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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1 15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental GERAÇÃO DE IMAGENS ESTEREOSCÓPICAS A PARTIR DE PRODUTOS DO GOOGLE EARTH COM APLICAÇÕES NO MAPEAMENTO GEOTÉCNICO E GEOAMBIENTAL Flávio Henrique Rodrigues 1 ; José Eduardo Zaine 2 Resumo Neste trabalho é apresentada a técnica de captura das imagens Google Earth e geração de fotografias aéreas digitais com estereoscopia, por meio de procedimentos semiautomáticos, com vistas à aplicação no mapeamento geotécnico e geoambiental. Foram adaptados os métodos convencionais de aerofotogrametria ao meio digital, a fim de se realizar o levantamento fotoaéreo simulado no ambiente do Google Earth. Para tanto, a proposta metodológica apresentada fundamentou-se nos trabalhos clássicos sobre aerofotogrametria e fotointerpretação geológica, abordando os seguintes tópicos: 1) Tipos de fotografias aéreas; 2) Escala fotográfica; 3) Exagero vertical; 4) Levantamento fotoaéreo, e 5) Fotomosaico. Por fim são apresentados dois exemplos de mapeamentos geológico-geotécnicos em diferentes escalas, que aplicaram esta técnica, obtendo resultados satisfatórios na identificação e caracterização dos terrenos e processos geológicos exógenos condicionantes de obras viárias. Conclui-se que a obtenção sistemática de imagens estereoscópicas do Google Earth apresenta-se como uma alternativa economicamente viável à realização de mapeamento do meio físico em diferentes escalas, sendo uma solução em casos onde a falta de dados cartográficos básicos é um limitante. Abstract This paper presents the technique of capture Google Earth’s images and generation of digital aerial photographs with stereoscopy, by means of semi-automatic procedures, aiming at the application in geotechnical and geoenvironmental mapping. Conventional aerial photogrammetry methods have been adapted to the digital environment, in order to carry out the survey fotoaéreo simulated in the Google Earth environment. Therefore, the methodological proposal was based on the classic works on aerial photography and geological photointerpretation, addressing the following topics: 1) Types of aerial photographs; 2) Photographic scale; 3) Vertical exaggeration; 4) Survey aerial photo, and 5) Photo Mosaic. Finally, two examples of geological-geotechnical mapping in different scale are presented, which was applied this technique, obtaining satisfactory results in the identification and characterization of landunits and exogenous geological processes that affect road works. It follows that a systematic obtaining stereoscopic images from Google Earth appears as an economically viable alternative to carrying out mapping of the physical environment at different scales, as a solution in cases where a lack of basic map data is limiting. Palavras-Chave Aerofotogrametria aplicada à Interpretação Fotogeológica; Imagens do Google Earth; Mapeamento Geotécnico e Geoambiental. 1: Eng. Amb., Msc, Universidade Estadual Paulista, Programa de Pós Graduação em Geociências e Meio Ambiente, Rio Claro SP (19) 9 9131-6797, email: [email protected] 2: Geól., Livre Docente, Universidade Estadual Paulista, Departamento de Geologia Aplicada, Rio Claro SP (19) 3526-9313, email: [email protected]

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15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental 1

