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Geonovas n.º 27

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Afinal, o que é ser geólogo hoje?

OmonteFuji,ouFujisancomolhechamamosjaponeses,pontoculminantedoarquipé-lagojaponês(3776m),édesde2003patrimóniomundialdaUnesconasuaqualidadede“lugarsagradoefontedeinspiraçãoartística”.Estesimbolismoesconde,porém,outrafacemenospacífica.ÉtambémumvulcãodotipoexplosivosituadonajunçãotripladasplacastectónicasdoPacífico,daEurásiaedasFilipinas,quepermaneceactivo,emborasómuitoraramentetenhaacordadodoseusonoletárgiconosúltimosmilénios.

Recentemente,umgrupodeinvestigadoresfranco-japonêsrevelouqueoFujiseencontrasobpressõesacrescidasdevidoaograndesismodeTohoku(M9,0)de11deMarçode2011,quedeuorigemaotsunami causadordodesastrenucleardeFukushima.Estes investigadoresrealizaram

umaespéciedeecografiadasentranhasdalitosfera,apartirdoenormeacervodedadosregistadosdepoisdomegassismopelarededegeofonesjaponesaHi-net,amaisdensadomundo,commaisde800pontosdemedida.Paratanto,usaramsinaisnormalmenteconsideradoscomoparasitas:oruídodefundosísmicopermanenteproduzidopelaacçãodasondasoceânicassobreaterrafirme.OregistodasflutuaçõesdesteruídodebaseveiopermitircartografarasperturbaçõesgeológicasprovocadasnosubsolodoJapãopelasondassísmicasgeradaspelograndesismodeTohoku.Estesefeitosparecemparticularmenteacentuadosnasregiõesvulcânicasondeosfluidos(águaevapor,gases,magma)seencontramjámuitocomprimidosnarochaeoefeitodinâmicoadicionaldapropagaçãodasondassísmicasésusceptíveldedarorigemaumacréscimodapressãoeconsequenteaumentodaaberturadasfracturasefis-surasdosmaciçosrochososporfracturaçãohidráulica.Estainvestigação,cujarealizaçãonãoteriasidopossívelsemumpoderososoftwaredetratamentodedados,alémdetodaasofisticadainstrumentaçãodecapturadosdados,revelouqueoFujisanseencontrasubmetidoapressõeselevadasinduzidaspelograndesismode11deMarçode2011.Nãoéqueestejaprestesaentraremactividade,masosresultadosmostramqueseencontranumestadocríticoqueimportamonitorizarnoâmbitodaprevençãoedaprotecçãocivil.

PoucoantesdaleituradesteartigonaSciencede4deJulho,participeicomaDirecçãodaAPGnumaSessãodeInformaçãodoMinistériodoAmbientesobreoAnteprojectodePropostadeLeideBasesdosRecursosGeológicos.Nessareuniãopareceu-mepertinentesalientaranecessidadedesecontinuaracartografiageológicadoterritório,aindaincompleta,bemcomodeactualizarascartasmaisantigaselaboradashá40ou50anos.Nofimdareunião,umaltodirigentedoLNEG,comaenormecortesiaqueocaracteriza,agradeceu-meaintervenção(feitasobretudoemnomedacriaçãodeempregoparaosgeólogos)maschamou--meaatençãoparaofactode,actualmente,nonossopaísnãoseracartografiageológicaocaminhocríticoparaadescobertaevalorizaçãodosrecursosgeológicos,massimageofísicaprofundamobilizadoradepotentesesofisticadosmeiostecnológicosedesoftware informáticodequeoLNEGnãodispõe.Sentinaquelemomento,nãosóqueeletinharazão,mastambémcomoeuestavaaindaancoradoaideiaseconcepçõesultrapassadas,sobretudopelaevoluçãodastecnologiasdainformação,nãopelaevo-luçãodoconhecimentocientífico.Emtermosde“tecnologiasdainformação”eupermaneciapresoàspotencialidadesdomeuvelhomartelodegeólogo,umEstwingde24Oz.,hámuitoesquecidoaumcantodomeugabinetedetrabalho,aoladodeumvelhoestereoscópiodeespelhos,recordaçãodanovidadequefoiafotointerpretaçãonosanosde1950,masagoraaindamaisarcaicodoqueele,faceatodaaimagiologiadossatélitesedoGoogle Earth.Umasemanadepois,sentinoartigodaSciencesobreoFujisanamesmahegemoniadosgrandesmeiosdeacessoindirectoaosdadosdageodinâmicainterna.Sãoevidentesossinaisdeumagrandemudança.Parece-meporémquenãoestamosnofimdenada,masnatransiçãoparaoutracoisahámuitoanunciadapelaalteraçãodadesignaçãodosDepartamentosdeGeologiaparaDepartamentosdeCiênciasdaTerraemmuitasUniversidadeseInstitutosdeinvestigação,naEuropaenosEstadosUnidos.Entrenóshátambémalgunsexemplosdestamudança,mas,comoé

usual,nadadesubstantivomudouefectivamenteanãoseronome.QuenovofuturoparaasCiênciasdaTerraeseusagentesnoplanoprofissionalpoderiasurgirdafusãodageologiacomageofísicanumafileiraúnicadaformaçãouniversitária?Osgeólogosnãodevemtemerpelasuaidentidade,sevieraserestaanovaordem.Esteéapenasocaminhológicoabertopelaglobalizaçãoaqueateoriadatectónicadeplacasdeuorigem.Éimpossívelquenãonosinterroguemossobreoquesignificahojesergeólogo,noplanodaformaçãoacadémicaedaactividadeprofissional.Sim,oquesignificaafinal,sergeólogohoje?Pensemnisso…

António Gomes Coelho

PresidentedaAssociaçãoPortuguesadeGeólogos

associação portuguesa de geólogos 3geonovas n.º 27: 03 a 06, 2014

Identificação de deformações em sedimentos finos não consolidados com recurso a georadar (Vale Inferior do Tejo)

R. J. Oliveira*, J. Casacão, B. Caldeira & J. F. Borges

Universidade de Évora, Centro de Geofísica de Évora, Rua Romão Ramalho, 59, 7000-671 Évora;

[email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; *autor correspondente.

Objectivo do estudo

O objectivo deste estudo, desenvolvido no âmbito do projecto ATESTA, é cartografar fa-lhas activas aflorantes do Vale Inferior do Tejo, na zona de Vila Franca de Xira. A partir dos da-dos provenientes de ensaios de sísmica de re-flexão em diversos locais da região (desenvolvi-dos também no âmbito do projecto ATESTA) foi possível escolher algumas localizações onde existe forte probabilidade de se encontrarem falhas à superfície, ou muito próximo desta. Nesses locais realizaram-se ensaios de geora-dar (GPR) de forma a confirmar as suspeitas da presença de falhas aflorantes ou a poucos me-tros da superfície.

Enquadramento da área de estudo

A área de estudo, situada em Vila Franca de Xira, está inserida no sector central da Bacia Cenozóica do Baixo Tejo, no Vale Inferior do Tejo. Na vizinhança desta área foram realiza-dos trabalhos sobre geologia estrutural a nível regional, tendo-se por objectivo principal car-tografar falhas e caracterizar a sismicidade da região, dada a enorme preocupação com o risco sísmico da área metropolitana de Lisboa.

A Bacia Lusitaniana, formada no Mesozóico du-rante a abertura do Atlântico Norte, encontra-se na Orla Ocidental do Maciço Ibérico e apresenta carác-ter distensivo continental. De acordo com Ribeiro etal. (1979), a evolução da bacia foi condicionada por

Resumo

O projecto ATESTA visa avaliar a perigosidade sísmica no Vale Inferior do Tejo. Tem vindo a assumir-se que as falhas activas na região terão sido a fonte de eventos históricos, como sejam os sismos de 1531 e 1909, que afectaram a região de Lisboa. Para melhor compreensão destes processos, realizaram-se ensaios geofísicos nas imediações de Vila Franca de Xira, perto de Lisboa. O objectivo destes ensaios é determinar a localização precisa das falhas, me-diante a detecção de deformações sub-superficiais que possam estar associadas às escarpas dessas falhas. Os resulta-dos de georadar evidenciam estruturas verticalizadas que corresponderão a falhas ou a deformações de sedimentos finos não consolidados.

Palavras-chave: Falhas activas; Vale Inferior do Tejo; deformação de sedimentos finos não consolidados; processa-mento de imagem.

Abstract

ThemainpurposeoftheprojectATESTAistoassesstheseismichazardontheLowerTagusValley.Here,regionalseismicfaultsareassumedtobethesourceofhistoricalevents,suchasthe1531and1909earthquakeswhichaffectedtheLisbonarea.Forabetterunderstandingoftheseprocesses,severalgeophysicalsurveyswerecarriedoutinVilaFrancadeXira(Lisbon).Thepurposeofthesetestsistodeterminethepreciselocationoffaultsbydetectingsub--superficialdeformationsthatmaybeassociatedwiththeslopesofthesestructures.Theresultsofground-penetratingradaremphasizeverticalstructuresthatcanmatchfaultsorsoft-sedimentdeformationstructures.

Keywords: Activefaults;LowerTagusValley;soft-sedimentdeformationstructures;imageprocessing.

4 Identificação de deformações em sedimentos finos não consolidados com recurso a georadar (Vale Inferior do Tejo)

Figura1 – Radargrama obtido com uma antena 100 MHz: modo distância, bi-estático de baixo alcance. A utilização desta antena permite atingir profundidades maiores, no entanto tem a desvantagem de ser susceptível ao ruído. É

possível observar falhas prováveis (FP) e o efeito da presença de um tubo metálico (TM) junto à superfície. Aos 80 m poder-se-á estar perante a Falha de Vila Franca de Xira.

Figure1–Radargramobtainedwitha100MHzantenna:distancemode,bi-staticoflowrange.Usingthisantennaachievesgreaterdepths,butithasthedisadvantageofbeingsusceptiblewiththenoise.Probablefaults(PF)andtheeffectofthepresenceofametaltube(TM)canbeobservednearthe

surface.After80m,theVilaFrancadeXiraFaultmightbepresent.

Figura2 – Radargrama obtido com uma antena 200 MHz: modo distância. Com esta antena atinge-se um quinto do alcance da antena de 100 MHz, podendo-se observar pormenores com menos ruído. Neste radargrama observam-se falhas prováveis (FP) e um tubo metálico (TM), assim como variação lateral da espessura dos reflectores, que poderá

corresponder a variações da taxa de compactação.Figure2–Radargramobtainedwitha200MHzantenna;distancemode.Thisantenna’srangeisone-fifthofthe100MHzantenna,resultingindetailedacquisitionswithlessnoise.Inthisradargramprobablefault(FP)andametaltube(TM)wereobserved,aswellaslateralvariationofthe

reflectorsthicknesses,whichmaycorrespondtovariationsintherateofcompaction.

episódios de fracturação tardi-variscos, nomeada-mente cisalhamentos direitos, responsáveis pelo apa-recimento de falhas de desligamento esquerdo com direcção NNE-SSW e NE-SW (Ribeiro, 2002). A Zona de Cisalhamento de Porto-Tomar, com orien-tação N-S e outras falhas de direcção NW-SE foram igualmente importantes na definição da estrutura da Bacia Lusitaniana (Kullberg etal., 2006).

É de conhecimento geral, atendendo a evidên-cias expostas em artigos publicados, que o Vale In-ferior do Tejo é sismicamente activo. É lá que se localizam as falhas activas responsáveis pelos impor-tantes sismos históricos de 1531 e 1909. Uma dessas falhas é a denominada Falha de Vila Franca de Xira, cujo traçado passará na área de estudo (Cabral etal., 2004). Recentemente descobriram-se, em re-gistos sísmicos (Ghose et al., 2013), evidências de deformação provocada por falhas que poderão ter expressão a poucos metros da superfície, logo afec-tando sedimentos recentes. Estes factos motivaram a escolha desta região para local deste trabalho.

A litostratigrafia da área de estudo é caracteriza-da por depósitos aluvionares, cuja espessura pode

atingir os 60 m. As ocorrências litológicas consis-tem, essencialmente, de aluviões argilo-arenosos, areias e argilas. Na base da sequência aluvionar ocorrem níveis de cascalho (Zbyszewski etal., 1965).

Deformação de sedimentos finos não consolidados

Os dados de georadar revelaram uma complexa subsuperfície sedimentar deformada, denunciadora de ambiente geotectónico e geodinâmico complexo. De acordo com Owen etal. (2011) e Suter etal.(2011), a deformação de sedimentos finos não consolidados ocorre em curtos intervalos de tempo, junto à su-perfície, durante e logo após a deposição, mas an-tes de se iniciar definitivamente o processo de dia-génese. Porém, para que essa deformação ocorra é necessário que se cumpram algumas condições, no-meadamente, a existência de forças que promovam a deformação. Os fenómenos que desencadeiam essas forças responsáveis por deformação podem estar re-lacionados com eventos sísmicos. Se os sismos são de magnitude superior a 4,5 a deformação resultante em zonas próximas da fonte pode estar associada ao

associação portuguesa de geólogos 5R. J. Oliveira, J. Casacão, B. Caldeira & J. F. Borges

fenómeno de liquefacção, que consiste numa mu-dança de estado temporária promovida pelos fortes movimentos sísmicos. Nessas situações, as estrutu-ras que daí resultam, designam-se por sismitos. São estruturas que, para além das ondas sísmicas, podem também ser originadas por cheias, percolação, se-dimentação rápida e movimentos do nível freático. Tipicamente, este tipo de deformação ocorre em ambientes lacustres, palustres, zonas deltaicas e es-tuarinas, planícies aluviais e de inundação, em que a presença de água é abundante (Owen etal., 2011a). Moura-Lima etal.(2011) realizaram ensaios de geo-radar no Brasil para comprovar a origem sísmica desta deformação associada a fenómenos de lique-facção e movimentos do substrato em ambiente sa-turado de água, de modo a excluir potenciais triggers autogénicos (Owen etal., 2011).

Ensaios geofísicos

No local do estudo foram realizados ensaios de georadar de forma a inferir a existência de falhas aflorantes ou que tenham expressão próximo da superfície. Usou-se um sistema da marca GSSO, modelo SIR-3000, com antenas de 100 MHz, 200 MHz e 400 MHz. Os dados foram adquiridos por arrastamento das antenas sob perfis, na generalida-

de dos ensaios segundo o modo distância (aquisi-ção com antena em movimento). Em alguns ensaios optou-se pelo modo ponto (aquisição com a antena parada) para confirmar suspeitas sobre o efeito das irregularidades do terreno nos dados adquiridos no modo distância. A antena de 100 MHz foi utilizada no modo bi-estático de baixo alcance com comuni-cação entre emissor e receptor, promovida por fibra óptica, de modo a obter resultados mais precisos.

Tratamento de dados

Os dados de georadar obtidos nas campanhas geofísicas foram processados com recurso ao pro-grama RADAN (GSSI), para remover o ganho apli-cado durante a aquisição, e ao plugin MATGPR para Matlab (Mathworks) para o restante processamento (decomposição da amplitude inversa, com atenua-ção média, filtros FIR e saturação da coloração do radargrama final tratado).

Resultados

Da interpretação dos radargramas finais (Figs. 1 a 4) foi possível identificar uma sucessão estratifor-me e horizontal de litologias na área estudada, ob-servando-se localmente estruturas com geometria

Figura4 – Radargrama obtido com uma antena 200 MHz: modo ponto. Localização das falhas prováveis (FP). Com o modo ponto confirmam-se os efeitos provocados pela irregularidade do terreno durante a aquisição pelo modo distância.Figure4–Radargramaobtainedwitha200MHzantenna:pointmode.Locationofprobablefaults(PF).Withpointmodeitispossibletoconfirmthe

effectsoftheterrainirregularityduringdistancemodeacquisition.

Figura3 – Radargrama obtido com uma antena 400 MHz: modo distância. Localização das falhas prováveis (FP). A partir dos 95 m observa-se uma deformação horizontal aos 30 ns, que poderá corresponder a uma deformação sem

ocorrência de ruptura.Figure3–Radargramobtainedwitha400MHzantenna:distancemode.Locationofprobablefaults(PF).Lowerthan95mthereisahorizontal

deflectionat30ns,whichcorrespondstoadeformationthatcanoccurwithoutrupture.

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vertical, deformadas, que poderão corresponder a descontinuidades originadas em consequência de movimentos produzidos numa falha activa duran-te um episódio sísmico. Nos níveis estratigráficos analisados ocorrem ressaltos compatíveis com frac-turas ou falhas prováveis (FP). Observaram-se tam-bém fácies sedimentares, nomeadamente estratifi-cações e laminações, cuja continuidade lateral foi comprometida, devido aos horizontes terminarem de forma abrupta, sendo assim cortados por estru-turas posteriores. As estruturas descritas poderão corresponder a assentamentos e/ou consolidação de níveis de maior componente argilosa. No radar-grama da figura 3, a partir dos 95 m nota-se uma mudança de padrão no horizonte dos 30 ns que poderá corresponder a uma deformação sem ocor-rência de rotura. A confirmar-se esta interpreta-ção, esta reflecte o carácter plástico do conjunto de litologias estudadas. Em alguns radargramas, aos 35 m é observada uma reflexão correspondente a um tubo metálico (TM) próximo da superfície.

Conclusão

Após a realização deste estudo concluiu-se que as estruturas identificadas nos radargramas cuja organização é sub-vertical poderão correspon-der a evidências de deformação de sedimentos fi-nos não consolidados cujo trigger pode ter sido um evento sísmico.

O ambiente geodinâmico da área de estudo é estuarino, rico de água e aluviões, com movi-mentações periódicas do nível freático (marés e cheias). O ambiente tectónico caracteriza-se por uma sismicidade activa com eventos históricos re-gistados, existindo evidências da ocorrência de fe-nómenos de liquefacção na região. De acordo com a teoria em torno das deformações de sedimentos finos não consolidados, e tendo em conta a or-ganização dos elementos sedimentares estudados, as estruturas verticalizadas que se observaram nos radargramas deverão corresponder a sismitos ou mesmo a falhas activas, aflorantes ou que ocorrem a poucos metros da superfície. Segundo a orienta-ção da Falha de Vila Franca de Xira, esta passará no local de estudo, coincidindo com a falha provável identificada aos 80 m no radargrama representado nas figuras 1 e 2.

De modo a comprovar estas evidências, a pró-xima etapa do projecto ATESTA prevê a abertura de uma trincheira no local onde foram realizados os ensaios geofísicos, podendo-se posteriormente corroborar ou excluir os resultados até agora ob-tidos e interpretados.

Agradecimentos

Os projectos ATESTA (Active Tectonics and Ear-thquakeScenariosfortheLowerTagusValley – PTDC/CTE--GIX/099540/2008) e NEFITAG (Strong groundmotionandnearfieldeffectsintheLowerTagusValleyRegion- -PTDC/CTE-GIX/102245/2008) foram finan-ciados pela Fundação para a Ciência e a Tecnolo-gia. Um agradecimento ao colaborador do Centro de Geofísica de Évora, Samuel Neves, pelo auxílio na execução dos ensaios geofísicos e ao responsável pela Unidade de Recursos Minerais e Geofísica do LNEG, João Carvalho, pela sua contribuição com os dados de sísmica de reflexão.

Bibliografia

Cabral, J., Ribeiro, P., Figueiredo, P., Pimentel, N. & Martins, A., 2004. The Azambuja fault: An active structure located in in intraplate basin with signifi-cant seismicity (Lowe Tagus Valley, Portugal). JournalofSeismology, 8: 347-362.

Ghose, R., Carvalho, J. & Loureiro, A., 2013. Signa-ture of fault zone deformation in near-surface soil visible in shear seismic reflections. GeophysicalResearchLetters, 40: 1074-1078.

Kullberg, J., Rocha, R., Soares, A., Rey, J., Terrinha, P., Callapes, P. & Martins, L., 2006. A Bacia Lusi-taniana: Estratigrafia, Paleontologia e Tectónica. InGeologiadePortugalnocontextodaIbéria. Dias, R., Araújo, A., Terrinha, P., Kulberg, J, (Eds.), Universidade de Évora, Évora, 317-368.

Moura-Lima, E., Bezerra, F., Lima-Filho, F., Castro, D., Sousa, M., Fonseca, V. & Aquino, M., 2011. 3-D geometry and luminescence chronology of Quaternary soft-sediment deformation structures in gravels, northeastern Brazil. Sedimentary Geology, 235: 160-171.

Owen, G., Moretti, M. & Alfaro, P., 2011. Recogniz-ing triggers for soft-sediment deformation: Current understanding and future directions. SedimentaryGe-ology, 235: 133-140.

Suter, F., Martínez, J. & Vélez, M., 2011. Holocene soft-sediment deformation of the Santa Fe-So-petrán Basin, northern Colombian Andes: Evidence for pre-Hispanic seismic activity?. SedimentaryGeology, 235: 188-199.

Zbyszewsky, G. & Assunção, C., 1965. CartaGeológicadePortugal,naescala1/50000:NotíciaExplicativadaFolha30-D.Alenquer. Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa.

Este artigo encontra-se redigido segundo o antigo Acordo Ortográfico.

Identificação de deformações em sedimentos finos não consolidados com recurso a georadar (Vale Inferior do Tejo)

associação portuguesa de geólogos 7geonovas n.º 27: 07 a 11, 2014

Prospecção geofísica aplicada à detecção de falhasactivas – a falha de Vila Franca de Xira

J. Casacão1,*, R. J. Oliveira2, B. Caldeira2, J. F. Borges2 & J. Carvalho3

1Centro de Geofísica de Évora, Colégio Luís António Verney, Rua Romão Ramalho 59, 7000 Évora; [email protected]; 2Departamento de Física, Universidade de Évora, Colégio Luís António Verney, Rua Romão Ramalho 59, 7002-554 Évora; 3Laboratório Nacional de Energia e Geologia, Estrada da Portela-Zambujal, Alfragide, Apartado 7686, 2610-999 Amadora;

*autor correspondente.

Resumo

A falha de Vila Franca de Xira é considerada como a mais provável fonte de sismos destrutivos que afectaram a região de Lisboa. Contudo, devido às altas taxas de erosão/sedimentação no Vale Inferior do Tejo (VIT), as evidências super-ficiais de deformações cossísmicas nos sedimentos Holocénicos rapidamente são apagadas. Estudos recentes mostram indícios do traçado desta falha sob a cobertura aluvionar e de deformações subsuperficiais a ela associadas. O objectivo deste trabalho é, através de métodos geofísicos, complementar esses estudos e verificar, se possível, se esta falha atingiu os primeiros metros da subsuperfície para, assim, contribuir para um modelo de análise de perigosidade e risco sís-mico no VIT. A realização de um perfil de sísmica de reflexão de ondas P deu, inicialmente, a indicação da existência de quatro descontinuidades em profundidade, interpretadas como prováveis falhas. Para confirmar as suspeitas foram realizados, sobre esses locais específicos, perfis de georadar (com antenas de 200 MHz e 400 MHz) e tomografia de resistividade eléctrica. A interpretação dos perfis obtidos revela vários deslocamentos verticais, correspondendo aos traçados de falhas propostos em trabalhos anteriores.

Palavras-chave: Falhas activas; sísmica de reflexão; georadar; tomografia eléctrica; Vale Inferior do Tejo.

Abstract

TheVilaFrancadeXirafaultisconsideredtobethemostprobablesourceofseveraldestructiveearthquakesthataffectedtheLisbonarea.However,thereisnoevidenceofsurfacefaultingintheHolocenesedimentsoftheLowerTagusValley(LTV)duetolowtectonicactivityandhigherosion/sedimenta-tionrates.Themaingoalofthisworkis,usinggeophysicalmethods,tocomplementrecentstudiesandverifyhowclosethefaultapproachedthesubsurface,thuscontributingfortheseismichazardmodelassessmentintheLTV.TheinitialP-waveseismicreflectionsurveyindicatedfourdiscontinuities,interpretedaspossiblefaults,andforthisreasonground-penetratingradar(200MHzand400MHzantennas)andelectricaltomographysurveyswereconductedonthosespecificlocations.Severalverticaldisplacementswereobserved,matchingthetheoreticalfaulttracesproposedinpreviousstudies.

KeywordsActivefaults,seismicreflection;ground-penetratingradar;electricaltomography;LowerTagusValley.

1. Introdução

Os registos históricos da região de Lisboa apresentam sucessivas referências a sismos vio-lentos, com elevados danos materiais e perda de vidas humanas. Actualmente sabe-se que o Vale Inferior do Tejo (VIT) alberga as falhas activas onde se produziram alguns desses sismos, no-meadamente os de 1909 (Teves, 1999) e 1531 (Justo, 1998), com magnitudes variando entre 6,0 a 7,0 na escala de Richter. O período de re-torno médio estimado para a falha de Vila Franca

de Xira, para sismos com ruptura média de 0,7 m, é da ordem de 5000 anos, para magnitu-des compreendidas entre 6 e 7 (Carvalho et al., 2006). Actualmente, a localização exacta da(s) fonte(s) sismogénica(s) do VIT ainda está em discussão na comunidade académica.

A repetição de um evento semelhante teria efeitos devastadores. Para além da elevada densi-dade populacional, a região está edificada sobre uma bacia sedimentar de dimensão suficiente para produzir a amplificação das ondas sísmicas e, consequentemente, dilatar o efeito dos sismos.

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Figura1– Enquadramento geológico da bacia Cenozóica do Vale Inferior do Tejo (adaptado de Carvalho etal., 2006).Figure1–GeologicalframeworkoftheCenozoicLowerTagusValleybasin(adaptedfromCarvalhoet al.,2006).

A caracterização das fontes sismogénicas implica o reconhecimento das falhas activas que geram sismicidade, e constitui uma tarefa essencial para o estudo do modelo de evolução tectónica regio-nal e avaliação do risco sísmico. Este trabalho de prospecção geofísica é parte integrante do projec-to de paleosismicidade ATESTA, que tem como objectivo localizar e caracterizar falhas activas aflorantes do VIT.

A área de estudo localiza-se junto à localida-de de Vila Franca de Xira, na bacia Cenozóica do Baixo Tejo, 25 km a norte de Lisboa (Fig. 1). Do ponto de vista tectónico, faz parte da zona de falha Ota-Vila Franca de Xira-Lisboa-Sesimbra (Carva-lho etal., 2008). Há evidência que a falha de Vila Franca de Xira esteve activa ao longo do Holocé-nico (Ghose et al., 2013), sendo a mais provável fonte do sismo catastrófico de 1531. A falha aflora em sedimentos Miocénicos, não existindo registo de falhas nos sedimentos holocénicos na zona do VIT. A baixa taxa de deslizamento (estimada em <1 mm/ano) que corresponde a baixo grau de ac-tividade tectónica, e a alta taxa de sedimentação/erosão (com influência local de terrenos agrícolas remobilizados) são responsáveis pela inexistência de afloramentos geológicos na zona.

A região foi sujeita a vários estudos geofísicos desde a década de 50, para efeitos de exploração de hidrocarbonetos. Os perfis de sísmica de refle-xão adquiridos para a prospecção de hidrocarbo-netos indiciam grandes deformações geológicas em profundidade, mas a falta de resolução devido aos parâmetros de aquisição não permite verificar se a falha afecta os sedimentos Holocénicos

Os ensaios geofísicos a baixa profundidade têm a faculdade de quantificar com precisão variações de parâmetros físicos do solo. Por esse facto têm vindo a ser aceites como apropriados para a detec-ção de estruturas geológicas (Demanetetal., 2001; Meghraoui et al., 2001; Slater & Niemi, 2003; Yalçiner etal., 2013; Nguyen etal., 2005). Segun-do estes autores, a resistividade eléctrica, métodos electromagnéticos, sísmica de reflexão e georadar são os métodos mais apropriados para atingir este fim específico.

Tomando como base toda a informação dis-ponível sobre a região, materializada nos registos geofísicos disponíveis, na sismicidade histórica e instrumental e no registo geológico, as equipas do Centro de Geofísica de Évora (CGE) e do Labo-ratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG) decidiram utilizar métodos geofísicos de alta reso-

Prospecção geofísica aplicada à detecção de falhas activas

associação portuguesa de geólogos 9J. Casacão, R. J. Oliveira, B. Caldeira, J. F. Borges & J. Carvalho

Figura2 – Secção sísmica migrada no tempo (topo) e conversão para profundidades usando uma função de velocida-des 1D a partir das velocidades de processamento, com interpretação das principais falhas sobreposta (fundo). Estão

definidas quatro zonas de interesse, marcadas de A – D .Figure2–Timemigratedseismicsection(top)anddepthconversionusinga1Dspeedfunctionderivedfromprocessingspeeds,withinterpretationofthe

mainoverlayproblems(bottom).Fourinterestzonesaredefined,labeledAtoD.

lução, como a sísmica de reflexão, tomografia de resistividade eléctrica e georadar (ground-penetratingradar – GPR) para a identificação de traços de falha sob a cobertura aluvionar, originados através de ac-tividade tectónica recente.

2. Ensaios geofísicos no Vale Inferior do Tejo

Tem sido demonstrado por Carvalho et al. (2012), que o método da sísmica de reflexão garan-te uma interpretação fiável da estrutura geológica. A execução inicial do perfil de sísmica de reflexão e a sua posterior interpretação, forneceu a indica-ção de quatro potenciais segmentos de falha que se aproximam da superfície.

Tendo em conta esta informação foram então aplicadas as técnicas de georadar e tomografia eléc-

trica ao longo de todo o perfil de sísmica, com es-pecial atenção nos quatro locais especificados. Des-ta forma, foi possível produzir uma interpretação geológica, a baixa profundidade.

2.1 Georadar (ground-penetrating radar)

Esta técnica funciona por emissão de sequên-cias de impulsos electromagnéticos (EM) para o solo, que após reflectidos em cada contraste físico (ex.: solo/litologia), emergem e são registados. O processamento destes registos redunda em figuras (radargramas) passíveis de interpretação geológi-ca. Foram realizados ensaios com antenas de 100, 200 e 400 MHz de forma a garantir resoluções e profundidades diferentes, ao longo dos locais de interesse (A – D) definidos no perfil de sísmica de

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reflexão. Desde logo, foi possível observar que os perfis 2D resultantes do varrimento (array) com a antena de 100 MHz não foram claros, tendo sido descartada a utilização desta antena. Após a obten-ção dos dados georadar no campo, foi necessário realizar processamento através de software RADAN e do plugin matGPR para MATLAB, daqui resultando vários radargramas.

2.2 Tomografia de resistividade eléctrica

Este método consiste na injecção de corrente eléctrica no solo por dois eléctrodos de corrente e na posterior leitura da diferença de potencial en-tre outros dois eléctrodos. Através da corrente (I) e diferença de potencial (V), é possível calcular a re-sistividade aparente. Utilizando o software Res2DInv procedeu-se à inversão dos dados, de forma a obter

o perfil 2D final. De todos os tipos de varrimen-to (array) disponíveis no equipamento PASI 16G-N foi escolhido o Dipolo-Dipolo, visto ser um bom método para identificar estruturas verticais como cavidades e falhas geológicas, tendo ainda uma boa resolução horizontal. O perfil resultante foi reali-zado na zona B (Fig. 3), que tem um comprimento de 46,5 m e profundidade máxima de 5,0 m.

3. Resultados

Após o processamento dos dados de campo de georadar e de tomografia eléctrica são apresentados os resultados sob a forma de perfis 2D.

Os radargramas revelam algumas deformações e descontinuidades, que podem relacionar-se com potenciais falhas geológicas, correspondentes a des-locamentos sub-verticais abruptos. Algumas destas

Figura3 – Radargramas interpretados, obtidos após processamento dos dados de campo. a) Antena 200 MHz (modo distância); b) Antena 100 MHz (modo distância); c) Antena 200 MHz (modo ponto – wiggle); d) Antena 200 Mhz

(modo ponto – wiggle). Fp – Falha provável.Figure3–Interpretedradargrams,obtainedafterthefielddataprocessing.a)Antenna200MHz(distancemode);b)100MHzantenna(distance

mode);c)200MHzantenna(pointmode-wiggle);d)Antenna200Mhz(pointmode-wiggle).Fp–Probablefault.

Figura4 – Secção interpretada de tomografia de resistividade eléctrica, usando o array Dipolo-Dipolo. Fp – Falha provável.Figure4–Electricalresistivitytomographysectioninterpretedusingthedipole-dipolearray.Fp–Probablefault.

Prospecção geofísica aplicada à detecção de falhas activas

associação portuguesa de geólogos 11

deformações têm expressão mais profunda (como sugere a sísmica de reflexão) e terminam junto à su-perfície. No perfil de tomografia eléctrica surgiram valores de resistividade baixa (<10 Ω m), típicos de solos areno-argilosos. Embora o perfil apresente diferenças de valores de resistividade, não parece haver disparidades significativas que indiquem com clareza deformações sub-verticais, semelhantes às que foram observadas nos radargramas de GPR. Apesar disto, as poucas variações existentes têm correspondência com deslocamentos verticais ob-servados no perfil de sísmica de reflexão de ondas P.

Em geral, ficou demonstrado o bom resultado das campanhas de sísmica de reflexão de ondas P, que constituíram a base de trabalho, e que servi-ram para orientar os restantes métodos geofísicos de forma a investigar detalhadamente as áreas de interesse seleccionadas. Concluiu-se que o geo-radar ofereceu melhores resultados para este caso específico de detecção de segmentos de falhas ac-tivas. É, ao mesmo tempo, o que apresenta melhor resolução, e onde é possível observar a horizonta-lidade dos reflectores a baixa profundidade, que correspondem às estratificações típicas de deposi-ção sedimentar em regime de baixa energia. Esta disposição horizontal permite, também, denotar com maior clareza as interrupções verticais entre os reflectores, deslocamentos aqui interpretados como falhas geológicas.

Numa fase posterior, serão abertas trincheiras ao longo destes perfis geofísicos. Este processo terá como objectivo confirmar a existência das falhas e caracterizá-las, medindo o rejeito co-sísmico, re-colhendo amostras para determinar as suas datações absolutas e comparando os dados geofísicos com o registo dos logs das paredes das trincheiras. Confir-mando-se a existência de falhas nestes sectores, a sua caracterização detalhada irá contribuir significativa-mente para o estudo da avaliação da perigosidade e, posteriormente do risco sísmico na região do VIT.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Fundação para a Ciên-cia e Tecnologia, por financiar o projecto ATESTA (PTDC/CTE-GIX/099540/2008). Agradecemos também ao colaborador do Centro de Geofísica de Évora, Samuel Neves o seu contributo, em especial no decurso do trabalho de campo realizado, ao proprie-tário dos terrenos onde se efectuaram os trabalhos de campo, João Lopes, e à equipa de campo de sísmica, Daniela Alves, Jaime Leote e Fernando Caneiras.

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Este artigo encontra-se redigido segundo o antigo Acordo Ortográfico.

J. Casacão, R. J. Oliveira, B. Caldeira, J. F. Borges & J. Carvalho

associação portuguesa de geólogos 13geonovas n.º 27: 13 a 20, 2014

Comparação de fontes sísmicas através de ensaios de refraçãosísmica e multichannel analysis of surface waves (MASW)

S. Neves*, J. Borges & B. Caldeira

Centro de Geofísica de Évora e Departamento de Física da Universidade de Évora, Rua Romão Ramalho, 59, 7000, Évora;

*[email protected]; autor correspondente.

teriormente o método MASW (Multichannel analysisofsurfacewaves) desenvolvido por Park etal.(1999) e Xia etal. (1999), que ao contrário do SASW, uti-liza várias estações sismográficas/geofones em ar-ray. Ambos os métodos recorrem a duas ou mais estações sismográficas/geofones, e são expeditos, permitindo obter resultados em que a relação custo-benefício é bastante apelativa, daí que têm vindo a ser utilizados em variadas aplicações, tais como, na caracterização geotécnica ou na avaliação da perigosidade/risco sísmico. Com este novo método é possível ultrapassar grande parte das desvantagens da refração sísmica, quer de ondas P quer de ondas S, utilizando praticamente o mesmo equipamento.

Introdução

Os ensaios sísmicos de subsuperfície de rápi-da execução, como a refração sísmica permitem inferir, com custos mais reduzidos, a variabili-dade litológica local, envolvendo a caracteriza-ção de um maior volume de solo. No entanto, estes ensaios recorrem normalmente à aquisição de ondas P.

A utilização de métodos sísmicos de subsuper-fície, que recorrem à aquisição e processamento de ondas superficiais, como meio para obter a ve-locidade das ondas S (Vs), tem vindo a aumentar desde a década de 80 do passado século, após a introdução do ensaio SASW (Spectralanalysisofsurfacewaves) desenvolvido por Nazarin & Stokoe (1984). No decorrer da investigação do SASW, surgiu pos-

Resumo

São comparados os resultados obtidos através dos ensaios de refração sísmica e MASW (Multichannel analysis of surface waves) para duas fontes sísmicas diferentes, por forma avaliar a profundidade máxima de investigação através do ensaio MASW. De modo a determinar o modelo de velocidades das ondas S foi necessário obter um modelo inicial das ondas P, o qual foi obtido a partir do método de refracção sísmica. As fontes sísmicas uti-lizadas consistiram no tradicional martelo e na fonte sísmica AWD (Acceleratedweightdrop). Para ambas as fontes sísmicas foram testados alguns parâmetros de aquisição e registo, tais como, a utilização de stacking e de ganho automático. Verificou-se que a utilização da fonte sísmica AWD permite atingir maior profundidade de investi-gação do que com o martelo.

Palavras-chave: Ensaios sísmicos; Refração; MASW; Geofísica.

Abstract

TheresultsobtainedfromtheseismicrefractionandMultichannelanalysisofsurfacewaves(MASW)surveysarecomparedfortwoseismicsourcesinordertoassessthedepthtowhichthesesurveyscanbeachieved.TheseismicsourcesusedwerethesledgehammerandAWD(Acceleratedweightdrop).Forbothseismicsourceswehavechangedsomeacquisitionparameters,suchastheuseofstackingandautomaticgain.ItwaspossibletoverifythattheAWDseismicsourceachievedmoredepththanthesledgehammer.

Keywords: SeismicSurveys;Refraction;MASW;Geophysics.

14

Refração sísmica

O método de refração sísmica baseia-se na ge-ração de ondas sísmicas P que se propagam no ter-reno e se refratam nas interfaces dos meios com velocidades de propagação crescentes em profun-didade, marcadas por características elásticas sufi-cientemente distintas.

Ao introduzir um impulso no solo são obtidos os tempos de percurso das ondas sísmicas através dos geofones, que se encontram dispostos ao longo

do terreno em array (em linha e espaçamento cons-tante). Ao ajustar os tempos de percurso a segmen-tos de reta, utilizando por exemplo o método dos mínimos quadrados, são determinados os declives da reta, sendo que o inverso do declive é a velocida-de de propagação da onda sísmica. Cada segmento de reta com declive diferente, representa diferentes camadas com diferente velocidade de propagação de onda (Fig. 1). A utilização de vários impulsos ao longo do array permite criar um modelo de veloci-dades 1.5D (Redpath, 1973).

Comparação de fontes sísmicas através de ensaios de refração sísmica e multichannel analysis of surface waves (MASW)

Figura1 – Determinação das camadas de solo e respetivas velocidades de propagação.Figure1–Determinationofsoillayersandseismicwaves’velocities.

associação portuguesa de geólogos 15S. Neves, J. Borges & B. Caldeira

Figura2 – Propagação das ondas sísmicas.Figure2–Propagationofseismicwaves.

MASW – Método das ondas superficiais

O método MASW baseia-se no estudo do fenó-meno da dispersão das ondas superficiais em meio verticalmente heterogéneo, isto é, diferentes fre-quências propagam-se com velocidades diferentes, designadas por velocidade de fase (Fig. 2). Estes parâmetros são utilizados como base para construir uma curva, que relaciona a velocidade de fase com a frequência, designada por curva de dispersão.

O objetivo principal do método é determinar a distribuição em profundidade da velocidade de propagação das ondas S. As ondas superficiais ad-quiridas são normalmente as ondas de Rayleigh (ondas presentes unicamente na componente

vertical do registo sísmico), que correspondem a cerca de dois terços da energia produzida por uma fonte pontual (Richart etal., 1970). São co-nhecidas diversas metodologias, em que se faz va-riar, por exemplo, o número, o tipo de geofones utilizados, a geometria do array e o processo para obter a curva de dispersão e/ou o algoritmo de inversão (Nazarian & Stokoe, 1984; Stokoe etal., 1988; Park et al., 1998-b, 1999; Xia et al., 1999, 2000). Após o processamento, são criados os modelos de velocidades das ondas S 1D. Segundo Xia etal. (2000) é possível determinar, através de uma determinada geometria em array, o modelo de velocidades das ondas S 1.5D tendo em conta vários modelos de velocidades 1D.

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Descrição geral dos ensaios

Os ensaios foram realizados no campus da Mitra, espaço que integra a Universidade de Évora, com as seguintes coordenadas: N38o31.922,W8z00.723(Fig. 3). A figura 4 apresenta a geologia da região onde se insere o local de realização dos ensaios. Os litótipos representados cartograficamente no re-ferido espaço, correspondem a rochas ígneas, no-meadamente granitos e granodioritos do Carbónico (Pereira etal., 2013).

O equipamento utilizado foi um sismógrafo (P.A.S.I. 16SG24), 24 geofones verticais (frequên-cia própria de 4,5 Hz, para MASW, e 10 Hz, para a refração sísmica), martelo de 9,0 Kg e fonte sís-mica AWD (Fig. 5). Os perfis de MASW e a refra-ção sísmica têm origem no Ponto P. O espaçamento entre geofones é de 0,50 m, e no caso do MASW, o trigger foi colocado a 2,00 m do primeiro geofone (distância que permite o desenvolvimento de ondas superficiais logo a partir do primeiro geofone). Os parâmetros de registo utilizados na refração sísmica

Comparação de fontes sísmicas através de ensaios de refração sísmica e multichannel analysis of surface waves (MASW)

Figura4 – Mapa geológico com a representação do local dos ensaios no campus da Mitra (Pereira etal., 2013).Figure4–GeologicalmapofsurveyfieldinsidetheMitracampus(Pereiraet al.,2013).

Figura3– Localização dos ensaios.Figure3–Seismicsurvey’slocation.

Figura5 – Martelo e fonte baseada na queda de um corpo acelerado por elásticos AWD “Accelerated weight drop”.Figure5–SledgehammerandAcceleratedweightdropseismicsource.

associação portuguesa de geólogos 17S. Neves, J. Borges & B. Caldeira

foram intervalo de amostragem de 0,125 ms e jane-la temporal de registo de 250 ms. Para o MASW, o intervalo de amostragem adotado foi de 0,250 ms e a janela temporal de registo de 1024 ms (Park etal., 2002). O ganho (definido automaticamente a partir de testes com a fonte) e o stacking (soma de registos redundantes para aumentar a razão sinal ruído) foram definidos de acordo com a tabela 1, sendo adotado stacking com 3 impulsos. O plano de trabalhos para ambos os ensaios é apresentado na tabela 1, onde o símbolo E1 representa o número do ensaio, neste caso o primeiro.

Resultados

O software utilizado para processar os dados da refração sísmica foi o WinSismV.14, e o SurfseisV2.05para o MASW. Após o processamento dos dados da

refração, foram determinadas as velocidades de propagação das ondas P para a maioria dos ensaios, exceto o ensaio E7, devido a problemas técnicos nos ficheiros de aquisição. Verificou-se que o lo-cal em estudo apresenta duas camadas de solo com características geológicas distintas (velocidades Vp distintas) e que a interface se situa aproximada-mente a 1,00 m abaixo da superfície do solo. As figuras 6 e 7 apresentam velocidades de propagação das ondas P nas camadas 1 e 2, respetivamente, para os diversos ensaios realizados, e tendo em conside-ração a posição onde foram realizados os tiros.

Comparando as velocidades apresentadas nas figu-ras 6 e 7 com os valores médios e os respetivos desvios padrões (Tabela 2), verificou-se que o ensaio (E6) é o mais próximo do valor médio. A tabela 2 apresenta a velocidade média e o desvio padrão das velocidades das ondas sísmicas P dos vários ensaios. Assim, o en-

E1 E2 E3 E4 E5 E6 E7 E8

Martelo x x x x

AWD x x x x

Sem stacking x x x x

Com stacking x x x x

Sem ganho x x x x

Com ganho x x x x

Tabela1 – Resumo da tipologia dos ensaios realizados.Table1–Summaryofthetestingtype.

Figura7 – Velocidades das ondas P na camada 2.Figure7–VelocityofseismicPwaves,layer2.

Figura6 – Velocidades das ondas P na camada 1.Figure6–VelocityofseismicPwaves,layer1.

Tiro 2 Tiro 3 Tiro 4Média D. Padrão Média D. Padrão Média D. Padrão

Vp, camada1 (m/s) 436,4 28,0 441,9 78,1 355,0 105,2Vp, camada2 (m/s) 783,7 60,0 697,1 105,3 772,7 35,2

Tabela2 – Análise estatística das velocidades das ondas sísmicas P.Table2–StatisticalanalysisofseismicPwaves’velocities.

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saio (E6) foi adotado como modelo inicial de veloci-dades para o processamento do MASW (Fig. 8).

Para realizar a inversão do perfil de velocida-des S (VS) foi necessário adotar o modelo inicial de velocidades da refração sísmica (modelo apriori), onde se definiu 2 camadas em que a primeira tem espessura de 1 metro e a segunda camada corres-ponde ao meio semi-infinito. Neste processo foi necessário estimar inicialmente a velocidade das ondas S (VS,inicial) através da seguinte condição:

))1(2/()21(.,, Re µµ −−≈ fraçãoinicial VpVs

Comparação de fontes sísmicas através de ensaios de refração sísmica e multichannel analysis of surface waves (MASW)

para além de ter em consideração a proposta de Xia et al. (1999). Neste modelo, o coeficiente de poisson adotado foi µ=0,3 (Shearer, 2009).

