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Gestão democrática da escola pública: ideologia ou realidade? Heriberto Francisco Xavier (CUFPB) [email protected] Janaíne Cosmo Silva dos Santos (UFPB) [email protected] Elikênia Silva Martins (UFPB) [email protected] Jacqueline Kelly Leal Costa (UFPB) [email protected] Resumo: A gestão é uma forma de organização do trabalho pedagógico da escola. Este trabalho tem como objetivo apresentar reflexões sobre a gestão democrática da escola pública. Tomamos por base uma pesquisa qualitativa, realizada entre 2008 e 2009, a qual procurou verificar aspectos inerentes à gestão e à existência de instâncias colegiadas na Escola Municipal do Ensino Fundamental Professora Emília de Oliveira Neves, localizada na cidade de Bananeiras PB. Os instrumentos de pesquisa utilizados foram: entrevistas semiestruturadas e observação. As entrevistas foram aplicadas à gestora, à vice gestora, à coordenadora pedagógica e ao supervisor escolar. Tomamos por base teórica as ideias de Batista (2006), Bastos (2002), Canivez (1991), Castro (1991), Ferenzena e Araújo (2006), Formiga (1999), Henriques, Brassoloto e Souza (1999), Libâneo (2008), Luce e Medeiros (2006), Vieira (2006). Buscamos assim comparar os resultados da pesquisa com esse corpo teorico e com a legislação nacional sobre os processos democráticos na educação representada pela Constituição Federal de 1988, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação de 2007. Os resultados mostraram que na concepção dos entrevistados a Escola, foco da pessquisa, adota uma gestão democrática e possui apenas uma instancia colegiada: o Conselho Escolar. O preenchimento dos cargos de gestão e vice gestão ainda ocorrem por indicação política do Poder Exeutivo Municipal. Desta forma concluímos que há um distanciamento entre a verdadeira concepção de gestão democrática e as concepções dos entrevistados, o que indica que tais concepções estão restritas ao plano ideológico, e não prático/real, da gestão escolar democrática. Palavras chave: Gestão Escolar, Instâncias Colegiadas, Processos Democráticos, Escola Pública. 1. Introdução As discussões sobre a gestão escolar têm sido na contemporaneidade, foco de debates educacionais em esfera nacional, federal e municipal, discussões estas que visam encontrar formas de descentralização do poder administrativo, pedagógico e financeiro da escola pública, antes centrado na pessoa do diretor. Todavia, esse é um processo complexo e que envolve conflitos e interesses por parte dos segmentos escolares, sociais, políticos e ideológicos.

Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

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Resumo: Heriberto Francisco Xavier (CUFPB) [email protected] Janaíne Cosmo Silva dos Santos (UFPB) [email protected] Elikênia Silva Martins (UFPB) [email protected] Jacqueline Kelly Leal Costa (UFPB) [email protected] Palavras chave : Gestão Escolar, Instâncias Colegiadas, Processos Democráticos, Escola Pública.

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Gestão democrática da escola pública: ideologia ou realidade?

Heriberto Francisco Xavier (CUFPB) [email protected]

Janaíne Cosmo Silva dos Santos (UFPB) [email protected]

Elikênia Silva Martins (UFPB) [email protected]

Jacqueline Kelly Leal Costa (UFPB) [email protected]

Resumo: A gestão é uma forma de organização do trabalho pedagógico da escola. Este trabalho tem como

objetivo apresentar reflexões sobre a gestão democrática da escola pública. Tomamos por base uma

pesquisa qualitativa, realizada entre 2008 e 2009, a qual procurou verificar aspectos inerentes à gestão

e à existência de instâncias colegiadas na Escola Municipal do Ensino Fundamental Professora Emília

de Oliveira Neves, localizada na cidade de Bananeiras – PB. Os instrumentos de pesquisa utilizados

foram: entrevistas semiestruturadas e observação. As entrevistas foram aplicadas à gestora, à vice

gestora, à coordenadora pedagógica e ao supervisor escolar. Tomamos por base teórica as ideias de

Batista (2006), Bastos (2002), Canivez (1991), Castro (1991), Ferenzena e Araújo (2006), Formiga

(1999), Henriques, Brassoloto e Souza (1999), Libâneo (2008), Luce e Medeiros (2006), Vieira

(2006). Buscamos assim comparar os resultados da pesquisa com esse corpo teorico e com a legislação

nacional sobre os processos democráticos na educação representada pela Constituição Federal de

1988, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e Plano de Metas Compromisso Todos

pela Educação de 2007. Os resultados mostraram que na concepção dos entrevistados a Escola, foco

da pessquisa, adota uma gestão democrática e possui apenas uma instancia colegiada: o Conselho

Escolar. O preenchimento dos cargos de gestão e vice gestão ainda ocorrem por indicação política do

Poder Exeutivo Municipal. Desta forma concluímos que há um distanciamento entre a verdadeira

concepção de gestão democrática e as concepções dos entrevistados, o que indica que tais concepções

estão restritas ao plano ideológico, e não prático/real, da gestão escolar democrática.

Palavras chave: Gestão Escolar, Instâncias Colegiadas, Processos Democráticos, Escola Pública.

1. Introdução

As discussões sobre a gestão escolar têm sido na contemporaneidade, foco de debates

educacionais em esfera nacional, federal e municipal, discussões estas que visam encontrar

formas de descentralização do poder administrativo, pedagógico e financeiro da escola

pública, antes centrado na pessoa do diretor. Todavia, esse é um processo complexo e que

envolve conflitos e interesses por parte dos segmentos escolares, sociais, políticos e

ideológicos.