15º Congresso Brasileiro de Geologia de Engenharia e Ambiental

GERAÇÃO DE IMAGENS ESTEREOSCÓPICAS A PARTIR DE PRODUTOS

DO GOOGLE EARTH COM APLICAÇÕES NO MAPEAMENTO

GEOTÉCNICO E GEOAMBIENTAL

Flávio Henrique Rodrigues 1; José Eduardo Zaine 2

Resumo – Neste trabalho é apresentada a técnica de captura das imagens Google Earth e geração de fotografias aéreas digitais com estereoscopia, por meio de procedimentos semiautomáticos, com vistas à aplicação no mapeamento geotécnico e geoambiental. Foram adaptados os métodos convencionais de aerofotogrametria ao meio digital, a fim de se realizar o levantamento fotoaéreo simulado no ambiente do Google Earth. Para tanto, a proposta metodológica apresentada fundamentou-se nos trabalhos clássicos sobre aerofotogrametria e fotointerpretação geológica, abordando os seguintes tópicos: 1) Tipos de fotografias aéreas; 2) Escala fotográfica; 3) Exagero vertical; 4) Levantamento fotoaéreo, e 5) Fotomosaico. Por fim são apresentados dois exemplos de mapeamentos geológico-geotécnicos em diferentes escalas, que aplicaram esta técnica, obtendo resultados satisfatórios na identificação e caracterização dos terrenos e processos geológicos exógenos condicionantes de obras viárias. Conclui-se que a obtenção sistemática de imagens estereoscópicas do Google Earth apresenta-se como uma alternativa economicamente viável à realização de mapeamento do meio físico em diferentes escalas, sendo uma solução em casos onde a falta de dados cartográficos básicos é um limitante.

Abstract – This paper presents the technique of capture Google Earth’s images and generation of digital aerial photographs with stereoscopy, by means of semi-automatic procedures, aiming at the application in geotechnical and geoenvironmental mapping. Conventional aerial photogrammetry methods have been adapted to the digital environment, in order to carry out the survey fotoaéreo simulated in the Google Earth environment. Therefore, the methodological proposal was based on the classic works on aerial photography and geological photointerpretation, addressing the following topics: 1) Types of aerial photographs; 2) Photographic scale; 3) Vertical exaggeration; 4) Survey aerial photo, and 5) Photo Mosaic. Finally, two examples of geological-geotechnical mapping in different scale are presented, which was applied this technique, obtaining satisfactory results in the identification and characterization of landunits and exogenous geological processes that affect road works. It follows that a systematic obtaining stereoscopic images from Google Earth appears as an economically viable alternative to carrying out mapping of the physical environment at different scales, as a solution in cases where a lack of basic map data is limiting.

Palavras-Chave – Aerofotogrametria aplicada à Interpretação Fotogeológica; Imagens do Google Earth; Mapeamento Geotécnico e Geoambiental.

1: Eng. Amb., Msc, Universidade Estadual Paulista, Programa de Pós Graduação em Geociências e Meio Ambiente, Rio Claro – SP (19) 9 9131-6797, email: [email protected] 2: Geól., Livre Docente, Universidade Estadual Paulista, Departamento de Geologia Aplicada, Rio Claro – SP (19) 3526-9313, email: [email protected]

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1. INTRODUÇÃO

A análise de produtos de sensoriamento remoto aplicada às geociências interessa-se fundamentalmente por feições superficiais ou elementos da paisagem, dados por condições naturais. As variações na textura do relevo e da drenagem constituem a propriedade fundamental de análise de imagens orbitais e fotografias aéreas, pois permitem separar atributos do meio físico com significado diferente ou associar aqueles com o mesmo significado (SOARES E FIORI, 1976; VENEZIANI; ANJOS, 1982).

A fotogeologia, compreendida como o conjunto de procedimentos analíticos e interpretativos de dados geológicos, consiste no uso de fotografias aéreas a partir da combinação de critérios como tom, cor, textura, padrão (modelo), relação com aspectos associados, forma, tamanho, exagero vertical e escala (RAY, 1963). Dentre suas aplicações, destaca-se a inferência com respeito às propriedades e características geológico-geotécnicas dos materiais e estruturas geológicas, com foco na elaboração de mapas de geologia de engenharia.

Com o advento tecnológico e consequente consolidação de aspectos metodológicos, duas abordagens cartográficas destacaram-se no meio geotécnico: a abordagem analítica, a qual visa à avaliação multitemática com enfoque geossistêmico, com a sobreposição de mapas de diferentes assuntos (geologia, geomorfologia, hidrológico, etc.), e a abordagem sintética a partir da análise fisiográfica do relevo e drenagem, por meio do método lógico sistemático de fotointerpretação (ARCANJO, 2011; SILVA, DANTAS, 2012). Para Zuquette e Gandolfi (2004), o uso de informações preexistentes de áreas com grande volume de dados consistentes, precisos e organizados homogeneamente é denominado de cartografia geotécnica. Já o mapeamento geotécnico refere-se à geração de informações de interesse em regiões onde são escassos ou inexistentes dados cartográficos, enquadrando-se nesta situação o Brasil e a maioria dos países do hemisfério sul.