Após a inversão dos modelos iniciais de veloci-dades, foram determinados e modeladas as veloci-dades de propagação das ondas S 1D. Obtidos todos os modelos de ondas S 1D, foram determinados os perfis 1.5D das ondas S segundo os procedimen-tos e cálculos de Xia et al. (2000). As figuras 9 e 10 apresentam os resultados do MASW em posição idêntica às dos tiros da refração sísmica. Tendo-se verificado que não ocorreram significativas varia-ções de velocidades nas ondas S em todos os en-

Figura8 – Perfil de velocidades de propagação das ondas P, relativo ao ensaio E6 (m/s).

Figure8–VelocitymodelofPwaves,concerningtheE6survey(m/sec).

Figura9 – Velocidades das ondas S na camada 1.Figure9–VelocityofseismicSwaves,layer1.

Figura10 – Velocidades das ondas S na camada 2.Figure10–VelocityofseismicSwaves,layer2.

Tiro 2 Tiro 3 Tiro 4Média D. Padrão Média D. Padrão Média D. Padrão

Vs, camada1 (m/s) 100,0 0 100,0 0 92,9 18,9Vs, camada2 (m/s) 600,0 0 584,3 41,6 585,7 76,8

Tabela3 – Análise estatística das velocidades das ondas sísmicas S.Table3–StatisticalanalysisofseismicSwaves’velocities.

associação portuguesa de geólogos 19

saios, constatou-se que as fontes sísmicas não apre-sentaram diferenças expressivas na determinação das velocidades das ondas S. A tabela 3 apresenta a média e o desvio padrão da velocidade das ondas sísmicas S para cada tiro e camada de solo. A figura 11 mostra o modelo de velocidades das ondas S rela-tivo ao ensaio E6. Note que, não existe variabilida-de lateral de velocidade das ondas S e que a oscilação

de velocidade apresentada na interface das camadas deve-se ao algoritmo de interpolação (Krigging).

No processamento dos dados dos ensaios MASW verificou-se que a fonte sísmica AWD ob-teve uma frequência mínima, aproximadamente de 17 Hz (Fig. 12), enquanto que para o tradicio-nal martelo alcançou-se uma frequência mínima, aproximadamente de 19 Hz (Fig. 13). A partir dos

S. Neves, J. Borges & B. Caldeira

Figura12 – Curva de dispersão do E1, tiro 1. Figure12–DispersioncurveoftheE1survey,shot1.

Figura13 – Curva de dispersão do E5, tiro 1.Figure13–DispersioncurveoftheE5survey,shot1.

Figura11 – Modelo de velocidades de propagação das ondas S, relativo ao ensaio E6 (m/s).Figure11–VelocitymodelofSwaves,concerningtheE6survey(m/sec).

20 Comparação de fontes sísmicas através de ensaios de refração sísmica e multichannel analysis of surface waves (MASW)

resultados apresentados, concluiu-se que a fonte sísmica AWD é a mais indicada para realizar o en-saio MASW, dado que atinge maiores profundida-des de investigação.

Conclusão

Os ensaios da refração sísmica e MASW tiveram como objetivo comparar os resultados obtidos atra-vés da fonte sísmica AWD e o martelo, de forma a avaliar a profundidade máxima atingida pelo ensaio MASW. Para tal utilizou-se, um modelo a priori no processo de inversão, obtido através do método da refração sísmica das ondas P.

Em relação aos ensaios de refração sísmica, ve-rificou-se que não ocorreu divergência significati-va nas velocidades de propagação das ondas P. No entanto, nos ensaios E5, E6 e E8, as velocidades de propagação das ondas P aumentaram ligeiramente na camada 1 para os tiros 3 e 4.

Relativamente ao MASW, constatou-se que não ocorreram elevadas variações de velocidades das ondas S em todos os ensaios, sendo possível con-cluir que o martelo e a fonte AWD não divergem muito no processo de determinação da velocida-de. Contudo, a fonte sísmica AWD permitiu obter frequências mais baixas do que o martelo e atra-vés deste indicador aferiu-se que a fonte sísmica AWD atinge maiores profundidades de prospeção que o martelo.

Em suma, os resultados obtidos são bastante encorajadores para que o método MASW em con-junto com a fonte AWD seja aplicado a prospeções sub-superficiais profundas, avaliando assim, mais em profundidade, o comportamento do solo a ações dinâmicas.

Para avaliar o desempenho do MASW com a fonte sísmica AWD é necessário realizar outros en-saios, porém em litologias distintas, caracterizadas por idades diferentes.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) o financiamento concedido através do projeto “NEFITAG – Movimentos Sísmi-cos intensos e efeitos locais na Região do vale Inferior do Tejo” - “PTDC/CTE-GIX/102245/2008” e do projeto ATESTA (Active Tectonics and Earthqua-ke Scenarios for the Lower Tagus Valley – PTDC/

CTE-GIX/099540/2008). Agradecem ainda aos colaboradores Rui Oliveira, João Casacão e ao Óscar Lopez pela cooperação na aquisição dos da-dos no campo.

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associação portuguesa de geólogos 21geonovas n.º 27: 21 a 25, 2014

Petrografia das rochas metassedimentares e metaígneas na envolvente e nos roof pendants do Complexo Plutónico de Santa Eulália

C. Cruz*, M. A. Ribeiro, H. C. B. Martins & H. Sant’Ovaia

Universidade do Porto, DGAOT, CGUP, R. Campo Alegre, 4169-007 Porto, Portugal;

[email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; *autora correspondente.

vimento esquerdo da Falha da Messejana, cuja orientação é NE-SW.

Segundo Oliveira etal. (1991), os principais se-tores litoestratigráficos da Zona de Ossa Morena (ZOM), correspondem à Faixa Blastomilonítica, ao setor de Alter do Chão-Elvas, ao setor de Es-tremoz-Barrancos, ao setor de Montemor-Ficalho e ao setor do Maciço de Beja. No estudo apresen-tado serão considerados: a Faixa Blastomiloníti-ca, equivalente ao que em Pereira etal.(2013), foi designada como Zona de Cisalhamento Coimbra-

Introdução

A área envolvente do Complexo Plutónico de Santa Eulália (CPSE) é bastante complexa e diversificada do ponto de vista litoestratigráfico e estrutural. Na figura 1 estão representadas as unidades litológicas e litoestratigráficas, assim como os acidentes principais, nomeadamente a Falha de Assumar e o Cavalgamento de Alter do Chão, ambas de orientação NW-SE. A SE do CPSE estes acidentes são deslocados pelo mo-

Resumo

O Complexo Plutónico de Santa Eulália (CPSE) é um corpo granítico tardi-varisco situado na parte norte da Zona Ossa Morena do Maciço Ibérico, discordante da estruturação NW-SE. As rochas do encaixante/roofpendants do CPSE englobam unidades metaígneas e metassedimentares datadas, desde o Proterozoico Superior até ao Paleozoico. O efeito térmico por contacto induzido pelo CPSE é evidente apenas nos roofpendants. Nos litótipos que envolvem a intrusão granítica ocorre metamorfismo de baixo grau, com preservação de características mineralógicas, texturais e estruturais dos respetivos protólitos sedimentares, metassedimentares ou ígneos. Excetua-se uma faixa, a N e NE do CPSE, com paragéneses e texturas de metamorfismo térmico, que não estarão relacionadas com a intrusão do CPSE, mas sim com magmatismo prévio e com anisotropias estruturais.

A ocorrência de efeitos térmicos, somente a teto do maciço, poderá ser consequência da conjugação de diversos factos interrelacionados: maior volume de massa granítica; efeito térmico por advecção de fluidos; maior período de tempo de prevalência de condições térmicas elevadas.

Palavras-chave: Petrografia; Rochas metassedimentares; Rochas metaígneas; Metamorfismo térmico de contacto.

Abstract

TheSantaEuláliaPlutonicComplex(SEPC)isalate-variscangraniticbodylocatedinthenorthernpartofOssaMorenaZoneoftheIberianMassifandcross-cutstheNW-SEstructures.Thehostrocks/roofpendantsofSEPCarecomposedofmeta-igneousandmetasedimentaryunits,fromUpperPro-terozoictoPaleozoicages.ThethermaleffectinducedbytheSEPCisrestrictedtotheroofpendants.IntheSPEChostrocks,alowgrademetamorphismwithpreservationofmineralogical,texturalandstructuralfeaturesofthesedimentary,metasedimentaryandigneousprotoliths,isshown.InthelithologiesofNandNEofSPECtherearethermalmetamorphismtexturesandparagenesis,whicharenotrelatedtotheintrusionoftheSEPCbuttopreviousmagmatismandstructuralanisotropies.

Theoccurrenceofthermaleffectsrestrictedtotheplutonroofmaybecausedbyacombinationofseveralinterrelatedfactors:highervolumeofgraniticmass,thermaleffectbyadvectionoffluids,longerperiodofprevalenceofelevatedthermalconditions.

Keywords: Petrography;Metasedimentaryrocks;Meta-igneousrocks;Contactmetamorphism.

22 Petrografia das rochas metassedimentares e metaígneas na envolvente e nos roof pendants do Complexo Plutónico de Santa Eulália

-Córdova (ZCCC) e o seu bordo meridional, o setor de Alter do Chão-Elvas e ainda, embora com menos detalhe, o setor Estremoz-Barrancos (Araújo etal., 2013).

O CPSE é um plutão granítico calco-alcalino de duas micas tardi-varisco. Ocupa uma área de cerca de 400 km2 e é constituído por duas fácies distin-tas: a fácies G0, mais externa, de coloração rósea e textura granular média a grosseira; e uma fácies central, designada por G1, de cor cinzenta e textura de granularidade média (Sant’Ovaia et al., 2012). As duas fácies são praticamente contemporâneas de idade Rb/Sr de 290 Ma (Pinto, 1984). O CPSE corta a estrutura regional envolvente, sendo o seu carácter discordante mais evidente no bordo norte e no bordo sul.

Este estudo baseou-se em 18 locais de amostra-gem (Fig. 1), onde foram recolhidos litótipos que se distribuem pelas litologias das unidades litológi-cas e litoestratigráficas envolventes eroofpendants. A

partir destas amostras foram efetuadas 23 lâminas delgadas para análise petrográfica detalhada.

Importa referir que os roof pendants consis-tem de fragmentos litológicos de materiais en-caixantes, localizados a teto do maciço graní-tico, que conservam a estrutura regional das rochas envolventes. No CPSE, os roof pendants ocorrem com alguma expressão cartográfica, so-bretudo no setor oeste do maciço granítico, a SW do cavalgamento de Alter do Chão (Fig. 1).

Unidades metassedimentares e metaígneas

No setor a NE do Cavalgamento de Alter do Chão, mais precisamente na Zona de Cisalhamen-to Coimbra-Córdova (segmento do NE Alentejano e bordo meridional da ZCCC), afloram unidades litoestratigráficas de baixo a alto grau metamórfico. As amostras estudadas nas unidades litoestratigrá-ficas de baixo grau metamórfico, nomeadamen-

Figura1 – Esboço do mapa geológico da região onde afloram o CPSE e as unidades litológicas e litoestratigráficas que contêm as rochas encaixantes analisadas e se localizam as estações de amostragem (elaborado com base em: Carta Geo-

lógica de Portugal à escala 1:500 000; Araújo et al., 2013 e Pereira etal., 2013).Figure1–GeologicalmapoftheSECPandhostrockswithlocationofthesamplingstations(createdbasedon:GeologicalmapofPortugalscale

1:500000;Araújoet al.,2013andPereiraet al.,2013).

associação portuguesa de geólogos 23C. Cruz, M. A. Ribeiro, H. C. B. Martins & H. Sant’Ovaia

te na Série Negra (amostra SE 6a) e na Formação Carbonatada (amostras SE 6b, SE 6c e ASM JD1), são compostas, respetivamente, por rochas metas-sedimentares siliciclásticas, calcários dolomíticos e mármores. Adjacente às litologias de baixo grau metamórfico já citadas, na faixa a NE do CPSE, afloram rochas de alto grau metamórfico, forte-mente tectonizadas. Na faixa de alto grau foram estudadas amostras de litologias pelíticas (amostra ASM 110) e anfibolitos (amostra ASM 111) da Série Negra, assim como rochas peralcalinas (amostras SE 13a e SE 13b).

A SW do Cavalgamento de Alter do Chão estão representados cartograficamente dois setores, de-signados de Alter do Chão-Elvas e de Estremoz--Barrancos. No setor de Alter do Chão-Elvas, ocorre uma sequência metassedimentar do Câm-brico com intercalações de rochas meta-vulcânicas ácidas e básicas, que inclui rochas metassedimenta-res conglomeráticas, quartzo-pelíticas e carbonata-das. A sucessão câmbrica inicia-se por conglome-rados e arcoses, ao que se sobrepõe, uma espessa sequência carbonatada (Formação Carbonatada) e uma unidade quartzo-pelítica mais a topo, designa-da de Formação de Vila Boim (Oliveiraetal., 1991),

No bordo SW do setor Alter do Chão-Elvas, sobre a Formação de Vila Boim, aflora o Comple-xo Vulcano-sedimentar de Terrugem e sobre este a Formação de Fatuquedo. O Complexo Vulcano--sedimentar de Terrugem é constituído por xistos e arenitos com intercalações de vulcanitos félsicos, basaltos e rochas peralcalinas. Já a Formação de Fa-tuquedo é composta por alternâncias de xistos cin-zentos, psamitos e grauvaques. No Setor Estremoz--Barrancos faremos referência apenas à Formação de Barrancos, aflorante no limite NE deste setor, no contacto com o Setor de Alter do Chão-Elvas. Esta formação é constituída por xistos intercalados com psamitos a topo (Araújoetal., 2013). A Forma-ção Carbonatada e a Formação de Vila Boim estão bem representadas nos roof pendants, onde todas as amostras estudadas apresentam características pró-prias de metamorfismo térmico, independente-mente do seu tipo litológico. Nos roofpendants foram estudados ao microscópico petrográfico anfibolitos que integram a unidade Série Negra (amostra ASM 125), mármores da Formação Carbonatada (SE 4 e ASM 124) e vulcanitos básicos (SE 2), anfiboli-tos (ASM 26) e corneanas pelíticas da sucessão que constitui a da Formação de Vila Boim (amostras ASM 116 e ASM J58).

Das litologias que envolvem a parte S e SW do CPSE, foram estudadas amostras da Formação Carbonatada, como anfibolitos (SE 9a), már-

mores (SE 9b) e vulcanitos ácidos (SE 9c), assim como rochas detríticas da Formação de Vila Boim (vaque quártzico - ASM 123). Relativamente ao Complexo Vulcano-sedimentar de Terrugem fo-ram estudadas rochas meta-básicas (basaltos anfi-bolitizados – Af 3.0) e quartzo-filitos (ASM 27) e da Formação de Fatuquedo uma amostra de rocha metaígnea (ASM 120).

No setor Estremoz-Barrancos, foi estudado um filito (Af 6.0) pertencente à Formação de Barrancos.

Efeitos metamórficos do CPSE

Na área envolvente do CPSE, localizada a SW do cavalgamento de Alter do Chão-Elvas, os litótipos dos metassedimentos encaixantes não apresentam efeitos térmicos de contacto, mesmo a curta dis-tância da intrusão granítica. Pelo contrário, nas amostras dos roofpendants, só representados a SW do referido cavalgamento, o efeito térmico a topo do maciço é marcado por paragéneses e texturas me-tamórficas/metassomáticas, quer em rochas pelíti-cas quer em litótipos carbonatados. Nas primeiras rochas, o efeito da temperatura manifesta-se por uma paragénese com silimanite-fibrolítica e poli-gonização do quartzo, da calcite e da plagioclase, assim como pela presença de aspetos de fusão par-cial pontual (pool de quartzo, envolvendo plagio-clase de textura metamórfica; Fig. 2). Nas rochas carbonatadas, o efeito térmico é observado pelo aparecimento de uma paragénese caracterizada por

Figura2 – Pool de quartzo a envolver a plagioclase de textura metamórfica indiciando fusão parcial (amostra

ASM 116).Figure2–Quartzpoolinvolvingtheplagioclasewithmetamorphic

texture,indicatingpartialmelting(sampleASM116).

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Figura5 – Filonete de afinidade granítica paralelo à foliação (amostra ASM 27).

Figure5–Like-graniteveinparalleltothefoliation(sampleASM27).

Figura6 – Mármore impuro sem efeitos térmicos/metassomáticos com presença de moscovite detrítica

(amostra ASM JD1).Figure6–Marblewithoutthermal/metasomaticeffectswithdetritical

muscovite(sampleASMJD1).

Figura4 – Quartzo com lamelas de deformação associa-do a quartzo poligonal (amostra ASM 110).

Figure4–Quartzwithdeformationlamellaeassociatedtopolygonalquartz(sampleASM110).

vesuvianite, tremolite e epídoto, para além de in-tensa poligonização da calcite (Fig. 3).

No setor localizado a NE do Cavalgamento de Alter do Chão-Elvas observaram-se litologias com efeitos de blastese pós-deformação, mas não rela-cionadas exclusivamente com a intrusão do plutão de Santa Eulália. Assim, admite-se que os efei-tos térmicos reconhecidos nas amostras ASM 110 e ASM 111, evidenciados pela presença de quartzo com lamelas de deformação, ribbons de quartzo e alguma poligonização (Fig. 4), poderão estar re-lacionados com a proximidade ao granito de duas micas, intrusivo na Série Negra a norte do CPSE e que constitui o alinhamento Barquete-Bedanais--Aguilhão, ou a uma eventual circulação de fluidos hidrotermais ao longo da falha de Assumar.

Tanto a este como a oeste do CPSE, ocorrem unidades litoestratigráficas com filitos e quartzo--filitos, pertencentes à zona da clorite, da fácies metamórfica dos xistos verdes, porém sem evidên-cia de recristalização mineral por efeitos térmicos de contacto, mesmo quando localizadas a poucos metros da intrusão granítica. Na amostra ASM 27 (quartzo-filito da Formação de Terrugem) foram observados microfilonetes (2 mm de espessura) com afinidade granítica, compostos por quartzo, biotite, clorite e apatite, concordantes com a estra-tificação/foliação, porém sem evidências de efeitos térmicos nos seus bordos (Fig. 5).

No sector ESE do CPSE, os filitos da Série Negra (amostra SE 6a) apresentam matriz quartzo-mosco-vítica de granularidade fina, com blastese incipiente

Figura3 – Poligonização evidenciada pelo ponto triplo entre cristais de calcite (amostra SE 4).

Figure3–Polygonizationdisplayedbythetriplepointbetweencalcitecrystals(sampleSE4).

Petrografia das rochas metassedimentares e metaígneas na envolvente e nos roof pendants do Complexo Plutónico de Santa Eulália

associação portuguesa de geólogos 25

de biotite transversa ou mimética sobre a foliação. Quanto aos litótipos de calcários dolomíticos e mármores da Formação Carbonatada (amostras SE 6b, SE 6c e ASM JD1) que afloram junto ao contacto ESE do CPSE, também não mostram qualquer efeito térmico pós-tectónico, dado que apresentam granularidade fina, com vestígios de moscovite detrítica e sem evidências de poligoni-zação dos carbonatos (Fig. 6).

Os resultados obtidos dos estudos petrográficos efetuados, demonstram que os efeitos térmicos da intrusão do CPSE, apenas estão evidenciados nos roof pendants. Este efeito termometamórfico ocor-reu apenas a teto do maciço, onde os materiais encaixantes foram sujeitos a temperaturas eleva-das durante mais tempo, comparativamente com as rochas junto dos bordos externos do CPSE que contactam com as diversas litologias envolventes. Por outro lado, outra justificação para o mesmo efeito corresponde à razão de volume entre rocha granítica e litótipos encaixantes ser muito alta nos roofpendants. Contudo, a predominância da advec-ção de fluidos hidrotermais a teto do CPSE po-deria ter sido outro dos fatores potenciadores dos efeitos térmicos nos roofpendants. O baixo grau me-tamórfico prévio das rochas encaixantes (fácies dos xistos verdes), nomeadamente nas litologias pelíti-cas e carbonatadas, indica que o CPSE se instalou num nível crustal relativamente alto, implicando necessariamente um choque térmico. No entan-to, a ausência de efeitos térmicos laterais sugere arrefecimento rápido e baixa razão volume rocha granítica/rocha encaixante junto à fronteira do maciço do CPSE.

Conclusão

O estudo petrográfico de litologias com idên-ticos protólitos no encaixante e roofpendants pôs em evidência que os efeitos térmicos da intrusão do CPSE, apenas foram expressivos e significativos nos roofpendants.

De facto, a análise petrográfica mostrou que, quer no bordo este quer no bordo oeste do CPSE, as rochas encaixantes não evidenciaram um efeito térmico profundo e significativo, pelo que muitas das amostras metaígneas ainda preservam as suas características ígneas iniciais, no que diz respeito à sua textura e composição mineralógica. Por outro lado, nos roofpendants presentes no setor ocidental do CPSE, o efeito térmico está bem evidenciado, sobretudo pela poligonização do quartzo, da calcite e/ou da plagioclase, e pontualmente por indícios de fusão parcial em rochas pelíticas.

Importa referir que na faixa localizada a NE do CPSE, ocorrem litologias pelíticas e metabásicas que fazem parte da Série Negra, caracterizadas por texturas de blastese e/ou recristalização mineral, indicadoras de metamorfismo térmico, relaciona-das com a intrusão do granito de duas micas (ali-nhamento Barquete-Bedanais-Aguilhão) ou even-tualmente com circulação de fluidos hidrotermais ao longo da caixa da Falha de Assumar.

Este trabalho permite concluir que, a ocorrên-cia de efeitos térmicos, somente a teto do maciço, poderá ser consequência da conjugação de diversos factos que se podem interrelacionar entre si, no-meadamente o maior volume de massa granítica, o efeito térmico por advecção de fluidos e o maior período de tempo de prevalência em condições tér-micas elevadas.

Agradecimentos

Este trabalho foi financiado pelo projeto: PTDC/CTE-GIX/099447/2008 (FCT-Portugal, COMPETE/FEDER). Agradecemos os comentá-rios pertinentes do revisor.

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associação portuguesa de geólogos 27geonovas n.º 27: 27 a 32, 2014

Migmatitos e granitos: o exemplo do granito do Pedregal

J. A. Ferreira*, H. C. B. Martins & M. A. Ribeiro

Universidade do Porto, DGAOT, CGUP, R. Campo Alegre, 4169-007 Porto, Portugal;

[email protected]; [email protected]; [email protected]; *autora correspondente.

encontram preservadas (paleossoma), e a fração de melt (neossoma) é baixa; pelo contrário nos diate-xitos, o neossoma é dominante, as estruturas ante-riores à fusão parcial estão ausentes no neossoma e, podem ser substituídas por estruturas de fluxo sin-anatéticas (schlieren e foliações magmáticas) ou por neossoma isotrópico.

Associada à evolução geodinâmica das cadeias orogénicas fanerozoicas ocorreu importante fusão parcial da crosta continental, como é evidenciado pela génese e exumação de maciços migmatíticos e graníticos, no geral intimamente relacionados. A caracterização petrogenética de rochas graníti-

Introdução

As rochas migmatíticas são rochas formadas em condições de ultrametamorfismo, na transição do domínio metamórfico para o domínio magmático. A caracterização destas rochas suporta-se fundamentalmente em observações de campo, à escala macro e mesoscópica. Os migmatitos desig-nam-se por metatexitos ou diatexitos consoante a fração de melt gerada durante os processos de fu-são parcial. Segundo Sawyer (2008), os metatexi-tos são rochas heterogéneas à escala macroscópica, onde as estruturas anteriores à fusão parcial se

Resumo

A caracterização petrogenética de rochas graníticas anatéticas no Orógeno Varisco e a sua associação espacial com domos térmicos gnaisso-migmatíticos tem vindo a ser defendida e demonstrada de uma forma mais integrada, con-jugando dados geológicos, geoquímicos, isotópicos e geocronológicos. Data da década de 50/60 do século passado a referência à existência de rochas migmatíticas associadas ao “Granito do Porto”.

Neste trabalho são apresentados dados preliminares relativos ao Granito do Pedregal e às rochas gnaisso-migma-títicas e metassedimentares que ocorrem na sua envolvente. O granito do Pedregal é um granitoide de duas micas, de grão fino a médio, com abundantes nódulos biotíticos (1 a 2 cm) com foliação interna e encraves xenolíticos. O granito contacta com rochas gnaisso-migmatíticas metatexíticas e com xistos estaurolíticos englobados no “Complexo Xisto--Grauváquico”. Localmente este contacto é marcado por brecha ígnea cuja matriz é o granito do Pedregal, envolvendo clastos das litologias encaixantes, o que confirma o caráter intrusivo do granitoide nas rochas envolventes.

Palavras-Chave: migmatitos; granitos; Porto; Pedregal.

Abstract

ThepetrogeneticcharacterizationofanatecticgranitesinVariscanOrogenandtheirspatialassociationwithgneissic-migmatitethermaldomeshasbeenadvocatedanddemonstratedinamoreintegratedwaycombininggeological,geochemical,isotopicandgeochronologicaldata.Migmatiticrocksassociatedwiththe“GranitodoPorto”arereferredsince50s/60softhepastcentury.

Inthiswork,preliminarydatafortheGranitePedregalandforthegneissic-migmatiticandmetasedimentaryhostrocksarepresented.ThePedregalgra-niteisatwomica,finetomediumgrainedrock,withabundantbiotitenodules(1-2cm)withinternalfoliationandxenolithicenclaves.Thegranitecontactswithmetatexitic,gneiss-migmatiterocksandstaurolite-schistsbelongingto“SchistandGreywackeComplex”.LocallythiscontactismarkedbyanigneousbrecciawhosematrixisthePedregalgranitewithclastsofhostlithologies,whichconfirmstheintrusivecharacterofthisgranitoidinthesurroundingrocks.

Keywords: migmatites;granites;Porto;Pedregal.

28 Migmatitos e granitos: o exemplo do granito do Pedregal

ticos com rochas de natureza gnaisso-migmatítica no Orógeno Varisco no território nacional (Holtz & Barbey, 1991; Moita et al., 2009; Santos et al., 2010; Valle Aguado etal., 2010; Ribeiro etal., 2011; Areias etal., 2012). No referente ao setor NW de Portugal, na década de 50/60 do século XX , Car-los Teixeira referiu a existência de rochas migmatí-ticas associadas ao “Granito do Porto” (Carríngton da Costa & Teixeira, 1957). Nas últimas décadas, os granitos que afloram no bordo oriental do maciço do Porto foram descritos e datados tendo em conta a sua relação com as fases de deformação varisca, nomeadamente a D2 e a D3 (Pinto, 1984; Pinto etal., 1987; Almeida, 2001). Na área adjacente ao maciço granítico do Porto foi recentemente refe-rida a presença de rochas de natureza diatexítica e metatexítica Ribeiro etal. (2011), Areias etal. (2012) e Ferreira (2013).

Caso de estudo: Granito do Pedregal

O corpo granítico em estudo tem cerca de 3 km2 e aflora alongado na direção NW-SE, na margem direita do rio Douro junto à localidade do Pedre-gal (Fig. 1). O Granito do Pedregal (Ribeiro etal., 2008) corresponde a um granitoide de duas mi-

cas em contexto orogénico e a sua relação espacial com domos térmicos gnaisso-migmatíticos e zonas de cisalhamento à escala crustal (Brown & Solar, 1998) tem vindo a ser defendida e demonstrada de uma forma mais integrada conjugando dados geo-lógicos, geoquímicos, isotópicos e geocronológi-cos, nomeadamente nos Apalaches (Maine, USA) (Solar & Brown, 2001), no Maciço Armoricano (St. Malo, França) (Milorde etal., 2001) e no Ma-ciço da Boémia (Áustria) (Vanderhaeghe, 2009). A existência destes domos térmicos terá produzido uma relação de causa-efeito entre o magmatismo e o metamorfismo sin-orogénicos. A associação de elevados gradientes térmicos laterais isócronos, condicionados mais por processos de advecção do que pela condutividade térmica crustal está de-monstrada neste tipo de contextos orogénicos (Lux etal., 1986; Lancaster etal., 2008). Esta advecção poderá estar relacionada com ascensão de fluidos, de melts ou de magmas.

No Maciço Ibérico alguns trabalhos têm vin-do a ser desenvolvidos sobre esta mesma temática (Viruete etal., 2000; Alcock etal., 2009; Díez Fer-nández etal., 2012). Desde a década de 80 do sé-culo passado são vários os trabalhos publicados que põem em evidência a associação de granitos anaté-

Figura1 – Mapa esquemático da área em estudo, baseado na carta geológica 1/50 000 do Porto (Carrington da Costa & Teixeira, 1957).

Figure1–Geologicalsketchmapofthestudiedarea,basedonthe1/50000PortoGeologicalMap(CarringtondaCosta&Teixeira,1957).

associação portuguesa de geólogos 29J. A. Ferreira, H. C. B. Martins & M. A. Ribeiro

O corpo granítico intruiu micaxistos com es-taurolite pertencentes à unidade “Complexo Xisto--Grauváquico” (CXG), designada mais recentemen-te por Supergrupo Dúrico-Beirão. Os micaxistos apresentam uma foliação principal de direção NW--SE a NNW-SSE. O contacto entre os micaxistos e a massa granitoide é intrusivo, irregular e brusco, sendo localmente marcado por brecha ígnea.

A cortar o granitoide e as rochas metassedi-mentares encaixantes já descritas ocorrem lentí-

cas, geralmente de grão fino a médio, isogranular do ponto de vista textural (Fig. 2a), e sem orienta-ção preferencial. Localmente, o granito apresenta nódulos biotíticos, de dimensão entre 1 a 2 cm e uma foliação interna de orientação NE-SW a E-W (Fig. 2b), discordante relativamente à estrutura do encaixante. Observaram-se ainda no seu interior encraves de rochas metassedimentares (Fig. 2c), às vezes, com orientação preferencial bem definida NW-SE (Ferreira etal., 2013a, 2013b).

Figura2– Aspetos do granitoide do Pedregal: (a) textura isogranular de grão fino; (b) nódulo biotítico; (c) encrave de rocha metassedimentar.

Figure2–Pedregalgranitefeatures:(a)finegrainisogranulartexture;(b)biotiticnodule;(c)metasedimentarxenoliths.

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As inclusões de zircão e monazite estão presentes em ambos os tipos de moscovite. A plagioclase é es-sencialmente albítica e as maclas polissintéticas, ca-racterísticas deste mineral, encontram-se mascara-das pela presença de moscovitização. A plagioclase é mais abundante que o feldspato potássico, porém este último apresenta maiores dimensões. A biotite é frequentemente subédrica e ocorre sob a forma de cristais alongados, com pequenas inclusões de zircão, e quando evidencia cloritização são visíveis agulhas de rútilo (Fig. 5). Pontualmente, pequenos cristais de biotite anédrica estão associados à primeira geração de moscovite.

O estudo geoquímico revela que o granito do Pedregal é peraluminoso (parâmetro A/CNK varia entre 1,18 e 1,62), com uma assinatura magnesiana e alcalina a alcalino-cálcica. Os resultados geoquí-micos mostram baixos teores SiO2 (65 a 69 wt%) e elevado teor de Zr (389 a 435 ppm). Os valores de Zr poderão ser explicados pela abundância de inclusões de zircão na moscovite e na biotite. Este mineral também ocorre disperso na rocha. O gra-nito tem elevado teor em terras raras, com um perfil ETRL (elementos de terras raras leves) não fracio-nado entre o La e o Nd, um forte fracionamento entre o Nd e Eu, e uma anomalia negativa em Eu bem pronunciada. O fracionamento das terras raras pesadas (Tb-Lu) é semelhante ao granito de duas micas do maciço do Porto (Almeida, 2001). A falta de fracionamento das terras raras leves poderá ser explicada pela presença de monazite (Bea, 1996).

culas e veios pegmatíticos, no geral concordantes com a foliação regional.

Na zona marginal do Rio Douro, no contacto com o granito do Pedregal, ocorrem rochas ban-dadas de carácter gnaisso-migmatítico passando la-teralmente a micaxistos estaurolíticos. O bandado das rochas gnaissso-migmatíticas é marcado por leitos quartzo-feldspáticos predominantes e sem foliação, alternando com níveis micáceos subordi-nados com foliação evidente.

A associação mineral do granito do Pedregal consiste em quartzo + biotite + plagioclase + felds-pato-K + zircão + apatite + monazite + rútilo ± sili-manite ± alanite, e moscovite secundária. Associada à moscovite secundária e à silimanite ocorre herci-nite rica em Zn.

O granito do Pedregal tem uma textura holocris-talina de grão fino a médio; os limites intergranu-lares evidenciam reequilíbrios texturais no estado sólido, mais consistente com uma textura meta-mórfica do que com uma textura tipicamente ígnea.

O quartzo tem tendência subédrica a anédrica, e quando incluso em outros minerais assume uma forma globular. Frequentemente, os cristais de quartzo mostram inclusões de silimanite e agulhas de rútilo. A moscovite é abundante na rocha e marcada pela presença de duas gerações: uma, moscovite su-bédrica precoce com bordos simplectíticos, com in-tercrescimento e inclusões de quartzo (Fig. 3) e outra moscovite mais tardia, com birrefringência anó-mala e inclusões de silimanite e hercinite (Fig. 4).

Figura3 –Microfotografia (NX): moscovite com inclu-sões de zircão e halos pleocróicos associados, e inclu-

sões de quartzo.Figure3–Photomicrograph(NX):muscovitewithzirconpleocroic

halosandquartzinclusions.

Figura4 – Microfotografia (NX): moscovite com inclu-sões de silimanite fibrolítica.

Figure4–Photomicrograph(NX):muscovitewithfibroliticsillimanite.

Migmatitos e granitos: o exemplo do granito do Pedregal

associação portuguesa de geólogos 31

Considerações finais

O Granito do Pedregal ocorre espacialmente associado a outros corpos de granito, nomeada-mente o granito de Gondomar, granito de Fânze-res e granito do Porto (Fig. 1). No seu encaixan-te verifica-se um forte gradiente térmico lateral, marcado por uma zonalidade metamórfica muito condensada, desde a zona da clorite à zona da es-taurolite-granada, atingindo mesmo a silimani-te. A associação de diferentes fácies mineralógicas graníticas à zonalidade metamórfica condensada, e a presença local de rochas de natureza gnaisso--migmatítica, favorece a hipótese da existência de uma relação de causa-efeito entre processos meta-mórficos e magmáticos.

O estudo preliminar do Granito do Pedregal colocou em evidência as seguintes características:

(i) o carácter intrusivo em rochas de natureza gnaisso-migmatítica e em xistos estaurolíticos, lo-calmente com brechas ígneas no contacto;

(ii) estrutura/textura peculiares, nomeadamen-te a abundância de pequenos nódulos biotíticos de orientação preferencial NE-SW a E-W, os reequi-líbrios texturais no estado sólido e o aspeto meta-mórfico e corroído da biotite;

(iii) granito essencialmente moscovítico com abundante predominância de plagioclase sobre o feldspato potássico;

(iv) elevado teor em Zr e ETRL, baixo teor em SiO2 e carácter peraluminoso.

As características descritas anteriormente, a sua contextualização no bordo de um maciço ígneo sin-tectónico (Maciço do Porto), e a sua associação espacial a pequenos corpos graníticos de distinta composição, textura e estrutura (granito de Gon-domar; granito de Fânzeres; granito de Ermesin-de; veios pegmatíticos) remete para a possibilidade de este granitoide corresponder a uma rocha dia-texítica relativamente isotrópica e rica em restitos.

O elevado gradiente metamórfico na área adja-cente e a relação cronológica de sincronismo entre migmatização/magmatismo e o pico das condições térmicas do metamorfismo varisco, com paragéne-ses com estaurolite ante a sin-cinemática e pós-ci-nemática relativamente a D3 (Ribeiro etal., 2008) põem em evidência a importância da advecção crustal de magmas; melts e fluidos; como processo de transferência térmica sin-orogénica, gerador de um elevado gradiente.

Em contextos orogénicos, onde ocorre associa-ção de granitos-migmatitos-micaxistos, as relações de campo, as microestruturas e texturas, as paragé-neses minerais e a cronologia relativa, embora pos-sam ser complementadas por estudos geoquímicos, mineralógicos e isotrópicos, são absolutamente re-levantes e indispensáveis no estudo e para a com-preensão dos processos de fusão crustal.

Agradecimentos

Este trabalho, realizado no âmbito de uma dis-sertação de mestrado, foi financiado pelo Pest-OE/CTE/UI0039/2011 e integra-se nas atividades do grupo GEOREMAT-CGUP.

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Figure5–Photomicrograph(NX):elongatedcrystalofbiotitewithsmallzirconinclusions.

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Migmatitos e granitos: o exemplo do granito do Pedregal

associação portuguesa de geólogos 33geonovas n.º 27: 33 a 38, 2014

Novos dados cartográficos e estruturais da Faixa MetamórficaPorto-Viseu (região da Foz do Sousa E do Porto)

P. A. Ferreira1,*, M. A. Ribeiro1, P. Castro2 & J. F. Rodrigues3

1Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, DGAOT, Rua do Campo Alegre, 687, 4169-007 Porto;

[email protected]; [email protected]; 2Laboratório Nacional de Energia e Geologia, Rua da Amieira, 4466-901 S. Mamede de Infesta; [email protected];

3Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, Rua Dr. Roberto Frias, s/n, 4200-465 Porto; [email protected];

*autora correspondente.

Introdução

A área de estudo localiza-se entre a foz do rio Sousa e a barragem de Crestuma-Lever, no concelho de Gondomar, a E do Porto. Está cartografada como pertencente ao “Complexo Xisto-Grauváquico” (CXG), também designado por Supergrupo Dúrico--Beirão, englobando o setor NE da Carta Geológi-ca 13-A (Espinho) e o setor NW da Carta Geológica 13-B (Castelo de Paiva), ambas na escala 1/50 000.

A área localiza-se na Zona Centro Ibérica (ZCI), a W e próximo do anticlinal de Valongo, que cor-responde a uma megaestrutura regional da 1ª fase varisca constituída, essencialmente, por metassedi-mentos de baixo a muito baixo grau metamórfico,

cujo núcleo compreende rochas pertencentes ao CXG, sobrepostas por unidades do Ordovícico, Si-lúrico, Devónico e Carbónico. Em contraste com o Anticlinal de Valongo, a área em estudo apresen-ta mais alto grau metamórfico e deformação mais intensa. Com efeito, as litologias que afloram na área de estudo, são parte integrante de megaestru-tura orientada NW-SE, entre Porto e Viseu, rece-bendo, por isso, a designação de Faixa Metamórfica Porto-Viseu (FMPV) (Schermerhorn, 1956; Oen, 1970; Reavy, 1987, 1989; Valle Aguado, 1992; Valle Aguado etal., 1993; Fernandes etal., 1998). A área de estudo, com cerca de 10 Km2, corresponde a uma transversal à FMPV, a SE do Porto. Vários dos autores estabeleceram relação de sincronismo entre

Resumo

Na região da Foz do Sousa são individualizadas três unidades tectonometamórficas, designadas, de W para E, por unidades A, B e C. A variação do grau metamórfico é mais acentuada entre a unidade A e B, com passagem de micaxis-tos estaurolíticos a filitos biotíticos, respetivamente. Na unidade C, as litologias são de baixo grau metamórfico: filitos e grauvaques. A deformação polifásica varisca que atua sobre as três unidades é mais acentuada em A e B evidenciando 2ª fase de carácter penetrativo. Já na unidade C é a 1ª fase que apresenta carácter penetrativo. Salienta-se, em todas as unidades, o carácter fortemente não-coaxial de D2, através da observação mesoscópica de estruturas rotacionais com movimento de topo para E.

Palavras-chave: Faixa Metamórfica Porto-Viseu; Cartografia Geológica; Metamorfismo; Deformação não-coaxial.

Abstract

Inarecentdetailedgeologicalmappingofthe“FozdoSousa”riverarea,threetectonometamorphicunitshavebeenrecognized,roughlywithanNStrending.Theywereinformallydesignated,fromthewesttotheeast,asunitsA,BandC.Thereisaclearevidenceofadecreaseinmetamorphicgradefromwesttoeast.SuchmetamorphicdecreaseissteeperbetweenunitsAandB,decreasingfromstaurolite-biotitemicaschiststobiotite-bearingmuscovitemicaschists.TheCunithasatypicallylowmetamorphicgrade.Thesedimentaryprotolith(phyllitesandgreywackes)isrecognizedwithwell-preservedsedimentaryfeatures.

Polyphasicvariscandeformationaffectstheoverallensemble.ItismoreintenseinunitsAandB,withatypicalpenetrative2ndphase(D2).During

regionalmetamorphismtheunitCwasaffectedbyapenetrativeD1variscanphase.Inallunitsdeformationismarkedlynon-coaxialduringtheD

2event,

asitisevidentintherotationalstructuresofmesoscopicdimension,showingsenseofmovementtotheeast(toptoeast).

Keywords: Porto-Viseumetamorphiclineament;geologicalmapping;metamorphism;non-coaxialdeformation.

34

lização cartográfica de unidades com base em crité-rios litológicos, metamórficos e estruturais.

Unidades cartografadas

No decorrer dos trabalhos de cartografia geoló-gica, foram confirmadas características metamór-ficas e estruturais que validam a divisão da área de estudo em diversas unidades cartográficas. São elas, a variação do grau de metamorfismo de W para E, tal como representado nas cartas geológicas, e a variação da intensidade de deformação no mesmo sentido. Assim, tendo por base estas duas carac-terísticas, optou-se pela divisão da região em três unidades, designadas respetivamente por A, B e C, de W para E (Fig. 1).

Figura1 – Mapa e perfis geológicos da área em estudo.Figure1–Geologicalmapandcrosssectionsofthestudyarea.

o pico das condições metamórficas, a deformação e o magmatismo sin-orogénico na ZCI, em eixos de orientação NW-SE, de que é exemplo a FMPV (Oen, 1970; Ribeiro etal., 2008).

As notícias explicativas das Cartas Geológicas 13-A (Espinho) e 13-B (Castelo de Paiva) à escala 1/50 000, distinguiram “séries metamórficas deri-vadas” com base no critério do grau metamórfico, variando entre micaxistos a W e xistos e grauvaques a E, bem como conglomerados com intensidades de deformação distintas. Para além dos metassedi-mentos do CXG, afloram na área depósitos de ter-raços fluviais do Plio-plistocénico (P).

Tendo por base o conhecimento geológico da área e do seu contexto regional, o objetivo do pre-sente estudo centrou-se na tentativa de individua-

Novos dados cartográficos e estruturais da Faixa Metamórfica Porto-Viseu

associação portuguesa de geólogos 35P. A. Ferreira, M. A. Ribeiro, P. Castro &, J. F. Rodrigues

Figura2 – A e B: Porfiroblastos de estaurolite contornados pela foliação principal, com geometria indicando movi-mento com topo para E.

Figure2–Stauroliteporphyroblastssurroundedbythemainfoliation,withgeometryindicatingtoptoEast.

Unidade A

A unidade A, localizada no setor mais a W da área de estudo, corresponde à fácies metamórfica de mais alto grau e de maior intensidade de de-formação. É composta, essencialmente, por mi-caxistos estaurolíticos, embora na parte oriental, predominem faixas com micaxistos biotíticos. A designação de ambas as litologias advém de se ob-servarem abundantes porfiroblastos de estaurolite e biotite. A passagem de uma litologia para a outra ocorre pela redução da abundância dos cristais de estaurolite e da granularidade da rocha, em parti-cular das estaurolites, no sentido E, bem como pela abundância de porfiroblastos de biotite.

Pontualmente, ocorrem intercalações meno-res de outras litologias, nomeadamente quartzitos impuros muito deformados, e metaconglomera-dos. Os metaconglomerados ocorrem em extensas faixas por toda a unidade e apresentam granula-ridade e fabrics diversos. A faixa de metaconglo-merados mais a W corresponde a metaconglome-rados clasto-suportados, compostos por clastos de quartzo e quartzito muito alongados, relativa-mente às dimensões da secção transversal (tecto-nitos do tipo L). Alguns destes clastos atingem 10 cm de comprimento. Os metaconglomerados das faixas mais a E apresentam, em geral, clastos de formas mais achatadas e de tamanho mais redu-zido (tectonitos do tipo SL), mas com a mesma composição litológica, com predominância de quartzo e quartzito.

A deformação polifásica varisca que afetou a área de estudo é mais intensa na unidade descrita, do que nas unidades B e C. Com base em relações de transposição geométrica de foliações, é possível registar a ocorrência de três fases de deformação na unidade A. A estratificação (S0) observa-se nos níveis de rocha quartzítica alinhados paralelamente a S2. A foliação S1 é preservada em microlithons e do-bras intrafoliais limitadas por S2, sendo esta a fo-liação mais penetrativa. É ainda observada ligeira crenulação de comprimento de onda centimétrico a métrico que afeta S2 e que corresponde à última fase de deformação D3.

A D2 corresponde a fase muito importante, quer devido ao carácter penetrativo, quer pelas indica-ções de uma cinemática fortemente não-coaxial. Salienta-se a ocorrência de lineação mineral se-gundo a máxima inclinação do plano da foliação S2 e a dissimetria do fabric tectónico. Segundo a dire-ção dessa lineação, o alongamento dos elementos estruturais, designadamente de corpos pré-D2, é muito evidente, ao contrário do que se passa numa direção normal à lineação mineral. A foliação principal em torno dos porfiroblastos de estauro-lite apresenta geometria indicadora de sentido de movimento de topo para E (Fig. 2).

Podem ser observadas dobras isoclinais em fi-lonetes de quartzo metamórfico e em níveis de quartzito, cujos eixos têm orientação próxima da lineação mineral (Lmin), o que sugere reorientação das estruturas lineares durante D2. A comparação da projeção dos dados estruturais correspondentes

36 Novos dados cartográficos e estruturais da Faixa Metamórfica Porto-Viseu

às medições da foliação S2, dos eixos de D2 e o eixo maior das estaurolites e dos metaconglomerados, revela relações geométricas entre todos, o que sig-nifica que estas estruturas foram fortemente reo-rientadas pela atuação de D2 (Fig. 3).

