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GIOMAR BAGGIO VONTADE DE PODER EM NIETZSCHE CANOAS, 2009

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GIOMAR BAGGIO

VONTADE DE PODER EM NIETZSCHE

CANOAS, 2009

GIOMAR BAGGIO

VONTADE DE PODER EM NIETZSCHE

Trabalho de conclusão apresentado para a banca examinadora do curso de Filosofia do Centro Universitário La Salle - UNILASALLE, como exigência parcial para a obtenção do grau de Licenciatura em Filosofia.

Orientação do Profº. Ms. Gilmar Zampieri.

CANOAS, 2009

TERMO DE APROVAÇÃO

VONTADE DE PODER EM NIETZSCHE

Trabalho de conclusão apresentado à banca examinadora aprovado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharelado e Licenciatura em Filosofia do Curso de Filosofia do Centro Universitário La Salle – UNILASALLE.

Aprovado pela banca examinadora em 27 de novembro de 2009.

____________________________ Profº Ms. Gilmar Zampieri

Unilasalle

___________________________ Prfº Ms. Rudinei Müller

Unilasalle

___________________________ Prfº Ms. Luís Evandro Hinrichsen

Unilasalle

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo compreender o conceito de vontade de poder em

Nietzsche. Para a compreensão do conceito de vontade de poder em Nietzsche temos que

compreender o conceito de vontade em Schopenhauer. Para Schopenhauer o mundo é

representação e vontade. A vontade é a coisa em si e em si. A vontade é o mundo em si e por

si. O mundo em si é vontade. A vontade é cega, irracional e imutável. A vontade se manifesta

no corpo e devido a isso a vontade é dor e sofrimento. Para buscar a felicidade devemos negar

a vontade através da contemplação, através das artes e principalmente através da música. Uma

vontade metafísica então. Já para Nietzsche a vontade de poder é a expressão da vida, da

exaltação a vida, sem cunho metafísico, sem religião, sem moral e sem um princípio

organizador. Para Nietzsche a vontade de poder é o enaltecimento da vida e nada mais. Para

demonstrar esse caminho abordarei a vontade de poder no conhecimento, na arte, na natureza,

na arte e na moral. Em todos os momentos a vontade de poder é o crescimento de forças, de

poder perante a vida. Dessa forma, Nietzsche introduz os conceitos de eterno retorno. Tudo

retornará, pois o mundo sempre existiu. O tempo é infinito e as forças são finitas. Com isso,

Nietzsche postula que tudo retornará. Assim surge o segundo conceito: Amor Fati. O Amor

Fati é amar o nosso destino, amar e desejar tudo o que existiu e existe. Para suportar ou

superar tudo isso Nietzsche introduz o terceiro conceito, o do super homem. O super-homem

é aquele que vai superar tudo isso. Vai possuir a vontade de poder no seu extremo, vai amar e

desejar a volta do mesmo, porque o super-homem vive o sentido da terra, pois, deseja viver a

vida agora sem nenhum princípio organizador a não ser ele mesmo.

Palavras Chaves: Vontade de Poder. Vida. Vontade. Amar. Desejar. Valores. Superar. Criar.

ESTRATTO

Questo studio si propone come obiettivo di comprendere il concetto della volontà di potere in

Nietzsche. Per capire il concetto di volontà di potere in Nietzsche dobbiamo partire dalla

comprensione del concetto di volontà in Schopenhauer. Per quest’ultimo il mondo è

rappresentazione e volontà. La volontà è la cosa in sé e in sé. La volontà è il mondo in se ed

per sé. Il mondo in sé è volontà. La volontà è cieca, irrazionale e immutabile. La volontà si

manifesta nel corpo, a causa di ció la volontà è dolore e sofferenza. Per ricercare la felicità

dobbiamo negare la volontà attraverso la contemplazione, attraverso le arti e soprattutto

attraverso la musica. Dunque si tratta di una volontà metafisica. Per Nietzsche la volontà di

potere è l’espressione della vita, della esaltazione della vita, senza un senso metafisico,senza

religione,senza morale, e senza alcun principio organizzatore. La volontà di potere è per

Nietzsche l’esaltazione della vita e niente più. Per dimostrare questo percorso presenterò la

volontà di potere nella conoscenza, nell’arte, nella natura e nella morale. In tutti questi

momenti la volontà di potere è la crescita di forze, del potere di fronte alla vita. In questo

modo Nietzsche introduce il concetto di eterno ritorno. Tutto ritornerà perché il mondo è

sempre esistito. Il tempo è infinito e le forze sono finite. In tal modo Nietzsche sostiene che

tutto ritornerà. Il concetto di amor fati, invece, consiste per Nietzsche nell’amore del nostro

destino, amare e desiderare tutto ciò che è esistito e esiste. Per rafforzare il suo ragionamento

Nietzsche introduce infine il concetto del superuomo. Il superuomo è quello che supererà tutto

questo. Possiederà la volontà di potere all’estremo, amerà e desidererà il ritorno dello stesso,

perché il superuomo vive il senso della terra, desidera vivere la vita ora, senza nessun

principio organizzatore che non sia se stesso.

Parole Chiave: Volontà di Potere. Vita. Volontà. Amare. Desiderare. Valori. Superare. Creare.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................................06

2 APROXIMAÇÂO AO CONCEITO DE VONTADE EM SCHOP ENHAUER ........08

2.1 Conceito de Vontade em Schopenhauer.......................................................................08

2.1.1 Vontade e Representação.......................................................................................................09

2.1.2 Vontade e Vida.................................................................................................................12

3. VONTADE DE PODER COMO CENTRO DA VIDA ................................................18

3.1 Vontade de Poder em Nietzsche.....................................................................................19

3.2 A Vontade de poder no Conhecimento..............................................................................23

3.3 A Vontade de poder na Natureza...................................................................................26

3.4 A vontade de poder na Arte............................................................................................29

3.5 A vontade de poder na Moral...........................................................................................31

4. A CONSTRUÇÃO DO HOMEM NIETZSCHIANO .................................................37

4.1 Eterno Retorno................................................................................................................37

4.2 Amor Fati.........................................................................................................................42

4.3 Super-homem......................................................................................................................44

5 CONCLUSÃO.................................................................................................................50

REFERÊNCIAS................................................................................................................53

1 INTRODUÇÃO

Nietzsche refletiu não somente sobre o papel destrutivo do querer, mas também e,

sobretudo, sobre seu poder criativo. Se sua filosofia foi compreendida como um golpe de

martelo que tudo destrói, ele também nos mostra que ela possui também a força da criação.

É verdade que ela tem como alvo demolir as antigas doutrinas, os antigos valores, mas

se ela o faz é justamente para tornar o ser humano mais flexível, mais feliz e suas mãos mais

livres a fim de criar uma nova forma de viver, capaz de libertá-lo do peso existencial e da

miséria social que o oprime.

Como a vontade de poder pode ajudar a demolir e a reconstruir uma nova forma de

viver? A vontade é própria do ser humano? O que é uma vontade? Como surge à vontade?

Existe uma vontade livre conhecida pelos homens? Como ela se manifesta? No corpo? Na

alma? Em que lugar? São perguntas que poucas vezes fazemos em nossas vidas.

Vontade é um impulso desencadeado em ação? É o eu querer fazer? Esse querer fazer

seria a vontade? A vontade é a mediação entre o impulso e a ação? A vontade é um querer

fazer? Para a vontade se realizar há de ter a ação?

O objetivo geral do trabalho é compreender como a vontade de poder em Nietzsche

fundamenta um novo homem, uma nova postura perante as morais vigentes. Um homem que

se guia pelo princípio da vida. Uma vida que brota do homem, que é controlada pelo homem e

vivida a partir dos seus valores aqui na terra.

A base da pesquisa foram os livros dos próprios autores; Assim fala Zaratustra,

Vontade de Poder, Aurora, Genealogia da Moral, entre outros em Nietzsche. Em

Shopenhauer, O mundo como vontade e como representação. Porém, para um melhor

entendimento dos problemas busquei alguns comentadores, afim de que a pesquisa seja

consistente de boa compreensão e tenha êxito. Para tanto o modo de ler filosófico será

também uma preocupação constante para que sejam de fato captadas as idéias do autor

pesquisado.

A presente pesquisa pretende analisar o conceito de vontade em Schopenhauer para

analisar o conceito de Vontade de Poder em Nietzsche, a partir do livro Póstumo Vontade de

Poder, mas com passagens em outras obras do autor.

Portanto, primeiramente abordarei o conceito de vontade em Schopenhauer, fazendo

uma alusão de que foi de Schopenhauer que Nietzsche começa a pensar e desenvolver a sua

teoria, o seu o ensinamento sobre a vontade de poder. Para depois elucidar o conceito de

vontade em Nietzsche.

Em seguida busco demonstrar como Nietzsche elaborou o conceito de Vontade de

poder dentro da teoria do conhecimento, da arte, da natureza e na moral. Dessa forma

Nietzsche coloca a Vontade de Poder como o centro da vida.

Por fim busco esclarecer os pontos em que Nietzsche disserta sobre o conceito do

Eterno Retorno, Amor Fati e do Super-homem. A partir dessas idéias o Super-homem vai ser

aquele que viver tudo isso com a sua maior força. Aquele que viver o sentido da terra, e nada

mais do que isso.

2 APROXIMAÇÃO AO CONCEITO DE VONTADE EM SCHOPRNHAUE R

Todos os dias nos encontramos na seguinte situação, precisamos escolher isso ou

aquilo. Fazer isso ou aquilo. Temos necessidades e vontade de algo. Mas no dia a dia não

paramos para observar de onde vem o querer e a vontade.

Para iniciar a reflexão sobre a vontade de poder em Nietzsche é necessário entender o

conceito de vontade em Schopenhauer. Na obra intitulada: O mundo como vontade e como

representação, Schopenhauer apresentada a vontade como sendo o núcleo metafísico, que

apreendemos por meio de representações que temos da vontade. Portanto, eis a nossa primeira

tarefa, compreender o conceito de vontade em Schopenhauer.

2.1 Conceito de Vontade em Schopenhauer

Arthur Schopenhauer nasceu em 1788 na cidade de Danzig. Faleceu em 1860 em

Frankfurt, vítima de pneumonia. Nacionalidade Alemã. Ficou conhecido como filósofo

pessimista, devido a sua filosofia que nos diz que o mundo é um cenário de dores e

sofrimentos sem fim. Schopenhauer tem como obra principal O mundo como vontade e

representação. É nessa obra que Schopenhauer faz a descoberta da vontade como cerne do

enigma do mundo.

O cerne da filosofia de Schopenhauer é o conceito de “Vontade”. Ela é irracional e é

um ímpeto cego. Para Schopenhauer, a Vontade seria a porta de acesso à verdade do mundo.

Dessa forma Barboza (1997, p.20) expressa, “o núcleo das ações humanas é irracional e

inconsciente, é a Vontade”.

O conceito de vontade para Schopenhauer é,

À luz de toda a nossa visão, contudo, a Vontade é não apenas livre mas até mesmo todo-poderosa. Dela provém não só seu agir, mas também seu mundo. Tal qual ela é, assim aparecerá seu agir assim aparecerá seu mundo: ambos são seu autoconhecimento e nada mais. Ela determina a si e justamente por aí determina seu agir e seu mundo: estes dois são ela mesma, pois exterior à Vontade não há nada (SCHOPENHAUER, 2005, p.354-355).

A vontade é livre, autônoma e onipresente. Todavia, a ação e o seu mundo constituem

vontade consciente de si própria, determinando tal ação e tal mundo. Para Schopenhauer a

vontade em si mesma já contém vida. Força vital é idêntica a vontade.

Para Schopenhauer (2005, p. 376) “o intelecto experiência as decisões da vontade

apenas a posteriori e empiricamente.” A vontade se encontra acima do intelecto consciente.

Porque ela é uma força espontânea, esforçada e persistente. Schopenhauer (2005, p.379),

continua: “A vontade é o primário e originário; o conhecimento é meramente adicionada

como instrumento pertencente ao fenômeno da Vontade. Conseguintemente, cada homem é o

que é mediante sua vontade. Seu caráter é originário, pois querer é a base de seu ser.” O

homem se conhece em consequência da sua vontade. A sua vontade será o seu caráter.

Conforme Durant ([19--], p.42), “não queremos uma coisa porque encontramos razões

para isso, encontramos razões para isso porque a queremos; podemos até elaborar filosofias e

teologias para cobrir nossos desejos”.

Também podemos perceber a superioridade da vontade sobre o intelecto na seguinte

passagem de Durant ([19--], p.45),

O intelecto se cansa, a vontade nunca, o intelecto necessita do sono, mas a vontade trabalha mesmo durante o sono. A fadiga, tal como a dor, tem sua sede no cérebro, os músculos que não são ligados ao cérebro (como o coração) nunca se cansam. Cérebro se alimenta no sono, mas a vontade não necessita de alimento.

Para Schopenhauer o mundo é representação. E o mundo também é minha vontade.

Schopenhauer escreve: “Pois assim como este é, de um lado, inteiramente representação, é de

outro, inteiramente vontade” (2005, p. 45). A vontade em Schopenhauer é a coisa em si, é o

mundo em si e é em si. Ultrapassa o fenômeno e é independente da consciência. Assim, o

mundo em si é a Vontade, já para nós, seres conscientes, o mundo é representação.

2.1.1 Vontade e Representação

Segundo Barboza, a representação do mundo material é tudo aquilo que aparece para o

nosso entendimento, isto é, tudo o que aparece diante de nós. É pelos sentidos, pelo empírico,

pelos primeiros dados fornecidos pela experiência que conduzem à representação. Assim, o

sujeito é ativo, que possui à priori três formas de apreensão do mundo circundante, que são: o

tempo, o espaço e a causalidade.

Conforme Schopenhauer, para se conhecer as coisas, vê-las tal qual aparecem ao

homem são necessários as três formas, o espaço, o tempo e a causalidade. Porque as coisas

estão situadas num dado espaço, num determinado tempo e envolvida pela causalidade. Todo

acontecimento tem uma razão de ser, que no fundo tem outra causa também. Portanto uma

regressão infinita, sem chegar a uma causa primeira.

O tempo, o espaço e a causalidade para Schopenhauer são a base, ou melhor o

princípio da razão. Segundo Barboza;

O entendimento, portanto, ou cérebro (usando o princípio de razão) juntamente com os sentidos (principalmente o tato e a visão – esta como uma espécie de tato à distância) são imprescindíveis para a finitude humana, porque só por meio deles é que se tem acesso ao conhecimento (BARBOZA, 1997, p.33).

Para existir um mundo e um sujeito, Schopenhauer vai chamar atenção que se

necessita uma cabeça que pense, e um corpo que sinta. Nada adiante ter pernas, braços e olhos

se não tiver um cérebro. Também nada adianta ter um cérebro e não ter um corpo. Portanto, é

necessário aos seres humanos uma cabeça acoplada a um corpo, e que esses trabalhem juntos

para se ter de fato um mundo, ou seja, o objeto de representação. Podemos perceber isso na

seguinte passagem de Barboza (1997, p. 34) “O mundo externo, numa palavra, é minha

representação, não passa de uma atividade no interior da cabeça; se esta fosse cortada, o

mundo desapareceria”.

O mundo é representação, porque o que existe para o conhecimento é tão somente

objeto em relação ao sujeito, isto é, uma intuição de quem intui. Dessa forma, tudo o que

existe no mundo, está condicionado pelo sujeito. Existindo somente para ele. Nós não

conhecemos a coisa em si. O que conhecemos é a representação do objeto, através do tempo,

espaço e causalidade. Então, temos o intelecto para organizar o nosso conhecimento de seres

cognoscentes.

Por outro lado, o sujeito que faz a abstração é sempre a vontade única a constituir o

mundo. Dessa forma, o sujeito é o pilar central do mundo, é a condição central e sempre

pressuposta de tudo o que existe de objeto no mundo. Portanto, tudo o que existe, existe para

o sujeito. Nunca é ultrapassado o fenômeno.

Para Schopenhauer a palavra vontade contém o enigma da vida.

