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1 Gestão Contemporânea: Tensão e Equilíbrio entre Opostos e Interdependência como Marcas Autoria: Paula Chies Schommer, Júlio Cesar Andrade de Abreu, Kátia Santos de Moraes Resumo Na contemporaneidade, na qual a mudança (ou o fetiche da mudança) e a intensidade e diversidade dos fluxos de informação são características reinantes, chamam atenção os paradoxos, contradições, antagonismos e ambivalências vivenciadas no cotidiano organizacional. Frente a esse cenário, define-se como objetivo deste trabalho o debate acerca de características da gestão contemporânea das organizações, a partir de referenciais teóricos e práticos sobre gestão e contemporaneidade, relacionando-os com uma área tradicional de ação administrativa (operações e logística) e uma temática transversal da gestão na atualidade (responsabilidade social empresarial). A referência central para a discussão é o artigo de Child e McGrath (2001) que abre seção especial do Academy of Managment Journal sobre novas formas organizacionais. No texto, ou autores apresentam a interdependência – entre áreas nas organizações, entre diferentes organizações, entre stakeholders de uma organização, entre sistemas – como um dos principais desafios de design na dialética das novas formas organizacionais. Segundo os autores, as organizações são desafiadas a equilibrar-se na tensão estabelecida pela dupla pressão de: ser consistente e confiável e ter flexibilidade; ser eficiente e inovadora; explorar conhecimento existente e explorar novas possibilidades; definir padrões e normas e promover inovação e mudança. O principal desafio de design das organizações em tempo de informação como algo central, para os autores, é lidar bem com o paradoxo. Partindo desse texto e de outros referenciais sobre gestão contemporânea, os associamos à análise da área de operações e logística e da temática da responsabilidade social empresarial. No percurso de análise, emergiram duas características que nos pareceram essenciais para compreender a natureza da gestão contemporânea das organizações: (i) a interdependência (não como novidade na compreensão sobre as organizações, mas percebida de modo latente e complexo no cotidiano das práticas gerenciais e nas relações entre pessoas, organizações e seus ambientes); (ii) o resultante da tensão permanente entre pólos opostos que definem não uma contradição, um paradoxo ou mesmo um equilíbrio nulo, mas uma dualidade, ou seja, que é relativo a dois, que é definido pela existência de ambos, em interação. Assim, busca-se compreender como a natureza dual de pólos aparentemente opostos configura e se expressa na gestão contemporânea das organizações. A origem deste trabalho está em uma disciplina de mestrado e doutorado em administração, construída entre 2007 e 2008, na qual se debatiam a natureza e características da gestão contemporânea das organizações. Muitas escolhas foram necessárias para delimitar um foco e possíveis eixos para orientar a discussão sobre tema tão amplo. A começar pela palavra contemporânea, cujo sentido remete àquilo que é do seu tempo, da época atual, do “nosso” tempo, e pode trazer também a conotação de algo que é vanguarda ou avançado em relação às práticas correntes. Destarte, nosso propósito neste trabalho é identificar características que sejam, simultaneamente, singulares do tempo atual e comuns a diferentes formas organizacionais e áreas de ação administrativa. O percurso metodológico adotado neste ensaio teórico é baseado em revisão bibliográfica, que conduz à conclusão de que tanto o ambiente organizacional como o próprio gerir tem, na contemporaneidade, como cicatriz indelével, a interdependência organizacional e a tensão e o equilíbrio entre opostos, formando uma dualidade.

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Gestão Contemporânea: Tensão e Equilíbrio entre Opostos e Interdependência como Marcas

Autoria: Paula Chies Schommer, Júlio Cesar Andrade de Abreu, Kátia Santos de Moraes

Resumo Na contemporaneidade, na qual a mudança (ou o fetiche da mudança) e a intensidade e diversidade dos fluxos de informação são características reinantes, chamam atenção os paradoxos, contradições, antagonismos e ambivalências vivenciadas no cotidiano organizacional. Frente a esse cenário, define-se como objetivo deste trabalho o debate acerca de características da gestão contemporânea das organizações, a partir de referenciais teóricos e práticos sobre gestão e contemporaneidade, relacionando-os com uma área tradicional de ação administrativa (operações e logística) e uma temática transversal da gestão na atualidade (responsabilidade social empresarial). A referência central para a discussão é o artigo de Child e McGrath (2001) que abre seção especial do Academy of Managment Journal sobre novas formas organizacionais. No texto, ou autores apresentam a interdependência – entre áreas nas organizações, entre diferentes organizações, entre stakeholders de uma organização, entre sistemas – como um dos principais desafios de design na dialética das novas formas organizacionais. Segundo os autores, as organizações são desafiadas a equilibrar-se na tensão estabelecida pela dupla pressão de: ser consistente e confiável e ter flexibilidade; ser eficiente e inovadora; explorar conhecimento existente e explorar novas possibilidades; definir padrões e normas e promover inovação e mudança. O principal desafio de design das organizações em tempo de informação como algo central, para os autores, é lidar bem com o paradoxo. Partindo desse texto e de outros referenciais sobre gestão contemporânea, os associamos à análise da área de operações e logística e da temática da responsabilidade social empresarial. No percurso de análise, emergiram duas características que nos pareceram essenciais para compreender a natureza da gestão contemporânea das organizações: (i) a interdependência (não como novidade na compreensão sobre as organizações, mas percebida de modo latente e complexo no cotidiano das práticas gerenciais e nas relações entre pessoas, organizações e seus ambientes); (ii) o resultante da tensão permanente entre pólos opostos que definem não uma contradição, um paradoxo ou mesmo um equilíbrio nulo, mas uma dualidade, ou seja, que é relativo a dois, que é definido pela existência de ambos, em interação. Assim, busca-se compreender como a natureza dual de pólos aparentemente opostos configura e se expressa na gestão contemporânea das organizações. A origem deste trabalho está em uma disciplina de mestrado e doutorado em administração, construída entre 2007 e 2008, na qual se debatiam a natureza e características da gestão contemporânea das organizações. Muitas escolhas foram necessárias para delimitar um foco e possíveis eixos para orientar a discussão sobre tema tão amplo. A começar pela palavra contemporânea, cujo sentido remete àquilo que é do seu tempo, da época atual, do “nosso” tempo, e pode trazer também a conotação de algo que é vanguarda ou avançado em relação às práticas correntes. Destarte, nosso propósito neste trabalho é identificar características que sejam, simultaneamente, singulares do tempo atual e comuns a diferentes formas organizacionais e áreas de ação administrativa. O percurso metodológico adotado neste ensaio teórico é baseado em revisão bibliográfica, que conduz à conclusão de que tanto o ambiente organizacional como o próprio gerir tem, na contemporaneidade, como cicatriz indelével, a interdependência organizacional e a tensão e o equilíbrio entre opostos, formando uma dualidade.