Unidade B

A E da unidade A, ocorrem litologias de menor grau metamórfico. Na unidade B, afloram essen-cialmente filitos biotíticos com intercalações de quarztovaques e metaconglomerados.

Os filitos da unidade B distinguem-se dos filitos de baixo grau (da unidade C) devido à ocorrência de porfiroblastos de biotite com geometrias seme-lhantes às que se observavam nos cristais de estau-rolite da unidade anteriormente descrita, porém de menor dimensão.

Os metaconglomerados são do tipo clasto--suportados com clastos de quartzo e quartzi-to. Apresentam-se com clastos individuais mais achatados e menos alongados que os da unidade

anterior (tectonitos do tipo SL), definindo um fabric planar nítido.

As três fases de deformação identificadas na uni-dade A, estão representadas também na B, com idên-ticas geometrias. A fase D2 é penetrativa e apresenta uma orientação média semelhante à da unidade A (Fig. 4) e deforma as poucas estruturas pré-existentes visíveis. Estas estruturas correspondem, essencial-mente, a porfiroblastos de biotite deformados e con-tornados por S2, observados à escala macroscópica e confirmados na microescala. O estudo petrográfico permitiu ainda verificar que alguns dos porfiroblas-tos de biotite estão deformados por D2, e frequen-temente cloritizados nas fraturas e nos bordos, in-dicando retrogradação das condições metamórficas.

As biotites cisalhadas confirmam o comporta-mento não-coaxial de D2. De facto, os metassedi-mentos apresentam um fabric assimétrico, bem evi-denciado pela comparação petrográfica de lâminas com diferentes orientações relativamente aos ele-mentos estruturais (corte A paralelo à lineação e corte B perpendicular à lineação).

Figura3 – Estereogramas relativos à Unidade A: A – Foliação principal S2; B- Lineação mineral sobre

S2; C- Eixos maiores dos cristais de estaurolite; D – Eixos maiores dos clastos dos metaconglomerados.

Figure3–StereoplotsconcerningUnitA:A-MainfoliationS2;B-MinerallineationonS2;C-Majoraxesofstaurolitecrystals;

D-Majoraxesofclastsinthemetaconglomerates.

Figura4 – Estereograma da foliação principal S2 na unidade B.

Figure4–StereoplotofthemainfoliationS2intheBunit.

associação portuguesa de geólogos 37

Unidade C

A unidade C corresponde à unidade posiciona-da mais a E da área de estudo. Aqui afloram litolo-gias de baixo a muito baixo grau metamórfico, no-meadamente metagrauvaques, filitos, metarenitos e metargilitos, por vezes ferruginosos, bem como vários níveis de metaconglomerados.

Os metaconglomerados desta unidade apre-sentam diversidade litológica, quer em termos de razão clastos/matriz, quer em termos de de-formação. Ocorrem metaconglomerados clasto suportados com clastos de formas achatadas se-melhantes aos da unidade B (tipo SL) e níveis de conglomerados com imbricação sedimentar de clastos. Com efeito, o baixo grau metamórfico das litologias permite a preservação de algumas estruturas sedimentares. Para além da referida imbricação de clastos, nos metaconglomerados foram também observadas figuras indicadoras de polaridade sedimentar, de que são exemplo as fendas de dissecação.

Nesta unidade a deformação é menos intensa, comparativamente com as unidades localizadas mais a W. A deformação polifásica que afetou os metassedi-mentos desta sucessão, está representada por estrutu-ras relativas apenas a duas fases de deformação, sendo a fase D1 de carácter penetrativo onde S1 está paraleliza-do com S0 (Fig. 5A e B). Os clastos dos conglomerados apresentam deformação muito variável (Fig. 5C). A fase D2 está representada pela crenulação de S1 (pouco frequente), que exibe carácter progressivo e rotacional e afeta também filonetes paralelos a S1. O sentido da rotação do plano axial indica, tal como nos casos das unidades A e B, movimento com topo para E.

Conclusões

Apesar da reduzida dimensão da área em estudo, é possível observar a variação de grau metamórfico desde micaxistos estaurolíticos na unidade A, até às rochas de baixo a muito baixo grau metamórfico, metagrauvaques e filitos, na unidade C. A suces-são de minerais índice desde a estaurolite, biotite e clorite, parece remeter para a hipótese do gradien-te geotérmico apontado pelos diversos autores, em estudos levados a cabo na zona adjacente (Fernan-des etal., 1998; Ribeiro etal.,2008) e na região de Viseu (Oen, 1970; Reavy, 1987, 1989; Valle Agua-do et al. 1993). Na verdade, também a ocorrência de níveis de metaconglomerados em todas as uni-dades remete para a homogeneização estratigráfica da área de trabalho, levando os autores das cartas geológicas (e.g. Teixeira etal.,1962; Medeiros etal., 1964) a englobar todo o setor numa única unidade litostratigráfica, pertencente ao CXG, embora com diferentes graus de metamorfismo.

Porém, os dados estruturais revelaram uma de-formação fortemente não-coaxial que afetou as três unidades definidas neste trabalho, ainda que com maior intensidade nas unidades A e B. A ocorrên-cias destas evidências, coloca a hipótese da ocor-rência de cisalhamentos discretos de escala e im-portância ainda por definir.

Agradecimentos

Este trabalho foi desenvolvido no âmbito da dissertação Mestrado em Geomateriais e Recur-sos Geológicos (FCUP/UA) efetuada pela 1ª au-tora. Esta agradece ao Doutor Carlos Meireles, do LNEG, todo o apoio, interesse e opiniões formu-ladas que contribuíram para o esclarecimento de algumas questões. Aos dois revisores pelas suges-tões e correções apresentadas, que contribuíram para aperfeiçoar este trabalho.

P. A. Ferreira, M. A. Ribeiro, P. Castro &, J. F. Rodrigues

Figura5 – Estereogramas relativos à unidade C: A - Estratificação, S0; B – Foliação principal, S1; C- Eixos

maiores dos clastos dos conglomerados.Figure5–StereoplotsconcerningCunit:A–Stratification,S0;B–

MainfoliationS1;C-Majoraxesofclastsintheconglomerates.

38 Novos dados cartográficos e estruturais da Faixa Metamórfica Porto-Viseu

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associação portuguesa de geólogos 39geonovas n.º 27: 39 a 46, 2014

Caracterização de terraços marinhos entre Cascais e o Cabo da Roca, com recurso a elementos cartográficos e de detecção remota.

Implicações Neotectónicas

D. Duarte, K. Volochay, R. Magalhães, S. Amaro & J. Cabral*

Universidade de Lisboa, Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências, Campo Grande, 1749-016 Lisboa;

[email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected];

*autor correspondente.

calcários compactos e margosos do Jurássico Su-perior, conforme explicitado na Carta Geológica de Portugal à escala 1:50 000 Folha 34-C Cascais, (IGM, 2001; Ramalho etal., 2001). Toda a região sofreu deformação, devida principalmente à insta-lação do maciço intrusivo de Sintra durante o Cre-tácico Superior, (Kullberg etal., 2006), gerando-se um sinclinal anelar que bordeja o maciço. Conse-quentemente, a estrutura dominante na área em estudo corresponde a um sinclinal assimétrico ver-gente para S, cuja zona axial se situa entre a praia do Guincho e a praia da Crismina, com direcção próxima de E-W. Reflectindo a vergência mencio-nada, o flanco setentrional, mergulhante para sul, apresenta-se mais inclinado que o flanco meridio-nal, que mergulha para norte. A inclinação das ca-

1. Introdução

Na área costeira entre Cascais e o Cabo da Roca (a oeste de Lisboa, Portugal) observam-se indí-cios da presença de terraços marinhos escalonados a diferentes altitudes. O objectivo deste trabalho, realizado no âmbito da Disciplina de Projecto da Licenciatura em Geologia da Faculdade de Ciên-cias de Lisboa, e como tal, de carácter preliminar, foi a identificação e caracterização de alguns desses terraços com base na análise de características geo-morfológicas e sedimentares indicadoras de antigas linhas de costa e plataformas de abrasão marinha nesta região (Fig. 1).

Na região estudada afloram, maioritariamente, calcários e alguns arenitos do Cretácico Inferior e

Resumo

Na região litoral entre Cascais e a serra de Sintra a topografia evidencia diversos níveis de terraços marinhos escalo-nados a diferentes altitudes. Neste trabalho, de carácter preliminar, pretende-se identificar alguns desses terraços, de-terminar as cotas dos respectivos rebordos internos e correlacioná-los com uma curva eustática global de modo a poder avaliar as taxas de levantamento que caracterizam este litoral. Da análise dos dados e correlação com a curva eustática global obtêm-se taxas de levantamento de cerca de 0,03 a 0,1 mm.ano-1 no período correspondente à idade dos terra-ços, embora com elevada incerteza devido à fraca precisão na determinação da cota dos respectivos rebordos internos, à incerteza inerente à curva eustática utilizada e à idade dos terraços identificados. Estes valores são compatíveis com taxas de levantamento previamente estimadas para o território continental português no Plio-Quaternário.

Palavras-chave: Terraços marinhos; curva eustática; taxas de levantamento neotectónico; Cascais.

Abstract

InthecoastalareabetweenCascaisandSintrathemorphologyindicatesthepresenceofseverallevelsofmarineterraces.Theaimofthisworkwastoidentifysomeoftheseterraces,determinetheelevationoftheirinneredgesandcorrelatethemwithaglobaleustaticsealevelcurveinordertoevaluatetheupliftratesthatcharacterizethisregion.Fromthedataanalysisandcorrelationwiththeeustaticglobalcurve,anupliftrateoftheorderof0.03to0.1mm/yearwasobtained,thoughwithhighuncertaintyduetothepoorcharacterizationoftheelevationoftheinneredges,theuncertaintyinherenttotheeustaticcurvethatwasused,andtheuncertaintyintheterracesage.ThesevaluesarecoherentwithupliftratespreviouslyestimatedforthePortuguesemainlandinthePlio-Quaternary.

Keywords: Marineterraces;eustaticsealevel;neotectonicupliftrates;Cascais.

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madas calcárias cretácicas neste flanco reduz-se pro-gressivamente para sul acabando por inverter-se o sentido do mergulho, que passa a ser muito suave nesta direcção. Esta estrutura pouco inclinada para sul favorece o desenvolvimento de uma topografia aplanada próxima de uma morfologia estrutural, conhecida por plataforma do Cabo Raso ou, mais genericamente, por plataforma de Cascais. As uni-dades do Jurássico afloram apenas no flanco N do sinclinal periférico, que margina o maciço intrusivo de Sintra.

O principal critério utilizado para a identi-ficação dos vários terraços marinhos foi o reco-nhecimento de áreas aplanadas de fraco declive, compreendidas entre zonas com incremento signi-ficativo de inclinação, tanto quanto possível cor-roborado pela presença de sedimentos marinhos costeiros preservados nesses elementos aplana-dos. Esta metodologia baseou-se, essencialmente, em análise morfológica sobre cartografia à escala 1:25 000 (Folha 429 – Cascais; IGeoE), cartogra-fia detalhada em formato digital, com equidistância de 1 m, e imagens de detecção remota (GoogleEarth e fotografia aérea), recorrendo-se a ferramentas SIG para esta análise, nomeadamente na execução de

perfis topográficos. O estudo sobre as bases carto-gráficas e de detecção remota foram complementa-dos por reconhecimentos de campo.

2. Identificação de terraços

Para facilitar a descrição e interpretação dos da-dos, a área em estudo foi dividida em duas zonas com morfologias algo distintas: Zona Norte, do sopé da serra de Sintra até à praia do Guincho, com relevo mais acentuado e escalonamento de formas mais nítido, e Zona Sul, da praia do Guincho até a E do Cabo Raso, com relevo mais suave e escalona-mento de formas menos evidente (Fig. 1).

Salienta-se que a metodologia utilizada e os dados recolhidos estão afectados por incertezas significativas, devidas, essencialmente, ao facto das evidências morfológicas estarem mascaradas pela erosão posterior e/ou sedimentação de ma-teriais de cobertura (eólica e/ou coluvial), e ao facto dos instrumentos utilizados para o posicio-namento no terreno – GPS portátil, terem uma incerteza intrínseca, particularmente no que re-fere à altimetria. O posicionamento horizontal teve um erro de 3 m em todas as estações, sendo

Figura1 – Localização da zona de estudo (a sombreado; adaptado de imagem GoogleEarth), no litoral oeste e noroeste da região de Cascais. As áreas assinaladas a vermelho correspondem à divisão em Zona Norte e Zona Sul, efectuada para

facilitar a descrição das observações.Figure1–Locationofthestudyzone(shadedarea;adaptedfromGoogleEarthimage),onthewestandnorthwestcoastofCascaisregion.Asubdivision

inNorthandSouthZones,foreasiercharacterization,isshown.

Caracterização de terraços marinhos entre Cascais e o Cabo da Roca

associação portuguesa de geólogos 41D. Duarte, K. Volochay, R. Magalhães, S. Amaro & J. Cabral

o erro no posicionamento vertical (altitude) su-perior àquele valor.

Na figura 2, adaptada de uma imagem GoogleEarthda área estudada em que se inseriram curvas de nível equidistantes de 5 m, indica-se a localização de esta-ções referenciadas seguidamente, bem como a loca-lização de perfis topográficos realizados sobre a cor-respondente base cartográfica digital (equidistância de 1 m (Fig. 3), com o objectivo de suportar a iden-tificação dos diferentes terraços marinhos (T1 a T4).

2.1 Zona Norte

As observações realizadas no terreno, em locais onde foram reconhecidas características morfológicas e/ou registo sedimentar correlativo, complementadas pela análise de gabinete efectuada sobre os mapas to-pográficos, a fotografia aérea em visão estereoscópica e as imagens GoogleEarth, permitiram diferenciar di-

Figura3– Perfis topográficos da área estudada (locali-zação na figura 2) realizados a partir de curvas de nível digitais com equidistância de 1 m; nos perfis assina-

lam-se os terraços marinhos intersectados.Figure3–Topographicprofilesofthestudyarea(locationinfigure2)constructedfromdigitalcartographydatawith1mcontourinterval;the

intersectedmarineterracesarereferencedintheprofiles.

Figura2 – Imagem BingMaps da área estudada, com curvas de nível equidistantes de 5 m; assinala-se ainda a localização de estações referenciadas no texto (E1 a E7), o traçado de perfis topográficos realizados sobre

a correspondente base cartográfica digital e os terraços marinhos identificados (T1 a T4).

Figure2–BingMapsimageofthestudyareawithinsertedcontourlines(5minterval);thelocationsofthesitesreferencedinthetext(E1to

E7),theprofilesconstructedfromthedigitalcartographydata(Profile1to5)andthemarineterracesthatwereidentified(T1toT4)areshown.

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versos terraços marinhos. Estes foram agrupados em 4 níveis de acordo com as cotas definidas para os res-pectivos rebordos internos, de T1 a T4.

O terraço T1 (mais antigo) está escassamente representado, tendo sido identificado apenas em duas áreas muito restritas, com o rebordo interno à cota de ~40 m. A identificação no terreno baseou--se no reconhecimento de estreita zona de super-fície rochosa aplanada limitada por um aumento brusco de declive a este (rebordo interno), e que passa a oeste (no sentido da linha de costa) a uma superfície a cotas um pouco inferiores, com vestí-gios de sedimentos marinhos costeiros (essencial-mente calhaus rolados dispersos sobre o substrato calcário jurássico) (estações E3 e E4, Fig. 2).

O terraço T2 está melhor representado, existin-do diferentes aspectos que suportam a sua identifi-cação, nomeadamente a morfologia aplanada talha-da no substrato calcário e a presença de sedimentos arenosos e de cascalheira de calhaus rolados, típi-cos de praia, subjacentes a coluviões, observados na zona das estações E1 e E2 (Fig. 4). Em estudos anteriores realizados no local da estação E1, a uma altitude de aproximadamente 35 m, foram reco-lhidas amostras de sedimento arenoso para datação por OSL (Optically Stimulated Luminescence). Segundo comunicação pessoal de Cunha (2013), o método

aplicado em grãos de quartzo saturou a cerca de 100 ka, pelo que os sedimentos terão uma idade mínima correspondente àquele valor.

Verificou-se que o rebordo interno do terraço T2 apresenta pequenas variações de cota nas áreas onde se identificou, pelo que se assume um valor médio para a altitude. Atendendo a que a estação E1 se localiza, inequivocamente, muito próximo do rebordo interno do terraço, considera-se que este se encontra a cota de aproximadamente 35 m.

Como se referiu atrás acerca da caracterização do terraço T1, ligeira quebra de declive e a ocor-rência de sedimentos de praia no local da estação E4 (Fig. 2) suportam a presença do terraço T2 nes-ta zona, escassamente embutido no terraço T1.

O terraço T3 encontra-se relativamente bem preservado a sul do anterior e é facilmente identi-ficado na morfologia, uma vez que, tanto no terre-no, como na informação cartográfica e de detecção remota, se observa uma vasta área aplanada limitada por um incremento brusco de declive a este, cor-respondente a uma vertente íngreme que limita in-teriormente a aplanação. Embora o respectivo re-bordo interno não esteja marcado por uma quebra de declive nítida, as observações de campo indicam que este se situa a uma altitude de cerca de 26 a 28 m, tomando-se o segundo valor como referência.

Figura4 – Talude na arriba expondo sedimentos de praia correlativos do terraço marinho T2 (depósitos com calhaus rolados e areia), assentando numa plataforma de abrasão talhada em formações calcárias jurássicas, a uma cota de

cerca de 30 m, com coluviões sobrejacentes.Figure4–OutcropatthetopofthepresentseacliffshowingbeachsedimentscorrelativeoftheT2marineterrace(roundedpebblesandsand)laying

overanabrasionplatformcutinJurassiclimestoneataheightofapproximately30m,andcoveredbycolluvialdeposits.

Caracterização de terraços marinhos entre Cascais e o Cabo da Roca

associação portuguesa de geólogos 43

No que respeita ao rebordo externo do terraço T3, verificou-se uma elevada indeterminação no seu posicionamento, consequência da presença de outro terraço, T4, embutido no anterior, a cotas inferiores, mas cujo rebordo interno se mostrou difícil de determinar, estimando-se que se situa a uma cota de ~20 m. Assim, a análise morfológica efectuada sugere a ocorrência nesta região de um terraço T4 abaixo do terraço T3, embora a deli-mitação dos respectivos rebordos interno e externo se tenha mostrado muito imprecisa. Os principais aspectos a favor são a presença de vestígios de se-dimentos marinhos costeiros (calhaus rolados) na estação E5 (Fig. 2) e, a sul desta estação, uma que-bra de declive evidenciada nos perfis 3 e 4 (Fig. 3) que suporta o ligeiro rebaixamento topográfico re-conhecível no terreno.

2.2 Zona Sul

A sul da praia do Guincho a análise morfoló-gica, nomeadamente a identificação de variações de declive que permitissem diferenciar os terraços marinhos, mostrou-se mais difícil devido à região apresentar morfologia mais aplanada. Esta deve--se, aparentemente, à presença de uma superfície de erosão anterior, disposta em rampa inclinando suavemente para o litoral, pelo que, quando se for-maram os terraços, o declive já seria reduzido não sendo geradas rupturas de pendor abruptas. A co-bertura de dunas móveis e consolidadas que ocorre nesta região também dificulta a identificação dos terraços marinhos, cobrindo o substrato mesozói-co bem como a morfologia nele talhada.

Os estudos realizados a sul da praia do Guincho permitiram identificar dois terraços marinhos com rebordos internos aproximadamente a 20 m e 28 m. Sendo estas cotas semelhantes às dos rebordos inter-nos dos terraços T4 e T3 identificados a norte, as-sumiu-se corresponderem aos mesmos níveis. Nes-ta área é possível cartografar estes terraços de modo quase contínuo, desde a zona da Guia, a oeste de Cascais, pela plataforma do Cabo Raso até à praia do Guincho, dispondo-se com um traçado sub-paralelo à actual linha de costa em toda a sua extensão (Fig. 2).

O terraço T3 encontra-se em grande parte co-berto pelos corpos dunares já referidos e é de di-fícil reconhecimento por ocorrer em terrenos pri-vados, pelo que o estudo foi realizado com muitas limitações. A presença de um caminho pedonal na área do complexo dunar da Crismina (estação E6, Fig. 2) permitiu observar uma pequena variação de declive, a cerca de 28 m de altitude, que se consi-derou corresponder ao rebordo interno deste ter-raço, corroborando a sua localização e cota.

Em toda a restante área entre a Cresmina e a duna de Oitavos, o rebordo interno do terraço T3 foi inferido com auxílio da cartografia disponível e das fotografias aéreas, para além de observações no terreno, embora à distância, sendo a sua ocorrên-cia comprovada por mudanças de declive notadas no perfil topográfico 5 (Fig. 3).

O terraço T4 é bem evidente na morfologia, correspondendo a uma plataforma de erosão bem preservada, nomeadamente a sul do Cabo Raso, onde é reconhecido a truncar as camadas de calcá-rio cretácico, que se encontram suavemente incli-nadas para SW (Fig. 5). Esta plataforma apresenta-

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Figura5 – Aspecto da plataforma de abrasão correspondente ao terraço marinho T4 truncando as camadas de calcário cretácico suavemente inclinadas para SW, a sul do Cabo Raso.

Figure5–ViewoftheabrasionplatformofthemarineterraceT4truncatingthecretaceouslimestonebedsdippinggentlytowardsSW,southofCaboRaso.

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-se progressivamente mais degradada em direcção à linha de costa, onde é interrompida pela arriba actual. Nas zonas em que está mais degradada pela erosão apresenta um lapiás razoavelmente desen-volvido, caracterizado por locais em que o rebai-xamento da plataforma se processa por remoção progressiva de camadas calcárias, pouco inclinadas, desenvolvendo-se, assim, áreas planas a cotas mais baixas que correspondem a superfícies estruturais.

A duna consolidada de Oitavos (E7, Fig. 2) as-senta, parcialmente, na superfície dos terraços T3 e T4. Monge Soares etal. (2006) e Prudêncio etal.(2007) dataram os sedimentos que formam esta duna consolidada, assim como um paleossolo de-senvolvido num nível arenoso maciço que se situa por baixo desta. Para essas datações Prudêncio etal. (2007) utilizaram o método de OSL sobre grãos de quartzo, tendo obtido valores compreendidos entre aproximadamente 15 000 anos, para o sedimento correspondente ao topo do paleossolo, e aproxi-madamente 12 000 anos para os níveis superiores da duna. Aqueles autores, bem como Monge Soa-res etal.(2006), dataram matéria orgânica contida no paleossolo, e conchas de gastrópodes do género Helix disseminadas no sedimento, pelo método do radiocarbono (C14), obtendo idades significativa-mente mais antigas, de cerca de 30 000 anos.

Assim, considerando a idade do paleossolo e dos gastrópodes presentes no nível arenoso subjacente à duna de Oitavos, que se sobrepõe à plataforma talhada nos calcários cretácicos presente na área, podemos inferir que a morfologia de erosão sobre a qual a duna assenta, correspondente às plataformas dos terraços T3 e T4 (Fig. 2), tem mais de 30 000 anos. Imediatamente a sul dos actuais vestígios pre-servados da duna de Oitavos, o substrato calcário da plataforma T4 apresenta-se marcado por ventifac-tos, provavelmente correlativos da fase de intensa deflação que precedeu o soterramento pelo corpo dunar.

A identificação do rebordo interno do terraço T4, localizado a uma cota de cerca de 20 m, mos-trou-se difícil, fundamentando-se em observações de campo, para além da análise cartográfica e de fotointerpretação, reconhecendo-se no perfil 5 (Fig. 3). Na área da Guia (extremo SE da região de estudo), encontram-se preservados escassos teste-munhos do terraço T4, que se apresentam aqui cla-ramente embutido numa morfologia mais elevada.

3. Discussão e conclusão

Os terraços identificados na região estudada são do tipo erosivo, não tendo sido detectados indícios

de elementos construtivos (como estruturas bio-génicas edificadas), verificando-se a presença, in-discutível, de superfícies de erosão sobre as quais se encontra apenas cobertura dunar, maioritaria-mente na Zona Sul, ou coluvionar sobrejacente a escassos testemunhos de sedimentos de praia, na Zona Norte. As plataformas que caracterizam cada terraço estão, de modo geral, mal preservadas, uma vez que os terraços se encontram bastante erodi-dos, exceptuando-se a plataforma correspondente ao terraço T4, melhor conservada nas imediações do Cabo Raso.

Determinada a cota dos rebordos internos de cada terraço, procurou-se estabelecer correlação entre estes terraços e níveis eustáticos do mar cor-relativos de “estádios isotópicos marinhos” (MarineIsotopicStages–MIS), tomando-se como referência as curvas eustáticas e sua discussão expostas em Bin-tanja etal.,2005) e Siddall etal.,2007) (Fig. 6).

As plataformas formadas durante níveis do mar baixos (lowstands) são submersas devido à elevação eustática do nível do mar que acompanha a degla-ciação. Estas plataformas encontram-se expostas apenas em regiões de tectónica activa sujeitas a taxas de levantamento elevadas. A área estudada, loca-lizada no litoral oeste-ibérico, encontra-se numa situação intraplaca, em que as taxas de levantamen-to expectáveis são relativamente baixas. Os terraços marinhos identificados neste trabalho ter-se-ão desenvolvido, assim, em períodos de nível alto do mar (highstands).

O terraço T4, bem desenvolvido, a cotas mais baixas, é assumido como correspondendo ao último interglaciário MIS 5, possivelmente ao sub-estádio 5e, estimando-se que o respectivo nível médio do mar (n.m.m.) estaria um pouco acima do actual (4 a 6 m, Bintanja etal., 2005; Siddall et.al., 2007). Admite-se assim que o terraço T4 foi gerado a uma cota de cerca de +4 m durante o MIS 5e, cujo pico ocorreu aproximadamente há 120 ka, pelo que se calcula uma taxa de levantamento para esta área de cerca de 0,13 mm.a-1 [(20-4)/120], com intervalo de variação de 0,09 a 0,17 mm.a-1, considerando uma incerteza de ±2 m no nível eustático e de ±3 m na cota de 20 m do rebordo interno.

A correlação proposta entre o MIS 5e e o T4 é tomada como referência para os restantes terraços (mais antigos), que são correlacionados com os MIS anteriores correspondentes a períodos interglaciá-rios, nomeadamente o terraço T3 com o MIS 7, o T2 como MIS 9, e o T1 com o MIS 11 (Fig. 5). As respectivas idades e os correspondentes níveis eus-táticos são progressivamente mais incertos quanto mais antigos são os MIS. Os valores seguintes fun-

Caracterização de terraços marinhos entre Cascais e o Cabo da Roca

associação portuguesa de geólogos 45

damentam-se, essencialmente, no trabalho de sín-tese de Siddall etal.(2007) e devem ser considera-dos como valores estimados com elevada incerteza.

O MIS 7, com uma duração total de cerca de 40 ka, compreende três picos de nível alto do mar (highstands), designados respectivamente por 7a (201-193 ka; n.m.m. -10 m), 7c (220-212 ka; n.m.m. -5 m) e 7e (235-230 ka; n.m.m. -5 m). O MIS

9 apresenta um highstand principal correspondente ao sub-estádio 9c, que ocorreu há cerca de 330 ka (334-318 ka), em que o nível do mar terá estado próximo do nível actual (0 m), enquanto o MIS 11 corresponde a um highstand de idade compreendida entre cerca de 415 e 395 ka, em que o nível do mar terá estado, também, próximo do actual (0 m), em-bora a incerteza seja elevada (-10 m a +10 m).

Figura6 – Diagrama representando curvas eustáticas inferidas por diversos autores com base na variação da razão 18O/16O em conchas de foraminíferos preservadas em sedimentos marinhos. Assinalam-se as cotas dos terraços mari-nhos identificados na região estudada e a correlação proposta com highstands de diferentes MIS (adaptado da figura 7.1, Siddall etal., 2007). Os rectângulos a negro representam margens de incerteza nos valores dos níveis eustáticos e das

respectivas idades referidas em Siddall etal. (op.cit.) considerados no presente estudo.Figure6–Diagramshowingeustaticsea-levelestimatesfromavarietyofsources,basedonoceanicoxygenisotope(18O/16O)ratiosrecordedbycal-

careousforaminiferainmarinesediments(adaptedfromfigure7.1,Siddallet al.,2007).TheheightoftheinneredgesoftheterracesrecognizedinthepresentstudyandtheproposedcorrelationswithMIShighstandsareshown.Theblackrectanglesrepresenttheuncertaintiesintheeustaticsealevelsand

agesasreferredinSiddallet al.(op. cit.),whichwereconsideredinthisstudy.

D. Duarte, K. Volochay, R. Magalhães, S. Amaro & J. Cabral

46 Caracterização de terraços marinhos entre Cascais e o Cabo da Roca

Considerando as correlações propostas, e tendo em conta a incerteza associada às observações e esti-mativas efectuadas, bem como a incerteza subjacen-te às idades dos MIS e respectivos níveis eustáticos apresentados em Bintanja etal.(2005) e Siddall etal.(2007), propõe-se um modelo de levantamento crustal para a região do Guincho e Cascais a uma taxa de cerca de 0,03 mm.a-1 entre o MIS 11 e o MIS 7, que se acelera para um valor de 0,13 mm.a-1 nos últimos 230 ka (do MIS 7 à actualidade). As veloci-dades de levantamento inferidas correspondem aos declives das rectas assinaladas na figura 5.

O valor da velocidade de levantamento inferida para o período mais recente é compatível com taxas de levantamento já estimadas para o território con-tinental português no Plio-Quaternário (Cabral, 2012), o que suporta, de alguma forma, as corre-lações e idades aproximadas propostas, embora a taxa de levantamento obtida para o período do MIS 11 ao MIS 7 seja uma ordem de grandeza inferior ao valor médio da velocidade de levantamento pro-posto por Cabral (2012), de 0,2 a 0,3 mm.a-1 nos últimos cerca de 3 milhões de anos.

Considerando as taxas de levantamento pro-postas, pode inferir-se que a elaboração do terraço marinho correspondente ao MIS7 terá sido lon-ga e multifaseada. Deverá ter-se iniciado no sub--estádio 7e, sendo o terraço depois abandonado no lowstand correspondente ao sub-estádio 7d, voltan-do a ser sensivelmente reocupado (embutimento de apenas cerca de 2 m, ou inferior?) durante o highstand correspondente ao sub-estádio 7c. O ter-raço foi retrabalhado ao longo deste sub-estádio e também do sub-estádio 7a, que ocorrem quase em continuidade eustática ao longo de um período de cerca de 30 ka. O terraço foi abandonado pelo mar durante todo o MIS6, correspondente a um nível eustático baixo, voltando a ser aproximadamente reocupado durante o highstand correspondente ao sub-estádio 5e. Esta evolução multifaseada, poli-cíclica, poderá explicar a morfologia aplanada, dis-posta em rampa, que se observa na área litoral si-tuada aproximadamente entre a praia do Guincho e a duna de Oitavos/Guia, onde, como se referiu, se mostrou difícil definir o rebordo interno do terraço T4, ou seja, diferenciá-lo do terraço T3, constatando-se uma situação semelhante na zona a este daquela praia.

Como se referiu acima, o terraço inferior, T4, na generalidade talhado em unidades calcárias, ca-racteristicamente está mais degradado no sentido da arriba que define a actual linha de costa. A pla-taforma onde assenta o terraço T4 apresenta erosão por dissolução, desenvolvendo-se, neste caso, um

lapiás litoral, e/ou erosão mecânica, em que o re-baixamento erosivo progride em diversos locais por remoção de blocos de estratificação, gerando-se uma superfície estrutural que inclina suavemente para o quadrante SW ou S. No contexto desta to-pografia rebaixada, não se descarta a possibilidade de ocorrerem alguns testemunhos de um terraço erosivo embutido no nível T4, cuja identificação e caracterização implica estudos adicionais. A con-firmação da presença desses testemunhos (como a W do Forte da Crismina) implicará uma revisão da cronologia proposta neste trabalho para os di-ferentes terraços identificados, cuja idade, nesse caso, se encontrará subestimada.

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Este artigo encontra-se redigido segundo o antigo Acordo Ortográfico.

associação portuguesa de geólogos 47geonovas n.º 27: 47 a 56, 2014

Estruturação dos dados da Cartografia Geológica à luz da Diretiva INSPIRE

Proposta para futura implementação

A. Pereira*, G. Luís, P. Patinha & J. T. Oliveira

Laboratório Nacional de Energia e Geologia, I.P., Estrada da Portela, Bairro do Zambujal, Alfragide, Apartado 7586, 2720-866 Amadora;

[email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected];

*autora correspondente.

Resumo

Para promover a disponibilização e reutilização da informação espacial essencial na definição e avaliação de po-líticas ambientais e/ou de atividades ligadas à área ambiental, a Comissão Europeia fez aprovar a Diretiva INSPIRE a 14 de março de 2007, que fixou as regras gerais para o estabelecimento da Infraestrutura de Informação Espacial na Europa (Comissão Europeia, 2007). Neste âmbito, o acesso aos dados espaciais será, preferencialmente, efetuado através de uma rede de serviços implementada na Internet (e.g. pesquisa, visualização, descarregamento).

Embora a Diretiva INSPIRE não exija o levantamento de novos dados, obriga as autoridades públicas a cumprir com a implementação faseada dos modelos de dados dos temas dos seus anexos I, II e III. O Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG) contribui, de forma ativa, na resolução de múltiplos problemas ambientais, graças ao vasto espólio de dados que detém, de que se destacam os da cartografia geológica. Estes dados fazem parte do tema Geologia do anexo II da Diretiva INSPIRE, devendo o LNEG garantir a criação dos respetivos metadados, e a sua harmonização e dispo-nibilização. Futuramente, terá de passar a produzir em simultâneo a cartografia geológica e os respetivos metadados segundo procedimentos normalizados que a tornem interoperável a nível europeu.

A harmonização dos dados da cartografia geológica implica a adoção do modelo de dados geológicos da Diretiva INS-PIRE (INSPIRE GE), sendo para isso necessário reformular as atuais estruturas que suportam a sua gestão e disponibi-lização. O presente trabalho apresenta uma metodologia de implementação do INSPIRE GE na produção de cartografia geológica e sua integração no Sistema Nacional de Informação Geocientífica do LNEG, contribuindo para a estruturação e harmonização da futura base de dados (BD) institucional. A metodologia adotada consistiu na modelação de uma Geoda-tabasee respetiva aplicação à cartografia geológica da Antiforma do Rosário, da Faixa Piritosa Ibérica, tendo permitido veri-ficar a viabilidade na produção de cartografia geológica oficial e ainda definir novo fluxo de trabalho na produção de cartas temáticas. A título de exemplo descreve-se o processo utilizado para obter o mapa litológico da Antiforma do Rosário.

Palavras chave: LNEG;Cartografiageológica;DiretivaINSPIRE;harmonização;interoperabilidade.

Abstract

Inordertopromotetheavailabilityandreuseofspatialinformationessentialforthedefinitionandevaluationofenvironmentalpoliciesand/oractivitiesrelatedtotheenvironment,theEuropeanCommissiondidapprovetheINSPIREDirectiveonMarch14th,2007.ThisDirectivehasthepurposeofsettinggeneralrulesaimedattheestablishmentoftheInfrastructureforSpatialInformationinEurope.INSPIREDirectiveaimstoprovidetheusersaccesstospatialdatasetsthroughnetworkservices,typicallyviaInternet(e.g.discover,view,download).AlthoughINSPIREdoesnotrequirecollectionofnewspatialdataitobligespublicauthoritiestocomplywiththephasedimplementationofdatamodelsofthethemesasdescribedinannexesI,IIandIII.GeologicalmapdatasetsheldbytheNationalLaboratoryforEnergyandGeology(LNEG)playsanimportantroleintheresolutionofseveralenvironmentalissues.Thepresentworkdealsessentiallywithonetheme–Geology,asdescribedinannexIIoftheDirective.TocomplywiththeINSPIRE“obligations”LNEGmustproceedwiththecreationofmetadataand,inthenearfuture,harmonizethesedatasetssoastobecoherentlyandeasilyaccessedthroughtheInternet.HarmonizationinthiscontextmeansthetransformationofdatafromsourceschemasordatamodelstothetargetINSPIREdatamodels.ThisworkdescribestheuseoftheINSPIREGeologydatamodel(INSPIREGE)forcreatinganewgeologicaldatabase(Geodatabase),aimingatbuildingamoreefficient,interoperableandharmonizeddatamanagement.ThisGeodatabasehasbeensuccessfullytestedinLNEG’sgeologicalmapproductionprocesswithdatacollectedfromtheRosarioAntiform,ageologicstructurethatbelongstothePortuguesesectionoftheIberianPyriteBelt,aswellasincludinganewlydefinedautomatedworkflowforcreatingdifferenttypesofthematicmaps.AlithologicalmapconcerningtheRosárioAntiformisgivenasanexample.

Keywords: LNEG;Geologicalmapping;INSPIREDirective;harmonization;interoperability.

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1. Introducão

Os recentes avanços das tecnologias de infor-mação e comunicação e o aparecimento de ferra-mentas web como o GoogleEarth têm motivado uma mudança de atitude dos utilizadores de informação geocientífica. Hoje, já é possível aceder a grandes quantidades de informação no domínio das geo-ciências, bastando para isso uma ligação à Internet. Mas será fácil encontrá-la e combiná-la de forma coerente, com layers de geoinformação provenientes de variadas fontes? Mais, será possível partilhá-la entre vários utilizadores e aplicações? E obter re-sultados adequados ao objetivo em vista?

Estas questões de disponibilidade, qualidade, acessibilidade e partilha da informação espacial são comuns e sentidas a vários níveis da autoridade pública (Comissão Europeia, 2007). A Comissão Europeia, ciente da importância deste tipo de in-formação na sociedade, fez aprovar a Diretiva INS-PIRE (INfrastructure for SPatial InfoRmation in Europe), a 14 de março de 2007 (Comissão Euro-peia, 2007), que fixa as regras gerais para o esta-belecimento da Infraestrutura de Informação Geo-gráfica na Europa, promovendo a disponibilização de informação espacial (utilizável na formulação, implementação e avaliação de políticas ambientais). A sua entrada em vigor constituiu um marco ex-tremamente importante no campo da interopera-bilidade, ao obrigar os Estados Membros a gerirem e a disponibilizarem a informação de acordo com princípios e regras comuns, fomentando a partilha de dados harmonizados através de um conjunto de serviços de dados geográficos. Ao criar as condições necessárias ao desenvolvimento e implementação de uma plataforma distribuída por servidores eu-ropeus, para permitir a pesquisa e manuseamento da informação espacial via Internet, esta Diretiva desempenha ainda o papel fundamental de garantir o acesso dos utilizadores a este tipo de informação.

A Diretiva INSPIRE não requer a recolha de novos dados espaciais, cingindo-se apenas aos exis-tentes em formato digital, da responsabilidade das autoridades públicas e referentes a um conjunto de temas distribuídos por três anexos. O LNEG par-ticipa no anexo II, com o tema Geologia, e no ane-xo III com os temas Recursos Minerais, Recursos Energéticos e Zonas de Risco Natural. No presente trabalho irá apenas ser focado o tema da Geologia, tendo sido selecionado um caso de estudo - a An-tiforma do Rosário - que compreende uma área de aproximadamente 100 Km2 de cartografia geológi-ca situada numa das principais províncias metalo-génicas da Europa – a Faixa Piritosa Ibérica.

Os detalhes técnicos para a implementação da Diretiva INSPIRE são fornecidos sob a forma de regras de implementação, que tomam a forma de disposições legais, de cumprimento obrigatório por todos os Estados Membros, após consulta às instituições registadas no site da INSPIRE e aprova-ção pela Comissão Europeia. As disposições legais em vigor estabelecem as modalidades de aplicação da Diretiva INSPIRE em termos de: metadados; especificações de dados relativas aos temas do anexo I; serviços de rede; partilha de dados; monitoriza-ção e reporte.

A entrada em vigor das disposições legais rela-tivas às especificações de dados para os temas dos anexos II e III está prevista para finais de 2013, de-vendo o LNEG proceder à harmonização dos seus dados espaciais num futuro próximo (os novos da-dos até 2015 e os restantes até 2020). Após esta calendarização, os dados obtidos devem ser dispo-nibilizados no Geoportal INSPIRE, que pode ser acedido através do endereço http://inspire-geo-portal.ec.europa.eu/.

A elaboração das especificações da Diretiva INSPIRE para a Geologia (inclui modelo INS-PIRE GE) foi efetuada por um conjunto de es-pecialistas de diversos Serviços Geológicos euro-peus e empresas de relevo na área das geociências (públicas e privadas), com a participação de to-dos os interessados incluindo o público em geral (INSPIREThematicWorkingGroupGeology, 2013). Para fornecer dados de cartografia geológica harmo-nizada é necessário reformular as atuais estrutu-ras de acordo com o modelo de dados INSPIRE GE ou criar serviços de transformação dos dados existentes. A opção pela implementação de servi-ços de transformação não foi considerada pelos seguintes motivos:

• ser necessário reestruturar o atual modelo de gestão dos dados da cartografia geológica de forma a facilitar a sua reutilização;

• dificuldades em criar os automatismos necessá-rios à implementação dos serviços de transformação;

• inexistência de técnicos informáticos com o conhecimento necessário ao desenvolvimento e implementação destes serviços de transformação.

2. A Diretiva INSPIRE nas atividades do LNEG

O LNEG nomeou um grupo de trabalho, onde estão representadas todas as Unidades de Investiga-ção da área da Geologia, que tem trabalhado para cumprir as disposições legais em vigor. O seu plano de ação tem seguido uma abordagem por fases, em consonância com o esquema da figura 1.

Estruturação dos dados da Cartografia Geológica à luz da INSPIRE

associação portuguesa de geólogos 49A. Pereira, G. Luís, P. Patinha & J. T. Oliveira

A primeira fase deste plano de trabalhos con-sistiu em identificar, junto da Direção Geral do Território (DGT) (Ponto Nacional de Conta-to para a Diretiva INSPIRE), todos os conjun-tos de dados espaciais existentes no LNEG, que reúnem as condições adequadas para a aplicação da Diretiva INSPIRE, representados na tabela 1. É desejável que esta lista inclua já as novas car-

• Metadata• Discovery Service• Data Policies• Licensing Framework• Coordinating Structures• ...

• Geodetic Framework• Seamless data• Quality insurance• Certification• Data model• ...

• Catalog Services• View Service• Query Service• Object Access Service• Generalisation Services• Geo-Processing services• ...

Figura1 – Fases para a criação de uma Infraestrutura de Dados Espaciais (INSPIREArchitectureandStandardsWorkingGroup, 2002).Figure1–TowardsanInfrastructureforSpatialInformation(INSPIRE Architecture and Standards Working Group,2002).

Conjuntos de dados geográficos Serviços

Ane

xo I

I

II.4 Geologia Recursos HidrogeológicosCartas Hidrogeológicas de Portugal à escala 1:200 000Carta das Fontes e do Risco de Contaminação da Região de Entre-Douro-e-MinhoCartografia Geológica e TemáticaCarta Geológica de Portugal Continental à escala 1:2 000 000Carta Geológica de Portugal à escala 1:1 000 000Carta Geológica de Portugal à escala 1:500 000Cartas Geológicas de Portugal à escala 1:200 000Cartas Geológicas de Portugal à escala 1:50 000Carta Geológica da Região do Algarve à escala 1:100 000Carta Geológica Simplificada do Parque Arqueológico Vale do Côa à escala 1:80 000Carta Geológica do Parque de Natureza de Noudar (Herdade da Coitadinha - Barrancos) à escala 1:10 000Carta Geológica Simplificada do Parque Natural da Ria Formosa, Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António e Região Envolvente à escala 1:100 000Carta Geológica Simplificada do Parque Natural da Serra da Estrela à escala 1:75 000

Geoportal do LNEGCarta Geológica de Portugal à escala 1:500 000 (WMS)Carta Geológica de Portugal à escala 1:1 000 000 (WMS)Base de Dados dos Recursos Hidrogeológicos (WMS)

Ane

xo I

II

III.12 Zonas de risco naturalCarta Neotectónica de Portugal, à escala 1:1 000 000 Geoportal do LNEG

III.21 Recursos mineraisCartas de Ocorrências Minerais à escala 1:250 000Carta de Ocorrências Minerais de Portugal à escala 1:500 000Carta de Áreas de Exploração Mineira de Portugal à escala 1:500 000Sistema de Informação de Ocorrências e Recursos Minerais Portugueses

Geoportal do LNEGSistema de Informação de Ocorrências e Recursos Minerais Portugueses - SIORMINP (WMS)

Tabela1– Conjuntos de dados espaciais e serviços propostos pelo LNEG para a aplicação da Diretiva INSPIRE.Table1–SpatialdatasetsandservicespresentedbyLNEGforINSPIREDirectiveapplication.

tas geológicas publicadas nos últimos anos. Numa segunda fase procedeu-se à criação dos respetivos metadados, utilizando o software MIG (editor de Metadados de Informação Geográfica Nacional) e à sua publicação no SNIG - Sistema Nacional de Informação Geográfica.

A Diretiva INSPIRE obrigou ainda à reformula-ção do Sistema Nacional de Informação Geocien-

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3. Objetivo

A atual estrutura de armazenamento dos dados de cartografia geológica foi concebida essencial-mente para cumprir com a publicação de cartas em papel, não tendo existido por isso necessidade de definição de políticas concretas para a normaliza-ção e disponibilização online. Para cada carta geo-lógica é criada uma File Geodatabase, independente das restantes, que é normalmente reproduzida (em parte ou no seu todo) sempre que há necessidade de a reutilizar. Esta forma de gerir os dados acarreta problemas de integridade, comprometendo a segu-rança e dificultando o desenvolvimento de sistemas de informação consistentes.

