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GOVERNO DO PARANÁSECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃOPROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE/2010
Formação do Professor e Gestão Escolar na Escola do Campo
“CONSTRUINDO A EDUCAÇÃO DO CAMPO”
IES: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ/UNIOESTE/ Campus de Foz do Iguaçu/ PR
ORIENTADOR: FERNANDO JOSÉ MARTINSÁREA CURRICULAR: GESTÃO ESCOLAR
Município de Nova Santa RosaNúcleo Regional de Educação de Toledo
Secretaria de Estado da Educação do Paraná – Professora Especialista em Gestão Escolar e Literatura do Ensino Fundamental e Médio – Professora Efetiva do Estado.
E-mail: [email protected] de 2012
Formação do Professor e Gestão Escolar na Escola do Campo“CONSTRUINDO A EDUCAÇÃO DO CAMPO”
Professora Maria Ester PhilippsenBaumann1
Professora PDE
Professor Dr. Fernando José Martins2
Orientador
RESUMO
Este artigo é o resultado da Proposta deFormação dos Professores, da comunidade escolar e comunidade externa, uma construção coletiva da Escola do Campo em uma área rural, tentativa de aproximação com a temática: Educação do Campo. Inicialmente identifica quem são os sujeitos do campo, os sujeitos coletivos e as especificidades da educação do campo. Conceitua-se a Escola do Campo, traz a legislação pertinente que a ampara e as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo. Através de avaliação entendeu-se que o paradigma urbano do direito à educação não pode ser único para todas as escolas, porque no meio rural há situações diferentes às das cidades. Normas e políticas generalistas não têm garantido os direitos nas especificidades do homem do campo, por isso é necessáriohaver políticas públicas educacionais focadas ao homem do campo, reafirmando sua identidade. Espera-se, depois desse trabalho, a consolidação de uma escola do campo na área rural com estratégias específicas de desenvolvimento para o campo. Somos conscientes de que, a partir de um primeiro diálogo, novas vozes se levantarão para consolidar políticas de construção da Escola do Campo.
Palavras-chave: Educação do campo, movimento social e políticas públicas.
1 Introdução
O projeto de Formação para a Comunidade Escolar e moradores dos arredores foi realizado
na Escola Estadual do Campo "Vinícius de Moraes" – EF, no distrito de Alto Santa Fé, município de
Nova Santa Rosa – PR. A iniciativa surgiu da necessidade de suprir a falta de Recursos Humanos e
Infra-estrutura nas Escolas do Campo e buscar estratégias para favorecer a permanência dos
professores treinados para a Educação do Campo em Escola do Campo, auxiliando-os a
reorganizarem as suas práticas educativas, tornando-as cada vez mais próximas da realidade dos
sujeitos do campo.
A proposta de formação da construção coletiva da escola do campo, foi ofertada a todos os
1Professora da Rede Pública do Estado do Paraná, formada em Letras com especialização em Literatura Brasileira e Gestão Escolar. Com 20h em sala de aula do ensino fundamental e médio no Colégio Est. "Mal. Gaspar Dutra" e 20h direção na Esc. Est. "Vinícius de Moraes" (escola do campo).2 Professor Doutor Diretor do Centro de Educação e Letras da Universidade Estadual do Oeste do Paraná/UNIOESTE – Campus de Foz do Iguaçu – PR.
professores do Ensino Fundamental das Escolas do Campo, bem como aos agentes educacionais da
Escola Estadual do Campo "Vinícius de Moraes", na forma de convite para a socialização com os
mesmos das reais intenções do Programa.
Entende-se que a chamada escola do campo tem uma grande responsabilidade com o
educando, sua família e a comunidade como um todo, já que pode ser o veículo fundamental para a
melhoria da qualidade de vida da comunidade rural, mantendo o homem do campo no campo. Por
isso, partiu-se para uma proposta de construção de escola do campo numa escola de distrito, área
rural, em que, até então, sóse reproduziam dinâmicas de vivências urbanas, o que levava a educação
desenvolvida na Escola Estadual do Campo "Vinícius de Moraes" ao desencontro das necessidades
da comunidade rural.
Para isso é de fundamental importância que a escola participe do processo de construção de
identidade da escola do campo. Para tanto, os seus professores devem estar preparados para
desenvolver uma reflexão crítica quanto ao aspecto pedagógico das escolas do campo, bem como,
elaborar propostas de práticas educativas contextualizadas, que incluam o agricultor como agente
do desenvolvimento do local.