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1. Introdução

Enveredar pelos estudos sobre gestão supõe assumir suas características históricas e temporais. Lidar com os fundamentos e conceitos de gestão desprovidos de sua historicidade, como fenômeno atemporal, pode representar um equívoco. Do mesmo modo, considerar esta variável cria distinções entre a gestão do passado, do presente e do futuro. Quando o presente é tomado por uma série de mudanças e processos acelerados de transformações (CASTELLS, 2007), a gestão ganha novos contornos, um design talvez mais sofisticado, talvez mais arrojado, possivelmente mais diverso, definitivamente contemporâneo.

O objetivo deste trabalho é discutir características da gestão contemporânea das organizações, a partir de referenciais teóricos e práticos sobre gestão e contemporaneidade, fazendo relação desses referenciais com uma área de ação administrativa – operações e logística e uma temática transversal da gestão, na atualidade – responsabilidade social empresarial.

A origem da construção deste trabalho está em uma disciplina de mestrado e doutorado em administração, construída entre 2007 e 2008, na qual se debatiam a natureza e características da gestão contemporânea das organizações. Muitas escolhas são necessárias para delimitar algum foco e possíveis eixos para orientar a discussão sobre tema tão amplo. A começar pela palavra contemporânea, cujo sentido remete àquilo que é do seu tempo, da época atual, do “nosso” tempo, e pode trazer também a conotação de algo que é vanguarda ou avançado em relação às práticas correntes. Pode-se, ainda, fazer relação com a Idade Contemporânea – que corresponderia ao período da história iniciado em 1789, com a Revolução Francesa, que se segue à Idade Moderna – e com a Arte Contemporânea, movimento de expressão artística que aparece em termos como dança contemporânea ou cinema contemporâneo. Neste sentido, contemporâneo também pode ser entendido como pós-moderno, no sentido de movimento de reflexão estética sobre a modernidade.

Modernidade e contemporaneidade são palavras constantemente presentes na literatura sobre gestão. Algumas vezes estes termos são empregados como “rótulos” para diferenciar argumentos, técnicas ou ferramentas gerencias daquilo que é considerado antigo, ultrapassado. É necessário, porém, ir além dos rótulos para compreender e identificar características da gestão contemporânea. A gestão (enquanto ação, movimento) e a organização (enquanto lócus e enquanto estrutura e estratégia combinadas, forma e movimento imbricados) são os objetos de pesquisa e prática da Administração e devem ser considerados para a exploração dos sentidos da contemporaneidade.

Destarte, a idéia é identificar características que sejam, simultaneamente, singulares do tempo atual e comuns a diferentes formas organizacionais e áreas de ação administrativa. Para tanto, partimos de diferentes referenciais teórico-conceituais sobre gestão e contemporaneidade e os associamos à análise de uma área tradicional da ação administrativa - operações e logística (O&L). Foram exploradas teorias e práticas nessa área, ao longo do tempo, identificando principais concepções, autores, conceitos e instrumentos de gestão utilizados. A partir dessa exploração, esperava-se ser possível identificar elementos essenciais que caracterizam a gestão contemporânea. Também abordamos temática mais recente – responsabilidade social empresarial (RSE), identificando sua relação com áreas tradicionais da gestão e buscando encontrar nos debates e instrumentos de gestão relacionados ao tema, pistas sobre o que caracteriza a gestão contemporânea. No contexto em que este trabalho tem origem, outras áreas da administração, como finanças e gestão de pessoas, também foram exploradas. Neste trabalho, porém, nos limitaremos a abordar operações e logística e responsabilidade social empresarial.

A principal referência conceitual em que se assenta este trabalho é um artigo de Child e McGrath (2001) que abre seção especial do Academy of Managment Journal sobre novas

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formas organizacionais. Neste texto, ou autores apresentam a interdependência – entre áreas nas organizações, entre diferentes organizações, entre stakeholders de uma organização, entre sistemas – como um dos principais desafios de design na dialética das novas formas organizacionais. Segundo Child e McGrath (2001), as organizações são desafiadas a equilibrar-se na tensão estabelecida pela dupla pressão de: ser consistente e confiável e ter flexibilidade; ser eficiente e inovadora; explorar conhecimento existente e explorar novas possibilidades; definir padrões e normas e promover inovação e mudança. O principal desafio de design das organizações em tempo de informação como algo central, para os autores, é lidar bem com o paradoxo.

Da exploração de referências bibliográficos sobre gestão contemporânea e sobre áreas tradicionais da gestão e termas emergente, emergiram duas características que nos pareceram essenciais para compreender a natureza da gestão contemporânea das organizações: a interdependência (não exatamente uma novidade na compreensão sobre as organizações, mas percebida de modo latente e complexo no cotidiano das práticas gerenciais e nas relações entre pessoas, organizações e seus ambientes); o resultante da tensão permanente entre pólos opostos que definem não uma contradição, um paradoxo ou mesmo um equilíbrio nulo, mas uma dualidade, ou seja, que é relativo a dois, que é definido pela existência de ambos, em interação. Assim, busca-se compreender como a natureza dual de pólos aparentemente opostos configura e se expressa na gestão contemporânea das organizações, como os comumente mencionados no cotidiano organizacional e social: objetividade-subjetividade, ter-ser, individual-coletivo, competição-cooperação, conformidade/padrões/eficiência-criatividade/originalidade/flexibilidade; ordem/estabilidade/harmonia/equilíbrio-desordem/contradição/conflito/desequilíbrio.

Para desenvolver essas ideias, o texto está estruturado da seguinte maneira: a) inicialmente, apresentamos elementos conceituais para discutir a tensão e o equilíbrio entre pólos opostos e o desafio que representam para o gerir. Em seguida, essa característica da gestão contemporânea á analisada em cada uma das áreas/temas aqui focalizados – operações e logística e responsabilidade social empresarial; b) discutimos como a noção de interdependência influencia a gestão nas duas áreas/temas focalizadas; c) propomos questões que ficam em aberto, relacionando as duas características aqui exploradas, item este que se liga às considerações finais do texto.

2. Antagonismos, dualidades, dilemas e paradoxos e a interdependência e o

equilíbrio que desafiam o gerir

Dentre as inúmeras características da gestão contemporânea que seria possível debater, optamos por explorar neste trabalho duas delas: (i) a tensão entre pólos opostos que desafia a gestão – seus conceitos, modelos, instrumentos e gestores – a agir no sentido de explorar essa tensão e promover o equilíbrio possível entre pólos que se influenciam mutuamente; (ii) a interdependência das organizações entre si e destas com seus ambientes.

Seriam essas características alguma novidade na compreensão das características da gestão? Seriam únicas desse tempo? Não. Não há qualquer novidade na idéia de que nos orientamos por relações dialéticas, por pólos em oposição, como o positivo e o negativo geram energia. Assim como não é novidade que organizações e ambientes, fenômenos naturais e sociais são interligados, interdependentes. A novidade seria o crescente reconhecimento da necessidade de compreender sua complexidade e construir instrumentos de gestão que dêem conta da tensão entre pólos opostos e da interdependência, que permitam explorá-los de modo produtivo e criativo.

