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A questão agrária no Brasil Profº Ney Jansen Professor de sociologia do Colégio Estadual do Paraná

GLOBALIZAÇÃO E QUESTÃO AGRÁRIA NO BRASIL · produção agroecológica, sem agrotóxicos, com qualidade, diversidade e preço barato para toda a população ... (Israel), DuPont

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A questão agrária no Brasil Profº Ney Jansen

Professor de sociologia do

Colégio Estadual do Paraná

Raiz da desigualdade social no

Brasil está na Terra

Diferentes concepções da propriedade da terra no Brasil:

1500-1530

> Pouco interesse pela recém colônia pelos portugueses

> invasões no território nacional

Raízes da desigualdade social no

Brasil

Século XVI ao XIX:

> Capitanias hereditárias (1530)

Os donatários recebiam a terra (sesmarias) como doação mas não tinham a propriedade, podiam apenas explorá-la. A terra era domínio da Coroa portuguesa.

Possuir terra significava prestígio/status social;

> Utilização de trabalho escravo (350 anos)

Século XIX (Lei de Terras de 1850)

>A terra torna-se “domínio público”; a terra é acessível apenas para quem possa comprá-la; a terra torna-se mercadoria.

>Utilização de trabalho livre (migrante)

O Brasil era controlado por uma oligarquia latifundiária ligada à economia de exportação-importação e o trabalho “livre” convivia paralelamente ao trabalho escravo.

Base da economia brasileira: latifúndio de monocultura de exportação

Em 1961 João Goulart assume a presidência

Discurso pelas “reformas de base”, entre elas a reforma agrária

Em 1964 ocorreu um golpe civil-militar que instaurou uma ditadura de 21 anos (1964-85) apoiado pela burguesia industrial, agrária, financeira, financiada pelos EUA

A reforma agrária foi condenada pelo regime militar

Elementos de discussão sobre a TERRA

- Modelo do Agronegócio (monocultura, concentração fundiária, segurança alimentar)

- Produção agrícola familiar, agroecologia x agronegócio

- Êxodo Rural

- Propriedade X função social da terra (reforma agrária)

- Conflitos sociais no campo

Carta do MST às candidatas e candidatos à Presidência da República

e aos governos estaduais. 02/09/2014

Exigimos a atualização imediata dos índices de produtividade prevista na legislação brasileira, possibilitando o acesso à terra a milhares de famílias. Precisamos da elaboração e execução de um novo Plano Nacional de Reforma Agrária – PNRA, com metas de assentamento de famílias e estabelecimento de prioridades por regiões.

É necessário a arrecadação das terras griladas da União e a desapropriação de latifúndios em todos os estados. Além disso, as terras devolutas invadidas por fazendeiros e principalmente, pelo capital bancário e pelas empresas transnacionais do agronegócio, devem ser desapropriadas para fins de Reforma Agrária. O mesmo deve acontecer com as fazendas endividadas com os bancos públicos e órgãos do governo, com as áreas onde houver identificação com exploração de trabalho escravo e as que não cumprem a função social.

[...] Cobramos o assentamento imediato das mais de 120 mil famílias que estão vivendo em condições precárias em centenas de acampamentos por todo o país. É necessário destinar para a Reforma Agrária as terras dos projetos de irrigação e as do entorno dos canais de transposição das águas. Para isso, faz-se necessário o fortalecimento, reorganização e qualificação do INCRA, como órgão responsável pela Reforma Agrária e que garanta as condições de implementá-la. [...]

A agricultura brasileira deve priorizar a produção de alimentos saudáveis, como um direito humano e como princípio da Soberania Alimentar. Alimento não pode ser mercadoria, fonte de exploração, lucro e especulação. Para isso, exigimos políticas públicas que garantam condições para a produção agroecológica, sem agrotóxicos, com qualidade, diversidade e preço barato para toda a população brasileira.

Os governos, federal e estaduais, precisam incentivar e garantir a produção, seleção e armazenamento de sementes pelos próprios camponeses, combatendo assim as sementes transgênicas e a dependência política e econômica das empresas transnacionais que monopolizam sua produção e comercialização. Somos contra as leis de patentes e a privatização de nossas sementes. [...] Carta do MST às candidatas e candidatos à Presidência da República e aos governos estaduais. 02/09/2014

CONFLITOS NO CAMPO

CPT lança o relatório Conflitos no Campo Brasil 2013

Segundo o 29º relatório “Conflitos no Campo Brasil 2013” da Comissão Pastoral da Terra (CPT) é alarmante os dados sobre os conflitos e violências sofridas pelos trabalhadores e trabalhadoras do campo brasileiro, neles inclusos os indígenas, quilombolas e outros povos tradicionais.

