Gestão de sistemas de saúde

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UERJReitora Nilca Freire Vice-Reitor Celso Pereira de S

INSTITUTO DE MEDICINA SOCIALDiretor Joo Regazzi Gerk Vice-Diretora Jane Dutra Sayd

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Celia Regina Pierantoni Cid Manso de M. Vianna Organizadores

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Autores Alberto Beltrame Angela Maria Meira de Vasconcellos Gilvnia Westin Cosenza Heloiza Machado de Souza Lcia de Ftima Nascimento de Queiroz Maria Helena Carvalho Brando Oliveira Marizete Almeida Silva Paulo Henrique Ferreira de Melo Renilson Rehem de Souza Tereza Cristina Lins Amaral

Rio de Janeiro Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ Instituto de Medicina Social IMS 2003

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Obra publicada pelo Instituto de Medicina Social da UERJ e financiada com recursos de:

Projeto Grfico Visual / Editorao / Normalizao

Editora Segrecar / Perfect PressReviso Ana Slvia Gesteira Capa Raphael Neto Colaborao Tcnica Tania Frana Thereza Varella Valria Dias Mattos Ficha catalogrfica elaborada pela Biblioteca Biomdica CB/C, Carlos Gentile de Mello, do Instituto de Medicina Social da UERJG393 Gesto de sistemas de sade / Clia Regina Pierantoni, Cid Manso M. Vianna, organizadores; Angela Maria Meira de Vasconcellos ... [et al.]. Rio de Janeiro: UERJ, Instituto de Medicina Social, 2003. 389p. Bibliografia ISBN 85-89752-02-X 1. Sade pblica Administrao Brasil. 2. Servios de sade Brasil. 3. Sistema nico de Sade (Brasil). 4. Poltica de sade Brasil. 5. Promoo da sade Brasil. 6. Indicadores de sade Brasil. I. Pierantoni, Clia Regina . II. Manso, Cid Manso de Mello. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Medicina Social. CDU 614(81)

Universidade do Estado do Rio de Janeiro Instituto de Medicina Social (IMS) www.ims.uerj.br Rua So Francisco Xavier, n 524, 7 andar, bloco E, sala 7010 20559-900 - Maracan - Rio de Janeiro RJ Fone: (21) 2264-1143, 2587-7303, ramais: 242, 253 e 206 Fax: (21) 2264-1142

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SUMRIOSOBRE OS AUTORES .......................................................................................................... 7 APRESENTAO .................................................................................................................. 9 CONSTRUINDO O SUS: A L GICA DO FINANCIAMENTO E O P ROCESSO DE DIVISO DE RESPONSABILIDADES ENTRE AS ESFERAS DE GOVERNO Renilson Rehem de Souza ...................................................................................... 15 PACTOS DE GESTO: DIVISO DE RESPONSABILIDADES ENTRE ESTADOS E M UNICPIOS NA DESCENTRALIZAO Maria Helena Carvalho Brando Oliveira ...................................................... 59 TEXTOS NORMATIVOS X CONTEXTOS LOCAIS: ESTUDO DE CASO SOBRE OS DILEMAS DO PROCESSO DE DESCENTRALIZAO DA SADE Lcia de Ftima Nascimento de Queiroz ......................................................... 93 DISTRIBUIO ESPACIAL E ACESSO DA POPULAO AOS SERVIOS DE SADE Gilvnia Westin Cosenza .....................................................................................133 M ORTALIDADE HOSPITALAR NA REDE SUS: ESPELHO DOS BITOS OCORRIDOS NA POPULAO BRASILEIRA? Tereza Cristina Lins Amaral ...............................................................................169 ANLISE DAS PRTICAS ASSISTENCIAIS NA REA DE SADE DA M ULHER NAS EQUIPES DO PROGRAMA DE SADE DA FAMLIA: UM ESTUDO DE CASO EM ESTADO SELECIONADO Heloiza Machado de Souza .................................................................................201 POLTICA DE MEDICAMENTOS DE ALTO CUSTO: O ATUAL PROGRAMA DE MEDICAMENTOS EXCEPCIONAIS Alberto Beltrame ......................................................................................................249 CENTROS COLABORADORES PARA A QUALIDADE DA GESTO E ASSISTNCIA HOSPITALAR: UMA EXPERINCIA INOVADORA Marizete Almeida Silva ..........................................................................................281 UMA ANLISE DO PROCESSO DE IMPLANTAO DOS CENTROS DE REFERNCIA PARA O TRATAMENTO DA RETINOPATIA DIABTICA NA REDE DE SERVIOS DO SISTEMA NICO DE SADE DO BRASIL EM 2000/2001 ngela Maria Meira de Vasconcellos ...............................................................317 O P ROCESSO DA REGULAMENTAO DA ASSISTNCIA SUPLEMENTAR NO BRASIL Paulo Henrique Ferreira de Melo .......................................................................355

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SOBRE OS AUTORESAlberto Beltrame Mdico. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Diretor da Rede de Servios de Sade do Ministrio da Sade. Angela Maria Meira de Vasconcellos Arquiteta. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Assessora Tcnica da Secretaria de Assistncia Sade do Ministrio da Sade. Coordenadora Geral do Gabinete do Ministro da Sade e Chefe de Gabinete do Ministrio da Sade Substituta. Celia Regina Pierantoni Mdica. Doutora em Sade Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Professora Adjunta do IMS/UERJ, Coordenadora do Mestrado Profissional. Cid Manso de Mello Vianna Engenheiro Qumico. Doutor em Economia pelo Instituto de Economia da UFRJ. Professor Adjunto do IMS/UERJ, Coordenador do Programa de Ps-graduao e do Mestrado Profissional. Gilvnia Westin Cosenza Mdica. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Assessora da Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Secretrios de Sade (CONASS). Assessora do Gabinete/Secretaria de Vigilncia em Sade do Ministrio da Sade. Heloiza Machado de Souza Enfermeira. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Diretora do Departamento de Ateno Bsica. Assessora do Conselho Nacional de Secretrios de Sade (CONASS).UERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 7

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Lcia de Ftima Nascimento de Queiroz Mdica. Mestre em Economia pela UFPB e mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Gestora Governamental do Ministrio do Planejamento. Assessora da Secretaria de Assistncia Sade do Ministrio da Sade. Maria Helena Carvalho Brando Oliveira Assistente Social e Sanitarista. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Diretora do Departamento de Descentralizao da Gesto da Assistncia da Secretaria de Ateno Sade do Ministrio da Sade. Diretora de Programas da Secretaria de Ateno Sade do Ministrio da Sade. Marizete Almeida Silva Tcnica em Comunicao Social Jornalismo. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. MBA em Gerncia da Sade, pela Fundao Getlio Vargas (FGV). Ex-Coordenadora de Estruturas e Processos. Gerente de Projeto do Ministrio da Sade. Paulo Henrique Ferreira de Melo Economista e Administrador. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Chefe de Gabinete da Secretaria de Assistncia Sade do Ministrio da Sade. Assessor Tcnico da Presidncia do BNDES. Renilson Rehem de Souza Mdico. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Secretrio de Assistncia Sade do Ministrio da Sade. Consultor em Gesto de Servios e Sistemas de Sade. Tereza Cristina Lins Amaral Assistente Social. Mestre em Administrao em Sade pelo Instituto de Medicina Social da UERJ. Ex-Consultora da Secretaria de Assistncia Sade do Ministrio da Sade. Consultora da Secretaria de Ateno Sade do Ministrio da Sade.8 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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APRESENTAODESAFIOS PARA A FORMAO DE GESTORES DO SISTEMA DE SADE: PROCESSOS E PRODUTOSCelia Regina Pierantoni Esta coletnea rene artigos produzidos a partir das reflexes e pesquisas geradas pela preocupao e investimento do Ministrio da Sade na qualificao de seus quadros em programas de ps-graduao stricto sensu, sob a forma de Mestrado Profissional1 na rea de Gesto de Sistemas de Sade, em parceria com o Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Essas preocupaes refletem as mudanas observadas nas organizaes de sade e espelham as operadas no chamado mundo do trabalho. So reflexo ainda de questes inerentes aos processos de mudana e de implementao da poltica de sade para a construo do Sistema nico de Sade em anos recentes. consensual que o mundo do trabalho vem sofrendo transformaes que acompanham as mudanas da sociedade ps-industrial, relativas ao desenvolvimento e incorporao tecnolgica. Essas transformaes se traduzem em produtos, processos de trabalho ou gesto e, para alm da incorporao de tecnologia armada, dos trabalhadores se exigem novos perfis adaptativos. Estes demandam nova conformao da capacidade laboral de diversos setores da economia, ditada por tendncias, s vezes contraditrias, relacionadas com a polivalncia, a ausncia de especializao, a capacidade de inovar, a nfase do trabalho em equipe, a qualificao, a autonomia e a responsabilizao, o desenvolvimento de habilidades cognitivas e de novas competncias. A velocidade com que esses novos perfis so demandados, aliada a proposies inovadoras aplicadas em estruturas organizacionais rgidas ou com metodologias tradicionais, faz conviver hoje formas hbridas de organizao do trabalho. Assim, persistem processos de trabalho com ausncia de participao efetiva dos trabalhadores, rotatividade da ocupao dos postos de trabalho, treinamentos ou especializaes que visam a mudanas comportamentais e no formao especfica mais qualificada, entre outras.1

O mestrado profissional uma modalidade de especializao strictu sensu cuja finalidade formar profissionais no necessariamente ligados carreira de docncia e pesquisa. Visa qualificao e produo de conhecimentos aplicados em reas especficas. credenciado pela Coordenao de Aperfeioamento de Ensino Superior do Ministrio da Educao (CAPES).