Se é que podemos perceber novos desafios ao gerir que seriam próprios da atualidade, ao explorar mais profundamente a natureza da gestão, percebemos desafios básicos, antigos

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dilemas humanos sempre presentes, combinados a novos elementos e potencializadas pelas inovações e, aparentemente, novas contradições da atualidade. O contexto contemporâneo das organizações revela paradoxos (a contrariedade ao que é comum, aparentes contradições ou incompatibilidades), contradições (oposição entre proposições, incoerência entre palavras e ações, entre afirmações atuais e anteriores), diversidade (diferença, dessemelhança, que expressa ou não contradição), hibridismo (como qualidade daquilo que combina naturezas diferentes), complexidade (que encerra muitos elementos) (MICHAELIS, 2009).

Ao organizar-se e procurar avançar no processo de civilização, por um lado, o desejo humano de garantir ordem, controle, racionalidade, regulação, estabilidade. Em paralelo, o desejo permanente por transformação, mudança, desordem, criatividade, inovação. Em síntese, nossa percepção de que o equilíbrio, a harmonia, a sustentabilidade da vida ancoram-se justamente na dialética ou na resultante da tensão entre esses pólos. Como as extremidades do eixo de uma esfera que é definida, também, pela relação entre eles.

Para se compreender a característica da gestão contemporânea, um dos caminhos possíveis é, pois, analisar dicotomias, dualidades, contradições e paradoxos – humanos, organizacionais e sociais – que desafiam a gestão, procurando perceber que elementos dessas dualidades são reforçados ou transformados na atualidade. Procuramos explorar, pois, nas duas áreas/temas focalizados aqui – operações e logística e responsabilidade social empresarial – como se verificam relações entre objetividade-subjetividade; ter-ser; individual-coletivo; competição-cooperação; conformidade/padrões/eficiência-criatividade/originalidade/flexibilidade; ordem/estabilidade/harmonia/equilíbrio-desordem/contradição/conflito/desequilíbrio. Ao analisar a gestão com um olhar investigativo em busca de dicotomias, contradições e paradoxos, o ato de gerir assume um interessante caráter mediador e equilibrador de forças e relações dentro das organizações. Como se fosse uma balança, ou um pêndulo metaforicamente.

A Figura 1 representa o papel “pendular” da gestão que deve ao mesmo tempo lidar com a tensão e o equilíbrio entre pólos opostos de um eixo ou esfera. Ambas as extremidades (A e B) representam a tensão onde cada uma aponta para uma direção, nos remetendo: (i) aos diversos interesses relativos às atividades de uma organização, oriundos de gestores, acionistas, empregados, fornecedores, clientes, concorrentes, governos etc.; (ii) às diferentes demandas a que está sujeita a organização – eficiência, competitividade, confiabilidade, lucratividade, flexibilidade, abertura à mudança, capacidade de aprender, inovação etc. ; (iii) aos diferentes conhecimentos, tecnologias, sistemas e possibilidades de soluções ou caminhos pelos quais uma organização pode optar; (iv) às contradições e pressões sociais, políticas e econômicas dos contextos mais amplos nos quais as organizações operam.

Nem sempre essa diversidade de interesses e possibilidades configura-se em oposição, contrariedade ou incompatibilidade. No exercício de análise que procuramos realizar neste trabalho, contudo, exploraremos a idéia de pólos em extremidade, interligados por uma figura maior que representa a interdependência entre os diferentes interesses. Como exemplo disso, para que um departamento tenha recurso para dada atividade, outro departamento deverá ceder. Para que exista possibilidade de investimento em um projeto, outros projetos deixarão de receber apoio. Para que uma tecnologia seja privilegiada, outra será preterida. Embora haja possibilidade de combinação de possibilidades, harmonização de interesses, construção de consensos e hibridização de características, as organizações enfrentam dilemas frente aos quais é necessário fazer opções que fatalmente excluem algo. Os recursos são escassos e a capacidade de uma organização de responder a diferentes demandas ou investir em diferentes possibilidades é limitada. Logo, as extremidades A e B são interdependentes e, ao mesmo tempo, em certa medida, concorrentes.

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Figura 1: Gestão, Interdependência e Equilíbrio.

Fonte: Elaborado pelos autores.

O “fiel da balança” que será responsável pelo equilíbrio entre as diversas tensões - interdependentes na organização, é a gestão. Este papel de intermediação, negociação, conciliação e combinação, que exige flexibilidade, capacidade de diálogo, valorização da diversidade, é cada vez mais reconhecido por pesquisadores e gestores. Ao mesmo tempo, porém, os gestores seguem pressionados a “fazer as coisas acontecerem”, a “entregar produtos e serviços”, a “cumprir regulamentos” e a “alcançar resultados”.

Em âmbito mais amplo, as inter-relações e articulações entre pessoas e entre organizações são, crescentemente, reconhecidas como fundamentais para se compreender a contemporaneidade e os diferentes arranjos organizacionais por meio dos quais se articulam. Isso pode ser observado em referenciais que tratam de diferentes temáticas da gestão, como aprendizagem, identidade, redes, gestão de territórios, logística, gestão de pessoas etc.

Ao tratar de aprendizagem organizacional, Araujo (1998) assinala que pessoas e organizações aprendem e constroem novos conhecimentos por meio de interações práticas, superando fronteiras claramente delimitadas, sobretudo por meio de redes. Laniado e Milani (2007), explorando o fenômeno dos novos movimentos sociais internacionais, analisam o surgimento de novos atores e sua articulação em redes transnacionais, assumindo co-responsabilidade, com preservação de identidade, em torno de interesses comuns, que superam visões tradicionais de tempo e de território. Textos da área de operações e logística, como os de Ballou (2006) e Zhao et al. (2007), enfatizam a coordenação, a colaboração e a confiança necessárias para explorar oportunidades nas fronteiras entre organizações e nas cadeias de suprimentos. Textos que tratam de gestão por competências evidenciam tendência à maior integração entre áreas tradicionais das organizações, na medida em que a gestão de pessoas distancia-se da base em cargos (FLEURY, 2002). Referenciais que tratam de desenvolvimento sustentável e responsabilidade social empresarial fundamentam-se na noção de interdependência entre dimensões sociais, econômicas e ambientais e na necessidade de articulação entre diferentes atores, interesses e ações em prol da sustentabilidade da vida no planeta (SCHMIDHEINY; ZORRAQUÍN, 1996; NASCIMENTO; LEMOS, MELLO, 2007; VEIGA, 2008).