O relatório destaca que houveram 34 assassinatos no campo em 2013, contra 36 no ano anterior.

Outros pontos que chamam atenção é que 15 desses assassinatos são de indígenas além de 10 das 15 vítimas de tentativas de assassinato, e 33 das 241 pessoas ameaçadas de morte. Em nenhum outro período houve registro semelhante.

A Amazônia continua como o principal palco dos conflitos. Nela se concentram 20 assassinatos ocorridos, 174 das 241 das ameaças de morte, 63 dos 143 presos, e 129 dos 243 agredidos. Das populações tradicionais que, em 2013, foram vítimas de algum tipo de violência, 55% se localizavam na região.

Fonte: http://www.brasildefato.com.br/node/28261

Multiplicidade de conflitos sociais no campo

Povos originários (indígenas)

Comunidades Quilombolas

Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

Assalariados Agrícolas

Desmatamento

Fluxos de população urbano-rural no

Brasil

Ano Campo/Cidade

1950 64% campo

1960 55% campo

1970 56% cidade

1980 68% cidade

1990 75% cidade

2000 80% cidade

ÁREA AGRICULTÁVEL VERSUS PLANTIO

(em hectares) dados do IBGE, 2000.

Área Total

(hectares)

Plantada %

376.892.898 52.908.898 13,98

ÁREA AGRICULTÁVEL VERSUS PLANTIO

(em hectares) dados do IBGE, 2000.

Sem Plantio %

323.984.000 86

ÁREA AGRICULTÁVEL VERSUS PLANTIO

(em hectares) dados do IBGE, 2000.

Latifúndio sem plantio

(hectares)

% Total

%

Sem plantio

163.919.003 43,7 49,83

Os donos da terra

Os 5 maiores latifúndios estrangeiros

Empresa Terras

hectares

% Área

Manasa/Cifec 4.160.658 1,23

E.N.I 492.174 13,70

Calcestruzzi 367.885 10,95

BelgoMineira 288.333 70.12

Mannesman 138.431 66,64

Os donos da terra

Os 10 maiores latifúndios nacionais

-dados do Incra-

Empresa Terras(ha) % Área utilizada

Aplub 2.279.073 0,04

AntunesCaemi 2.240.485 17,47

Cotriguaçu 1.611.757 0,00

Bradesco 893.224 37,58

Moraes Mad 668.280 30,04

Ingreco 599.559 28,52

Agro Amapá 540.613 21,88

Klabin 522.984 61,48

Votorantim 497.566 37,94

Ometto 438.715 41,83

46 maiores latifúndios por grupos

econômicos

Grupos Terras (ha) Área Utilizada

(%)

N°assalariados

Financeiro 22.133.342 17,16 63.552

Industrial 10.991.211 18,12 44.075

Agropecuário 6.277.169 14,42 4.887

Total 39.401.722 16,99 112.514

Segurança alimentar: transgênicos e

agrotóxicos

O Brasil é o segundo maior consumidor mundial de agrotóxicos.

Entre 2002 e 2007, o faturamento líquido do setor passou de US$ 1,9 bilhão a US$ 5,4 bilhões

Esses números estão ligados a opção pelo modelo exportador de commodities agrícolas, que, diferentemente da alternativa agroecológica, trata a biodiversidade como praga a ser combatida.

O lucro fica na mão de poucos: apenas dez empresas respondem por 90% do mercado nacional –

Bayer (Alemanha), Syngenta (Suíça), Basf (Alemanha), Monsanto (EUA), Dow Chemical (EUA), Milenia/Makteshim Agan (Israel), DuPont (EUA), FMC (EUA), Nortox (Brasil) e Arysta (Japão).

Envenenamento químico

A maior parte ocorre no campo, entre trabalhadores rurais, incluindo mulheres e crianças.

Essa situação decorre da combinação de inúmeros fatores, tais como a elevada toxicidade dos produtos, a forma irresponsável com que são vendidos, a falta de orientação adequada aos usuários e o baixo nível de informação e treinamento dos agricultores.