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Assim, este artigo tem por objetivo apresentar reflexões sobre a gestão da escola pública

tomando por base duas pesquisas realizadas no âmbito das disciplinas Gestão Escolar,

cursada em 2008; Estágio Supervisionado na Gestão Escolar , cursada em 2009 e, Pesquisa e

Prática Pedagógica na Gestão Escolar, também cursada em 2009, do Curso de Pedagogia do

Centro de Ciências Humanas, Sociais e Agrárias (CCHSA) da Universidade Federal da

Paraíba (UFPB), Campus III de Bananeiras. Com as pesquisas buscou-se verificar aspectos

inerentes à gestão e à existência de instâncias colegiadas na Escola Municipal do Ensino

Fundamental Professora Emília de Oliveira Neves (EMEON), localizada na cidade de

Bananeiras – PB.

As questões/problemas que nortearam a pesquisa foram: Qual o tipo de gestão adotado pela

escola? Há quanto tempo ela funciona dessa forma? Quem participa dessa gestão? Como são

organizadas as discussões e deliberações? Todos os sujeitos da escola apóiam esse tipo de

gestão? Há instâncias colegiadas na escola? E se há quais são elas? Como ocorre o processo

de escolha para preenchimento dos cargos de gestores?. Os instrumentos metodológicos

utilizados na pasquisa foram: entrevistas e observação. As entrevistas foram aplicadas à

gestora da referida escola (em 2008); à vice gestora, à coordenadora pedagógica e ao

supervisor escolar da mesma escola (em 2009).

A escolha da entrevista se deu porque segundo Chizzotti (2005), ela possibilita a comunicação

de forma mais significativa entre o pesquisador e o sujeito pesquisado. Já a observação na

concepção deste mesmo autor, é uma das formas de se registrar, sistemática e fielmente, fatos

e circunstâncias em situações concretas definidas previamente e que e estejam ligadas ao

problema em estudo. Além disso, o tomamos por base teórica as idéias de Batista (2006),

Bastos (2002), Canivez (1991), Castro (1991), Ferenzena e Araújo (2006), Formiga (1999),

Henriques, Brassoloto e Souza (1999), Libâneo (2008), Luce e Medeiros (2006), Vieira

(2006).Buscamos, assim, comparar os resultados da pesquisa com esse quadro teórico e com

a legislação nacional representada pela Constituição Federal de 1988 da República Federativa

do Brasil (CF/88); pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (LDB nº

9.394/96) e pelo Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação de 2007 (PMCTE

Decreto nº 6.094/07), que dispõem sobre a implantação da gestão escolar democrática em

todo o país.

As temáticas a que nos propomos a tratar são de suma relevância aos gestores escolares e

profissionais da educação; aos estudantes dos cursos de formação cujas diretrizes visem a

formação de gestores escolares e, também aos demais segmentos da sociedade, que estejam

envolvidos, comprometidos com a escola e com a educação. Por isso, no decorrer do artigo

buscamos responder a indagação, que também se faz título do mesmo: Gestão democrática da

escola pública: ideologia ou realidade? Para isso o dividimos em cinco subtítulos: Bases

legais e conceituais da gestão escolar democrática no Brasil; Gestão escolar “democrática”:

relatos de uma experiência “prática”; O conselho escolar como um elemento necessário à

consolidação da gestão escolar democrática; Desafios e possibilidades da escolha

democrática dos gestores escolares; Colóquio sobre gestão escolar: espaço de discussões e

integração entre teoria e prática.

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2. Bases legais e conceituais da gestão escolar democrática no Brasil

Anterior à LDB 9394/96, a gestão das escolas públicas brasileiras estava calcada em preceitos

que remetiam à uma postura autocrática e centralizadora do poder administrativo das

atividades escolares por parte de seus gestores (diretores ou administradores). Tal postura foi

um entrave, e ainda continua sendo em muitas unidades escolares do país, ao

desenvolvimento do processo educacional, à participação dos alunos nas deliberações e nas

tomadas de decisões e à participação da comunidade nesses processos. Na

contemporaneidade, e diante do novo paradigma educacional,

a gestão da educação em sentido amplo e a gestão escolar apresentam-se como um

dos temas centrais no debate da administração pública e do setor educacional atual.

Concorrem para isso não apenas a indiscutível centralidade da Educação para a

formação dos cidadãos, a tecitura social e o projeto de desenvolvimento da Nação,

mas também a peculiaridade organizacional das instituições de ensino e dos sistemas

educacionais. Estas condições provocam questões bastante polêmicas, porque tocam

de fundo interesses individuais e coletivos, as possibilidades pessoais e políticas,

neste tempo de reconfiguração dos campos social e educacional. Por exemplo, na

Educação incidem, hoje, notoriamente, os processos de descentralização das

responsabilidades do Estado, que podem ter como motivação a desobrigação com as

políticas sociais e a privatização, ou reconhecimento das lutas pela democratização e

controle público dos espaços escolares, ou seja, a escolha da inclusão social e da via

democrática como objetivo e forma de gestão da esfera pública (LUCE &

MEDEIROS, 2006, p. 9)

É recente no país, a regulamentação legal da implantação da gestão democrática na escola

pública. As bases legais para esse fim começaram com a promulgação da CF/88 e a se efetivar

com por volta da década de 1970 a partir dos movimentos em prol de uma educação

democrática. Mas somente a partir de 1990 é que o modelo de gestão democrática passa a ser

visto de modo efetivo e a ser implantado em escolas públicas do país após a promulgação da

LDB nº 9.394/96.