Child e McGrath (2001) apresentam a interdependência – entre áreas nas organizações, entre diferentes organizações, entre stakeholders de uma organização, entre sistemas – como um dos principais desafios de design na dialética das novas formas organizacionais. Na atualidade, sobretudo em função do fluxo das informações e da centralidade que a informação adquire na sociedade, as organizações são desafiadas a equilibrar-se na tensão estabelecida pela dupla pressão de: ser consistente e confiável e ter flexibilidade; ser eficiente e inovadora; explorar conhecimento existente e explorar novas possibilidades; definir padrões e normas e promover inovação e mudança (CHILD; McGRATH, 2001). O principal desafio de design

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das organizações em tempo de informação como algo central, para os autores, é lidar bem com o paradoxo.

Para isso, torna-se crucial definir as fronteiras da organização, sua identidade e sua integridade, ao mesmo tempo em que é preciso articular-se nas fronteiras com outras organizações (CHILD;McGRATH, 2001). Como já apontavam Clegg e Hardy (1998), diante de fronteiras mais fluidas, relações interorganizacionais ou mesmo interorganizações podem ser mais determinantes dos processos organizacionais do que as características internas.

As relações que envolvem, simultaneamente, cooperação e competição, negociação e colaboração não são novidade, mas são hoje mais reconhecidas como potenciais para resolver problemas complexos. Tais relações geram conflitos construtivos, que ampliam possibilidades, uma vez que as diferentes visões, repertórios e experiências em contato geram material para o equivalente a recombinações genéticas.

Martinet (2007), referindo-se à área de estratégia, nos fala de estratégias híbridas, mestiças, de “luta-cooperação”, nas quais o mais importante é o tracinho do meio (-), que reflete a tensão constante entre essas duas dinâmicas. Ele lembra que qualquer relação social implica em luta-cooperação e isso precisa ser considerado na gestão, e que a construção da identidade corresponde a um processo de singularização que envolve a dinâmica entre luta-cooperação, inovação-imitação, individualização-assimilação.

Estas características desnudadas por Martinet (2007), presentes nas relações sociais, são reflexos naturais das contradições e ambivalências do humano. A inconstância, a relação entre o subjetivo e o objetivo e a mudança são traços marcantes no ser humano. Acerta disto, é válido recuperar o pensamento do filósofo Heráclito que afirmara que uma pessoa nunca atravessa duas vezes o mesmo rio, porque nem o rio e nem a pessoa serão os mesmos.

Ao se referir à humanidade, Lins (2009) afirma que não cabe pensarmos em evolução, mas sim em involução, não cabe pensar em progresso, mas sim em processo. A esta natureza em constante devir, Lins (2009) recupera o pensamento de Deleuze denominada Sociologia do Rizoma, destacando a inconstância, o paradoxo, o conflito, a contradição. Não se poderia esperar, pois, das organizações, como construções sociais, que estivessem livres dos paradoxos, contradições e ambivalências.

Com base nas características da gestão contemporânea sobre as quais argumentamos até aqui, exploramos a seguir a área de Operações e Logística e a temática da Responsabilidade Social Empresarial, buscando identificar como se manifestam tais elementos na gestão.

3. Equilíbrio entre opostos e interdependência em Operações e Logística A área de Operações e Logística (O&L) ganhou relevo na literatura sobre gestão. O

significado do termo logística apresentou grande evolução até sua forma atual. De atividade relacionada à guerra e à esfera militar (BALLOU, 2006), passando pela sua disseminação como atividade empresarial até estar associada à gestão de cadeias de suprimento, a área passou por crescente sofisticação, o que se reflete na complexidade de seus processos e nas tecnologias empregadas. A logística também passou a ter significado cada vez mais estratégico por lidar com tópicos extremamente sensíveis para as organizações, como qualidade de serviço e custos de transação.

Este movimento de re-significação da área de Operações e Logística, pode ser percebido no conceito adotado pelo Council of Supply Chain Management Professionals (CSCMP, 2008), para quem a área de Operações e Logística seria a “parte da Gestão da Cadeia de Suprimentos que planeja, implementa e controla o fluxo direto e reverso e o armazenamento de bens, serviços e informação relacionada entre o ponto de origem e o ponto de consumo, visando satisfazer aos requisitos dos clientes.”

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Vislumbrar O&L como parte de uma cadeia de suprimentos sugere um processo de gestão focado na relação entre diferentes organizações em uma dada cadeia de suprimentos. Esta relação é tão forte na atualidade que Christopher (2007) defende que a competição, brevemente, não será entre organizações, mas sim entre cadeias. Percebe-se no mundo organizacional uma série de fusões e parcerias (mesmo entre empresas concorrentes, para ganhar escala e condições de competir, por exemplo, com multinacionais). A predominância de cadeias de suprimentos representa uma forte relação de confiança entre, por exemplo, manufaturas e fornecedores. Os grandes parques industriais, principalmente do setor automobilístico, possuem grandes cinturões de fornecedores à sua volta para suprimento dos mais diversos insumos. Neste sentido, o próprio termo “fornecedor” assume na contemporaneidade outro significado e passa a ser denominado “parceiro” (BALLOU, 2006; CHRISTOPHER, 2007; LEOPOLDINO; ABREU; MELO, 2008).

A relação entre confiança e controle emerge como um dos desafios postos para os gestores na contemporaneidade. Ao mesmo tempo em que seu “parceiro” goza de certa confiança, vários controles devem ser mantidos por determinações legais e mesmo para garantir, sustentar e delimitar esta confiança. O crescente uso de operadores logísticos (empresas especializadas em logística que atuam com ao menos dois tipos de modais de transporte – rodoviário, hidroviário, aéreo, ferroviário etc. – e prestam serviços para outras organizações) expõe esta tênue relação de confiança. Em alguns casos, os operadores logísticos são contratados para que as organizações dediquem total atenção ao seu core business, e recebem destas organizações todo o sistema de informações (para emissão de notas fiscais, movimentação de materiais, etc.) e até equipamentos de transporte (empilhadeiras, estruturas porta-pallets, etc.) em regime de comodato. O que parece, à primeira vista, uma total hibridização entre duas organizações exibe, ao olhar mais atento, algumas arestas que apontam limites, responsabilidades e até mesmo sanções.

É comum em processos de terceirização do setor de logística ou na entrega das atividades para operadores logísticos a criação de departamentos de “Controladoria de Operações Logísticas” que são responsáveis pelas métricas que envolvem esta relação de “confiança” entre duas organizações “parceiras”. Tais métricas refletem itens pontuais do contrato de prestação de serviços como, por exemplo, acuracidade do inventário (onde qualquer variação fora dos padrões poderá representar um pagamento da diferença monetária ao contratante); atendimento de prazos de entrega de produtos aos clientes; atendimento de prazos internos de ressuprimento de materiais, etc. Certamente, enquanto a relação, as métricas e os controles não estão apontando nenhuma discrepância, os “parceiros” são “parceiros”. Porém, quando discrepâncias surgem, a relação, agora hibridizada, vive momentos contemporaneamente interessantes, por exemplo: a falha de acondicionamento de inventário, por exemplo, é justificada pelo operador logístico como um erro na informação prestada pelo contratante.