Tal palavra se chama VONTADE. Esta, e tão-somente esta, fornece-lhe a chave para seu próprio fenômeno, manifesta-lhe a significação, mostra-lhe a engrenagem interior de seu ser, de seu agir, de seus movimentos. Ao sujeito do conhecimento que entra em cena como individuo mediante sua identidade com o corpo, este corpo é dado de duas maneiras completamente diferente: uma vez como representação na intuição do entendimento, como objeto entre objeto e submetido às leis destes; outra vez de maneira completamente outra, a saber, como aquilo conhecido imediatamente por cada um e indicado pela palavra VONTADE. Todo ao verdadeiro de sua vontade é simultâneo e inevitavelmente também um movimento de seu corpo (SCHOPENHAUER, 2005, p.157).

O corpo é o ponto de partida para todo o conhecimento. Porque a causalidade oferece

os primeiros dados ao entendimento. Assim, o ato da vontade e a ação do corpo são uma única

e mesma coisa, somente dadas de forma diferente, uma age imediatamente e outra se dá na

intuição do entendimento.

Dessa forma, a ação do corpo é o ato da vontade objetivadora, a saber, o que apareceu

na intuição. Em outras palavras Schopenhauer vai dizer que, “a vontade é o conhecimento a

priori do corpo, e o corpo é o conhecimento a posteriori da vontade” (SCHOPENHAUER

2005, p.157).

Segundo Schopenhauer,

Todo ato verdadeiro, autêntico, imediato da vontade é também simultânea e imediatamente ato fenomênico do corpo; e, em correspondência, toda ação sobre o corpo é também simultânea e imediatamente ação sobre a vontade, que enquanto tal se chama dor, caso a contrarie, ou bem estar, prazer, caso lhe seja conforme (2005, p. 158).

Dessa maneira, Schopenhauer apresenta a vontade interligada ao corpo. Toda ação

sobre o corpo afeta simultaneamente a vontade e, nesse sentido, chama-se dor ou prazer.

Assim, para Schopenhauer a vontade é o mais íntimo núcleo de cada particular.

Portanto, a vontade vem do íntimo de cada ser. Então ela é una, cega, irracional e

imutável e é exposta através de fenômenos que estão no tempo, no espaço e na causa e efeito,

nos quais, esses são inumeráveis. O mundo fenomênico é um “véu de maia”, porque esconde

a verdade das coisas. O mundo fenomênico é uma ilusão, uma aparência enganadora das

coisas em si. Tudo isso porque Schopenhauer acredita que o mundo como representação e o

mundo fenomênico é aparência enganadora, devido que as coisas são um fluxo constante de

ser, um devir constante.

Para Schopenhauer (2005, p. 165), “todo o corpo não tem de ser outra coisa senão

minha vontade que se torna visível, tem de ser a minha vontade mesma na medida em que

esta é objeto intuível”.

Podemos perceber que para Schopenhauer a vontade é algo do íntimo de cada um e

não racional. Pode-se expressar de várias maneiras, que Schopenhauer chama de fenômenos.

O corpo é o caminho da ação.

O corpo é a condição do conhecimento da minha vontade. Não existe como

representar a minha vontade sem representar o meu corpo. Portanto, na medida em que

conheço a minha vontade dita como objeto, conheço-a como corpo. Dessa forma

Schopenhauer denomina as seguintes expressões como verdade filosófica:

Meu corpo e minha vontade são uma coisa só; ou, o que como representação intuitiva denomino meu corpo, por outro lado denomino minha vontade, visto que estou consciente dele de maneira completamente diferente, não comparável com nenhuma outra; ou, meu corpo é a OBJETIDADE da minha vontade; ou, abstraindo-se o fato de que meu corpo é minha representação, ele é apenas minha vontade etc. (SCHOPENHAUER, 2005, p. 160).

A vontade não dependente do homem. Ela existe por si só. Mas para se tornar um

fenômeno ela dependente do homem, do animal e das outras espécies de seres.

Contudo, o homem só pode agir sobre a vontade posteriormente a esta. Nunca irá tocar

o cerne da vontade. Noutros termos, o conhecimento ou a razão, podem impedir a

materialização da vontade em atos. Isto é, o arrependimento surge do cancelamento do ato

feito pela razão, ou seja, nunca com a vontade. Assim, o fundamento das coisas existentes é a

vontade que se expressa no corpo que por sua vez quer a satisfação das necessidades deste.

Todavia, jamais alcançaremos os desejos de nossas vontades. Porque a vontade

consiste num esforço que jamais atinge um alvo verdadeiro. Além disso:

Em toda parte da natureza vemos conflitos, lua e alternância da vitória, e aí reconhecemos com distinção a discórdia essencial da Vontade consigo mesma. Cada grau de objetivação da Vontade combate com outros por matéria, espaço e tempo. Constantemente a matéria que subsiste tem de mudar de forma, na medida em que, pelo fio condutor da causalidade, fenômenos mecânicos, químicos, orgânicos anseiam avidamente por entrar em cena e assim arrebatam uns aos outros a matéria, pois cada um quer manifestar a própria Idéia (SCHOPENHAUER, 2005, p.211).

Para Schopenhauer, o mundo em si, a essência do mundo é possível ser conhecida a

partir da “Vontade”. Ela a (Vontade), é cega, é irracional e é a essência do mundo.

2.1.2 Vontade e Vida

Para Schopenhauer os objetos reais estão apenas no presente, pois, o tempo presente é

a forma essencial e inseparável do fenômeno da vontade. De acordo com Schopenhauer

(2005, p.362), só o presente é aquilo que sempre existe e se mantém firme e imóvel. O

presente é a forma de toda a vida, o presente sempre existe junto com seu conteúdo.

Para Schopenhauer, a vontade é vida, pois ela quer viver. Lefranc (2005, p. 103-104),

faz a seguinte reflexão sobre vontade e vida.

A noção de vida nunca tem a mesma extensão da noção de vontade. Isto sob dois aspectos. Por uma parte, ‘uma primeira conclusão, portanto, é a força vital é idêntica à vontade; mas o mesmo se dá com todas as outras forças naturais (grifo nosso), embora ao fato seja menos evidente’. Por outra parte, ‘a qualificação da vida só convém ao ser organizado’. A consideração de organismo permite, então, traçar um limite nítido no interior da natureza: ‘Pode-se definir a vida como estado de um corpo que, através de mudança constante da matéria, conserva sempre a forma que lhe é essencial’. Muito pelo contrário, em um corpo não organizado, a conservação da forma é apenas acidental. A distinção entre e vontade repousa, deste modo, sobre a separação do reino orgânico e do reino inorgânico, tão difícil é pensar uma vontade sem vida.

Para Lefranc, vontade e vida possuem características distintas, elas não possuem a

mesma extensão mas se completam, ou seja, a vontade sem a vida nada é. A vontade é ativa e

se manifesta em diversos seres como fenômeno.

Segundo Schopenhauer, (2005, p.263) “a fonte e o sustentáculo de seu conteúdo é a

Vontade de vida, ou a coisa-em-si – que somos nós”. Ou seja, onde “há Vontade a vida é

certa, e onde há vida o presente é certo”. Para Schopenhauer, a vontade é a coisa-em-si. Isso

significa que a vontade é destituída de conhecimento. Porque ela é um ímpeto cego,

onipresente, una e indivisa. O único conhecimento é daquilo que ela quer e é. Ela é esse

mundo, essa vida, e tudo o que existe.

Como a vontade é vida e tudo o que existe no mundo, Barboza (1997, p.52) vai dizer

que; “a vontade é intrinsecamente autodiscórdia consigo mesma, o que se reflete na sua

visibilidade, na sua manifestação”. Seguindo o pensamento Durant (p.63) coloque que: “A

vida é má, porque a vida é guerra. Em toda a natureza vemos luta, competição, conflito e uma

alternância suicida de vitórias e derrotas.” Tanto o homem como a natureza são amor e ódio

ao mesmo tempo, sempre haverá construção e destruição, porque sempre haverá o devir.

Como a Vontade é a coisa-em-si, o conteúdo íntimo, o essencial do mundo, e a vida, o mundo visível, o fenômeno, é seu espelho; segue-se daí que este mundo

acompanhará a Vontade tão inseparavelmente quanto a sombra acompanha o corpo. Onde existe Vontade, existirá vida, mundo. Portanto, a Vontade de vida a vida é certa, e pelo tempo em que estivermos preenchidas de Vontade de vida, não precisamos temer por nossa existência, nem pela visão da morte (SCHOPENHAUER, 2005, p.358).

Para Arthur Schopenhauer a essência do homem, a essência da natureza em geral, é a

vontade que se manifesta no mundo como vida. A vontade é caracterizada como uma força

vital, destinada à propagação da vida e a conservação da espécie. Assim, a vontade é um

esforço sem fim, um ímpeto cego e sem fundamento, una e indivisa.

A Vontade é falta de uma coisa, é uma carência, é desejo. Se a Vontade é vida, então,

a vida é a busca por aquilo que falta, do satisfazer os desejos. Acerca disso, podemos dizer

então que a vontade é infinita. Que a vontade nunca será saciada, porque na superação de um

obstáculo aparecerá outro e mais outro, porque a vontade é infinita e jamais será saciada.

Assim, “a Vontade sempre quer é a vida, precisamente porque esta nada é senão a

exposição daquele querer para a representação é indiferente e tão-somente um pleonasmo se,

em vez de simplesmente dizermos ‘a Vontade’, dizermos ‘a Vontade de vida.’”

(SCHOPENHAUER, 2005, p.357-358).

Para Schopenhauer o homem é o fenômeno da vontade, ou seja, o ser humano é o

fenômeno mais perfeito da vontade pela sua capacidade de conhecer. De acordo com

Schopenhauer:

Todavia, o homem é fenômeno mais perfeito da vontade, como mostrado no livro segundo e, em vista da própria conservação, tem de ser iluminado por um tão elevado grau de conhecimento que, neste, é até mesmo possível, como mostrado no livro terceiro, uma perfeição adequada e perfeita da essência do mundo sob a forma da representação, ou seja, é possível a apreensão das idéias, o límpido espelho do mundo (SCHOPENHAUER, 2005, p. 373).

Para Schopenhauer é no homem que a vontade pode alcançar a plena consciência de

si. O conhecimento do homem pode alcançar um conhecimento distinto e integral da própria

essência tal qual esta se espelha em todo o mundo. A essência do homem é a vontade, e ele

mesmo é apenas fenômeno dessa Vontade.

Dessa forma Schopenhauer (2005, p. 401) vai dizer que:

A base de todo querer, entretanto, é necessidade, carência, logo, sofrimento, ao qual consequentemente o homem está destinado originariamente pelo seu ser. Quando lhe falta o objeto do querer, retirado pela rápida e fácil satisfação, assaltam-lhe vazio e tédio aterradores, isto é, seu ser e sua existência mesma se lhe tornam um fardo insuportável. A sua vida, portanto, oscila como um pêndulo, para aqui é para acolá, entre a dor e o tédio, os quais em realidade são seus componentes básicos.

A vida oscila, portanto, como um pêndulo, da direita para a esquerda, da dor ao tédio.

Isto é, uma alegria, uma felicidade negativa. Porque a nossa vida estaria submetida aos

desejos. Se existe desejos, há uma falta. Se, contudo, há uma falta, logo existe dor,

sofrimento. Portanto, para Schopenhauer a vontade apenas aparece,

Assim como uma lanterna mágica mostra muitas e variadas imagens, porém aí se trata de uma única e mesma flama que confere visibilidade a elas, assim também em todos os diversos fenômenos que um ao lado do outro preenchem o mundo ou se rechaçam como acontecimentos sucessivos, trata-se apenas de uma vontade que aparece. Tudo é sua visibilidade, objetividade. Ela mesma, no entanto, permanece imóvel em meio a essa mudança (SCHOPENAUER, 2005, p.218).

Logo, “tudo isso se assenta no fato de a Vontade ter de devorar a si mesma, já que

nada existe de exterior a ela, e ela é uma Vontade faminta. Daí a caça, a angústia, o

sofrimento” (SCHOPENHAUER, 2005, p. 219). A objetivação da vontade se dá no homem,

no seu corpo. Portanto, é o homem com o seu corpo que deseja, assim, abrindo a

concretização de milhares de necessidades e como conseqüência outros tantos sofrimentos.

A vontade sempre quer e deseja a vida. A Vontade quer a vida em todos os reinos. A

Vontade é sempre amor e ódio. Eis o grande drama da vida. A vontade existe em toda vida. A

vontade é um impulso cego que está presente em todos os seres vivos. Assim, a vontade não é

acessível à razão, mas se mostra através da razão. Então, o objetivo da vontade é a sua

satisfação, mas ela não é cognoscente. Assim para Schopenhauer a vontade é puramente

metafísica.

Assim sendo, o próprio mundo não permite a sua satisfação, devido os obstáculos que

existem na vida. Demais, não existe nenhuma forma de satisfação da vontade em sua

integralidade. Logo, na busca incessante das suas satisfações é que a vida se apresenta como

uma sucessão de sofrimento e dor.

Conforme Durant, ([19--], p.59), “porém se o mundo é vontade, tem de ser um mundo

de sofrimento. Primeiro porque a própria vontade é querer e ela quer agarrar sempre mais do

que pode alcançar. Para cada desejo que é satisfeito restam dez que não o são.” A vida é

sofrimento.

Para Schopenhauer (2005, p. 403),

A vida da maioria das pessoas é tão-somente uma luta constante por sua existência mesma, com a certeza de ao fim serem derrotadas. O que as faz, por tanto tempo, travar essa luta árdua não é tanto o amor à vida, mas sim temor à morte, que todavia, coloca-se inarredável no pano de fundo, e a cada instante ameaça entrar em cena. A vida mesma é um mar cheio de escolhos e arrecifes, evitados pelo homem com

grande precaução e cuidado, embora saiba que, por mais que seu empenho e arte o leve a se desviar com sucesso deles, ainda assim, a cada avanço, aproxima-se do total, inevitável, irremediável naufrágio, sim, até mesmo navega direto para ele, ou seja, para a MORTE. Esta é o destino final da custosa viagem e, para ele, pior que todos os escolhos que evitou.

A existência é uma roda de desejos. A existência existe por si. É o homem que a

busca, mas nunca encontrará. Por mais que escolhemos e escolhemos a morte sempre estará

aberta a nos receber. Fazemos de tudo para eliminar o sofrimento a dor e o tédio devido o

parentesco com a morte.

Os desejos nunca serão totalmente satisfeitos, assim sendo, a vida será de sofrimento,

dor, tédio. Conforme Schopenhauer (2005, p.404) “ora, assim como a necessidade é a praga

do povo, o tédio é a praga do mundo abstrato. Na vida civil o tédio é representado pelo

domingo, e a necessidade pelos seis dias da semana.” Após satisfazer um desejo, existem uns

dez que não o são. Então, o desejo realizado produz um novo desejo, assim até o infinito.

Para a superação do sofrimento, da dor, do vazio, do tédio, Schopenhauer propõe:

Aquilo que se poderia nomear o lado mais belo e a pura alegria de vida, precisamente porque nos arranca da existência real e nos transforma em espectadores desinteressados diante dela, é o puro conhecimento que pertence alheio a todo querer; é a fruição do belo, a alegria autêntica na arte. Mas mesmos isso requer dispositivos raros e cabe apenas a pouquíssimo e, mesmo para estes, é um sonho passageiros. Ademais, justamente as elevadas faculdades espirituais desses poucos os tornam suscetíveis a sofrimentos bem maiores que aqueles que os obtusos jamais podem sentir, e os coloca, dessa forma, solitários entre seres marcadamente diferentes, pelo que, a fim, as coisas se equilibram. (SCHOPENHAUER, 2005, p.404)

Enquanto a vontade for a força maior do homem, haverá sempre, sofrimento, tédio e

dor. Ou melhor, os males da vida continuarão. Só haverá uma mudança quando a vontade for

subordinada ao estado estético, de contemplação da Idéia, quando ocorre a negação da

Vontade, em vez de sua afirmação. Como o exemplo que Barboza (1997, p. 58) coloca:

“diante de uma bela pessoa, não se interessa em se envolver sexualmente com ela:

simplesmente a contempla de modo puro em sua idéia”.