De acordo com a Comissão Nacional de Cartografia (CONCAR), responsável pela atualidade e integridade da infraestrutura dos dados espaciais, o Brasil enfrente graves dificuldades culturais e institucionais em atender as demandas dos diversos setores que utilizam a cartografia para o desenvolvimento de suas atividades (públicos e privados). As lacunas na representação dos aspectos físicos e culturais, com mais de trinta anos de defasagem desde os grandes mapeamentos (na escala de 1:1.000.000 em todo território nacional), contribuem para os altos índices de vazios cartográficos e desatualização das folhas topográficas existentes. Em termos quantitativos, os mapeamentos nas escalas regionais e locais recobrem os seguintes percentuais do território brasileiro: 81% na escala 1:250.000, 75% na escala de 1:100.000, 14% na escala de 1:50.000 e 1% na escala de 1:25.000 (CONCAR, 2015).

Frente a este cenário, torna-se imperativa a busca por alternativas técnicas e científicas para elaboração de mapas como instrumentos de planejamento e gestão territorial, compatíveis à realidade brasileira. Evidencia-se tal fato, pela crescente importância dos recursos computacionais cartográficos, como os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) e bancos de dados georreferenciados acessíveis gratuitamente via internet.

Em consonância com essa premissa, o Google Earth apresenta-se com uma poderosa ferramenta de manipulação de dados digitais cadastrais (arquivos vetoriais e alfanuméricos) e provenientes de sensores remotos (imagens orbitais de diversas resoluções), com uma abrangência global, preferencialmente de países economicamente desenvolvidos e regiões com alta densidade demográfica.

Lopes (2009) descreve e avalia criteriosamente os dados interpretados no Google Earth, com enfoque na validação geométrica e registro (georreferenciamento) das imagens de satélite da alta resolução. A pesar das limitações calculadas estatisticamente, as imagens analisadas foram consideradas adequadas para uso no mapeamento territorial, com nível de confiança de 95%, porém com ressalvas para registro das mesmas, fator limitante na utilização para trabalhos em escalas muito grandes em lugares remotos.

Muitos trabalhos têm se conduzido no sentido de validar e popularizar no meio técnico-acadêmico os produtos do Google Earth, com destaque para os seguintes: Brown (2006),

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Garfinkel (2007), Comamandeura e Asperena (2008), Hwang (2008) Oliveira (2009), Silva e Nazareno (2009), Freitas et al (2012), Simon e Trentin (2015) e Borges et al (2013). No entanto, constata-se a ausência de trabalhos que exploram os dados altimétricos associados ao efeito tridimensional de terreno no referido software, o qual se trata do modelo digital de elevação (MDE) gerado a partir de produtos de radar da missão estadunidense SRTM (Shuttle Radar Topography Mission - Missão de Lançamento do Radar Topográfico).

Com uma acurácia vertical do MDE/SRTM é de 16 metros com 90% de confiança e uma resolução espacial de 90 a 30 metros (USGS, 2015), estes recursos foram explorados, isoladamente do Google Earth, por muitos pesquisadores brasileiros com destaque para Valeriano (2005), Pinheiro (2006), Mantelli et al (2009), Oliveira et al (2010), Ferreira et al (2013) e Tinós et al (2013). De modo geral, tais estudos focam na geomorfometria, recurso de grande potencial dos produtos SRTM para análise quantitativa de atributos do relevo.

Borges et al (2013), ao validarem a qualidade numérica do MDE/SRTM e integrá-los às imagens de satélite de alta resolução do Google Earth, constataram uma dispersão média dos valores altimétricos igual a -0,75%, ou 4,5m. Os autores ainda concluem que, com uma declividade média de 18,3%, tal diferença passa a ser perceptível em escalas maiores que 1:120.000, restringindo seu uso a escalas regionais em análises morfométricas.