Até que ponto um contrato conseguiria cobrir todas as peculiaridades de uma complexa relação entre duas organizações? Como o gestor estabelece os limites desta relação (principalmente quando o operador logístico/prestador de serviços fica na própria planta do contratante)? Quando confiar e quando controlar? É possível existir “confiança controlada”?

Outro elemento da área de O&L que exibe antagonismos e paradoxos é a relação de competição e cooperação. Um exemplo clássico neste sentido é a criação da parceria entre os setores de compras das montadoras Fiat e GM. O design do farol dos automóveis de ambas as empresas é totalmente diferente, mas as lâmpadas usadas nestes faróis podem ser iguais. Deste modo, a união das duas montadoras concorrentes tinha como objetivo economizar na aquisição de itens comuns aos produtos das duas empresas. Esta parceria não logrou completo êxito devido a uma série de fatores (econômicos, estruturais, culturais, etc.), mas serve de ilustração para outro tópico emergente na área de O&L que deve receber atenção dos gestores na contemporaneidade, principalmente no atual contexto de cadeias e redes de suprimentos.

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Voltando ao debate sobre interdependência, como já dissemos, a logística considerada como gestão de cadeia de suprimentos é caracterizada pela interdependência e interação entre as organizações. O suporte conceitual em logística permite uma gestão mais eficiente e eficaz das cadeias de suprimento (WANKE, 2003). A conceituação e a prática da área de Operações e Logística sofreram forte modificação ao longo dos anos. De aplicação militar a grandes estoques de segurança; de armazéns e centralização a centros descentralizados de distribuição; de gestão da cadeia de suprimentos a gestão de redes de cadeias. A concepção de redes de cadeias de suprimento é cada vez mais aplicada na contemporaneidade ampliando a idéia da cadeia de suprimentos (Supply chain Management - SCM). Neste sentido o conceito de SCM que era “a gestão das relações a montante e a jusante com fornecedores e clientes, para entregar mais valor ao cliente, a um custo menor para a cadeia de suprimentos como um todo” (CHRISTOPHER, 2007, p. 8) evolui para:

Uma rede de organizações conectadas e interdependentes, trabalhando conjuntamente, em regime de cooperação mútua, para controlar, gerenciar e aperfeiçoar o fluxo de matérias-primas e informação dos fornecedores para os clientes finais (CHRISTOPHER, 2007, p. 12).

Tal abordagem faz com que o conceito de cadeia de suprimentos apresente uma

sensível sofisticação e ampliação de sua complexidade. A visão de logística é ampliada para além dos limites das empresas e integra ao máximo todas as organizações envolvidas na concepção de um determinado bem ou serviço visando sempre o elo seguinte da cadeia e o principal ponto da rede, que é justamente o cliente.

Para que a logística pudesse atingir este nível de evolução, as tecnologias de informação e da comunicação (TIC) tiveram papel fundamental. Segundo Cameira (1999) foi o desenvolvimento das TICs que possibilitou o incremento dos fluxos de informação que cresceram de forma exponencial juntamente com a sofisticação das atividades logísticas e da cadeia de suprimentos (SCM). Segundo Cameira:

Essa evolução permitiu, por exemplo, no caso do planejamento e controle da produção, que sistemas de administração da produção centralizadores da decisão, como são os sistemas de Manufacturing Resources Planning (MRPII), [...], indo além do preconizado pelos modelos de Manufatura Integrada por Computador (CIM – Computer Integrated Manufacturing), construindo o conceito de ERP (Enterprise Resources Planning), tornando suave e imediato o fluxo de informações na empresa. A partir disso, assistimos hoje à grande difusão dos Sistemas Integrados de Gestão (SIG). Esses sistemas objetivam tornar possível a gestão global da empresa, realizando o ERP e, na fronteira atual, procurando gerir toda a cadeia logística de suprimento (Supply Chain). (1999, p.2)

A idéia de redes de cadeias de suprimentos, integrada por sistemas informatizados confere à gestão logística um caráter interorganizacional. A figura 2 ilustra este processo de integração. Juntamente com a integração surge a dimensão “interdependente”, existente em conceitos de redes. Esta interdependência faz com que os fluxos e contra-fluxos internos de uma dada empresa causem, em certa medida, reflexo em toda uma rede de cadeias de suprimentos.

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Figura 2: Fluxo de Informações ERP.

Fonte: Elaborado pelos autores baseado em CAMEIRA, 1999; BALLOU, 1998 e 2006.

Os processos de certificação de qualidade série ISO ou similares que tenham exigências de adequação de fornecedores ou controle de procedência são interessantes exemplos de interdependência que afetam toda uma rede de cadeias de suprimentos. Se uma organização decidir estrategicamente, para adentrar novos mercados, obter uma certificação ambiental, deverá exigir o mesmo de seus fornecedores (de nada adianta uma empresa ser certificada ambientalmente se suas matérias-primas são oriundas de processos de destruição ambiental). Se seus fornecedores fizerem parte de uma rede de cadeias de suprimentos, esta certificação irá gerar um “efeito dominó” em toda rede. O retorno de materiais para reciclagem e a aplicação de técnicas de logística reversa são outros exemplos de interdependência em redes de cadeias de suprimentos. A figura 3 ilustra uma rede de cadeias de suprimentos.

Figura 3: Interdependência – Rede de Cadeias de Suprimento.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Se, por um lado, esta interdependência de diversos elos de uma rede de cadeias de suprimentos é benéfica para as organizações envolvidas (que compartilham informações, reduzindo riscos, otimizando fluxos de materiais e tempo) muitas distorções podem ocorrer, principalmente em termos de poder dentro da rede e de relações de confiança entre as empresas.

Ainda que o “cliente” seja o principal foco em várias cadeias (e este possui grande poder enquanto último elo e consumidor final) as assimetrias entre as organizações de uma rede podem existir principalmente quando os limites internos da própria organização não são bem delimitados.

Uma dada multinacional da área de eletrônicos tinha dentro de sua planta produtiva vários fornecedores trabalhando diretamente na organização. Eram empresas transportadoras, embaladoras, pela EBCT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos) e especialistas em remoção de máquinas. Cada uma delas era um elo de uma ampla rede de cadeias de suprimento que, com diferenciado papel, estavam cada vez mais interdependentes. Ainda que

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legalmente fossem empresas totalmente distintas, a cultura no ambiente de trabalho (que era o mesmo para diversas organizações) também era influenciada.