Sobre a democratização da educação e do ensino público no Brasil a própria CF/88, sendo a

principal representação legal sobre os direitos dos cidadãos brasileiros, já sinalizava para a

importância da implantação desse novo modelo de gestão, e também de ensino, em nossas

escolas públicas, dispondo que

Art.206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o

saber;

III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições

públicas e privadas de ensino;

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V - valorização dos profissionais do ensino, garantido, na forma da lei, plano de

carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso

exclusivamente por concurso público de provas e títulos, assegurado regime jurídico

único para todas as instituições mantidas pela União;

VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

VII - garantia de padrão de qualidade.

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Atentemos neste artigo da CF/88 para o inciso VI, pois será a partir dele que se encaminharão

as bases, nas décadas posteriores, para a consolidação da gestão democrática da escola e do

ensino público no país a ser efetivada pela LDB de 1996 em seus artigos 14 e 15, os quais

dispõem que

Art. 14º. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino

público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os

seguintes princípios:

I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico

da escola;

II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou

equivalentes.

Art. 15º. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de

educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e

administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito

financeiro.

Nota-se que legalmente o novo paradigma de gestão escolar se concretiza, se efetiva na

realidade, ou seja, é algo real. Não podemos, entretanto, negar que implícito a essa realidade

existe uma série de ideologias (im)postas pelas instâncias educacionais superiores, a exemplo

do Ministério da Educação (MEC) e suas Secretarias, às escolas. Isso é notório até pelo fato

de que o reconhecimento legal desse novo paradigma não foi fruto de um processo pacífico

e/ou tomada de cosciência por parte dessas instâncias sobre a situação de precariedade da

educação pública que se manteve por um longo período histórico, mas sim de muitos

conflitos, muitas exigências e lutas dos educadores, professores e outros segmentos da

educação em prol desse reconhecimento. Todavia, ainda são estas instâncias que elaboram as

diretrizes a serem seguidas pelas escolas sem considerar as peculiarides de cada uma e o

contexto social em que estão inseridas.

Mesmo a CF/88 em seu Art. 206, VI e a LDB nº 9.394/96 em seus artigos 14 e 15 fazerem

referência a implantação da gestão democrática, são muitas as escolas que ainda resistem à

mudança e continuam a adotar uma gestão autocrática calcada em princípios de autoridade e

centrariedade do poder administrativo, pedagógico e financeiro e sob a responsabilidade do

diretor. Entendemos, então, que é preciso transformar as práticas tradicionais ainda presentes

em muitas escolas públicas.

Transformações estas que devem ocorrer, tanto no setor administrativo e financeiro quanto no

setor pedagógico, a partir da descentralização das responsabilidades inerentes a esses setores

visando instituir uma cidadania efetiva e participativa, o que, de fato, também são sinônimos

de democracia. Instituir a cidadania deve ser, nesse novo paradigma educacional, um dos

principais objetivos da escola, até porque

a escola, de fato institui a cidadania. É ela o lugar onde as crianças deixam de

pertencer exclusivamente à família para integrarem‐se numa comunidade mais

ampla em que os indivíduos estão reunidos não por vínculos de parentesco ou de

afinidade, mas pela obrigação de viver em comum. A escola institui em outras

palavras, a coabitação de seres diferentes sob a autoridade de uma mesma regra

(CANIVEZ, 1991, p. 33)

Page 5: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

Neste contexto, com o objetivo de fortalecer a gestão democrática da educação, do ensino e

das escolas públicas e visando sanar os problemas, ainda vigentes, de um modelo tradicional e

histórico da gestão escolar do país, através do compromisso da União Federal, em regime de

colaboração com Municípios, Distrito Federal, Estados e com a participação das famílias e da

comunidade, mediante programas e ações de assistência técnica e financeira, visando a

mobilização social pela melhoria da qualidade da educação básica, é criado por força do

Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007, o PMCTE, o qual dispõe que

Art. 1o O Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (Compromisso) é a

conjugação dos esforços da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, atuando

em regime de colaboração, das famílias e da comunidade, em proveito da melhoria

da qualidade da educação básica.

Art. 2o A participação da União no Compromisso será pautada pela realização

direta, quando couber, ou, nos demais casos, pelo incentivo e apoio à

implementação, por Municípios, Distrito Federal, Estados e respectivos sistemas de

ensino, das seguintes diretrizes:

XVII - incorporar ao núcleo gestor da escola coordenadores pedagógicos que

acompanhem as dificuldades enfrentadas pelo professor;

XVIII - fixar regras claras, considerados mérito e desempenho, para nomeação e

exoneração de diretor de escola;

XXI - zelar pela transparência da gestão pública na área da educação, garantindo o

funcionamento efetivo, autônomo e articulado dos conselhos de controle social;

XXII - promover a gestão participativa na rede de ensino;

XXV - fomentar e apoiar os conselhos escolares, envolvendo as famílias dos

educandos, com as atribuições, dentre outras, de zelar pela manutenção da escola e

pelo monitoramento das ações e consecução das metas do compromisso.

Observemos que o PMCTE é mais uma tentativa de consolidar uma gestão democrática e

participativa no âmbito da escola pública inserindo, agora, na pauta de exigências a

necessidade de se fixar regras claras, considerados mérito e desempenho, para nomeação e

exoneração de diretor de escola (inciso XVIII). Essa atitude poderá vir a extinguir práticas

clientelistas e político-partidárias na escolha dos gestores escolares, assegurando a

participação de todos os segmentos da escola nessa escolha, o que discutiremos mais adiante

neste artigo.