Pelo exposto, são claras as potencialidades do uso conjunto dos MDE/SRTM e imagens de satélites do software Google Earth em estudos do meio físico, bem com suas limitações. Neste sentido, o presente artigo tem o objetivo de apresentar uma técnica de captura de imagens estereoscópicas por meio do voo simulado no ambiente do Google Earth, com aplicações no mapeamento geotécnico e geoambiental. Entende-se que esta técnica representa um passo importante no ensino da cartografia geotécnica e geoambiental e no mapeamento de locais com deficiência de dados, viabilizando a geração de informações sobre o meio físico para prefeituras de pequenos municípios, universidades, unidades de conservação, comitês de bacias hidrográficas, etc.

2. CAPTURA E GERAÇÃO DAS IMAGENS ESTEREOSCÓPICAS DO GOOGLE EARTH Neste item é apresentada a técnica de captura das imagens Google Earth, por meio de procedimentos semiautomáticos.

O embasamento teórico-metodológico fundamentou-se nos trabalhos clássicos de aerofotogrametria e fotointerpretação geológica de Ray (1963), Ricci e Petri (1965) e Vergara (1971), com adaptações para o meio digital do Google Earth, abordando os seguintes tópicos:

1) Tipos de fotografias aéreas

2) Escala fotográfica

3) Exagero vertical

4) Levantamento fotoaéreo

5) Fotomosaico

2.1. Tipos de Fotografias Aéreas

De acordo com a inclinação do eixo óptico da câmera transportada por uma aeronave em relação à vertical, as fotografias aéreas podem ser classificadas em oblíquas altas, oblíquas baixas e verticais (com desvios menores que 2o)(VERGARA, 1971, p. 19), sendo estas mais adequadas nos trabalhos de interpretação fotogeológica. Devido a sua projeção central, as definições das fotografias verticais são uniformes para toda área imageada, qualitativamente análogas às cartas topográficas, ou seja, a escala se mantém praticamente constante, quando comparada com os outros tipos de fotografias.

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No Googe Earth, a precisão do ponto de vista ortogonal à superfície terrestre (virtual), bem como o posicionamento do Norte voltado para cima, são facilmente definidos pela ferramenta

Visualizar Redefinir Inclinação e bússola, ilustrada na Figura 1:

Figura 1: Definição da inclinação normal do eixo de visada e do norte

2.2. Escala Fotográfica

Nos levantamentos fotoaéreos verticais, os quais são muito onerosos e complexos, é preciso primeiramente calibrar a escala, o que em termos práticos, é um grande limitante, pois sua precisão depende da distância focal e de um voo com altura constante, o que não se verifica na realidade devido a fatores atmosféricos e as variações topográficas do relevo. O denominador

da escala fotográfica ( ), e consequentemente a escala de mapeamento, é calculado pela relação

entre a distância focal ( ) e altura do voo relativa ao terreno ( ) ou pelo tamanho do objeto

representado na imagem ( ) e seu tamanho real na superfície terrestre ( ). A seguir a Equação 1 ilustra este cálculo:

Equação 1: Cálculo da escala de uma fotografia aérea vertical

Ricci e Petri (1965) e Vergara (1971) discutem detalhadamente as implicações práticas no cálculo da escala de fotografias verticais e apontam as seguintes condições a serem consideradas: a) o terreno deve ser perfeitamente plano e horizontal; b) perfeita verticalidade do eixo óptico da câmera fotografada; c) nenhuma variação de altura absoluta de voo entre as sucessivas estações de tomadas das fotos, ou seja, linhas de voo perfeitamente horizontal. Em condições ideais, como no caso do voo digital simulado no Google Earth, os aspectos supracitados são facilmente obsevados, viabilizando a fixação da escala. Para tanto, uma linha é desenhada no sentido E-W ou N-S (de acordo do o plano de voo, discutido a diante), com

comprimento ( `) compatível da foto a ser capturada, cuja largura ( `) varia de 18 a 23 cm (VERGARA, 1971, p.14-15)

Para obtenção de fotografias com 20cm de largura ( `), a serem utilizadas em um

mapeamento na escala de 1:25.000 ( ), desenha-se uma linha com 5km de comprimento ( `), sobre o terreno virtual do Google Earth. Preferencialmente seleciona-se um local plano como planícies ou corpos d’água a fim de evitar distorções horizontais. Em tal procedimento é usada a

ferramenta Régua Caminho Salvar, ilustrada na Figura 2:

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Figura 2: Linha com 5km em uma área plana (mar) no Google Earth

Em seguida são ajustados os limites da linha de 5km com as extremidades da imagem

exposta na interface do Google Earth, por meio da ferramenta Zoom (Figura 3).