Ocorre que o domínio nesta relação era exercido não pela empresa que estava “cedendo” a planta produtiva ou pelo cliente, mas sim pela EBCT. Os Correios têm uma enorme capilaridade em todo território nacional, o que faz com que esta organização consiga entregar produtos em qualquer município brasileiro (coisa que outras transportadoras simplesmente não fazem, pois não é lucrativo). Outro ponto é que o custo praticado pela EBCT era extremamente competitivo de modo que abrir mão do contrato com esta empresa não seria nada saudável. Com isso, requerimentos de relatórios feitos pela empresa multinacional contratante não eram plenamente atendidos e, em contrapartida, todos os requerimentos da EBCT eram tidos como “ordens” dado seu poder dentro desta rede de cadeias. Este exemplo ilustra uma disparidade de poder nesta complexa relação de interdependência entre empresas e cadeias de suprimento.

4. Equilíbrio entre opostos e interdependência nos debates sobre responsabilidade social empresarial

 O debate sobre Responsabilidade Social Empresarial (RSE) ganha força a partir do final

dos anos 1960, sobretudo nos Estados Unidos, quando a sociedade passa a questionar de modo enfático os comportamentos do ponto de vista ético e o papel das grandes corporações frente a antigos e novos desafios sociais, econômicos e ambientais (KREITLON, 2004). No Brasil, tal debate ganha espaço a partir dos anos 1990, quando as empresas começam a ser mais pressionadas a adotar práticas e posicionamentos relativos ao seu papel frente aos persistentes desafios sociais do País, como precárias e desiguais condições de trabalho, pobreza, desigualdade social, corrupção, violência e, na esteira dos debates mundiais sobre preservação ambiental e mudanças climáticas, suas iniciativas no sentido de reduzir o impacto ambiental das atividades produtivas.

Para além das mais tradicionais práticas filantrópicas e de caráter voluntário, e da noção de cidadania empresarial restrita à doação de recursos para causas sociais, sem relação com a atividade produtiva empresarial, passa-se a questionar as práticas de gestão do negócio e seus impactos sobre todos os stakeholders (ou partes interessadas) nas atividades de uma empresa. O conceito de responsabilidade social empresarial começa a figurar no cenário empresarial e acadêmico brasileiro, acompanhando movimento permanente de transformação conceitual, o que tem a ver com a própria dinâmica de interação das ações coletivas e com o nível de monitoramento e julgamento sobre a atuação das organizações, ou seja, dos interesses e do espaço ocupado pelos grupos que as formulam (KUNSCH, 2003; SINA; SOUZA, 1999).

No que tange à relação entre ética e responsabilidade social empresarial, uma vez que o debate se origina no campo da ética, Kreitlon (2004) aponta três abordagens ao tema: (i) a Business Ethics, abordagem normativa ao tema, preocupada com os valores e normas sociais que orientam as ações empresariais e com o senso ético que impulsionaria pessoas e organizações e buscarem avanços em suas práticas no sentido da justiça; (ii) Business & Society, abordagem de cunho sociopolítico e contratual, que analisa o comportamento empresarial com base na noção de que as empresas, para existirem, operarem e fazerem opções de gestão, orientam-se por um contrato firmado com a sociedade (noção geral), nas relações com suas várias partes interessadas, como governos, clientes, fornecedores, empregados, comunidade etc. A sociedade e os stakeholders de uma empresa, por meio de pressões e manifestação de seus interesses, definiriam os comportamentos que autorizam ou não autorizam, influenciando as decisões em maior ou menor intensidade de acordo com o poder que alcançarem em meio ao conjunto de relações e à diversidade de vetores de força aos quais uma empresa está sujeita; (iii) Social Issues Management, de caráter mais

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instrumental, esta abordagem preocupa-se na incorporação de variáveis sociais e ambientais na gestão estratégica, tanto no sentido de gerenciamento de riscos como no sentido de obtenção de vantagens competitivas (KREITLON, 2004; SCHOMMER, 2009).

Na abordagem normativa, a interdependência mais evidente está entre os valores e normas sociais de dado contexto social, histórico e territorial no qual uma empresa atua. O que se considera mais avançado em termos éticos, no entanto, pode não coincidir com o que é mais lucrativo, por exemplo, abrindo espaço para contradições. Na abordagem contratual, interdependência e interesses contraditórios tornam-se evidentes no gerenciamento da diversidade de relações presentes no cotidiano de qualquer atividade empresarial. Na abordagem instrumental (também chamada de estratégica), a dimensão de interdependência mais evidente é aquela que se associa ao discurso do desenvolvimento sustentável, que prega a necessidade (e possibilidade) de um sistema sócio-econômico capaz de conciliar crescimento econômico, proteção ambiental e justiça social.

Embora não haja um consenso conceitual, a prática da RSE está hoje implicada nos discursos dos diversos setores da sociedade, designando, no entanto, diferentes propósitos. Para as organizações, é interessante defender a idéia de Responsabilidade Social como estratégia para gerenciar suas relações com stakeholders, num processo que decorre da década de 1980, quando o termo se reveste de argumentos em favor do mercado, que se encube da função de regular e fiscalizar as atividades empresariais ao se afastar da concepção predominante entre as décadas de 1950 e 1970 de intervenção do Estado na economia (TENÓRIO, 2004). Já o chamado terceiro setor, que se consolida como resposta a esse domínio do mercado, apresenta um discurso de responsabilidade social movido pela defesa de nichos específicos- gênero, preservação ambiental, educação, etc.- e num caminho para angariar parcerias que promovam as causas por ele defendidas.

Independentemente das motivações que a acompanham, o que se observa numa concepção mais contemporânea é a crescente vinculação da Responsabilidade Social Empresarial à noção de Desenvolvimento Sustentável, cuja construção dependeria, entre outros fatores, de uma desconcentração de poder em alguns Estados nacionais e grandes grupos privados multinacionais, em favor de relações mais equilibradas e decisões compartilhadas. O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, principal think tank brasileira neste tema, define RSE como uma forma de gestão caracterizada pela ética e transparência com todos os públicos e com o estabelecimento de metas que impulsionem a sustentabilidade, preservando os recursos necessários à sobrevivências das gerações futuras e buscando reduzir as desigualdades sociais. A aproximação entre os dois termos, aliás, nasce como uma necessidade do próprio sistema, diante do paradoxo da conciliação entre altos níveis de produção e a preservação dos recursos naturais que servem de matéria-prima para a manutenção deste sistema produtivo, ou seja, um ajuste entre economia e ambiente.

Mas como conciliar práticas tão opostas? Como promover, ao mesmo tempo, o alcance de metas econômicas e a atenção às necessidades de todos os públicos da organização? Que desafios para a gestão contemporânea se colocam frente à diversidade de atores aos quais uma organização deve “escutar” e “prestar contas”? Como fazer com que os interesses coletivos por uma sociedade mais igualitária falem mais alto que os interesses individuais dos grupos de acionistas? Pensando a questão por outro prisma, como falar em Responsabilidade Social quando, ao mesmo tempo em que uma organização se destaca por promover ações em prol das comunidades, em sua estrutura micro- o contexto interno- ela pode não se comportar de modo socialmente responsável com os seus próprios colaboradores, por exemplo, desrespeitando leis trabalhistas, em assédio moral e condições inadequadas de trabalho?