Através de reuniões e de grupos de estudo, os professores e comunidade interna e externa
tiveram conhecimento e se sentiram atraídospela proposta de inserção da Escola Estadual do Campo
"Vinícius de Moraes" – EF na educação do campo, fazendo adaptações na sua forma de organização
e adequando-se à realidade do campo sem perder de vista a dimensão universal do conhecimento e
da educação.
Assim, portanto, inicialmente a proposta era levar os professores e toda comunidade escolar,
interna e externa, a uma reflexão e a um estudo mais amplo sobre a educação do campo, de que o
campo é uma diversidade, independente de o povo do campo estar ou não no processo de luta
social. O povo do campo, como sujeito que se reconhece como do campo, precisa de uma educação
diferenciada da educação urbana, porque o paradigma urbano do direito à educação não pode ser
único para todas as escolas, pois no campo se vivem situações diversas e até adversas às das
cidades. Normas e políticas generalistas não têm garantido os direitos nas especificidades do
homem do campo. Há necessidade de políticas educacionais focadas no homem campesino,
direcionadas ao território, à terra, à cultura e à tradição do campo.
A importância da educação do campo como um recurso de participação na construção e na
formação da cidadania do homem do campo é indiscutível, porém a forma de participação é objeto
de muita discussão, vez que o ambiente social, diferentemente da escola urbana, é hoje muito mais
amplo, complexo, desigual e diverso.
Diante desse quadro, é necessário trabalhar com as questões do direito e da igualdade,
promessas não cumpridas e que evidenciam a usurpação de direitos, e ampliam a desigualdade e a
descriminação do campo.
O procedimento para a realização deste projeto aconteceu em forma de oficinas, que foram
ofertadas em cinco momentos, totalizando 30 h (trinta horas). Em cada encontro discutimos um
tema:
1. Apresentação das características da escola do campo.
2. O que é educação do campo.
3. Legislação e educação do campo.
4. A escola na educação do campo.
5. Avaliação.
Ressalta-se que a oficina foi uma forma utilizada para que um grupo se apropriasse de um
determinado tema. Foi o lugar de produzir, reparar e edificar. E foi nessa perspectiva que as
atividades foram desenvolvidas, considerando a sua utilização no diaadia, vivenciando as atividades
e compreendendo-as com mais intensidade, diagnosticando o quanto a reflexão necessita estar
presente em todas as atitudes, tanto pessoais quanto profissionais.
3 O caminho da construção da escola do campo
O estudo foi organizado em três temas, acrescidos de textos para reflexão. Primeiramente foi
necessário conceituar a educação do campo e contextualizar com a questão agrária, situando-nos no
movimento histórico social, para maior compreensão. Com base nessas definições é que pôde-se
avançar para outros temas como: legislação e educação do campo; a escola do campo na educação
do campo, situando-se no espaço campesino, e assim, percebendo as necessidades dos povos do
campo.
3.1 O que é Educação do Campo
Diante da complexidade em conceituar a educação do campo, Teresinha de Fátima Perin traz
o conceito que condiz com o presente projeto:
O conceito de educação do campo é, antes de tudo, uma discussão de camponeses e órgãos de apoio (igreja, universidades, ONGs, dentre outros), que têm a intenção de desnudar o modelo de desenvolvimento vigente e, especialmente, forjar um modelo de desenvolvimento para o campo que leve em consideração as especificidades locais (culturais), a necessidade de reforma agrária, a valorização da agricultura familiar e que sua lógica não seja o lucro, mas a humanidade. Esse modelo de desenvolvimento para o campo é também entendido pelo movimento dos camponeses como um modelo de desenvolvimento para toda sociedade. (PERIN, 2010, p.01).Cita-se o sobrenome do autor.
O conceito de educação do campo envolve um processo de produção da existência humana.
O ser humano vai se modificando, alterando aquilo que é necessário à sua sobrevivência, cria novas
necessidades que passam a ser tão fundamentais quanto as chamadas necessidades básicas à sua
sobrevivência, não cria só artefatos, instrumentos, como também desenvolve ideias
(conhecimentos, valores, crenças) e mecanismos para a sua elaboração desenvolvimento do
raciocínio e planejamento.