A abordagem usada neste trabalho difere da atual em termos de filosofia e estruturação dos dados, uma vez que reporta o desenvolvimento de uma nova Geodatabase para toda a cartografia geoló-gica (que cumpre com as especificações de dados INSPIRE) e sua integração no Sistema Nacional de Informação Geocientífica do LNEG.

A opção pelo desenvolvimento desta Geodatabase tem as seguintes vantagens, relativamente ao mo-delo existente:

• contribui para a estruturação e implementação de uma infraestrutura única para armazenar os da-dos geológicos nacionais;

• contribui para a integridade dos dados; • facilita a obtenção de outros produtos deri-

vados da informação geológica de base, como por exemplo cartas litológicas e cronológicas;

• contribui para a harmonização dos dados geológicos nacionais, conforme as especificações INSPIRE, permitindo a sua interoperabilidade a nível europeu.

4. Metodologia

O facto de atualmente, a produção de cartogra-fia geológica no LNEG ser realizada com softwareArcGisDesktop, levou à opção pelo formato Geodatabase (formato de BD proprietário da ESRI).

O modelo de dados INSPIRE GE, disponível em http://inspire.jrc.ec.europa.eu/index.cfm/pageid /2/list/datamodels, serviu de base ao desenho da Geodatabase com o software Enterprise Architect e Perfil UML (Unified Modelling Language) para ArcGis da SparxSystems (Sparx Systems, 2012). Esta Geodatabase, re-presentada na figura 3, foi posteriormente im-portada para ArcGis e implementada em SQL Server2008, que é o Sistema de Gestão de Bases de Dados (SGBD) utilizado na disponibilização da informa-ção geocientífica do LNEG.

tífica do LNEG, de modo a satisfazer os requisi-tos de disponibilização da informação geográfica emanados pela Diretiva. Deste modo, foi criado o geoPortal do LNEG (Fig. 2) que é a infraestrutura de suporte à gestão e disponibilização integrada de dados espaciais na web. Nesta plataforma estão disponibilizados todos os metadados e serviços de dados espaciais institucionais, permitindo aos uti-lizadores pesquisar, visualizar e descarregar alguma da informação disponível. De referir ainda que esta aplicação foi totalmente desenvolvida no contexto da INSPIRE, encontrando-se assim em conformi-dade com os seus princípios e regras.

Com a recente aprovação das disposições le-gais relativas aos temas dos anexos II e III, a 21 de Outubro de 2013, estão criadas as condições para se proceder à fase de harmonização dos da-dos, que envolve pelo menos três níveis: estru-tura, semântica e representação. Neste contexto, este trabalho surge da necessidade de harmonizar as estruturas que suportam a produção de car-tografia geológica em conformidade com as es-pecificações INSPIRE da Geologia, disponíveis em http://inspire.jrc.ec.europa.eu/documents/Data_Specifications/INSPIRE_DataSpecifica-tion_GE_v3.0rc3.pdf.

A metodologia seguida consistiu no desenho de uma Geodatabase, com a finalidade de armazenar as entidades nucleares na produção de cartografia geológica, que depois de modelada foi testada no caso em estudo, o que permitiu aferir a sua viabi-lidade e ainda definir um novo fluxo de trabalho para a produção de cartas temáticas.

Estruturação dos dados da Cartografia Geológica à luz da INSPIRE

Figura2 – Página inicial do geoPortal do LNEG (http://geoportal.lneg.pt/).

Figure2–GeoportalLNEG’shomepage(http://geoportal.lneg.pt/).

associação portuguesa de geólogos 51

O sistema de referência de coordenadas adota-do foi o «ETRS 1989 Portugal TM06», cumprin-do assim com os requisitos relativos a sistemas de referência de coordenadas (Comissão Europeia, 2010). Todas as classes espaciais contêm o campo do identificador único INSPIRE (inspireId), para re-ferenciar externamente os objetos espaciais e ainda um campo para o identificador interno (Id) que funciona como chave-primária.

Foram adotadas as convenções UpperCamelCasepara designar as classes e as respetivas associações e lowerCamelCase para os atributos e os papéis das clas-ses nas associações. Assim, por exemplo, o nome da classe GeologicUnit é constituída por duas palavras que aparecem juntas com a primeira letra de cada palavra em maiúsculas (GeologicUnit). Aos nomes dos domínios foi adicionado o sufixo «Value».

Figura3 – Diagrama da Geodatabase (adaptado de Pereira, A., 2012).Figure3–Geodatabasediagram(adaptedfromPereira,A.,2012).

Para armazenar os dados relativos a Portugal Continental, foi criada uma FeatureDataset (Geology) com quatro classes espaciais:

• unidade cartografada (MapUnit);• unidade geomorfológica (GeomorphologicUnit);• falha (ShearDisplacementStructure);• dobra (Fold).Foi ainda criada uma classe (GeologicUnit), que

permite armazenar os dados não espaciais associados às unidades cartografadas, nomeadamente o nome (name), o tipo de unidade geológica (geologicUnitType), a regra de representação cartográfica (unitRuleId) e o respetivo identificador uniforme do recurso (URI - UniformResourceIdentifier). O URI constitui um iden-tificador único, que permite estabelecer a ligação a um vocabulário na Internet, que contém mais in-formação sobre o termo geológico, nomeadamente

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a sua definição e referência bibliográfica. Este iden-tificador é independente do idioma de pesquisa, as-segurando assim a harmonização semântica entre os termos portugueses e os standards europeus (Fig. 4).

Entre as unidades geológicas e as unidades car-tografadas foi estabelecida uma associação de umparamuitos, uma vez que uma unidade geológica pode ter várias representações gráficas mapeadas (polígo-nos). Esta associação é definida pelo identificador da unidade geológica (geologicUnitId).

Para a caracterização das unidades geológicas, procedeu-se à criação das classes Litologia (Composi-tionPart) e Idade (GeologicEvent). A classe Litologia con-tém um campo descritivo dos constituintes rochosos de cada unidade geológica (material), um URI e um campo identificador da regra de representação carto-gráfica (lithologyRuleId). Esta classe contém ainda o pa-pel (role) das litologias na unidade (e.g. componente único, parcial) e a sua proporção relativa (proportion). Entre as unidades geológicas e as litologias foi esta-belecida uma associação compósita de um para mui-tos. Os constituintes rochosos são controlados por um domínio (LithologyValue) cujos valores são geridos através do serviço de registos INSPIRE (Fig. 5). Este domínio é do tipo aberto o que quer dizer que pode ser alargado caso o valor proposto não exista no re-gisto. Tais valores adicionais devem ser publicados no registo INSPIRE e não devem substituir ou rede-finir qualquer valor já especificado.

A hierarquia entre as litologias é representada pela associação Pai (Father), que relaciona uma li-tologia ao nível hierárquico superior (fatherId). Por exemplo, uma “Areia” que é uma “Rocha Sedimen-tar” tem no atributo fatherId, o valor corresponden-te ao identificador da “Rocha Sedimentar”. Esta hierarquização é fundamental para a realização de pesquisas com base nestes critérios.

A classe Idade contém campos para registar as idades da base (olderNamedAge) e do topo (youngerNa-medAge) de uma unidade geológica, os URI e as re-gras de representação cartográfica da idade da base (ageRuleId). As idades foram associadas ao domínio GeochronologicEraValue, cujos valores são geridos pela Comissão Internacional de Estratigrafia da União Internacional das Ciências Geológicas (Fig. 6). Os valores permitidos para este domínio compreen-dem os termos especificados na Tabela Estratigráfi-ca Internacional (InternationalUnionofGeologicalSciences, 2013), mais os que foram adicionados no âmbito do projeto OneGeology-Europe(Asch etal., 2010).

Os campos unitRuleId, lithologyRuleId e ageRuleId fo-ram adicionados para permitir o cálculo automático das regras de representação cartográfica essenciais à produção dos mapas geológico, litológico e cro-

Figura5– Página de acesso ao serviço de registos INS-PIRE para os valores da litologia (http://inspire.

ec.europa.eu/codelist/ LithologyValue).Figure5–INPIREregistryservicewebpageforlithologyvalues

(http://inspire.ec.europa.eu/codelist/LithologyValue).

Figura6 – Vocabulário das idades disponível na Internet. Pesquisa do termo ‘Holocénico’ através do seu URI=http://

resource.geosciml.org/classifier/ics/ischart/Holocene.Figure6–SpatialInformationServicesStackVocabularyService.

Searchingtheterm‘Holocene’throughitsURI=http://resource.geos-ciml.org/classifier/ics/ischart/Holocene.

Figura4 – Um único URI para vários idiomas de pes-quisa (adaptado de Pereira etal., 2011).

Figure4–UniquemultilingualidentifierURI(adaptedfromPereiraet al.,2011).

Estruturação dos dados da Cartografia Geológica à luz da INSPIRE

associação portuguesa de geólogos 53

nológico da Antiforma do Rosário (procedimento explicado no ponto 5.2 tomando como exemplo a obtenção do mapa litológico).

À classe das falhas foram adicionados três atributos: o tipo de falha (faultType), o tipo e o sen-tido do movimento (movementType e movementSense).

A classe Unidade Geomorfológica foi dividida em dois subtipos: natural (NaturalGeomorphologicFea-ture) e antropogénica (AnthropogenicGeomorphologicFea-ture), para distinguir as formas do relevo originadas por processos naturais das que tiveram também in-tervenção humana. Na figura 3 estão representadas somente as unidades geomorfológicas do tipo polí-gono, mas existem outras do tipo linha e ponto que poderão ser modeladas futuramente. Normalmente a geomorfologia não é representada nas cartas geo-lógicas portuguesas, no entanto ela é obrigatória segundo as especificações da Diretiva INSPIRE para a Geologia (INSPIREThematicWorkingGroup, 2013).

5. Caso de estudo

Uma vez implementado o modelo de dados e estruturado o Sistema de Informação Geográfica (SIG), foi necessário proceder ao seu carregamen-to com dados reais e efetuar as operações de geo-processamento necessárias à obtenção dos mapas geológicos, o que permitiu avaliar a sua capacidade de resposta. Este procedimento possibilitou, tam-

bém, a verificação de “lapsos” e identificação das principais dificuldades encontradas na implemen-tação da metodologia proposta.

Para este efeito, foram utilizados dados de car-tografia geológica à escala 1:25 000, da Antiforma do Rosário (Oliveira etal., 2013), que é uma estru-tura geológica pertencente à Faixa Piritosa Ibérica, localizada no concelho de Castro Verde, Alentejo (Fig. 7). A escolha desta cartografia específica de-veu-se principalmente às seguintes razões:

• ser uma área bem estudada devido ao elevado potencial mineiro, já que na extremidade SE desta Antiforma está situada a mina de Neves Corvo, uma das principais minas produtoras de cobre do mundo;

• possuir cartografia geológica disponível em formato shapefile, reunindo assim as condições ade-quadas para a aplicação da Diretiva INSPIRE;

• pertencer à Folha 46-C Almodôvar, da Carta Geológica de Portugal à escala 1:50 000, cuja pro-dução está em curso.

A aplicação do modelo de dados ao caso em estu-do permitiu obter três mapas temáticos distintos da Antiforma do Rosário mas complementares, nomea-damente o geológico, o litológico e o cronológico.

5.1 Harmonização dos dados

Na atual estrutura de armazenamento dos dados da cartografia geológica, a informação das litologias

Figura7 – Localização da Antiforma do Rosário. Geologia adaptada da Carta Geológica de Portugal à escala 1:1 000 000, LNEG, edição de 2010.

Figure7–RosárioAntiformlocation.GeologyadaptedfromtheGeologicalMapofPortugalscale1:1000000,LNEG,2010.

A. Pereira, G. Luís, P. Patinha & J. T. Oliveira

54

e das idades está descrita numa mesma tabela que é associada a cada uma das unidades cartografadas, através de uma operação de Join. No modelo pro-posto neste trabalho, foram definidas duas classes distintas: uma para descrever as idades e outra para descrever as litologias, sendo a associação a cada unidade geológica realizada através de associações de umparamuitos. Na figura 8 pode observar-se a as-sociação entre as unidades geológicas e as litologias.

Em relação aos termos litológicos utilizados, foi estabelecida a correspondência entre os conceitos portugueses e ingleses. Este processo foi mais ou menos direto, havendo apenas a salientar a ne-cessidade de adaptar alguns termos litológicos ao termo mais geral do vocabulário de litologias INS-PIRE, uma vez que este não tem o detalhe necessá-rio para a cartografia geológica à escala 1:25 000. Por exemplo, o jaspe e o cherte, dois litótipos que ocorrem na área, foram classificados como “Rocha sedimentar siliciosa não detrítica”, por não existi-rem os termos correspondentes no vocabulário de litologias INSPIRE.

Alguns campos não puderam ser preenchidos por ainda não terem sido definidos, como por exemplo os URI das unidades geológicas. Esta ação passa pela formalização de um dicionário de For-mações Geológicas.

Os troços de falha tiveram de ser agregados em segmentos de falha, tendo sido inferido o tipo e o sentido do movimento.

5.2 Resultados

Para a produção dos mapas geológico, litológico e cronológico da Antiforma do Rosário foram desen-volvidos três modelos, em ModelBuilder do ArcGisDesktop, com as operações de geoprocessamento necessárias ao cálculo automático das regras de representação car-tográfica, definidas para cada tipo de mapa. A ESRI disponibiliza esta ferramenta para a criação da simbo-logia (cores, padrões, etc.) essencial à representação dos elementos gráficos do tipo ponto, linha e polígo-no que compõem um mapa. A associação de múlti-plas representações cartográficas àGeodatabase constitui a principal vantagem desta ferramenta, sendo por isso muito útil na produção temática de mapas geológicos.

Neste trabalho, e a título de exemplo, optou-se por descrever apenas o processo seguido para a ob-tenção do mapa litológico da Antiforma do Rosá-rio, dado que o processo de obtenção dos restantes mapas é muito idêntico. A escolha da simbologia para representar as diferentes litologias baseou-se nas especificações INSPIRE da Geologia (INSPIREThematicWorkingGroupGeology, 2013). Com base neste

documento foram criadas e implementadas as res-petivas regras de representação cartográfica e pos-teriormente executadas as seguintes operações:

• preenchimento do campo identificador da re-gra de representação cartográfica para cada uma das litologias (lithologyRuleId);

• associação das litologias às unidades cartogra-fadas através de operações de Join;

• cálculo das regras de representação cartográfica de cada uma das litologias no mapa através da ope-ração FieldCalculator.

Na figura 9 é apresentado o mapa litológico da Antiforma do Rosário, resultante da aplicação da metodologia anteriormente descrita, onde estão re-presentadas as principais litologias aflorantes obtidas através de uma pesquisa efetuada ao campo “proportion” para os termos ‘all’, ‘dominant’, ‘major’ e ‘predominant’.

6. Conclusões

O principal resultado deste trabalho consistiu na obtenção de uma Geodatabase, que responde eficaz-mente ao objetivo proposto, pelo que a sua imple-mentação futura na produção da cartografia geológica oficial irá certamente reformular os procedimentos e formas de trabalho, beneficiando quem produz e utiliza os dados da cartografia geológica.

A utilização do software Enterprise Architect, para além de permitir gerar, automaticamente, a estru-tura de dados pretendida em ArcGis, possibilita tam-bém efetuar as iterações necessárias ao seu aperfei-çoamento e desenvolvimento, num ambiente de modelação openstandard e universal, com acesso aos normativos e requisitos da Diretiva INSPIRE. A Geodatabase obtida apresenta numerosas vantagens, das quais se enumeram as seguintes:

• é compatível com o SIG que suporta a produ-ção de cartografia geológica;

• não existe necessidade de duplicar a informa-ção por vários ficheiros, contribuindo assim para a sua integridade, uma vez que os dados assentam em ambiente de gestão centralizado;

• poderá contribuir para a reestruturação dos dados da cartografia geológica, uma vez implemen-tada em ambiente de produção;

• facilita a implementação de operações de geo-processamento;

• contribui efetivamente para a interoperabilida-de e reutilização dos dados da cartografia geológica.

A aplicação da metodologia proposta ao caso em estudo permitiu constatar a viabilidade na produção de cartografia geológica e ainda definir um novo flu-xo de trabalho para a obtenção de cartas temáticas.

Este trabalho constitui, também, um primeiro

Estruturação dos dados da Cartografia Geológica à luz da INSPIRE

associação portuguesa de geólogos 55

Figura9 – Mapa das principais litologias da Antiforma do Rosário.Figure9–MapofRosárioAntiform’smainlithologies.

A. Pereira, G. Luís, P. Patinha & J. T. Oliveira

Figura8 – Associação de umparamuitos entre as unidades geológicas e as litologias.Figure8–One to many associationbetweengeologicalunitsandlithologies.

56 Estruturação dos dados da Cartografia Geológica à luz da INSPIRE

contributo para a harmonização semântica dos da-dos, embora simplificado, por se tratar de pequena área de estudo. A aplicação à totalidade dos dados da cartografia geológica irá certamente levantar problemas mais complexos a este nível, cuja reso-lução poderá passar pelo desenvolvimento de onto-logias (ver os trabalhos de Ludascher etal., 2003; Woodcock etal., 2010; Maetal., 2012).

Num futuro próximo será necessário acautelar o registo dos termos específicos da geologia portu-guesa nas listas de valores INSPIRE e criar os iden-tificadores de objeto externo (inspireId) e garantir a consistência dos dados da cartografia geológica a todas as escalas de representação e nas regiões fron-teiriças (INSPIREDraftingTeamDataSpecifications, 2013).

Por fim, deverão ser criados os respetivos servi-ços de visualização e descarregamento para permitir o acesso aos dados da cartografia geológica, através do geoPortal do LNEG. Estes serviços podem ser su-jeitos à cobrança de taxas, de acordo com a política institucional de cedência de dados, devendo nestes casos, ser também disponibilizados serviços de co-mércio eletrónico.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao LNEG a disponibili-zação dos condições necessárias à realização deste trabalho e à Sparx Systems pela cedência da licença do softwareEnterpriseArchitect9.3, utilizado no desenho do diagrama da Geodatabase.

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Transformação de coordenadas cartográficasO exemplo da região de Granja (NW do Ceará, Brasil)

A. J. F. Silva1,*, A. C. Teodoro2,3, L. Duarte2,3, J. A. Gonçalves2, J. A. Nogueira Neto4, M. R. Azevedo1 & B. Valle Aguado1

1Universidade de Aveiro, Departamento de Geociências, GeoBioTec, Campus de Santiago, 3810-193, Aveiro, Portugal;2Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Departamento de Geociências, Ambiente e Ordenamento do Território;

3Centro de Investigação em Ciências Geo-Espaciais, Rua do Campo Alegre 687, 4169-007, Porto, Portugal; 4niversidade Federal do Ceará, Departamento de Geologia, Recursos Minerais e Geodinâmica, Campus do Pici,

Bloco 912, 60.455-760, Fortaleza - CE, Brasil;

*[email protected]; autor correspondente.

Introdução

A cartografia, como ciência, tenta representar no plano a dificilmente concebível superfície curva da Terra, a que chamamos geoide (Catalão, 2010). Define-se geoide como a superfície equipotencial do campo gravítico terrestre que melhor se ajusta ao nível médio das águas do mar (Fig. 1). A sua forma é bastante próxima da superfície de um elipsoide de revolução achatado, designado em cartografia como elipsoide de referência (Fig. 1).

O geoide é determinado através de métodos gravi-métricos e astro-geodésicos e, mais recentemente, recorrendo a tecnologias espaciais. A sua inclinação

em relação ao elipsoide de referência é dada pelo ângulo formado pela vertical do lugar (normal ao geoide) e a normal ao elipsoide (normal). A forma e a dimensão do elipsoide de referência são definidas pelos seguintes parâmetros geométricos:

a – dimensão do semi-eixo maior;b – dimensão do semi-eixo menor;f – achatamento, em que f = (a-b/a) e;e – excentricidade, em que e = (2 f - f2).Quando se pretendem representar zonas exten-

sas da superfície terrestre numa superfície plana, é necessário adotar sistemas de representação plana do elipsoide. Como este não é planificável, qual-quer que seja o método de representação usado,

Resumo

Este estudo tem como principal objetivo mostrar a importância de se efetuar a análise metódica da cartografia de base que suporta a produção de Cartografia Geológica, antes de iniciar o trabalho de campo. Em certas regiões, as cartas base publicadas estão ainda associadas a redes geodésicas clássicas, o que obriga a proceder à transformação de coor-denadas para assegurar que todos os dados geo-espaciais são definidos no mesmo sistema de referência espacial. Neste estudo, selecionaram-se 8 pontos localizados sobre as cartas publicadas na região de Granja (NW do Ceará, Brasil), determinaram-se as coordenadas no Datum topocêntrico das cartas (CA 70-72) e procedeu-se à sua transformação para os Data geocêntricos WGS84 e SIRGAS2000. As diferenças entre as coordenadas obtidas nos três sistemas são residuais, indicando que erros introduzidos quando se desconsideram parâmetros essenciais como o Datum Geodésico são, neste caso, mínimos para efeitos de Cartografia Geológica.

Palavras-chave: Sistemas de Referência Espaciais; Transformação de Coordenadas; DatumSIRGAS2000.

Abstract

ThisstudydrawsattentiontotheimportanceofconductingadetailedanalysisofcartographicproductsthatsustaintheGeologicalMappingbeforestartingthefieldwork.Insomeregions,thepublishedbasemapsarestillrelatedtoclassicalgeodeticnetworks.Therefore,itisfundamentaltoperformtheadequatecoordinatetransformationtoensurethatallspatialdataaredefinedrelativelytothesamespatialreferencesystem.ThisisparticularlyrelevantwhenGPSandGISareusedtoobtainandplotspatialdata.Thepresentstudyinvolvedtheselectionof8pointslocatedonthepublishedmapsfortheGranjaregion(NWCeará,Brazil),thedeterminationoftheircoordinatesintheCA70-72topocentricmapDatumandtheirsubsequenttransforma-tiontothegeocentricData WGS84andSIRGAS2000.Thedifferencesbetweencoordinatesareresidual,indicatingthattheerrorintroducedwhenessentialparameterssuchastheGeodeticDatumaredisregardedare,inthiscase,minimum.

Keywords: SpatialReferenceSystems;CoordinateTransformations;Datum SIRGAS2000.

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construídas por triangulação sobre o elipsoide de referência constituem a base para a materialização das representações cartográficas bidimensionais.

As vantagens resultantes da adoção de uma car-tografia mundial única e uniforme são universal-mente conhecidas. No entanto, isto implica três condições fundamentais: (a) escolha de um elipsoide internacional, que se adapte às necessidades de todos os países; (b) seleção de um Datum comum para todas as triangulações e (c) escolha de um sistema comum de representação plana conforme (Catalão, 2010).

No Brasil, o referencial geodésico em que se baseia a cartografia de base passou por gran-des transformações ao longo do tempo: Criciú-ma/Itararé, Córrego Alegre 1961, Córrego Ale-gre 1970 + 1972, PSAD56, Astro Chuá, SAD 69, SAD 69/96 e SIRGAS2000 (Marotta & Rodrigues, 2011). Recentemente, o Brasil aderiu ao Sistema Geocêntrico de Referência para a América do Sul (SIRGAS2000), criado com vista a promover a de-finição e estabelecimento de um referencial único compatível, em termos de precisão, com as tecno-logias modernas de posicionamento (GPS). Este sistema foi oficialmente adotado em 2005, embo-ra se encontre em fase de transição até 2014, com a recomendação de que a nova cartografia publi-cada aplique o SIRGAS2000. Ao Datum Geodésico SIRGAS são aplicados os parâmetros do Elipsoide GRS80 (Geodetic Reference System 1980), com carac-terísticas muito semelhantes às do WGS84 (World-

haverá sempre distorções. Existem diferentes tipos de projeção cartográfica, dependendo dos métodos de projeção aplicados (e.g. planas/azimutais, có-nicas, cilíndricas), da sua coincidência (tangente, secante e poli-superficial), da posição da superfí-cie de projeção (normal, transversa, oblíqua) e das suas propriedades cartográficas, i.e., se represen-tam corretamente as áreas, distâncias ou formas (equivalentes, equidistantes e conformes, respeti-vamente), de acordo com Catalão (2010).

O conjunto de transformações analíticas que permitem relacionar as coordenadas geodésicas dos pontos sobre o elipsoide e as corresponden-tes coordenadas cartesianas na carta constitui um sistema de projeção. A sua caracterização completa requer a definição do Datum Geodésico, das coor-denadas geodésicas do ponto central da projeção, da origem das coordenadas cartográficas, do fator de escala e da expressão analítica da projeção.

Os Data geodésicos podem ser agrupados em duas categorias: locais e globais. Um Datum local, ou to-pocêntrico, é constituído por um elipsoide de refe-rência, posicionado num ponto terrestre de coor-denadas astronómicas conhecidas, de tal forma que as coordenadas elipsoidais desse ponto coincidam com as coordenadas astronómicas. Em contraparti-da, um Datum global, ou geocêntrico, é definido por um elipsoide de referência, posicionado de modo a que o seu centro coincida com o centro de massa da Terra e o eixo polar, com a posição média do eixo de rotação da Terra (Fig. 2). As redes geodésicas

Figura1 – Relação entre o elipsoide e o geoide com a topografia; N - ondulação do geoide; h - altitude elip-

soidal ou geométrica; H - altitude ortométrica.Figure1–Relationshipsbetweentheellipsoidandthegeoidwiththe

topography,N-geoidundulation;h-ellipsoidalorgeometricheight,H-orthometricheight.

Figura2– Representação esquemática de um Datum local e um Datum global quanto ao posicionamento do elipsoide de referência com o geoide (Extraído de Gaspar, 2005).

Figure2–SchematicrepresentationofalocalandglobalDatumregardingthepositioningofthereferenceellipsoidwiththegeoid(From

Gaspar,2005).

Transformação de coordenadas cartográficas

associação portuguesa de geólogos 59A. Silva, A. Teodoro, L. Duarte, J. Gonçalves, J. Neto, M. Azevedo & B. V. Aguado

Geodetic System1984), sendo por isso praticamente equivalente ao sistema WGS84 para efeitos práticos de cartografia (Tabela 1).

No entanto, tal como noutras regiões do mun-do, muitos dos produtos cartográficos publicados no Brasil ainda estão associados a redes geodésicas clássicas, o que causa problemas quando se preten-de compatibilizar informações geográficas de dife-rentes origens (Gonçalves, 2008). A transforma-ção de coordenadas torna-se, por isso, uma etapa fundamental no processo de preparação de mapas para o trabalho de campo e posterior georreferen-ciação nos SIG.

No caso em estudo, as três cartas topográficas disponíveis (escala 1:100 000) baseiam-se no re-ferencial geodésico topocêntrico Córrego Alegre (CA 70-72), tendo o ponto Córrego Alegre como vértice, o Elipsoide de Hayford de 1924 como super-fície de referência (Tabela 1) e a projeção conforme e cilíndrica UTM (Universal Transversa Mercator) como sistema de representação.

No sistema UTM, a superfície da Terra com-preendida entre os paralelos 84º N e 80º S é di-vidida em fusos por uma série de meridianos, re-gularmente intervalados de 6º (Fig. 3). Para cada fuso, utiliza-se um cilindro secante, minimizan-do assim as deformações. Constituem-se, assim, 60 fusos, numerados de 1 a 60, a partir do anti--meridiano de Greenwich (longitude 180º) que vão crescendo para Leste. Cada fuso é segmentado em zonas através de paralelos regularmente espaçados de 8º, dando origem a uma rede de zonas de 6º x 8º, identificadas por uma letra, desde C a X, com exceção do I e do O.

Os eixos de referência de cada fuso são consti-tuídos pelo meridiano central do fuso e pelo equa-dor. Por convenção, atribuiu-se ao meridiano central do fuso uma distância fictícia à meridiana de 500 000 metros (FalseEasting) para evitar coor-denadas negativas para os pontos situados a oeste deste. Por razões semelhantes, atribuiu-se ao equa-dor uma distância fictícia à perpendicular de 0 ou 10 000 000 metros (False Northing), conforme se trate de pontos localizados nos hemisférios Norte ou Sul (cf. Gaspar, 2005; Catalão, 2010) (Fig. 3).

Figura3 – Esquematização da Projeção Universal Transversa de Mercator indicando os principais dados relativos à Zona 24 do Hemisfério Sul (Extraído e mo-

dificado de Gaspar, 2005).Figure3–SchematicdiagramoftheUniversalTransverseMercatorProjectionshowingthekeydataconcerningZone24intheSouthern

Hemisphere(ModifiedfromGaspar,2005).

O sistema completa-se com a criação de uma malha de quadrados que constitui a quadrícula de referenciação UTM. Para referenciar as posições de um ponto no sistema UTM usam-se as suas coor-denadasFalseEasting e FalseNorthing, sendo o metro a unidade de comprimento.

Cobertura topográfica da região de Granja

Com a crescente utilização dos sistemas de po-sicionamento GPS (GlobalPositioningSystem) e dos Sis-temas de Informação Geográfica (SIG), torna-se cada vez mais importante ter em atenção o Datum Geodésico usado na elaboração de mapas topográ-ficos e geológicos de base para evitar desfasamentos de posicionamento entre dados geo-espaciais com diferentes origens.

A região de Granja (NW do Ceará) é coberta por três cartas topográficas (Granja, Camocim e Chaval), na escala 1:100 000, com coordenadas

ELIPSOIDE a (m) b (m) f

Hayford(1924) 6378388 6356911,9000 1/297,0000000

GRS80 6378137 6356752,3141 1/298,2572221

WGS84 6378137 6356752,3142 1/298,2572235

Tabela1 – Principais parâmetros dos elipsoides de Hayford, GRS80 e WGS84.Table1–MainparametersoftheHayford,GRS80andWGS84ellipsoids.

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retangulares UTM, que ainda estão referenciadas ao Datum Córrego Alegre 1970 + 1972 (CA 70-72). O ponto de fixação de coordenadas, λ = 19° 50’ 14,91” S, ϕ = 48° 57’ 41,98” W e H = 683,81 metros, está situado no Estado de Minas Gerais. A região faz parte da Zona 24 (Hemisfério Sul), meridiano central 39º W. O valor do coeficien-te de deformação dos comprimentos (k) é de 0,9996.

Para avaliar os desvios de posicionamento entre este referencial geodésico e os sistemas WGS84 e SIR-GAS2000 foi elaborado um estudo a partir das coor-denadas geográficas (longitude e latitude) de 8 pon-tos localizados nos vértices das três cartas (Fig. 4).

Metodologia

Para efeitos de comparação de coordenadas seguiu--se uma metodologia que envolveu os seguintes passos:

1. Partindo das coordenadas geográficas projeta-das dos vértices das três cartas, procedeu-se ao cálculo das respetivas coordenadas cartesianas UTM (E - FalseEasting, N - FalseNorthing) através da aplicação PROJ (PROJ.4 CartographicProjectionsLibrary), com o código: proj+ellps=intl+proj=utm+zone=24+south (Fig. 5). Origi-nalmente desenvolvido no USGS (UnitedStatesGeologicalSurvey), o PROJ é atualmente uma ferramenta stan-dard, de código aberto e associada ao projecto OSGeo(OpenSourceGeospatialFoundation);

Figura5 – Imagem da aplicação PROJ mostrando os resultados do cálculo das coordenadas cartesianas projetadas (X, Y) a partir das coordenadas geográficas (Long, Lat) para os vértices das cartas topográficas do NW do Ceará.

Figure5–ProgramPROJimageshowingthecalculationresultsoftheprojectedCartesiancoordinates(X,Y)fromthegeographiccoordinates(Long,Lat)on8verticesoftheNorthwesternCearátopographicmaps.

Transformação de coordenadas cartográficas

Figura4 – Cobertura topográfica do NW do Ceará (escala 1:100 000), mostrando as cartas e os respetivos vértices utilizados nas transformações de coordenadas.

Figure4–TopographiccoverageofNWCeará(1:100000scale),showingthemapsandtheirverticesusedincoordinatetransformations.

associação portuguesa de geólogos 61A. Silva, A. Teodoro, L. Duarte, J. Gonçalves, J. Neto, M. Azevedo & B. V. Aguado

Figura6 – Transformação de coordenadas geográficas do Datum Córrego Alegre (1970 + 1972; EPSG:4225) para coor-denadas geográficas no DatumWGS84 (EPSG:4326) usando a aplicação cs2cs.

Figure6–TransformationofgeographiccoordinatesinCórregoAlegreDatum(1970+1972;EPSG:4225)togeographiccoordinatesinWGS84Datum(EPSG:4326)usingthecs2csapplication.

Figura7 – Conversão de coordenadas geográficas no DatumWGS84 (input: Long, Lat) para coordenadas cartesianas no mesmo Datum (output: X, Y).

Figure7–ConversionofgeographiccoordinatesinWGS84Datum(input:Long,Lat)toCartesiancoordinatesinthesameDatum(output:X,Y).

2. Em seguida, efetuou-se a conversão das coordenadas geográficas no Datum CA 70-72 para coordenadas geográficas no Datum WGS84, recor-rendo à aplicação cs2cs (PROJ.4 Cartographic Coor-dinateSystemFilter), com o código: cs2cs+init=epsg:4225+to+init=epsg:4326 (Fig. 6). A aplicação cs2cs permite realizar transformações entre o sistema cartográfi-co fonte e o sistema cartográfico de destino a partir de um conjunto de pontos de entrada, associando códigos numéricos aos parâmetros dos sistemas de coordenadas (identificadores EPSG-EuropeanPetro-leumSurveyGroup);

3. Seguiu-se a conversão das coordenadas geo-gráficas no Datum WGS84 para coordenadas carte-sianas UTM (E, N) no mesmo Datum, através da aplicação PROJ (proj+ellps=WGS84+proj=utm+zone=24+south), como se pode ver na Fig. 7;

4. Em paralelo, procedeu-se, igualmente, à transformação das coordenadas cartesianas UTM no Datum CA 70-72, obtidas previamente através da aplicação PROJ (ponto 1), para o Datum SIR-GAS2000. Para o efeito, utilizou-se o software Pro-GriD, desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

62 Transformação de coordenadas cartográficas

Para efeitos de cartografia geológica, a escalas compreendidas entre 1:25 000 a 1:250 000, os desvios observados são praticamente irrelevantes, até porque a precisão associada à informação de geoposicionamento fornecida pelos dispositivos GPS é de aproximadamente 10 metros. De qual-quer modo, é sempre recomendável que os mapas topográficos em que se baseia a cartografia geoló-gica e os dados de geoposicionamento adquiridos durante o levantamento geológico estejam referi-dos ao mesmo Datum.

Através da aplicação ArcGIS 10.1 é possível geor-referenciar a cartografia topográfica e/ou geológica publicada ao Datum em que se obtêm os dados geo--espaciais que se pretendem projetar. Assim, numa fase subsequente, procedeu-se à georreferenciação das cartas de Granja, Camocim e Chaval (Datum CA 70-72) no DatumSIRGAS2000, usando os valores das coordenadas cartesianas obtidas previamente (pon-to 4) para os vértices das três cartas. Tendo em conta

Com base nos resultados obtidos, compilaram--se os valores das coordenadas cartesianas UTM (E, N) nos diferentes Data e verificou-se que os desvios encontrados são relativamente pequenos (Tabelas 2 e 3).

Resultados e conclusões

As diferenças entre os valores das coordenadas UTM nos Data CA 70-72, SIRGAS2000 e WGS84 obtidas para os 8 pontos são residuais, indicando que erros introduzidos quando se desconsidera o Datum Geodésico são, neste caso, mínimos. As li-geiras diferenças entre as coordenadas UTM Easting e Northing (Tabelas 2 e 3) nos três sistemas estuda-dos, podem ser atribuídas a variações na forma e dimensão dos elipsoides de referência adotados em cada um dos sistemas, assim como, às distintas re-des geodésicas (Datum local vs.Datum global) sobre as quais foram determinadas.

Córrego Alegre WGS84 SIRGAS2000

Ponto Córrego Alegre | (λ , ϕ) X (m) X (m) X (m)

1 “-41dW; -2d30’S” 277606,42 277609,85 277606.35

2 “-40d30’W; -2d30’S” 333219,68 333223,26 333219.62

3 “-41d30’W; -3dS” 222092,04 222095,32 222091.32

4 “-41dW; -3dS” 277699,07 277702,51 277698.93

5 “-40d30’W; -3dS” 333289,14 333292,73 333289.41

6 “-41d30’W; -3d30’S” 222228,97 222232,26 222228.52

7 “-41dW; -3d30’S” 277808,56 277812,00 277808.57

8 “-40d30’W; -3d30’S” 333371,22 333374,81 333371.89

Córrego Alegre WGS84 SIRGAS2000

Ponto Córrego Alegre | (λ , ϕ) Y (m) Y (m) Y (m)

1 “-41dW; -2d30’S” 9723500,75 9723493,99 9723492,86

2 “-40d30’W; -2d30’S” 9723574,87 9723568,11 9723566,79

3 “-41d30’W; -3dS” 9668085,74 9668078,84 9668078,47

4 “-41dW; -3dS” 9668200,08 9668193,19 9668192,50

5 “-40d30’W; -3dS” 9668288,97 9668282,09 9668281,45

6 “-41d30’W; -3d30’S” 9612765,65 9612758,59 9612758,19

7 “-41dW; -3d30’S” 9612898,97 9612891,92 9612891,55

8 “-40d30’W; -3d30’S” 9613002,60 9612995,56 9612995,35

Tabela3 – Valores da coordenada cartesiana Y (FalseNorthing) para os 8 pontos nos diferentes Data geodésicos.Table3–TheCartesiancoordinateYvalues(FalseNorthing)forthe8pointsinthedifferentgeodeticData.

Tabela2 – Valores da coordenada cartesiana X (FalseEasting) para os 8 pontos nos diferentes Data geodésicos.Table2–TheCartesiancoordinateXvalues(FalseEasting)forthe8pointsinthedifferentgeodeticData.

associação portuguesa de geólogos 63A. Silva, A. Teodoro, L. Duarte, J. Gonçalves, J. Neto, M. Azevedo & B. V. Aguado

que o erro de graficismo de 0,2 mm numa carta na escala de 1:100 000 corresponde a 20 metros, os er-ros associados ao processo de georreferenciação não devem exceder esse valor. Quando se finaliza a geor-referenciação de uma carta em ambiente ArcGIS, a aplicação fornece automaticamente o valor do erro associado, expresso através do parâmetro RMS (valor quadrático médio ou valor eficaz). No caso presen-te, os erros associados à georreferenciação das três cartas são inferiores a 20 metros (Granja: 7,65 me-tros; Camocim: 16,40 metros; Chaval: 18,78 me-tros), validando assim o procedimento usado.

Agradecimentos

O autor A. J. F. Silva agradece à Fundação para Ciência e Tecnologia a Bolsa de Investiga-ção concedida (SFRH/BD/85292/2012) e às uni-dades de Investigação GeoBioTec (PEst-C/CTE/UI4035/2011) e Centro de Investigação em Ciên-cias Geo-Espaciais (PEst-OE/CTE/UI0190/2011).

Bibliografia

Catalão, J., 2010. ProjecçõesCartográficas. Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia, Facul-dade de Ciências da Universidade de Lisboa, 79 p.

Gaspar, J. A., 2005. Cartas e Projecções Cartográficas. LIDEL edições técnicas, 3ª edição, Mafra, Portugal, 331 p.

Gonçalves, J. A., 2008. Adopção de Sistemas de Refe-renciação Geográfica Globais. ActasdoXESIG, Lisboa, 877-887.

Marotta, G. S. & Rodrigues, D. D., 2011. Atualização de Parâmetros na Transformação em Referenciais Geodésicos Históricos. Revista Brasileira de Cartografia, 63/5: 609-617.

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associação portuguesa de geólogos 65geonovas n.º 27: 65 a 75, 2014

A geologia prática em mineração de pequena escala Desenvolvimentos em territórios Lusófonos

C. L. Gomes

Universidade do Minho, Departamento de Ciências da Terra, Gualtar, 4710-057 Braga;

[email protected].

Introdução

A mineração de pequena escala - “Small Scale Mining” (SSM) – é uma actividade económica para a qual não existe uma definição única e consensual mas que se dispersa por todo o mundo.

Na versão mais rudimentar, o garimpo, con-centra-se em países em vias de desenvolvimento. Os garimpeiros são homens, mulheres e crianças provenientes de meios rurais e pobres. Actualmen-te estima-se que na actividade extractiva de garim-po estejam envolvidos directamente 13 milhões de pessoas. No entanto, indirectamente mais de 80 a 100 milhões de pessoas dependem do garimpo para a sua sobrevivência (Sandbrok etal., 2002).

Mas a SSM não inclui exclusivamente o garim-po. Também pequenas unidades extractivas não mecanizadas, ou com mecanização incipiente, e pequeno número de assalariados, podem ser in-

cluídas neste conceito. Nessa acepção, mesmo paí-ses industrializados, como os Estados Unidos da América, o Canadá e a Austrália, devem uma parte significativa da sua produção mineira à SSM.

Os organismos governamentais que tutelam a mineração em países industrializados, tal como o UnitedStatesGeologicalSurvey, reconhecem a importân-cia social e a sustentabilidade ambiental das práticas mineiras de pequena escala, as quais, incluem num âmbito mais alargado da sistemática de interven-ções extractivas. Aqui, a funcionalidade da classifi-cação SSM e as implicações jurídicas consequentes justificam-se pois consagram de forma consistente, regular e legal, o aproveitamento integral e integra-do dos recursos minerais ocorrentes em jazidas de pequenas dimensões, num quadro sustentável de ordenamento territorial e conservação da Natureza.

Estudos da Organização Internacional do Tra-balho (OIT, 1999) sugerem que o conceito de

Resumo

Apresentam-se incidências de Países Lusófonos e discute-se a diversidade e amplitude da intervenção geológica em mineração de pequena escala e a importância decisiva que lhe é atribuída por organizações internacionais. O âmbito e as perspectivas possíveis estendem-se do estudo dos factores favoráveis ao incremento e sustentabilidade desta actividade até à evidência de reservas e definição de procedimentos extractivos. Neste tipo de mineração a necessidade de utilização de mão-de-obra intensiva, as imposições governamentais e as moratórias internacionais incrementam a demanda de uma prática geológica também intensiva.

Palavras-chave: mineração de pequena escala; aplicação geológica intensiva.

Abstract

Over-viewingsomeminingincidencesofPortuguese-speakingcountries,theamplitudeofpracticalgeologyassessmentinsmall-scalemining,justi-fiesthedecisiveimportancegivenbyseveralinternationalorganizations.Thescopeandpossibleperspectivesofpracticalgeologyrangefromthestudyoffavourablegrowthandsustainabilityfactorsforthisactivitytotheevidenceofreservesandthedefinitionofminingprocedures.Thestrongengagementoflabour-intensiveworkandgrowingrestrictivenessofgovernmentalandinternationaldirectivesarecorrelatedwiththeneedofanincreasinginvolvementofanalsointensivepracticalgeology.

Keywords: small-scalemining;intensivegeology.

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e ASM (artisanalandsmall-scalemining) incluindo-as no conjunto dos vectores essenciais que podem con-tribuir de forma sustentável para o alívio da pobre-za em países em vias de desenvolvimento – conceito SLA (sustainablelivelihoodsapproach). No entanto, cha-mam a atenção para os problemas de insurgência e conflito que podem estar relacionados com algu-mas práticas de garimpo em territórios sem juris-dição ou fiscalização estatal e sem controlo policial.

Para o horizonte de 2015, entre os objectivos para o desenvolvimento no milénio – MillenniumDevelopmentGoals (MDG) – do plano de desenvolvimento das Na-ções Unidas -UNDevelopmentProgram(UNDP) – con-ta-se a erradicação da pobreza e da fome em articu-lação com a promoção da sustentabilidade ambiental e de uma parceria global para o desenvolvimento. De acordo com o UNDP é sobre estes 3 objectivos do MDG que a SSM e a ASM podem ser decisivas e expressam-se ou incluem-se nas directivas políticas, sociais, económicas, administrativas, tecnológicas e científicas, que actualmente balizam os sistemas de criação de riqueza a partir dos recursos minerais.

De acordo com as duas organizações internacio-nais referidas, UN e WB, a SSM e a ASM são con-sideradas viáveis e sustentáveis e particularmente adequadas às unidades territoriais mais fortemen-te deprimidas do ponto de vista económico e mais afastadas de acessibilidades infra-estruturais de in-cidência nacional.

Esta acepção também se justifica a respeito da inclusão das unidades de SSM e ASM nos planos estratégicos regionais e planos directores munici-pais em países industrializados.

Parceria global - interlocutores, agentes e promotores

No que respeita ao objectivo MDG – promoção de parcerias globais para o desenvolvimento – plas-mado na máxima das UN, “investir no Sul em nome da segurança no Norte”, a assistência oficial ao de-senvolvimento a partir de países industrializados, de 2000 a 2012, caracterizou-se por um aumento progressivo, de pequena magnitude mas consis-tente, nos investimentos bilaterais em projectos e programas de desenvolvimento e de cooperação técnica subsidiários da Parceria Global sobre Terra, Recursos Naturais e Conflitos – MDG, UNDP.

Não obstante, os fundos disponibilizados por estes programas, não subvencionam praticamente as pequenas unidades nas suas acções individuali-zadas e os apoios das diferentes organizações rara-mente se dispersam até aos intervenientes locais de menores dimensões.

mineração de pequena escala varia em função dos critérios diferenciados que são adoptados para a caracterização regional da actividade extractiva nos diferentes territórios com apetência mineira. É, por isso, um conceito de alcance qualitativo e bastante subjectivo nos seus atributos, que invoca, muitas vezes, as menções, operação artesanal e ope-ração a céu aberto, utilizando equipamentos sim-ples com baixos níveis de mecanização.