Figura 3: Ajuste do Zoom com aproximação dos vértices da reta às extremidades da interface

A calibração da escala a partir de um plano imaginário horizontal ou datum deve ser feita em um local no interior da área de estudo ou o mais próximo possível, para que as variações de altitude relativa estejam dentro de um limite aceitável (RICCI; PETRI, 1965, p.20-24; VERGARA, 1971, p. 22).

Em relevos acidentados só será possível determinar a altura relativa de voo média, priorizando um datum a partir de pontos do terreno fotografado com o valor de cota mais frequente, e não a média destas (RICCI; PETRI, 1965, p.14). Desta forma é possível afirmar que no voo virtual com uma altitude do ponto de visão de 4,34 km, o terreno é recoberto por uma fixa longitudinal de 5km. No entanto, este valor de altitude refere-se à altura absoluta do voo e não à altura relativa, e, portanto, não é correto extrapolar esse valor sempre que se desejar obter um recobrimento longitudinal de 5km.

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2.3. Exagero Vertical

Outro recurso relevante para fotointerpretação geológica é o exagero vertical do esteromodelo, compreendido como a relação entre as escalas vertical e horizontal. Mesmo em fotografias tradicionais (mais fieis na sua representação topográfica), a representação fotográfica do relevo sempre aparecerá mais acentuada do que realmente o é, devido principalmente pelo espaçamento das posições da câmera no momento da exposição em contrate com a separação entre as duas fotos montadas para a observação estereoscópica, além da distância interpupilar de cada indivíduo (RAY, 1963, p. 14).

Por se tratar de um fator basicamente qualitativo, (MILLER; 1953, apud RICCI; PETRI, 1965; p.46), o exagero vertical é tido como um aspecto vantajoso para interpretação fotogeológica, uma vez que se evidencia um grande número de feições topográficas diminutas (de ordem centimétrica) de significado geológico (RAY, 1963, p. 13). No entanto, fortes e bruscas mudanças de declive podem comprometer a visão estereoscópica, visto que este fator pode tornar inviável a fusão simultânea, ou convergência de pontos mais altos e pontos mais baixos, devido às limitações da visão humana.

No Google Earth, a manipulação do exagero vertical é facilmente realizada pelo comando

Ferramentas Opções... Terreno Ampliar elevação, cujo valor oscila de 0,01 a 3 vezes a representação normal do terreno virtual pelo MDE, conforme apresentado na Figura 4.

Figura 4: Diferença entre os exageros verticais do terreno virtual, realçado 0,01 vezes em A e 3 vezes em B

Importante ressaltar que este procedimento deve ser realizado antes do processo de captura das imagens, de modo que todo terreno seja imageado, pois, como pode ser observada na Figura 4, a área enquadrada varia de acordo com o exagero vertical.

2.4. Levantamento Fotoaéreo

A tomada aérea virtual deve ser sistemática, completa e racional, varrendo toda região selecionada, isto é, realiza-se um acurado plano de voo, estabelecendo-se as bandas ou linhas de voo que o avião deverá seguir. Define-se um sentido N-S ou E-W, e ao final de cada banda, se inverte a direção, seguindo a próxima banda, paralelas entre si, e igualmente espaçadas, captando uma sequência de fotografias aéreas digitais, chamada de faixa de fotos.

A área coberta comum a duas fotos consecutivas de uma mesma faixa ou recobrimento longitudinal deve ser entre 50% e 60%, e entre as bandas adjacentes, um recobrimento lateral de cerca de 30% (RICCI; PETRI, 1965, p.15-16; VERGARA, 1971, p.20).

O processo de captura das imagens Google Earth para fotointerpretação, a partir do enquadramento da imagem com a fixação da altitude do ponto de visão (Figura 3), inicia-se

determinação do centro de cada foto, utilizando a ferramenta Adicionar Marcador, com as

teclas Ctrl + Shift + P, como referência para sobreposição longitudinal, atribuindo-se a cada marcação uma sigla para identificar a banda (letras) e a foto captada (algarismos), conforme

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apresentado a seguir (Figura 5). Da mesma forma, também devem ser marcados os limites superior e inferior da primeira foto de cada linha de voo, para o recobrimento lateral.