A gestão escolar, segundo Vieira (2006), situa se no âmbito da escola e diz respeito à tarefas

que estão sob sua esfera de abrangência, orientando-se para assegurar aquilo que é próprio

de sua finalidade, ou seja, promover o ensino e a aprendizagem, viabilizando a educação

como um direito de todos. Neste sentido destacamos outro conceito de gestão escolar, que

também corrobora com o conceito explicitado por Vieira (2006), no qual

(...) a ideia de gestão escolar está intimamente relacionada à organização do trabalho

pedagógico. Dessa forma, convém notar, que a Administração Escolar deve ser

exercida por um educador que possua formação pedagógica e visão administrativa

baseadas na efetiva participação de todos os envolvidos no ato educativo. Em fim

administrar significa também estar aberto à reflexão, discussão, a mudanças

contínuas, ao trabalho em equipe, à formação contínua e ao aperfeiçoamento

constante (HENRIQUES; BRASSOLOTO, SOUZA & GARBO, 1999, p.26)

Page 6: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

Feito essas considerações sobre as bases legais e conceituais da gestão democrática no Brasil

passaremos a discutir, na sequência, sobre o modelo de gestão adotada na EMEON a partir da

análise das entrevistas realizadas com a gestora, vice gestora, coordenadora pedagógica e com

o supervisor escolar.

3. Gestão escolar “democrática”: relatos de uma experiência “prática”

Inicialmente queremos justificar o propósito das aspas nas palavras democrática e prática. As

aspas na primeira palavra simbolizam a necessidade de nos expressarmos quanto ao teor

democrático não efetivo de gestão adotado pela escola pesquisada, haja vista algumas

práticas, julgadas pelos entrevistados como democrática, em nossa concepção ainda não são e

não têm objetivos verdadeiramente democráticos, sendo, portanto, uma visão ideológica de

gestão democrática, conforme explicitaremos no decorrer deste subtítulo e dos demais que

discutiremos neste artigo. As aspas utilizadas na segunda palavra, por sua vez, dizem respeito

e se correlacionam com o teor não real da pratica democrática da gestão escolar, a qual não

contradiz com a verdadeira realidade da escola pesquisada e dos sujeitos que devem, ou pelo

menos deveriam, comungar das decisões, deliberações e fazerem-se presentes em instâncias

colegiadas da escola. E mesmo os entrevistados afirmando, em certos momentos da pesquisa,

que o modelo de gestão democrática é uma realidade prática na escola, consideramos essa

afirmação como sendo um equívoco sobre a concepção democrática e da democracia, haja

vista não ser essa concepção uma realidade concreta na escola.

As considerações que faremos a partir desse ponto estão todas calcadas nas entrevistas

concebidas pelos entrevistados, cujos nomes não evidenciaremos com vistas a preservar a

integridade profissional e seu direito legal ao anonimato dos mesmos.

Segundo a gestora, é adotado na escola um modelo de gestão democrática e participativa

seguindo as exigências da LDB de 1996. Esse modelo de gestão foi adotado pela escola há

cerca de cinco anos, mas nem todos os sujeitos da escola, principalmente alguns de seus

professores, apóiam esse tipo de gestão, o que dificulta o trabalho e a consolidação dos

princípios democráticos na escola. Assim, na escola as discussões acerca dos problemas da

escola são abertas à participação dos gestores, alunos e professores da escola, funcionários,

pais de alunos e de pessoas da comunidade. Entretanto, nem todos buscam exercer esse direito

e colaborar com a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem

A gestão democrática segundo a gestora tem pontos positivos e negativos. os pontos positivos

são que a gestão democrática busca o melhor para os alunos e todos podem opinar, sugerir,

participar das reuniões e das decisões. Ela aponta como pontos negativos a falta de

compromisso por parte de alguns professores com as causas da escola e nem todos querem

participar das discussões nem assumir responsabilidades.

Conforme a vice gestora a gestão adotada pela escola também é democrática, porém, segundo

a mesma esse tipo de gestão que diz ela ser democrática também traz resquícios de uma

gestão autocrática/monocrática.

Page 7: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

Ainda segundo a vice gestora a gestão democrática existe mesmo assim nem todos os sujeitos,

principalmente alguns dos professores com um tempo maior de serviço prestado à escola,

apóiam esse tipo de gestão, o que dificulta o trabalho da gestora e das duas vice gestoras para

transformar a escola e a gestão em democráticas. Um dos motivos que leva ainda a

vice‐gestora a afirmar que a gestão da escola é democrática é o fato de as discussões acerca

dos problemas da escola são abertas à participação dos gestores, alunos e professores da

escola. Notamos em sua fala que ela não se refere a participação dos pais de alunos e demais

sujeitos da escola como é o caso dos auxiliares de serviços gerais e vigilantes.

Para a Coordenadora Pedagógica, a gestão adotada pela escola é participativa porque todos os

sujeitos da escola têm direito a participar das discussões e funciona dessa forma há pelo

menos quatro anos. Ainda segundo ela, as discussões são organizadas a partir das

necessidades que vão surgindo na escola e todos os sujeitos da escola apóiam o tipo de gestão

adotado aqui na escola, contrapondo‐se, em nossa visão, com a opinião da vice gestora, a qual

afirmou que nem todos apóiam a gestão democrática, sempre tem aqueles que ficam com um

pé atrás.

Ainda na opinião da Coordenadora Pedagógica um dos pontos positivos na gestão da escola é

que todos participam e um dos pontos negativos é que quando todos participam aparecem às

divergências, a partir delas conhecemos melhor cada membro, cada profissional. Essa

afirmação sobre o ponto negativo da gestão, citado pela Coordenadora Pedagógica, nos leva a

concluir que não há um consenso entre os membros que participam das discussões para

tomadas de decisões na escola e que a gestão adotada por essa escola não pode ser

considerada democrática ou participativa efetivamente.