Para a superação desse sofrimento, dessa Vontade, ao homem só resta os momentos de

silêncio da vontade, a contemplação objetiva do Belo natural e a experiência da mística do

desapego.

Mais adiante Barboza (1997, p.74) coloca:

Numa palavra: pela arte negamos a Vontade de vida: ora, alles Lebes Leiden ist, ‘toda vida é sofrimento’, logo, se não a queremos mais, deixamos de sofrer. É precisamente isso, a liquidação momentânea do querer-viver (e sofrer), o que

acontece nos instantes felizes de imersão no belo exposto pelo arquiteto, escultor, pintor e poeta.

A Vontade é para Schopenhauer a raiz metafísica do mundo e ao mesmo tempo a fonte

de todos os sofrimentos. A vontade é concebida como algo sem nenhuma meta ou finalidade,

um querer irracional e inconsciente. A existência humana é então um mal, pois ela gera dor,

sofrimento e tédio. A felicidade seria apenas a interrupção temporária de um processo de dor

ou sofrimento. Para Schopenhauer, o prazer é momento fugaz de ausência de dor e não existe

satisfação durável. “Viver é sofrer”.

Para Ramos,

[...] a vontade é não apenas a raiz metafísica do mundo como também a fonte de todos os sofrimentos. Ela é cega, irracional e sem finalidade. A felicidade e o prazer são considerados meramente negativos, pois residem em momentos transitórios de satisfação do querer, seguidos de imediato por novas solicitações do querer insaciável. A vida humana é assim descrita como um pêndulo que oscila constantemente entre a dor – incapacidade de satisfazer o querer – e o tédio, quando o querer não encontra objeto da satisfação. Ao homem só resta então buscar uma saída nos momentos de silêncio da vontade, na contemplação objetiva do Belo natural e artístico e na experiência mística do desapego: o nirvana das filosofias e religiões da índia (RAMOS, 2009, p.22).

Para Schopenhauer, a arte sem o princípio da razão conduz a imagens cristalinas.

Schopenhauer faz uma exaltação da música. Pois essa arte é a magnânima das artes. Pois a

arte pertence a uma única e indivisa essência cósmica que se objetiva. Já a realidade é

submetida ao princípio da razão, assim sendo ela é uma ilusão. Sempre que contemplamos o

belo o ‘véu de Maia’ caiu por terra e vemos o mundo em sua beatífica luz. Assim é quando

escutamos uma música, quando contemplamos um quadro, uma escultura ou quando lemos

uma poesia.

Assim, toda e qualquer contemplação genuína da beleza é a negação da Vontade. É a

negação dos desejos insatisfeitos, é a negação dos sofrimentos. Assim temos um sujeito

destituído de vontade. Um sujeito bem diferente do início do trabalho. Um sujeito que nega a

vontade para ter a felicidade.

Para Schopenhauer, a vontade de vida tem que ser negada para a salvação da nossa

existência. Com a negação da vontade de vida, Schopenhauer vai contra as manifestações

particulares da vontade no homem, volta-se contra o corpo, e principalmente contra a sua

própria individualidade, o seu querer, o seu desejo, a sua vontade.

3 VONTADE DE PODER COMO CENTRO DA VIDA

Nietzsche1 após ler O Mundo como vontade e como representação, apropriou se do

conceito de vontade. Para Nietzsche a vontade é a essência das coisas, mas não possui nada de

metafísico no seu conceito. Após a leitura do livro, Nietzsche escreve que a vontade além de

sua função cega e negativa da vida, ela é também uma força criadora que permite ao homem

fazer de si uma obra de arte, isso para Nietzsche se chama: vontade de poder. Eis a nossa

tarefa agora, explicitar o conceito de vontade em Nietzsche e explicitar como a vontade de

poder manifesta se na Natureza, no Conhecimento, na Arte e na Moral.

Para Nietzsche a vontade é a superação de si mesmo. Uma vontade que quer superar,

que quer crescer, que quer dominar e que quer vencer na vida. A vida é aqui na terra. É

chamado a se superar aqui na terra. Pois a vida é luta, conflito. Podemos perceber essa idéia

no livro A Gaia Ciência, onde se lê:

A vontade de querer preservar a si próprio é a expressão de um estado de indigente, uma restrição do verdadeiro e fundamental instinto vital, instinto que visa à expansão do poder e, em função disso, coloca muitas vezes em jogo e sacrifica, a autoconservação (NIETZSCHE, 2005, p. 190).

De acordo com Nietzsche a tendência da vida é a busca de poder. O sentido e a

afirmação da vida estão no poder. Assim, a vida seria para Nietzsche o acúmulo de poder e de

vontade de poder. Nas diferentes relações que se estabelecem no dia a dia tudo é relação de

poder. Portanto, a vida deve ser entendida na relação de poder e executada com total vontade

de querer o poder.

Para tal idéia Nietzsche usa a figura de Dionísio. A filosofia dionisíaca prega novos

valores. Com a filosofia dionisíaca, Nietzsche assume e prega novos valores. Dessa forma, a

vontade de poder, promove, aumenta e fortalece a vida em busca de novos valores. Viver isso

para Nietzsche é escapar da vida decadente e paralisante da escala dos valores tradicionais.

Para Nietzsche, poder é a capacidade que o ser humano tem de ao mesmo tempo de ser

útil e de auto prejudicar-se. “Quer dizer, o homem quer finalmente os meios por eles mesmos

e esquece-os como meios: a tal ponto que eles agora aparecem na consciência dele como fins

1 Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu em 15 de outubro de 1844 em Röcken e morreu em 1900, em Weimar, no dia 25 de agosto. Viveu numa família de pastores protestantes. A maior parte de seus livros são críticas a religião, a moral, e a tradição filosófica do Ocidente. Autor de vários livros. Para uma leitura sobre a vida e obra dE Nietzsche indico dois livros: NIETZSCHE, Os pensadores. Trad. Rubens Rodrigues Torres Filho. Ed. 2°. Abril Cultural, São Paulo, 1978. NIETZSCHE. Ecce Homo. Trad. Marcelo Backes. L&PM, Porto Alegre, 2008.

e como critérios dos fins” (NIETZSCHE, 2008, p.194). Dessa forma Nietzsche estima os

homens que tenham a capacidade de usar e adquirir o poder e a plenitude da vontade.

3.1 Vontade de Poder em Nietzsche

Na filosofia tradicional a vontade é tratada como, “um conceito cuja extensão é

antropológica e teológica, pois ele denota um dos poderes presentes nos homens e em Deus,

sendo até mesmo o ponto de semelhança máxima entre Criador e as criaturas” (MOURA,

2005, p.183). Nesse período a conotação de vontade é muito forte. Vontade sendo uma

faculdade, “um atributo exclusivo da inteligência humana ou divina, nunca um atributo da

natureza”. Dessa forma, a vontade é um poder, uma faculdade dos seres pensantes.

Segundo Moura (2005, p. 184), “Nietzsche vai se esforçar para libertar o conceito de

vontade dessa coisificação falsificadora, procurando determiná-lo para aquém dos esquemas

da razão instituídas”. Portanto, nas obras de Nietzsche devemos entender a vontade como uma

determinação que deve recobrir a totalidade do contexto da realidade. E não entendida como

uma faculdade, que o conceito fique preso no antropológico ou teológico. Porque a vontade

aqui falada é o mundo.

O mundo aqui falado é uma “monstruosidade de força, sem início, sem fim, uma

firme, brônzea grandeza de força, que não se torna maior, nem menor, que não se consome,

mas se transmuda... quereis um nome para esse mundo?” (MOURA, 2005, p.185). O mundo

que Nietzsche está falando sem dúvida é a ‘Vontade de poder’2. A vontade deve ser

apreendida como a ação de um ator, o eu, como um fazer algo por querer sempre esse algo.

Dessa forma não existe a separação dos fins da ação.

Todavia,

Se a vontade é um querer-para-além-de-si, então reside nesse para-além-de-se-mesmo o fato de a vontade não se estender simplesmente para fora de si, mas se inserir concomitantemente no querer. O fato de aquele que quer se inserir em sua vontade significa no querer tornar-se manifesto o querer e, juntamente com ele aquele que quer e aquilo que é querido. Na essência da vontade, na de-cisão, reside o fato de a vontade descerrar a si mesma (HEIDEGGER, 2007, p.48).

2 Os intérpretes das obras de Nietzsche divergem sobre o conceito de Vontade de Poder. Alguns usam em suas obras o conceito de Vontade de poder e outros usam o conceito Vontade de Potência. Com isso, adotarei o conceito Vontade de poder.

Dessa forma temos uma vontade que quer comandar-se a si mesma. Temos aqui uma

vontade que é decisão para si, um ir além de si. Então, “o querer mesmo é um assenhoramento

sobre... que se estende para além de si; querer é em si mesmo poder. O poder é o querer que é

constante em si. Vontade é poder e poder é vontade” (HEIDEGGER, 2007, p. 39).

No livro A Vontade de Poder, Nietzsche faz seguinte colocação:

Quero, antes defender que a vontade quer ir adiante e sempre de novo se tornar senhora daquilo que está em seu caminho: o sentimento de prazer jaz justamente no não-apaziguamente da vontade, no fato de que ela, sem os limites e resistências, ainda não está satisfeita o bastante...(NIETZSCHE, 2008, p. 352).

Para Nietzsche a vontade é um comando que ultrapassa a si mesmo podendo até

chegar a se sacrificar a sua vida. A vontade é um assenhoramento sobre algo. Ultrapassa além

dele e de si. A vontade é sempre criadora e destruidora. Além disso, Marton (1990, p.33)

escreve que: “A vontade é livre, não porque pode escolher, mas porque implica um sentimento de

superioridade.” Sempre que a vontade esteja voltada para além de si, a vontade, ao mesmo

tempo está criando e aniquilando-se. A vontade é uma força intensificadora, que tem como

base o caráter de comando, de criar e de afirmar-se e de ser superior aquilo que desejei.

Portanto a,

Vontade fala da espontaneidade do irromper da vida, de seu livre movimento de auto-exposição ou aparição. Espontaneamente, gratuitamente, vida é acontecimento de vir à luz, fazer-se visível e, assim crescer, isto é, agravar-se intensificar-se. E isso mesmo é poder, à medida que é realização e, então, assim, impõe-se, impera, vige e vale. É a força – esta força-concretizada. Vida é vontade de poder, quer dizer, desde nada, a partir de nada, movimento livre e gratuito, sem por que, sem causa de, para aparição e, então, assim, imposição, vigência – poder. Vida, enquanto e como vontade de poder, é a fala do extraordinário, do milagre que o grego experimentou como o elementar de ser-aparecer (NIETZSCHE, 2008, p.11).

Nietzsche no livro Assim falou Zaraiustra introduz o conceito de vontade de poder da

seguinte forma: “Nunca um vizinho compreendeu o outro; sempre a sua alma se assombrou

da loucura e da maldade do vizinho. Sobre cada povo está suspensa uma tábua de bens. E

vede: é a tabua dos triunfos dos esforços; é a voz da sua vontade de poder (2003, p.58).

Acerca disso podemos perceber que todos os povos têm suas necessidades e tem suas

diferenças. E é a ela que os povos devem seguir, porque nelas estão estipulados os castigos e

culpas. Dessa forma Nietzsche começa estruturar o seu pensamento sobre a vontade de poder.

No livro Assim Falou Zaratustra, Nietzsche nos diz que: “Quando vos elevais acima

do louvor e da censura, e quando a vossa vontade, como vontade de um homem que ama e

quer mandar em todas as coisas, então assistis à origem da vossa virtude” (NIETZSCHE,

2003, p.70). O mundo é de atritos. Só o super-homem poderá sobreviver. Essa vontade que

Nietzsche fala é a vontade de poder, é uma vontade pela qual tudo se curve perante o homem.

Nietzsche coloca em Assim falou Zaratustra: “É preciso, porém, que tudo se amolde e

curve perante vós! Assim o quer a vossa vontade. É mister que fique punido e submisso ao

espírito como seu espelho e sua imagem” ( NIETZSCHE, 2003, p. 95). A vontade de poder é

algo inato e que se deve cultivar. Podemos dizer que o que a vontade quer é satisfazer as

nossas vontades, acumular poder e deixar fluir os nossos reais desejos.

Para Nietzsche a vontade deve ser realizada aqui na terra. Mesmo que ele tenha que

destruir o que é dado para que aconteça o vir a ser, nisso se constituiria a vontade de poder.

Isso acarretaria o peso de suportar e superar o peso de ser juiz, vítima e testemunha do que a

de mais alto e de mais baixo nos seus sonhos.

E onde há sacrifício, serviço e olhar de amor há também vontade de ser senhor. Por caminhos secretos desliza o mais fraco até à fortaleza, e até mesmo ao coração do mais poderoso, para roubar o poder. E a própria vida me confiou este segredo: “Olha - disse – eu sou o que deve ser superior a si mesmo” (NIETZSCHE, 2003, p. 96-97).

O elemento próprio da vida é vontade, vontade de crescer. Crescer em clareza, nitidez,

e lucidez da própria história, do destino e do movimento histórico de cada pessoa, por si só.

Para Nietzsche (2003, p. 114), “a vontade não pode querer para trás: não pode aniquilar o

tempo e o desejo do tempo é a sua mais solitária aflição”. Tudo isso é sentido, destino e

crescimento, portanto isso é a intensificação do poder, da vida. E Nietzsche continua: “A

vontade é um criador. Todo o “foi” é fragmento e enigma e espantoso azar, até que a vontade

criadora acrescente: ‘Mas eu assim quero! Assim o hei de querer” (NIETZSCHE, 2003,

p.115).

Para Nietzsche a vontade de poder é uma tentativa de uma transvaloração de todos os

valores, para isso ser possível é preciso também se ouvir, se sub-ouvir, a cada passo, a

pergunta de Zaratustra: “Quem deve ser o senhor da Terra? Terra é um outro nome para dizer

o acontecimento gratuito, essencialmente finito, sem porquê, sem para quê, da vida”

(NIETZSCHE, 2008, p.13).

A real resposta de Zaratustra: “Senhor da Terra há de ser aquele que obedece ao

sentido da Terra. O sentido da Terra é vontade de poder, isto é, livre e espontâneo

crescimento-intensificação do acontecimento vida. Desde nada, para nada, inutilmente”

(NIETZSCHE, 2008, p.13).

Na apresentação da obra A Vontade de Poder, Fogel escreve que o conceito de

vontade de poder é o pensamento fundamental da obra. Dessa forma, se tem a necessidade de

saber os conceitos básicos da tradição para confrontar, para atravessar, para perpassar e para

superá-los. “Superar fala, sim, de ultrapassar, de um ir sobre, para além e, assim, incorporar

tais conceitos desde um outro horizonte, a partir de um outro registro, a saber, princípio, vida,

visto (ou vista) enquanto e como vontade de poder e, claro, tudo que isso implica”(FOGEL,

2008, p.12).

No livro Aurora Nietzsche (2004, p. 201), escreve sobre o sentido de poder,

“distingamos bem: quem deseja adquirir o sentimento de poder; recorre a todos os meios e

não despreza nada que possa alimentá-lo. Quem tem, porém, tornou-se bastante seletivo e

nobre em seu gosto; raramente alguma coisa o satisfaz”.

Segundo Marton (1990, p. 39), “a vontade de potência pode vir a manter aquilo de que

se apoderou; a preservação de seus domínios, porém jamais será seu objetivo”. Seguindo com

Marton, ela vai nos dizer ainda que a vontade de poder não busca simplesmente manter os

seus poderes, mas ela quer antes dominar tudo o que se encontra a seu redor. Assim, a

conservação é uma consequência. Mas a vontade de poder não pode deixar de querer poder,

porque isso já pertence ao seu ser.