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A necessidade de novas competncias e a criao de novas ocupaes e especializaes enfrentam, por outra via, interesses corporativos, tanto por parte das corporaes mais organizadas como do sistema educacional, o que afeta no s a velocidade, mas tambm a qualidade e a institucionalidade da incorporao dos novos perfis profissionais. No campo da sade, a reforma do sistema, nos momentos relativos definio constitucional do Sistema nico de Sade, na dcada de 80; a definio macropoltica da reforma do Estado, na dcada de 90; a fixao de polticas relacionadas com a criao ou mudana do modelo assistencial (particularmente em meados da ltima dcada) e o fortalecimento das instncias de participao social vm gerando transformaes especficas em produtos, processos de trabalho e gesto para a rea. Tais transformaes fortalecem a necessidade de qualificao de quadros para o exerccio dessa funo. O Programa de Mestrado Profissional em Administrao de Sade do IMS/UERJ surgiu do desenvolvimento e consolidao de seu programa de Ps-graduao em Sade Coletiva e da experincia acumulada, desde 1976, com o Curso de Especializao (Ps-graduao lato sensu ) em Administrao Hospitalar. Nessa rea em particular, o movimento de transformao da gesto nas organizaes de sade pde ser acompanhado por mudanas no perfil da clientela do curso: antes predominantemente composta de mdicos, incorporou progressivamente outros profissionais da rea de sade. A realidade atual agrega, alm desses profissionais, aqueles com formao em administrao e em reas diversas, como engenharia, arquitetura, direito, informtica, entre outras. Seu foco ampliou-se assim para alm das unidades hospitalares, abrangendo a complexidade de sistemas e servios de sade. A diversidade da clientela, por outra via, promoveu o desenvolvimento e acmulo de experincia no uso de metodologias de ensino-aprendizado voltadas para a valorizao da experincia dos participantes, fertilizada com a de profissionais da rea. Mais ainda, levou criao de mecanismos de avaliao capazes de considerar a troca de experincias entre os alunos e a competncia para o trabalho em equipe. O desenvolvimento do Programa de Mestrado Profissional em Administrao de Sade e na rea de Sade Coletiva representa desafio constante para as instituies de ensino e de servio, que s poder ser consolidado a partir de discusses e aprendizados mtuos. Exige audcia para o novo e o reconhecimento dos limites e possibilidades dos campos da educao e do trabalho, na formao e na produo de conhecimento.10 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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Os cursos, criados em 2000, alm de proverem uma sistematizao de conhecimentos relativos rea, tm sido importante estmulo para o desenvolvimento e disseminao de pesquisas nos servios de sade. Mais ainda, pela possibilidade de troca de experincias entre os alunos, favorecem o desenvolvimento institucional entre as esferas da gesto, tambm qualificando os processos de reflexo e avaliao, a partir de acmulos sistematizados de conhecimentos tericos aplicados prtica das organizaes de servios de sade. Do ponto de vista acadmico, esses cursos so importante facilitador na sistematizao de conhecimentos e avaliao dos processos relacionados ao campo da gesto e das polticas pblicas. Aproximam os campos tericos de produo de conhecimento da rea de Sade Coletiva com a prtica e a dinmica observadas na gesto dessas polticas. So um desafio para docentes e alunos: para os primeiros, pela adaptao de contedos dos diversificados campos de conhecimentos expertise prtica dos alunos; para estes, pela retomada de hbitos de leitura e reflexo daqueles campos de conhecimento por vezes no exercida devido prontido das demandas cotidianas da gesto do sistema de sade. Assim, esta coletnea apresenta textos selecionados pelos organizadores, de forma aleatria, a partir dos temas apresentados nas dissertaes de concluso do Mestrado Profissional. No primeiro bloco, os estudos refletem o registro e a anlise de questes relativas implementao da poltica e seus aspectos normativos, o processo de descentralizao, os avanos e dificuldades da capacidade gestora de nveis subnacionais, a distribuio espacial e o acesso da populao ao sistema, alm de limites e possibilidades de utilizao mais abrangente de sistemas de informao vigentes. Os artigos do bloco seguinte abordam temas relativos avaliao de programas e implementao de polticas em reas especficas. O primeiro texto analisa o financiamento e a diviso de responsabilidades entre os nveis de governo no processo de implantao do SUS. Destaca que o SUS comeou a ser implantado como uma estratgia que buscou dar carter universal cobertura das aes de sade, at ento proporcionada pelo INAMPS para seus beneficirios. Foi desenvolvido a partir da hiptese de que, ao se adotar a lgica de um INAMPS universal dentro de um modelo de federalismo que no define claramente os limites entre seus entes, determinou-se o modelo de financiamento que, por sua vez, produziu a estratgia de organizao do novo sistema. O texto seguinte apresenta uma reflexo sobre alguns instrumentos criados para operacionalizar a estratgia de descentralizao do SUS,UERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 11

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enfocando sobretudo a diviso de responsabilidades que se estabeleceu entre estados e municpios durante a vigncia da NOB-SUS 01/96. Para examinar as relaes entre estados e municpios, avalia os pactos interesferas governamentais mediados direta ou indiretamente pelas Normas Operacionais. Analisa fatores relacionados ao processo de criao de capacidade gestora no nvel subnacional e s estratgias de superao e de enfrentamento das dificuldades relativas formulao descentralizada das polticas de sade. O terceiro texto aborda a questo da distribuio espacial e o acesso da populao aos servios de sade. Discute os conceitos de eqidade e acesso como uma de suas vertentes, avaliando a oferta de servios de sade no Brasil na dcada de 90, especialmente os servios pblicos, no que se refere sua distribuio espacial e como a populao percebe o acesso s unidades de sade. O estudo seguinte verifica a possibilidade de uso do Sistema de Informaes Hospitalares do SUS (SIH/SUS) em perspectiva mais abrangente, via comparao dos bitos registrados no SIH/SUS e no Sistema de Informaes sobre Mortalidade (SIM), no sentido de analisar se o perfil da mortalidade hospitalar na rede SUS reflete os bitos ocorridos na populao brasileira. Observa que ainda h grande variao em relao compatibilidade e consistncia dos dados brutos aportados no SIH/SUS e no SIM, apontando para a necessidade de ajustes, maior controle e avaliao das informaes prestadas. O sexto tema analisa as prticas assistenciais relativas rea de sade da mulher nas equipes do Programa de Sade da Famlia e o contexto de sua implantao, tendo como base estudo realizado em um estado previamente selecionado. A poltica brasileira de medicamentos abordada a seguir, nos aspectos relativos assistncia farmacutica de alto custo no pas e, particularmente, ao processo de gerenciamento do chamado Programa de Medicamentos Excepcionais. O texto focaliza o comportamento do mercado farmacutico, a regulao da atividade, a capacidade gestora do Ministrio da Sade e dos estados, e o acesso da populao a medicamentos de alto custo. A seguir, a experincia de implantao do Programa Centros Colaboradores para a Qualidade da Gesto da Assistncia Hospitalar apresentada e identificada em seus objetivos, a saber: permitir o intercmbio de conhecimento e de tecnologia entre instituies hospitalares distintas para formar hospitais capacitados a gerenciar racionalmente os recursos disponveis.12 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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Nessa linha avaliado, no trabalho seguinte, o processo de implantao de trinta centros de referncia especializada em oftalmologia no SUS, destinados ao tratamento das leses oftalmolgicas, em especial para pacientes diabticos portadores da retinopatia diabtica (anos 2000 e 2001). Descrevem-se as circunstncias do processo de deciso para implantao do programa e os instrumentos para sua formalizao, bem como as dificuldades encontradas para implantao e os possveis resultados no quadro atual da ateno oftalmolgica no Brasil. Finalmente, apresentado estudo sobre a construo da assistncia mdica suplementar no Brasil e sua respectiva regulao, tendo como base analtica pesquisas acadmicas, publicaes das entidades representativas das operadoras, artigos publicados e dados estatsticos gerados pela Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS) e pelas prprias operadoras. Esperamos que a publicao desta coletnea sirva no s de registro e avaliao de aspectos relativos poltica de sade dos anos recentes, mas tambm como estmulo para iniciativas semelhantes, articuladas entre as instituies de ensino e de servios, para a construo de um sistema de sade alinhado com os preceitos de cidadania e justia social. ... Por fim destacamos, por sua iniciativa, Renilson Rehem de Souza (ex-Secretrio de Assistncia Sade SAS/MS), Eduardo Levcovitz (ex-Diretor do Departamento de Descentralizao da Assistncia DDGA/SAS/MS), Jos Gomes Temporo (representante do MS no programa) e todos gestores alunos do Ministrio da Sade, representados pelos colaboradores desta obra. E tambm os docentes e pesquisadores do IMS/UERJ Sulamis Dain, Ana Luiza Vianna, Anna Maria Campos, Hsio Cordeiro, George E. Kornis, Cid Manso de Mello Vianna e Rosangela Caetano e professores colaboradores Zulmira Hartz, Ligia Vieira, Ligia Bahia, Nelson Ibaez, Humberto Falco Martins, Anna Beatriz Toms Salles e Lia Hasenclever , cuja competncia e solidariedade sobressaram nesta empreitada. Esta edio s pde ser finalizada com a colaborao de Thereza Christina Varella, Tania Frana (pesquisadoras associadas e doutorandas do IMS/UERJ), Valria Dias Mattos (auxiliar de pesquisa da Rede Observatrio de Recursos Humanos Estao de Trabalho IMS/UERJ) e Ana Silvia Gesteira.

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C ONSTRUINDO O SUS: A LGICA DO FINANCIAMENTO E O PROCESSODE DIVISO DE RESPONSABILIDADES ENTRE AS ESFERAS DE GOVERNO

Renilson Rehem de Souza

1. INTRODUOA Constituio Federal brasileira de 1988 redefiniu o modelo de proteo social adotando o conceito de Seguridade Social, integrada pelo conjunto das aes referentes a sade, previdncia e assistncia social. No campo das polticas sociais, dever do Estado assegurar a todos os cidados o direito educao e sade (Brasil, 1988). Para assegurar esse direito, na rea da sade, a Constituio determinou a implantao do Sistema nico de Sade (SUS), estruturado de forma descentralizada, hierarquizada e regionalizada, de acesso universal. Embora o pargrafo nico do art. 198 da Constituio Federal defina que o Sistema nico de Sade ser financiado, nos termos do art. 195, com recursos do oramento da seguridade social, da Unio, dos estados, do Distrito Federal e dos municpios, alm de outras fontes, tem havido, ao longo do processo de implantao do SUS, nfase na participao da Unio. Parte-se do pressuposto de que esse entendimento tem influenciado de forma decisiva o processo de implantao do SUS. Um dos fatores determinantes desse entendimento , provavelmente, o papel desempenhado pelo Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social (INAMPS), por meio do Programa de Desenvolvimento de Sistemas Unificados e Descentralizados de Sade nos Estados (SUDS), no perodo imediatamente anterior aprovao da Lei n 8.080 e que continuou no incio da implantao do SUS. O SUDS foi uma iniciativa do prprio INAMPS, no sentido de universalizar sua assistncia, que at ento beneficiava apenas os trabalhadores da economia formal e seus dependentes. Na anlise deste processo, importante destacar que o SUS comeou a ser implantado por meio de uma estratgia que buscou dar carter universal cobertura das aes de sade, at ento proporcionada pelo INAMPS para seus beneficirios. A nossa hiptese que, ao se adotar a lgica de um INAMPS universal sobre um modelo de federalismo que no define claramente os limites entre seus entes, determinou-se o modelo de financiamento que, por sua vez, determinou a estratgia de organizao do novo sistema.UERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 15

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Por outro lado, o Ministrio da Sade, na condio de gestor nacional do sistema, se comporta de maneira ambivalente entre garantir um processo de transio sem rupturas bruscas que ponham em risco o funcionamento do sistema (NOB-SUS 93) e a manuteno de um processo que mais significa a universalizao do INAMPS. Essa posio do MS fortalecida por sua inadequada diviso de trabalho, que fraciona de modo excessivo as reas da sade, com srias implicaes no processo de financiamento e, por mais que se rejeite, refora o componente assistencial, particularmente aquele de alta complexidade. Estes fatos nos fazem supor que os gestores, tanto nacional, como estaduais e municipais, no assumiram efetivamente sua parcela de responsabilidade no sistema, o que nos leva a indagar, em que pese o avano do SUS, se o processo desenvolvido at a NOB 96 foi a efetiva implantao do SUS, ou se tratou de um contnuo aperfeioamento do Sistema Unificado e Descentralizado de Sade (SUDS). As significativas alteraes ocorridas no processo de implantao do SUS ao longo dos ltimos dez anos fazem com que, para se entender o atual momento, seja necessrio rever a origem e a prpria histria da reorganizao do sistema de sade, dado que no entrecruzamento entre a implantao do novo sistema e a preservao de estruturas organizacionais e de financiamento antigas que se define a lgica de implantao do SUS.