Uma pesquisa realizada no norte do país mostrou que muitos agricultores desconheciam o código de cores utilizado para classificar o nível de toxicidade dos produtos (vermelho para extremamente tóxico, amarelo para muito tóxico etc.). Além disso, mais de 75% dos entrevistados afirmaram não ler a bula e nenhum deles conseguiu explicar corretamente o significado de pelo menos cinco dos 14 pictogramas utilizados para instruir analfabetos sobre o uso de máscara e luvas de proteção, entre outros”.

(MILANEZ, Bruno, et all. Os agrotóxicos, os transgênicos e a força das multinacionais)

A avaliação de 2007 da ANVISA indicou que 45% das amostras de tomate, 43% das de morango e 40% das de alface apresentavam situação insatisfatória quanto à presença desses produtos.

(MILANEZ, Bruno, et all. Os agrotóxicos, os transgênicos e a força das multinacionais)

O lobby das empresas

“Ao invés de apoiarem o processo de reavaliação, que busca reduzir a exposição da população a diferentes produtos de alta toxicidade, as empresas ligadas ao Sindag opuseram-se à movimentação da Anvisa. Dessa forma, de acordo com a decisão nº 69/2008 do Juiz Federal Substituto da 13ª Vara do Distrito Federal e “a fim de evitar qualquer dano às empresas”, foi determinado que a Anvisa se abstivesse de suspender ou restringir a comercialização de diversos agrotóxicos, até que a regularidade formal da reavaliação fosse analisada”.

(MILANEZ, Bruno, et all. Os agrotóxicos, os transgênicos e a força das multinacionais)

“Embora representantes do Sindag afirmem que o sindicato “não quer impedir a reavaliação dos agrotóxicos”, novamente seu discurso parece incoerente com a prática das empresas. Em abril de 2008, a companhia japonesa Arysta conseguiu um mandado de segurança que obriga a Anvisa a manter o registro dos agrotóxicos produzidos a partir do acefato, um produto proibido na Europa desde 2003. Em julho, a italiana Sipcam Isagro entrou na Justiça com um pedido de anulação do processo de reavaliação da cihexatina, numa tentativa de impedir que a Anvisa publique as restrições a esse agrotóxico, cujo uso foi cancelado na Europa em abril deste ano. […]”

(MILANEZ, Bruno, et all. Os agrotóxicos, os transgênicos e a força das multinacionais)

“Aos fatos! Os transgênicos aumentam o uso de agrotóxicos, ao contrário do que alegavam as empresas de biotecnologia, e, por isso (e por outras razões também), são prejudiciais ao meio ambiente e à saúde. A soja transgênica (Roundup Ready) é resistente ao herbicida Roundup, também fabricado pela Monsanto e cuja base é o glifosato. Depois que foi autorizada no Brasil, o crescimento das vendas de glifosato foi significativo, saltando de 60 mil para mais de 110 mil toneladas do ingrediente ativo, entre 2004 e 2007, segundo a Anvisa, enquanto, no mesmo período, a área plantada de soja diminuiu cerca de 8%, de acordo com a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento)”. [...] O aumento do uso de glifosato também já está comprovado nos Estados Unidos. Hoje, a soja dos brasileiros contém 50 vezes mais veneno (glifosato) do que em 1998.

SALAZAR, Andrea. Transgênicos: crescimento em limites.

O Etanol e o verde enganador

Desmatamento e queimadas

Empobrecimento do solo e seca de lençol freático

Reforço da monocultura

Trabalho análogo ao escravo intenso

Alta do preço das terras

[...] Essa cova em que estás,

com palmos medida,

é a cota menor

que tiraste em vida.

— É de bom tamanho,

nem largo nem fundo,

é a parte que te cabe

deste latifúndio.

— Não é cova grande,

é cova medida,

é a terra que querias

ver dividida.

— É uma cova grande

para teu pouco defunto,

mas estarás mais ancho

que estavas no mundo.

— É uma cova grande

para teu defunto parco,

porém mais que no mundo

te sentirás largo.

— É uma cova grande

para tua carne pouca,

mas a terra dada

não se abre a boca. [...] MELO NETO, João Cabral de. Morte e Vida Severina. 1954.55.

Fontes:

ALVAREZ, Ricardo. A fome nossa de cada dia. blog.controversia.com.br

CHIAVENATO, Júlio José. Violência no campo: o latifúndio e a reforma agrária. Moderna: São Paulo, 2004.