Segundo o supervisor escolar, a gestão a dotada pela escola é participativa sendo esta uma

peça fundamental no processo de tomada de decisões da escola, uma vez que todos os

envolvidos no processo de ensino podem participar. Na opinião dele, todos os sujeitos da

escola apóiam esse tipo de gestão já que tem como pontos positivos a democratização,

autonomia, liberdade de expressão e tem como pontos negativos a falta de interesse dos

envolvidos no processo de ensino.

Na opinião do supervisor escolar todos os sujeitos da escola apóiam a gestão democrática,

mas nos pareceu, após analisarmos a sua fala, que mesmo esses sujeitos apoiando o tipo de

gestão adotado na escola, os mesmos se restringem apenas a apoiá‐la sem que haja

questionamentos ou participação ativa nas tomadas de decisões, deliberações ou

contribuições ao processo de organização do trabalho administrativo e pedagógico.

Para a vice gestora participam da gestão da escola a diretora e as duas vice diretoras. Já para a

Coordenadora Pedagógica, participam da gestão os gestores, professores, alunos e pais. E para

o supervisor escolar participam da gestão todos os envolvidos no processo de ensino.

As concepções da gestora, da vice gestora, da coordenadora pedagógica e do supervisor

escolar com relação a gestão democrática nos leva a perceber um distanciamento entre o é eo

que deveria ser a concepção democrática de gestão, na prática. Ficando esta restrita ao plano

ideológico.

Page 8: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

Entendemos, então que, de acordo com Libâneo (2003), a concepção democrática e

participativa da gestão escollar caracteriza-se pala definição explícita, por parte da equipe

escolar, de objetivos sociopolíticos e pedagógicos da escola; pela articulação da atividade de

direção com a iniciativa e a participação das pessoas da escola e das pessoas que se

relacionam com ela; pela qualificação e competência profissional; pela busca de objetividade

no trato das questões da organização e da gestão, mediante coleta de informações reais; pelo

acompanhamento e avaliação sistemáticos com finalidade pedagógica a exemplo de

diagnóstico, acompanhamento dos trabalhos, reorientações de rumos e ações, tomadas de

decisões; pelo aspecto de que todos dirigem e são igualmente dirigidos, todos avaliam e são

também avaliados e, pela ênfase tanto nas tarefas quanto nas relações. Isto não ainda não está

efetivamente ocorrendo na escola pesquisada.

Nas afirmações dos entrevistados analizamos que pode haver uma confusão sobre a gestão é

democrática, estando assinalado neste ponto que a concepção de gestão democrática utilizada

na escola não é concreta, real. Na verdade, pode ser uma concepção ideológica por privilegiar

as ideias da gestoras sobre as ideias dos demais segmentos. Mesmo assim, consideraramos

que

a gestão democrática da educação, reivindicada pelos movimentos sociais durante o

período da ditadura militar, tornando‐se um dos princípios da educação na

Constituição Brasileira de 1988, a ser aplicada apenas ao ensino publico, abriu uma

perspectiva para resgatar o caráter público da administração pública. A gestão

democrática restabelece o controle da sociedade civil sobre a educação e a escola

pública (BASTOS, 2002, p.7).

Os resultados da pesquisa mostraram que a escola possui apenas uma instancia colegiada: o

Conselho Escolar e mesmo não sendo, e nem devendo ser, a única instancia presente na escola

representativa, na prática, da gestão democrática e de processos democráticos ele é um

elemento necessário à consolidação da gestão escolar democrática. É sobre essa instância que

passaremos a discutir na sequência deste artigo.

4. O Conselho escolar como um elemento necessário à consolidação da gestão escolar

democrática

O Conselho Escolar é uma instância colegiada e um importante instrumento que favorece à

consolidação da gestão democrática das escolas públicas. É através dele que a escola e sua

gestão podem se organizar para possibilitar uma educação com mais qualidade através da

cooperação e da participação de todas as pessoas envolvidas e comprometidas com a

educação. Dentre estas pessoas destacamos aquelas que fazem parte da escola, a exemplo dos

gestores, professores e alunos e aquelas que estão ligadas a escola de forma indireta, a

exemplo dos pais de alunos e demais pessoas das comunidades. Sendo assim, “a

administração colegiada, ao se efetivar como prática democrática de decisões deve ser capaz

de garantir a participação de todos os membros da comunidade escolar, a fim de que assumam

o papel de co-responsáveis no projeto educativo da escola e, por extensão, na comunidade

social” (PRAIS, 1996, p.82 apud FORMIGA, 1999, p.19).

Page 9: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

A importância do Conselho Escolar se faz devido ao fato de possibilitar a participação de

todos no processo de tomadas de decisões da escola e da gestão dos recursos didáticos e

financeiros da escola descentralizando assim o poder antes centralizado nas mãos da direção.

Nesse sentido um dos fatores que possibilitam essas tomadas de decisões são as reuniões que

ocorrem sistematicamente quando há necessidade de discutir o destino e emprego dos

recursos financeiros que vêm para a escola e outra para prestar contas sobre os gastos desses

recursos.

O Conselho da escola pesquisada é composto por um representante de pais, um dos

professores, um dos alunos, um da gestão e um da comunidade. Dessa forma, destacamos que

“o Conselho Escolar é um espaço de formação, justamente por possibilitar esse nível de

participação” (WERLE, 2003, p.25) desses sujeitos que compõem direta e/ou indiretamente o

cotidiano escolar.

A gestão democrática, de acordo com Batista (2006), tendo com instrumento o Conselho

Escolar, carrega em si o germe da transformação das práticas escolares, já que propõe a gestão

colegiada por meio da participação de todos os segmentos da comunidade e diz respeito um

processo que procura romper radicalmente com os mecanismos e armadilhas da dominação

patrimonial na escola, dominação esta com origem reconhecida no campo do Estado.