2. METODOLOGIAO objeto deste estudo o financiamento e a diviso de responsabilidades entre os nveis de governo no processo de implantao do Sistema nico de Sade histrico porque se desenvolve numa sociedade humana, que existe em determinado espao, cuja formao social e configurao so especficas. De acordo com Minayo (1994), vivem o presente marcado pelo passado e projetado para o futuro, num embate constante entre o que est dado e o que est sendo construdo. uma questo social, pois a provisoriedade, o dinamismo e a especificidade so suas caractersticas fundamentais. O trabalho foi desenvolvido como um estudo exploratrio que, segundo Gil (1996), tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com um problema, com vistas a torn-lo mais explcito ou a construir hipteses. Frente necessidade de considerar diversos aspectos relativos ao nosso objeto de estudo e objetivos, e que dizem respeito a sua implantao e financiamento, entendemos que esse tipo de pesquisa bastante flexvel e possibilitou a construo da nossa hiptese.16 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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Assume a forma de pesquisa documental, pois foi desenvolvido a partir de material j elaborado, constitudo daqueles que ainda no receberam tratamento analtico: documentos impressos para um determinado pblico, textos legais, tais como leis, portarias etc. H ainda documentos de segunda mo, que de alguma forma j foram analisados, tais como relatrios de pesquisa, tabelas estatsticas etc. (Gil, 1996). O processo de anlise foi realizado conjuntamente com a interpretao dos dados, que consistiu em estabelecer a ligao entre os achados com outros resultados conhecidos e tambm na vivncia profissional do autor.

3. ANLISE E RESULTADOS3.1. ANTECEDENTES DO SUSAntes da criao do Sistema nico de Sade, o Ministrio da Sade, com apoio dos estados e municpios, desenvolvia quase que exclusivamente aes de promoo da sade e preveno de doenas, com destaque para as campanhas de vacinao e controle de endemias. Todas essas aes eram desenvolvidas com carter universal, ou seja, sem nenhum tipo de discriminao com relao populao beneficiria. Na rea de assistncia sade, o MS atuava apenas por meio de alguns poucos hospitais especializados, nas reas de psiquiatria e tuberculose, alm da ao da Fundao de Servios Especiais de Sade Pblica (FSESP), em algumas regies especficas, com destaque para o interior das regies Norte e Nordeste. A chamada assistncia mdico-hospitalar era prestada parcela da populao definida como indigente, por alguns municpios e estados e, principalmente, por instituies de carter filantrpico. Essa populao no tinha assegurado nenhum direito de acesso a servios assistenciais e a assistncia que recebia era uma forma de caridade. A grande atuao do poder pblico nessa rea se dava atravs do Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS). O INPS foi o resultado da fuso, em 1966, dos Institutos de Aposentadorias e Penses que, em 1978, por meio da Lei do SINPAS (Sistema Nacional de Previdncia e Assistncia Social), foi desdobrado em Instituto de Administrao da Previdncia Social (IAPAS), Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS) e Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social (INAMPS). Este tinha a responsabilidade de prestar assistncia sade de seus associados, o que justificava a construo de grandes unidades de atendimento ambulatorial e hospitalar, como tambm aUERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 17

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contratao de servios privados nas regies com maior desenvolvimento econmico e nos grandes centros urbanos, onde estava a maioria dos seus beneficirios. A assistncia sade desenvolvida pelo INAMPS beneficiava apenas os trabalhadores da economia formal, com carteira assinada, e seus dependentes, ou seja, no tinha o carter universal que passou a ser um dos princpios fundamentais do SUS. Desta forma, o INAMPS aplicava nos estados, atravs de suas Superintendncias Regionais, recursos para a assistncia sade de modo mais ou menos proporcional ao volume de recursos arrecadados e de beneficirios. Portanto, quanto mais desenvolvida a economia do estado, com maior presena das relaes formais de trabalho, maior o nmero de beneficirios e, conseqentemente, maior a necessidade de recursos para garantir a assistncia a essa populao. Dessa forma, o INAMPS aplicava mais recursos nos estados das regies Sul e Sudeste, mais ricos, e nessas regies e em outras, em maior proporo nas cidades de maior porte. Nessa poca os brasileiros, com relao assistncia sade, estavam divididos em trs categorias, a saber: os que podiam pagar diretamente pelos servios; os que tinham direito assistncia prestada pelo INAMPS e os que no tinham nenhum direito. A tabela a seguir mostra, nessa conjuntura, a distribuio percentual dos recursos gastos pelo INAMPS no ano de 1986, em comparao com a distribuio percentual da populao, segundo regio.Tabela 1 Desigualdades Regionais na Assistncia Mdica (Brasil, 1986)

Fonte: INAMPS/Secretaria de Planejamento / DIS 1987.

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Pode-se verificar na Tabela 1 que, proporcionalmente, a Regio Sudeste, mais rica (com 43,79% da populao e 59,28% dos recursos), foi a que recebeu mais recursos; e que as regies Norte e Nordeste, mais pobres, foram a que menos receberam. Esta constatao no deve ser entendida como uma crtica, porque a alocao de recursos atendia aos objetivos formais e legais do INAMPS. Esses recursos eram utilizados para o custeio das unidades prprias (Postos de Assistncia Mdica e Hospitais) e, principalmente, para a compra de servios da iniciativa privada. Com a crise de financiamento da Previdncia que comeou a se manifestar a partir de meados da dcada de 70, o INAMPS adotou vrias providncias para racionalizar suas despesas e comeou, na dcada de 80, a comprar servios do setor pblico (hospitais universitrios federais e redes de unidades das Secretarias Estaduais e Municipais de Sade), inicialmente atravs de convnios. A assistncia sade prestada pela rede pblica, mesmo com o financiamento do INAMPS apenas para seus beneficirios, preservava seu carter de universalidade da clientela. Para enfrentar essa situao de crise, foram apresentadas vrias sugestes, sendo que a nica a alcanar razovel grau de consenso foi a criao do CONASP (Conselho Nacional de Administrao da Sade Previdenciria), subordinado diretamente ao Presidente da Repblica, efetivada pelo Decreto n 86.329, de setembro de 1981 (Levcovitz, 1997): A partir do plano do CONASP, foi implementada a estratgia das Aes Integradas de Sade AIS, visando a alcanar nveis de articulao institucional que viabilizassem aes mais eficientes e eficazes. Em meados da dcada de 80, o INAMPS adotou medidas que o aproximam ainda mais de uma cobertura universal de clientela, dentre as quais se destaca o fim da exigncia de Carteira de Trabalho e Previdncia Social e da Carteira de Beneficirio, por parte dos pacientes que buscassem assistncia hospitalar ou ambulatorial nas unidades prprias do INAMPS (Resoluo INAMPS n. 98). Em dezembro de 1986, por meio da Resoluo INAMPS n. 138, extinguiu-se a necessidade de apresentao da Carteira de Identidade de Beneficirio do INAMPS para atendimento ambulatorial e hospitalar efetuado pelas unidades prprias do INAMPS ou das demais entidades componentes das Aes Integradas de Sade AIS (as unidades pblicas). Tambm nessa poca, o INAMPS passou a dar aos trabalhadores rurais, at ento precariamente assistidos pelo FUNRURAL, tratamento equivalente quele prestado aos trabalhadores urbanos, formalizada por meio da Resoluo INAMPS n. 115, de maro de 1986. Mesmo com aUERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 19

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crise que j se abatia sobre o INAMPS, essa medida significou grande melhoria nas condies de acesso dessa populao aos servios de sade, particularmente na rea hospitalar. Tais medidas atraram grande simpatia da opinio pblica em geral e de alguns grupos especficos de trabalhadores, como os rurais, que at ento estavam submetidos a muitas dessas restries (Levcovitz, 1997). Esse processo culminou com a publicao do Decreto n. 94.657, de julho de 1987, que cria o Programa de Desenvolvimento de Sistemas Unificados e Descentralizados de Sade nos Estados (SUDS). O programa foi implementado por meio da celebrao de convnios entre o INAMPS e os governos estaduais. A fase inicial de implantao do SUDS, cujos primeiros convnios entre o INAMPS e as SES foram firmados j em 1987, caracteriza-se pela inexistncia de uma normatizao detalhada. Somente em 1988 o SUDS adquiriu uniformidade jurdico-legal, atravs do Convnio-padro SUDS 01/88. Este instrumento de relacionamento entre as esferas de governo induz uma estratgia de estadualizao da gesto do sistema, pela transferncia de funes federais e pelo destaque dado CIS (Levcovitz, 1997). Em junho de 1988, o INAMPS publica a Norma Operacional Bsica do Programa de Desenvolvimento de Sistemas Unificados e Descentralizado de Sade nos Estados (NOB/SUDS), que estabelece instrues aos servidores do INAMPS responsveis pela anlise dos Planos de Aplicao de Recursos de Convnio e das prestaes de contas correspondentes. O SUDS teve como principais objetivos a unificao dos sistemas (Ministrio da Sade e INAMPS - Ministrio da Previdncia e Assistncia Social) e a conseqente universalizao da cobertura e descentralizao. Em janeiro de 1989, nas palavras do Secretrio-geral do MPAS, o SUDS apresentado como o precursor por que no dizer viabilizador do prprio texto constitucional: o Sistema nico de Sade, preconizado nos artigos 196 a 200 da Carta Magna (Brasil/MPAS, 1989). No perodo SUDS (1987/89), as mudanas ocorridas na esfera federal tiveram como executores os estados da Unio. Essa questo importante para a discusso do processo de diviso de responsabilidades ocorrida durante a implantao do SUS. As iniciativas apresentadas demonstram que comea a se construir no Brasil um sistema de sade descentralizado e com tendncia cobertura universal, mesmo antes da aprovao da Lei n 8.080, que instituiu o SUS. Isto foi motivado, por um lado, pela crescente crise de financiamento do modelo de assistncia