Com base nessas definições de educação do campo e escolas do campo, contidas nas
Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo e também no próprio
conceito de educação descrito na LDBEN (Lei Federal nº 9394/1996), o conceito de educação do
campo supera as significações de educação no campo ou para o campo, pois os movimentos sociais
entendem que essas significações remetem a uma educação que não é própria do campo, que não
respeita as singularidades e nem é produzida pelo povo a quem se destina.
Ainda, com relação ao conceito de educação no e do campo, Caldart (2008) explica que o
preposiçãono(em+o) é relativa ao direito que o povo tem de ser educado no lugar onde vive; já o
preposição do(de+o) indica o direito de essa educação ser pensada do lugar e com a participação
desses sujeitos, vinculada à cultura e às suas necessidades humanas e sociais.
A Resolução nº 2, de 28 de abril de 2008, estabeleceu as “diretrizes complementares, normas
e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas para a Educação Básica do Campo”, e
também define com clareza o que é e a quem se destina a educação do campo no artigo 1º. A
Educação do Campo compreende a Educação Básica em suas etapas de Educação Infantil, Ensino
Fundamental, Ensino Médio e Educação Profissional Técnica de nível médio integrada com o
Ensino Médio e destina-se ao atendimento às populações rurais em suas mais variadas formas de
produção da vida agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos,
assentados e acampados da Reforma Agrária, quilombolas, caiçaras, indígenas e outros.
3.1.1Questão agrária
De acordo com o professor doutor WalterMarschner, da Faculdade de Ciências Humanas da
UFGD,a Educação do Campo historicamente foi bandeira de luta dos movimentos sociais, tornou-se
recentemente uma política pública específica para as escolas do meio rural e desdobra-se agora
também como uma proposta de desenvolvimento sensível às diferenças entre cidade e campo.
A história do campo no Brasil é marcada até hoje pela invasão e divisão de seu território
desde o período colonial. A questão agrária tem gerado confronto por interesses e por concepções
distintas de como viver e se organizar em sociedade. O MST materializa esse confronto por projetos
antagônicos, representando as mulheres e homens que são vítimas do modelo econômico
hegemônico. Valendo-se da construção dos vários movimentos que o antecederam, organizou um
projeto para a construção de uma sociedade que tenha como lógica o homem. Esse projeto, como
todo projeto de sociedade, precisa da educação para dar suporte à construção de valores que sejam
coerentes com a visão da sociedade proposta.
A Educação do Campo foi construída no decorrer dos anos pelos movimentos do campo em
suas práticas de luta. Essa educação, sua ideologia e ação, se fortalecem com a organização do
MST. A Educação do Campo elaborada pelo MST traz, inserida em seu currículo, um projeto de
desenvolvimento para avançar na construção de uma sociedade para além do capital. Com a
constituição dos Fóruns Estaduais de Educação do Campo, muitos movimentos e outras
organizações que trabalham com educação no campo vieram compô-lo. Essa ampliação fortaleceu a
luta e trouxe, também, os discursos de humanização do capitalismo, influenciando nas diretrizes de
ação e de organização da Educação do Campo.
No Brasil, no passado histórico, sem uma legislação própria para a aquisição de terras, o que
vigorava era o sistema de posses. Esse sistema favorecia a todos os que conseguissem um pedaço de
terra para ocupar, gerando insatisfação dos grandes proprietários, que veem seus privilégios sendo
ameaçados. A elite dominante brasileira, que quer frear a posse de terra, é presenteada com a Lei de
Terras em 1850. Essa lei vem ao encontro de seus interesses hegemônicos, instaurando o mercado
como nova modalidade de acesso à terra. Assim, o acesso à terra fica possível apenas a quem tem
como comprá-la, inviabilizando a aquisição de terra para a grande maioria da população.
É com base nessa lei de 1850 que se vai construindo no Brasil o problema agrário, com a
produção de um número cada vez maior de pessoas sem terra para plantar e viver.
[...] a luta pela terra é uma política que nasceu com o latifúndio. Portanto, é fundamental distinguir a luta pela terra da luta pela Reforma Agrária. Primeiro, porque a luta pela terra sempre aconteceu, com ou sem projetos de Reforma Agrária. Segundo, porque a luta pela terra é feita pelos trabalhadores e na luta pela Reforma Agrária participam diferentes instituições.(FERNANDES, 2005, p. 17).