A vontade de poder é a superação das suas próprias vontades. Vontade é o modo de

ser, de desejar, querer. A vontade vai de encontro do poder. Portanto, “a vontade de poder é,

antes, a vontade em que o próprio poder é poder, em sua força de possibilitação. Todo

empenho vigoroso e pleno de si é uma vontade que, por si mesma e desde si mesma,

manifesta poder e é poder”( FERNANDES; MORAES, 2008, p.19).3

Conforme Moura (2005, p. 200), “toda a vida será compreendida por Nietzsche como

uma luta de potências, em que diferentes centros de força se determinam por sua relação a

potência antagônicas.” O cerne do conceito de vontade de potência é a superação de si. A

superação de si, diz Nietzsche, já está contida na vida.

Conforme Marton (1990, p. 39), na vontade de poder “não existe nenhum objetivo a

atingir, nenhuma meta a alcançar; a vontade de potência é desprovida de qualquer caráter

teleológico, assim como a luta que se desencadeia pelo fato de ela exercer-se”. Dessa forma

podemos perceber no livro A Vontade de poder Nietzsche (2008, p. 509) a seguinte passagem:

Se o mundo tivesse um fim, ele haveria de já ter sido alcançado. Se houvesse para ele um estado final não intencional, então este haveria de já ter sido, do mesmo modo alcançado. Se ele fosse capaz, em geral, de um persistir, de um tornar-se petrificado, de um “ser”, tivesse ele, em todo o seu devir, somente por um momento, essa capacidade do “ser” então ele teria chegado mais uma vez, há muito tempo, ao

3 Conforme a tradução de Marcos Sinésio Pereira Fernandes, Francisco José Dias de Moraes. Nietzsche. A vontade de poder. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008.

fim do devir, também ao fim do pensar, ao fim do “espírito”. O ato do espírito como um devir prova que o mundo não tem nenhum fim, nenhum estado final e é incapaz de ser.

Para Nietzsche, o mundo é eterno. A partir dessa idéia Nietzsche vai postular o

conceito do eterno retorno do mesmo, que veremos no último capítulo. Assim Marton (1990,

p.56) escreve: “Não houve momento inicial, pois a vontade de potência não se pode atribuir

nenhuma intencionalidade; tampouco haverá instante final, pois a ela não se deve conferir

caráter teleológico algum”.

3.2 A Vontade de poder no Conhecimento

Na filosofia sistemática a teoria do conhecimento elabora a estrutura do pensamento e

é a partir disso vai dizer o que é verdade. A verdade é conseqüência do sistema. Assim se

conhece o objeto que se enquadra no sistema. Portanto a teoria do conhecimento na filosofia

sistemática segue certas regras de raciocínio, nos quais dependem as argumentações.

Para Nietzsche os raciocínios não devem ser elaborados a partir de conceitos

imaginários abstratos ou universais. Porque, para Nietzsche, a validade dos argumentos é

constatada na realidade, no mundo real.

Nietzsche vai contra essa filosofia sistemática que estrutura o seu pensamento sobre

lógica aristotélica. Ele não aceita o pensamento que a partir da lógica se chegue à verdade

pura. Um pensamento desvinculado do mundo da vida.

Dessa forma Nietzsche vai colocar no livro Além do bem e do Mal o seguinte

aforismo:

Depois de por muito tempo ler nos gestos e nas entrelinhas dos filósofos, disse a mim mesmo: a maior parte do pensamento consciente deve ser incluída entre as atividades instintivas, até mesmo o pensamento filosófico; aqui se deve mudar o modo de ver, como já se fez em relação à hereditariedade e às características “inatas.”[...] em sua maior parte, o pensamento consciente de um filósofo é secretamente guiado e colocado em certas trilhas pelos seus instintos. Por trás de toda lógica e de sua aparente soberania de movimentos existem valorações, ou, falando mais claramente, exigências fisiológicas para a preservação de uma determinada espécie de vida (NIETZSCHE, 1992, p.11).

Com esse aforismo Nietzsche demonstra que o pensamento não é efeito do querer

pensar logicamente os objetos. Nietzsche vê antes do pensar uma luta pela vida, uma reação

instintiva para a preservação da vida. Uma preservação da vida do ser humano na luta do dia a

dia.

O grande erro dos filósofos foi terem pensado que a lógica criou o pensamento. O

correto é que o pensamento criou a lógica. A lógica é uma estrutura gramatical e nada além

disso. Foi posta pelo pensamento. Portanto, para Nietzsche (1992, p. 23), “um pensamento

vem quando “ele” quer, e não quando “eu” quero; de modo que é um falseamento da realidade

efetivar dizer: o sujeito ‘eu’ é a condição do predicado ‘penso’”.

O conhecimento é o cerne do ser humano. O conhecimento pertence ao ser humano. A

partir do conhecimento o ser humano se desenvolve e determina a sua visão de mundo e de

ser humano. É com o conhecimento que o ser humano constrói e planeja a sua vida, a sua

existência nesse mundo.

Nietzsche dedica todo o terceiro livro da obra A Vontade de Poder, para a questão do

conhecimento para a busca da verdade. Já no início Nietzsche descreve que do conhecimento

é que derivou a ciência.

As compreensões mais valiosas são achadas mais tardiamente: mas as compreensões mais valiosas são os métodos. Todos os métodos, todas as pressuposições de nossa ciência de agora tiveram contra si, durante milênios, o mais profundo desprezo: por causa deles, foi-se excluído do trato com homens de bem – era se considerado ‘inimigo de Deus’, desprezador dos supremos ideais, ‘possesso’ (NIETZSCHE, 2008, p.255).

Para Nietzsche o método foi a descoberta mais valiosa dos últimos anos. Porque a

ciência em si estava subordinada aos homens que diziam o que era verdadeiro ou falso. Nesse

tempo as verdades já estavam pré-estabelecidas por pessoas que se julgavam donas da

verdade. Só era verdade aquilo que era esperado para determinado fim.

Com o passar dos tempos a humanidade com os seus pensadores acreditaram que

poderiam chegar a verdade desde que usassem os métodos, ou critérios para tal objetivo.

Assim, se desenvolveu a razão, consciência e a lógica para a busca do verdadeiro

conhecimento.

Com o conhecimento o ser humano passa a dominar o mundo, passa a querer controlar

as forças da natureza. Dessa forma, o conhecimento é entendido como um instrumento de

dominação. Com isso, Nietzsche (2008, p. 282) coloca que na verdade: “Há muitos olhos.

Também a esfinge tem olhos: conseqüentemente, há muitas ‘verdades’, e, conseqüentemente,

não há nenhuma verdade”.

O conhecimento não é racional e nem empírico. O conhecimento é uma relação entre

objeto e fatos reais. Com a relação entre objetos e fatos reais, o ser humano constrói estruturas

mentais, sendo por sua vez, as verdades para o sujeito. Para Nietzsche (2008, p. 310) os “‘fim

e meio’, ‘causa e efeito’, ‘sujeito e objeto’, ‘fazer e sofrer’, ‘coisa em si e manifestação’,

como interpretação (não como fato) e em que medida talvez como interpretações necessárias?

(como interpretações que conservam) todas no sentido de uma vontade de poder”.

Tudo isso não são verdades e sim interpretações. Colocamos significados para uma

determinado fim. Por exemplo: “Pomos uma palavra onde começa a nossa incerteza, onde não

podemos ver adiante, por exemplo, a palavra ‘eu’, a palavra ‘fazer’, a palavra ‘sofrer’: tais

são, talvez, linhas do horizonte de nosso conhecimento, mas não verdades” (NIETSCHE,

2008, p. 260). O que existe são relações entre coisas sensíveis, e disso só podemos imaginar

as coisas.

O ser humano com a sua capacidade de criar imagens mentais atribui a elas uma

realidade que muitas vezes são transcendentes. Dessa forma esse mundo transcendente é

colocado como ideal e perfeito. Já o mundo sensível é colocado como aparente devido as suas

mutações, ou seja, devido ao processo do devir. Dessa forma Nietzsche faz uma crítica ao

mundo verdadeiro e aparente.

Desses, o primeiro é pura ficção, formada a partir de coisas meramente simuladas. A aparência pertence, ela mesma, à realidade: é uma forma de ser; isto é, em um mundo em que não há nenhum ser, há de ser criado pelo aparente, primeiramente, um certo mundo computável de casos idênticos: um andamento no qual observação e comparação sejam possíveis etc. Aparência é um mundo preparado e simplificado, no qual trabalharam nossos instintos práticos: ele é, para nós, perfeitamente adequado: a saber, vivemos, podemos viver nele: prova de sua verdade para nós... o mundo, abstraído de nossa condição de vivermos nele, o mundo que não reduzimos ao nosso ser, à nossa lógica e aos nossos preconceitos psicológicos, não existe como mundo ‘em si’; ele é, essencialmente, mundo-relação: tem, segundo as circunstância, a partir de cada ponto, sua face diferente: o seu ser é essencialmente, em cada ponto, outro: ele pressiona em cada ponto, cada ponto lhe resiste – e essas somas são, em cada caso, inteiramente incongruentes. A medida de poder determina que essência em outra medida de poder: sob que forma, domínio e coação esse ser atua ou resiste. Nosso casso particular é bastante interessante: fizemos uma concepção para podermos viver em um mundo, para perceber apenas o suficiente, o que suportamos... (NIETZSCHE, 2008, p. 295).

Para Nietzsche o mundo aparente é o mundo real. Todos os postulados metafísicos são

criação da razão humana, por isso são apenas ilusões. Assim o mundo das aparências, ou seja,

o mundo real é concebido segundo os valores de cada sujeito que percebe a realidade. Assim,

Nietzsche rejeita toda a metafísica.

Portanto para Nietzsche:

O conhecimento trabalha como instrumento do poder. Assim, torna-se claro que ele cresce com cada aumento de poder... Sentido do ‘conhecimento’: aqui há de tornar-se o conceito rigorosa e estritamente como antropocêntrico e biológico, assim como em ‘bem’ e ‘mal’. Para que uma determinada espécie se conserve – e cresça em seu poder – precisa compreender, em sua concepção de realidade, uma porção de calculável e invariável suficiente para que, sobre ela, possa ser construído um esquema de seu proceder. A utilidade da conservação, não uma necessidade abstrata teorética qualquer de não ser enganado, é o motivo por trás do desenvolvimento dos órgãos do conhecimento...estes se desenvolvem de modo que a observação é suficiente para nos conservar. De outro modo: a medida da vontade de conhecer depende da medida do crescimento da vontade de poder da espécie: uma espécie agarra tanto a realidade quanto possa assenhorar-se dela, quanto possa tomá-la a seu serviço (NIETZSCHE, 2008, p.259-260).

O conhecimento não busca a verdade, ou seja, busca o desenvolvimento da vida

através do incremento da vontade de poder. Com o domínio do conhecimento o ser humano

coloca a natureza sob seu controle, assim, aumentando o seu controle. Para isso, cria e

transforma órgãos e outros instrumentos para melhor alcançar os seus objetivos. Porque para

Nietzsche (2008, p. 303), “o princípio da não-contradição deu o esquema: o mundo

verdadeiro, para o qual se busca o caminho, não pode estar em contradição consigo, não pode

mudar, não pode devir, não tem nenhuma origem e nenhum fim”.

O conhecimento é um meio de dominação, ou seja, um instrumento por meio do qual a

vontade de poder se expressa e incrementa a vida. Podemos perceber bem isso no aforismo

110 da Gaia da Ciência onde está intitulado ‘Origem do conhecimento’. Assim ele escreve:

“Portanto, a força do conhecimento não resiste no seu grau de verdade, mas no seu grau de

antiguidade, no seu grau de incorporação, no seu caráter de condição vital”.

Portanto, o conhecimento deve servir para que o ser humano se conserve, cresça em

seu poder, e que sirva para compreender a realidade a partir dele. Com o conhecimento o ser

humano deve construir esquemas de seu proceder para a sua conservação e não um sistema

teorético de teorias metafísicas sem utilização.

3.3 A Vontade de poder na Natureza

Para compreender Nietzsche e os seus conceitos é mister a compreensão do conceito

de “Força”. A partir desse conceito estruturado, Nietzsche elabora os seus pensamentos sobre

vida, mundo e ser humano.

Para Nietzsche,

O conceito vitorioso, “força”, com o qual nossos físicos criam Deus e o mundo, necessita ainda ser completado: há de ser-lhe atribuído um mundo interno que designo como “vontade de poder”, isto é, como insaciável ansiar por mostrar o poder; ou emprego, exercício de poder, pulsão criadora etc (NIETZSCHE, 2008, p. 319).

Se o conceito de força for simplesmente abstrato não podemos representar. Já por

exemplo em um cachorro, é possível atribuir a ele a vontade de poder em todas as suas

pulsões; como também, em todas as funções da vida orgânica, pois, todas são derivadas de um

mundo interno, isto é, derivadas pela Vontade de poder.

Para Marton, Nietzsche

Concebe então a vontade de potência como vontade orgânica; ela é própria não unicamente do homem, mas de todo ser vivo; mais ainda: exerce-se nos órgãos, tecidos e células, nos numerosos seres vivos microscópios que constituem o organismo. Atuando em cada elemento, encontra empecilhos nos que o rodeiam, mas tenta submeter os que a ela se opõem e colocá-los a seu serviço. Manifestando-se ao deparar resistências, desencadeia uma luta que não tem pausa ou fim possíveis (MARTON,1993, p. 62).

Portanto, a vontade de poder é uma vontade orgânica, ela atua também no inorgânico,

sendo própria de todo ser. É essa ‘força’ que faz com que as coisas se agreguem e

desagreguem, no entanto, essa força natural não é divina, mas sim uma força do universo. Um

exemplo dessa força compreensível na natureza: no caso de uma Tsunami onde uma onda

gigante arruína uma ilha inteira, porém algum tempo depois é possível que ali nasça outra

vegetação no mesmo local.

Para Deleuze na obra Nietzsche e a filosofia a força é:

Que a força se relaciona com uma outra, seja para ordenar seja para obedecer, eis o que nos conduz ao caminho da origem: a origem é a diferença na origem, a diferença na origem é a hierarquia, quer dizer, a relação entre uma força dominante e uma força dominada, entre uma vontade que submete e uma vontade submissa (DELEUZE, 2001, p.15).

Portanto, para esse mecanismo podemos chamar de vontade da natureza, uma força

que se relaciona com uma outra, seja para dominar ou para obedecer. Porque a força deseja a

dominação da outra. Assim, a força é cega, destruidora e restauradora, no entanto ela é

também regeneradora da vida a partir de si e para si mesma. Dessa forma, a vida é

identificada como força, impulso criador, energia e princípio dinâmico de unidade de todas as

funções orgânicas fundamentais, uma força que tem em si mesma o ponto de aplicação, ou

seja, a vontade é essa pura afirmação de si.

Segundo Nietzsche (2008, p. 324) “não há autoconservação: cada átomo atua sobre o

ser em sua totalidade – ele é abstraído se se abstrai essa irradiação de vontade de poder”. Essa

afirmação da vida desde o seu estádio simplesmente biológico até à criação corporal e,

sobretudo essa tensão de criação e de instauração da ordem que a vida traz consigo, é

expressa, por Nietzsche, como vontade de poder. Portanto, além do homem, cada centro de

força constrói a partir de si todo o mundo restante. Para o homem e as forças orgânicas são

capazes de criar e destruir a partir de suas próprias forças.

Conforme a obra Gaia da Ciência, Nietzsche vai dizer que a vontade é sempre

vontade de algo, vontade de aumento de poder. Assim ele coloca:

A vontade de querer preservar a si próprio é a expressão de um estão de indigente, uma restrição do verdadeiro e fundamental instinto vital, instinto que visa à expansão do poder e, em função disso, coloca muitas vezes em jogo e sacrifica, a autoconservação.[...] A luta pela vida é exceção; restrição momentânea de querer viver; o interesse das lutas, grandes e pequenas, continua a ser o da preponderância, do aumento, da expansão, da força, conforme essa vontade de poder, que é precisamente a vontade de viver ( NIETZSCHE, 2005, p.190).

Dessa forma, conforme Marton (1993, p.62), “a força só existe no plural; não é em si,

mas em relação a; não é algo, mas um agir sobre”. Então a vontade de poder é assim vontade

de viver, e vontade de viver é, especialmente, capacidade de criar, dominar, impelir a vida

para uma plena realização de si.