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mdica da Previdncia Social e, por outro, grande mobilizao poltica dos trabalhadores da sade, de centros universitrios e de setores organizados da sociedade, que constituam o ento denominado Movimento da Reforma Sanitria, que teve seu auge na VIII Conferncia Nacional de Sade, no contexto da redemocratizao do pas. A Constituio Federal de 1988 determinou a implantao do Sistema nico de Sade (SUS), estruturado de forma descentralizada, hierarquizada e regionalizada, de acesso universal. O Pargrafo nico do Art. 198 diz: O sistema nico de sade ser financiado, nos termos do art. 195, com recursos do oramento da seguridade social, da Unio, dos estados, do Distrito Federal e dos municpios, alm de outras fontes. Esta questo de extrema importncia, pois em todo debate sobre o financiamento do SUS, a nfase dada na participao da Unio, como se esta fosse a nica responsvel pelo mesmo. Um dos fatores determinantes desse entendimento , provavelmente, o papel do INAMPS no incio do SUS, como veremos mais adiante. Um aparente passo significativo na direo do cumprimento da definio constitucional de construo do Sistema nico de Sade foi a publicao do Decreto n. 99.060, de 7 de maro de 1990, que transferiu o Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social (INAMPS) do Ministrio da Previdncia para o Ministrio da Sade. Portanto, anterior promulgao da Lei n 8.080, que s ocorreu em setembro do mesmo ano. No entanto, como procuraremos demonstrar aqui, a presena do INAMPS na estrutura do Ministrio da Sade e seu uso como base para a implantao do SUS levou a um caminho que pode ter dificultado essa implantao. A Lei n 8.080 institui o Sistema nico de Sade, com comando nico em cada esfera de governo e define o Ministrio da Sade como gestor no mbito da Unio. A Lei, no seu Captulo II Dos Princpios e Diretrizes, Art. 7, estabelece, entre os princpios do SUS, a universalidade de acesso aos servios de sade em todos os nveis de assistncia. A Lei n 8.142, de dezembro de 1990, dispe sobre a participao da comunidade na gesto do SUS e sobre as transferncias intergovernamentais de recursos financeiros na rea da sade. Com relao participao da comunidade, institui, em cada esfera de governo, a Conferncia de Sade e o Conselho de Sade. No que se refere ao financiamento, detalha de modo significativo a participao da Unio e, com relao s demais esferas de governo, apenasUERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 21

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faz referncia obrigatoriedade de contrapartida dos mesmos, que definida como condio para o recebimento dos recursos federais por parte de estados e municpios. No seu artigo terceiro, estabelece que os recursos sero repassados de forma regular e automtica para os municpios, estados e Distrito Federal (...). Vai alm, ao definir que 70% desses recursos devero ser destinados aos municpios.

3.2. AS FUNES GESTORAS E AS ATRIBUIES DE CADA NVEL DE GOVERNO NO SUSConforme mencionado anteriormente, o Sistema nico de Sade , por definio constitucional, um sistema pblico de sade, nacional e de carter universal, baseado na concepo de sade como direito de cidadania, na noo de unicidade e ao mesmo tempo nas diretrizes organizativas de descentralizao, com comando nico em cada esfera de governo; integralidade do atendimento e participao da comunidade. A implementao desse sistema, particularmente no que diz respeito ao processo de descentralizao e definio do papel de cada esfera de governo, condicionada por e deve considerar o enfrentamento de, ao menos, trs questes gerais: as acentuadas desigualdades existentes no pas; as especificidades dos problemas e desafios na rea da sade; as caractersticas do federalismo brasileiro. Pode-se dizer que, de certa forma, houve na implementao das polticas de sade nos anos 90 esforo no sentido de construir um modelo federativo na sade, seja atravs das tentativas de definio do papel de cada esfera no sistema, seja atravs da criao de estruturas e mecanismos institucionais especficos de relacionamento entre os gestores do SUS e destes com a sociedade. Os gestores do SUS so os representantes de cada esfera de governo designados para o desenvolvimento das funes do Executivo na sade, a saber: o Ministro de Sade, o Secretrio de Estado de Sade e o Secretrio Municipal de Sade. Esses gestores devem atuar em dois mbitos, bastante imbricados: o mbito poltico e o mbito tcnico . A atuao poltica do gestor do SUS, norteada pela concepo da sade como direito e pelo interesse pblico, tambm se consubstancia na permanente interao e relacionamento com outros atores do jogo democrtico, tais como: o chefe eleito do Executivo respectivo que o designou; outros Ministros/Secretrios; o Ministrio Pblico; representantes do Poder Legislativo; do Poder Judicirio; prestadores de servios; servidores pblicos do setor sade; profissionais de sade; cidados usurios do SUS; representantes de entidades22 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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corporativas; representantes da sociedade em geral; gestores do SUS de outros nveis de governo e de outras unidades da federao (estados e municpios). Nesse sentido, merecem destaque os conselhos nacionais de representao dos gestores estaduais (CONASS) e municipais (CONASEMS), as comisses intergestores tripartite (CIT) e bipartite (CIB) e os Conselhos de Sade, que integram a estrutura decisria no SUS. A atuao tcnica do gestor do SUS permanentemente permeada por variveis polticas se consubstancia atravs do exerccio das funes gestoras na sade, que podem ser definidas como um conjunto articulado de saberes e prticas de gesto necessrios para a implementao de polticas na rea da sade, exercidas de forma coerente com os princpios do sistema pblico de sade e da gesto pblica. A legislao do SUS e diversas normas e portarias complementares, editadas nos anos 90, empreenderam esforos no sentido de definir e diferenciar o papel dos gestores da sade nas trs esferas de governo.

3.3. O PROCESSO DE IMPLANTAO DO SUSO SUS vem passando, desde sua instituio pela Lei Orgnica de 1990, por importantes mudanas, entre as quais pode-se destacar o significativo avano obtido na sua universalizao, principalmente em decorrncia de importante processo de descentralizao de responsabilidades, atribuies e recursos da esfera federal para estados e municpios. Uma das dimenses relevantes desse processo diz respeito tentativa de definio do papel de cada esfera de governo no SUS, que se d com intensos debates e conflitos, tendo em vista o carter ainda recente do processo de democratizao no Brasil, a marcante heterogeneidade poltica, econmica e social no pas, as caractersticas do federalismo brasileiro e as intensas transformaes pelas quais o Estado brasileiro vem passando nas diversas reas da poltica, no contexto de uma economia globalizada. Esse processo tem sido orientado por Normas Operacionais do SUS, institudas por meio de portarias ministeriais. Essas normas definem as competncias de cada esfera de governo e as condies necessrias para que estados e municpios possam assumir as novas posies no processo de implantao do SUS. Embora o instrumento formal seja uma portaria do Ministro da Sade, seu contedo definido de forma compartilhada entre o Ministrio e os representantes do Conselho de Secretrios Estaduais de SadeUERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 23

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(CONASS) e do Conselho de Secretrios Municipais de Sade (CONASEMS). Para tanto, foram criadas instncias de negociao, sendo uma em nvel nacional, a CIT com representao do MS, do CONASS e do CONASEMS e, em cada estado, uma CIB, com representao da Secretaria Estadual de Sade e do Conselho Estadual de Secretrios Municipais de Sade COSEMS. Desde o incio do processo de implantao do SUS, foram publicadas quatro Normas Operacionais Bsicas (NOB-SUS 1991; NOB-SUS 1992; NOB-SUS 1993 e NOB-SUS 1996). Em 2001 foi publicada a Norma Operacional da Assistncia Sade (NOAS-SUS/01). Ao analisarmos esse processo, importante destacar que, como descrito anteriormente, o Sistema nico de Sade comeou a ser implantado por meio de uma estratgia que buscou dar carter universal cobertura das aes de sade, at ento proporcionada pelo INAMPS para seus beneficirios. No final da dcada de 80, o setor pblico de assistncia sade mantinha uma estreita relao com o INAMPS, que a partir de 1990 passou a integrar a estrutura do Ministrio da Sade e que j vinha, nos ltimos anos, participando de modo significativo do seu financiamento. De qualquer modo, o oramento do INAMPS era muito superior ao oramento total do Ministrio da Sade. Em 1990, o oramento anual final do INAMPS foi de Cr$ 657.098.822.000,00 enquanto que o oramento do MS foi de Cr$ 181.931.285.000,00. Ou seja, o oramento do INAMPS era 3,5 vezes maior que o oramento do MS. Fica evidente que o SUS se inicia com uma forte dependncia dos recursos oriundos do INAMPS. Considerando-se essa relao e a continuidade da participao do Ministrio da Previdncia no financiamento do INAMPS, este inicialmente preservado e se constitui no instrumento para assegurar a continuidade, agora em carter universal, da assistncia mdico-hospitalar a ser prestada a populao. O INAMPS somente foi extinto atravs da Lei n 8.689, de 27 de julho de 1993, portanto quase trs anos aps a promulgao da lei que instituiu o SUS. Nesse perodo observa-se a concomitncia do INAMPS e do SUS. Ao se incorporar o INAMPS ao MS, incorporou-se tambm sua lgica de financiamento e de alocao de recursos financeiros. Dessa forma, o SUS inicia sua atuao na rea da assistncia sade com carter universal, utilizando uma instituio que tinha sido criada e organizada para prestar assistncia a uma parcela especfica da populao.24 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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Ou seja, adotou-se como estratgia para a implantao do SUS a universalizao do INAMPS. Vrias foram as conseqncias dessa preservao: a manuteno de uma Tabela Nacional de Procedimentos e sua utilizao como instrumento de financiamento, pelo MS, de servios e aes de sade executadas por estados e municpios; o processamento das informaes e dos pagamentos realizados de modo centralizado; a realizao de auditoria federal em prestadores de servios, j sob a gesto dos estados; a conservao do modo de relao com mdicos autnomos (tipo 7), etc. Mas uma das mais importantes conseqncias foi, no incio da implantao do SUS, o estabelecimento, pelo MS, de limites fsicos e financeiros para as Unidades Federadas na lgica do INAMPS e que garantiria a manuteno da situao at ento vigente. Ou seja, o SUS no adota uma lgica prpria para distribuio dos recursos financeiros destinados a custear a assistncia sade de toda a populao, o que significaria grande remanejamento de recursos entre os estados. A primeira alocao de recursos feita em 1991, pelo MS, agora gestor federal do SUS, baseou-se fundamentalmente nos gastos do INAMPS e carregou consigo imensa desigualdade na diviso dos recursos entre os estados, pois, agora, a assistncia passava a ter carter universal. Isto se evidencia nas Portarias n 19 e 20, de 08/01/91, do Secretrio Nacional de Assistncia Sade do MS, que poca acumulava a Presidncia do INAMPS. Como se pode verificar na Tabela 2, no estabelecimento do limite de recursos para a assistncia hospitalar (Portaria n. 19), foram definidos quantitativos de AIH diferenciados entre os estados, que variavam de 5,0 internaes para cada 100 habitantes/ano (estado de Roraima), at 12,84 para o estado do Tocantins, com uma mdia Brasil de 10,05. Claro est que essa distribuio no se baseava nas necessidades de assistncia hospitalar das respectivas populaes e sim na srie histrica de gastos do INAMPS. Nessa portaria so definidos quantitativos de AIH acima da mdia nacional, para os estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, So Paulo, Gois, Paraba, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paran e Tocantins. Constata-se que entre os onze estados esto os trs da Regio Sul, trs dos quatro da Regio Sudeste, trs da Regio Centro-Oeste e apenas um da Regio Nordeste e um da Regio Norte.UERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 25