Figura 5: Marcação do centro extremidades da primeira foto aera digital de uma linha de voo

Com as teclas Ctrl + Alt + S, a imagem é salva, gerando assim, a fotografia aérea digital, que será impressa na largura pré-estabelecida (20cm), a fim de se manter a escala desejada.

Em um voo virtual com direção W-E, a próxima foto a ser capturada, a2, deve ter sua

margem esquerda a 500m a oeste do ponto central a1, de modo que haja uma sobreposição

longitudinal entre elas de 3km, ou 60%, realizando novamente o procedimento Régua

Caminho Salvar, apresentado a seguir (Figura 6).

O deslocamento ao longo da mesma linha de voo é feito com teclas direcionais e ,

assim como para mudança de linhas adjacentes, utilizam-se as teclas e . Assim, procede-se a captura de sucessivas imagens, de maneira sequencial e contínua.

Figura 6: Marcação de 0,5km a oeste em relação ao centro da foto a1 para o recobrimento

longitudinal de 60% com a foto a2

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2.5. Fotomosaico

Concomitantemente, é gerado o fotomosaico com o recobrimento da área de estudo, por meio da adição de marcadores poligonais, referentes ao enquadramento da cena capturada. São

utilizadas as teclas Ctrl + Shift + G, clicando em seguida nas quatro extremidades da imagem exposta na interface do Google Earth. A seguir, a Figura 7 apresenta o resultado desta operação, com 4 faixas de fotos, dispostas no sentido W-E, com respectivamente 3, 6, 5 e 3 fotos.

Figura 7: Fotomosaico com 17 fotos virtuais abrangendo toda área de estudo

Este recurso é conveniente, visto que, além de fornecer as posições relativas e o número progressivo de todas as fotos virtuais, apresenta também as respectivas localizações na área de estudo, neste caso denominado carta de referência ou mapa-índice (RICCI; PETRI, 1965; p.18). O Google Earth possui a vantagem sobre as fotografias aéreas tradicionais, cuja organização é feita manualmente, pois permite a integração de dados com a base cartográfica em um ambiente SIG, e a fácil impressão do mapa-índice em escala reduzida.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho enfatiza a importância do desenvolvimento de técnicas que atendam às demandas de mapeamento do meio físico no Brasil, sobressaindo-se pela economia de tempo e recursos financeiros. Dentre os trabalhos com esta temática, destacam-se os mapeamentos geológico-geotécnicos realizados por Grabler (2011) e Rodrigues (2013), onde foram identificados e caracterizados as unidades de terreno e processos geológicos superficiais atuantes (Figura 8).

As vantagens do uso destas imagens consistem na sua resolução espacial e temporal, e na organização do plano de voo de acordo com a escala e objetivos do mapeamento (obras lineares, áreas urbanas, etc.). Outro aspecto relevante é seu uso didático, sobretudo no ensino de fotogeologia e suas aplicações. No entanto, podem citar, como desvantagens, sua pobreza espectral, levando a distorções na sensação de profundidade e a eventual presença de nuvens.

Conclui-se, portanto, que a obtenção sistemática de imagens estereoscópicas do Google Earth é uma alternativa técnica e economicamente viável à cartografia em diferentes escalas, apresentando-se como uma solução nos casos onde a falta de dados básicos é um limitante. Apesar das restrições intrínsecas dos produtos do Google Earth no processamento digital e análise quantitativa do relevo, a utilização das fotografias aéreas digitais na fotointerpretação e compartimentação fisiográfica deve ser estimulada uma vez que se trata de uma área com grande potencial de exploração, que ainda requer mais estudos com vistas ao seu aprimoramento e validação.

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Figura 8: Recortes dos mapas geológico-geotécnicos da Estrada de Castelhanos, Ilhabela/SP, 1:20.000 (a

cima), e da Rodovia SP-063, entre Bragança Paulista e Itatiba/SP, 1:50.000 (a baixo)

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