O Conselho Escolar, para a gestora é uma realidade na escola e este funciona de forma

organizada e sistemática. A nosso entendimento, ela quis referir‐se com a afirmação

supracitada a questão de que as discussões e reuniões para as tomadas de decisões são

previamente organizadas quando surge a necessidade de os membros do Conselho aprovar, ou

não, algum projeto para a escola. Ao utilizar o termo sistematica, entendemos que talvez o

mesma estivesse querendo dizer hierarquizado, onde os membros do Conselho seguem e

respeitam fielmente suas decisãoes. Quanto às reuniões a própria gestora admite que a não

participação efetiva dos pais de alunos nas mesmas para que possam coletivamente discutir

questões referentes à escola e ao processo educativo.

Todas as ações organizadas pelo Conselho, tais como reuniões, planejamento financeiro e

pedagógico, palestras e avaliação dos resultados obtidos a partir do planejamento de ações,

são registrados em Livro de Atas e relatórios que são enviados como forma de prestação de

contas ao MEC. Um dos fatores mais importante destacado pela gestora quanto o Conselho é

que, em nenhum momento se é permitida a interferência político-partidária nas tomadas de

decisões e deliberações, pois cabe apenas a seus membros realizarem tais tarefas de forma

autônoma e coletiva. No entanto, o Conselho só foi criado, segundo a gestora, no ano de 1998

para que a escola pudesse receber os recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola

(PDDE) e do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).

Mesmo sendo uma exigência legal muitas escolas ainda não conseguiram organizar seus

conselhos e nem adotar uma gestão democrática e participativa e mesmo dentre aquelas que

conseguiram acompanhar essas exigências muitas só fizeram, no papel, para se adequar as

novas legislações e para simplesmente receber os recursos financeiros do PDDE e do PDE e

não em prol da melhoria da qualidade do processo educativo e das escolas.

Page 10: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

Na escola pesquisada não há outras instâncias colegiadas que legitimem a participação dos

sujeitos da escola e da comunidade nas tomadas de decisões, deliberaçoes e nos processos

educacionais. É preciso que as escolas passem a vislumbrar que, conforme ressalta Werle

(2003) tanto o Conselho Escolar quanto o Conselho de Classe, o Grêmio Estudantil, o

Grêmio de Professores, o Grêmio de Guncionários, a Associação de Pais e Professores são

espaços de desenvolvimento, aprendizagem e revisão de processos participativose por isso

toda escola deve promover essa aprendizagem.

A Coordenadora Pedagógica reconhece que a escola possui um Conselho Escolar e, conforme

fica claro em sua fala, ele atua no momento em que os gestores, por sua vez, organizam a

escola como um todo. Esse Conselho foi criado há cerca de seis anos (1998), para que a

escola tivesse o direito de receber os recursos financeiros do PDE e do PDDE. Pudemos

analisar, mais uma vez e reforçar nossa concepção de que o Conselho Escolar não foi criado

tendo como objetivo principal a necessidade de mudança na gestão da escola nem mesmo

para torná‐la democrática ou possibilitar a participação de outras esferas da escola nos

processos deliberativos. Entendemos ainda que, se não fosse para receber tais recursos, talvez

o Conselho não tivesse sido criado. É possível notarmos isso pelo fato de não existir outras

instâncias colegiadas na escola como já ressaltamos anteriormente, o que possibilitaria uma

maior participação de um maior número de sujeitos nas tomadas de decisões.

Após essas reflexões, concluímos que, mesmo havendo um Conselho na escola, não há uma

participação efetiva dos membros da comunidade, dos pais de alunos e outros segmentos da

escola nas tomadas de decisões e/ou deliberações desse conselho, sendo essa participação um

dos princípios primordiais da gestão democrática.

Este conhecimento sobre o Conselho Escolar é fundamental e de grande relevância tanto para

os profissionais que atuam na gestão escolar quanto para os estudantes de cursos de formação

que irão atuar nessa área porque possibilita conhecer, mesmo que de forma não abrangente, a

realidade e o funcionamento dessa instância democrática. No entanto, outro fator de grande

importância ao processo democrático diz respeito à escolha ou ao preenchimento dos cargos

de gestão e vice-gestão da escola, os quais devem seguir modelos democráticos que

favoreçam e oportunizem a participação não só dos sujeitos da escola, mas também da

comunidade local. Detalharemos essa temática na sequência deste trabalho esperando levar

vocês caros leitores e leitoras à uma reflexão sobre a atual situação desse processo dentro das

escolas brasileiras.

5. Desafios e possibilidades da escolha democrática dos gestores escolares

A gestão de uma escola para que seja considerada democrática, em nosso entendimento, deve

priorizar processos democráticos para o preenchimento de cargos diretivos, principalmente os

de gestão e vice‐gestão. Mas em muitas escolas esses processos ainda não conseguiram seu

espaço definitivo e até mesmo naquelas que se dizem adotar o modelo de gestão democrática,

como é o caso da escola pesquisada, a escolha dos gestores e vice gestores ainda ocorre de

forma tradicional, ou seja, por indicação política do poder executivo.

Page 11: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

É preciso ressaltar que na escolha dos profissionais para preenchimento desses cargos estão

implícitos muitos aspectos de cunho ideológico e político partidário, sem considerar a

capacidade e a formação especifica desses sujeitos para atuar na área, prejudicando o processo

e o caráter pedagógico da gestão escolar.

Tomemos por exemplo, o caso da escola pesquisada e que é foco das discussões desse artigo.

Nela os cargos diretivos são preenchidos por meio de indicação política e nos parece que não

se é exigido uma qualificação específica das pessoas que irão assumir tais cargos.