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Tabela 2 Distribuio do Quantitativo de AIH por UF (Brasil, 1991)

Fonte: Portaria n 19, de 08 de janeiro de 1991, do Secretrio Nacional de Assistncia Sade do Ministrio da Sade, que poca acumulava a Presidncia do INAMPS.

Alm da diferena quanto ao quantitativo de AIH, o volume de recursos por estado variava tambm em funo do custo mdio da AIH, que depende do nvel de concentrao de recursos assistenciais de maior tecnologia, presentes em maior proporo nos estados mais ricos. A Portaria n 20, ao estabelecer o limite de recursos para a assistncia ambulatorial, define valores diferenciados de Unidade de Cobertura

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Ambulatorial (UCA) para os diversos estados, baseados tambm, dentre outros critrios, em capacidade instalada e srie histrica de gasto realizado pelo INAMPS. O valor da UCA variava entre CR$ 1.200,00 e CR$ 3.200,00, ou seja, uma variao de 266,66%. Com o menor valor (CR$ 1.200,00) se encontravam todos os estados da Regio Norte (TO, RO, AP, AC, PA, RR e AM), trs estados da Regio Nordeste (PI, SE e MA) e dois estados da Regio Centro-Oeste (MT e MS). Com valores intermedirios, tnhamos: CR$ 1.600,00 (PE, PB, SC e MG); CR$ 2.000,00 (ES, BA, AL, RN e DF); CR$ 2.400,00 (GO, RJ, CE e PR). E com os maiores valores, os estados do Rio Grande do Sul, com CR$ 2.800,00, e So Paulo, com CR$ 3.200,00. Tambm em janeiro de 1991, o Presidente do INAMPS, por meio da Resoluo n. 258, institui a Norma Operacional Bsica do SUS NOB/ SUS 91, que trata da nova poltica de financiamento do Sistema nico de Sade SUS para 1991. importante destacar dois aspectos: o fato de esse primeiro ato normativo da implantao do SUS ser assinado pelo presidente do INAMPS, embora o INAMPS j tivesse sido transferido para o Ministrio da Sade e, com a provao da Lei n 8.080, o mesmo no ser mais o responsvel pela assistncia sade, e que esse se refira especificamente ao financiamento, embora fosse apenas para aquele ano. Santos (1991) critica severamente o papel assumido pelo INAMPS no financiamento do SUS e na sua normatizao: O INAMPS revigora a poltica do centralismo federal, ou seja, considera como (sua) a competncia para prestar servios de assistncia mdico-hospitalar (ainda que a Constituio Federal e a Lei Orgnica da Sade tenham disposto de forma diferente) e d um crdito de confiana aos Municpios e Estados para executarem servios seus. de se mencionar, tambm, que no h mais como alocar recursos para servios de assistncia sade no oramento do INAMPS, uma vez que no lhe cabe mais prestar servios. Em julho do mesmo ano, o Secretrio Nacional de Assistncia Sade, que poca acumulava a Presidncia do INAMPS, por meio da Resoluo n. 273, reedita, com alteraes, a Norma Operacional Bsica do SUS (NOB-SUS 91). Vale destacar que, enquanto nos considerandos da primeira verso s se fazia referncia aos fundamentos legais, nessa verso se acrescenta: Considerando propostas do CONASS, CONASEMS e outros setores da sociedade organizada que atuam na rea da sade como profissionais, prestadores de servios e usurios. Assim, pode-se

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concluir que o processo de negociao para estabelecimento dessas normas j est presente desde ento, embora v progressivamente se tornando mais orgnico. Segundo Levcovitz (1997), a NOB-SUS 01/91 iniciou uma nova fase na relao do governo federal com os municpios. Afirma: Diferentemente do que ocorreu sob o SUDS, agora o espao de atuao dos estados foi sensivelmente diminudo, em favor de um relacionamento mais direto entre o Governo federal e municpios. Ao determinar o repasse direto de verbas pelo MS/INAMPS aos municpios, atravs do SIA/SUS e do SIH/ SUS, a NOB-SUS 01/91 desarticulou a funo gestora dos estados. A deciso trouxe graves conseqncias para uma adequada diviso de poderes entre os estados e municpios, que persistem at hoje. Este importante papel assumido pelo INAMPS no incio da implantao do SUS e que, como procuraremos demonstrar, continuou ao longo dos anos seguintes, pode ter dois motivos: 1 . a falta de um projeto operacional para o novo sistema. Esta constatao nos leva a supor que toda a mobilizao poltica se esgotou na elaborao da proposta para a Constituio Federal e para a Lei n 8.080. Este fato pode ter sido motivado pelo papel que j era desempenhado pelo SUDS, na perspectiva de unificao e universalizao do sistema e pelo entendimento de que sua consolidao significaria a implantao do SUS; 2 . a perspectiva de manter a utilizao dos recursos financeiros do INAMPS no financiamento do novo sistema. Embora tenha-se conseguido inicialmente este objetivo, o mesmo se frustra a partir de 1993, embora a influncia do modelo operacional e de financiamento do INAMPS persista nos anos seguintes. Em 1992, pela primeira vez, o MS definiu essas normas e iniciou um processo de tentativa de distino entre o SUS e o INAMPS. O Secretrio Nacional de Assistncia Sade, que poca ainda acumulava a Presidncia do INAMPS, em 07/02/92, por meio da Portaria n 234, edita a Norma Operacional Bsica do Sistema nico de Sade para 1992 (NOB-SUS/92). Essa NOB, que normalmente nem referida quando se descreve a implantao do SUS, praticamente repete as duas verses da NOB-SUS 01/91. Mesmo com a manuteno do INAMPS e de toda sua lgica de financiamento, na sua introduo se afirma: H de ser compreendido que o SUS no sucessor do SUDS ou do INAMPS, nem um novo rtulo para um produto velho. Ele um sistema inteiramente novo e diferente de28 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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tudo que se disps at hoje no Brasil. A questo que fazer tal afirmativa no resolve o problema criado com a deciso poltica de adotar a lgica de financiamento e a estrutura operacional do INAMPS como base para a implantao do SUS. No seu item 2, O Financiamento do SUS Assistncia Sade, a NOB-SUS 92 estabelece: A partir do corrente exerccio, tais recursos estaro alocados no Fundo Nacional de Sade, permanecendo o INAMPS, ainda, mas to-somente, neste ano de 1992, atuando como via de repasse aos estados, Distrito Federal e municpios. Aqui se evidencia o dilema vivido pelos gestores federais do SUS, poca, de conseguir implantar um sistema novo sobre as velhas estruturas remanescentes do INAMPS. No subitem 2.1.2, do item 2.1, Financiamento das Atividades Hospitalares, define que o quantitativo de Autorizao de Internao Hospitalar AIH, ser proporcional populao.... Porm, pelo menos do ponto de vista formal, esta deciso no foi posta em prtica. No subitem 2.2.3, do item 2.2, Financiamento das Atividades Ambulatoriais, estabelece que a Unidade de Cobertura Ambulatorial (UCA), destinada a definir os valores a serem repassados aos estados, Distrito Federal e municpios, fixada atravs de Resoluo da Secretaria Nacional de Assistncia Sade/MS, considerando a classificao dos estados dentro dos seguintes critrios: populao, capacidade instalada, complexidade da rede, desempenho financeiro em 1991 e desempenho da auditoria estadual no ano anterior. Estabelece os critrios para repasse dos recursos para os municpios, nos seguintes termos: Para receberem os recursos, de forma regular e automtica, para a cobertura das aes e servios de sade, conforme estabelecido na Lei n 8.242/90, os municpios devero contar com: FUNDO MUNICIPAL DE SADE de natureza contbil e financeira, a ser previamente autorizado pelo Poder Legislativo, gerido pela Secretaria Municipal de Sade ou rgo equivalente e fiscalizado pelo Conselho Municipal de Sade. CONSELHO MUNICIPAL DE SADE deve ter carter deliberativo, com composio paritria de representantes do governo, prestadores de servio e profissionais de sade (50%) e usurios (50%). Cabe aos Conselhos a aprovao dos Planos Municipais de Sade, bem como atuar na formao de estratgias de controle da execuo da poltica de sade.UERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 29