Durante séculos, os camponeses desenvolveram a luta pela terra sem a existência de projeto
de Reforma Agrária.
Em 1964 foi criado O Estatuto da Terra pela Lei Federal nº 4.504, nos primeiros meses da
ditadura militar. Essa lei para a reforma agrária foi elaborada apenas para conter os camponeses que
estavam articulados na luta pela terra, e o medo das elites dominantes com possibilidade de uma
revolução no Brasil, inspirada na Revolução Cubana. O Estatuto estabelecia a realização da reforma
agrária e o desenvolvimento da agricultura, mas foi realizado apenas o desenvolvimento da
agricultura, o desenvolvimento empresarial da agricultura (FERNANDES, 2005, p. 17)
A história de invasão e opressão vivida por séculos em nosso país não ocorreu de forma
pacífica, mas foi marcada por resistência e luta dos índios, dos negros escravizados e dos
camponeses. Essa luta se estende até hoje com a ação dos camponeses, brancos e negros, pela terra,
pela reforma agrária e dos índios pela demarcação de suas terras.
Desse passado de lutas pela terra, vai se formando “de 1979 a 1985, no Rio Grande do Sul, o
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que se consolidou e se territorializou desde lá até
os dias de hoje” (FERNANDES, 2000, p. 15). Assim, começa a jornada de ações do MST,
movimento conhecido e reconhecido no mudo inteiro, tendo, no momento político atual do Brasil,
fundamental importância nas diretrizes para a reforma agrária e um outro modelo de
desenvolvimento. A essência daescola do campo, sem dúvida, surge da luta dos movimentos sociais
pela reforma agrária e pela terra.
Convém destacar alguns momentos importantes na trajetória do início da construção do
conceito de educação do campo:
1 - Em julho de 1997, o MST, segundo Kolling (1999), promove, em parceria com diversas
entidades, como a Universidade de Brasília (UnB), o Fundo das Nações Unidas para a
Infância(UNICEF), a Organização das Nações Unidas para a Educação(Unesco) e Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil(CNBB), o I Encontro Nacional de Educadores da Reforma Agrária (I
ENERA), em Brasília.
2 - Julho de 1998, em Luziânia (GO), a I Conferência Nacional: Por uma Educação Básica do
Campo. "Essa conferência mostrou que somente é possível trabalhar por uma educação básica do
campose vinculada ao processo de construção de um novo projeto de desenvolvimento para o
campo e a garantia de que todo o povo tenha acesso à educação" (KOLLING, 1999).
3 - Em julho de 1998, realiza-se, em Salvador, o I Encontro Estadual por uma Educação Básica do
Campo.
4 - Em 1999; 2000;2001;2002. São realizados os I; II; III; e IV Encontros do Fórum Estadual de
Educação do Campo.
5 - Em 1999 acontece o I encontro da Articulação Nacional em defesa da educação do campo onde
foram firmados cinco compromissos políticos:
a) Recuperação da soberania e da autonomia política.
b) Compromisso com a solidariedade para eliminação da exclusão e desigualdade social.
c) Compromisso com o desenvolvimento mediante rompimento com o capital financeiro e com a condição de economia periférica.
d) Compromisso com a sustentabilidade.
e) Democracia ampla.
8 - Em 2003, realização da Conferência Estadual de Educação do Campo e Para Convivência com o
Semi-Árido.
9 - -Em agosto de 2004, II Conferência Nacional Por Uma Educação do Campo, Luziânia, GO.
AI Conferência Nacional, em 1998, privilegiou as seguintes temáticas:
“Desenvolvimento Rural e Educação no Brasil: Desafios e Perspectivas; Situação da
Educação Rural no Brasil e na América; Política Pública em Educação no Brasil; Municipalização;
Financiamento da Educação; Política Educacional para as Escolas Indígenas. Neste encontro ainda
foram apresentadas experiências em educação infantil, ensino médio e profissionalizante, educação
de jovens e adultos e formação do magistério. Ao final da conferência foi produzido um documento-
síntese dos compromissos, desafios, propostas e ações para os educadores e educadoras do campo.
Tal processo teve o mérito de “recolocar o rural, e a educação a que ele se vincula, na agenda
política do país.[...] Para a afirmação de um processo rico e promissor de Construção da educação
básica do campo”. (Kolling,1999 apud CARVALHO, M., 2003, p. 22).