As Nações Unidas – UnitedNations (UN) – sugeri-ram vários critérios de incidência quantitativa para a definição de uma unidade extractiva de SSM:

• processamento de tout-venant, em rotina, in-ferior a 50 000 toneladas por ano ou 200 tone-ladas por dia;

• investimento de capital inferior a um milhão de dólares americanos;

• facturação anual inferior a um milhão e meio de dólares americanos;

• número de trabalhadores inferior a 40;• vida útil inferior a cinco anos.Outros atributos a ter em conta na mineração em

pequena escala, agora de incidência mais concep-tual, são os seguintes: localização geológica e geográ-fica das jazidas, tipo de mineralização e paragénese, morfologia, morfoscopia e morfometria dos de-pósitos minerais, métodos de desmonte e bene-ficiação, importância e valor das infra-estruturas de apoio, valor unitário e global dos produtos ex-traídos e potenciais, taxas de processamento e arti-culação em eventuais fileiras, integração e ajuste a cadeias de valor, grau de mecanização, distâncias de escoamento de produtos, inserção em zonografias de ordenamento, “pegada” mineira e as condicio-nantes ambientais.

Excluindo o garimpo insurgente, que é inde-fensável do ponto de vista ambiental, sanitário, le-gal, social e económico, à SSM regular atribuem--se alguns impactos negativos, sobretudo do ponto de vista ambiental e económico. Não obstante, através dela, é extraída uma grande variedade de minerais classificáveis nos diversos grupos de inci-dência económica e legislativa (minérios, minerais industriais e rochas e massas minerais) que em ou-tras circunstâncias não poderiam ser aproveitados (Drechsler, 2001).

A nível global, e particularmente em países de língua portuguesa, as unidades de SSM mais fre-quentes dedicam-se à extracção de rochas e mi-nerais industriais e ao aproveitamento do ouro e gemas devido ao mais fácil processamento e/ou co-mercialização destes produtos.

Em articulação com as UN, o Banco Mundial (WB) associa os conceitos de SSM (small-scalemining)

A geologia prática em mineração de pequena escala

associação portuguesa de geólogos 67C. L. Gomes

– aparelho de televisão; 5 – veículo motorizado; 6 – bicicleta.

Quanto à acessibilidade a equipamentos de in-teresse mineiro, encarada como um melhoramento das condições de laboração, as mesmas fontes apre-sentam a seguinte ordem decrescente de frequência de declarações: 1 – veículo motorizado; 2 – trans-porte de tracção animal; 3 – tractor; 4 – escava-dora mecânica; 5 – ferramentas não tradicionais. Estes indicadores são utilizados para a aferição do progresso e do sucesso mais difuso da actividade de SSM em meios rurais pobres.

Assiste-se actualmente a uma crescente conju-gação de factores favoráveis ao incremento genera-lizado das actividades de SSM e ASM em unidades regulares e licenciadas. Os mais importantes são os seguintes:

1) incremento da atractividade económica das pequenas e médias empresas;

2) melhoramento generalizado das diversas in-fra-estruturas e logísticas, regionais e locais;

3) incremento do número e da eficiência dos programas de apoio e financiamento à SSM – exis-tem alguns departamentos estatais e empresas pú-blicas especializadas nestas tarefas;

4) diversificação e incremento do valor unitário das matérias primas que se podem obter em insta-lações com este estatuto;

5) boom dos investimentos dedicados a minerais industriais por indução do incremento da procura;

6) aumento consistente das cotações e dos valo-res unitários do ouro, concentrados de coltan e ge-mas coloridas;

7) advento de novas aplicações para os produtos minerais;

8) o facto de alguns elementos críticos só pode-rem ser obtidos de forma viável em unidades de SSM.

Panoramas nacionais

No espaço lusófono os estatutos SSM são diver-sificados e também é variada a amplitude de apli-cação da geologia a pequenas unidades extractivas.

Excluindo casos, que ainda se observam, de garimpo insurgente, em Angola e Moçambique as realidades são similares (Mauvilo, 2011) e in-cluem contextos de garimpo, mineração artesanal e mineração de pequena escala em que a mão--de-obra intensiva, coadjuvada ou não por geo-logia intensiva (empírica ou formal), sustentam a maioria das explorações. Nestes casos as pró-prias unidades extractivas mais informais e as cooperativas e associações de mineiros - o regime cooperativo é encorajado pela prática e pela le-

No âmbito global do Ordenamento da Activi-dade Extractiva, as UN reconhecem à ASM uma dimensão e potencial de desenvolvimento capaz de fazer intervir de forma mais empenhada e res-ponsável as organizações baseadas na comunidade (CBO – community-based organizations) bem como as CSO (civilsocietyorganizations) e NGO (non-governmentalorganizations).

Isto não acontece com a mineração em larga escala, pelo facto de esta se articular entre os Go-vernos Centrais e algumas Companhias Multina-cionais, com um forte alheamento em relação à sociedade civil e envolvendo muito pouco as co-munidades locais. Também implica uma logística complexa cujos eixos de escoamento dependem de grandes obras de engenharia ou de infra-estrutu-ras já consolidadas e de importância nacional ou internacional, mas com planos de utilização quase sempre saturados.

Financiamentos, indicadores de viabilidade e perspectivas

O financiamento de unidades de SSM, espe-cialmente nos países em desenvolvimento, recorre pouco à banca institucional e na maior parte dos casos não existe investimento inicial. Quando se verifica financiamento de partida ele inclui, por ordem decrescente de importância, as seguintes proveniências (relatórios MDG – UNDP): 1 – pe-quenas poupanças pessoais; 2 – recursos prove-nientes da força de trabalho aplicada em outras ac-tividades; 3 – heranças familiares; 4 – empréstimos familiares; 5 – produtos de venda de propriedade pessoal; 6 – empréstimos pessoais; 7 – fundos de pensões; 8 – contributos diversos de outros indiví-duos das mesmas comunidades.

O facto de não haver endividamento de partida, perante a banca institucional, representa um argu-mento favorável à sustentabilidade económica das pequenas intervenções extractivas, em contextos económicos tão caracterizados por baixos índices de investimento público e deficiente acesso a fontes de financiamento.

Ao nível do garimpo informal, entre os indi-cadores de viabilidade contam-se os bens que os mineiros declaram possuir em resultado directo da actividade extractiva e também os meios a que têm acesso para optimizar as suas rotinas de laboração.

Relativamente aos bens que são declarados como alcançados através de dividendos provenientes da SSM, os relatórios UNDP listam por ordem de-crescente de frequência, os seguintes: 1 – rádio; 2 – telefone celular; 3 – frigorífico doméstico; 4

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No quadro de McKelvey (citado em Rudawsky, 1986), a função explorabilidade, é mais sustentada pela complexidade das acções que visam estabele-cer a certeza geológica das ocorrências. As tarefas de prospecção dependem da aplicação intensiva de aproximações geológicas, desde análise distanciada e detecção remota (estratégica e táctica) até à moni-torização mineira.

A prospecção geofísica é quase sempre subcon-tratada por iniciativas governamentais de larga es-cala e o recurso à geoquímica é apenas considerado, em casos de maior disponibilidade de financia-mento, para a pesquisa táctica.

As aplicações de geologia mais vezes invocadas em SSM fundamentam-se na análise estrutural e paragenética de jazidas mas também se podem si-tuar a outras escalas e níveis de organização. Po-dem mesmo estar na origem da própria demanda industrial de matérias-primas e influenciar o pla-neamento, regional e estratégico.

A experiência no terreno em países em vias de desenvolvimento e economias emergentes mostra que a geologia prática intervém tanto em contexto macroeconómico como microeconómico.

As matérias-primas minerais obtidas em unida-des de SSM e ASM, consideradas tanto em relató-rios nacionais como internacionais, são as seguintes (Barreto, 2003; Gomes, 2004): ágata, ametista, quartzo róseo, quartzo hialino, água-marinha, es-meralda, granada, rubi, safira, turmalina, topázio, opala, argila, caulino, vermiculite, mica , berilo, feldspato, corindo, cromite, bauxite, fosfatos, es-troncianite, fluorite, coltan, cassiterite, minerais de Ti, minerais de TR, minerais de U, zircão, granito, sienito, rocha ígnea básica, calcário, rocha indus-trial e agregados e areias.

São mais frequentes e têm mais peso no cômpu-to da produção mineira a partir de SSM, os seguin-tes padrões de laboração:

• pedra natural em maciços rochosos e areias em sistemas fluviais e litorais;

• gemas, ouro, coltan (concentrados de columbi-te-tantalite) e minerais de terras raras, zircónio e titânio em pláceres;

• gemas coloridas em pegmatitos e zonas de ci-salhamento;

• coltan e minerais de estanho e bismuto em pegmatitos;

• minerais industriais no geral e, especialmente, minerais cerâmicos em maciços e seus produtos de alteração em depósitos sedimentares;

• diamantes em kimberlitos, nos horizontes yel-lowground;

• gemas coloridas em rochas calcossilicatadas (skarns).

gislação – recorrem às vezes ao apoio geológico proporcionado por CBO, CSO e NGO e tam-bém, quando possível, ao apoio das delegações provinciais e locais das direcções governamentais de geologia e minas.

O problema do garimpo insurgente tem-se agudizado em territórios sujeitos à recolecção de gemas (não tanto no caso dos diamantes), com in-fluência difusa no impacte ambiental associado à actividade extractiva, segurança das populações e das unidades extractivas licenciadas, criminalida-de, abandono escolar, trabalho infantil, fuga aos impostos, imigração ilegal, incremento da pre-valência de doenças infecto-contagiosas e outras relacionadas com a sanidade ou o aumento da toxicodependência.

O caso brasileiro é o mais complexo, pois é afectado por directivas de ordenamento, pro-tecção ambiental e conservação da natureza, que condicionam fortemente as intervenções regula-res de mineração artesanal. O quadro legislati-vo para atribuições de exploração ou pesquisa é mais restritivo. Subsiste, no entanto, o garim-po informal, embora altamente condicionado pela fiscalização mineira e, neste caso, a compo-nente de decisão geológica sobre o ordenamen-to extractivo é insignificante (Barreto, 2000; MMSD, 2001) – no Anuário Mineral Brasileiro de 2006, a distribuição de frequências de por-te (escala) das minas é a seguinte: grande porte = 4,4%; médio porte = 22,9%; pequeno porte = 72,7%; a actividade de garimpo insurgente é considerada insignificante.

Em Portugal, a ASM depende pouco de mão--de-obra intensiva e não inclui o conceito de ga-rimpo. Apesar de tudo, permanecem em lavra al-gumas micro-explorações individuais e informais de rocha industrial e ornamental, não licenciadas. As pequenas explorações licenciadas privilegiam a aproximação técnica e tecnológica, com ocasionais desmontes subcontratados, e são escassas as roti-nas de monitorização geológica, verificando-se, por isso, disfunções qualitativas do aproveitamento das jazidas e mesmo subaproveitamento de reservas disponíveis e acessíveis.

Constatações

Invariavelmente, para as diferentes organiza-ções internacionais que se dedicam à problemática da mineração de pequena escala, a prospecção e o planeamento de intervenções extractivas, é forte-mente dependente de aproximações geológicas em sentido estrito.

A geologia prática em mineração de pequena escala

associação portuguesa de geólogos 69

Geologia aplicada à SSM numa perspectiva macroeconómica

A respeito da diversidade de posicionamentos tec-tonogénicos dos conjuntos de explorações em modo ASM, surge o conceito de prática geológica na pers-pectiva macroeconómica. A prospecção estratégica atende a indícios lineamentares definidos em análise distanciada e detecção remota, os quais costumam ser os mais utilizados, dado o custo relativamente baixo dos documentos que os proporcionam e dado que dependem essencialmente de interpretação geológica.

Dois ambientes tectónicos essenciais absorvem a grande maioria das intervenções de SSM em terri-tórios lusófonos (Fig. 1):

A geologia aplicada à SSM, desde a pesquisa à exploração, dedica-se preferencialmente a maciços rochosos aflorantes e pláceres, pegmatitos e skarns ou outros jazigos de natureza geoquímica calcossi-licatada em complexos orogénicos exumados, car-bonatitos e, ocasionalmente, kimberlitos, em am-bientes extensionais.

É também constatação prevalecente que os jazigos afectados por SSM são mais susceptíveis de um melhoramento das práticas de lavra e ges-tão por efeito da assistência geológica, entendi-da como uma monitorização regular, efectuada, quer por consultores visitantes assíduos, quer por geólogos residentes.

Figura1 – Territórios lusófonos afectados por SSM no espaço Gondwânico e sua correlação espacial com ambientes tectonogénicos convergentes e divergentes.

Figure1–Portuguese-speakingterritoriesaffectedbySSMintheGondwanicspaceanditsspatialcorrelationwithconvergentanddivergenttectonogenicenvironments.

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Geologia aplicada à SSM numa perspectiva microeconómica

Numa perspectiva microeconómica a práti-ca geológica adequada impõe a monitorização do avanço mineiro, quer por geólogo mineiro resi-dente, situação ideal em ASM, que se verifica em países como o Brasil e Angola e esporadicamente, em Portugal quer por consultores governamentais, não-governamentais e empresariais, que acedem periodicamente ou sazonalmente às jazidas – situa-ção generalizada a todos os países lusófonos onde se verificam práticas de ASM.

São objectivos essenciais da prática geológica em perspectiva microeconómica:

• reavaliar a apetência de jazidas (redefinição dos produtos e objectos de exploração) – qualificação de recursos, cálculo de reservas e avaliação mineira;

• evidenciar replicações de compartimentos úteis de jazidas, em extensão e em profundidade – prospecção mineira típica;

• optimizar especificações de produtos à boca da mina e em circuitos de beneficiação – ensaio ma-terialográfico, de beneficiação e de compostagem (blending);

• optimizar especificações de produtos em cir-cuitos de comercialização e contribuir para a nor-malização e certificação.

Nesta perspectiva a geologia intervém ainda na solução de problemas de rotina, surgidos no de-curso da ASM e no planeamento e relato da lavra de pequeno porte.

As metodologias de trabalho mais praticadas são a análise estrutural detalhada, intimamente combi-nada com a análise paragenética, procurando enun-ciar soluções, tanto quanto possível, reprodutíveis e ajustadas a momentos críticos de decisão, em pros-pecção pontual e no progresso da mineração.

A unidade territorial significante na abordagem microeconómica é o jazigo, ou área de concessão, eventualmente, compartimentado em sectores com identidade estrutural e paragenética individualizá-vel e também com relações, teor/tonelagem típicas.

No âmbito de uma prática abrangente de moni-torização da lavra, os jazigos de pequena dimensão têm o seu valor muito dependente do conhecimento pormenorizado das condicionantes paragenéticas e estruturais que incidem sobre as razões de teor/tone-lagem, especialmente no caso dos pegmatitos graní-ticos, skarns e carbonatitos, muito complexos do pon-to de vista da estrutura interna e onde a distribuição das substâncias úteis segue tendências não conven-cionais, teóricas ou empiricamente consolidadas.

• ambientes divergentes – predominam depó-sitos relacionados com erosão, exumação, adelga-çamento crustal, rifting incipiente, sedimentação endorreica e colmatação aulacogénica – especial-mente, em espaço Gondwânico em Angola e Brasil;

• ambientes convergentes – predominam de-pósitos relacionados com transporte tectónico, espessamento crustal, intrusão, metamorfismo/metassomatismo, alteração, erosão e exumação de complexos orogénicos – no Noroeste de Portugal, Brasil, no litoral de Angola e nos Cinturões Móveis do Norte de Moçambique.

Na perspectiva macroeconómica a geologia aplicada a SSM intervém ao nível dos estudos de caracterização regional, necessários para funda-mentar o ordenamento da actividade extractiva, e para a classificação, zonografia, e atribuição de condicionantes aos terrenos susceptíveis de al-bergarem jazigos minerais diferenciados. As uni-dades de divisão regional para agrupamentos de jazigos, que são significantes nesta abordagem, incluem os conjuntos: Província Metalogénica, Cintura Metalífera, Distrito Mineiro e Campo Mineiro. Têm vocação para intervir a este nível de organização os Serviços públicos de Geologia e entidades por eles subcontratadas, bem como CBO, CSO e NGO.

A solução de problemas relacionados com ga-rimpo insurgente e a defesa da ASM em prática regular, licenciada e legal depende desta escala de intervenção geológica. A gestão de conflitos, e a própria intervenção de forças públicas na solução de litígios entre ASM regular e garimpo insurgen-te, também deveriam recorrer sistematicamente à intervenção da geologia aplicada.

As principais incidências de um debate abran-gente sobre prática geológica em SSM, incluem:

• adequação de tipologias e modelos, o que tem como consequência a reformulação e actualização conceptual dos procedimentos de planeamento e avanço mineiro;

• capacitação para estabelecer limites de teor ou tonelagem que possam ser geologicamente e mine-ralogicamente deduzidos através de indícios estru-turais e paragenéticos;

• apuramento de técnicas de análise distanciada e detecção remota em conjuntos de jazigos, capazes de determinarem metalotectos geológicos em sen-tido estrito que, por sua vez, sejam funcionais no que respeita à SSM, com aplicação ao ordenamento da actividade extractiva e ao estudo da sociologia do garimpo nas componentes caracterizáveis do ponto de vista geológico.

A geologia prática em mineração de pequena escala

associação portuguesa de geólogos 71

extrai-se da monitorização geológica da actividade extractiva no distrito pegmatítico do Alto Ligonha (Fig. 2A), Cintura Pegmatítica Monapo – Mocu-ba (margem do Cinturão Móvel Moçambicano) na Província Pegmatítica Zambeziana (Moçambique) (Leal Gomes etal., 2008) e diz respeito ao campo pegmatítico de Naipa-Muiane (Fig. 2B).

A prática de geologia intensiva, em articulação com a ASM dependente de mão-de-obra inten-siva, nos diferentes sectores dos grupos e corpos pegmatíticos de Naipa, Naquissupa, Namiali, Na-hia, Maridge e Muiane, permitiu reconhecer a existência de ore-shoots tantalíferos e gem-shoots tur-malínicos e berilíferos, cujos elementos geomé-tricos são caracterizados por certo grau de inva-

Nestes casos a concepção e definição de ore--shoots ou gem-shoots assumem particular impor-tância. A explicação cinemática e geoquímica da sua existência é a chave para a atribuição de viabi-lidade económica a um compartimento de jazida, via, a sua aplicação como indicadores de concen-tração mineralógica.

Atendendo a que a lavra em SSM depende fre-quentemente de mão-de-obra intensiva a assistên-cia geológica pode também assumir um carácter intensivo, em especial, no decurso das primeiras etapas do progresso da mineração, buscando o re-conhecimento de padrões geométricos na organi-zação interna das concentrações de minerais úteis.

Um exemplo típico, que ilustra esta concepção,

Figura2– Divisões regionais dos conjuntos de pegmatitos de Moçambique sujeitos a SSM e ASM. A – sistemática tec-tono-metamórfica e intrusiva dos distritos pegmatíticos da Província Zambeziana (originada e modificada por eventos orogénicos Kibarianos a Pan-Africanos); B – discriminação de campos pegmatíticos da mesma província, incluindo os de Naipa e Muiane, com indicação da área do distrito Sul Zambeziano, definida, recentemente, com base em atri-

butos geológicos individualizados (Leal Gomes etal., 2008).Figure2–RegionalsettingofMozambiquepegmatitessubjecttoSSMandASM.A-tectono-metamorphicandintrusivesystematicoftheZambezianPegmatiteProvince(originatedandmodifiedbyKibariantoPan-Africanorogenicevents),B-discriminationofpegmatitefieldsinthesameprovince,

includingtheNaipaandMuianefieldandtheZambezianSouthDistrictrecentlyestablished,basedongeologicalattributes(LealGomeset al.,2008).

C. L. Gomes

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titos, estruturas com as mesmas relações angulares intersectam-se em volumes expansivos, com cres-cimento cristalino interno de tipo centrípeto que materializam gem-spots.

Esta estruturação, invariante do ponto de vista escalar, e os ritmos da sua replicação nas diferentes jazidas, são tão constantes que adquirem importân-cia crítica tanto como guias de prospecção pontual como na orientação das escavações manuais, espe-cialmente, no caso dos gem-shoots dos pegmatitos do campo Muiane – Naipa.

Num período recente de cerca de 15 anos de acompanhamento da lavra nestas jazidas, tem-se confirmado, repetidamente, a validade destes in-dicadores estruturais e paragenéticos.

riância escalar (Fig. 3) (Leal Gomes, 1998, 1999, 2001, 2004). Neste caso ideal, as relações geo-métricas entre ambientes dilatacionais associados a transpressão (em transporte tangencial) e asso-ciados a cristalização/fraccionação, sin-cinemáti-ca de transtensão (decomponível a partir de um deslocamento transcorrente), permitem diagnos-ticar sítios de acolhimento preferencial de gemas (gem-shoots) e locais adequados para a concentra-ção hidrotermal de Nb-tantalatos (ore-shoots). O progresso da deformação induziu geometrias que são típicas e discerníveis nos contextos mais pe-netrativos e nas relações entre foliação e distri-buição de veios das rochas gnaissico-migmatíticas encaixantes. Na fraccionação interna dos pegma-

Figura3 – Constatação geológica da invariância escalar e persistência de relações angulares entre estruturas que aco-lhem mineralizações de gemas e nióbio-tantalatos na região de Naipa-Muiane. A – escala cartográfica - cartografia

dos spots de gemas (a vermelho) na planta dos desmontes da Mina de Naipa (localização na Fig. 2B) (SSW – sector SW, SV8 – sector do vértice 8, SN – sector Norte, SCT – sector Central, SCM – sector Cume); B – escala do afloramento - fotografia de migmatitos do Alto Ligonha em exposição sub-horizontal; C – escala do desmonte mineiro - fotogra-fia de um antigo talude vertical de exploração num pegmatito de Muiane; D – escala da amostra - macro-imagem do

ortognaisse de Naipa - Sector SW da mina (exposição sub-horizontal e lado maior da foto com 120 cm).Figure3–Geologicalobservationsofthescalarinvarianceandpersistenceofangularrelationshipsbetweenstructuresholdinggemstonemineralizations

andniobium-tantalateconcentrationsintheNaipa-MuianeArea.A–cartographicscale-mapofgem-spots(red)atNaipamine(seeNaipalocationinfigure2B)(SW-SWsector,SV8-sectoroflandmark8,SN-Northernsector,SCT-Centralsector,SCM-Hilltopsector);B–outcropscale

-photoofAltoLigonhamigmatites(sub-horizontalview);C–mineslopescale-photoofaverticalminingexposureinaMuianepegmatite;D–rocksamplescale-macroimageofNaipaOrthogneiss-SWsectorofNaipamine(sub-horizontalexposure-largersideofthepicture-120cm).

A geologia prática em mineração de pequena escala

associação portuguesa de geólogos 73

sos de licenciamento das unidades de ASM com ac-tividade legal e regular.

A importância da geologia integrativa envolven-do a generalização de procedimentos e a extrapola-ção de resultados a partir de práticas localizadas de geologia intensiva, revelou-se de grande importân-cia no passado em algumas situações paradigmáticas:

a) Campos pegmatíticos de Angola1) mineralizações de mica industrial a NE de

Luanda - a procura dos melhores “livros” da varie-dade mica rubi de alto rank baseava-se na assump-ção de que, na zonalidade interna dos pegmatitos, a transição entre a zona intermédia externa e a zona intermédia interna era favorável à concentração desta variedade de moscovite nos jazigos do Campo Pegmatítico do Dande (Bebiano, 1946);

2) mineralizações de Be a NE do Namibe – a de-tecção de jazigos pegmatíticos portadores de beri-lo industrial, e a sua cartografia temática (Fig. 4),

A geologia intensiva em contexto microeconó-mico impõe a conjugação e o ajuste funcional/em-pírico de métodos de análise emanados da mine-roquímica, cristalografia, petrologia de minérios, crystalsizedistribution e do equilíbrio de fases minerais em condições de cristalização fraccionada, cristali-zação em equilíbrio e substituição/precipitação.

Outros desenvolvimentos da geologia em SSM

No conjunto das aplicações à SSM, a prática geológica aborda também a avaliação do impac-te ambiental associado à actividade extractiva, nas aproximações, geologia, mineralogia e geoquímica ambiental (Roosbroeck etal., 2006).

Como exemplos citam-se, o estudo de áreas afectadas por uma grande dispersão do garimpo in-formal penalizante (caso da amalgamação do ouro em sistemas fluviais) (Sá etal., 2006) e os estudos de impacte ambiental que acompanham os proces-

Figura4 – Exemplo de trabalhos pioneiros de geologia aplicada a SSM em Angola – o caso dos pegmatitos do Giraúl junto do Namibe. A - trajectórias estruturais correspondentes ao alongamento cartográfico de conjuntos pegmatíticos do litoral de Angola e indicações das mineralizações que lhes correspondem, com localização do conjunto pegmatítico situado entre os rios Girául e Bero representado em 4 B (π – pegmatito; π LCT – pegmatitos mineralizados com Li, Cs e Ta onde predomina a lepidolite); B - fac-simile de um mapa de Korpershoek (1960) para a Companhia Mineira

do Lobito, baseado na fotointerpretação do conjunto pegmatítico do Giraúl – no fac-simile são discerníveis os contor-nos dos filões pegmatíticos concordantes com as foliações regionais.

Figure4–ExampleofthepioneeringworksofgeologyappliedtoSSMinAngola–thecaseofGiraúlpegmatitesnearNamibe.A-Structuraltrajecto-riesofpegmatitefieldsofAngola’sseasideandindicationsofthecorrespondentmineralizations,togetherwiththelocationofpegmatitessituatedbetweentheriversGiraulandBero,representedin4B(π-pegmatite;πLCT-mineralizedpegmatitesLi,CsandTa–richwithlepidolite);B-“facsimile”of

aKorpershoekmap(1960)fortheLobitoMiningCompany,basedonthephoto-interpretationofGiraúlpegmatites–atthefacsimilereproductiontheoutlineofmajorpegmatiteoutcropsarevisible,followingregionalfoliation.

C. L. Gomes

74 A geologia prática em mineração de pequena escala

resultou em grande medida da fotointerpretação, após levantamento pormenorizado de algumas ocorrências chave (Korpershoek, 1960), prática que se generalizou, dadas as condições climáticas, geomorfológicas e geológicas, típicas do deserto do Namibe, as quais são extraordinariamente favorá-veis à análise distanciada e detecção remota.

b) Brasil, Minas Gerais1) a utilização de prospecção geofísica muito

localizada, por exemplo através de groundpenetratingradar (GPR), aplicada à detecção de gemas em ca-vidades miarolíticas (“bolsadas” e “caldeirões”), situadas no interior dos pegmatitos graníticos (Patterson & Cook, 2002), embora se tenha re-velado proveitosa em algumas situações de SSM – por exemplo, nos trabalhos subterrâneos da mina de Santa Rosa – gera numerosos indícios do tipo falso positivo e, por isso, não dispensa nem substitui a funcionalidade indiciadora dos guias estruturais e paragenéticos obtidos em contexto de aplicação de geologia intensiva;

2) nas jazidas aluvionares, em terraços e em leitos vivos fluviais, sujeitos a dragagem para re-cuperação do ouro, a localização dos melhores paleocanais e spots de concentração, dependia, e em larga medida continua a depender, da apli-cação empírica de constatações, explicáveis do ponto de vista sedimentológico, que podem ser posteriormente generalizadas.

c) MoçambiqueSendo o país lusófono com maior percen-

tagem populacional dedicada ao garimpo, em 2012, só nas províncias da Niassa, Cabo Del-gado, Zambézia e Nampula, existiriam cerca de 50 000 indivíduos envolvidos, directa ou indi-rectamente e sazonalmente, em actividades mi-neiras não regulares, ocupando-se da produção difusa de ouro e gemas.

No passado a actividade legal e regular de ASM foi objecto de uma abordagem exemplar no que respeita à prática de geologia intensiva, as-sociada à exploração por mão-de-obra intensiva, em vários jazigos pegmatíticos que produziam, berilo, mica, gemas e Nb-tantalatos (Betencourt Dias, 2001, 2004). Tal como já se antevê da lei-tura dos textos de Betencourt Dias (op.cit.), seria desejável que as práticas de garimpo ilegal fos-sem progressivamente substituídas por práticas legais de ASM, acompanhadas de monitorização geológica, para que se verificasse um convenien-te registo para estudo subsequente do carácter extraordinário, ou mesmo irrepetível, de alguns

aspectos estruturais e paragenéticos que são atra-vessados no decurso das escavações mineiras.

Em especial no caso de Moçambique, tem-se verificado também o desenvolvimento de métodos de prospecção específicos, adaptados às condições locais, baratos e baseados em mão-de-obra inten-siva. É o caso da prospecção com recurso a termi-teiras – “muchém” – usando a mineralometria, e a análise estrutural da distribuição das edificações de termitidae (Dias Pereira & Leal Gomes, 2010a, b).

Incidências conclusivas de um debate abrangen-te sobre prática geológica em SSM

Alguns factos a deduzir e aduzir a esta discussão são os seguintes:

• em países lusófonos a produção de gemas está essencialmente dependente de SSM;

• a produção de coltan também depende de SSM e no caso particular de Moçambique, a maior parte da produção dos últimos anos, deve-se essencial-mente ao garimpo e é escoada através de circuitos de comercialização mais ou menos informais;

• em SSM a produção depende muito de mão--de-obra intensiva;

• após alguns anos de experiência constata-se que, regularmente, a certificação de produtos e a se-gurança na comercialização (tendo como fonte o ga-rimpo), depende da análise paragenética e (em ter-mos gerais) a produção e produtividade regional e local crescem com a aplicação de geologia intensiva.

Em ASM, especialmente quando predomina a utilização de mão-de-obra intensiva, a monitori-zação geológica também intensiva é sem dúvida um factor determinante do sucesso e da validação de pressupostos e um guia do planeamento mineiro e da lavra lucrativa.

Agradecimentos

Aos revisores designados pela edição da Revista Geonovas pelo minucioso e efectivo contributo que prestaram ao melhoramento do texto. Ao Dr. Ber-nardo Reis por ter proporcionado a cópia primitiva do mapa geológico temático do Distrito Pegmatíti-co do Girául, para a Companhia Mineira do Lobi-to, o qual foi fac-similado para este artigo.

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Este artigo encontra-se redigido segundo o antigo Acordo Ortográfico.

C. L. Gomes

www.lneg.ptgeoportal.lneg.pt

Investigação para a Sustentabilidade

Investigação e Desenvolvimento no domínio da Energia e Geologia, promovendo a Inovação Tecnológica

O Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG) é um Laboratório do Estado, no Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, que faz investigação, demonstração e desenvolvimento tecnológico orientados para responder às neces--sidades da sociedade e das empresas.Apostando numa investigação sustentável, a par das melhores práticas internacionais, garante que as suas áreas de competência permitem uma resposta adequada às necessidades do setor empresarial.O LNEG tem consciência de que só o trabalho cooperativo e em rede poderá otimizar as competências de que é detentor, pelo que é parceiro ativo das principais redes e plataformas colaborativas em Energia e Geologia.O LNEG tem por missão promover a inovação tecnológica orientando a ciência e tecnologia para o desenvolvimento da economia, contribuindo para o aumento da competitividade dos agentes económicos no quadro de um progresso sustentável da economia Portuguesa.

Como instituição de I&D o LNEG assume, como primeiro objetivo, fazer investigação para as necessidades da sociedade, para o apoio às políticas públicas e para o desenvolvimento económico. No âmbito das atribuições decorrentes da estratégia e da política de desenvolvimento económico e social do governo português, funciona como interface de integração de tecnologia e resultados de I&DT junto do tecido empresarial. As diversas parcerias internacionais posicionam o LNEG como parceiro dinamizador da internacionalização e fonte de informação privilegiada nas suas áreas de intervenção.Colabora como consultor para as políticas públicas em diversas áreas, nomeadamente as da Energia e Geologia.A natureza das atividades do LNEG materializa-se em três tipos:

• Projectos de I&DT financiados, • Prestação de serviços e contratos com o tecido empresarial, • Apoio ao Estado nas vertentes de representação internacional, na prestação ao Governo de fundamentação de

Ciência e Tecnologia adequada às políticas setoriais, problemáticas transversais e de interface em problemas societais emergentes.

O LNEG desenvolve atividades de I&D nas seguintes áreas de intervenção:

• Sistemas de Produção de Energia• Eficiência Energética• Análise Energética• Tecnologias Inovadoras Estratégicas• Recursos Endógenos• Riscos Geológicos e Ambiente• Geologia para a Valorização do Território

O LNEG dispõe de uma rede de Laboratórios acreditados constituída por:

• Laboratório de Biocombustíveis e Ambiente• Laboratório de Ciência e Tecnologia Mineral• Laboratório de Energia Solar• Laboratório de Materiais e Revestimentos

Atividades

Missão

Áreas de I&D

associação portuguesa de geólogos 77geonovas n.º 27: 77 a 82, 2014

Relevo no âmbito da inventariação do património geológico português

D. I. Pereira* & P. Pereira

Centro de Geologia da Universidade do Porto, Departamento de Ciências da Terra da Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4710-057 Braga;

[email protected]; [email protected];

*autor correspondente.

Textoelaboradonoâmbitodo33.ºCursodeAtualizaçãodeProfessores(APG),CaldasdaRainha-11a13deJulhode2013.

1. Introdução

Em Portugal, como em muitos outros países, é dominante uma visão científica acerca da origem, idade e evolução do universo, da Terra e da vida, pensamento transposto para ensino. Contudo, em contradição, observa-se frequentemente uma visão quase dogmática, baseada nas ideias e dados que constam de manuais escolares e livros, perdendo--se frequentemente a relação com os dados que re-sultaram da leitura das rochas, do relevo e de ou-tros elementos da natureza.

É pois desejável que o ensino das Ciências da Terra tenha maior qualidade e uma contínua ligação dos modelos ensinados aos locais que fornecem os dados científicos, atribuindo a esses locais (geossí-tios e outros locais de interesse geológico) o valor científico e didáctico que merecem. A valoriza-ção e a divulgação dos geossítios são fundamentais, enfatizando a sua importância para o avanço e suporte do conhecimento científico.

Em seguida efectua-se uma breve e simplifica-da abordagem aos diferentes valores do património geológico em Portugal, de relevância nacional e in-

Resumo

A inventariação das geoformas e dos processos geomorfológicos foi realizada no âmbito do inventário do património geológico português. Este levantamento realizado com base no valor científico, constitui um instrumento fundamental para a adopção de medidas objectivas de Geoconservação. Os geossítios seleccionados possuem um valor didáctico asso-ciado e muitos deles revelam, igualmente, valor ecológico e cénico. Das 27 frameworks consideradas neste processo de inventariação, os temas “RelevoeDrenagemFluvialnoMaciçoIbéricoPortuguês”, “SistemasCársicos”, “ArribasActuaiseFósseisdoLitoralPortuguês”, “CostasBaixas” e “VestígiosdasglaciaçõesPlistocénicas”, são totalmente dedicadas ao relevo. Os temas “VulcanismodoAr-quipélagodosAçores” e “VulcanismodoArquipélagodaMadeira” identificam também um número significativo de geomorfossítios. No processo de inventariação do tema “RelevoeDrenagemFluvialnoMaciçoIbéricoPortuguês” foi adoptada a mesma metodologia de frameworks, procedimento que conduziu à definição de 5 temas e 20 subtemas. Este procedimento resultou na selecção de 37 geomorfossítios representativos da diversidade geomorfológica do Maciço Ibérico.

Palavras-chave: Património geológico; geossítio; geomorfossítio; geoforma; Maciço Ibérico.

Abstract

AlistofgeomorphositesresultingfromthePortuguesegeologicalheritageinventoryispresented.Thisinventorywasbasedexclusivelyonthegeosites’scientificvalueand it constitutesa fundamental tool for the implementationof geoconservationmeasures.The selectedgeomorphositesmayalsohaveeducationalvalueandmanyofthemrevealecologicalandaestheticvalues.27geologicalframeworkswereconsideredintheentireinventory.Fromthese,“Landforms and river network of the Portuguese Iberian Massif”,“Karst systems”,“Active and fossil coastal cliffs”,“Low coasts”,and“Vestiges of Pleistocene glaciations”areframeworksfullyrelatedwithlandformsandgeomorphologicalprocesses.Theframeworks“Volcanism of the Azores Archipelago”and“Volcanism of the Madeira Archipelago”alsocontainasignificantnumberofgeo-morphosites.5themesand20sub-themesweredefinedintheinventoryofthe“Landforms and river network of the Portuguese Iberian Massif”framework.Thisprocedureresultedintheselectionof37geomorphositesthatrepresentthegeomorphologicaldiversityintheIberianMassif.

Keywords: Geoheritage;geosite;geomorphosite;landform;IberianMassif.

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a fixação de um ecossistema. O valor estético está dependente dos avaliadores, embora seja comum o reconhecimento generalizado da beleza de muitos locais. O valor didáctico está sempre associado aos valores referidos anteriormente.

A constituição de Áreas Protegidas tem como ob-jectivo fundamental garantir a conservação de valores naturais. Diferentes tipologias de Áreas Protegidas pretendem alcançar objectivos mais específicos, como bons exemplos de harmonia entre valores naturais e culturais. Contudo, no essencial, deverá estar em causa a conservaçãodanatureza e em especial a geoconservação. Muitas das Áreas Protegidas em Por-tugal constituem casos de património geológico ou integram importantes geossítios (Pereira etal., 2010a).

A geoconservação é a vertente da conservaçãodanatureza dedicada à conservação do patrimóniogeológico. Aten-dendo à necessidade de exploração de recursos e à actividade humana, não é possível manter intacto o registo geológico e as formas do relevo em todo o planeta. Assim, é fundamental salvaguardar os me-lhores e mais valiosos exemplos do registo de mate-riais, formas e processos geológicos. A conservação e valoração patrimonial deve constituir objectivo de âmbito global, nacional, estatal ou local, de acor-do com a relevância dos geossítios. Este processo deve atender essencialmente ao valor patrimonial do geossítio, independentemente do seu potencial eco-nómico ou turístico.

A legislação constitui um instrumento funda-mental de suporte às acções de geoconservação, pelo que é recomendável um forte empenho de investigadores e técnicos das áreas das CiênciasdaTerra no sentido da introdução ou reforço da geoconservação na legis-lação. Seguindo bons exemplos como o observado, por exemplo em Inglaterra, países como Espanha e Portugal viram reconhecida nas leis de conservaçãodanatureza conceitos como geoconservação, patrimóniogeoló-gico e geossítio. Tal como na lei espanhola datada de 2007, em Portugal o Decreto-Lei 142/2008 reco-nhece a necessidade de inventariar e proteger geos-sítios a par das preocupações com a biodiversidade.

3. A Geomorfologia no âmbito do património geológico português

O inventário do património geomorfológico foi efectuado no âmbito do projecto “Identificação,carac-terização e conservação do património geológico: uma estratégiade geoconservação para Portugal”, financiado pela FCT (PTDC/CTE-GEX/64966/2006). Este projecto produziu um inventário de 322 geossítios de rele-vância internacional e nacional seleccionados com base no valor científico (Brilha etal., 2008). Aten-

ternacional. Apresentam-se os dados gerais relati-vos aos geossítios relacionados com o tema Geomorfologia e em particular com o tema RelevoeDrenagemdoMaciçoIbéricoemPortugal. Estes geossítios constituem excelentes locais para a abordagem de diversos conteúdos pro-gramáticos no âmbito das Ciências da Terra. Mui-tos desses locais têm também elevado valor estético e permitem abordar e relacionar diversos temas.

2. Valor e inventariação do património geológico

O valor científico constitui o valor fundamen-tal que justifica a geoconservação e no qual se deve basear a classificação legal de áreas protegidas. Da mesma forma que se protegem espécies biológi-cas raras ou em perigo, também locais geológicos seleccionados por critérios como raridade, repre-sentatividade e/ou vulnerabilidade, urgem medidas de protecção. Tal como a beleza de um animal não deve constituir um critério para uma maior atenção de conservação, também a beleza do objecto geoló-gico não deve constituir um critério científico em processo de geoconservação. Contudo, este facto não impede que também sejam tomadas medidas legais e técnicas de conservação de locais de ine-gável beleza, quer pelo seu valor cénico quer pelo consequente valor turístico e valor didáctico.

Nos casos em que está em causa o valor estético de um local ou área, é fundamental reclamar a impor-tância da Geologia e em particular da Geomorfologia, como elementos estruturantes da paisagem. A paisagem constitui um conceito ambíguo que se aplica, desde os locais mais naturais até ao meio urbano. Quando é reconhecido o valor estético de um local, ele não deve ser tratado como um jardim. A geoconservação deve garantir não só a conservação dos valores naturais, mas também a sua valorização e divulgação. Garan-tidas as medidas fundamentais de geoconservação, as áreas naturais de forte apelo estético têm enorme po-tencial para o desenvolvimento do geoturismo e con-sequentemente de actividades didácticas não formais. Aí, a Geomorfologia desempenha um papel fundamen-tal, na medida em que a paisagem e as geoformas são, na maioria dos casos, os motivos de maior atractividade.

Em síntese, o patrimóniogeológico (s.l.), constituído pelo conjunto de geossítios inventariados numa dada área ou região (Brilha, 2005), pode ser visto sob diferentes perspectivas de acordo com o seu valor. Diz-se que um geossítio tem valor científico quando é o melhor exemplo ou constitui uma ocorrência rara ou representativa de determinado processo geológico ou geomorfológico. Um geossítio tem valor ecológico quando a característica geológica ou geo-morfológica constitui o factor fundamental para

O relevo no âmbito da inventariação do património geológico português

associação portuguesa de geólogos 79D. I. Pereira & P. Pereira

dendo ao facto de estar em causa o valor científico, a inventariação recorreu ao princípio da definição de categoriasoucontextosgeológicos (frameworks) representati-vos da geodiversidade portuguesa, abrangendo di-ferentes tipos de património geológico (Brilha etal., 2008). A definição das 27 categorias temáticas de relevância internacional e nacional, sucedeu a uma primeira e importante etapa de definição das fra-meworks de relevância internacional (Brilha, 2005) e resultou de uma discussão aberta à comunidade científica. As 27 frameworks reúnem temas variados como por exemplo a estratigrafia e bacias sedimen-tares (e.g. NeoproterozóicosuperioreCâmbricodaZonaCen-tro-Ibérica, RegistoJurássiconaBaciaLusitaniana, BaciasTer-ciárias da Margem Ocidental Ibérica), paleontologia (e.g. Pegadas de DinossaurosnoOestedaPenínsulaIbéria), mi-neralizações e metalogenia (e.g. GeologiaemetalogeniadaFaixaPiritosaIbérica, MineralizaçõesauríferasemPortugal).

Este inventário constitui uma base fundamental para apoiar iniciativas de conservação da natureza e integra o SistemadeInformaçãodoPatrimónioNatural (SIP-NAT), sob a responsabilidade do InstitutodeConservaçãodaNaturezaeFlorestas (ICNF), como indicado na legis-lação sobre conservação da natureza (DL 142/2008).

No referido processo de inventariação foram selec-cionados 144 geossítios de âmbito geomorfológico (tam-bém designados geomorfossítios), integrados em 5 cate-gorias, nomeadamente (Pereira etal., 2013): “RelevoedrenagemfluvialnoMaciçoIbéricoportuguês” (37 geossítios), “Sistemascársicos” (38 geossítios), “Arribasactuaisefósseisdolitoral português” (7 geossítios), “Costas baixas” (7 geossí-tios), “Geoformasedepósitosglaciárioseperiglaciários”(16 geos-sítios), “VulcanismodoarquipélagodosAçores” (29 geossítios) e “VulcanismodoarquipélagodaMadeira” (10 geossítios). Essa selecção foi baseada em critérios como representati-vidade, raridade, diversidade, integridade e conhe-cimento científico. Embora muitos dos geomorfossítios inventariados estejam localizados, total ou parcial-mente, em áreas protegidas e alguns tenham também um estatuto de área protegida, é essencial assegurar a sua protecção e gestão adequada atendendo às suas especificidades como dimensão, estética e dinâmica, bem como ao seu elevado potencial geoturístico.

4. Relevo e Drenagem Fluvial no Maciço Ibérico Português

A categoria temática RelevoedrenagemfluvialnoMa-ciçoIbéricoportuguêsfoi definida com relevância inter-nacional (Brilha etal., 2008) após uma framework se-melhante ter sido eleita em Espanha com a mesma relevância (García-Cortés etal., 2001).

O Maciço Ibérico é a maior unidade morfo-tec-tónica da Península Ibérica e corresponde a cerca

de 70% do território continental português. Esta unidade, constituída por rochas metassedimenta-res proterozóicas e paleozóicas e abundantes grani-tóides afectados pela deformação cadomiana, varis-ca e alpina, constitui o núcleo mais antigo e rígido da Península Ibérica.

Desde a orogenia varisca, o Maciço Ibérico tem sofrido erosão, gerando, em alguns sectores, um relevo com declives suaves. A denudação envolveu uma sucessão de ciclos de erosão e meteorização, que deram origem a superfícies de aplanamento e níveis embutidos genericamente designados por MesetaIbérica. Devido às diferenças de resistência à meteorização e erosão do soco varisco, desenvol-veu-se no MaciçoIbérico um relevo de tipo apalachiano, caracterizado por cristas quartzíticas com orien-tação predominante NW-SE, que se destacam das amplas superfícies desenvolvidas em granitóides, xistos e metagrauvaques (Pereira, 2010b).

Durante o Cenozóico desenvolveram-se sobre o MaciçoIbérico sistemas fluviais, drenando quer para oci-dente (Atlântico) quer para oriente que contribuíram para o enchimento de bacias endorreicas. Nos sec-tores interiores do país é possível observar testemu-nhos que permitem a reconstituição da evolução dos modelos aluviais. Em alguns momentos, observaram--se mudanças paleogeográficas significativas devido a importantes soerguimentos tectónicos em sectores específicos, como na Cordilheira Central e nas Mon-tanhas Ocidentais, bem como ao longo dos desliga-mentos tectónicos NNE-SSW de Vérin-Penacova e Bragança-Vilariça-Manteigas (Pereira, 2010b).