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PLANO MUNICIPAL DE SADE ser a base das atividades e programao da Secretaria Municipal de Sade e seu financiamento ser previsto na proposta oramentria da Secretaria. RELATRIOS DE GESTO devero permitir o acompanhamento, pelo Ministrio da Sade, atravs de seu sistema de auditoria, do executado em relao programao aprovada da aplicao dos recursos repassados ao municpio. CONTRAPARTIDA DE RECURSOS PARA A SADE NO RESPECTIVO ORAMENTO deve ser comprovada pela publicao, no Dirio Oficial do Municpio, da destinao global oramentria. recomendvel que se observe a evoluo dos recursos destinados sade no oramento do municpio e que se estabelea uma meta a ser alcanada de, aproximadamente, 10% do oramento. COMISSO DE ELABORAO DO PLANO DE CARREIRA, CARGOS E SALRIOS (PCCS), previsto o prazo de dois anos para a sua implantao. Ainda conforme a NOB-SUS 01/91, cabe ao estado controlar a manuteno do cumprimento de tais quesitos, podendo at, em casos extremos, solicitar a resciso do Convnio de Municipalizao (grifo nosso). Aqui se explicita uma contradio, ao se utilizar o convenio como instrumento de implantao de um direito e dever do municpio, definido na Constituio Federal. Por outro lado, fica evidente a tentativa de obter a participao dos municpios no financiamento do SUS, o que no se concretiza, pelo menos no que se refere explicitao desses valores. Em 20 de maio de 1993, o Ministro da Sade assina a Portaria MS n. 545, que estabelece normas e procedimentos reguladores do processo de descentralizao da gesto das aes e servios de sade, atravs da NOB-SUS 01/93. Na apresentao, diz: a transformao do sistema de sade no comporta rupturas bruscas que desorganizem as prticas atuais antes que se instaurem novas, impondo, por isso, um perodo de transio no qual medidas de carter inovador devem ser institudas em todos os estados e municpios em intensidade compatvel com sua prpria vontade e capacidade de absoro de responsabilidades gerenciais e polticas, de modo a evitar soluo de continuidade na ateno sade da populao. Aqui parece se assumir a dificuldade de abandonar a estrutura e a lgica do INAMPS como base para a implantao do SUS. Essa NOB, pela primeira vez, estabelece critrios para a definio de tetos financeiros por estado, separando recursos ambulatoriais e30 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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hospitalares, e prev repasse desses recursos mensalmente, mas no estabelece o mecanismo. Este s foi criado por meio do4 Decreto n. 1.232, em agosto de 1994, que dispe sobre as condies e formas de repasse regular e automtico de recursos do Fundo Nacional de Sade para os fundos estaduais, municipais e do Distrito Federal. Com relao ao Gerenciamento do processo de descentralizao, a NOB-SUS 01/93 inova, ao instituir as Comisses Intergestores Tripartite e Bipartite como espaos formais de pactuao poltica. No item 4, estabelece as condies de gesto, sendo para os municpios: condio de gesto incipiente, condio de gesto parcial e condio de gesto semiplena. E para os estados estabelece: condio de gesto parcial e condio de gesto semiplena. Porm a manuteno do INAMPS e de sua lgica de financiamento no evitou que, a partir de maio de 1993, portanto pouco antes da sua extino (em 27 de julho de 1993), o Ministrio da Previdncia Social deixasse de repassar para o Ministrio da Sade recursos da Previdncia Social (ou seja, produto do recolhimento com base na folha salarial), criando enorme defasagem entre a nova responsabilidade constitucional e a disponibilidade oramentria. Para que se possa ter idia do significado dessa medida, vale apresentar os valores da execuo oramentria do MS em 1992. O valor total do oramento executado pelo MS naquele ano foi de Cr$ 30.909.149.340.100,00, sendo Cr$ 23.175.035.438.000,00 pelo INAMPS e por toda a administrao direta do MS. INAN, CEME, FUNASA e FIOCRUZ executaram os Cr$ 7.734.113.802.100,00 restantes. Ou seja, o oramento do INAMPS naquele ano correspondia a aproximadamente 75% do oramento total do MS. Do oramento total do INAMPS, Cr$ 11.379.749.421.000,00 tinham como fonte a transferncia do MPAS, ou seja, aproximadamente 50%. Dessa forma, a suspenso do repasse de recursos por parte do MPAS significou reduo do oramento do INAMPS metade e uma reduo do oramento do MS em mais de 36%. Os anos seguintes foram de grandes dificuldades para o SUS, pela falta de recursos e de definio de fontes alternativas para financiamento. Essa situao s comeou a ser resolvida a partir de 1997, com a aprovao da Lei n 9.311, de outubro de 1996, que instituiu a CPMF. O perodo de grave crise no financiamento marcou o processo de implantao do SUS, principalmente a postura de estados e municpios, que assim buscaram manter uma relao de compra e venda de servios com o Ministrio da Sade como forma de garantir a continuidade doUERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 31

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financiamento. Sendo estados e municpios prestadores de servios para o Ministrio da Sade, este estaria obrigado a financiar a prestao de servios. Desta forma, mesmo extinto, o INAMPS servia como modelo para o financiamento do novo sistema. importante referir que essa manuteno no se deu por imposio do MS, mas pela necessidade, sentida por estados e municpios, de obter garantia na continuidade do financiamento iniciado pelo INAMPS por meio do SUDS. Em outubro de 1994, o Ministro da Sade publicou a Portaria n. 1.827, determinando Secretaria de Assistncia Sade (SAS) que definisse os tetos financeiros de cada estado relativos ao custeio das atividades de assistncia ambulatorial e hospitalar. A SAS definiu a alocao de R$ 7.042.722.456,00 para assistncia sade, estabelecendo, em uma portaria para cada estado (Portarias de n. 172 a 198, de 31 de outubro de 1994), o respectivo teto financeiro (Tabela 3). Essa portaria, no pargrafo primeiro, do artigo primeiro, define: Os tetos financeiros sero utilizados para a cobertura das atividades hospitalares (SIH/SUS) e ambulatoriais, incluindo o fornecimento de ciclosporina e eritopoitina, rteses e prteses ambulatoriais (SIA /SUS); programa de agentes comunitrios; programa de interiorizao e programa de sade da famlia. Portanto, esses recursos eram tambm destinados para cobrir as despesas com aes que atualmente so definidas como de Ateno Bsica.

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Tabela 3 Limites financeiros anuais e respectivo valor per capita por UF (Brasil, 1994)

Fonte: Portarias SAS de n 172 a 198, de 31 de outubro de 1994.

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Pode-se observar que esta definio preserva a lgica dos gastos realizados pelo INAMPS e, por conseqncia, da capacidade instalada. Assim, os menores valores per capita continuam sendo os dos estados do Norte e do Nordeste, sendo o do Acre e do Amap, com R$ 25,00; seguidos do Amazonas, com R$ 26,84; de Roraima, com R$ 27,49 e de Sergipe, com R$ 28,66 (Tabela 3). Por outro lado, os maiores per capita so os dos estados do Sul e do Sudeste, sendo: So Paulo (R$ 57,78); Paran (R$ 53,18); Rio de Janeiro (R$ 51,78); Minas Gerais (R$ 46,88) e Santa Catarina (R$ 44,73). Aqui merece destaque o Distrito Federal, com o terceiro maior per capita entre os estados (R$ 52,55) (Tabela 3). A Tabela 4 apresenta um comparativo entre a distribuio dos recursos e de populao, por regio, em 1994.Tabela 4 Limites financeiros anuais e respectivo valor per capita por regio (Brasil, 1994).

Fonte: Portarias SAS de n 172 a 198, de 31 de outubro de 1994.

Constata-se que as Regies Sudeste e Sul recebem recursos numa proporo bem maior que sua populao e que assim, enquanto o valor per capita do Brasil de R$ 45,81, o da Regio Sudeste de R$ 52,89 e o da Regio Sul de R$ 50,42, enquanto o valor per capita da Regio Norte de apenas R$ 29,66 e da Regio Nordeste de R$36,87 (Tabela 4). Durante o ano de 1995 foram feitas algumas alteraes nos tetos financeiros dos estados, resultando num total de R$ 7.080.125.352, com um per capita nacional de R$ 45,44 (Tabela 5), sem alterao significativa na distribuio de recursos. Em 6 de novembro de 1996, o Ministro da Sade baixa a Portaria n. 2.203, que institui a Norma Operacional Bsica do Sistema nico de Sade (NOB-SUS 96).

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Quanto ao financiamento, a NOB-SUS 96 estabelece, no item 10 (Financiamento das Aes e Servios de Sade), no subitem 10.3 (Transferncias Intergovernamentais e Contrapartidas): as transferncias, regulares ou eventuais, da Unio para estados, municpios e Distrito Federal esto condicionadas contrapartida destes nveis de governo (grifo nosso), em conformidade com as normas legais vigentes. Mais uma vez se registra a tentativa de contar com a participao de estados e municpios no financiamento do SUS. E mais uma vez no se obtm sucesso, pelo menos quanto explicitao dos valores. No subitem 10.4 (Tetos Financeiros dos Recursos Federais), estabelece: Os recursos de custeio da esfera federal, destinados s aes e servios de sade, configuram o Teto Financeiro Global (TFG), cujo valor, para cada estado e cada municpio, definido com base na PPI (Programao Pactuada Integrada). O teto financeiro do estado contm os tetos de todos os municpios, habilitados ou no a qualquer uma das condies de gesto. O Teto Financeiro Global do Estado (TFGE) constitudo, para efeito desta NOB, pela soma dos Tetos Financeiros da Assistncia (TFA), da Vigilncia Sanitria (TFVS) e da Epidemiologia e Controle de Doenas (TFECD). No item 12 (Custeio da Assistncia Hospitalar e Ambulatorial), institui o Piso Assistencial Bsico (PAB), que, como detalharemos mais adiante, se constitui na primeira grande mudana na lgica de alocao de recursos federais. No item 15, estabelece as condies de gesto do municpio em Gesto Plena da Ateno Bsica e Gesto Plena do Sistema Municipal. No item 16, estabelece as condies de gesto do estado em Gesto Avanada do Sistema Estadual e Gesto Plena do Sistema Estadual. Com relao s condies de gesto, tanto de estados quanto de municpios, pretende concluir o processo de transio, ao abandonar condio incipiente e semi para adotar o conceito de gesto plena. Todo o ano de 1997 foi consumido pela negociao do MS com estados e municpios, tendo como espao as reunies da CIT. O principal ponto desse longo processo de negociao foi a definio do valor per capita a ser adotado para o PAB, j que estados e municpios pretendiam obter o maior volume possvel de recursos federais novos a serem somados queles que j eram gastos por meio da remunerao da prestao de servios, tendo por base a tabela do SIA. Apenas a partir de maro de 1998, com a edio da Portaria n 2.121/ GM, implantado o Piso da Ateno Bsica (PAB) e, em decorrncia,

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d-se a subdiviso dos recursos federais transferidos para estados e municpios para o custeio da assistncia em Ateno Bsica e Assistncia de Mdia e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar. O PAB de cada municpio, que calculado tendo por base um valor per capita, transferido de forma automtica fundo a fundo, mudando a forma anterior de financiamento por prestao de servios e passando para uma lgica de transferncia de recursos em troca de o municpio assumir a responsabilidade sanitria por esse nvel de ateno. Vale destacar que, enquanto os recursos do PAB fixo so transferidos tendo por base o valor per capita, o valor do PAB varivel depende da adeso do municpio a programas prioritrios definidos pelo Ministrio da Sade, tais como os Programas de Agentes Comunitrios de Sade, de Sade da Famlia e de Combate s Carncias Nutricionais e a aes estratgicas, como a Farmcia Bsica e as Aes Bsicas de Vigilncia Sanitria. Com a Portaria GM/MS n 2.121 (maro de 1998), o Ministrio da Sade concretizou o primeiro e significativo passo para a construo de um sistema de sade que no se reduzisse apenas a um componente de assistncia mdica e para avanar na reduo das desigualdades regionais quanto distribuio dos recursos. Ou seja, a partir desse ato, se inicia o processo de rompimento com o modelo do SUDS e se d um passo significativo na implantao do SUS. Porm, no que se refere assistncia de mdia e alta complexidades, ainda continuou o processo de aperfeioamento do SUDS. A existncia, em 1996 portanto, no momento da instituio do PAB de 582 municpios que no recebiam recursos federais para as aes e servio de sade comprova esta afirmativa. Tambm para reforar essa afirmativa, basta comparar o valor per capita efetivamente aplicado em 1997, por estado, nos procedimentos que passaram a constituir o PAB com o valor per capita do PAB (fixo mais varivel) em vigor em 1998, apresentado na Tabela 5.