Este impulso vital não tem outra lei, não tem outro ponto de referência senão

precisamente o incremento da própria vida. Dessa forma, a força é um efetivar-se. Conforme

Marton (1993, p. 62), as forças, “atuando sobre outras e resistindo a outras mais, ela tende a

exercer-se até o limite, manifestando um querer-vir-a-ser-mais-forte, irradiando uma vontade

de potências”.

Acrescenta a autora:

Querendo-vir-a-ser-mais-forte, a força esbarra em outras, que lhe opõem resistência, mas o obstáculo constitui um estímulo. Inevitável, trava-se a luta por mais potência. Não há objetivos a atingir; por isso ela não admite trégua nem prevê termo. Insaciável, continua a exercer-se a vontade de potência (MARTON, 1993, p. 63).

Deste modo, toda força é força de vontade de poder, que quer se apoderar das demais

para continuar a lutar. Cada força anseia por se tornar senhora de todo o espaço, por estender

a sua força por cima de todos. Dominar e exercer a sua força. Mas ela sempre se depara com

forças que querem a mesma coisa. Sempre há uma luta do mais forte com o mais fraco. E

assim o processo segue adiante.

Portanto, Nietzsche chega a conclusão que a vontade de poder é um efetivar-se da

força, dessa forma, o mundo seria simplesmente a vontade de poder. Nada além disso.

3.4 A Vontade de poder na Arte

Nietzsche no livro A Vontade de Poder inicia o capítulo intitulado “A vontade de

poder na arte” do seguinte modo: “Nossa religião, moral, e filosofia são formas de décadence

do homem. O contramovimento: a arte” (2008, p.397). Por que o contramovimento é a arte?

Com essa passagem Nietzsche vem combater a religião cristã e a filosofia de Platão.

Pois a religião cristã e também Platão diziam que este mundo não vale nada, é preciso que

haja um mundo “melhor” do que este mundo enredado na sensibilidade, é preciso que haja um

‘mundo verdadeiro” acima deste, o mundo supra-sensível (HEIDEGGER, 2007, p.67). Assim,

para Nietzsche a arte é o contramovimento. A arte é esse mundo sensível, aparente.

Dessa forma Nietzsche escreve;

A arte e nada como a arte! Ela é a grande possibilidade da vida, a grande sedutora para a vida, o grande estimulante da vida...A arte como única força contrária superior, em oposição a toda vontade de negação da vida; anticristã, antibudista e antiniilista par excellence. A arte como a redenção de quem conhece, - daquele que vê e quer ver o caráter terrível e problemático da existência, mas antes o vive e quer vivê-lo, do homem que é guerreiro trágico, do herói. A arte como redenção do sofredor, - como caminho para estados nos quais o sofrer é querido, transfigurado, divinizado; nos quais o sofrer é uma forma do grande arrebatamento (NIETZSCHE, 2008, p. 427).

Aqui Nietzsche está nos colocando que ser artista é ser transparente e ter força para

produzir e posicionar sobre algo que ainda não foi criado. Para tanto ele compara o artista

com o infantil. Isso lembra a passagem do livro de Nietzsche Assim falou Zaratustra em que o

espírito se transforma em três tipos: o espírito em camelo, camelo em leão, o leão em criança.

Com o camelo temos o “Tu deves” carregar as verdades eternas. Sofrer de fome por

causa da verdade. Tu deves amar os que de desprezam e estender a mão aos famintos. Como o

leão temos o “Eu quero”, demonstrando a liberdade de dizer eu quero. Mas não de criar novos

valores. O leão tem a liberdade, mas não a capacidade da criação. Para a transformação do

espírito necessitamos o espírito de criança. A criança que é a inocência, o esquecimento, um

novo começar a cada novo momento, um brinquedo que com tudo brinca a partir de si mesma,

afirma tudo com uma santa afirmação de si mesma. Dessa forma temos o jogo da criação. O

espírito deseja a vontade de criança que tudo afirma para a criação do seu mundo, deixando

para trás o mundo supraterrestre.

Ser artista é o modo maximamente transparente da vida. Vida é a forma que nos é mais conhecida do ser. A essência maximamente interna do ser é a vontade de poder. No ser artista depararemo-nos com o modo mais transparente e conhecido da vontade de poder (HEIDEGGER, 2007, p. 64).

Ser artista é viver de certa forma um estilo de vida, uma vida transparente, um ser

animado para criar, para o querer, para atuar e para o viver sempre o querer do devir. Sendo

dessa forma, o artista vive a essência da vontade de poder. Assim, o ser artista vive com a

criação artística e com o ser criado.

Dessa forma, a arte é uma atividade criadora, que se mostra a si, e que se torna

transparente ao seu máximo. Portanto, a arte é estimulante, ela nos faz elevarmos-nos, ela faz

o ser alçar para além de si, ela faz o ser buscar mais poder, portanto, a arte é o poder puro, isto

é, a arte é vontade de poder em seu estado genuíno.

Para Nietzsche a arte deve ser um movimento contra o niilismo. A arte deve promover

e criar, preparar e fundamentar novos valores na sociedade. A arte é vista como fundamento e

medida para novas leis. Para tal criação, Nietzsche vai recorrer à tragédia grega. Vai recorrer

à figura de Apolo e Dionísio.

Podemos perceber esse pensamento na seguinte passagem do seu livro:

Apolíneo, dionisíaco. – Há dois estados nos quais a arte, ela mesma, irrompe no homem como um poder da natureza, impondo-se, queria ele ou não: de um lado, como coração para a visão; de outro lado, como coação para o orgiástico. Ambos os estados também estão presente na vida normal, apesar de mais atenuados, no sonho e na embriaguez. Mas a mesma oposição ainda subsiste entre sonho e embriaguez: ambos desencadeiam em nós poderes artísticos, mas são diferentes: o sonho é o poder de ver, do combinar, do poetar; a embriaguez é o poder do gesto, da paixão, do canto, da dança (NIETZSCHE, 2008, p. 397-398).

Segundo Scarlett Marton, Nietzsche contrapõe o apolíneo e o dionisíaco. O apolíneo

seria a arte da ponderação e do domínio de si. O dionisíaco teria o caráter de vertigem e

excesso. Dessa forma, Nietzsche percebendo as manifestações dos dois na tragédia grega,

coloca que são duas pulsões cósmicas que encontram o equilíbrio entre elas.

Mas podemos perceber na citação acima que para Nietzsche ao mesmo tempo em que

contrapõe um com o outro mostra que cada um deles está inserido em si mesmo. Que o

dionisíaco e o apolíneo são dois pólos diferentes.

Nietzsche quer dizer que a embriaguez é essencial para a elevação de força e de

plenitude. Dessa forma Heidegger (2007, p.91) coloca que: “o essencial é, agora, a maneira

como nós nos encontramos juntos a nós mesmos e aí ao mesmo tempo junto às coisas, junto

aos entes que nós mesmos somos”. Para Nietzsche o essencial da embriaguez é o sentimento

de elevação da força e o sentimento de plenitude que a embriaguez traz. A embriaguez

significa a conquista clara da forma. Segundo Heidegger (2007, p. 106), “Criar é enfatizar os

traços centrais, é ver da maneira mais simples e mais intensa”.

Dessa forma, a arte é para Nietzsche uma figura da vontade de poder. A arte precisa

ser vista a partir do artista como uma força criadora que quer a auto-afirmação no âmbito no

qual somos e com o qual nos identificamos. A arte é o real, e o real é a vontade de poder.

Nietzsche reconhece que um princípio fundamental da arte é a embriaguez.

Como vimos no segundo capítulo a música para Schopenhauer é um instrumento de

contemplação da vontade, isto é, um anestésico. A música servirá para esquecer as dores e

sofrimentos do mundo. A música em Schopenhauer é a negação da vontade de viver. Em

Nietzsche, porém, a música é focalizada como aspecto produtivo. Nietzsche vê no sofrimento

e na dor a expressão da alegria, pois as duas coisas são faces da mesma moeda.

3.5 A Vontade de poder na Moral

Com o livro Genealogia da Moral, Nietzsche pretende mostrar à humanidade o que

está escondido no sentido do valor da moral. Para tanto, busca fazer uma releitura da história

da moral, buscando nos costumes e no modo de estabelecimento do costume a fundação da

moral. Para a desconstrução da interpretação da tradição sobre a moral, Nietzsche vai usar

dois instrumentos como meios norteadores, que são eles a história e a filologia.

Nietzsche não aceita a imposição dos símbolos como algo verdadeiro, como já

estabelecido, como um fundamento absoluto. Porque isso exclui a possibilidade de construção

do ser, do conhecer e do agir do homem. Nunca houve um questionamento quanto ao valor

dos valores morais. Porque isso era dado como real, como além de qualquer dúvida, como

verdadeiro. Ora, é esse o problema que Nietzsche vai levantar. Os valores morais são

absolutos ou foram construídos? E se foram construídos, por quem foram construídos e sob

que valoração?

As investigações genealógicas no livro Genealogia da moral, tem como objetivo a

questão de onde se originam verdadeiramente nosso bem e nosso mal.

[...] sob que condições o homem inventou para si os juízos de valor ‘bom’ e ‘mau’? e que valor têm eles? Obstruíram ou promoveram até agora o crescimento do homem? São indícios de miséria, empobrecimento, degeneração da vida? Ou, ao contrário, revela-se neles a plenitude, a força, a vontade da vida, sua coragem, sua certeza, seu futuro? (NIETZSCHE, 2007, p.9).

Nietzsche vai criticar a moral tradicional pela depreciação da vida, a subordinação da

vida a um valor transcendente ao invés de um valor no plano imanente. Com isso, a

importância dos valores morais deixou de ser vista sobre a questão da transcendência para

uma visão dos valores morais no mundo, na terra, associados à vontade de poder. Porque para

Nietzsche (2006, p.66) “não existem fenômenos morais, apenas uma interpretação moral dos

fenômenos...” Quem interpreta? O que ele avalia? A partir de que procedimento? O que quer

aquele que avalia? Quem faz essas perguntas é o homem. Quem as responde é o homem.

Logo quem deseja e avalia é o homem. Portanto, não existem valores morais transcendentes e

sim imanentes colocados pelos homens em diferentes contextos e lugares.

Para essa crítica Nietzsche (2007, p. 12) vai colocar que:

[...] necessitamos de uma crítica dos valores morais, o próprio valor desses valores deverá ser colocado em questão – para isso é necessário um conhecimento das condições e circunstâncias nas quais nasceram, sob as quais se desenvolveram e se modificaram (moral como conseqüência, como sintoma, máscara, tartife, doença, mal-entendido, mas também moral como causa, medicamento, estimulante, inibição, veneno), um conhecimento tal como até hoje nunca existiu nem foi desejado.

Consta aqui a inversão crítica da moral proposta por Nietzsche. A pergunta de

Nietzsche não é dos valores já existentes, mas sim, sobre o valor desses valores. Para Marton

(1990, p.72).

Se o valor dos valores “bem” e “mal” não chegou a ser posto em questão, é porque eles foram vistos como existindo desde sempre: instituídos num além, encontravam legitimidade num mundo supra-sensível. No entanto, uma vez questionados, revelam-se apenas “humanos, demasiados humanos”; em algum momento e em algum lugar, simplesmente foram criados.

Para descobrir esses questionamentos sobre o momento o lugar e criação dos valores,

Nietzsche vai “percorrer a imensa, longínqua e recôndita região da moral – da moral que

realmente houve, que realmente se viveu – com novas perguntas, com novos olhos: isto

significa praticamente descobrir essa região?” (NIETZSCHE, 2007, p. 13). O objetivo de

Nietzsche é retirar as máscaras que encobriam o sentido e o valor da moral e mostrar como os

valores morais estão associados a luta de vontades.

Para Nietzsche não existem fatos, apenas interpretações. Dessa forma Azeredo (2003,

p.8-9) vai colocar que; “a verdade, a universalidade, a essência, o ser e Deus são

interpretações introduzidas pelo homem no mundo, convenções que referendam um modo de

ser, que viabilizam uma dada existência”.

Para Nietzsche, o mais importante é o ato do ser humano criar, impor e valorar as

coisas. É um ato de apreciar e depreciar a vida a partir do seu ato, e sem ser imposto por um

ato absoluto. Dessa forma, o ato de apreciar, depreciar, de ter o domínio sobre o agir, do

interpretar e do avaliar se chama de vontade de poder.

Dessa forma, segundo Azeredo (2003, p. 44),

A análise dos valores apresenta dois aspectos: por um lado, o valor é o ponto de partida para a avaliação; por outro, o valor é estabelecido a partir de uma dada avaliação. A questão da avaliação é o ponto principal para o estabelecido de um valor como sendo ou não valor, enquanto referindo à promoção da vida.

Para a interpretação dos valores Nietzsche vai usar o método genealógico. Nietzsche

quer estudar os fundamentos da criação e das condições da criação dos valores. Os valores

morais segundo Nietzsche se originam de dois tipos de homens distintos, dos senhores e a dos

escravos. Eles são os elementos que vão proceder a avaliação e a criação dos valores morais.

No livro Além do bem e do mal, Nietzsche faz a seguinte descoberta:

Numa perambulação pelas muitas morais, as mais finas e as mais grosseiras, que até agora dominaram e continuam dominando na Terra, encontrei certos traços que regularmente retornam juntos e ligados entre si: até que finalmente se revelaram dois tipos básicos, e uma diferença fundamental sobressaiu. Há uma moral dos senhores e uma moral de escravos [...] (NIETZSCHE, 2006, p.155).

Nesse aforismo Nietzsche apresenta o resultado final do longo processo de

investigação histórica da moral. Em todas as morais que já existiram e que ainda existem

haveria para Nietzsche traços comuns, uma moral dos senhores ou uma moral dos escravos.

Na Genealogia da moral, na primeira dissertação, Nietzsche busca a origem dos

conceitos ‘bom e mau”, “bom e ruim”. Dessa forma, Nietzsche inicia a sua genealogia sobre

os conceitos:

Para mim é claro, antes de tudo, que essa teoria busca e estabelece a fonte do conceito “bom” no lugar errado: o juízo “bom” não provém daqueles aos quais se fez o “bem”! Foram os “bons” mesmos, isto é, os nobres, poderosos, superiores em posição e pensamento, que sentiram e estabeleceram a si e a seus atos como bons, ou seja, de primeira ordem, em oposição a tudo que era baixo, de pensamento baixo, e vulgar e plebeu. Desse pathos da distância é que eles tornaram para si o direito de criar valores, cunhar nomes para os valores: que lhes importava a utilidade! (NIETZSCHE, 2007, p. 19).

A afirmação da superioridade se dá na ligação entre o sentimento e o valor. Porque a

própria superioridade vem de um impulso interno. Assim os poderosos, os nobres que são

superiores na posição e nos pensamentos, estabeleceram os atos bons, em contraposição a

tudo o que era baixo, vulgar e plebeu. A origem do bom e do ruim se deu da seguinte forma: a

espécie superior de senhor, isto é, nobres, poderosos, posta em proporção com uma espécie

inferior.

[...] o homem da vontade própria, duradoura e independente, o que pode fazer promessas – e nele encontramos vibrante em cada músculo, uma orgulhosa consciência do que foi finalmente alcançado e está nele encarnado, uma verdadeira consciência de poder e liberdade, um sentimento de realização.[...] e como, com esse domínio sobre si, lhe é dado também o domínio sobre as circunstâncias, sobre a natureza e todas as criaturas menos seguras e mais pobres de vontade? O homem “livre”, o possuidor de uma duradoura e inquebrantável vontade, tem nesta posse a sua medida de valor: olhando para os outros a partir de si, ele honra ou despreza; e tão necessariamente quanto honrar os seus iguais, os fortes e confiáveis... (NIETZSCHE, 2007, p.49).

Para Nietzsche o homem de espírito livre é que possui coragem e vontade de colocar a

sua medida de valor sobre os inferiores. A partir de si, o homem forte olha os fracos e faz

juízos sobre seus valores. Assim, o homem forte segue a sua vontade de poder. A sua vontade

que diz para criar e dominar. O homem de vontade própria, afirma a partir dele, cria valores e

os fracos os seguem.