No Plistocénico, a rede hidrográfica desenvol-veu um progressivo encaixe, particularmente pro-fundo no vale do Douro. Durante esta etapa de incisão a evolução dos vales fluviais foi controlada pelos factores litológicos, eustáticos, climáticos e tectónicos (Pereira, 2010b).

No âmbito da categoria temática - RelevoeDrenagemFluvialnoMaciçoIbéricoPortuguês- a selecção dos geossítios teve como objectivo a conservação de locais repre-sentativos de aspectos diversos do relevo e da evolu-ção e complexidade da rede de drenagem do MaciçoIbérico. Atendendo a esta diversidade, consideram--se 5 temas e 20 subtemas para enquadrar os geossítios com relevância científica nacional ou internacional, representando os aspectos geomorfológicos funda-mentais da paisagem (Pereira etal., 2010b).

Macro-geoformas residuais

O registo litológico e estrutural do ciclo varis-co tem forte implicação na espessura dos mantos de alteração, na actuação diferencial dos agentes

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erosivos e no rumo das geoformas residuais que se traduzem nos seguintes subtemas (Pereira etal., 2010b):

•Cristasquartzíticas,representativas de um relevodetipoapalachiano, com geossítios localizados em Mar-vão, Penha Garcia, Buçaco-Góis e Marofa;

• Inselbergs,representados pelo inselbergdeMonsanto(Fig. 1);

• Superfícies de aplanamento desenvolvidas em fases de maior estabilidade tectónica e de drenagem com fraco declive, visíveis nos geossítios panorâmicos seleccionados no âmbito dos subtemas anteriores.

Geoformas graníticas

Os granitóides ocupam uma parte significativa do Maciço Ibérico, revelando uma elevada varieda-de de geoformas de escala distinta, nomeadamente (Pereira etal., 2010b):

•Macro-geoformasgraníticas, representadas pelo In-selbergdeMonsanto(Fig. 1);

•Geoformasgraníticasdemédiadimensão, representadas pelos bornhardtdePenamedaeRocalva nas Serras da Pe-neda e do Gerês, respectivamente;

•Geoformasgraníticasdepormenor, relacionadas com o processo de meteorização e aspectos mineralógicos, geoquímicos e estruturais, bem representados no sector de CheiradaNoivanaSerradeMontesinho.

Geoformas tectónicas

O regime compressivo que se iniciou a partir de final do Cretácico provocou a diferenciação do re-levo em compartimentos tectónicos, intensamente

soerguidos a partir do Tortoniano. No Maciço Ibé-rico, a tectónica alpina ficou particularmente im-pressa em (Pereira etal., 2010b):

•Maciçossoerguidosdotipopop-up, representados pela Serra da Estrela;

•Compartimentossoerguidosdotipopush-up associados a desligamentos tectónicos de rumo NNE-SSW e NE--SW, representados pelas Serras de Alvão e Bornes;

•Depressõestectónicas, como as depressões da Vilari-ça (Fig. 2), Longroiva e Miranda do Corvo;

• Escarpas de falha como as da Vilariça, Lousã e Ponsul;

•Valesdefractura como o vale do rio Gerês.

Sedimentos cenozóicos

As unidades sedimentares cenozóicas são corre-lativas das diversas fases tectónicas alpinas que reavi-varam o relevo do Maciço Ibérico; estão conservadas em depressões tectónicas ou, na Meseta, e dispõem--se com reduzida espessura sobre o soco. O registo sedimentar e geomorfológico é fundamental para datar os eventos tectono-sedimentares, caracterizar a evolução da paisagem e da drenagem, bem como para interpretar a interacção da tectónica, do clima e do eustatismo no controlo da deposição (e.g. Cunha, 1992; Cabral, 1995; Cunha etal., 2000). Foram de-finidas como subtemas (Pereira etal., 2010b):

•Cretácico, com melhor expressão nas imediações de Coimbra;

•Paleogénico, representado em bacias como Nave de Haver, Longroiva e Castelo Branco;

• Neogénico, com áreas-chave nas imediações de Coimbra e de Miranda do Douro.

O relevo no âmbito da inventariação do património geológico português

Figura1– GeossítiodeMonsanto, seleccionado como mais re-presentativo das geoformas do tipo Inserberg/Monte-ilha.Figure1–Monsanto geosite,themostrepresentativelandformof

theInserbergtype.

Figura2– GeossítioValedaVilariça, um dos locais mais notáveis para análise e compreensão do relevo do Maciço Ibérico. Destacam-se a bacia com sedimentos cenozóicos, a escar-pa tectónica ativa, a superfície aplanada da Meseta e em último plano a crista quartzítica da Serra de Reboredo.Figure2–Vilariça Valley geosite,oneofthemostnotablesitestointerpretandunderstandtheIberianMassiflandscape.Itincludesthe

Cenozoicsedimentsandtheactivetectonicscarp.Furthermore,theMe-setaplateauandtheReboredoquartziteridgecanbeperceivedfromthere.

associação portuguesa de geólogos 81

Geoformas fluviais

As características e organização da rede fluvial ac-tual resultaram da conjugação de múltiplos aspectos, essencialmente relacionados com a herança varisca, a tectónica alpina e a evolução climática cenozóica. A progressiva incisão da rede fluvial deu origem a diferentes tipos de geoformas (Pereira etal., 2010b):

• Gargantas, com geossítios definidos no vale do Douro, entre Miranda do Douro e Pocinho (Fig. 3);

•Valesepigénicos, representados pelas PortasdeRodão;•Cascatas, representadas pelas FisgasdoErmelo (rio

Olo), Frecha da Mizarela (rio Caima, Fig. 4), Faia daÁguaAlta (Douro) e PulodoLobo (Guadiana);

•Meandrosencaixados, representados pelo meandrodeVale Meão (rio Douro), meandros do Alva e meandros doZêzere em Oleiros;

•Terraçosrochosos representado pelo terraçodoPulodoLobo (rio Guadiana, Fig. 5);

•Terraçosfluviais, com geossítios nos vales dos rios Minho (V. N. De Cerveira), Douro (Pocinho) e Tejo (Vila Velha de Rodão).

No Maciço Ibérico encontram-se igualmente in-ventariados diversos geossítios seleccionados no âm-bito da categoria “Sistemascársicos”, bem como 16 geos-sítios representativos da categoria temática “Vestígiosdeglaciaçõesplistocénicas” (Pereira etal., 2010; 2013). Em Portugal, embora ocorram vestígios de proces-sos periglaciários a baixa altitude, as mais relevan-tes geoformas e depósitos relacionados com o frio encontram-se nas montanhas mais altas, nomeada-mente na Serra da Estrela (Fig. 6) e nas montanhas do Minho. Estes aspectos traduzem-se principal-mente por geoformas glaciárias de erosão (vales em

Figura6– GeossítioValeGlaciáriodoZêzere apoiado por painel interpretativo, no Parque Natural da Serra da Estrela.Figure6–Zêzere Glacial ValleygeositeintheSerradaEstrela

NaturalPark,withaninterpretivepanel.

D. I. Pereira & P. Pereira

Figura3– GeossítioSãoJoãodasArribas(Aldeia Nova, Miran-da do Douro), um miradouro sobre o canhão fluvial

no sector do Douro Internacional.Figure3–São João das Arribas geosite(AldeiaNova,

MirandadoDouro),aviewpointabovetheDourorivercanyonintheInternationalDouroNaturalPark.

Figura4– GeossítioFrechadaMizarela (Arouca), knick-point no rio Caima, em resposta ao levantamento tectónico da

Serra da Freita e ao contraste de resistência à erosão no contacto xisto-granito.

Figure4–Frecha da Mizarela geosite(Arouca),aknick-pointintheCaimaRiverinducedbythetectonicupliftoftheFreitaMountain

andthelocalschist-granitecontact.

Figura5– GeossítioPulodoLobo no rio Guadiana, um caso notável de terraço rochoso e de knick-point que eviden-cia o processo de erosão remontante controlado pelas

oscilações eustáticas.Figure5–Pulo do Lobo geosite,astrathterraceandknick-

-pointintheGuadianaRiver,remarkableexampleofheadwarderosionprocessescontrolledbyeustaticoscillations.

82 O relevo no âmbito da inventariação do património geológico português

U, vales suspensos, circos, estrias, polimentos), geoformas glaciárias de acumulação (moreias), de-pósitos glaciários (tills glaciários e subglaciários) e depósitos periglaciários (acumulação de crioclas-tos). A importância destes vestígios em Portugal tem sido reconhecida como de elevado valor cien-tífico, testemunhando condições específicas para a ocorrência de uma dinâmica glaciária de baixa al-titude, no contexto das glaciações quaternárias das montanhas mediterrâneas.

5. Conclusões

Portugal dispõe de um inventário de geossítios derivado de um projecto que contou com o en-volvimento de um elevado número de especialistas e que adoptou uma metodologia cientificamen-te reconhecida. Os geossítios são representativos dos temas fundamentais da Geologia de Portugal, e entre eles, os geomorfossítios são representativos das diferentes formas de relevo e dos processos geomorfológicos. Estes geossítios, para além do va-lor científico que justificou a sua selecção, possuem um elevado valor didáctico. No sentido do melhor aproveitamento deste valor urge desenvolver medi-das para a sua divulgação e valorização.

No que respeita à temática do Relevo e drenagemfluvial do Maciço Ibérico português, a aplicação de uma metodologia de definição de temas e subtemas permitiu sistematizar as geoformas e os processos geomorfológicos, bem como seleccionar geossítios representativos dos diferentes aspectos que com-põem o relevo. A divulgação e valorização destes geossítios deverão constituir passos determinan-tes no sentido de promover a sua conservação e o seu uso didáctico.

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Este artigo encontra-se redigido segundo o antigo Acordo Ortográfico.

associação portuguesa de geólogos 83geonovas n.º 27: 83 a 94, 2014

Janelas sobre mundos extintosReflexões sobre comunicação em Paleontologia

J. M. Brandão1,*, P. M. Callapez2,3, V. F. Santos3,4 & N. P. C. Rodrigues4

1Centro de Estudos de História e Filosofia da Ciência, Universidade de Évora, Palácio do Vimioso,

Largo Marquês do Marialva, 8, 7000-554 Évora / Rede HetSci; 2Departamento de Ciências da Terra, Universidade de Coimbra;

3Centro de Geofísica da Universidade de Coimbra; 4Museu Nacional de História Natural e da Ciência, Universidade de Lisboa;

*[email protected]; autor correspondente.

Aexposição,compostadeformaartísticaconverte-se,emsentidoestrito,numacriaçãoculturalqueactuanãosóatravésdoseu

conteúdocientíficocomotambémdasuaeloquênciaestética.

Swiecimski, 1987.

Introdução

Durante milénios, as petrificações naturais com formas de seres vivos foram associadas a crenças e lendas, servindo como ornamentos, fetiches ou ta-lismãs (Torrens, 1985) e só em meados do século XVIII, se consolidou a ideia da sua origem bioló-gica. Os “petrefactos” ou fósseis tal como hoje en-

tendemos, constituem o único registo tangível da evolução dos organismos expressa em contexto es-tratigráfico e geográfico e são considerados como a mais simples e fundamental das ferramentas de investigação em Paleontologia, constituindo, para os cientistas e para os não especialistas, uma espécie de janela para os mundos extintos.

Independentemente das interpretações de que fo-ram alvo estas “mineralizações de mundos defuntos”, como lhe chama Jacques Barrau (1985), pela grande curiosidade que despertavam, cedo se tornaram obje-tos colecionáveis; encontram-se desde as jazidas pré--históricas às prateleiras da Naturalia dos gabinetes de curiosidades seiscentistas e setecentistas e, posterior-

Resumo

Pela curiosidade despertada, os fósseis cedo se tornaram objetos colecionáveis e motivo de discussões filosóficas so-bre a história da Terra e da vida. A importância naturalística crescente desencadeou, sobretudo a partir do século XVIII, a formação de grandes coleções que serviram de base aos trabalhos que impulsionaram a Paleontologia e a Estratigrafia, durante o século seguinte. A sua representação figurativa, tornada ferramenta nas obras impressas de História Natural, foi também adotada nas exposições a partir de finais do século XIX. Este contributo conduziu a alterações substanciais no discurso museológico tradicional, até então centrado na observação massiva de exemplares dispostos segundo cri-térios taxonómicos ou estratigráficos, adicionando aos espécimes a sua representação pictórica em contexto paleoam-biental. Através desta contextualização, os fósseis emergiram como verdadeiras “janelas de Magritte” sobre os mundos extintos, em cenários que a Paleontologia procura recriar numa aceção científica e iconográfica.

Palavras-chave: Paleontologia; fósseis; museus; coleções; transposição museográfica.

Abstract

Asasubjectofcuriosity,fossilssoonbecomecollectiblesandamotiveofphilosophicaldiscussionsaboutthehistoryofEarthandlife.EspeciallyfromtheXVIIIcenturyonwards,theirgrowingnaturalisticimportanceresultedontheformationoflargecollections,whichestablishedabasisfortheworkthatputforwardtheXIXcenturyPalaeontologyandStratigraphy.TheirfigurativerepresentationinprintedworksofNaturalHistorywasusedasaresourceandadoptedinexhibitionssincetheendofthatcentury.Thiscontributionledtosubstantialchangesinthecustomarymuseologicaldiscourse,previouslyfocusedonthemassiveobservationofspecimensarrangedbytaxonomicorstratigraphiccriteria,andaddingtothemapictorialrepresentationoftheirpaleoenvironmentalcontext.Throughthesecriteriafossilsemergedastrue“Magritte’swindows”overtheextinctworlds,inscenariosforwhichPaleontologyrecreatesascientificandiconographicmeaning.

Keywords: Palaeontology;fossils;museums;collections;museographictransposition.

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A interpretação mágica das petrificações perdeu importância durante a Renascença, quando a ob-servação metódica e a dedução lógica, precursoras do pensamento cartesiano substituíram, pouco a pouco, um ideário secular baseado na crença. Cé-tico quanto a antigas teorias impostas pela doutrina vigente, Leonardo da Vinci (1452-1519), aquando da descoberta de conchas de moluscos marinhos na abertura de canais do rio Pó (Itália), cerca de 1508, não hesitou em reconhecer àqueles restos petrifica-dos uma natureza orgânica, dada a sua semelhança morfológica com species mediterrânicas atuais, o que vindo de um dos mais reconhecidos espíritos dedi-cados às artes e à ciência, mereceu a maior credi-bilidade. Georgius Bauer [Agricola] (1494-1555), especialista em Mineralogia e Arte de Minas, tam-bém admitia que os fósseis resultavam de seres vivos, embora postulasse que a sua formação resultaria da ação de um suco lapidificante (succuslapidescens), que emergia da terra e petrificava os organismos.

Nas décadas seguintes, as ideias sobre a origem biológica dos fósseis difundiram-se através da Eu-ropa, porém, enquanto se esbatia o seu carácter he-

mente, organizados com fins científicos em acervos museológicos. Estima-se que existam atualmente no mundo cerca de 275 milhões de exemplares conserva-dos em coleções públicas e privadas (Allmon, 1997)1, com fins científicos, culturais ou mesmo lúdicos.

Considerando a importância destas coleções para a difusão do conhecimento em Paleontolo-gia, os autores refletem, no presente texto, sobre a sua apresentação em contexto museológico e sobre a sua interpretação mediante ilustrações e repre-sentações pictóricas.

De curiosidade natural a documento científico

Os filósofos gregos terão sido os primeiros a referirem-se aos fósseis como sendo restos de seres vivos que não tinham sobrevivido, falhas da gesta-ção no ventre da “mãe Natureza”, admitindo-se, por então, a tese de que a vida brotava espontanea-mente da Terra.

Durante a Idade Média, grande parte do conhe-cimento que se possuía sobre os objetos geológicos era ainda a herdado das escolas helénicas de Aris-tóteles (384-322 a.C.) e Plínio (o Velho) (23-79 d.C.); não se efetuava a distinção entre minerais, rochas e fósseis, considerados como produtos na-turais e genericamente designados por fossilis (tudo o que está enterrado no solo). Propalada pelo via-jante e médico islâmico Avicena (980-1037) e ree-laborada durante o século XIV, vingava a teoria - que perdurou durante vários séculos - de que os fósseis se deviam a uma “virtude” (vis plastica) ou fluido petrificante (succus lapidificatus) que os for-maria acidentalmente no solo. Na realidade, esta crença na “geração espontânea” apenas foi refutada em definitivo graças às experimentações científicas de Louis Pasteur (1862).

Após a revolução da tipografia proporcionada pela invenção de Gutenberg (1398-1468), come-çaram a circular na Europa diversos tratados co-nhecidos genericamente como lapidários, dedi-cados aos minerais e gemas, onde se enfatizavam, sobretudo, as propriedades mágicas e medicinais que se supunha estes possuírem. Das diversas obras de maior divulgação disponíveis nas universidades europeias da época, merece referência particular a do naturalista suíço Conrad Gesner (1516-1565), “De rerum fossilium, lapidum et gemmarum maxime, fuguris etsimilitudinisliber…”2. Embora as ilustrações já fossem amplamente usadas noutras áreas da História Na-tural, esta obra é apontada como pioneira no uso de xilogravuras elaboradas por gravadores a partir de desenhos e aguarelas (Fig. 1), para complemen-tar as descrições de fósseis (Rudwick, 1987)3.

Figura1– Página ilustrada da obra de Conrad Gesner publicada em 1565. Rep. de Fejfar, 1989.

Figure1–IllustratedpageoftheworkofConradGesnerpublishedin1565.Rep.fromFejfar’s,1989.

Janelas sobre mundos extintos. Reflexões sobre comunicação em Paleontologia

associação portuguesa de geólogos 85J. M. Brandão, P. M. Callapez, V. F. Santos & N. P. C. Rodrigues

tes ossos de “gigantes fósseis” ver-se-iam transfor-mados em restos de quadrúpedes desconhecidos, à medida que se desenvolvia a anatomia comparada.

Os trabalhos do médico e anatomista Niels Stensen [Nicolaus Steno] (1638-1686) resultaram noutro impulso considerável para este progresso de saberes relativos aos fósseis e aos processos de fos-silização. Com efeito, ao dissecar a cabeça de um grande tubarão branco, constatara que os dentes desse animal eram análogos aos glossopetrae, desig-nação atribuída aos dentes fósseis isolados, que até então se pensava serem línguas de serpente petri-

rético, acentuava-se a convicção de que os fósseis representavam restos de organismos transportados e depositados com os sedimentos ao tempo do ca-taclismo diluviano, salvaguardando-se assim a cro-nologia bíblica numa perspetiva criacionista.

Durante o século XVII o valor dos fósseis en-quanto documento científico sofreu novo impulso, dada a necessidade de se reinterpretar convincen-temente a descoberta de ossadas de grandes dimen-sões, até então atribuídas a colossos mitológicos (Fig. 2)4. “Laicizados [e] desumanizados no século XVIII”, como sublinha Margaret Lopes (2005), es-

Figura2– Interpretações das ossadas fósseis de grandes mamíferos, representadas pelo jesuíta Athanasius Kircher (1601-1680), no seu Mundussubterraneus (1664-1678). Sublinhe-se que Kircher manifestava sérias reservas sobre as proporções dos supostos “gigantes” (Buffétaut, 1991; Lopes, 2005). Acessível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/

Ficheiro:MundusSubterraneus.jpg, 20/09/2013.Figure2–InterpretationsofthefossilbonesoflargemammalsfiguredbytheJesuitAthanasiusKircher(1601-1680)inhisMundus subterra-neus(1664-1678).ItshouldaddupthatKircherhadmanydoubtsabouttheproportionsofthese“giants”.Availablein:http://pt.wikipedia.org/

wiki/Ficheiro:MundusSubterraneus.jpg,20/09/2013.

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No domínio mais restrito da Paleontologia, é incontornável a referência à obra de James So-werby (1757-1822), naturalista, autor, entre outros trabalhos por si ilustrados e coloridos, da MineralConchology of Great Britain (1812)7, catálogo exaustivo em vários volumes, dos invertebrados fósseis de Inglaterra, publicado ao longo da longa carreira e continuado pelos filhos, também naturalistas. Esta obra terá sido certamente, um dos grandes suportes aos trabalhos pioneiros de William Smith (1769-1839), no estabelecimento da correlação de estratos sedimentares com base no mesmo conteúdo fossi-lífero, pilar fundamental da Estratigrafia.

Em França, Jean-Baptiste de Monet [Cheva-lier de Lamarck] (1744-1829) elevou a Botânica, a Zoologia e a Paleontologia ao estatuto de ciên-cias modernas, preconizando o transformismo na sua PhilosophieZoologique (1809) e descrevendo e fi-gurando centenas de novas espécies em trabalhos monumentais, de que é exemplo a Histoirenaturelledesanimauxsansvertèbres (1815-1824). Por sua vez, Geor-

Figura3– Estampa do Litofilácio do naturalista galês Edward Lhuyd (1660-1709).

Figure3–PlatefromEdwardLhuyd’s(1660-1709)Lithophylacii.

Janelas sobre mundos extintos. Reflexões sobre comunicação em Paleontologia

ficadas. Steno não só demonstrou assim, de forma convincente, a origem orgânica dos fósseis, como também evidenciou que os estratos onde estes se encontravam aprisionados se tinham formado pela deposição dos materiais em suspensão nas águas, retomando algumas das ideias já aventadas por Da Vinci ao admitir que as pedras estratificadas das montanhas eram todas camadas de argila, deposita-das umas sobre as outras pelas cheias dos rios. Esta e outras das suas observações constituem uma an-tevisão do “princípio da sobreposição das camadas” que Leonardo terá então compreendido.

O Litofilácio (LithophylaciiBritanniciIchnographia) de Edward Lhuyd (1660-1709), colecionador de fós-seis e curador do Ashmolean Museum em Oxford5, porventura menos divulgado, é considerado como o mais antigo catálogo de fósseis do Reino Unido. Pu-blicado em 1699 graças ao suporte financeiro de um grupo de amigos do naturalista, entre os quais Isaac Newton (1643-1727) e Hans Sloane (1660-1753), o Litofilácio cumpria a dupla função de catálogo das coleções reunidas sobretudo graças ao seu empenho pessoal, e de guia de campo destinado aos natura-listas amadores que quisessem determinar rapida-mente os seus achados (Hellyer, 1996). Para isso, lado a lado com as descrições, Lhuyd disponibilizou um elevado número de estampas, em que figurou um vasto lote de exemplares de fósseis animais e ve-getais incorporados no acervo do museu (Fig. 3).

A partir do século XVIII, numa época em que as primeiras tabelas cronostratigráficas ainda se en-contravam por definir e a génese dos fósseis era lida à escala humana e reportada ao Dilúvio, começou finalmente a ser compreendida a sua importância para a história da Terra e da vida, apesar de sub-sistir alguma relutância em atribuir uma nature-za orgânica a formas muito diferentes das atuais. Em paralelo, ganhava consistência o colecionismo científico, alargado no contexto do Iluminismo e do Enciclopedismo pelo recurso crescente a cor-respondentes, viajantes e marchands especializados, assim como pelo acesso a publicações de grande impacto, profusamente ilustradas, que testemu-nham os esforços dos naturalistas da altura, na descrição e classificação das produções naturais. Destacam-se apenas, de entre muitas outras obras em que se fundamenta o edifício epistemológico da História Natural, o Systema Naturae de Carl von Linné [Lineu] (1707-1778)6, editado desde 1735, e a Histoire Naturelle de Georges Leclerc [Conde de Buffon] (1707-1788), publicada entre 1749 e 1788. Este último, contrariando a doutrina vigente, es-peculou sobre a idade da Terra, a que atribuía mais do que os 6.000 anos sugeridos pela Bíblia.

associação portuguesa de geólogos 87

da criação” e o catastrofismo associado ao Dilúvio acabaram por ser refutados pela generalidade da comunidade científica e destronados, passando os fósseis a ser definitivamente encarados como teste-munhos da evolução e com elevado valor científico.

O conhecimento em Paleontologia progrediu, também, de forma notável, com os trabalhos me-tódicos de Alcide d’Orbigny (1802-1857) sobre os fósseis de França, descritos e agrupados em obras notáveis e de grande difusão internacional, como o foram, entre outras, a PaléontologieFrançaise(publi-cada desde 1840, em parte póstuma), o ProdromedePaléontologie Stratigraphique (1850) e o Cours élémentaire[de Paléontologie] (1849), publicado aquando da sua nomeação para o Museu de História Natural de Paris. Verdadeiro repositório da Paleontologia sis-temática e estratigráfica, a Salled’Orbigny do Museu de História Natural de Paris ainda hoje conserva as suas coleções, naquele que é um dos locais de culto para esta área da ciência.

Da abundância à relevância

O estudo e o ensino da Filosofia Natural fo-ram desde sempre apoiados pela manipulação de coleções de exemplares naturalizados, herbários e amostras geológicas, constituídas no seio dos ga-binetes universitários e museus que se multiplica-ram por todo o mundo durante a segunda metade do século XIX. O principal objetivo desses museus era, por conseguinte, a representação exaustiva da diversidade das produções dos três Reinos lineanos da Natureza, evidenciando ligações e dissemelhan-ças, tópicos que constituíam – em paralelo com a problemática da origem dos fósseis – uma das prin-cipais preocupações dos naturalistas, aguçada pe-las viagens de exploração nos novos mundos. Tais propósitos levaram à constituição de enormes cole-ções, sem as quais, sublinhe-se, seria difícil imagi-nar a construção do conhecimento em Taxonomia e Sistemática, domínios aos quais a abundância de espécimes era de importância crucial. Este pro-pósito persistiu ao longo de todo o século XIX, à medida que a descoberta geográfica e subsequente colonização das ilhas da Oceania e do interior de África e da Austrália prosseguia.

Embora desde os Gabinetes de Curiosidades seiscentistas, as produções naturais fossem já me-recedoras de seções próprias, a apresentação dos exemplares fazia-se, em regra, sem que se procu-rasse um princípio natural orientador, seguindo apenas as preferências pessoais –estéticas ou de ou-tra ordem – dos seus organizadores, ou os condi-cionalismos de espaço e mobiliário. A organização

ges Cuvier (1769-1832) e Alexandre Brongniart (1770-1847), adeptos da doutrina do imutabilis-mo das espécies, cujo desaparecimento explicavam como consequência de grandes catástrofes geológi-cas, contribuíam para os fundamentos da Zoologia e Paleontologia de vertebrados e sua importância estratigráfica. Cuvier destacou-se por ter demons-trado a possibilidade de reconstituição de animais completos a partir do achado de peças esqueléti-cas isoladas, através da comparação funcional com o observado em espécies similares e contemporâ-neas. Este é um processo de suma importância para o estudo dos fósseis, que lançou as bases da anato-mia comparada e o método de figuração ilustrada e recriação dos achados fósseis. Sublinhe-se, por exemplo, a contribuição na determinação de um fragmento cranial descoberto em Maastricht, em 1764, atribuído a um crocodilo, mas pertencente, afinal, a nova espécie de grande “lagarto marinho”, posteriormente designado por Mosasaurus (Fig. 4). Também ficou famoso o estudo do esqueleto do emblemático “animal do Paraguai” (megatério), descoberto em 1788 nos arredores de Buenos Aires e enviado para Espanha, onde foi incorporado nas coleções do Real Gabinete de Historia Natural, em Madrid8. Este esqueleto, alvo da atenção de diver-sos naturalistas até ao estudo de Cuvier, terá sido um dos primeiros a ser montado na posição que se supunha ter podido ter em vida (Buffetaut, 1991).

A aproximação às modernas interpretações da história geológica chegou com Charles Lyell (1797-1875), ao universalizar o Uniformitarismo de James Hutton (1726-1797) nos Principles of Geology (1832-1834). Com a publicação, em 1859, dos fundamen-tos basilares do evolucionismo em “A origem das es-pécies”, de Charles Darwin (1809-1882), a “ordem

J. M. Brandão, P. M. Callapez, V. F. Santos & N. P. C. Rodrigues

Figura4– Descoberta do crânio de Mosassauro na pedreira St. Pietersberg (Maastritch). Acessível em:

http://en.wikipedia.org/wiki/File:MosasaurDiscovery.jpg, 20/09/2013.

Figure4–DiscoveryoftheMosasaurskullinSt.Pietersbergquarry(Maastritch).Availablein:http://en.wikipedia.org/wiki/

File:MosasaurDiscovery.jpg,20/09/2013.

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& Press, 2001). Outros naturalistas ousavam pro-por a separação das coleções destinadas à investiga-ção, das destinadas à instrução do público não es-pecialista, devendo estas reunir apenas um número restrito de espécimes para que cada objeto pudesse ser claramente visto, em expositores cientificamente corretos, atrativos e fáceis de entender (id.ibid.).

A generalidade dos museus contemporâneos as-sume intencionalmente esta dualidade funcional, por razões que se prendem, por um lado, com a sua função social e de mediador cultural, questão cen-tral ligada à acessibilidade intelectual dos materiais disponibilizados e, por outro, com o papel de repo-sitório científico destinado a um grupo específico de utentes11. O recurso a reconstituições desenhadas e a modelos elaborados a partir da interpretação dos achados paleontológicos, processo que, em regra, acompanha a investigação, teve o melhor acolhi-mento por parte de alguns artistas que contribuíram para a realização das grandes exposições universais iniciadas em Londres, em 185112 (Fig. 5). Nos mu-seus em que as preocupações educativas se acentua-ram de forma mais vincada, foi sentida a necessidade de proporcionar outros documentos ilustrativos da Natureza capazes de captar e prender a atenção dos visitantes, ao mesmo tempo que, de forma sublimi-nar, pudessem condicionar e dirigir os modos de ver e apreender. Proporcionava-se, então, a observação de esqueletos montados de dinossauros, mamíferos e outros animais extintos, na posição anatómica que

dos exemplares segundo lógicas científicas decor-reu dos trabalhos de Lineu e subsequentes, os quais permitiram sistematizar os espécimes segundo ma-trizes baseadas na subordinação das características anatómicas internas e externas, padrões de orga-nização revistos na sequência da difusão das teorias evolucionistas. Refletia-se assim a “nova concepção do mundo natural” (Alberch 1995).

O fulcro das apresentações de base taxonómica residia no testemunho individualizado do espéci-me, acompanhado apenas por uma etiqueta com o nome científico, algumas vezes também com a procedência ou a unidade estratigráfica correspon-dente no caso dos fósseis, transmitindo assim uma visão muito limitada do mundo natural (Hernán-dez, 1998), consonante, porém, com os paradig-mas científicos vigentes.

Em consequência destes modelos de organi-zação, profundamente vinculados à investigação e ao ensino da História Natural que vingaram até meados da segunda metade do século XX, muitos museus mantiveram, até há poucos anos, exposi-ções muito densas e estáticas, por assim dizer, ver-dadeiros depósitos de materiais etiquetados, onde a abundância superava quaisquer outros desígnios. Miles etal,1982) referiam-se-lhes dizendo que “…enquanto o especialista devia deliciar-se com esta abundância, o leigo […] incapaz de apreciar dema-siadas diferenças subtis entre uma razoável massa de objetos semelhantes, acharia a exposição perple-xa e visualmente monótona”. Contudo, desde fi-nais de setecentos que se esboçavam tentativas para conferir um papel educativo às exposições; refira--se, como passo importante nesse (novo) enten-dimento, a exposição das coleções de Hans Sloane em Montagu House, Bloomsbury, Grã-Bretanha, desde 17599; no entanto, a consolidação da ideia de museus ao serviço da “instrução pública” só se afirmaria na esteira da criação do Museu de Histó-ria Natural de Paris (1793) e do Conservatoire des Arts et Métiers de Paris (1794)10, no contexto da democratização republicana.

Para Richard Owen (1802-1892), o eminente anatomista e paleontólogo britânico que orientou a instalação das coleções de História Natural do “Bri-tish” no edifício de South Kensington, a “função pública” do museu cumpria-se com um grande es-tabelecimento onde todas as espécies e variedades estivessem reunidas e a sua comparação fosse pos-sível, através do treino da observação de exemplares expostos e convenientemente identificados; contu-do, esta postura, de resto comum a outros naturalis-tas contemporâneos, fez emergir a discussão sobre a utilidade de expor, ou não, toda a coleção (Thackray

Figura5– Gravura da época com uma vista do ateliê do escultor Benjamin Waterhouse Hawkins (1807-1894),

aquando da preparação das réplicas de dinossauros exi-bidas no Palácio de Cristal, na exposição universal de

Londres (1851). Acessível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Central_Park_studio.jpg, 20/09/2013.

Figure5–ContemporaryengravingwithaviewfromthestudioofthesculptorBenjaminWaterhouseHawkins(1807-1894)dur-

ingthepreparationofdinosaurreplicasdisplayedintheCrystalPalaceattheUniversalExhibitionofLondonin1851.Availablein:http://

pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Central_Park_studio.jpg,20/09/2013.

Janelas sobre mundos extintos. Reflexões sobre comunicação em Paleontologia

associação portuguesa de geólogos 89

se assumia ser correta (Fig. 6), ou de reconstituições de cenas vivas, mediante o recurso a representações pictóricas, atividade que tem vindo, desde há alguns anos, a consolidar-se e ser designada por paleoar-te13 e que, de certa forma, culmina a investigação (Correia, 2012). Sublinhe-se que estas reconstitui-ções supõem uma responsabilidade partilhada en-tre cientistas e artistas, tendo os fósseis como base estrutural “e o conhecimento científico enquanto elemento modelador da realidade passada” (id.ibid.).

O sentido estético do grafismo foi sendo apura-do pouco a pouco, tendo em vista a potenciação do discurso museológico, tendendo nalguns casos, se bem que numa partilha de responsabilidades en-tre os profissionais da área da Ciência e os designerse ilustradores, “para uma certa espécie de criação artística” (Stránski, 1978). Esta tendência foi par-ticularmente sentida na ilustração de divulgação, representando ambiências e comunidades paleo-biológicas. Contudo, uma leitura diacrónica des-tas reconstituições, bem como das representações figurativas concebidas para exposições, permite concluir que muitas vão ficando desatualizadas ao longo do tempo, ao ritmo das (novas) descobertas;

J. M. Brandão, P. M. Callapez, V. F. Santos & N. P. C. Rodrigues

Figura6– Reconstituição do esqueleto da tartaruga gigante Archelonischyros descoberta em 1895 na formação de Pierre Shale (South Dakota, E.U.A.). Yale Peabody

Museum. Acessível em: http://www.oceansofkansas.com/Turtles/ArchelonYPM3000.jpg, 20/09/2012.

Figure6–SkeletonreconstitutionofthegiantturtleArchelon Ischyrosdiscoveredin1895,inthePierreShaleFormation(South

Dakota,USA).YalePeabodyMuseum.Availablein:http://www.oceansofkansas.com/Turtles/ArchelonYPM3000.jpg,20/09/2012.

são disso inúmeros testemunhos, sobretudo no que respeita aos vertebrados14.

Neste contexto, delineado o discurso expositivo, são em regra selecionados por entre os exemplares bem preservados e sem problemas de conservação, aqueles que conciliem simultaneamente os neces-sários requisitos taxonómicos, estratigráficos ou de relevância histórica, e possam contribuir, de alguma forma, para o desenvolvimento da linguagem plásti-ca da exposição (Hernández, 1998) ou, como refe-re Bergeron (1994), sem que certas peças, “embora mostradas enquanto objetos científicos sejam pri-vadas das suas características de beleza ou raridade”.

A observação do comportamento dos públicos na exposições mostra que, apesar de tudo, o que acaba por sobressair são as peças que se destacam pelas suas peculiaridades e cujo poder de atração, não raras vezes, constitui, por si só, a justificação da visita. Estão nestas circunstâncias certos “grupos fa-róis”, como os dinossauros, os grandes mamíferos e os hominídeos, potenciados pela mediatização de que têm sido objeto. Este fenómeno fora já cons-tatado em finais do século XIX por Francisco Mo-reno (1852-1919), naturalista, explorador e dire-tor do Museu de La Plata (Buenos Aires) – já então detentor de um considerável acervo da megafauna plistocénica das pampas argentinas – , que chegou a defender que o poder de atracção de certos objetos deveria ser um critério prioritário na organização das exposições, além de que a sua disposição nas sa-las deveria realizar-se de forma a poderem ser ple-namente apreciados pelo público (Francisco More-no, 1891, apud. Lopes & Murriello, 2005).

Apresentação e transposição

Na generalidade, os museus lidam com obje-tos retirados do seu contexto original, aos quais se procura dar um novo sentido e significado, aliando ao seu valor material e científico, um valor ima-terial que permita a sua transposição para os con-textos originais, ou seja, situá-los no domínio da interpretação do mundo natural. O veículo para tal desiderato é a apresentação das coleções - a expo-sição -, que embora não esgote a comunicação em ambiente museal, continua a ser, como enfatizava Georges Henri Rivière (1897-1985), “a mais ade-quada via para estabelecer o diálogo entre o museu e o público” (Rivière, 1989).

A exposição é um processo criativo que recorre a uma linguagem multimodal, cujo objectivo é a pro-dução de uma narrativa ou discurso museológico, que comunica uma ou mais mensagens (cognitivas, afetivas ou ambas) em torno de objetos, realidades

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Enquanto dispositivo museográfico, o diorama consegue reunir e fundir visualmente a represen-tação gráfica (ilustração do ambiente e ilustração analítica de taxa) com a figuração dimensional (modelação de taxa e do substrato), reforçando--se a mediação da interpretação pela apresentação dos espécimes em contexto de integração sinergé-tica, recorrendo a uma gama alargada de emissores sensoriais, de percepção táctil e auditiva. Porém, tenha-se em boa nota que o propósito da transpo-sição museográfica não é propriamente o de apre-sentar a realidade nas suas múltiplas dimensões, mas sim, como referia Jean-François Lyotard (L. apud. Thomson, 2002) o de“inventar alusões re-presentativas do que não pode ser apresentado”.

Não obstante estas limitações, existe sempre uma fundamentação científica subjacente ao acto de recriar “janelas de Magritte”16 sobre um passado tornado irreversível pela dimensão tempo. Esta ad-vém da aplicação do paradigma do uniformitaris-mo, assim como de critérios próprios da analogia e da convergência morfológica, entre outros.

Monstros, interpretação e (geo)conservação

A par de outras produções naturais, os fósseis tiveram, desde cedo, lugar de relevo nos museus constituídos em Portugal a partir da segunda me-tade do século XVIII, na esfera do erário público e eclesiástico. Atestam-no, por exemplo, as remessas de restos de grandes vertebrados destinados ao Real Gabinete de História Natural e Jardim Botânico

ou conceitos. Os objetos podem ser parte da narra-tiva ou desempenharem opapel de “semióforos”i.e.,o papel de intermediários entre os utentes dos mu-seus e um “mundo invisível” (Pomian, 1997). Isto significa que o valor das coleções decorre do facto de representarem mundos inexistentes no momen-to e no lugar onde podem ser contempladas, e onde se destinam a estabelecer uma comunicação entre o mundo real, com o mundo donde vêm os objetos que as preenchem, pertencentes a um espaço e a um tempo diferentes, “invisível” no presente.

Deste modo, objetos reais ou réplicas, ou combi-nações de ambos, associados às suas representações figurativas (ilustrações, fotografias ou animações multimédia) asseguram o estabelecimento de uma ligação visível e tangível com mundos desconhecidos, recriando os seus espaços e ecossistemas, povoados de seres extintos há milhões de anos (Fig. 7)15.

Passos decisivos no sentido de aumentar a eficá-cia da comunicação foram trilhados nas primeiras décadas do século XX, pelo recurso aos dioramas, técnica que rapidamente se alargou da Zoologia, o domínio tradicional, à Paleontologia. Consistia na representação ou recriação de peças e ambien-tes naturais, cujos elementos, exemplares reais e/ou réplicas, eram apresentados em posição de vida e conexão ecológica, num contexto paleoambien-tal. Esta forma de apresentação que marcou o iní-cio da rotura com as exposições exaustivas, baseadas na sistemática e na evolução,“predominantemente um fenómeno do século XIX” (Mason, 1994), con-tinua a utilizar-se com grande aceitação.

Janelas sobre mundos extintos. Reflexões sobre comunicação em Paleontologia

Figura7.A – Montagem didática combinando peças esqueléticas de dinossauro Iguanodontídeo (Museu do Instituto Real de Ciências Naturais da Bélgica, Bruxelas). Foto dos autores, 2011; B – Réplica do esqueleto do dinossauro Miragaialon-gicollum, peça emblemática da exposição de longa duração do Museu da Lourinhã. Foto O. Mateus / Museu da Lourinhã.Figure7.A–DidacticassemblagecombiningskeletonpartsofanIguanodontiddinossaur(MuseumoftheRoyalBelgiumInstituteofNaturalSciences,

Brussels).Authors’photo,2011;B–SkeletonreplicaofthedinossaurMiragaia longicollum,emblematicpartoflong-termexhibitionoftheMuseumofLourinhã.PhotobyO.Mateus/MuseumofLourinhã.

associação portuguesa de geólogos 91

e impressas por técnicos ao serviço da Comissão ou por estúdios europeus de referência (Fig. 8).

Fósseis, materiais “conchiológicos” e minerais faziam igualmente parte das coleções de curiosi-dades naturais reunidas por Frei Manuel do Ce-náculo (1724-1814), bispo de Beja, apresentadas no “seu” Museu Sisenando Cenaculano Pacence, aberto aos fiéis da Diocese sob o mote “OestudodoMuseohehumadisposiçãoparaqualquerhomemsercompletamenteSabio” (Vasconcelos, 1898) 17.

Seria injusto não referir, mesmo que de modo fugaz, as coleções que atualmente se encontram na esfera dos museus universitários, as quais conciliam muitas centenas de exemplares estrangeiros adqui-ridos com finalidades didáticas e de comparação a marchands de referência, sobretudo nas últimas déca-das do século XIX (Dr. Auguste Krantz e sucessores, Louis Sæmann, Émile Deyrolle e tantos outros). Es-tas, embora sem perderem valor enquanto referentes taxonómicos (mesmo carentes de revisão), são hoje em dia passíveis de novos olhares enquanto contri-butos para a História das Geociências, em contexto nacional e internacional. Estes acervos universitá-rios são também repositórios de espécimes recolhi-dos em formações portuguesas, no decurso de tra-balhos de investigação centrados nessas instituições.

Parte destas coleções permanece exposta no pre-sente em condições que procuram romper com os

da Ajuda, em Lisboa (fundado ca. de 1768), en-tre as quais a de diversos “pedaços de ossos mons-truosos”, testemunhos da megafauna plistocénica do Ceará enviados pelo capitão-mor Coutinho de Amaury (?-1810) ao Secretário dos Negócios da Marinha e Ultramar Martinho de Mello e Castro (1716-1795), bem como os restos esqueléticos do mítico “Monstro de Prados”, descoberto em 1785 em Minas Gerais, acompanhado pelo relatório do naturalista brasileiro Simão Pires Sardinha (1751-1808), sócio correspondente da Academia Real das Ciências de Lisboa (Fernandes etal., 2012, 2013; Lopes, 2005). Lamentavelmente perdeu-se o ras-to destes materiais nas transferências de que foi alvo o acervo do museu da Ajuda, em parte expe-dido por Domenico Vandelli (1735-1818) para o Gabinete de História Natural da Universidade de Coimbra (criado através da reforma pombalina de 1772), mas também espoliado durante a invasão de Junot (1807-1808) e, na maior parte, confiado à Academia Real das Ciências de Lisboa, quando foi extinto em 1836. As coleções reais juntaram-se aí aos materiais reunidos por Frei José Mayne (1723-1792), nomeadamente inúmeras peças de História Natural, bem como as doações de académicos e de outros contributos para formar o Museu Nacional de Lisboa (Antunes, 1986), posteriormente trans-ferido para a Escola Politécnica de Lisboa (1858).

No seio da Academia das Ciências, por influên-cia do Duque de Saldanha (1790-1876), viria a ser criada a 1ª Comissão Geológica (1848) que, refor-mulada e sob a orientação científica de Pereira da Costa (1809-1889) e Carlos Ribeiro (1813-1882), haveria de constituir, a partir de 1859, no segun-do piso do edifício da Academia, o museu onde se preservam as coleções de paleontologia e estratigra-fia portuguesas, reunidas durante os levantamentos para a Carta Geológica de Portugal, desde a década de 1860. Nelas estão representados os principais “cortes” históricos que permitiram definir e carac-terizar as principais unidades estratigráficas pre-sentes em território nacional, representados atra-vés das faunas fósseis usadas no seu ordenamento cronológico.

Os grupos fósseis mais representativos deste acervo foram alvo de estudos monográficos pu-blicados desde 1865, assinados pelos membros da Comissão e dos organismos que lhe sucederam, e por diversos colaboradores graciosos estrangei-ros, convidados de entre os grandes especialistas da época (Brandão, 2008). Do ponto de vista da ilustração, deve sublinhar-se a grande preocupação e qualidade das litogravuras incluídas nestes traba-lhos, até ao uso generalizado da fotografia, gravadas

Figura8– Original de Angelino Castro, desenhador da Comissão Geológica, com ilustrações de espécimes

miocénicos da região de Lisboa para as estampas da monografia de Pereira da Costa sobre os gastrópo-

des fósseis portugueses. Ca. 1866. Arquivo Histórico Geológico-Mineiro do LNEG.

Figure8–OriginalofAngelinoCastro,designerofthePortugueseGeologicalSurvey,showingillustrationsofMiocenicspecimensofLis-bonregiondestinedtothepreparationofplatesforPereiradaCosta’s

monographonPortuguesefossilgastropods.About1866.Geological--MiningHistoricArchive,LNEG.

J. M. Brandão, P. M. Callapez, V. F. Santos & N. P. C. Rodrigues

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padrões científicos tradicionais, em nome de uma nova eficácia comunicacional ao ritmo das dinâmi-cas institucionais.