Outra dualidade no campo da Responsabilidade Social diz respeito à relação entre o local e o global. Como as soluções tomadas em âmbito local são capazes de se articular a um circuito mais amplo, a fim de promover transformações reais e duradouras? E qual o interesse

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das organizações nisso? A própria globalização embutida nessa relação é, por si só, ambígua. Laniado e Milani (2007, p.2), ao abordarem o tema na perspectiva dos movimentos sociais transnacionais e redes de solidariedade, apontam que ao mesmo tempo em que a globalização reproduz desigualdades e acentua conflitos, “favorece o surgimento de um complexo sistema de redes tecnológicas, facilitando a intercomunicação rápida e imediata (tempo) em todas a direções”, o que escapa ao controle do Estado e torna infinitas as possibilidades de interação intra e inter-organizações com vistas à promoção do desenvolvimento sustentável e práticas de Responsabilidade Social em escalas múltiplas. Novamente, evidencia-se o que colocam Child e McGrath (2001) a respeito da informação como característica central e influenciar a gestão contemporânea.

Ao colocar algumas características básicas para nortear a postura empresarial, Kreitlon (2004) defende que uma empresa socialmente responsável deve reconhecer e gerenciar os impactos econômicos, sociais e ambientais de suas atividades, tanto a nível local como global, através de um diálogo permanente com os stakeholders, inclusive por meio de parcerias. Esse é o comportamento que se espera, mas que, também paradoxalmente, precisa se sobrepor a toda uma lógica de produção, tornando necessária, mais do que nunca, a participação de governos e da sociedade como parceiros no diálogo e tomada de decisões no âmbito organizacional.

Enxergar a Responsabilidade Social a partir das articulações entre suas dimensões econômicas, sociais e ambientais como fundamentais para a sustentabilidade do planeta requer a adoção de novas estratégias por parte das organizações. Karkotli (2006), ao refletir sobre essas questões, sugere uma inter-relação de variáveis baseada na concepção de que toda organização socialmente responsável é empreendedora. Algumas variáveis que o autor investiga são: comportamento responsável- saltos ousados com execução cautelosa; preocupação com a exclusão social- profundo conhecimento do mercado; novas tecnologias sustentáveis- capacidade do líder com visão empreendedora e linguagem simbólica capaz de contaminar a organização; política ética da empresa- busca de oportunidade no mercado.

Sendo assim, fica evidente a necessidade de incorporação por parte dos gestores de um sentimento de co-responsabilidade capaz de fazer com que os públicos diretamente envolvidos sintam-se também responsáveis pelas ações, tendo, portanto, o direito de manifestar suas opiniões. Isso implica uma negociação efetiva, onde questões como meio ambiente, condições de sobrevivência para gerações futuras e a própria prática cotidiana de interação com as comunidades e com os colaboradores seja revista, não num processo imediato, mas como algo construído a fim de que seja perene. Balanços sociais, relatórios de sustentabilidade e certificações têm se sido mais frequentemente explorados pelas grandes corporações, como um dos mecanismos de comunicação com seus públicos.

E se os stakeholders devem assumir sua parcela de responsabilidade, devem incorporá-la na prática cotidiana, desde suas ações individuais até a forma como interagem com outros grupos. Fornecedores (ou parceiros em uma cadeia de suprimentos), por exemplo, uma vez comprometidos com os ideais de responsabilidade social ou forçados a isso por seus clientes, são levados a assumir uma série de compromissos éticos, cujo reflexo em suas práticas pode vir a ser monitorado por meio de indicadores de RSE, certificações, selos ou auditorias. Como debatemos ao falar em operações e logística, também no âmbito das práticas de RSE, a ideia é fortalecer a confiança nas cadeias de suprimentos, o que não dispensa normas, certificações e auditorias, entre elas a ISO 14000 (relativa ao gerenciamento ambiental), SA 8000 (condições de trabalho), OHSAS 18001 (saúde e segurança no trabalho) e a nova ISO 26000, norma de orientação (não será certificável), a ser lançada em 2010 pela International Standardization Organization, com a pretensão de torna-se referência mundial em práticas socialmente responsáveis para qualquer tipo de organização, não apenas empresas. Várias outras iniciativas vêm ganhando espaço no sentido de promover a responsabilidade social nas

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cadeias de suprimentos, como o combate ao trabalho infantil, ao trabalho escravo e à corrupção, a promoção do consumo consciente, a certificação de origem, o comércio justo, a logística reversa, entre outros. Tudo isso mostra a necessidade de traduzir princípios e compromissos éticos e de responsabilidade social, relativos a valores, repletos de subjetividade e intangibilidade, em instrumentos e sistemas de gestão passíveis de monitoramento.

Organizações da sociedade civil, associações e movimento sociais, por sua vez, têm ocupado papéis de vigilância e de exercício de pressão sobre as empresas, em prol de causas específicas, a partir de espaços que desconsideram as fronteiras geográficas e onde o território é definido a partir de seu uso pelos atores sociais (SANTOS, 2000). Uma denúncia relativa à condição precária de trabalho em algum fornecedor remoto de uma empresa multinacional, por exemplo, pode resultar em graves impactos sobre sua reputação (OLIVEIRA, 2008). Em paralelo, a multinacional de refrigerantes Coca-Cola e a WWF, organização mundial voltada para o meio-ambiente, anunciaram em 2007 a colaboração para conservar as sete maiores bacias hidrográficas de água doce do mundo. A empresa também está trabalhando com a ONG Greenpeace para eliminar emissões de carbono de refrigeradores em máquinas de venda automática de refrigerante. Curioso nesses casos é verificar a tendência de aproximação entre organizações que antes eram vistas como inimigas, em pólos opostos e vistos como irreconciliáveis: "Há dez anos atrás você não conseguiria ter Coca-Cola e Greenpeace na mesma sala", foram as palavras de Neville Isdell, CEO da Coca-Cola, conforme reportagem publicada pela revista britânica The Economist (FRANKLIN, 2008).

Sendo assim, surgem novas escalas e formas de articulação, onde o público e o privado se misturam e onde o poder deve ser repartido para permitir um exercício permanente de busca pelo desenvolvimento sustentável, o que remete à discussão sobre poder local, que, nas palavras de Fischer (2002, p.14), deve ser pensando “tanto como a capacidade de agir, quanto como a capacidade de produzir comportamentos específicos”. Disso depreende-se que o poder local implica um certo nível de autonomia, de comprometimento com as questões relacionadas ao espaço onde se insere e a conexões mais amplas às quais tais questões se relacionam, embora não seja ele fácil de ser compartilhado.