Para pensar a educação do campo, faz-se necessário entendermos o sentido da perseverança
do campesinato e, para isso, é importante que se faça uma leitura histórica para a compreensão da
lógica da persistência do campesinato nos diferentes tipos de sociedades: escravocrata, feudal,
capitalista e socialista. Esse processo remonta a origem da história da humanidade.
Desde o século XIX, surgiram diversas teorias a respeito da existência e das perspectivas do
campesinato no capitalismo. Dessas teorias desenvolvidas constituíram-se três distintos modelos de
interpretação do campesinato ou paradigmas: “fim do campesinato; fim do fim do campesinato e
metamorfose do campesinato.”(CADERNOS TEMÁTICOS – Educação do Campo, p.15).
Conforme Bernardo Mançano Fernandes:
[...] “o paradigma da metamorfose do campesinato surgiu na última década do século XX. Acredita no fim do campesinato mas não no fim do trabalho familiar na agricultura.” Camponês é tido como atrasado e o agricultor familiar como moderno, essa transformação de sujeito camponês em sujeito agricultor familiar sugere também uma mudança ideológica. De camponês para agricultor familiar perde a sua história de resistência, e se torna sujeito conformado com o processo de diferenciação que passa a ser um processo natural do capitalismo: “O paradigma da metamorfose do campesinato tem como fundamento o capitalismo agrário”. (FERNANDES, 2000).
3.1.2 Necessidades dos povos do campo
Como já vimos anteriormente, em 1998 aconteceu a I Conferência Nacional de Educação do
Campo e, em decorrência desse evento, criou-se então o "Movimento por uma Educação Básica do
Campo", envolvendo grupos organizados, pesquisadores e algumas instâncias governamentais do
país, numa articulação que contribuísse para o melhoramento do ensino das séries iniciais do ensino
fundamental. Na ocasião, a expressão "educação do campo" apresentava uma nova conotação.
Caldart (2004, p.1) afirma, em seus estudos, “[...] ser esse o momento do batismo coletivo de um
novo jeito de lutar e pensar a educação para o povo brasileiro que vive e trabalha no e do campo”.
Líderes de movimentos sociais, educadores, políticos, simpatizantes e outros estudiosos
dedicaram grande parte de seu tempo estudando as mais diversas formas de participação popular
nas decisões de interesse coletivo do homem do campo.
Algumas reflexões sobre a Educação do Campo a partir de uma concepção comprometida
com as especificidades do campo, indicando também as Diretrizes Operacionais para a Educação
Básica nas Escolas do Campo, se fazem necessárias nas escolas inseridas na política educacional da
escola do campo.
Identificar pessoas que vivem no/do campo sem terra e sem as condições de sobrevivência,
num país continental como o Brasil, faz transparecer a fragilidade e os equívocos das políticas
fundiárias historicamente desenvolvidas pelo poder público e reforça a ideia de que “[...] não há
possibilidade de construção de justiça social no Brasil sem efetuarmos profunda e radical mudança
no acesso a dois bens fundamentais: terra e educação” (MOLINA, 2006, p. 7).
Essas políticas fundiárias mantêm as grandes diferenças econômicas também encontradas no
meio urbano, dado que o sistema capitalista usa a mesma lógica em ambos os locais. A reforma
agrária, essa mudança almejada na estrutura política e social do país, por muitas vezes prometida
mas nunca é executada a contento. Por isso o campo sofre ainda mais, por ser constantemente
esquecido nas demais políticas sociais. De acordo com Arroyo; Caldart; Molina:
A escola do campo e seus profissionais não se afirmarão se o projeto político for expulsar os povos do campo, expandir o agronegócio, acabar com a agricultura familiar. Sem gente não serão necessários educação, escolas, profissionais qualificados. (ARROYO; CALDART; MOLINA, p. 174).
Somente “A partir dos anos 90, os povos organizados do campo conseguem agendar na
esfera pública a questão da educação do campo como uma questão de interesse nacional ou, pelo
menos, se fazem ouvir como sujeitos de direito” (BRASIL. MEC/SECAD, 2007, p. 22).