Uma última palavra é devida às diversas coleções que têm vindo a constituir-se na esfera autárquica e do movimento associativo científico, que reúnem atualmente acervos de grande interesse científico (citem-se como exemplos os do Museu da Lou-rinhã e da Sociedade de História Natural, Torres Vedras) ou relevância pedagógica como são, entre outros exemplos possíveis, os do Museu de Histó-ria Natural de Sintra, onde se exibe uma parte da diversificada “Coleção Miguel Barbosa” (Brandão, 2006), do Museu da Pedra (Cantanhede), ou o do Parque Paleozóico de Valongo.

Notas finais

Henri Rivière (1989) referia a grande diversidade de formas que ao longo do tempo foram encontra-das para a apropriação e apresentação da Natureza, desde a ménagerie de Alexandria no antigo Egito, aos hortos botânicos e Gabinetes de Curiosidades, dos jardins zoológicos aos vivariume aos parques naturais, sem omitir, é claro, as“galerias científicas” novecen-tistas. Para o grande vulto da Museologia contempo-rânea, as sucessivas e múltiplas fórmulas de apresen-tação da História Natural conferiram aos respetivos museus um carácter “espectacularmente evolutivo”e até deavant-gardeno universo dos museus (id.ibid.).

Estas modificações encontram explicação nas novas e permanentes descobertas em todos os ra-mos da História Natural, incluindo a Paleonto-logia, mas também na interiorização da neces-sidade de modificar os discursos museológicos, adequando-os às novas realidades e aos interesses de utentes cada vez mais exigentes e apetrechados culturalmente. É notável o esforço feito por muitos museus e pela nova geração de “centros de ciên-cia” no sentido de se distanciarem da tradicional abordagem ontológica, centrada nos objetos, para novas formas de comunicação em Ciência que in-corporam perspetivas históricas sobre a construção do conhecimento e a evolução das metodologias de investigação, para chegar a outro nível de aborda-gem, epistemológica, centrada na demonstração e na experiência, envolvendo o utente no processo de descoberta e interpretação científicas (Montpetit, 1998). Este desafio tem de ser sido assumido em paralelo com a melhoria do acesso da comunidade científica às coleções, de forma a garantir o desen-volvimento da tradicional vocação científica deste grande grupo de museus.

É hoje consensual a aceitação de que a mudança

na filosofia da apresentação passa pela constituição de equipas multidisciplinares que conciliem cientistas e profissionais da comunicação e educação, repartindo entre si a responsabilidade da conceção, design e desenvolvimento de módulos expositivos, com recurso a novas tecnologias e materiais de su-porte. Pretende-se que estes interajam com os utentes e promovam a reflexão sobre as questões da paleoecologia, da paleobiogeografia, da evolução e da extinção - objetivos que estão para além dos pre-tendidos aquando da mera disponibilização de in-formação taxonómica nas exposições tradicionais. Trata-se, dir-se-ia, de desígnios que decorrem dos recentes esforços de interpretação, valorização e conservação do património geológico em todas as suas expressões (geoconservação), metas supremas do paradigma ambiental.

Se, como afirmam Antunes & Balbino (2010), a Paleontologia não é ciência “nem velha nem ob-soleta – ao contrário, com excelentes possibilidades de desenvolvimento”, então augura-se à sua apre-sentação e divulgação, enquanto contributo para a elevação dos níveis de literacia científica da socie-dade, um longo (e paralelo) caminho, reinventan-do o processo de transposição museográfica com recurso massivo às novas tecnologias de comunica-ção e à conceção de dispositivos interativos, de que carecem ainda os equipamentos atuais.

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notas1Este número peca certamente por defeito, dada a im-

possibilidade prática de conhecer os contornos do colecionismo amador, estimulado desde há algumas décadas, pela evolução dos currículos escolares e pelo crescente interesse pela Natureza nas suas diferentes expressões, estimulado pelos media, pelas “feiras de minerais e fósseis” e por exposições espectáculode impacto internacional (blockbusters), ligados a certos grupos há muito desaparecidos, como os dinossau-ros e os mamíferos “da Idade do Gelo”.

2Gesner, Conrad, 1565. De rerum fossilium, lapidum et gem-marummaxime,figuris&similitudinibusliber:nonsolummedicis,sedomnibusrerumnaturaeacphilologiaestudiosis,utilis&iucun-dus futurus (Dascoisas fósseis,principalmentepedrasegemas,assuasformasesemelhanças, não só para os médicos, mas também para os estudiosos de filologia, por ser útil e agradável.Trad. livre).Zurich: [Jacob Gesner].

3Gesnernãoestavaalheadonemdovalormedicinaldos“fósseis”etalcomoamaioriadosseuscontemporâneos,acreditava na exis-tência do succuslapidificatus.

4Tenha-se também presente que, durante este perío-do, era considerável a quantidade de marfim fóssil comercializado na Europa, proveniente de jazidas siberianas, facto que, mais tarde, foi explorado por Buffon na obra Lesépoquesdelanature(1778).

5O Ashmolean Museum, inicialmente dedicado às Ar-tes e Arqueologia, é considerado o mais antigo mu-seu público do Reino Unido e o mais antigo museu universitário. Abriu em 1683 disponibilizando as coleções de Elias Ashmole (1617-1692), oferecidas à Universidade de Oxford em 1677.

6Lineu, além de autor da classificação binomial, foi um dos primeiros naturalistas a estabelecer um critério de agrupamento das produções minerais em Petrae (rochas), Minerae (minerais) e Fossilia (fósseis).

7Sowerby, James; Sowerby, James de Carle; Farey, John.. ThemineralconchologyofGreatBritain;or,Colouredfiguresanddescriptionsofthoseremainsoftestaceousanimalsorshells,whichhavebeenpreservedatvarioustimesanddepthsintheearth.Lon-don. Ed. B. Meredith. 1812, 1st edition.

8Criado em 1771 por Carlos III, que muito se interessa-va pela História Natural e por isso apoiava as expe-dições e o colecionismo científico, antecedeu o atual Museo Nacional de Ciencias Naturales.

J. M. Brandão, P. M. Callapez, V. F. Santos & N. P. C. Rodrigues

94 Janelas sobre mundos extintos. Reflexões sobre comunicação em Paleontologia

9Estas coleções constituíram o núcleo fundador do Bri-tish Museum (Natural History), em Londres.

10AtualMuséedes Arts et Métiers/ cnam.11Embora as coleções de fósseis sejam a principal fonte

de informação em Paleontologia e por isso essenciais à investigação nos vários domínios desta ciência e à formação de novos investigadores, o seu valor cien-tífico é com frequência questionado, pelo facto da-quelas terem sido constituídas sobretudo por razões ligadas aos estudos de Taxonomia e, por isso, serem formadas por exemplares isolados, desprovidos do seu contexto estratigráfico e paleoecológico.

12GreatExhibitionoftheWorksofIndustryofallNations, Palácio de Cristal, Londres, 1851.

13A “Paleoarte” recorre a várias técnicas de expressão plástica, obedecendo a critérios de natureza inter-pretativa, tendo em vista a reconstrução, reconsti-tuição ou modelação figurativa de elementos esque-léticos ou outros restos orgânicos, bem como marcas de atividade de seres pretéritos (icnofósseis) desig-nadamente ninhos, pegadas, perfurações, copróli-tos, etc… (Correia, 2012).

14No caso dos museus existem algumas representações que perdurarão pela excelência do trabalho e en-

quanto documento histórico, tendo-se tornado, elas próprias, motivo de atração. Demonstram-no, por exemplo, os murais de Charles Robert Knight (1874-1953) e de Rudolph Zallinger (1919-1995) no Field Museum of Natural History, Chicago, EUA e Yale Peabody Museum of Natural History, New Ha-ven, EUA, respetivamente, importantes marcos na interpretação artística dos progressos das ciências da Terra e da Vida e, simultaneamente, imagens de marca do museu. Acessíveis em linha em: http://www.charlesrknight.com/FMNH.htm e http://pea-body.yale.edu/exhibits/age-reptiles-mural.

15Deve enfatizar-se o valor destes suportes para a divulga-ção em Paleontologia, atendendo a que em grande par-te dos casos a preservação e/ou o modo de fossilização dos exemplares nem sempre propiciarem uma rápida compreensão da morfologia do original, nem tão pou-co a sua extrapolação para o ser vivo de que resultaram.

16Evocação do pintor belga René Magritte (1898-1967).17O remanescente das coleções de Frei Manuel do Cená-

culo reparte-se atualmente entre a Biblioteca Públi-ca e o Museu de Évora, cidade para onde o clérigo foi transferido em 1802, como arcebispo.

associação portuguesa de geólogos 95geonovas n.º 27: 95 a 100, 2014

Visões filosóficas da NaturezaA Geologia no contexto cultural da Idade Média

N. Pimentel

Departamento de Geologia, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Campo Grande, C-6, 4º, 1749-016 Lisboa;

[email protected].

1. Introdução

Vivemos actualmente imersos em Ciência, ro-deados de tecnologia, estatísticas, modelos e dis-cursos racionais, com quase toda a informação filtrada por crivos científicos. Dificilmente conce-bemos, por isso, que uma sociedade possa não ter como primado estes conceitos, que não procure e discuta incessantemente as explicações mais lógi-cas para o que acontece e para o que faz acontecer. Mas, para que necessitam realmente as civilizações de descobrir, de explicar, de inventar?

Uma sociedade apenas gere, em cada momento, aquilo com que lida correntemente; e a Ciência, como tudo o resto, é feita por quem dela necessi-ta e só quando necessita, não antes nem de outro modo. Em tempos mais recuados, as prioridades não seriam as mesmas de hoje, e só descentrando--nos da realidade em que vivemos poderemos ace-der ao âmbito intelectual das teorias que ao longo da História foram surgindo para relatar, transmitir

ou inventar o mundo que nos envolve e a Terra em que nos movemos. O mundo medieval era certa-mente muito diferente deste em que vivemos, e por isso outras eram as ideias de então acerca da Terra, de como era e do que a faria funcionar.

2. Novos ideais com antigas ideias

As teorias desenvolvidas pelos pensadores da Antiguidade acerca da Natureza visavam, sobre-tudo, gerir princípios religiosos, espirituais, filo-sóficos e morais para a sociedade em que viviam, e não tanto estabelecer teorias científicas rigoro-sas, cujo alcance social seria quase nulo. Apesar da distância mantida entre o mundo terreno e o mundo filosófico (de que a alegoria da caverna de Platão constitui um paradigma), foi nesse quadro que nasceram as primeiras grandes ideias acer-ca da Terra e do seu funcionamento. Procuran-do integrar a Natureza num quadro filosófico, os pensadores clássicos foram assim levados a expli-

Resumo

Apresenta-se uma síntese comentada das principais ideias existentes na Idade Média acerca do funcionamento da Terra. Essas ideias são enquadradas no contexto histórico e cultural, procurando evidenciar o modo como os sucessivos eventos e fases históricas influenciaram a transmissão e evolução das mesmas. Constata-se uma continuada tensão entre as observações naturalistas e a procura de interpretações conformes à doutrina vigente em cada momento. Ainda assim, constata-se, também, que já na Idade Média, muito antes da chamada “Revolução Científica”, diversos pensadores procuraram olhar, conhecer e explicar as características e processos do planeta em que habitamos.

Palavras-Chave: Idade Média; Geologia; Filosofia Natural.

Abstract

ThisworkpresentsasynthesisofthemainmedievalideasaboutthebehaviourofplanetEarth.Thoseideasarediscussedwithintheirhistoricalandculturalframework,showinghowhistoricaleventsandmovementscontrolledtheirtransmissionandevolution.Acontinuoustension,betweennaturalisticobservationsanddoctrineconstrainedinterpretations,maybedetected.However,itisclearhowlongbeforetheso-called“ScientificRevolution”,severalintellectualstriedtolook,understandandexplainplanetEarth’scharacteristicsandbehaviours.

Keywords:MiddleAges;Geology;NaturalPhilosophy.

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car alguns fenómenos naturais, teorizando sobre terras e mares, sismos e vulcões, rochas e fósseis. Um modelo terrestre global? Claro que ainda não, apenas peças isoladas que suavemente se encaixa-vam e suportavam a Filosofia dominante.

Nos primeiros séculos da era cristã, toda essa reflexão recolhida pelo Império Romano come-çou a definhar, acompanhando o esvaziamento de ideais das civilizações em queda. Multiplicavam-se então as antologias, as enciclopédias e edições crí-ticas, sem que nada se criasse de realmente novo. Neste ambiente de estagnação, ganharam terreno os misticismos, surgiu a alquimia e renasceram os simbolismos e ocultismos próprios das etapas de indefinição civilizacional. Como única alternativa a esta tendência dissipativa surgiu, no Ocidente, o poder da Igreja católica, procurando pôr o dogma-tismo bíblico acima de todas as ideias, interditando as escolas filosóficas “helenizantes” e obrigando os membros destas a migrarem para Oriente, vindo a refugiar-se na Síria e na Pérsia.

A derrota militar do Império Romano no séc. V, com a consequente reorganização de forças e de influências na região, iria criar condições para o surgimento de uma nova civilização mais a oriente. Em três séculos, os recursos e as riquezas crescentes excederam as necessidades básicas e permitiram o desenvolvimento de elites aptas a disputar o poder. Surgiu assim um novo grupo político-religioso, dissidente de uma importante seita judaico-cristã, o qual estaria na base do Islão. Num século apenas, o Islão alastra desde o actual Irão pela Síria, Egipto e África do Norte até à Península Ibérica, tolerando as convicções dos povos conquistados e fornecen-do-lhes uma língua unificadora. Este enorme Im-pério soube conciliar e absorver os conhecimentos detidos pelos refugiados do antigo império roma-no, oferecendo-lhes ainda condições para o seu de-senvolvimento. Aproveitou-se assim uma “fuga de cérebros” para expandir uma civilização emergente, situação que a História várias vezes veio a repetir.

Bagdad tornou-se então o ponto de confluência de judeus e cristãos, persas e indianos, todos eles assimilados pelo Islão, promovendo a tradução dos textos clássicos do grego para persa e árabe, enquan-to no extremo oposto do império, Córdoba se de-senvolvia como centro intelectual do Ocidente islâ-mico. No séc. IX já quase toda a obra de Aristóteles se encontrava traduzida para árabe, frequentemen-te com subtis alterações, tornando-se uma referên-cia obrigatória para todos os pensadores islâmicos, atraídos pela concepção coerente de um Universo estável, contínuo e eterno, muito conveniente para apropriações religiosas e monoteístas, apresentan-do um Deus supremo criador e protector da Terra, sem a intervenção de catástrofes ou forças ocultas.

No séc. X os escritos aristotélicos dos “Meteoros” são “islamizados”por uma seita de Bassorah (”Os Ir-mãos da Pureza e da Verdade”), procurando integrar os diversos processos terrestres aí descritos numa primeira tentativa de teoria global. “Nósqueremosmos-trarcomoseformamasmontanhaseosmares,comoaargilamolesetornapedra,comoaspedrassequebrameformamareias,comoaschuvaseosriosastransportamparaomarecomo,apartirdaí,aareiaeaargilasetransformamemrochasemontanhas,nofundodosmares“ (traduzido de Ellenberger, 1988, p. 79).

Com este propósito, desenvolveram as suas ideias e difundiram-nas por todo o mundo islâmi-co.“Sabetu,meuirmão,quepelaintensidadedosraiosdoSol,Lua e estrelas sobre as montanhas e colinas, ao longo do tempoahumidadediminui,aumentandoasuasecuraedureza.Então,quebram-se e formam seixos e areia, que as chuvas levam paraosrioscujaforçatudotransportaparaoslagosemares.Depois,aforçadasondaseoborbulhardaságuasdepositamessesseixos,areiaseargilasnoseufundo,camadasobrecamadaaolongodasépocas.Porfim,essascamadassobrepõem-seeassimseformameseelevamnofundodosmaresascolinasemontanhas,talcomonosdesertosoventomoldaosmontesdeareia.Ecadavezqueofundodomarseenchecomessasmontanhas,aáguasobeetrans-bordaparaasáridasplanícies,cobrindo-asetransformando-asemlagosemares(...).Asmontanhasvãoassimsendodestruídas,enquantonomarasareiaseargilasexpulsamaságuasdeixandoaparecerilhas,colinasemontanhas”(ib.idem).

Como se vê, tudo funciona em contínua per-feição, sem cataclismos nem limitações temporais, apenas numa lenta e natural evolução. É a geodi-nâmica externa totalmente intuída, faltando no entanto um aspecto essencial: o motor do levanta-mento das montanhas, ou seja, da orogénese. Para explicar então que desde sempre existam áreas le-vantadas e outras imersas, introduziram como ele-mento inovador o papel da Sabedoria Divina, cuja “boavontadequisqueasduasesferas(a terrestreeaoceânica)tivessem centros distintos, para que uma parte das Terras estejaforadeáguaparahabitatdosanimaisedaspastagensqueosali-mentam”(ib. idem). Quando é necessário, o homem sonha, Deus quer e o equilíbrio nasce. E assim, a terrena geodinâmica interna, continuava ausente das ideias islâmicas medievais.

A partir daqueles textos essenciais, outros pen-sadores islâmicos propuseram aperfeiçoamento pontuais e tentaram incluir abordagens empíricas naquele modelo tão perfeito. Sobre as questões da natureza terrestre se debruçou também Avicena (Ibn Sina, 980-1037), um dos mais conhecidos pensadores da sua época, nascido em Samarkanda. No texto “DeMineralibus” enuncia pela primeira vez as bases do Princípio da Sobreposição, ou seja, que a sucessão vertical de camadas representa a sucessão de acontecimentos no tempo: “Épossívelqueomartenhagradualmenteinundadoasplaníciesemontanhasedepoisrecuado.Equecadavezqueaterraassimemergiaomardeixavaatrásdele

Visões filosóficas da Natureza. A Geologia no contexto cultural da Idade Média

associação portuguesa de geólogos 97N. Pimentel

umacamada,poisnósvemosquecertasmontanhasparecemtersidoempilhadas,camadasobrecamada.Primeiroformou-seumaede-poisaseguinte,sobrecadacamadaficouumaoutrasubstância,deorigemterrestre,separando-adaseguinte;aquandodapetrifica-çãodascamadasaquelasubstânciadesintegrou-seeassimaolongodostempos”(traduzidodeEllenberger,1988,p.82). À parte a ideia errónea de que cada camada representa um depósito marinho, separada da seguinte por um ní-vel continental, havendo assim tantas transgressões e regressões quantas as camadas, cabe a Avicena o enorme mérito de ter começado a vislumbrar na su-cessão das rochas a história dos acontecimentos na Terra, conceito basilar de toda a Geologia. Avicena descreve também o modo de ocorrência das conchas nas rochas antigas, procurando integrá-lo na visão global antes apresentada.“Aargiladofundodomaréex-postaaoar,aglutinando-seetornando-sepedra;osanimaismari-nhosaparecemporissonointeriordecertaspedras,aoquebrarem--se” (ib. idem). Quanto ao processo de fossilização, descreve-o do seguinte modo:“Algunsanimaiseplantaspodemserconvertidosempedraporumavirtudepetrificadora(VisLapidificativa)queexistenasrochaseélibertadapelostremoresdeterra,ouqueatéapartirdaáguapodecoagular”(ib.idem).

Um século mais tarde, o pensador Averróis (Ibn Rushd, 1126-1198) foi nomeado pelo califa de Córdoba para dirigente espiritual da comunidade islâmica local, sendo-lhe encomendada a tradução e comentário de toda a obra de Aristóteles, com a intenção expressa de a expurgar das numerosas in-terpretações entretanto sofridas e de lhe conferir maior modernidade e universalidade. Fatalmente, o resultado dessa “purificação” foi a introdução das suas próprias interpretações, mais convenientes aos poderes então vigentes. Averróis aproveita mesmo para apresentar ideias contrárias às de Avicena e propõe uma “Teoria das formas substanciais” que aplica também à formação dos fósseis: “Os corposmateriais têm qualidade activas para gerar formas próprias nosmateriaisqueassimtransformam,nãosendonecessáriaumaVir-tudeouInteligênciaexternas”(traduzidodeEllenberger,1988,p.84). Por outras palavras, as conchas conteriam em si mesmas as virtudes necessárias para se transfor-marem em fósseis, o que até corresponde à reali-dade na medida em que a sua mineralização apenas depende de uma série de lentíssimos processos na-turais; mas o tempo geológico era um conceito que ainda estava longe de ser compreendido.

O conceito temporal surge de novo algo distor-cido quando Averróis procura explicar as movi-mentações relativas das terras e dos mares, eterna questão a deslindar por quem encontra fósseis no cimo das montanhas. Baseando-se na influência da Lua e do ciclo anual sobre as marés, e procurando um apoio convincente na evoluída astronomia is-lâmica, afirma que seriam os ciclos e configurações astrais a comandar lá do alto as enormes oscilações

do nível do mar, supondo que tudo seria uma ques-tão de alguns milhares de anos. Ficava assim expli-cado pelos astros o que na Terra não encontrava ex-plicação, remetendo a questão para a arquitectura cósmica, de origem divina e forçosamente perfeita. No entanto, esta ideia algo rebuscada poderá en-contrar um certo paralelismo na actual teoria dos Ciclos de Milankovitch, a qual procura relacionar a ciclicidade dos fenómenos geológicos com a dos as-tronómicos a diversas escalas temporais, sugerindo que a mente humana talvez tenha apelos que estão para além dos simples conhecimentos acumulados.

A partir do início do segundo milénio, o poder político centralizado do Islão foi perdendo influên-cia, levando ao seu desmembramento em múltiplos impérios autónomos, os califados e emirados. Pa-ralelamente, iniciavam-se a ocidente as Cruzadas cristãs (conquista de Toledo em 1085 e de Córdoba em 1236), enquanto a oriente as invasões mongóis (tomada de Bagdad em 1258) enfraqueciam o Islão e o empurravam progressivamente para a Penínsu-la Arábica, onde nascera. Neste contexto histórico, os meios disponíveis para o desenvolvimento das escolas corânicas e dos centros de ensino e pensa-mento islâmicos foram desaparecendo, levando ao seu declínio e progressivo apagamento como centro intelectual euro-asiático.

3. A procura do equilíbrio

A europa ocidental seguia então um caminho inverso, no sentido da sua construção territorial e cultural. Na sequência das invasões nórdicas pelos povos “bárbaros”, apenas os francos haviam resistido e, comandados por Carlos Magno, expandiram-se até à península italiana, ligando-se ao poder papal romano e fundado uma segunda versão do império romano do ocidente (éc. IX). Criaram-se, assim, as condições para o florescimento da civilização cristã e da sua cultura, promovida essencialmente nos mos-teiros (e mais tarde nas Universidades) das diversas Ordens entretanto criadas: beneditinas (séc. IX), cistercienses (séc. XI), dominicanas e franciscanas (séc. XIII). Toda esta regeneração e fortalecimento religioso levou ao lançamento das Cruzadas a partir do séc. XI, tendo como objectivo oficial e derradei-ro a conquista de cidade sagrada de Jerusalém ao Islão, destruindo pelo caminho e por razões eco-nómicas os impérios islâmicos. Estes eram, por sua vez, os herdeiros do legado intelectual helenístico, processando-se deste modo a apropriação do saber do Islão para o Ocidente cristão e trazendo à Euro-pa uma lufada de renovação. É na cidade de Toledo recém-conquistada que um grupo de tradutores sob ordens do bispo Raimundo irá traduzir para latim as obras de Aristóteles e de outros filósofos gregos,

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secundarizando a aristotélica origem por simples erosão diferencial de terrenos heterogéneos.“Acau-saessencialeuniversalsãoosventosviolentosquefrequentementesegeramnointeriordaterraequelevantamosolo,formandoasmontanhas”(traduzidodeEllenberger,1988,p.88). Os aba-los sísmicos libertariam os vapores aprisionados no sub-solo, originando sob as montanhas uma enor-me cavidade que se encheria com as águas das chuvas e da qual brotariam as fontes. Este processo seria particularmente violento junto ao litoral, onde as águas do mar tapariam os poros da terra, explican-do-se assim a abundância de relevos litorais. Estas ideias poderão vir das viagens e observações directas de Alberto Magno, que cruzou as cadeias alpinas levantadas e dobradas, para leccionar em Pádua, Paris e Colónia, mas inserem-se também na ideia clássica de que o Ar tende naturalmente a libertar--se do interior da Terra para se unir à (atmo)esfe-ra que a rodeia. Esta ideia explicaria igualmente a ausência do Fogo, dado que esse Elemento é ainda mais externo (materializado no Sol) e por isso não faria sentido que se situasse no subsolo.

Para a génese dos fósseis, este autor retoma as ideias de Avicena, considerando que os animais se transmutam em minerais por acção de exalações telúricas e de uma força petrificadora. “Ocorpodosanimaisencontra-seemlocaisondeéexaladauma“vislapidifi-cativa”,transformando-osporinteiroempedrascalcáriascomocontorno externo desse animal; quando se quebram encontra-senelasassuaspartesinternas” (traduzidodeEllenberger,1988,p.89). Porém, para os gasterópodes invoca processos bastante próximos da geração espontânea:”ahumi-dadeéexaladaeretidanomeiodarocha,enrolando-sesobresiprópria,recebendoosoprovital”(ib.idem).

Ainda no séc. XIII, o naturalista Ristoro d’Arezzo, adepto dos escritos de Averróis e com sólidos conhecimentos de astronomia, reintroduz a ques-tão do controlo astral sobre a Terra. No seu tra-tado “ComposizionedelMondo”(c. 1282), defende que a acção de uma “virtude sêca” das estrelas sobre a Terra geraria as terras emersas, as quais abundam no hemisfério Norte devido à proliferação de es-trelas e constelações nesse hemisfério celeste. Se-riam também as estrelas a moldar o relevo terrestre – sob uma estrela próxima um vale, numa estrela longínqua uma colina, por simples transcrição ter-rena do “relevo” sideral. De igual modo, o Dilúvio bíblico teria sido o resultado de uma configuração astral única, deixando vestígios claros: “subimosaumamontanhacujotopoeraumalajedepedraferruginosaquepareciatersidoalicolocadaporalguém;sobela,terradeixadapelomar,areia,seixosroladosepeixes,oquemostraquefoioriginadapeloDilúvio” (traduzidodeEllenberger,1988,p.93.)

A importância dos astros é de novo invocada por Pietro d’Abanno (c. 1257-1316), médico em Pádua, para explicar a génese tão perfeita dos cristais e de

a partir das versões árabes aí deixadas pelos venci-dos. Esses conhecimentos foram então rapidamen-te absorvidos pelos eruditos da época, reunidos nas ordens religiosas em desenvolvimento.

Deste modo bastante indirecto, os cristãos eu-ropeus retomavam a sabedoria helénica, já filtrada mas também desenvolvida, por séculos de civiliza-ção islâmica. Aliás, por desconhecimento ou tal-vez mais por renegação dessa contribuição “infiel”, frequentemente os eruditos ocidentais atribuíram aos autores gregos (em especial a Aristóteles) afir-mações e teorias que não pertenciam àqueles, mas sim aos pensadores islâmicos que as desenvolve-ram. Assim actuava o purismo religioso, filtrando caridosamente as fontes para que a água não faltas-se aos seus fiéis.

No início do séc. XIII o poder religioso é forta-lecido, surge a Inquisição, são apoiadas as Ordens e centralizadas em Paris as Faculdades. “AinteligênciateológicadeveexerceroseupodersobretodasasFaculdades,comooespíritosobreacarne,dirigindonaviarecta,segundoastradi-çõesdossantos”, afirmava então Inocêncio III, do alto da sua autoridade papal. Como paradigma deste ambiente, poderá referir-se a proibição do ensino da “Physica” e da “Metaphysica” de Aristóteles na Uni-versidade de Paris em 1211, decretada por aquele papa, temeroso da força daquelas teorias pagãs, to-talmente exteriores aos dogmas bíblicos. Mas logo em 1255, perante o imparável interesse pelas teorias aristotélicas, a Igreja é forçada a recusar apenas as interpretações que sejam explicitamente contrárias à ortodoxia cristã, sempre validada pela Inquisição. Aliás, a validação, recusa e renovação das teorias acerca da Natureza acompanhavam intimamente os movimentos teológicos que, ao longo de toda a Ida-de Média, ora apoiavam ora refutavam as ideias de Aristóteles, de Platão, de Avicena ou Averróis. As ideias naturalistas difundidas não eram portanto o simples resultado de raciocínios lógicos, tendo es-tes que se adaptar às correntes mais em voga e acei-tes pelas autoridades religiosas em cada momento.

As ideias de Aristóteles são retomadas por um dominicano da Universidade de Pádua (Alberto Magno, 1206-1280) no seu “Tratado dos Meteoros” (clara alusão à obra aristotélica que o inspirou), sendo-lhes adicionadas observações e críticas pes-soais, como era habitual. A sua principal contri-buição epistemológica consistiu em considerar que a Natureza funciona autonomamente e que só pela experiência se lhe poderá aceder, não se devendo nela procurar a manifestação da inteligência divi-na, já que esta apenas por Revelação se transmite ao ser humano. Retomando as questões geológicas clássicas da época, debruça-se sobre a génese das montanhas, invocando causas internas na linha das ideias de Avicena (que certamente conheceria),

Visões filosóficas da Natureza. A Geologia no contexto cultural da Idade Média

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formar à superfície e que só poderiam vir das pro-fundezas da Terra, que ele supunha serem gélidas de modo a “coagularem” tais substâncias. Raciocí-nio lógico mas que troca o papel do frio com o do calor, pela única razão de que nunca poderia supôr ou aceitar que o Fogo se encontrasse, na realidade, no interior profundo da Terra.

Seria aliás o Fogo, o mais enérgico dos elemen-tos, a estar na origem do levantamento continuado que Buridan concebia, mas teria que ser um fogo externo, nomeadamente o calor solar e os seus raios incidentes sobre a Terra. “A terra cobertapelomarnãorecebealuzdoSol,arrefeceeperdeleveza;pelocontrárioaterraqueemergetorna-semaislevesobaacçãodoSoledoar.Assim,a terra mais leve vai-se levantando, forçando o mar a retirar--seeainvadirnovasterrasqueassimseafundam” (traduzidodeEllenberger, 1988, p.103)Este engenhoso movimento contínuo é de lógicaao“reajustamento isostático”moderno, já que se trata de um mecanismo pura-mente físico e auto-sustentado. Assim se explica-riam os avanços e recuos dos mares, a existência de mar onde antes havia terra e vice-versa. “O oceanopode,porestemeio,progredirdezléguasparaorienteemdezmilanos,podendoacontecerqueemoutrotempoigualváoutrotantoparaoriente(...)equeassimsucedaatéqueooceanotenhadadoavoltaàTerra” (ib. idem). Se fizermos as contas com o perímetro conhecido desde a determinação de Eratóstenes, chegaremos a um valor próximo de 10 milhões de anos, o que está para além de tudo o que na época se concebia mas que se insere bem na sua convicção de “tempo infinito”.

A principal contribuição de Buridan é a sua vi-são global da Terra como um corpo esférico sujei-to às “leis geraisdoselementos”. Tal como os pensado-res árabes do séc. X, afirma que a Terra e a Água se dispõem segundo duas superfícies esféricas mas descentradas entre si, de tal modo que exista um hemisfério emerso e habitado (o ocidental, natu-ralmente) e outro imerso e desconhecido (o oceano oriental). Porém, em vez de uma magnânime ori-gem divina, este facto é atribuído ao diferente peso das terras emersas e submersas (mais pesadas), sen-do estas mais fortemente chamadas para o centro da Terra, coincidente com o centro da homogénea es-fera oceânica. Neste modelo global, perfeitamente coerente, integra então as suas teorias sobre os mo-vimentos das terras e dos mares, numa lenta evolu-ção da Terra ao longo dos tempos. Os pedaços de terra arrancados às montanhas e levados para o fun-do dos mares tornam o hemisfério oceânico mais pesado, fazendo deslocar o centro da Terra nesse sentido e provocando o avanço dos oceanos sobre os continentes. Novos terrenos vão assim sendo pro-gressivamente cobertos pelo mar, enquanto outros se elevam, razão pela qual nos fundos oceânico há vestígios topográficos de antigas montanhas. “Éló-

pedras com formas orgânicas.“Avirtudedosastrosen-gendraumgermequeserevestedeumaideiaeformaespecíficas.Emcertaspedrasencontram-sefigurasmaravilhosas,testemunhosdecorposcelestes;asestrelasapresentamcincoraiosapartirdumcentro,numaesculturadetalmodoadmirávelquenenhumain-teligênciapoderia fazê-la” (traduzidodeEllenberger,1988,p.97), referindo-se provavelmente a “estrelas-do--mar” fossilizadas.

No início do séc. XIV, as ideias sobre a Terra iriam estar fortemente subordinadas à procura de uma ordem global, consubstanciada na recuperação e actualização do conceito helénico de organização dos Elementos em Esferas, imagem da perfeição di-vina e mística do círculo. Nas esferas encontram-se os elementos presentes no nosso meio terreno, a Ter-ra no centro e coberta pela Água, com o Ar e o Fogo (o Sol) nas alturas, tal como em sete esferas se dis-põem os planetas entre a Terra e as estrelas. As leis que regeriam o funcionamento dos Elementos seriam tão-só “abuscadasuanaturezaideal”, ou seja, o percurso até atingirem os seus lugares naturais na respectiva esfera. Todas as noções mecanicistas modernas de gravidade, força, velocidade fundem-se assim no simples desejo que cada elemento tem, de retornar a si mesmo, levando-o a realizar a sua própria es-sência: um pedaço de terra que procura o centro da Terra, um curso de água que procura o Oceano, esta é a única dinâmica da Natureza até se atingir a estática perfeição na obra de Deus concluída.

É neste quadro misto de metafísica e de empi-rismo que se deve encarar o conjunto de teorias e raciocínios avançados por Jean Buridan (1300-1358), filósofo e naturalista na Faculdade de Ar-tes de Paris. Na sua obra “Questões acerca do TratadodosMeteoros” parte das ideias aristotélicas ainda vi-gentes para propôr uma verdadeira teoria global da Terra, considerando a paisagem como o balanço entre acções naturais construtivas e destrutivas, numa visão bem geodinâmica, se bem que ainda apenas externa. “Emmuitoslocaisaterraapresentadispo-siçõesmuitodiferentes:argilosaaqui,arenosaoupedregosaali.Enquanto a terra emersa se levanta sem fim, as partes da su-perfíciequesãomenosreistentes são levadaspelaschuvaseriospara os locais mais baixos, enquanto com as outras partes nãoaconteceassim,permanecendo intactas e continuandoa ser le-vantadas. Assim vemos nós que existem mais rochas e pedrasdurasnocimodasmontanhasquenasplanícies” (traduzidodeEllenberger,1988,p.100).Este levantamento e erosão contínuos tenderiam, no extremo, a trazer rochas do interior da Terra à superfície,“ondeserãopostasemcontactocomoselementosquelhessãocontráriosequeaspode-rãodestruir”(ib.idem),ou seja, a sugestão do Ar e Água como agentes destruidores da Terra, num proces-so que hoje se designaria por alteração química. Como evidência deste facto, Buridan aponta para a ocorrência de cristais e metais que não se vêem

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100 Visões filosóficas da Natureza. A Geologia no contexto cultural da Idade Média

4. O legado medieval

Os tempos medievais, quase um milénio, mos-tram, acima de tudo, a força das ideias da Anti-guidade clássica, atravessando sociedades e reli-giões com as quais quase nada tinham em comum, a não ser talvez a busca intelectual e o reduzido conhecimento do globo terrestre. Foi um Islão conquistador e teocrático que recolheu, digeriu e difundiu os conceitos geognósticos de Aristóte-les, e foi depois um Ocidente cristão a recolher dos considerados “mouros infiéis” esses mesmos conceitos, já reelaborados e desenvolvidos, utili-zando-os nos grupos escolásticos e monásticos. As grandes questões em discussão permaneceram em torno das relações entre os mares e as terras, entre erosão e sedimentação, procurando sentir como os processos se desenrolam e como a Terra fun-ciona em cada lugar.

Assiste-se porém a uma crescente integração dos conceitos e, principalmente, das observações, em modelos mais amplos e até mesmo idealmente glo-bais. Procurou-se acima de tudo uma ordem uni-versal e eterna, um funcionamento compreensível e explicável, pressentindo-se sempre alguma tensão entre a ideia de um mundo eternamente renovado por vontade de um Deus magnânime e um mundo em progressiva decadência até ao caos prenuncia-dor do Juízo Final. E se as ideias andaram muito a reboque dos movimentos religiosos, também é verdade que se assistiu a um esforço para explicar o mundo físico por si mesmo, chegando-se ao ponto de aceitar excluir o papel de Deus ou a invocá-lo apenas para vir cumprir os inexplicáveis ditames bíblicos, quando o mundo por si mesmo já não era capaz de funcionar.

Estetextobaseou-senaconsultadasseguintesobras:

Adams, F. D., 1954. Thebirthanddevelopmentofthegeologicalsciences. The Williams and Wilkins Company, Balti-more, U.S.A., 506 p.

Ellenberger, F., 1988. HistoiredelaGéologie, T. 1. Ed. Tec. Doc. Lavoisier., Paris, 352 p.

Gohau, G., 1987. HistóriadaGeologia. Ed. Europa-Amé-rica, Lisboa, 204 p.

Holder, H., 1992. UnebrèvehistoiredelaGéologieetdelaPa-léontologie. Springer-Verlag, Paris, 280 p.

Kinder, H. & Hilgeman, W., 1992. AtlasofWorldHistory.Penguin Books, London, 299 p.

Este artigo encontra-se redigido segundo o antigo Acordo Ortográfico.

gicoquedomaremerjammontanhaseilhas,jáquenesselugaraterraeraantesmontanhosa.Masétambémlógicoqueapenasjuntoàcostaexistamilhas,porqueaexcentricidadedaTerratornaapro-fundidadetãoelevadanomeiodosoceanosquenenhumamonta-nhadasqueseerguemnasuperfícieterrestre(constituindoagoraofundooceânico)poderiaultrapassarasuperfíciedaságuas”(ib.idem). Como se vê, as imperfeições topográficas do mundo terreno integram-se perfeitamente nas es-feras divinas, situação que só os novos conhecimen-tos trazidos pelas Descobertas viriam ajudar a trans-formar, quase dois séculos mais tarde.

No entanto o Dilúvio, a total cobertura da Terra pela Água, não fazia sentido neste modelo excên-trico tão bem elaborado, colocando Buridan em dificuldades de ordem teológica que ele teve de re-solver com o mais simples dos atalhos: “Porvianaturaléimpossívelproduzir-seumDilúviouniversal,sebemqueDeusopossafazerporviasobrenatural” (ib. idem). E se porven-tura assim tivesse sido, facto que ninguém poderia ter contrariado, “Deuspermitiriaentãoqueaáguaescorresseeelanãocessariadeescorrerdapartequeestáagoraadescobertopara a outra parte, até ao momento em que se encontrasse re-unida no sítio em que hoje está” (ib. idem). Ou seja, para Buridan o mundo é físico e ele assim o explica, se bem que em qualquer momento a acção divina pos-sa contrariar o que é natural, ficando então fora de qualquer teoria e modelo. Eis uma forma eficaz de se escapar à contradição entre as observações na-turalistas e os dogmas religiosos, colocando-os em níveis independentes.

Talvez por não conseguir comprovar a presen-ça de Deus no mundo natural, os manuscritos de Buridan tiveram reduzida divulgação durante a sua vida, sendo um seu colega e discípulo, Albert de Saxe (1316-1390) a receber esse legado teórico. Po-rém, ao mesmo tempo que resumia e divulgava as ideias inovadoras de Buridan, adicionava-lhe fre-quentemente corolários pessoais e bem mais con-formes ao espírito ortodoxo da época. Infelizmente, seriam os seus tratados que viriam a ser reprodu-zidos no séc. XV pela recém-inventada imprensa, conferindo-lhe assim uma muito maior divulgação e influência nas mentalidades renascentistas. Para explicar a constante erosão das montanhas sem que o futuro terrível fosse o total arrasamento dos rele-vos e a submersão total da terra, é levado a invocar outras forças para além do mundo físico terreno. “QuandoaspartículasterrestressãolevadasparaooutroladodaTerra,esseladotorna-semaispesado,empurrando-oparacima.Eserásempreassim,graçasàeternadissimetriadaTerra,regu-ladaporDeusparatodoosempre,pelasaúdedosanimaisedasplantas”(ib.idem). É a providencial sabedoria divina a ser de novo invocada como o haviam feito os eru-ditos islâmicos séculos atrás. Mudam-se os tempos, mudam-se os deuses, mas as vontades permanecem para que o mundo mantenha as suas qualidades.

associação portuguesa de geólogos 101geonovas n.º 27: 101 a 110, 2014

Inventário de locais e atividades cominteresse geológico no ensino das Geociências

Importância e aspetos a melhorar

A. Vilão1,* & J. Simão1,2

1Departamento de Ciências da Terra, F.C.T. – U.N.L, 2829-516 Caparica, Portugal; 2Centro de Investigação em Ciências e Engenharia Geológica, F.C.T. – U.N.L., 2829-516 Caparica, Portugal;

*[email protected]; autora correspondente.

Introdução

A preocupação sobre a relação do Homem com a natureza abiótica, assim como a sua preservação, e o valor cultural das paisagens tem aumentado de forma significativa, em particular a partir do século XXI. Anteriormente a investigação em Geologia desenvol-via temáticas de âmbito científico ou técnico e dava pouca ênfase ao valor patrimonial e social que deter-minados aspectos geológicos têm para a Humanidade. No início do século XXI, os geocientistas começaram a sensibilizar-se e trouxeram para a comunidade nova visão sobre esta temática (Mantesso-Neto, 2010).

A cultura científica é uma das várias designações usadas para descrever a relação entre a ciência e o

público ou, mais especificamente, o que a popu-lação em geral sabe da ciência e o que pensa dela (Delicado, 2006).

Acerca dos recursos geológicos pode-se afirmar que são “laboratórios autênticos” não no sentido da utilização dos mesmos como atividades experimen-tais, mas sim no sentido da visualização, em dimen-sões reais, da estrutura, permitindo que se possa compreender em simultâneo conceitos, tais como, a génese, dimensão e importância. Os recursos geológicos podem, portanto, fornecer informa-ção e conhecimento de forma mais abrangente e ao mesmo tempo mais específica. Quer isto dizer que, insitu se podem observar fenómenos, identificar es-truturas, rochas, formações, minerais, etc., e por

Resumo

O presente trabalho aborda uma vertente das Geociências que se dedica ao Património Geológico e ao aproveita-mento do mesmo no ensino. Um dos objetivos principais é reforçar a importância do ensino da Geologia e, para além disso, da utilização dos demais recursos geológicos disponíveis. Pretende-se ainda informar sobre a diversidade dos meios que existem atualmente no ensino das Geociências, em particular na temática dos Georrecursos. Deste modo, procedeu-se a uma pesquisa histórica sobre as primeiras coleções de geociências e o aparecimento dos primeiros mu-seus, até se chegar à atualidade, onde se inventariam locais de particular interesse para o ensino das Geociências. Estes locais consideram-se de significativa relevância para o ensino, contudo são pouco representativos da aplicabilidade da Geologia no quotidiano, mais especificamente dos Georrecursos. Neste artigo demonstra-se que estes materiais, para além de serem uma determinante fonte de matéria-prima, podem constituir excelentes recursos para o ensino.

Palavras-chave: Ensino das Geociências; Georrecursos; Geodiversidade; Património Geológico.

Abstract

ThispaperapproachesanareaofGeosciencesdedicatedtothegeologicalheritageanditsuseineducation.Themainobjectiveistoreinforcetheimpor-tanceofgeologyandtheuseoftheavailablegeologicalresources.Moreover,thediversityofmethodologiesinGeosciencesteachingisdiscussedinparticularinthegeologicalresourcesfield.Thus,historicalresearchabouttheearlycollectionsofgeosciencesanditsappearanceonthefirstmuseumsuntilnowadayswasaccomplished.ManysitesthatareparticularlyinterestingfortheeducationofGeoscienceswereinventoried.TheirlocationsareveryimportantforteachingbuttheyarenotrepresentativeofdailyapplicabilityofGeology,morespecificallythegeo-resources.

Inthispaper,itisshownthatgeologicalresources,inadditiontobeingimportantsourcesofrawmaterial,canbeexcellentdidacticalresources.

Keywords: TeachingGeosciences;Georesources;Geodiversity;GeologicalHeritage.

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temáticas de carácter didático, visando favorecer o diálogo e a comunicação entre o museu e o públi-co (Carvalho, 1997). Neste sentido, a divulgação da Geologia passou a ser feita noutros moldes e em inú-meros locais, que estão representados no inventário desenvolvido por esta comunicação.

Museus em Portugal

Portugal caracteriza-se por uma enorme Geo-diversidade sendo inúmeras as unidades geológi-cas com características muito diferenciadas quer na constituição quer na estrutura, em tempos distin-tos. De facto, é marcado por grande heterogenei-dade de fenómenos geológicos, que se traduzem em numerosos georrecursos que são ou já foram explo-rados. A Geodiversidade é constituída não só pelas formações rochosas mas também por ocorrências minerais, fósseis, geoformas, solos, aquíferos, en-tre outros elementos de natureza geológica. Portugal tem boa representação dos diferentes tipos de geor-recursos e das técnicas de como estes são explora-dos. Recorde-se que existem minas, pedreiras a céu aberto, pedreiras subterrâneas, areeiros, aquíferos, entre outros, a partir da qual e são extraídos e pro-cessados (em alguns casos) materiais muitas vezes desconhecidos para a generalidade da população.