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Tabela 5 Teto financeiro anual e valor per capita - ateno bsica (Brasil, 1997 e 1998)

Fonte: SE/MS.

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Pode-se observar que o incremento no per capita ocorrido entre 1997 e 1998, enquanto na mdia do Brasil foi de 34,72%, chegou a ser negativo no Paran (-1,71%) e abaixo da mdia para Minas Gerais, Mato Grosso, So Paulo, Piau e Rio de Janeiro. Por outro lado, os maiores percentuais de aumento foram: Bahia (116,71%); Par (109,03%) e Esprito Santo (106,80%). Estes ocupavam posies desvantajosas nos limites financeiros para a assistncia estabelecidos em 1994 (17, 20 e 21 valor per capita).Tabela 6 Teto financeiro anual e valor per capita da ateno bsica, por uf (Brasil, 1998) (Em R$ 1,00)

Fonte: Portarias/MS.

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Ao analisarmos a Tabela 7, podemos observar que, em valores absolutos, em 1998 os maiores per capita do PAB so os dos estados do Nordeste, que historicamente recebiam menos recursos federais que os estados das regies Sul e Sudeste: Piau (R$17,28), Sergipe (R$ 17,28), Cear (R$ 17,15), Alagoas (R$17,01), Pernambuco (R$ 16,47), Maranho (R$ 16,06). Os menores valores per capita so: So Paulo (R$ 11,31), Rio de Janeiro (R$ 11,69) e Rio Grande do Sul (R$ 11,91). Isto significa um avano, j que os estados mais pobres passam a receber mais recursos para a ateno bsica. A Tabela 7 apresenta a evoluo dos valores per capita da Ateno Bsica no perodo de 1997 a 2001, classificando segundo percentual de crescimento.Tabela 7 Evoluo dos valores per capita da ateno bsica por UF (Brasil, 1997 a 2001)

Fonte: SE/MS.

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Na tabela acima est demonstrado que os estados com maiores percentuais de incremento no perodo foram: Acre (295,09%), Bahia (219,74%), Par (209,64%) e Tocantins (205,10%). Os estados do Paran (29,51%) de So Paulo (38,81%), Minas Gerais (40,59%) tiveram, no mesmo perodo, os menores incrementos. A Portaria GM n. 1.399, de 15 de dezembro de 1999, regulamenta a NOB-SUS 01/96, no que se refere s competncias da Unio, estados, municpios e Distrito Federal, na rea de epidemiologia e controle de doenas, alm de definir a sistemtica de financiamento. No ano 2000 o Ministrio da Sade, atravs da FUNASA, comeou a implementar o processo de descentralizao dessa rea. Com esse processo de descentralizao, concludo no final do ano 2000, pelo menos para os estados, em 2001 passou a existir o teto financeiro para os estados para o financiamento da Vigilncia Epidemiolgica e Controle de Doenas. Assim, a partir de junho de 2001, o volume de recursos anuais do Ministrio da Sade para os estados para o desenvolvimento de aes e servios de sade passou a ser subdividido em: recursos para a ateno bsica (PAB Fixo e PAB Varivel); recursos para a vigilncia epidemiolgica e controle de doenas; recursos para a assistncia de mdia complexidade; recursos para a assistncia de alta complexidade. Esses recursos federais, que, estima-se, correspondem a mais de 70% do total, progressivamente vm sendo repassados a estados e municpios, atravs de transferncias diretas do Fundo Nacional de Sade aos fundos estaduais e municipais, conforme mecanismo institudo pelo Decreto n 1.232, de 30 de agosto de 1994. Como j citamos, no incio o SUS teve como principal fonte de financiamento os recursos da Previdncia Social, por meio do oramento do INAMPS, que perdurou at maio de 1993. A partir da, o SUS entrou numa grave crise de financiamento, que s comeou a ser resolvida com a aprovao da Contribuio Provisria sobre Movimentao ou Transmisso de Valores e de Crditos e Direitos de Natureza Financeira (CPMF), em outubro de 1996, com a Lei n. 9.311. O art. 18 da lei estabelece: O produto da arrecadao da contribuio de que trata esta lei ser destinado integralmente ao Fundo Nacional de Sade, para financiamento

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das aes e servios de sade, sendo que sua entrega obedecer aos prazos e condies estabelecidos para as transferncias de que trata o art. 159 da Constituio federal. Em setembro de 2000, foi aprovada a Emenda Constitucional 29 (EC29), que determina a vinculao de receitas dos trs nveis para o sistema e define que at o exerccio financeiro de 2004, a Unio dever aplicar: a) no ano 2000, o montante empenhado em aes e servios pblicos de sade no exerccio financeiro de 1999 acrescido de, no mnimo, cinco por cento; b) do ano 2001 ao ano 2004, o valor apurado no ano anterior, corrigido pela variao nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Os estados e Distrito Federal devero aplicar doze por cento do produto da arrecadao dos impostos, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos municpios. Os municpios e o Distrito Federal devero aplicar quinze por cento do produto da arrecadao dos impostos. Define ainda que os estados, o Distrito Federal e os municpios que apliquem percentuais inferiores aos fixados devero elev-los gradualmente at o exerccio financeiro de 2004, reduzida a diferena razo de, pelo menos, um quinto por ano, sendo que, a partir de 2000, a aplicao ser de pelo menos sete por cento. Por fim, a EC 29 estabelece que os recursos dos estados, do Distrito Federal e dos municpios destinados s aes e servios pblicos de sade e os transferidos pela Unio para a mesma finalidade sero aplicados por meio de Fundo de Sade, que ser acompanhado e fiscalizado pelo Conselho de Sade, sem prejuzo do disposto no art. 74 da Constituio federal. Os recursos federais vm progressivamente sendo repassados, atravs de transferncias diretas do Fundo Nacional de Sade, aos fundos estaduais e municipais, conforme mecanismo institudo pelo Decreto n 1.232. A intensa habilitao de municpios e estados, a partir da NOBSUS 96, gerou expressivo aumento dessas transferncias, fazendo com que, em dezembro de 2001, a maior parte dos recursos da assistncia j fosse transferida nessa modalidade, em contraposio predominncia de pagamento federal direto aos prestadores de servios (Quadro 1).

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Quadro 1 Indicadores de evoluo da descentralizao no SUS - posio no final de cada exerccio 1997/2001

Fonte: Ministrio da Sade Dados de Habilitao SAS/SPS (1997/2001).

Alm das transferncias do Fundo Nacional de Sade, os fundos estaduais e municipais recebem aportes de seus prprios oramentos. Alguns estados promovem repasses de recursos prprios para os fundos municipais de sade, de acordo com regras definidas no mbito estadual. Quanto aos gastos com fonte nos oramentos estaduais e municipais, no se dispe de dados exatos, por se manter, at os dias atuais, prtica semelhante poca do INAMPS, nos moldes das Aes Integradas de Sade (AIS) e do SUDS, de se programar a aplicao apenas de recursos de origem federal. Essa resistncia de estados e municpios, em programar a aplicao dos seus recursos financeiros para a assistncia sade, faz com que se reforce a idia de que se tenha desenvolvido nos ltimos anos um processo que mais significou um aperfeioamento do SUDS do que de efetiva implantao do SUS. A esfera federal ainda a responsvel pela maior parcela do financiamento do SUS, embora se estime que a participao dos municpios venha crescendo ao longo dos ltimos anos, e haja a perspectiva de que a parcela dos recursos estaduais no financiamento do sistema aumente significativamente, em decorrncia da aprovao da EC-29. O pagamento aos prestadores de servios de sade feito pela esfera de governo responsvel por sua gesto. Vale destacar que, aps mais de dez anos do incio da implantao do SUS, o MS ainda realiza pagamento direto a prestadores de servios. Independentemente da esfera de governo que execute o pagamento, o SUS utiliza um mesmo sistema de informaes para os servios ambulatoriais o Sistema de Informaes Ambulatoriais (SIA/SUS) 42 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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e outro para os servios hospitalares o Sistema de Informaes Hospitalares (SIH/SUS). No caso especfico das internaes hospitalares, embora o pagamento pelos servios prestados esteja, numa proporo significativa, descentralizado para o nvel de governo responsvel por sua gesto, o processamento das informaes relativas a todas as internaes financiadas pelo Sistema Pblico de Sade realizado de forma centralizada pelo Departamento de Informtica do SUS (DATASUS), rgo do Ministrio da Sade. Do mesmo modo, todo o sistema pblico utiliza uma nica tabela de preos, definida pelo MS, para o pagamento aos prestadores de servios. Vale destacar que essa tabela ainda utilizada como instrumento de definio dos valores a serem transferidos do Ministrio da Sade para alguns estados. Essa prtica um dos elementos fundamentais de preservao da lgica do SUDS em plena vigncia do SUS. Em que pesem as divergncias quanto diviso de poder entre as esferas de governo, a tendncia que os municpios assumam cada vez mais a responsabilidade pelo relacionamento com os prestadores de servio, medida que se habilitem na condio de gesto plena do sistema. A norma em vigor (NOAS-SUS 01/01), instituda pelo MS (cujos objetivos e mecanismos de elaborao sero de detalhadas mais adiante), define duas condies de participao do municpio na gesto do SUS: a) Gesto plena da ateno bsica ampliada, pela qual o municpio se habilita a receber um montante definido em base per capita para o financiamento das aes de ateno bsica; e b) Gesto plena do sistema municipal, pela qual o municpio recebe o total de recursos federais programados para o custeio da assistncia em seu territrio. Apesar do incremento das habilitaes de estados e municpios, e do conseqente aumento do volume de recursos repassados diretamente aos fundos de sade subnacionais, um tero dos recursos federais ainda empregado em pagamentos diretos a prestadores de servios de sade. Tal situao decorre do processo de contratao e pagamento centralizado que vigorou durante o perodo do INAMPS, que antecedeu a implementao do SUS e, em certa medida, ainda no foi plenamente substitudo pelo processo de descentralizao, dado o carter no-compulsrio e progressivo deste, que refora a idia da influncia da estrutura do INAMPS sobre o SUS.UERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 43