Respostas articuladas às dicotomias que envolvem a busca pela Responsabilidade Social e pelo Desenvolvimento Sustentável exigem arranjos institucionais inovadores, com a inclusão de novos atores e perspectivas, soluções visualizadas de modo integrado, mas considerando as especificidades locais. Um exemplo interessante para ilustrar essa questão pode ser percebido no documentário The Story of Stuff (“A história das coisas”, documentário apresentado por Annie Leonard, no âmbito de disponível em www.storyofstuff.com), que mostra, numa linguagem simples, como assumir uma postura capaz de alterar os padrões historicamente predominantes depende de uma releitura de todo o sistema, onde cada um participa enquanto sujeito social, que produz e consome, desde a esfera individual até as grandes organizações. Da transformação da matéria-prima à produção em larga escala, incluindo o consumo e a pressão do sistema para que os indivíduos adquiram novos formatos tecnológicos, que rapidamente se tornam obsoletos, até a dificuldade de reaproveitamento do que foi abandonado, e a própria imagem incorporada pela sociedade de que é preciso acompanhar rapidamente o avanço tecnológico, tudo isso mostra como há uma rede implícita de interdependência entre os diversos setores e os mais diversos agentes inseridos no globo.

A reflexão sobre os desafios da responsabilidade social e do desenvolvimento sustentável evidenciam a necessidade de uma nova postura das organizações deve vir acompanhada, portanto, de uma auto-reflexão sobre o papel de cada indivíduo dentro do sistema, mostrando aí a interdependência entre o nível individual, organizacional e social. Como ele participa? Quais as suas contribuições à implantação de uma nova postura, na qual a sustentabilidade seja levada em conta? Como ele se articula com grupos sociais e organizações nas quais se

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envolve, desde a família, o bairro, até a empresa? Se não há canais para sua expressão dentro desse universo, como ele tem resistido a isso? Que alternativas tem buscado? Essas são algumas considerações que se colocam diante de uma realidade de interdependência onde já não é possível pensar ações setorializadas e tomadas isoladamente.

5. Considerações finais - traços da gestão contemporânea das organizações e questões em aberto

Sumarizando pontos centrais da discussão apresentada no que se refere à tensão e ao equilíbrio entre pólos opostos e à interdependência na área de Operações e Logística e na temática da Responsabilidade Social Empresarial, destacamos no Quadro 1 alguns dos traços da gestão contemporânea identificados ao longo do texto.

Quadro 1: Traços da gestão contemporânea em Operações e Logística e RSE Fonte: Elaborado pelos autores.

Diante desses traços e do que foi argumentado, nos permitimos apresentar algumas

questões que ficam em aberto sobre os dilemas e desafios da gestão contemporânea, que eventualmente poderão ser exploradas futuramente, nessas ou em outra áreas/temas da administração. Lembrando o que nos colocam Child e McGrath (2001) quanto ao principal desafio de design das organizações na atualidade – lidar com o paradoxo, pontuamos questões que revelam possíveis paradoxos enfrentados pelos gestores e estudiosos de organizações.

Ética foi um dos termos presentes em nosso debate. Podemos entender ética como capacidade intrínseca humana de orientar-se pelo mais belo e pelo mais justo em cada escolha. Opções orientadas pela ética independeriam, pois, de mecanismos de controle e de punição, privilegiando espaços de diálogo e de reflexão. No mesmo sentido, supõe-se que,

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havendo maior grau de confiança e transparência nas relações entre pessoas e organizações, reduz-se a necessidade de controle e amplia-se o potencial de resultados positivos para todos os envolvidos. No mundo da gestão, porém, instrumentos de regulação, controle e punição costumam ser enfatizados.

Poderíamos perguntar: seja na gestão de pessoas em uma organização, na formação de gestores nas escolas de administração, na gestão de uma cadeia de suprimentos ou nas estratégias em prol do desenvolvimento sustentável, como seria possível incentivar a liberdade e a capacidade humana de orientar-se por decisões que priorizam o bem comum e, ao mesmo tempo, criar instrumentos de gestão que estimulem e valorizem essa capacidade, ao contrário de limitá-la, tolhê-la ou desacreditá-la?

Com base no que vimos sobre Operações e Logística, poderíamos sugerir que se pode inovar, criar e discordar, desde que garantidos certos padrões básicos? Em RSE e desenvolvimento sustentável, seria possível reivindicar que as empresas tenham liberdade para práticas diferenciadas e menos reguladas, oferecendo soluções para desafios sociais e ambientais e ganhando vantagens competitivas com isso, desde que garantidos padrões responsáveis na gestão de seus negócios, seja por regulação governamental ou de outros atores?

Podemos concordar com a ideia de que racionalidade, racionalização, organização, produção, o processo civilizatório, em suma, tende a limitar a liberdade humana e a explorar a natureza, sempre com certo grau de sofrimento, dominação e destruição. Poderíamos, contudo, idealizar um processo civilizatório mais emancipatório, sustentável, que viva e celebre a liberdade e a diversidade? Seria possível construir a harmonia não pela dominação, supressão de diferenças e consenso sem fim, que estimulam a entropia, mas sim pela negociação, pela articulação entre opostos? Talvez seja possível apostar na controvérsia como antídoto para a entropia e para a dominação. Em lugar de enfatizar controle, conformidade, disciplina, produtividade, redução da variedade e consenso na gestão contemporânea, seja viável investir mais em: liberdade, emancipação, participação, divergência, dúvida, contestação, confronto, pluralidade e polifonia, admitindo-se que é necessário destruir para construir, desequilibrar para avançar, esquecer para aprender. Embora valorizemos termos como comunidade, confiança, coletividade, que remetem à segurança do conhecido, do controlado, do confiável, do homogêneo, do previsível (BAUMAN, 2003), é possível apostar, simultaneamente, em espaços para criar, na permissão para discordar? Paradoxo, contradição, diversidade e conflito, mais do que tolerados, podem ser desejados nas organizações? O que isso representa enquanto desafio para os gestores e para nossos sistemas de gestão?

Cabe, por fim, chamar a atenção para o fato de que qualquer dilema adquire sentido em situações cotidianas, contextualizadas, situadas. Para compreender características da gestão contemporânea, seus dilemas, contradições, paradoxos e dualidades, talvez um possível caminho seja voltar-se para os contextos sócio-práticos em que acontecem, efetivamente, a resposta aos dilemas, a aprendizagem e a construção de conhecimentos - nas práticas das pessoas em interação. Essa ênfase à prática acompanha tendência nos estudos organizacionais na busca da compreensão da realidade e da formulação de teorias, não de modo dicotômico, mais integrado, imbricado, articulando teoria e prática, reflexão e ação. Contribuindo, inclusive, para evitar o distanciamento entre prática gerencial e produção acadêmica em gestão.

Podemos seguir a recomendação de Martinet (2007) de que a saída para que os estudantes saiam das escolas menos arrogantes e ignorantes é contaminar-se com o real, ser um “homem situado”. Algo que enseja questões sobre como aprendemos a gerir, a enfrentar os desafios da gestão contemporânea e a produzir conhecimento sobre gestão.

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