Dessa forma nos diz Azeredo (2003, p. 76), que “enquanto a moral de senhores tem

como ponto de partida o sentimento de distância e superioridade para introduzir avaliações, a

moral de escravos faz da igualdade e da fraqueza o móvel de suas avaliações”. O nobre toma

o escravo como escravo. O escravo teme os senhores. Os escravos são os precursores da

moral de rebanho, que estimula a fraqueza e a igualdade. É uma moral que generaliza ao invés

de particularizar. É uma moral que avalia o bom como o que favorece a coletividade e como

mau aquilo que a ameaça.

Segundo Nietzsche (2006, p. 156), “o homem de espécie nobre se sente como aquele

que determina valores, ele não tem necessidade de ser abandonado, ele julga: ‘o que me é

prejudicial é prejudicial em si’, sabe-se como o único que empresta honra às coisas, que cria

valores”. Os nobres são a base para estabelecimento dos valores.

Nietzsche procura mostrar que historicamente houve uma luta travada entre a

aristocracia-guerreira e a sacerdotal para a primazia de suas avaliações, ou seja, a da

afirmação de suas respectivas morais. Para Nietzsche a moral da aristocracia utilizava o

princípio da força. Desenvolve a musculatura, a saúde, a aventura, ou seja, todas as potências

do vigor e da força. Já a moral sacerdotal, desenvolve a decadência e a negação. A moral

sacerdotal busca a destruição da moral de senhores, quer fazer do homem um tipo decadente.

Nietzsche, em Assim falou Zaratustra, coloca que:

O homem é que pôs valores nas coisas com a intenção de se conservar; foi ele que deu um sentido humano. Por isso se chama “homem”, isto é, o que aprecia. Avaliar é criar. Ouvi, criadores! Avaliar é o tesouro e a jóia de todas as coisas avaliadas. Pela avaliação se dá o valor; sem a avaliação, a noz da existência seria oca. Ouvi-o criadores! A mudança dos valores é mudança de quem cria. Sempre aquele que cria destrói (NIETZSCHE, 2003, p. 58-59).

O homem aqui é definido como aquele que avalia, que coloca e confere sentido às

coisas. Porque o homem é vontade de poder. Dessa forma Nietzsche coloca: onde há vida, ali

encontrei vontade de poder. Ora, a vontade de poder é determinante de toda ação, logo o

interpretar e o avaliar se apresenta como impulso vital responsável pela criação. Para

Nietzsche, “exigir da força que não se expresse como força, que não seja um querer-dominar,

um querer-vencer, um querer-subjugar, uma sede de inimigos resistências e triunfos, é tão

absurdo quanto exigir da fraqueza que se expresse como força” (NIETZCHE, 2007, p. 36).

A partir da obra principal de Arthur Schopenhauer, O Mundo como Vontade e

Representação, Nietzsche se vê tomado pelo pensamento que encontrou naquele livro, onde o

mundo é visto sob dois aspectos: como representação, mas também como vontade. Para

Schopenhauer o mundo obedece à noção de causa e efeito, que se dá no âmbito do espaço e da

temporalidade.

Como vimos no segundo capítulo a vontade é uma força cega, sem razão e caótica, a

qual nosso pensamento, nosso entendimento, não pode acessar. Dessa forma o mundo não é

visto mais como tendo uma lógica. A ordem própria do mundo é o caos. Esta vontade interna

do mundo se manifesta em tudo aquilo que existe. Uma vontade superior. Uma vontade de

mundo. Uma vontade metafísica encontrada em todo agir.

Com esse pano de fundo Schopenhauer coloca que o homem conhecendo o fundo de

sofrimento e dor da existência, abriria mão de seus projetos e aspirações, porque o mundo

sempre demonstra o triunfo do sofrimento e da dor sobre a felicidade e a alegria. Portanto, o

homem nessa situação deveria renunciar ao agir, ou seja, renunciar ao próprio mundo.

Deveria adotar uma postura de contemplação.

Já para Nietzsche, o sofrimento e a dor do homem pretendem despertar no ser humano

a idéia de que tudo aquilo que existe merece ser valorizado, isto é, o real, a terra, e aceitá-lo.

Pois o sofrimento é apenas o outro aspecto do prazer. A partir dessas considerações Nietzsche

desenvolve uma visão sobre o mundo independente de fatores morais teleológicos ou

transcendentes. Portanto, o mundo não deve ser interpretado pelos parâmetros morais de

valor.

Conforme Nietzsche a vida é uma constante interação de forças. Assim, por detrás da

transformação sucessiva das coisas, a pulsão da vida permanece se manifestando na

multiplicidade das forças. Mas como as forças são finitas e o tempo é infinito devermos

sempre querer o instante. Dessa forma, a vontade de poder que é vida sempre desejará a sua

existência. E nunca a negará.

4 A CONSTRUÇÃO DO HOMEM NIETZSCHIANO

Nietzsche no livro A Vontade de Poder tem em vista o anúncio da sua filosofia, o

anúncio de uma nova valoração dos valores. Nietzsche propõe uma nova valoração no mundo,

porque, para ele a moral que está vigente no mundo foi, e está, corrompida deste de Platão.

A nova cultura deve ter como base as características de Dionísio e Apolo. É a filosofia

da vontade de poder, do eterno retorno do mesmo e da transvaloração de todos os valores.

Para Heidegger (2007, p.18), o “eterno retorno, vontade de poder e transvaloração de todos os

valores: essas são as três expressões diretrizes”, da obra de Nietzsche.

Conforme Lefranc (2007, p.306), “o eterno retorno é um pensamento que inclui sua

própria afirmação. A vontade de poder e o pensamento do eterno retorno implicam-se

mutuamente, apelam um ao outro”. Sobre a vontade de poder acabamos de ver no terceiro

capítulo como ela acontece e age. Eis a nossa tarefa agora. Ver como acontece esse

entrelaçamento entre vontade de poder e eterno retorno.

4.1 Eterno retorno

Com a capacidade de conhecer o homem começou a criar, inventar e planejar as coisas

segundo os seus gostos, assim, criou um mundo para si. Agora o homem é confundido com o

mundo, pois o homem é a relação com o mundo. Portanto, o mundo não passa de sua

interpretação sobre os fatos e sobre o mundo. Dessa forma Nietzsche (2008, p.294) escreve:

“O ‘mundo verdadeiro’, como o havemos concebido até agora – foi sempre a reincidência do

mundo aparente”. Mas o único e verdadeiro é esse mundo que nos cerca, em que nós vivemos.

Na concepção de Nietzsche só existe um mundo, o mundo das interpretações vitais. O

mundo é uma multiplicidade de forças que lutam por seu espaço. Podemos perceber isso no

último aforismo do livro A Vontade de Poder. Nietzsche faz a seguinte colocação em relação

ao conceito de vontade de poder:

Sabeis vós também o que é para mim “o mundo”? Devo mostrá-lo em meu espelho? Este mundo: uma imensidão de força, sem começo, sem fim, uma firme, brônzea grandeza de força, que não se torna maior, não se torna menor, não se consome, só se transforma e, como um todo, é de imutável grandeza, um orçamento doméstico sem gastos e sem perdas, mas, do mesmo modo, sem crescimento, sem ganhos,

encerrado pelo “nada” como por seu limite, nada que se desvaneça, nada desperdiçado, nada infinitamente extenso, mas sim, como força determinada, posto em um determinado espaço,não em um lugar que fosse algures “vazio”, antes como força em toda parte, como jogo de forças e ondas de força, ao mesmo tempo uno e vário, acumulado-se aqui e ao mesmo tempo diminuindo acolá, um mar em forças tempestuosas e afluentes em si mesmas, sempre se modificando, sempre refluindo, com anos imensos de retorno, com vazante e montante de suas configurações, expelindo das mais simples às mais complexas, do mais calmo, mais inteiriçado, mais frio ao mais incandescente, mais selvagem, para o que mais contradiz a si mesmo e depois, de novo, da plenitude voltando ao lar do mais simples, a partir do jogo das contradições de volta até o prazer da harmonia, afirmando a si mesmo ainda nessa igualdade de suas vias e anos, abençoando a si mesmo como aquilo que há de voltar eternamente, como um devir que não conhece nenhum tornar-se satisfeito, nenhum fastio, nenhum cansaço – este meu mundo dionisíaco do criar eternamente a si mesmo, do destruir eternamente a si mesmo, este mundo misterioso da dupla volúpia, este meu “além de bem e mal”, sem fim, se não há um fim na felicidade do círculo, sem vontade, se não há boa vontade do anel que torna a si mesmo – vós quereis um nome para este mundo? Uma solução para todos os seus enigmas? Uma luz também para vós, ó mais esconsos, mais fortes, mais desassombrados, mais ínsitos à meia-noite? Este mundo é a vontade de poder – e nada além disso! E também vós mesmos sois essa vontade de poder – e nada além disso! (2008, p. 512 - 513).

Nesse aforismo Nietzsche deixa bem claro a sua concepção de mundo, concluindo o

aforismo com muita sabedoria: “Este mundo é vontade de poder e nada além disso! E também

vós mesmos sois essa vontade de poder – e nada além disso!” Assim, o homem faz parte do

mundo, pela sua capacidade de criar e destruir, pela sua vontade de poder. O homem faz parte

desse conjunto de forças que constitui o mundo. O conjunto de forças que Nietzsche está se

referindo aqui é a vida. Nada além disso!

Nietzsche busca a idéia de luta em Heráclito. A idéia do movimento contínuo. Do

eterno devir. O construir e destruir são movimentos que surgem da guerra dos opostos. A

guerra ou a luta está em toda parte, ela é permanente. Os opostos combatem-se um contra o

outro e de uma forma que ora um ora outro tenha a supremacia. A luta aqui vista em

Nietzsche, é sempre pela dominação e nunca pela aniquilação do adversário. Dessa forma a

luta é infinita porque o tempo é infinito.

Após essas reflexões acerca do mundo, conforme a autora Marton,

Nietzsche não pode aceitar que ele chegue a um estado final. O caráter essencialmente dinâmico da força impede que ele não se exerça; seu querer-vir-a-ser-mais-forte impede que cesse o combate. A vontade de potência, impulso de apropriar e dominar, leva a força a querer prevalecer na relação com as demais; atuando em todas elas, desencadeia uma luta geral e permanente. Em suma, se o mundo tivesse algum objetivo, já o teria atingido; se tivesse alguma finalidade, já a teria realizado. [...] Finito, mas eterno: é o quanto basta para formular a doutrina do eterno retorno. Todos os dados são conhecidos: finitas são as forças, finito é o número de combinações entre elas, mas o mundo é eterno. Daí se segue que tudo já existiu e tudo tornará a existir. Se o número dos estados por que passa o mundo é finito e se o tempo é infinito, todos os estados que hão de ocorrer no futuro já ocorreram no passado (MARTON, 1993, p. 66).

Para Nietzsche as forças que atuam no mundo são praticamente infinitas. Dessa forma,

a força tem como finalidade o poder, o domínio e nunca o aniquilamento. Assim, o mundo

percebido, o mundo aparente que é o verdadeiro, não passa de um pequeno fragmento.

Portanto, o mundo do homem é um mundo que passa pelos sentimentos, pelas

intenções, pelos gostos e por uma finalidade, mas tudo isso segundo Nietzsche é apenas um

pequeno fragmento perante as forças enormes e múltiplas que constituem o mundo. Além

disso, a força ao consumir-se, sempre está expressando a vontade de poder, assim a força tem

como finalidade a criação da vida.

Durante um passeio pelos Alpes em 1881, Nietzsche detém-se ao lado de um rochedo

onde refletiu sobre os sentidos das vivências, das coisas que se repetem. Nesse lugar vem à

mente de Nietzsche o seu pensamento mais abissal, a visão do eterno retorno. Dessa forma no

livro A Gaia Ciência ele relata o seu pensamento. E assim ele escreve:

E se um dia ou uma noite um demônio se introduzisse na tua suprema solidão e te dissesse: “Esta existência, tal como a levas e a levaste até aqui, vai-te ser necessário recomeçá-la sem cessar, sem nada de novo, ao contrário, a menor dor, o menor prazer, o menor pensamento, o menor suspiro, tudo o que pertence à vida voltará ainda a repetir-se, tudo o que nela há de indizivelmente grande ou pequeno, tudo voltará a acontecer, e voltará a verificar-se na mesma ordem, seguindo a mesma impiedosa sucessão, esta aranha também voltará a aparecer, este lugar entre as árvores, e este instante, e eu também! A eterna ampulheta da vida será invertida sem descanso, e tu com ela, ínfima poeira das poeiras!”... Não te lançarias por terra, rangendo os dentes e amaldiçoando esse demônio? Ou já vivestes um instante prodigioso, e então lhe responderias: “Tu és um deus; nunca ouvi palavras tão divinas!”. Caso este pensamento te dominasse, talvez te transformasse e talvez te aniquilasse; perguntarias a propósito de tudo: “Queres isto outra vez e por repetidas vezes, até o infinito?”. E pesaria sobre tuas ações com um peso decisivo e terrível! Ou então, como seria necessário que amasse a ti mesmo e que amasse a vida para nunca mais desejar nada além dessa suprema confirmação! (NIETZSCHE, 2005, p. 179).

A doutrina do eterno retorno de Nietzsche, expressa nesse aforismo, é uma doutrina

cosmológica que terá conseqüência antropológica. Na vivência e na incorporação da teoria no

seu dia a dia o ser humano terá reflexos profundos nos seu modo de pensar e agir.

Para pensar a doutrina do eterno retorno, Moura escreve que “a doutrina só se sustenta

sob o horizonte da morte de Deus, ela só recebe seu direito de cidadania em um universo

inteiramente desdivinizado, sendo uma consequência da consideração de um mundo para qual

Deus morreu” (MOURA, 2005, p. 264). Com isso, Nietzsche apresenta a doutrina do eterno

retorno como a mais pesada e abissal e extrema forma do niilismo: o nada, sem sentido

eterno. Então, para Nietzsche quem acredita em Deus não pode acreditar no eterno retorno, e

quem acredita no eterno retorno não pode acreditar em Deus.

Na doutrina do eterno retorno se encontra duas teses fundamentais, dois pilares: o

primeiro pilar é que o tempo é infinito, e o segundo pilar da tese é que as forças são finitas.

Admitindo essas duas teses, logo temos o postulado que tudo retorna.

Conforme Moura;

Se Deus morreu, a idéia de um universo criado deve ser guardada na galeria dos preconceitos. Mas a recusa da noção de criação é, imediatamente, a admissão de que o tempo é infinito, pois somente sob o horizonte criacionista tem cabimento falar em um começo do tempo. Se em regime de niilismo Deus está morto, junto com ele foram enterradas as idéias de criação e de tempo finito; se o universo não foi criado, então há uma infinidade temporal do mundo para trás, e deve-se conceber como legítima a idéia de um regressus in infinitum (MOURA, 2005, p.266-267).

O mundo para Nietzsche é uma quantidade de força finita. Finita e fixa. Portanto,

temos as forças que são finitas e fixas, mas que se desenvolvem em um tempo infinito. A

força é essencialmente ativa, mas a força não pode criar casos infinitos, tem que repetir, por

isso já existiram muitos sistemas repetidos. Contudo, “quem vive em regime de morte de deus

precisa extrair está última conseqüência: o vir-a-ser não é a produção do novo, mas o retorno

do mesmo” (MOURA, 2005, p. 269).

Para Nietzsche, eterno retorno é uma forma de representação do tempo, uma

representação cíclica do tempo. Porque tudo o que aconteceu acontecerá eternamente. É um

eterno retorno do mesmo, são os ciclos da existência que retornam. Viver o eterno retorno e

viver sem uma arché. Viver sem nenhum princípio e nenhum fim escatológico.

É pensar e viver o tempo sem o final redentor. É viver cada gesto de modo de ser

digno de seu retorno. Viver como se tudo retornasse de novo. É viver algo desejando que ele

volte eternamente. Afirmar em cada ação o meu desejo do eterno retorno do mesmo é afirmar

a cada gesto, a cada ação o que eu desejei e quero que a cada momento retorne eternamente.