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A NOB-SUS - 01/96, na tentativa de definir o papel de cada um dos gestores nas trs esferas de governo e induzir divises de responsabilidades que facilitem a organizao do SUS, props inicialmente que o gestor do sistema municipal fosse o responsvel pelo controle, avaliao e auditoria dos prestadores de servios de sade (estatais ou privados) situados no seu municpio. Com relao aos estados, a NOB-SUS - 01/96 definiu, como uma de suas responsabilidades nucleares, a mediao das relaes entre os sistemas municipais, ou seja, a gesto do sistema estadual de sade. Embora a NOB/SUS 01/96 tenha inicialmente proposto uma definio para as responsabilidades de gesto dos nveis de governo, em decorrncia da impossibilidade de se chegar a um consenso com as representaes dos Secretrios Estaduais e Municipais de Sade, atribuiu s Comisses Intergestores Bipartites de cada estado a prerrogativa de, excepcionalmente, definir outra diviso de responsabilidades entre esses gestores. A ocorrncia de pactos de gesto variados nos estados brasileiros identificada, atualmente, como um problema para a organizao do SUS. Em alguns casos, os pactos so desorganizativos, ocasionam conflitos permanentes entre os gestores estadual e municipal, levando ao rompimento do princpio do comando nico sobre o sistema em cada nvel de governo. Nesse sentido, uma definio clara das responsabilidades de cada esfera de governo, no contexto da implementao do processo de regionalizao desencadeado pela publicao da NOAS-SUS 01/01, fundamental para a consolidao do SUS. Para o xito da estratgia da regionalizao, cada esfera de governo dever desempenhar suas responsabilidades operacionais e de gesto de forma harmnica e cooperativa. Desse modo, ser possvel avanar na superao dos desafios enfrentados na construo do SUS e garantir populao brasileira uma ateno sade de qualidade, de modo a cumprir o que determina a Constituio Brasileira de 1998.

3.4. NOB 96 OS AVANOS DO PROCESSO DE IMPLANTAO DO SUSPode-se concluir que as NOB de 1991, 1992 e 1993 apresentaram poucos avanos para a real implementao do SUS, que comeou a se efetivar com a NOB 96. O perodo de implementao da NOB-SUS 01/ 96, compreendido entre os anos 1998 a 2000 (as habilitaes na referida norma, no ano 2001, foram residuais), foi marcado por uma srie de importantes avanos do processo de implantao do SUS. Entre os avanos, cabe destacar:44 UERJ - I NSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL

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No mbito do financiamento: a ) a implementao do Piso da Ateno Bsica para o financiamento das aes de ateno bsica desenvolvidas pelos municpios, representando a introduo de uma lgica de financiamento per capita pela primeira vez no SUS; b ) a adoo de incentivos especficos para reas estratgicas e o aumento expressivo de transferncias de recursos do Fundo Nacional de Sade para os Fundos Estaduais e Fundos Municipais de Sade; c) a adoo de critrios para alocao de recursos federais para o custeio das aes e servios de sade que contribussem para a reduo das desigualdades regionais; d ) a realizao de investimentos na rede de servios, com prioridade para as Regies Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Dentre os projetos executados nesse perodo, destaca-se o REFORSUS. O resultado desses avanos demonstrado nas tabelas apresentadas a seguir.Tabela 8 INAMPS x SUS - a superao das desigualdades na distribuio regional dos recursos para a assistncia sade (Brasil, 1986 a 2001)

Fonte: SAS/MS

Comparando-se a distribuio dos recursos do INAMPS por regio, em 1986, com a atual distribuio dos recursos federais, constata-se que houve significativa reduo na desigualdade na distribuio desses recursos entre as regies, com uma aproximao entre os valores repassados e a populao correspondente. Enquanto em 1986 a Regio Norte (com 5,8% da populao do pas) recebia apenas 2,27% do total dos recursos destinados aos estados, emUERJ - INSTITUTO DE MEDICINA S OCIAL 45

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2001 (com 7,5% da populao), recebe 6,46% desse total. Por outro lado, a Regio Sudeste, que em 1986 recebia 59,28% do total dos recursos destinados aos estados, em 2001 recebe 44,38% desse total. A Tabela 9 apresenta o comparativo entre os valores financeiros anuais e respectivos per capita por regio em 1994 e em 2001. Compara ainda o per capita de cada regio com o per capita do Brasil. Enquanto que em 1994, o valor menor per capita, que era da Regio Norte, correspondia a 64,7% do per capita nacional, em 2001 passou a corresponder a 85,8%. Enquanto isso, o valor per capita da Regio Nordeste passou de 80,5% do per capita nacional, em 1994, para 96%, em 2001. Por outro lado, o valor per capita da Regio Sudeste, que em 1994 correspondia a 115% do per capita nacional, em 2001 passou a corresponder a 104,2%. E o valor per capita da Regio Sul, que correspondia a 110,1% do per capita nacional, em 2001 passou a 103,8%.Tabela 9 Comparativo dos limites financeiros anuais, respectivos valores per capita e proporo em relao ao per capita nacional, por regio (Brasil, 1994 a 2001)

Fonte: SAS/MS.

Pode-se verificar, na Tabela 10, o avano na reduo das desigualdades regionais no perodo, quanto a alocao dos recursos federais para as aes e servios de sade. A Regio Norte, com 7,53% da populao, recebe 6,46% dos recursos, e a Regio Sudeste, com 42,58% da populao, recebe 44,38% dos recursos.

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Tabela 10 Limites financeiros anuais, populao e respectivo valor per capita, por regio (Brasil, 2001)

Fonte: SAS/MS.

No mbito do modelo assistencial e da organizao dos servios: a ) a expanso da estratgia de Equipes de Sade da Famlia e de Agentes Comunitrios de Sade; b ) a implementao de experincias inovadoras de ateno no mbito local e avanos, tanto na organizao da ateno bsica como na organizao de redes de referncia em vrios municpios e estados. No mbito da gesto: a ) milhares de municpios foram habilitados de acordo com as condies de gesto da NOB-SUS 01/96, integrando-se de forma voluntria e assumindo responsabilidades no Sistema Pblico de Sade; b ) houve intensa transferncia negociada de responsabilidades, atribuies e recursos do nvel federal para municpios e estados. Ao final do perodo de vigncia da NOB-SUS 01/96, mais de 99% dos municpios brasileiros estavam habilitados a uma das condies de gesto dessa norma, sendo 89% em Gesto Plena da Ateno Bsica e 10,1% em Gesto Plena do Sistema Municipal (Tabela 11). Entretanto, o percentual de municpios habilitados em cada uma dessas condies de

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gesto bastante varivel entre os estados, sugerindo a existncia de diferentes ritmos e modelos de descentralizao. Cabe lembrar que o processo de habilitao depende da iniciativa dos gestores subnacionais.Tabela 11 Habilitao dos municpios brasileiros, por estado, na NOB-SUS 01/96. Situao em dezembro de 2001

Fonte: Departamento de Descentralizao da Gesto da Assistncia SAS- MS. Nota: No est includo o DF.

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J o processo de habilitao dos estados foi mais lento e irregular (Quadro 2). Em dezembro de 2001, cinco estados estavam habilitados na condio de Gesto Avanada do Sistema Estadual, e sete na condio de Gesto Plena do Sistema Estadual.Quadro 2 Habilitao dos estados e Distrito Federal na NOB-SUS 01/96. Situao em dezembro de 2001

Fonte: Departamento de Descentralizao da Gesto da Assistncia SAS MS. *Nota: Os estados do Rio Grande do Sul e de Mato Grosso j tiveram a aprovao da Comisso Intergestores Tripartite para habilitao em Gesto Plena do Sistema Estadual, mas a habilitao no foi publicada, por solicitao dos prprios Secretrios Estaduais de Sade.

3.5. NOB 96 AS DIFICULDADES DO

PROCESSO DE IMPLANTAO DO

SUS

Os avanos da descentralizao no perodo levantam novas questes crticas para a implementao do SUS. No final da dcada de 90, acentua-se o debate sobre alguns problemas e desafios at ento no equacionados, tais como:

DIVISO DE RESPONSABILIDADES ENTRE ESTADOS E MUNICPIOSParcela significativa dos pactos de gesto entre estados e municpios sobre os prestadores de servios de sade foi estabelecida segundo critrios pouco adequados organizao funcional do sistema e ao comando efetivamente pblico do sistema, tais como partilhas de gesto por natureza jurdica dos prestadores de servios (pblicos x privados).

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PROCESSO DE HABILITAOEm muitos casos, a habilitao ocorreu de forma cartorial. O processo de habilitao dos estados nem sempre apresentou relao direta com a capacidade efetiva da Secretaria de Estado da Sade de exercer todas as suas funes gestoras. A macia habilitao dos municpios em Gesto Plena da Ateno Bsica representou um avano do ponto de vista da responsabilizao de milhares de gestores municipais e aumento da eqidade na alocao de recursos por meio da implantao do PAB, mas no assegurou a qualidade e efetividade da ateno bsica em todos esses municpios, nem foi suficiente para garantir o acesso dos cidados aos demais nveis de ateno. A habilitao em Gesto Plena do Sistema Municipal, por sua vez, representou um avano para centenas de municpios, que passaram a dispor de maior autonomia de gesto; por outro lado, no foi suficiente para assegurar sua insero no Sistema Estadual de Sade e seu papel na garantia do atendimento s populaes referidas de outros municpios com menor capacidade assistencial.

FINANCIAMENTO DO SISTEMAMesmo com o avano que significou a implantao do PAB e os esforos para reduzir as desigualdades regionais na alocao dos recursos federais para a assistncia de mdia e alta complexidades, a alocao dos recursos financeiros permanecia, em parte, vi