Para termos uma ideia, a vice gestora da escola, é graduada em Geografia com título de

Especialização em Meio Ambiente. Está exercendo a função de vice gestora há dois anos e

seis meses. Ingressou na escola por meio de concurso público para o exercício da docência,

exercendo a princípio a função de professora e posteriormente assumindo a função de

coordenadora do PDE e do PDDE e por conseguinte passou a ocupar o cargo de vice gestora

por meio de indicação política do Poder Executivo Municipal.

Essa escolha por nomeação pode inclusive acarretar problemas na administração escolar e

também em sua prática pedagógica, caso o gestor nomeado não possua formação e/ou

experiência com a prática. Mas ainda ocorre fatos desse tipo nas escolas brasileiras e por isso

podemos compreender que “se muitos administradores não-educadores determinam a ação de

professores e supervisores não muito educadores, o que temos finalmente, é o fracassos da

administração da educação, que significa inevitavelmente o fracasso da educação” (SILVA

JUNIOR, 1995, P.74 apud HENRIQUES; BRASSOLOTO, SOUZA & GARBO, 1999,

p.25).

A escolha de diretor é um processo que deve ser analisado com bastante cautela tanto pela

comunidade escolar quanto pela comunidade local, caso esta esteja inserida nesse processo de

escolha. Sobre esse aspecto, Libâneo (2003) essa escolha requer muita responsabilidade do

sistema de ensino e da comunidade escolar, mas predomina ainda no sistema escolar público

brasileiro a nomeação arbitrária dos gestores pelo governador ou pelo prefeito, geralmente

para atender a conveniências e interesses político‐partidários. Essa prática torna o gestor o

representante do Poder Executivo na escola.

A escolha do diretor escolar, no Brasil, conforme Padilha citado por Medeiros (2006), se dá

por meio da tradicional nomeação pelo poder público,dificilmente aceita como democrática,

ainda que associada ou precedida de lista de candidatos indicada pela comunidade escolar;

pelo concurso público, realizado por provas e/ou títulos, a fim de evitar clientelismo, ou

influência do Poder Executivo; pela eleição, justificada pelo caráter político da gestão escolar

e pela importância de participação da comunidade, organizada pela via indireta, através do

Colegiado ou Conselho Escolar, ou pela via direta, com voto universal ou proporcional. Neste

caso há o estabelecimento de peso dos votos de cada segmento escolar no cômputo final.

Ainda há o chamado esquema misto, que combina um sistema de avaliação de competência

técnica com processos de eleição pela comunidade.

Segundo Medeiros (2006), Padilha (1998) valendo‐se de Paro (1998), avalia que dentre essas

Page 12: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

possibilidades, a eleição é a forma mais democrática, pois a nomeação, mesmo com alguma

participação da comunidade, tende a critérios político‐clientelistas.

O concurso, ainda que coíba o apadrinhamento político, acaba sendo democrático a penas

para os candidatos, já que o diretor escolhe a escola, mas a escola não escolhe o diretor,

desvestindo esse processo do seu caráter político, neste caso

quando o sistema era clientelístico, o diretor era escolhido com base em critérios

políticos e tinha uma forma de relacionamento baseada nesta indicação política.

Com a eleição de diretores, isto se modifica e o velho sistema entra em desuso, mas

uma nova forma de relacionamento está em processo de formação e assim o diretor

eleito tem muito menos acesso às fontes de poder - à Secretaria de Obras do Estado

e aos contactos políticos tradicionais. O diretor eleito enfrenta, além de todas as

dificuldades inerentes à função, a de construir uma nova forma de relacionamento

com os órgãos superiores num breve período de mandato (CASTRO et al, 1991, p.

101).

No caso do esquema misto, também a comunidade tem o seu poder deliberativo bastante

reduzido pelos processos de qualificação dos candidatos via avaliação, já que nos processos

de eleição, a experiência tem mostrado que a discussão democrática é bastante fomentada,

implicando maior distribuição do poder para as instâncias da base da pirâmide estatal.

Esse aspecto reforça ainda mais nossa ideia da necessidade de abolir as práticas tradicionais

de escolha dos gestores escolares e em seu lugar adotar formas democráticas a exemplo da

eleição associada à prova técnica ou concurso público, nos quais exija dos concorrentes a

formação específica na área de gestão escolar.

Descentralizar o poder administrativo da escola sem dúvida é um dos primeiros passos para se

alcançara democratização dos meios educacionais. Mas não basta apenas descentralizar esse

poder na verdade são muitas as mudanças que devem acometer a educação até atingir esse

objetivo. Por exemplo, podemos destacar a implantação de Instâncias Colegiadas cujos seus

membros estejam comprometidos com a melhoria do processo educacional; uma

reorganização nos meios de escolha dos gestores escolares, e da equipe didático/pedagógica e

técnico/administrativa; a abertura efetiva da escola à comunidade local. Nesse caso devemos

salientar que a comunidade deve também está disposta a ir ao encontro da escola para que

ocorra desta feita um processo de reciprocidade entre ambas as esferas.

Assim como em muitas escolas públicas brasileiras, a escolha dos gestores da escola a qual

pesquisamos ainda é realizada por indicação política, o que consideramos ser uma barreira a

consolidação da gestão e da escola democrática, contrapondo-se a concepção de gestão

democrática levantada pelos pesquisados.

Tendo em vista esclarecer o verdadeiro significado das práticas democráticas é necessário

criar mecanismos que favoreçam a participação dos agentes da escola em discussões sobre

essa temática para que possam assim, colaborar com suas escolas. Esses mecanismos podem

ser representados por oficinas, palestras, mini-cursos e colóquios. É sobre esse ultimo

mecanismo que passaremos a discutir a seguir.