Conforme Nietzsche em Assim falou Zaratustra (2003, p.169-170):

Tudo vai, tudo retorna; a roda da existência gira eternamente. Tudo morre; tudo torna a florescer; correm eternamente as estações da existência. Tudo se destrói, tudo se reconstrói, eternamente se edifica a mesma casa da existência. Tudo se separa, tudo se saúda outra vez; o anel da existência conserva-se eternamente fiel a si mesmo. A todos os momentos a existência principia; em torno de cada aqui, gira a bola acolá. O centro está em toda a parte. A senha da eternidade é tortuosa.

Conforme Nietzsche, nossas vidas continuarão se repetindo infinitas vezes,

exatamente da mesma maneira como as estamos conduzindo agora. Portanto: Será que eu

quero passar a eternidade fazendo o que estou fazendo agora? Será que a decisão que estou

tomando hoje merece ser tomada sempre e infinitas vezes?

O agora é de verdade e o futuro não vai mudar sem que eu faça algo já! Para Nietzsche

o responsável é você mesmo. É você quem deve decidir se vale a pena a sua vida ou não, e

não esperar alguém falar para ti. Dessa forma, a cada decisão tomada por nós vai continuar

produzindo resultados, isto é, a responsabilidade por nossos atos aumenta a cada tomada de

decisões. É essa decisão que irá fazer o eterno retorno ser a chave de leitura de Nietzsche.

O único critério que se impõe por si mesmo, no entender de Nietzsche, é a vida. E a

vida é vontade de poder. O eterno retorno é primeiramente um pensamento cuja função é

transformar a atitude do homem a respeito da vida e de si mesmo, ter a coragem de dizer sim

à vida e ter a coragem de ser o que se é, isto é, viver segundo a sua vontade de poder.

Vontade de poder é criar, valorar. Como a criação de algo entra no eterno retorno? Criar algo

que sempre volta? Como isso é possível?

Conforme Marton (1993, p. 31) o eterno retorno de Nietzsche é assim compreendido:

Tudo retorna sem cessar. Se o universo tivesse algum objetivo, já o teria atingido; se tivesse alguma finalidade, já a teria realizado: Não existe um deus, soberano absoluto, com desígnios insondáveis. Todos os dados são conhecidos: finitos são os elementos que constituem o universo, finito é o número de combinações entre eles; só o tempo é eterno. Tudo já existiu e tudo tornará a existir. Cada instante retorna um número infinito de vezes, cada instante traz a marca da eternidade. O universo é animado por um movimento circular que não tem fim.

O mundo pensado como eterno retorno é a realidade em constante mudança, sem

causas nem finalidades, sem forças ou deuses que lhe imponham uma direção definida, à

exclusão de outras. Com o eterno retorno, o mundo é pensado como entregue ao jogo infinito

do tempo e à sucessão caótica de suas forças em luta por afirmação.

O tempo é infinito e as formas de existência que a realidade é capaz de assumir são

finitas, pode-se conceber que estas se repetirão indefinidamente e, portanto, retornarão

perpetuamente, não importa quão grande seja sua diversidade e número. Quem afirma o

eterno retorno de todas as coisas quer esta vida na sua totalidade, mesmo nos seus aspectos

mais dolorosos.

Dessa forma Nietzsche escreve:

Dissestes alguma vez ‘sim’ a uma alegria? Ó, meus amigos. Então dissestes também ‘sim’ a todas as dores! Todas as coisas estão encadeadas, forçadas; se algum dia quisestes que uma vez se repetisse, se algum dia dissestes: ‘Agradas-me, felicidade!’ Então quisestes que tudo tornasse. Tudo de novo, tudo eternamente, tudo encadeado, forçado: assim amastes o mundo; vós, os eternos, amai-o eternamente e sempre, e dizeis também à dor: ‘Passa, mas torna! Porque toda a alegria quer eternidade! (NIETZSCHE, 2003, p. 240).

Para Nietzsche, o afirmar o mundo sensível, o seu eterno retornar, ou seja, querer tudo

o que constitui a existência, é a maior prova de fidelidade à terra. Aquele homem que coloca o

sentido da terra na terra é aquela que afirma com coragem, força, inteligência que nada se

perde e tudo regressa ou retorna necessariamente.

O eterno retorno é a doutrina da adoração total da vida, através de todos os seus

enigmas e sofrimentos. Portanto a aprovação da alegria é também a aprovação da dor. O

homem que congregar o pensamento dos pensamentos em qualquer dos seus atos deve

perguntar a si mesmo. Quero o de tal modo que quererei realizá-lo por infinitas vezes? Dizer

sim é assumir um pesado fardo, é manifestar a vitalidade de um Super-Homem.

Conforme Moura:

A outra face do eterno retorno será o amor fati, aprender a sempre ver o belo na necessidade das coisas, com tudo o que isso implicará: renúncia ao ressentimento, à culpa, à vontade de vingança. Afirmação da vida e não sua negação, fim das acusações contra a existência – tal seria o resultado do pensamento do eterno retorno. O amor fati retorna aquela atitude dionisíaca diante da existência, o dionisíaco dizer-sim ao mundo, e ao mundo tal como ele é sem desconto, exceção e seleção (MOURA, 2005, p. 274).

Para Nietzsche a doutrina do eterno retorno exige uma transformação na atitude diante

da existência. Essa transformação por parte do homem implica a aprovação da existência que

ele viverá de modo a desejar viver isso e o que já se sucedeu. É preciso que cada acontecer

seja sentido como algo fundamental na sua vida, assim passará a ter significado para a vida.

Aqui podemos perceber que Nietzsche nega completamente a idéia de Schopenhauer da

negação da vida que foi vista no primeiro capítulo.

4.2 Amor Fati

Em latim, Fati é genitivo de Fatum. Fatum significa “fatalidade, destino”. Amor fati

significa, portanto, “amor ao destino”. Nietzsche quer dizer que devemos esperar um pouco

menos, lamentar um pouco menos e amar o sim dionisíaco. Nunca permanecer nas dimensões

não reais do tempo, no passado e no futuro, mas tentar, ao contrário, habitar o presente, dizer-

lhe sim ao amor fati, dizer sim a afirmação dionisíaca.

Se o mundo é tudo isso, o que resta ao homem é amá-lo. Porque o mundo ou a

existência é sem sentido ou finalidade, ou seja, o que resta ao homem é afirmá-lo. Dessa

forma Marton (1993, p.67) coloca que, “não temos escapatória: estamos condenados a viver

inúmeras vezes e, todas elas sem razão ou objetivo; tudo o que nos resta é aprender a amar o

nosso destino.”

Nietzsche no livro Vontade de poder (2008, p. 499-500) escreve:

Uma filosofia experimental assim, tal como a vivo, toma de antemão como ensaio mesmo as possibilidade do niilismo fundamental: sem que por isso fosse dito que ela estacionasse em uma negação, em um não, em uma vontade de não. Ela quer, antes, atravessar até o inverso - até um dizer sim dionisíaco ao mundo tal como ele é, sem subtrações, exceções e seleções – ela quer o eterno circuito - as mesmas coisas, a mesma lógica e não-lógica dos nós. O estado supremo que um filósofo pode alcançar: permanecer dionisíaco em relação à existência -: minha formula para tanto é amor fati.

Portanto amar a vida como ela é. Mas amar o que existe no presente exige, antes de

tudo, fugir do peso do passado, e fugir das promessas do futuro. É o que Nietzsche vai dizer

nesse aforismo:

Minha fórmula para a grandeza no homem é amor fati: não querer ter nada de diferente, nem para frente, nem para trás, por toda a eternidade... Não apenas suportar aquilo que é necessário, muito menos dissimulá-lo - todo o idealismo é falsidade diante daquilo que é necessário -, mas sim amá-lo... (NIETZSCHE, 2003, p. 67-68).

Para Abbagnano (1984, p.79) “a aceitação total da vida implica, como se viu, a

aceitação do passado, a vontade que ele seja tal como foi. No ato desta aceitação, a vida

mesma se põe como historicidade, e se liga ao passado, assumindo-o voluntariamente”. Dessa

forma, o amor fati liberta o homem do passado, porque, o que foi se transformou naquilo que

eu queria.

Segundo Lefranc (2007, p. 311), “o amor fati transforma um “foi” num “quero”, e

assim ele é libertação, assim ele é criador”. Nietzsche coloca em Assim Falou Zaratustra, que:

“A vontade é um criador. Todo o foi é fragmento e enigma e espantoso azar, até que a

vontade criadora acrescente: Mas eu assim o quero! Assim o hei de querer” (NIETZSCHE,

2003, p. 115) Nessa fórmula Nietzsche afirma o presente. Porque, se viver no passado é perca

de tempo são os homens fracos, ressentidos que vivem nele. Nietzsche prega ao homem forte

a necessidade de criar e amar o presente na sua totalidade, pois quem cria e destrói é o homem

com a sua vontade de poder.

Conforme Marton (1993, p. 67-68), “em vez de esperar que um poder transcendente

justifique o mundo, o homem tem de dar sentido à própria vida; em vez de aguardar que

venham redimi-lo, deve amar cada instante como ele é.” O amor fati é o amor ao necessário, é

o amor que aceita e quer o eterno retorno, ou seja, ele aceita e ama a repetição da vida. Assim,

por ser forte tal amor deseja o eterno retorno do mesmo. Portanto, ao desejar a volta de tudo, o

amor fati se mostra como uma atitude poderosa e corajosa, porque diz sim não apenas a todo

prazer, mas a todo sofrimento.

Desejo aprender cada vez mais a ver o belo na necessidade das coisas: é assim que serei sempre daqueles que tornam as coisas belas. Amor fati (amor ao destino): seja assim, de agora e diante, o meu amor. Não pretendo fazer a guerra ao que é feio. Não pretendo acusar, nem mesmo os acusadores. Desviarei o meu olhar, será essa, de agora em diante, a minha única negação! E, em uma palavra, portanto: não quero, a partir de hoje, ser outra coisa senão uma pessoa que diz Sim! (NIETZSCHE, 2005, p. 143).

Para Nietzsche o amor fati é a coragem de assumir as próprias conseqüências. É a

coragem de pensar e criar as próprias coisas. É a coragem de dizer sim aquilo que aconteceu

no instante. Porque o amor fati não se revela apenas nas relações de alegria da vida, mas

também nas dores, nos sofrimentos.

Portanto, para Nietzsche devemos amar a vida, o seu decorrer, devemos amar o devir,

amar o instante, tomando-o um eterno retorno. Dessa forma: “o ideal do homem mais

exuberante, mais vivo e mais afirmador do mundo, que não só aprendeu a se resignar e

suportar tudo o que existiu e é, mas deseja tê-lo novamente, tal como existiu e

é...(NIETZSCHE, 1997, p.59).

O Amor fati é uma afirmação incondicional da vida mesmo em seus sofrimentos e

dores. Assim, podemos dizer que o amor fati transforma o peso em leveza, a dor em alegria,

em força, em coragem.

4.3 Super-homem

Se houve alguém que tenha valorado as coisas foi o homem. Foi o homem que criou

todo o seu bem e todo o seu mal. O homem criou os valores e por ele podem destruir. Dessa

forma temos então, quem cria e destrói. Para Nietzsche, quem cria o bem pode criar o mal.

O homem é que pôs valores nas coisas com a intenção de se conservar; foi ele que deu um sentido às coisas, um sentido humano. Por isso se chama “homem”, isto é, o que aprecia. Avaliar é criar. Ouvi, criadores! Avaliar é o tesouro e a jóia de todas as coisas avaliadas. Pela avaliação se dá o valor; sem a avaliação, a noz da existência seria oca. Ouvi-o, criadores! (NIETZSCHE, 2003, p. 58).

O homem só é reconhecido pela sua capacidade de medir e avaliar tudo aquilo que o

advém, segundo seus princípios. Dessa forma, o processo avaliativo para Nietzsche é muito

mais do que apenas a capacidade de avaliar as coisas. Portanto, o processo avaliativo constitui

a integralidade do homem. Porque o homem é o exercício contínuo da avaliação. Logo, todas

as manifestações humanas, sentir, querer, imaginar, pensar implicam no processo avaliativo, a

saber, medir e valorar as coisas para si.

Esse estilo de pensar e executar o pensamento Nietzsche nomeou de “filosofar com o

martelo”.

O meu Eu ensinou-me um novo orgulho que eu ensino aos homens: não ocultar a cabeça nas nuvens celestes, mas levá-la descoberta; sustentar erguida uma cabeça terrestre que creia no sentido da terra. Eu ensino aos homens uma nova vontade: querer o caminho que os homens têm seguindo cegamente, e considerá-lo bom e fugir dele como os enfermos e os decrépitos (NIETZSCHE, 2003, p. 40).

A vida é esta. A vida se vive vivendo a vida aqui na terra. Sem se ocultar atrás de

nuvens celestes. Viver é o sentido da terra. Viver de cabeça erguida o sentido da terra. Viver o

sentido da terra é dizer e seguir o caminho do homem aqui na terra, sem nenhuma alma

celeste dizendo e ditando o que se deve fazer. É sim dizer eu quero o meu próprio destino aqui

na terra. Que o meu corpo seja tudo. Que o eu viva “o corpo cheio de ângulos, retos, fala com

mais lealdade, e mais pureza; fala do sentido da terra” (NIETZSCHE, 2003, p.40-41).

Na seqüência Nietzsche diz: “Na terra nada há maior que eu; eu sou o dedo ordenador

de Deus” – assim grita o monstro. Temos aqui de novo a idéia que o eu é o centro ordenador

da minha vida na terra. Nenhuma vida eterna ou deus nos orientar aqui.

Quando vos elevais acima do louvor e da censura, e quando a vossa vontade, como vontade de um homem que ama e quer mandar em todas as coisas, então assistis à origem da vossa virtude.”... “Essa nova virtude é o poder; um pensamento reinante e em torno desse pensamento uma alma sagaz: um sol dourado, e em torno dele a serpente do conhecimento”. .. “Meus irmãos, permanecei fiéis à terra com todo o poder da vossa virtude. Sirvam ao sentido da terra o vosso amor dadivoso e o vosso conhecimento” (NIETZSCHE, 2003, p. 70).

O homem deve ser firme nas coisas terrenas e adejar contra paredes eternas. Vivemos

na terra, assim desejamos viver o seu sentido completo, sentido humano. Que a nossa

inteligência e a nossa virtude de viver o sentido da terra nos ajudem a renovar os valores de

todas as coisas. Pois foram os homens que criaram, são eles que devem renovar ou destrói-los.

O mundo em que vivemos deve ser criado pelos homens que vivem o sentido da terra.

Não será uma força de outra parte do mundo que irá construir o mundo, e sim o homem com

inteligência e virtude. Portanto, para Nietzsche, “o que chamáveis mundo deve ser criado por

vós; a vossa razão, a vossa imagem, a vossa vontade, o vosso próprio mundo. E,

verdadeiramente, será para ventura vossa!” (NIETZSCHE, 2003, p.75).

Para Nietzsche a grande emancipação é a criação. Por isso que ele usa a figura da

criança para dizer, que temos que ser crianças e começar a criar novos valores. Ao criar nós

sofremos e transformamos. Eis a vida. A vida não está pronta, acabada, única, plena e

imutável. Somos nós os criadores da vida. Então tudo é possível, mas isso significa dor, e

morte. Essa parte Nietzsche compara as dores de mãe.

Na visão de Nietzsche o homem tem ascendência sobre os demais, porque é capaz de

dizer sim a si mesmo. Dessa forma, o homem é um ser de vontade, um ser que domina a sua

vontade, ou seja, domina o seu querer. O homem é o único ser soberano que possui a

capacidade e o poder sobre si mesmo.

Portanto, a memória deixa agora de ser medo do castigo para se tornar o guia do agir

do homem. Dessa forma, a memória torna:

O Homem da vontade própria, duradoura e independente, o que pode fazer promessas – e nele encontramos, vibrante em cada músculo, uma orgulhosa consciência do que foi finalmente alcançado e está nele encarnado, uma verdadeira consciência de poder e liberdade, um sentimento de realização (NIETZSCHE, 2007, p. 49).