Este aspeto, para além de uma cultura e tradi-ção mineira incutida em muitas regiões do país, fez com que surgissem coleções de georrecursos paten-tes nos museus mais importantes a nível nacional (veja-se na tabela 1, o Museu de Ciência da Univer-sidade de Lisboa, o Museu Geológico e o Museu de Ciência da Universidade de Coimbra, como exem-plos) e,numnívelmaislocal,museusregionaisouetnográficosondeestãopatentesaspectosrelacionadoscomosgeorrecursos(…)encontram-setambém,emmenorquantidade,emmuseusdeâm-bitolocalouregional,decarácterpluridisciplinaroumonográfico(museus mineralógicos, paleontológicos ou mineiros), por vezesinstaladosemantigasexploraçõesmineirasoujuntodasocorrên-ciasnaturaisdeparticularsignificado (Brandão, 2008).

Sobre os museus pode afirmar-se que constituem locais de interesse geológico, com exposições, mais ou menos interativas, que contemplam as mais di-versas áreas da geologia, nomeadamente aquela de mais interesse para este trabalho, a dos georrecursos.

Contudo pode aferir-se que, em determinados museus, existe elevada panóplia de elementos expos-tos, o que representa grande diversidade de temas expostos no mesmo local. Veja-se o caso do Museu de História Natural (Lisboa) ou do Museu Carlos Machado (Açores) que contêm coleções das áreas da Biologia, da Botânica, da Química, da Etnografia e da Geologia. Tal facto não se considera inoportuno,

outro lado, identificar processos muito específicos relativamente à importância desse recurso, à extra-ção e ao processamento. Pode dizer-se que existe uma “ponte” entre o conhecimento científico e a sua aplicação e implicação no mundo real. Con-tudo, apesar de se terem feito grandes progressos, o que existe na realidade é um grande número de recursos geológicos em Portugal, que se considera estarem subaproveitados como recursos didáticos.

O ensino das geociências atualmente não for-nece suficiente trabalho de campo como base do conhecimento geológico e trabalho experimental aplicado aos processos geológicos que decorrem em grandes unidades de espaço e tempo (Bolacha & Mateus, 2008a,b). Deste modo, o conhecimen-to acerca da formação de recursos geológicos, tais como os recursos minerais, torna-se difícil, im-percetível e inimaginável, o que poderá tornar o processo de ensino e aprendizagem frustrante.

Desenvolvimento

A Geologia tem tido um desenvolvimento e uma evolução ao longo dos tempos, similar às outras ciências, tendo ultrapassado obstáculos iniciais li-gados a fatores como a religião. Tal como as outras ciências, a Geologia, também foi sendo divulgada no meio científico e não só, tendo as coleções e os museus tido um papel preponderante.

As primeiras coleções de materiais geológicos, designadas de Gabinetes, estão associadas a classes sociais como a aristocracia e o clero e foram cria-das pela raridade dos objetos que as compunham. OsGabineteseramnasuaessência,coleçõesenciclopédicas(…)ereuniamumamisturaheteróclitadeobrasdearte,moedas,pedraspreciosas,corais,fósseiseobjetos“extravagantes”trazidosdeter-raslongínquaspornaveganteseviajantes (Brandão, 2008).

Oconhecimentoperpetuava-senasUniversidadesesurgemassimosprimeirosmuseus.Em1683éestabelecidoemOxford,oprimeiromuseuuniversitáriodeHistóriaNatural,oAshmoleanMuseaum;em1745abre-seaopúblico,emParis,oCabinetd’HistoireNaturelleduRoi,emquesesalientamascoleçõesdeminerais(…) (Brandão, 2008). O número de museus aumentou significati-vamente durante o século XIX, cujas principais fina-lidades consistiam na apresentação e na investigação e as atividades proporcionadas seriam a observação e a comparação (Brandão, 2008). Os museus per-mitiram documentar e fornecer informação sobre imensos factos científicos, onde se inserem as Geo-ciências. A evolução das Ciências Naturais e a plena assunção do carácter educativo dos museus levaram, gradualmente, no decurso do século XX, à perda de importância das exposições baseadas na sistemáti-ca e na teoria da evolução, dando lugar a exposições

Inventário de locais e atividades com interesse geológico no ensino das Geociências

associação portuguesa de geólogos 103A. Vilão & J. Simão

A origem dos Centros de Ciência Viva está rela-cionada com a necessidade da existência de um ca-ráter dinâmico no conhecimento da ciência, neste caso das geociências, que são patentes numa grande parte dos Centros de Ciência Viva. De acordo com a Agência Nacional para a Cultura Científica e Tec-nológica, “osCentrosdeCiênciaVivasãoespaçosinteractivosdedivulgaçãocientíficaetecnológica,distribuídospeloterritórionacional,funcionandocomoplataformasdedesenvolvimentore-gional–científico,culturaleeconómico–atravésdadinamizaçãodeatoresregionaismaisativosnestasáreas.”

Os Centros de Ciência Viva inventariados na ta-bela 2 permitem a aquisição de conhecimentos e a compreensão de fenómenos através da experimen-tação, da visualização e do manuseamento. São efe-tivamente mais dinâmicos que os museus tradicio-nais e, em quase todos os casos, representam uma forte interligação com o meio envolvente, veja-se o exemplo do Centro de Ciência Viva de Estremoz. Este último centro tem patente exposições de cará-ter geológico e mineiro e está inserido numa região com uma forte tradição na exploração de rochas ornamentais. O Centro de Ciência Viva do Lousal, inserido numa antiga área mineira requalificada, pretende recriar o conhecimento relativo à explora-ção e processamento de recursos minerais. O Cen-tro de Ciência Viva do Alviela tem como intenção, recriar através da tecnologia, as origens da nascente do rio Alviela, para além disso, abrange uma sé-rie de atividades, exposições e simuladores sobre o modelado cársico, estrutura geológica presente na região. Os Centros de Ciência Viva são essenciais para o conhecimento, para a motivação no ensino das ciências, para a sensibilização para as questões de sustentabilidade e ambientais- e também para a perpetuação de tradições e fenómenos culturais das sociedades envolventes. Estes vão mais além, quan-do comparados com os tradicionais museus por-que permitem a estimulação dos vários sentidos, a interação entre o conhecimento e o conhecedor, a construção do saber por experimentação. Contu-do, será que a relação entre o conhecimento e a sua aplicação, bem como a implicação no quotidiano serão suficientemente claras? O facto é que a pre-sença no campo e a aprendizagem insitu não podem ser descuradas, pelo que o desenvolvimento deste artigo se centra nesta problemática.

Programa Ciência Viva

De uma outra forma, e na sequência do apare-cimento dos Centros de Ciência Viva, surge o Pro-grama Ciência Viva. O programa de investimento da FCT “Ciência Viva – Promoção da Cultura Cientí-

uma vez que os museus são locais de aquisição e apro-fundamento de conhecimentos. De acordo com Deli-cado (2008), os museus científicos são fundamental-mente espaços onde a Ciência é exibida e disseminada a um público que não tem necessariamente que ter formação em determinada área do conhecimento. No mesmo sentido, a autora refere que os museus de te-mática científica são fundamentalmente vistos como espaços onde a Ciência é mostrada ao público, com a finalidade primordial de difundir conhecimento científico e gerar uma atitude positiva face à Ciência.

Pressupõe-se que existe enorme diversidade no público que visita os museus e, portanto, a existên-cia de várias coleções pode potencializar a curiosi-dade por parte de indivíduos com interesses distin-tos. No entanto, ao analisar-se a oferta de museus e a sua importância para o ensino das Geociências verifica-se que esta diversidade em determinados contextos, pode constituir uma objeção. A falta de especificidade dilui o conhecimento, ou seja, quan-do se trata de um museu com coleções referentes a diversas áreas, incorre-se no erro que a informação seja de conhecimento básico, ou que seja vista por esse aspeto. Existem, no entanto, alguns museus mais específicos, como é o caso do Museu do Már-more (Vila Viçosa), do Museu do Quartzo (Viseu), do Museu do Canteiro (Cantanhede) ou do Mu-seu do Ferro (Moncorvo) que são específicos para a área dos Georrecursos. É possível observarem-se coleções de minerais, maquetes, reconstituições da história da Terra, aplicações dos demais recursos geológicos, a relação entre um determinado recur-so geológico e a sociedade envolvente, entre outros, nos museus anteriormente referidos. Estas exposi-ções têm uma enorme importância para o conhe-cimento das geociências, enriquecem o saber mais generalizado e são boas ferramentas para o estudo e compreensão da importância das geociências e dos georrecursos para as sociedades. Contudo, acre-dita-se que existe uma sobreposição das temáticas abordadas em cada uma das unidades museológi-cas, ou seja, alguns museus podem incorrer no erro de serem repetitivos nas suas coleções e, por outro lado, a relação entre as exposições e a sua aplicação prática é, em alguns casos, quase inexistente.

Centros de Ciência Viva

Na mesma sequência dos museus, no final do sé-culo XX, surgiram em Portugal, locais representativos das várias áreas da ciência, nomeadamente da Geolo-gia. Esses locais são designados de Centros de Ciência Viva, e trouxeram inovação no que se refere à forma como se expõem e transmitem conteúdos científicos.

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igualitária, todo o território nacional (figura 1). As atividades contemplam saídas de campo para todas as vertentes da Geologia, por exemplo a Paleontologia ou a Geologia Estrutural, e mais especificamente os Georrecursos como é o caso, entre outras, da ação de “MármoresdeEstremoz:geologiae tecnologiadeexploraçãodemármores” (Vila Viçosa) e da “MinaRadical” (Lousal – Grândola). O programa Ciência Viva pretende, inequivocamente, atingir o maior número de in-teressados e permite que todas as regiões do país sejam contempladas. A mais-valia deste Programa, quer ao nível dos projetos, quer na Geologia de Ve-rão, é permitir um contacto direto com a Geologia em atividades e saídas de campo. Este aspeto pare-ce ser fundamental e determinante, uma vez que a participação tem sido massiva com grande adesão de público de diferentes faixas etárias. De acordo com o jornal o “Público” do dia 5 de Julho de 2013, as inscrições no Programa Ciência Viva no Verão, a decorrer entre 15 de Julho e 15 de Setembro, assim que abriram, inscreveram-se logo nos primeiros 15 minutos 4000 pessoas. Citado pela mesma fonte, este programa de divulgação científica é “o mais aguardado” do Verão. Ao todo nestes três meses, vai haver 1700 eventos gratuitos em todo o país sobre biologia, geologia, engenharia, castelos e faróis. As ações são guiadas por especialistas de cada área. No-ticiado pela Agência Lusa, em 15 de Julho de 2013, cerca de 16500 pessoas estão já inscritas no pro-grama de divulgação científica Ciência Viva no Verão. Este facto indica que a Geologia atualmente é uma ciência com grande interesse e importância e, para além disso, a possibilidade de observar fenómenos insitu estimula a motivação pelo conhecimento das Geociências. O bom aproveitamento das estruturas geológicas, em consonância com Centros de Ciên-cia Viva, Institutos e/ou Universidades, reflete-se no elevado número de atividades da Geologia de Ve-rão. Deve-se salientar também, como aspeto muito positivo o facto de empresas da indústria extrativa (como é o caso da Mina de Sal-Gema em Loulé) se disponibilizarem para o aproveitamento daquele Georrecurso, como um recurso didático.

Geoparques

A entrada no século XXI exponenciou o envol-vimento e interesse da comunidade científica por questões relacionadas com o património geológi-co, nomeadamente com potenciais locais de inte-resse geológico. Para além da inovação dos museus ou da criação dos Centros de Ciência Viva e dos Programas de Ciência Viva, surgiram ainda, os Geoparques (tabela 3).

Figura1 – Distribuição geográfica das atividades de Geo-logia no âmbito da Ciência Viva no Verão 2013.

Figure1–GeographicdistributionofGeologyactivitiesunderthe2013“CiênciaVivanoVerão”.

Inventário de locais e atividades com interesse geológico no ensino das Geociências

fica e Tecnológica” foi iniciado em 1999, na sequên-cia do programa de investimento “Apoio ao Ensino e Divulgação da Ciência e Tecnologia” de 1996.

O programa Ciência Viva abrange um consi-derável número de projetos que se encontram em execução e/ou já foram concluídos. Os projetos contemplam diversas áreas da ciência e propõem-se ao desenvolvimento de competências como a pes-quisa e o rigor científico, a aplicação de conheci-mentos, a motivação para o ensino e aprendizagem da ciência, a promoção do ensino experimental, a cooperação, o desenvolvimento do espírito crítico, a preservação e as políticas de desenvolvimento sus-tentável, entre outros.

Em rigor, no que se refere à CiênciaVivanoVerão, existem várias atividades, no âmbito da área da Geo-logia, que abrangem, de uma forma mais ou menos

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culo de ensino imprescindível para professores e alunos, para além de fomentarem a curiosidade e o gosto pela geologia. Os geoparques, inventariando e conservando geossítios no seu território, contri-buem para a promoção do ensino das Geociências. O simples facto de serem identificados geossítios de valor educativo já é contribuição relevante para o ensino da Geologia, facilitando a atividade dos pro-fessores que, por vezes, se sentem inseguros na rea-lização de aulas de campo (Brilha, 2009).

O desenvolvimento de estratégias de promoção educativa recorrendo ao património geológico da região, com a disponibilização de guias devida-mente treinados e de recursos educativos apropria-dos, tem-se revelado como um fator essencial para incentivar os professores a promoverem aulas de campo com os alunos, de diversos graus de ensino, particularmente pré-universitário (Brilha, 2009).

Paralelamente à criação de Geoparques, atual-mente, estão inventariados 350 geossítios disponí-veis na base de dados do Grupo Português TheEu-ropean Association for the Conservation of Geological Heritage. Alguns destes sítios inventariados estão incluídos na rede nacional de Geoparques, como é o caso das Portas de Rodão (Geoparque Naturtejo), das Do-bras da Serra da Freita e das Pedras Parideiras de Castanheira (Geoparque Arouca) e também o caso do Algar do Carvão ou da Caldeira das Furnas, am-bos no Geoparque Açores. A classificação de locais em geossítios é importante porque, para além des-tes constituírem bons locais de exemplificação para o ensino das Geociências, permite a geoconserva-ção deste património. Os Geoparques e respetivos geossítios surgem numa área delimitada, onde estão reunidas as condições necessárias para o desenvol-vimento de várias atividades que permitam atingir as finalidades acima referidas. Contudo, apesar da importância confinada aos Geoparques e Geossí-tios acima mencionados, existem outros locais com grande pertinência no ensino das geociências, e que representam locais de antigas ou atuais explorações de georrecursos, como é o caso das Minas da Borra-lha, O Fojo das Pombas, a Pedreira António Mocho, a RotadaPirite (constituída, de acordo com Matos etal., 2008, pelos sítios mineiros da Faixa Piritosa Ibé-rica, como Aljustrel, São Domingos, Lousal e Ca-veira, e que pretende dar continuidade à valorização do conhecimento geológico e mineiros das minas sobrescritas). Estes locais representam apenas uma pequena parcela da indústria extrativa em Portugal. Por outro lado, embora existam geossítios associados à exploração de georrecursos, estes não constituem evidências entre a estrutura geológica, a sua extra-ção e a sua aplicação na sociedade. Ou seja, não se

Um Geoparque é definido como um território com património geológico de importância interna-cional, raridade ou apelativo esteticamente, no qual foi desenvolvido como parte de um conceito inte-grado de conservação, educação e desenvolvimento económico local (UNESCO; Rede Global de Geo-parques, 2006; inAzman etal., 2010). O conceito de Geoparque surgiu na Europa no final do século XX, sendo a sua definição, assim como os seus re-quisitos de tal forma abrangentes, que se remetem a uma determinada área geográfica que abrange locais com interesse geológico relevante, nomeadamente formações geológicas e/ou estruturas com particu-lar importância, pela sua raridade, espetacularidade, beleza e/ou interesse científico. Por outro lado, re-presentam e caracterizam uma região, e permitem a interação entre os mais variados domínios da ciência e do conhecimento, sejam eles a ecologia, a botânica, a zoologia, a cultura, a etnografia, a história, entre outros. Um Geoparque corresponde a um territó-rio bem delimitado geograficamente, com uma es-tratégia de desenvolvimento sustentado, baseada na conservação do património geológico, em associação com os restantes elementos do património natural e cultural, com vista à melhoria das condições de vida das populações que habitam no seu interior (Brilha, 2009). Um Geoparque deverá ter um papel ativo no desenvolvimento económico do espaço territorial através da valorização da paisagem, enquanto heran-ça geológica e do geoturismo. Nele identificam-se “geossítios”, que são locais geológicos de particular importância, raridade ou beleza, que funcionam como núcleos de atração para atividades turísticas e afins, sendo o conjunto regido por um projeto de desenvolvimento económico e social sustentável. São os propósitos de um Geoparque fomentar a Geo-conservação, a educação para o desenvolvimento sus-tentável e o turismo. De acordo com Brilha (2009), a criação de Geoparques veio revolucionar o modo como se divulga as Geociências. Integrando na es-tratégia de gestão de um Geoparque, não só o patri-mónio geológico, como também a biodiversidade, a arqueologia e outros aspetos da herança cultural, de facto as Geociências ganharam visibilidade pública.

Os 3 Geoparques em Portugal, nomeadamente o Geoparque de Arouca, o Geoparque Naturtejo e o Geoparque Açores (tabela 3), e atualmente o As-piring Geoparque Terras de Cavaleiros têm como principais finalidades a divulgação e o ensino das Geociências, a perpetuação do património geológico, a sensibilização para a exploração sustentável dos recursos naturais, o ordenamento do território e a interação entre as comunidades locais, permitindo um desenvolvimento regional. Constituem um veí-

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-lo no campo. A perceção de fenómenos geológi-cos, da sua grandeza em escala temporal e espacial, passa pela observação, análise e compreensão insitu. A Geologia começa no campo sendo imprescindí-veis as saídas, enquanto que os materiais de apoio como vídeos e diapositivos devem servir apenas para colmatar algumas falhas (Antunes, 1991).

No início do século XXI, a Geologia, cuja evo-lução esteve quase sempre associada à identificação, à classificação e à exploração de recursos oriundos da geosfera, precisa de conciliar o desenvolvimen-to económico a que as sociedades legitimamente aspiram, com formas sustentáveis de exploração e de utilização dos referidos recursos naturais. Em simultâneo, deve ainda preocupar-se com o desen-volvimento de atitudes de valorização do patrimó-nio natural que visem a sua conservação (Amador, 2010). É, porém, necessário ter em consideração que, por exemplo, em paleontologia e em mine-ralogia, o património material está muito mais de-pendente dos objetos recolhidos e conservados nas coleções do que dos seus jazigos completos, insitu, aos quais poucas vezes se tem acesso fácil (Brandão, 2008). Os locais referidos, com interesse e impor-tância para o ensino das Geociências, são de igual forma essenciais porque abordam a Geologia e os Georrecursos através de inúmeras perspetivas, que podem passar pela visita a Museus ou Centros de Ciência Viva, pela classificação de Geossítios e até pela oferta do Programa Ciência Viva. Deste modo. o presente trabalho tenta colmatar essa lacuna de interligação entre temas tentando conjugar o valor material de um determinado georrecurso, com o seu valor patrimonial e didático.

Conclusão

Relativamente às formas de divulgação das Geo-ciências, onde se incluem os Georrecursos pode afirmar-se que, atualmente, Portugal dispõe de considerável rede de museus, Centros de Ciên-cia Viva e onde se incluem, também, as atividades organizadas no âmbito do Programa Ciência Viva, Geoparques, entre outros. Estes locais e/ou ati-vidades desenvolvidas neste sentido, são da maior importância para a divulgação das Geociências e podem ser bons instrumentos no ensino da Geo-logia, uma vez que a informação é disseminada de forma clara, concisa e percetível.

Em Portugal houve preocupação crescente, a partir do final do século XX início do século XXI, com a preservação e manutenção do Património Geológico, bem como com a sua divulgação. Con-tudo, considera-se que existem lacunas, nomea-

conhecem visitas orientadas para os diferentes graus de ensino, em que se expliquem e se observem em tempo real, as fases de extração, de processamento e de aplicação de um determinado georrecurso.

Outros locais com interesse geológico

Pela grande geodiversidade existente em Por-tugal, existem outros locais com elevado interesse geológico, que da mesma forma têm contribuí-do para o enriquecimento do ensino da Geologia e compreensão da mesma. São alguns exemplos: Centro Interpretativo do Complexo Mineiro de Tresminas, Mina de Castromil, Parque Paleozóico de Valongo, o Centro de Interpretação Científica das Grutas da Moeda e o Trilho Geológico de Beja.

Reflexão sobre lacunas no ensino das Geociências

Embora seja evidente a crescente preocupação com o Património Geológico português, no que se refere à sua conservação e utilidade pedagógica e social, existem aspetos a ter em conta. Considera--se que, apesar de existirem locais com património mineralógico já preservado e com associação à in-dústria extrativa, a sua compreensão não se processa na totalidade. Existe alguma dificuldade na relação entre a formação de estruturas geológicas (poten-ciais georrecursos), a sua extração e a sua aplicação na sociedade atual. Como exemplo, o Museu do Mármore de Vila Viçosa, que contempla diferen-tes componentes, desde a transformação do már-more em produto histórico-cultural de expressão artística a sócio-económica, através da realização de exposições temporárias, com temáticas relativas ao âmbito em que se insere o museu (in Roteiro de Mi-nas, www.roteirodeminas.pt). No entanto, enten-de-se que, para o visitante, continua a ser difícil, face a esta informação, relacionar uma estrutura geológica com a sua exploração e aplicação.

Por outro lado, todos os locais referenciados, em boa parte, carecem de orientação específica para os diferentes ciclos de escolaridade. Deste modo, po-deria existir um roteiro adequado às necessidades de cada grau de ensino. Este aspeto, em muitos casos de difícil conceção, prende-se com o fato do obje-tivo da existência de museus, de Centros de Ciência Viva, de Geoparques e outros locais ser mais amplo, e visar atingir toda a população de forma generali-zada. Embora recebam visitas de estudo, não exis-te um enquadramento nos conteúdos teóricos da disciplina que se pretende abordar com a visita. De outra forma, existe uma relação necessária entre o ensino das Geociências e a necessidade de praticá-

Inventário de locais e atividades com interesse geológico no ensino das Geociências

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damente ao nível específico da importância dos Georrecursos nas sociedades. A falta de relação entre o conhecimento de fenómenos geológicos e a sua importância real para Homem é notória. Para colmatar esta falta de interação, será impor-tante um esforço da comunidade científica com o apoio de empresas e outras entidades, para a elabo-ração de roteiros pedagógicos adequados a diferen-tes níveis de ensino. Procurar-se-ia, por um lado, acompanhar de forma mais eficaz os alunos numa saída de campo e, por outro, dar a conhecer todos os processos inerentes a este tipo de indústrias, que exploram e comercializam georrecursos, estabele-cendo uma relação entre as mesmas e a sociedade.

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ProgramaCiênciaViva.http://www.cienciaviva.pt/

A. Vilão & J. Simão

Nome Exposições - Principais Temas Localização

Museu Nacional de História Natural/ Museu de Ciência da Universidade de Lisboa

- Aventura na Terra;- Allosaurus;- Coleções de Naturalista;- Minerais – Identificar e Classificar;- O minério da Panasqueira.

Lisboa

Museu Geológico - Geologia de Lisboa;- Paleontologia;- Arqueologia;- Mineralogia;- Cartografia Geológica.

Lisboa

Museus de Geociências do Instituto Superior Técnico

- Museu Alfredo Bensaúde – mineralogia, cristalografia e petrologia;- Museu Décio Thadeu – geologia e jazigos minerais.

Lisboa

Museu da Água - Abrange 4 núcleos constituídos por monumentos e edifícios relacionados com a história do abastecimento de água de Lisboa nos séculos XVIII e XIX.

Lisboa

Museu de Ciência da Faculdade de Ciências – Universidade do Porto

- Museu de História Natural;- Jardim Botânico;- Instituto Geofísico;- Observatório Astronómico.

Porto

Museu de História Natural da Faculdade de Ciências – Universidade do Porto

- Museu de Mineralogia Montenegro de Andrade;- Museu de Antropologia e Pré-História Mendes Corrêa;- Museu de Paleontologia Wenceslau de Lima;- Museu de Zoologia Augusto Nobre.

Porto

Tabela1–Inventariação dos Museus com interesse geológico em Portugal.Table1 – Inventory of museums with geological interest in Portugal.

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Tabela1–Inventariação dos Museus com interesse geológico em Portugal (cont.).Table1 – Inventory of museums with geological interest in Portugal (cont.).

Inventário de locais e atividades com interesse geológico no ensino das Geociências

Museu da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP)

- Núcleo museológico constituído por coleções de objectos que testemunham o ensino experimental e a investigação desenvolvidos pela instituição desde a sua criação, salientando-se as coleções do Departamento de Engenharia de Minas.

Porto

Museu do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP)

- História dos últimos 160 anos de engenharia (Áreas da Engenharia: Civil, Química, Mecânica, Física, Eletrotécnica, Minas e Metalurgia).

Porto

Museu de Jazigos Minerais Portugueses

- Minérios de explorações portuguesas;- Artefactos arqueológicos relacionados com a exploração mineira em Portugal.

S. Mamede de Infesta (Porto)

Museu Mineralógico e Geológico da Universidade de Coimbra

- Mineralogia;- Petrologia;- Cartografia Geológica.

Coimbra

Museu da Ciência da Universidade de Coimbra

- Física;- Astronomia;- Química;- História Natural;- Ciências Médicas.

Coimbra

Museu do Quartzo - Mineralogia;- Geologia regional e o quartzo no contexto geológico e mineralógico.

Viseu

Museu de Geologia da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

- Coleções de rochas e minerais;- Coleções de fósseis;- Exemplos de aplicações de rochas e minerais.

Vila Real

Museu do Ferro e da Região de Moncorvo

- Oficina do conhecimento sobre os ofícios;- Sala do Ferro.

Torre de Moncorvo

Museu da Pedra do Município de Cantanhede

- Estatuaria antiga e outros ornamentos em pedra de Ançã;- Processamento e exploração da pedra;- Geologia do concelho;- Artefactos arqueológicos;- Fósseis;- Exposições temporárias de escultura contemporânea.

Cantanhede

Museu da Pedra do Marco de Canaveses

- Granito – relação do Homem com a pedra, a pedra com a arte, com o património e a sua história.

Marco de Canaveses

Museu da Lousa - Casa do Mineiro;- Espólio e documentação ligados à ardósia.

Valongo

Casa da Malta/Museu Mineiro - Secção Geológica (Fósseis e Carvão);- Tradição mineira.

S. Pedro da Cova (Gondomar)

Museu do Canteiro - Exposição permanente dedicada ao labor do canteiro. Alcains (Castelo Branco)

Museu da Fábrica Maceira-Liz - Património histórico e cultural da Fábrica Maceira-Liz (Indústria Cimenteira).

Maceira (Leiria)

Museu da Lourinhã - Paleontologia;- Arqueologia;- Etnografia.

Lourinhã

Museu Mineiro do Lousal - Arqueologia industrial mineira. Lousal

Museu Municipal de Aljustrel - Arqueologia ligada à Indústria mineira da região. Aljustrel

Museu da Lucerna - Coleção de Lucernas de época romana. Castro Verde

Museu do Mármore de Vila Viçosa

- Extração e transformação do mármore. Vila Viçosa

Museu de História Natural do Funchal

- Rochas e minerais do Arquipélago da Madeira;- Fósseis marinhos de Porto Santo;- Jardim de Plantas Aromáticas e Medicinais.

Funchal (Madeira)

Museu Carlos Machado - Exposição permanente de minerais e rochas vulcânicas. Ilha de S. Miguel (Açores)

Museu da Horta (Núcleo Museológico dos Capelinhos)

- Relato fotográfico da erupção do Vulcão dos Capelinhos em 1957;- Exposição de escórias provenientes da erupção.

Ilha do Faial (Açores)

associação portuguesa de geólogos 109

Tabela2–Inventariação de Centros de Ciência Viva em Portugal.Table2–Inventorying Science Centres in Portugal.

Nome Principais temas Localização

Centro de Ciência Viva de Bragança

- Energia e Ambiente;- Sustentabilidade.

Bragança

Centro de Ciência Viva – Planetário do Porto

- Astronomia. Porto

Centro de Ciência Viva de Vila do Conde

- Corpo Humano e o Sangue. Vila do Conde

Centro de Ciência Viva - Visionarium

- Exposições permanentes sobre os temas: Terra, Matéria, Universo, Vida, Odisseia Virtual.

Santa Maria da Feira

Centro de Ciência Viva de Aveiro – A Fábrica

- Atividades distintas: uma cozinha, onde as receitas se transformam em protocolos científicos, duas atividades de robótica, uma fábrica que guarda informações inesperadas e ainda um laboratório com paredes de vidro.

Aveiro

Centro de Ciência Viva Rómulo de Carvalho

- Física;- Centro de recursos para o ensino e aprendizagem das ciências e difusão da cultura científica.

Coimbra

Centro de Ciência Viva de Coimbra – Exploratório Infante D. Henrique

- Atividades distintas: descobrir as várias formas de comunicar do mundo animal, dar a volta a Portugal de rocha em rocha, saltar na Lua, deixar a silhueta numa parede, usar um vegetal para ver as horas ou construir uma Europa a quatro cores.

Coimbra

Centro de Ciência Viva de Proença-a-Nova

- Floresta. Proença-a-Nova

Centro de Ciência Viva de Constância – Parque de Astronomia

- Universo e Sistema Solar. Constância

Centro de Ciência Viva do Alviela - Carsoscópio

- Aquíferos. Alcanena

Centro de Ciência Viva de Sintra

- A água, o Homem e o Meio Ambiente. Sintra

Centro de Ciência Viva – Planetário Calouste Gulbenkian

- Astronomia. Lisboa

Pavilhão do Conhecimento – Ciência Viva

- Física; - Matemática;- Tecnologia; - Outras áreas do conhecimento.

Lisboa

Centro de Ciência Viva de Estremoz

- Exposições relacionadas com os temas: Terra, um planeta dinâmico, e Sistema Solar.

Estremoz

Centro de Ciência Viva do Lousal

- Conteúdos relacionados com a época em que a mina do Lousal se encontrava ativa, onde minérios formados há milhões de anos foram explorados por milhares de mineiros.

Lousal

Centro de Ciência Viva de Tavira

- Água e Energia. Tavira

Centro de Ciência Viva do Algarve

- O Sol e a sua influência sobre a Terra e os seres vivos. Faro

Centro de Ciência Viva de Lagos

- Instrumentos de orientação e navegação, a vida a bordo de um navio e a comunicação à distância.

Lagos

Centro de Ciência Viva de Porto Moniz

- Floresta Laurissilva. Porto Moniz (Madeira)

Expolab – Centro de Ciência Viva dos Açores

- Biologia;- Física.

Lagoa (Ilha de S. Miguel – Açores)

A. Vilão & J. Simão

110 Inventário de locais e atividades com interesse geológico no ensino das Geociências

Tabela3–Inventariação dos Geoparques em Portugal.Table3–Inventory of Geoparks in Portugal.

Nome Principais temas Localização

Geoparque Arouca

No Geoparque de Arouca estão referenciados 41 geossítios que se destacam pela sua singularidade e notável valor do ponto de vista científico, didático e/ou turístico, com particular destaque para as Trilobites Gigantes de Canelas, para as Pedras Parideiras de Castanheira e para os Icnofósseis do Vale do Paiva. Estão referenciados quatro geossítios de importância internacional.

Área administrativa do concelho de Arouca

Geoparque Naturtejo

O vasto património geomorfológico, geológico, paleontológico e geomineiro, apresenta elementos de relevância nacional e internacional, de que são exemplo os icnofósseis de Penha Garcia, os canhões fluviais de Penha Garcia, as Portas do Ródão e de Almourão, a mina de ouro romana do Conhal do Arneiro e as morfologias graníticas da Serra da Gardunha e Monsanto. Para além dos geossítios, o Geopark Naturtejo conta com o Parque Natural do Tejo Internacional e com áreas protegidas no âmbito da Rede Natura 2000 (sítios Gardunha, Nisa e S. Mamede) e das Important Bird Areas (Penha Garcia - Toulões e as serranias quartzíticas do Ródão), que testemunham a sua riqueza ecológica.

Corresponde a um território de 4616 km2, nos concelhos de Castelo Branco, Idanha-a-Nova, Proença-a-Nova, Nisa, Oleiros e Vila Velha de Ródão

Geoparque Açores

O arquipélago dos Açores apresenta uma rica e vasta geodiversidade e um importante património geológico, composto por diversos locais de interesse científico, pedagógico e turístico. O Geoparque Açores assenta numa rede de geossítios, dispersos pelas nove ilhas e zona marinha envolvente que;- Garante a representatividade da geodiversidade que caracteriza o território açoriano;- Traduz a sua história geológica eruptiva;- Possui estratégias de conservação e promoção comuns;- É baseada numa estrutura de gestão descentralizada e com apoio em todas as ilhas.

As 9 ilhas do Arquipélago dos Açores

Tabela4–Outros parques com interesse geológico e mineiro em Portugal.Table4–Other parks with geological and mining interest in Portugal.

Nome Principais temas Localização

Parque Paleozóico de Valongo - Preservação de fósseis de Trilobites e outros organismos da Era Paleozóica;- Preservação de um conjunto de características geológicas que fazem com que a Serra de Valongo se torne um laboratório vivo sobre a História da Terra.

Valongo

Passeio Geológico da Foz do Douro

- Visita guiada ao “Complexo Metamórfico da Foz do Douro”. Porto

Trilho Geológico - Mostra permanente da Geologia do Alentejo (minério de cobre de Neves Corvo, mármore de Trigaches, xisto de Barrancos, arenito de Alfundão com fósseis de ostras, gabro de Beja).

Beja

Mina do Lousal - Espaço requalificado e valorizado onde as infraestruturas físicas, os equipamentos e o acervo associados ao património mineiro do Lousal foram ou estão a ser intervencionados.

Lousal

Mina de Aljustrel - Malacate do Poço Viana;- Núcleo da Central de Compressores.

Aljustrel

Mina de Castromil - Percurso pedestre (com materiais didáticos) onde são referidos aspectos mineiros e geológicos;- Visita aos trabalhos subterrâneos, com explicação sobre as técnicas aplicadas na antiguidade para a exploração e extração do ouro;- Geologia local (fenómenos responsáveis pela ocorrência de mineralização de ouro).

Castromil (Paredes)

Ecomuseu Salinas de Rio Maior - Atendimento, visitas guiadas; serviços educativos e interpretação do meio natural e cultural no tempo e no espaço, da área do Vale Diapírico da Fonte da Bica.

Rio Maior

Centro Interpretativo do Complexo Mineiro de Tresminas

- Mineração Romana;- Património Natural;- Visita às galerias subterrâneas do complexo mineiro.

Vila Pouca de Aguiar

Centro de Interpretação Científica das Grutas da Moeda

- Espaço interativo destinado a questões relacionadas com as Ciências da Terra (interação com equipamentos e exposições que facilitam o entendimento dos fenómenos geológicos e ambientais do Maciço Calcário Estremenho).

Batalha (Leiria)

113Instruções aos Autores

A – Estatuto editorial da GEONOVAS

GEONOVAS é a revista anual publicada pela APG – Associação Portuguesa de Geólogos. Publicada desde 1981, é o principal agente de comunicação com os sócios e edita artigos originais de investigação científica e de divulgação no âmbito da geologia.

A revista poderá publicar artigos científicos origi-nais, artigos de divulgação, artigos de autores especial-mente convidados que desenvolvam temas no âmbito acima referido ou, ainda, notícias de carácter informa-tivo com interesse para a Comunidade Geocientífica.

B – Informação geral

Os autores devem seguir as normas aqui estabele-cidas e publicadas no final da revista. A submissão de artigos à GEONOVAS implica a aceitação destas normas.

Cada artigo será avaliado por um dos membros da Comissão Editorial e por dois revisores anónimos, podendo ser recusada a sua publicação. Os nomes dos revisores não anónimos e respetiva instituição poderão ser incluídos nos agradecimentos dos respetivos artigos, caso autores e revisores estejam de acordo. O conjunto dos revisores de cada número da revista constituem a respetiva Comissão Científica.

Os artigos submetidos a publicação não podem ser enviados a outras revistas.

C – Preparação do artigo

O último número da revista GEONOVAS deve ser consultado para mais fácil preparação do artigo. Os manuscritos que não sigam as instruções que se seguem poderão ser reenviados aos autores para procederem às alterações necessárias.

1. Submissão

Todos os artigos deverão ser submetidos pelo e-mail da APG ( [email protected]).

Todos os artigos submetidos deverão conter os se-guintes ficheiros:

a) Manuscrito (documento Word) que deverá incluir as seguintes partes: i) páginas iniciais com Título(s), Autor(es), Afiliação e Contactos, Título(s) curto(s), Resumo(s) e Palavras-Chave; ii) Texto principal; iii) Agradecimentos; iv) Bibliografia;

b) Legendas das Figuras e Tabelas (Documento Word);

c) Figuras enviadas em ficheiros JPEG ou TIFF à

parte com resolução de pelo menos 300 dpi (não inse-ridas no manuscrito);

d) Tabelas enviadas à parte num documento Word;e) Lista com três possíveis revisores para o artigo

(documento Word) com nomes, afiliações e contactos de e-mail. A comissão executiva não garante que qualquer dos nomes propostos seja escolhido para rever o artigo.

Todos os ficheiros deverão ser submetidos com um nome razoável que indique claramente o que esse fi-cheiro contém e numa ordem sequencial lógica, como por exemplo:

- título do trabalho.doc- Legendas.doc- Figura1.jpg- Figura2.jpg- Figura3.jpg- Tabelas.doc- Anexo1.tiff- Revisores.doc(Este exemplo é meramente ilustrativo).

2. Informação adicional

a) Os manuscritos deverão incluir numeração de pá-ginas e linhas.

b) Os manuscritos deverão ser preparados usando um tipo de letra comum e tamanho adequado (exemplo Times 12 ou Arial 12) e dactilografados a dois espaços, coluna única, formato de papel A4.

c) Os artigos devem ser originais e compreender dados, interpretações ou sínteses não publicados pre-viamente.

d) Os artigos e os resumos devem ser escritos em português, devendo ser sempre apresentado um resumo em inglês e em português. Os resumos na língua origi-nal do artigo não podem conter mais de 150 palavras.

e) Todos os manuscritos deverão conter palavras--chave a seguir aos resumos. Tanto para o resumo em inglês como na língua original do manuscrito não po-derão ter mais de 5 palavras-chave.

f) Os artigos recebidos pela Comissão Editorial se-rão revistos pelo editor e por dois ou mais revisores científicos.

h) Para artigos em co-autoria, o manuscrito deve-rá mencionar o autor correspondente. Se a mesma não for providenciada, o autor que submeteu o artigo será considerado o autor correspondente. A submissão de artigos em co-autoria implica que o autor correspon-dente tem o acordo dos restantes autores para submeter e publicar o artigo.

geonovasinstruções aos autores

114 Instruções aos Autores

3. Preparação do Manuscrito

a) A primeira página do manuscrito deverá conter o título do artigo em tamanho 16, o(s) nome(s) do(s) autor(es) em tamanho 12, a afiliação do(s) autor(es) com endereços institucionais, os telefones (ou faxes) e e-mails em tamanho 9, bem como a indicação a que au-tor deverá ser enviada a correspondência.

b) A segunda página deverá conter o(s) resumo(s) em português e em inglês seguido(s) de até cinco pa-lavras-chave, em tamanho 10. Cada resumo deverá ser inteligível sem referência ao artigo e deverá ser uma compilação objetiva das informações e interpretações originais do artigo, e não apenas uma referência aos as-suntos abordados.

c) O texto principal, em tamanho 12, deverá seguir--se e poderá ser dividido em secções.

d) Os agradecimentos deverão seguir o texto prin-cipal e deverão ser reunidos numa secção denominada por Agradecimentos.

e) Todas as referências citadas no texto deverão ser organizadas por ordem alfabética no fim do texto (a se-guir aos agradecimentos) e deverão estar numa secção denominada Bibliografia.

No texto, as referências deverão ser citadas pelo(s) nome(s) do(s) autor(es), e pela data da edição (entre parêntesis) como os exemplos seguintes:

Dias & Cabral (1989)Cabral (1995) (Cunha, 1987, 1992, 1996)(Raposo, 1987, 1995a, 1995b; Cunha etal., 2008).As referências a livros devem mencionar o(s) nome(s)

do(s) autor(es), seguido da data de publicação, o título da obra emitálico, entidade editora, local de publicação e paginação. As referências a artigos devem mencionar o(s) nome(s) do(s) autor(es), seguido da data de publi-cação (entre parêntesis), o título do artigo, o título do periódico emitálico, o volume, o número ou fascículo e a paginação.

Os autores deverão consultar o último número das GEONOVASpara correta listagem das referências.

Exemplos:Cunha, P. P., 1987. Evolução tectono-sedimentar ter-

ciária da região de Sarzedas (Portugal). Comun.Serv.Geol.Portugal, Lisboa, 73(1/2): 67-84.

Cunha, P. P., Martins, A. A., Huot, S., Murray, A. & Raposo, L., 2008. Dating the Tejo river lower ter-races in the Ródão area (Portugal) to assess the role of tectonics and uplift. Geomorphology, 102: 43– 54.

Reis, R. Pena dos & Cunha, P. P., 1989. Comparación de los rellenos terciarios en dos regiones del borde occidental del Macizo Hespérico (Portugal Central). PaleogeografíadelaMesetanorteduranteelTerciario. (C.J. Da-brio, Editor), Stv.Geol.Salman., Ediciones Univ. Sala-manca, vol. esp. 5: 253-272.

Ribeiro, O., Teixeira, C. & Ferreira, C. R., 1967. Car-ta Geológica de Portugal na escala 1/50 000 (folha 24D – Castelo Branco) e respectiva notícia explica-tiva. Serv.Geol.dePortugal, Lisboa, 24 p.

Romão, J., 2000. Estudo tectono-estratigráfico de um segmento do bordo SW da Zona Centro-Ibéri-ca (ZCI) e suas relações com a Zona Ossa-Morena (ZOM). Diss. Doutoramento, Univ. Lisboa, 322 p. f) Todas as ilustrações deverão ser designadas figu-

ras. No início da frase devem ser referidas escritas por extenso (ex: Figura 1). Dentro da frase devem ser escri-tas de forma abreviada (ex: Fig. 1). Os anexos deverão ser mencionados no texto, referindo-se a estes como Anexo 1, etc.

g) Cabeçalhos ou rodapés não poderão ser usados em qualquer circunstância.

h) Fórmulas matemáticas/equações são geralmente introduzidas como parte de frases, requerendo pontua-ção. Os autores deverão providenciar todos os símbolos a constar na publicação.

4. Ilustrações

Todas as ilustrações (figuras, gráficos, mapas, fo-tos, etc…) são figuras e devem ser referidas como tal. As figuras deverão estar numeradas sequencialmente com numerais arábicos e devem ser providenciadas em ficheiros separados com resolução adequada para publi-cação (no mínimo 300 dpi, submissão eletrónica ape-nas) que não poderá exceder os 4Mb cada.

As figuras deverão ser enviadas com os tipos de letra a usar (Times, Arial, Helvetica, Symbol ou Courier). As partes de uma figura devem estar indicadas como (a), (b), (c), etc., e devem ser referidas como tal nas legendas (ex: Fig. 5 – (a)), mas como a, b, c, etc. no texto (ex. Fig. 5d).

5. Tabelas

As tabelas devem ser enviadas num documento Word em separado. As unidades deverão ser referidas uma vez nas colunas ou na legenda e não ao longo da tabela.

6. Legendas

As legendas das figuras e tabelas devem ser apre-sentadas com espaçamento duplo e devem ser enviadas num documento Word em separado. As legendas devem ser providenciadas na língua original do artigo e em in-glês, descrevendo brevemente o conteúdo das figuras e/ou tabelas.

7. Separatas

Serão fornecidas aos autores ficheiros pdf dos traba-lhos publicados.

Associação Portuguesa de Geólogos Endereço postalApartado 2109, 1103-001 Lisboa

Morada socialMuseu Geológico,Rua da Academia das Ciências, nº19 - 2º1249-280 Lisboa

Telefone+351 213 477 695

Fax+351 213 429 285

[email protected]

Comissão DiretivaAntónio Gomes CoelhoJosé Mário C. BrancoJosé RomãoCarlos AlmeidaMargarida SilvaMónica SousaVítor Correia

Comissão EditorialJoão Pais (FCT/UNL)José Romão (LNEG)Rúben Dias (LNEG)Zélia Pereira (LNEG)

Foto da CapaGeossítio Pulo do Lobono rio Guadiana. Foto deDiamantino Insua Pereira.

Execução gráficaJ.M.G. - Art. Pap., Artes Gráficas e Publicidade, LdaAlameda das Figueiras, 13, 3B2665-501 Venda do Pinheiro

Depósito Legal183140/02 ISSN 0870-7375

Tiragem250 exemplares

PeriodicidadeAnual

A Associação Portuguesa de Geólogos foi fundada em 1976. É uma associação sócio-profissional, sem fins lucrati-vos, que congrega profissionais da Geologia que se dedicam a domínios diversificados no âmbito das Ciências da Terra.

É membro fundador da Federação Europeia de Geólogos.É também membro da Federação Portuguesa das Associa-

ções e Sociedades Científicas (FEPASC).

Os objetivos da Associação Portuguesa de Geólogos são os seguintes:

• Representar a profissão de Geólogo junto dos poderes públicos e privados;• Promover a elevação, independência e prestígio da pro-fissão;• Defender os interesses dos Geólogos e da Geologia;• Promover o desenvolvimento científico e técnico dos seus associados;• Cooperar na preparação de leis e regulamentos relativos ao título e ao exercício da profissão;• Aprovar um código português de deontologia profissio-nal (Código Deontológico);• Intervir no planeamento do ensino da Geologia.

Associação Portuguesa de Geólogos

Quer receber informações sobre as atividades desenvol-vidas pela APG? Envie-nos o seu endereço eletrónico para [email protected] solicitando a inclusão na nossa lista de divulgação.

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