Page 13: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

6. Colóquio sobre gestão escolar: espaço de discussão e integração entre teoria e prática

Sabemos que lidar com democracia num país com tantas desigualdades e injustiças sociais é

muito mais complexo do imaginam aqueles que deliberam as leis educacionais, em uma

esfera macro,muitas vezes sem qualquer conhecimento real das condições de nossas escolas.

Se quisermos que esse quadro seja modificado devemos fugir do discurso e parti para a

prática.

Não podemos repassar teoria sem prática. É preciso colocar o discurso de uma gestão

democrática em prática. Cabe a universidade e aos cursos de formação da educação contribuir

para essa modificação. Para isso deve‐se sair dos muros da universidade e das paredes das

salas de aulas para vivenciar na prática a realidade das escolas.

Atividades como Colóquios sobre gestão escolar com a participação dos sujeitos da escola

contribuem com a melhoria da atuação da universidade e com nossa formação. Uma

experiência com a realização de Colóquio em Gestão Escolar foi concretizada no

CCHSA/UFPB, conforme relataremos na sequência.

Assim, após a conclusão do Estágio Supervisionado na Gestão Escolar os estudantes do Curso

de Pedagogia e de Licenciatura em Ciências Agrárias do CCHSA/UFPB que cursaram essa

disciplina, orientada pela professora Francisca Alexandre de Lima, buscaram através da

realização do I Colóquio Sobre Gestão Escolar, contribuir com os gestores das escolas

Públicas dos municípios de Bananeiras, Solanea e outros municípios da Microrregião do

Brejo Paraibano a partir de discussões sobre a gestão democrática da escola pública no

Brasil.

O Colóquio foi realizado no dia 14 de agosto de 2009 no Auditório Central do

CCHSA/UFPB e contou com as presenças de gestores escolares, professores, secretários de

educação e estudantes de Pedagogia e de Ciências Agrárias.

Durante o evento foram discutidos os princípios norteadores da gestão democrática da escola

pública, dentre eles podemos destacar a participação, o planejamento, a coletividade, a

autoavaliação e a avaliação, a autonomia e a responsabilidade; as bases legais da gestão

escolar democrática com foco na LDB de 1996 e no Plano Nacional de Educação (PNE) de

2001; as formas democráticas de escolha dos gestores escolares; a formação de Conselhos

Escolares e sua relevância ás práticas da gestão democrática; as quatro concepções de

organização e gestão escolar, que são a técnico-cientifica, a autogestionária, a interpretativa e

a democrático-participativa.

Após as discussões foi possível eclarecer ao participantes que

(...) a gestão democrática da escola pública é um processo em construção, que

alcança seu objetivo na medida em que, principalmente os pais, alunos e

funcionários vão se apropriando dos problemas educacionais e adquirem

conhecimentos da organização política e burocrática da unidade escolar, da

administração pública em geral e do conjunto das organizações contemporâneas

(BATISTA, 2006, p,49).

Page 14: Gestão democrática da escola pública ideologia ou realidade

Pudemos concluir, portanto, após a realização deste Colóquio, que nossa meta como

estudantes não é solucionar os problemas da gestão escolar, mas sim conhecermos a sua

realidade para que possamos dar os primeiros passos em busca dessa solução e que as

universidades e os cursos de formação têm um papel importante no processo de transformação

das práticas escolares tanto no que concerne à teoria quanto na prática.

7. Considerações finais

A educação passou por diversas transformações de cunho estrutural, organizacional e legal

nas últimas décadas do século XX e nesta primeira década do século XXI. De fato, um dos

setores atingidos por tais transformações foi a gestão da escola que durante muito tempo foi

assoada por princípios autocráticos e que só recentemente começa a ser revestida por

princípios democráticos. As escolas públicas do Brasil também passaram por transformações

consideravelmente importantes nesse período, onde amparadas legalmente tiveram e estão

tendo a oportunidade de desenvolverem sua prática com certo grau de autonomia.

Os gestores foram também contemplados, pois agora podem compartilhar com os demais

segmentos da escola as deliberações, tomadas de decisões e próprio processo educativo. Mas

sem dúvida um dos segmentos que mais foi contemplado foi a comunidade, que conquistou o

seu direito de participação nesse processo. Os desafios enfrentados pelo modelo de gestão

democrática são muitos, todavia eles devem ser encarados como sendo típicos de qualquer

processo democrático em que as partes envolvidas tendem a lançar sua propostas para serem

avaliadas e as melhores serem aprovadas pelo consentimento da maioria.

Mudar a organização de uma unidade de ensino e solucionar todos os problemas que lhe são

acometidos é uma tarefa um tanto complexa, mas não impossível, haja vista que ela é

composta por diferentes sujeitos advindos de realidades e contextos distintos. Mas podemos

dizer que em muitas escolas os aportes necessários a uma mudança tão importante ainda não

estão sendo disponibilizados dvido a fatores políticos, sociais e, principalmente, ideológicos.

O nosso entendimento é de que a gestão é uma forma de organização e administração da

instituição escolar e de todo seu processo pedagógico, didático e educacional. Por esse motivo

ela deve ser concebida a partir de uma perspectiva democrática e participativa, onde todos os

sujeitos que fazem parte, direta ou indiretamente da escola, possam participar das tomadas de

decisões e deliberações da mesma e, dessa forma, contribuir para a melhoria da qualidade do

processo educacional. Ressalvamos que a escola por si e seus gestores individualmente não

conseguirão, do nosso ponto de vista, realizar um trabalho democrático e participativo. É o

envolvimento e a responsabilidade de todos que faz acontecer a democracia.

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