Assim temos o homem que conhece o que pode e o que deve fazer. O homem possui o

controle de seu próprio destino. O homem governa e dirige a sua própria vida. Pela

capacidade de conhecer, o homem é responsável pelo seu agir, porque o homem é racional,

político e criador da civilização.

O ser criador é ser a vontade criadora, isto é, o “eu” ser e querer o seu próprio destino.

Todas as dores, os sentimentos estão aprisionados em mim, e é a minha vontade que irá

libertar-me do sofrimento.

[...] híbris é nossa atitude para com nós mesmos, pois fazemos conosco experimentos que não nos permitiríamos fazer com nenhum animal, e alegre e curioso vivisseccionamos nossa alma: que nos importa ainda a “salvação” da alma! Depois curamos a nós mesmos: estar doente é instrutivo, não temos dúvidas, ainda mais instrutivo que estar são – os que tornam doentes nos parecem mesmo mais necessários do que homens hoje em dia, não há dúvida, nós, tenazes, quebra-nozes da alma, questionadores e questionáveis, como se viver fosse penas quebrar nozes; assim nós devemos tornar cada vez mais passíveis de questionamentos, mais dignos de questionar, e assim mais dignos talvez – de viver? (NIETZSCHE, 2007, p. 103).

Segundo Nietzsche, nós homens, devemos ser os quebra-nozes. Devemos ter a

capacidade de questionar e ser questionados sobre os valores que a sociedade está apegada.

Devemos ser homens que fazem jus a razão humana, homem que usem o sentimento da

liberdade para se auto determinar e estabelecer os seus objetivos a seguir. Porque como o

próprio Nietzsche diz no livro Aurora (2004, p.25), “nada foi comprado tão caro como o

pouco de razão humana e de sentimento de liberdade que agora constitui nosso orgulho”.

Para Nietzsche a verdadeira doutrina da vontade e da liberdade é querer libertar. Isso

vai acontecer no momento que somos criadores. Que não tenhamos medo de criar. Que o criar

veja a vontade de poder do homem. Que a vontade venha do homem daqui da terra, que a

partir dele seja tudo criado. Assim, Nietzsche (2003, p.76) quer que: “A minha ardente

vontade de criar impele-me sempre de novo para os homens, assim como é impelido o

martelo para a pedra”.

Então para o próprio Nietzsche o homem é um conjunto de forças e nada mais. Dessa

forma Nietzsche escreve sobre o homem:

Eis a minha conclusão: o homem verdadeiro representa um valor bem superior ao tipo de homem desejável a qualquer ideal proposto até o presente; tudo quanto se tem desejado em relação ao homem nada mais foi que digressão absurda e prejudicial. Uma classe particular de homens queriam transformar em regra, acima da humanidade, suas próprias condições de conservação e de crescimento; todo desejo dessa espécie aviltou até agora o valor do homem, sua força e sua certeza no futuro: a mesquinhez do homem e sua intelectualidade medíocre panteiam-se hoje claramente quando deseja; a faculdade que permite ao homem fixar valores foi até o presente mal desenvolvida para fazer justiça ao valor real do homem e não somente ao valor desejado; o ideal foi até hoje a verdadeira força caluniadora do mundo e do homem, uma força que espalhou sobre a realidade seu sopro envenenado, a grande sedução para o nada...(NIETZSCHE, 1966. p.253-254).

Para Nietzsche “o homem é a corda estendida entre o animal e o Super-homem: uma

corda sobre o abismo; perigosa travessia, perigoso caminhar; perigoso olhar para trás,

perigoso tremer e parar” (NIETZSCHE, 2003, p.27).

O homem é a ponte e o fim. Uma passagem que leva ao seu fim, ao acabamento de si

mesmo. Para isso Nietzsche coloca que o homem deve viver como se estivesse extinguindo-

se. Desprezar os adoradores. Viver, sacrificar-se na busca pela terra, para que um dia a terra

seja dos super-homens.

Segundo Beardsworth;

O ‘além-do-homem’ é, portanto, o homem que terá assumido sua finitude. É aquele que terá uma disposição de forças que vem do interior de si mesmo. Essa disposição, ao assumir a passagem do tempo, atribui ao tempo seu devir e, com isso, liberta o futuro. O além-do-homem não é, pois, um tipo cujos traços são prescritos, de maneira a formar um futuro (um horizonte temporal) determinado pelo comportamento ético e político da humanidade (2003, p. 92-93).

O homem vive também para conhecer, para que um dia a terra viva o Super-homem. O

super-homem deve amar a vontade de poder. Porque a vontade é a virtude que deseja a

existência, que deseja o eterno retorno. A vontade de poder é sua existência e seu destino.

O sentido da existência do homem é a busca do Super-homem. O Super-homem é o

relâmpago que brota da sombria nuvem homem. O Super-homem é criado a partir da vida

humana, do humano. Toda a idéia do super-humano é do próprio ser humano que é tirada. É

das cinzas, dos delírios, das chamas do homem no mundo que brota o super-humano.

Zaratustra é o arauto do eterno retorno, é o anunciador do além-do-homem, é “aquele que sempre afirma”. Se criar é ultrapassar-se, a criatura deve prevalecer sobre o criador. É preciso haver morte para que surja o além-do-homem; ele aponta para uma nova maneira de sentir pensar, avaliar. Não é fruto de um progresso nem surge ao termo de uma reta ascendente, pois, no infinito, todas as retas tornam-se curvas. O universo é um movimento circular eterno; quem intervém, num momento qualquer, modifica o futuro e recria o passado. Eterno retorno e além-do-homem são ideias inseparáveis: este permite aceitar aquele, aquele é garantia deste (MARTON, 1993, p.35).

“Eu vos apresento o Super-homem! O Super-homem é o sentido da terra. Diga a vossa

vontade: seja o Super-homem, o sentido da terra. Exorto, meus irmãos, a permanecer fiéis à

terra e a não acreditar em que vos fala de esperanças supraterrestre” (NIETZSCHE, 2003,

p.25).

Ao anunciar o Super-homem, Nietzsche coloca que os homens da atualidade são

superáveis. Todos os seres têm apresentado alguma coisa de superior a si mesmo, e é a isso

que devemos seguir buscando, senão cairemos no refluxo, ou preferimos ser animais.

Também Nietzsche faz uma alusão que o super-homem é o sentido da terra. Em acreditar e

viver o sentido da terra. Dar valor a vida aqui na terra.

Segundo Marton, o Super-homem

Não se trata e um tipo biológico superior ou de nova espécie engendrada pela seleção natural, mas de quem organiza o caos de suas paixões e integra numa totalidade cada traço de seu caráter, de quem percebe que seu próprio ser está envolvido no cosmo, de sorte que afirmá-lo é afirma tudo o que é, foi e será. fazendo surgir novos valores, ele intervém num momento qualquer do processo circular, que é o mundo, e assim recria o passado e transforma o futuro (MARTON, 1993, p.69).

O Super-homem em Nietzsche será o mais alto exemplo do sim, da afirmação positiva

da vida, tanto pelo que diz respeito ao seu espírito, como pelo que é relativo ao seu corpo.

Portanto, o Super-homem, orgulhoso e livre, alegre e sereno, forte de corpo e alma, é a

representação suprema daquele que diz sim à vida, é o verdadeiro Dionísio. O Super-homem

há de aceitar a vida de braços abertos e há de afirmá-lo com os olhos abertos. Todos os deuses

morreram; agora viva o “Super-homem!” seja esta, chegando o grande meio-dia, a vossa

última vontade! (NIETZSCHE, 2003, p.72).

O Super-homem é a expressão da vontade de poder. Zaratustra afirma contra

Schopenhauer, uma vontade de vida. O que não vive não pode querer, mas aquilo que vive

deseja algo a mais que a vida, a vontade de poder. A vontade de poder determina as novas

valorações do Super-homem. O homem deve suprimir todos os valores da moral corrente, que

é uma moral de rebanho e tende ao nivelamento e à igualdade, ou seja, todos devem ser

transmutados.

Para Abbagnano (1984, p. 80),

A primeira característica do Super Homem é a sua liberdade. Ele deve libertar-se dos limites habituais da vida e renunciar a tudo o que os outros prezam: deve por todo o seu empenho em voar livremente, sem temor, por cima dos homens, dos costumes, das leis e das apreciações tradicionais.

Para que o Super-homem seja o futuro do homem que se torne plenamente o que ele é,

Nietzsche mostra através do canto intitulado “As três metamorfoses”. A passagem do espírito

de camelo para leão e de para criança.

Portanto, o Super-homem define-se por uma nova maneira de sentir. Um sujeito com

vontade de poder para querer e desejar sempre o que é do sentido da terra. Desejar sempre a

vida e nunca negá-la como em Schopenhauer. O Super-homem também se define por uma

nova maneira de pensar. Um sujeito livre para pensar sem Deus. O Super-homem também se

define por uma nova maneira de avaliar. Um sujeito livre e capaz de pensar e avaliar as coisas

a partir de si. A partir do sentido da terra.

5 CONCLUSÃO Pela pesquisa podemos perceber que na obra intitulada O mundo como vontade e como

representação, Schopenhauer apresentada a vontade como sendo o núcleo metafísico da sua

teoria. Apreendemos por meio de representações que temos da vontade. A vontade é livre,

autônoma e onipresente. Portanto, a vontade em si mesma já contém vida. Porque a força vital

é idêntica à vontade.

Para Schopenhauer o mundo é representação e vontade. A vontade em Schopenhauer é

a coisa em si, é o mundo em si e é em si. A vontade está interligada ao corpo. A vontade é

algo do íntimo de cada um e não racional. A vontade é destituída de conhecimento. Já o corpo

é a condição do conhecimento da minha vontade. Não existe como representar a minha

vontade sem representar o meu corpo.

A essência do homem, a essência da natureza em geral, é a vontade. A vontade se

manifesta no mundo como vida. A vontade é caracterizada como uma força vital, destinada à

propagação da vida e a conservação da espécie.

É no homem que a vontade pode alcançar a plena consciência de si. A objetivação da

vontade se dá no homem, no seu corpo. A vontade sempre quer e deseja a satisfação. Assim,

vontade é sempre amor e ódio. Eis o grande drama da vida.

Enquanto a vontade for a força maior do homem, haverá sempre, sofrimento, tédio e

dor. Ou melhor, os males da vida continuarão. Só haverá uma mudança quando a vontade for

subordinada ao estado estético, de contemplação da Idéia, quando ocorre a negação da

Vontade, em vez de sua afirmação. Portanto, a vontade de vida tem que ser negada para a

salvação da nossa existência. Com a negação da vontade de vida, Schopenhauer vai contra as

manifestações particulares da vontade no homem, volta-se contra o corpo, e principalmente

contra a sua própria individualidade, o seu querer, o seu desejo, a sua vontade.

Podemos concluir que Nietzsche após ler O Mundo como vontade e como

representação, apropriou-se, ao seu modo, do conceito de vontade. Para Nietzsche a vontade

é a essência das coisas, mas não possui nada de metafísico no seu conceito. A vontade além

de sua função cega e negativa da vida, ela é também uma força criadora que permite ao

homem fazer de si uma obra de arte. A vontade é a superação de si mesmo.

Para Nietzsche a tendência da vida é a busca de poder. O sentido da afirmação da vida

está no poder. A vida é então o acúmulo de vontade de poder. Dessa forma, a vontade de

poder, promove, aumenta e fortalece a vida em busca de novos valores. Viver isso é escapar

da vida decadente e paralisante da escala dos valores tradicionais. Por outro lado, a vontade é

um assenhoramento sobre algo. A vontade é criadora e destruidora e deseja que tudo se curve

perante a sua força.

Para Nietzsche a vontade deve ser realizada aqui na terra, porque é o elemento próprio

da vida é a vontade de crescer. Crescer em clareza, nitidez, e lucidez da própria história, do

destino, do mundo e do seu destino.

Pode se concluir que, a vida desde o seu estádio simplesmente biológico até a criação

corporal e, sobretudo essa tensão de criação e de instauração da ordem que a vida traz

consigo, e é expressa, por Nietzsche, como vontade de poder. Portanto, além do homem, cada

centro de força constrói a partir de si todo o mundo restante.

Para Nietzsche o artista vive a essência da vontade de poder. Porque ele sabe usar as

qualidades de Apolo e de Dionísio. Nietzsche percebendo as manifestações dos dois na

tragédia grega, coloca que são duas pulsões cósmicas que encontram o equilíbrio entre elas.

Para Nietzsche o essencial da embriaguez é o sentimento de elevação da força e o sentimento

de plenitude que a embriaguez traz.

Para Nietzsche existem apenas interpretações, apenas fatos. Assim, o mais importante

é o ato do ser humano criar, impor e valorar as coisas. Esse ato de apreciar, depreciar, de ter o

domínio sobre o agir, do interpretar e avaliar se chama vontade de poder.

Os valores morais se originam de dois tipos de homens distintos, dos senhores e a dos

escravos. Em todas as morais que já existiram e que ainda existem á traços comuns de uma

moral dos senhores ou uma moral dos escravos.

O homem de espírito livre é aquele que possui coragem e vontade de colocar a sua

medida de valor sobre os inferiores. O homem de vontade própria, afirma a partir dele, cria

valores e os fracos os seguem. Os nobres são a base para estabelecimento dos valores. A

moral da aristocracia utilizava o princípio da força. Já a moral sacerdotal busca a destruição

da moral de senhores.

Para Nietzsche a vida é uma constante interação de forças. Por detrás da transformação

sucessiva das coisas, a pulsão da vida permanece se manifestando na multiplicidade das

forças. A vontade de poder que é vida sempre desejará a sua existência.

Nietzsche no livro Vontade de Poder tem em vista o anúncio da sua filosofia, o

anúncio de uma nova valoração dos valores. Propõe uma nova valoração no mundo, porque,

para ele a moral que está vigente no mundo foi, e está, corrompida desde de Platão.

A vontade de poder e o pensamento do eterno retorno implicam-se mutuamente,

apelam um ao outro. Sem entender a vontade de poder não tem como entender o eterno

retorno.

Na doutrina do eterno retorno se encontra duas teses fundamentais, ou seja, dois

pilares: o primeiro pilar é que o tempo é infinito, e o segundo pilar é que as forças são finitas.

O eterno retorno é a doutrina da adoração total da vida, através de todos os seus enigmas e

sofrimentos. A aprovação da alegria é também a aprovação da dor.

A doutrina do eterno retorno exige uma transformação na atitude diante da existência.

Essa transformação por parte do homem implica a aprovação da existência e de tudo o que ela

viveu. Aceitar o eterno retorno é aceitar e amar as coisas como elas são. Isso para Nietzsche

se chama de amor fati. O amor fati significa, portanto, “amor ao destino”. Não devemos

permanecer nas dimensões não reais do tempo, no passado e no futuro, mas tentar, ao

contrário, habitar o presente, dizer-lhe sim ao amor fati, dizer sim a afirmação dionisíaca.

O sentido da existência do homem é a busca do super-homem. O super-homem é o

relâmpago que brota da sombria nuvem homem. O super-homem é criado a partir da vida

humana, do humano. Toda a idéia do super-humano é do próprio ser humano que é tirada. É

das cinzas, dos delírios, das chamas do homem no mundo que brota o super-humano. O super-

homem é viver o que o sentido da terra nos faz viver. Viver o sentido da terra é viver tudo o

que ela deseja. Viver é amar o seu destino, é aceitar o que ele guarda para mim, é ser um

super-homens e transvalorar tudo o que está contido no mundo.

O mundo em que vivemos deve ser criado por nos homens que vivem o sentido da

terra. Não será uma força de outra parte do mundo que irá construir o mundo, e sim o homem

com inteligência e virtude. Portanto, o mundo deve ser criado por nós; a partir da nossa razão,

a partir da nossa imagem, da nossa vontade, do nosso próprio mundo. Somos nós os criadores

da vida. O homem deve governar e dirigir a sua própria vida. Em resumo, é pela capacidade

de conhecer, de criar, de avaliar que o homem é responsável pelo seu agir. Dessa forma é o

homem o criador da civilização. É o homem que sente, que cria, que avaliar o próprio mundo,

porque não existe mais um deus que faz tudo para o homem.

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