Como a educação em nosso país é pensada no paradigma urbano, o sistema escolar segue os
moldes da educação urbana, idealizando a cidade como espaço de excelência, e essa idealização é
que corresponde à visão negativa do campo. Assim, o que é feito na maioria das vezes é a adaptação
das condições do campo à educação escolar, aos currículos e à formação dos profissionais pensados
no paradigma urbano. Arroyo; Caldart; Molina lembram:
Em algum currículo escolar está o programa da luta pela reforma agrária? A luta pela terra, o desemprego? Temos ouvido de jovens das periferias das cidades: vocês, professores, nos explicam coisas lindas, mas vocês não explicam porque nossos pais estão desempregados, porque temos que morar nessa imundície das favelas, porque nossas colegas têm que se prostituir ou entrar no crime ou na droga para sobreviver, porque entre os mortos de cada fim de semana 65% são jovens e adolescentes populares; isso vocês não nos explicam... (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2006).
A educação no meio rural brasileiro foi tratada com descaso pelos governos que se
constituíram enquanto força hegemônica na sociedade. Se retornarmos ao passado escolar, vemos
que a escola possibilitada para o campo era, quando muito, a educação das primeiras letras,
poisalfabetizar-se e dominar as séries iniciais era considerado o suficiente para a população do
campo. Não se pode negar uma dura realidade de exclusão ao meio rural, em que se entendia que
ler, pensar e refletir não tinha nenhuma utilidade e serventia para os camponeses. A educação foi
vista como um processo desnecessário na vida desses povos e o acesso ao mundo do conhecimento
e do saber era negado.
A Lei Federal nº5692/1971 se fez cumprir, porém em parte, pois enquanto era obrigatório
cursar primeiro grau para a população em geral, para a população do campo era permitida a não
obrigatoriedade, uma forma de exclusão. A população do campo era acostumada a viver com essa
exclusão inconsciente, a aceitar a situação, assim como fazia parte da mentalidade que até os pais
concordassem e incentivassem os filhos que era suficiente estudar até a quarta série. Culturalmente
aceitava-se sem questionar. Assim, trabalhar na roça, criar cultura a partir do manejo da terra, da
lida campesina, era a única condição que se exigia dos jovens.
A partir da organização da luta pela terra, começa-se a perceber que a escola é um direito
que foi negado para os povos do campo. Começa-se então a perceber que a educação não se dá só
na escola, pois, da forma como a escola trabalhava, era distante, ela negava o conhecimento
construído no próprio campo, era um conhecimento distante, alheio, sem significado para a criança
do campo. Conforme Sônia Fátima Schwendler, mestre em extensão rural, a ideia presente era que
se a criança estudasse era para sair do campo. Para poder se formar, em consequência tinha que ir
para outro lugar para trabalhar. Caso contrário se dizia: “A criança estudou e vai voltar para o
campo?” A ideia era, e continua sendo, de que quem vive no campo não precisa de escolarização, de
estudo. É pela luta do trabalhador do campo que começa a mudar essa concepção. A origem da ideia
da escola do campo está na luta dos movimentos sociais:
Além de conviverem, muitas vezes, com o preconceito por serem do campo, cria-se e se reforça nos educandos a ideia de que a cidade é lugar do moderno e o campo do atraso, de uma cultura inferior ultrapassada. O campo é esvaziado de sentido, a cidade e a escola da cidade são vistas como espaços que oferecem mais opções de lazer, de aprendizagem, possuem mais infra-estrutura e são mais valorizadas no imaginário popular. (SCHWENDLER, 2005, p. 42).
O que temos atualmente são propostas com uma mesma finalidade, conteúdos iguais
para todos, que habilitam as crianças do meio rural ou urbano para experiências modernas da
produção e do mercado. Com o Projeto de Educação do Campo, esse paradigma deverá ser
rompido, criando projetos voltados para o campo exclusivamente.
3.2Legislação e Escola do Campo
A reflexão sobre as peculiaridades da Escola do Campo é tema de discussão há décadas, com
o objetivo de fomentar carências do ensino no campo, como a falta de infraestrutura das escolas e os
equívocos do currículo, que não levava em conta as necessidades específicas dos alunos das escolas
do campo. Nos últimos 25 anos, na legislação, isso mudou. No ano passado, o Decreto 7.352
transformou o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) em política pública.
O decreto assegura o comprometimento de governos futuros com a criação de cursos de Pedagogia
e de especialização específicos para professores das escolas do campo.
Os movimentos populares dos anos 1980, como o dos Trabalhadores Sem Terra (MST),
pediram mudanças. Uma das principais conquistas foi a inclusão do tema na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB), em 1996. Há também preocupação com os âmbitos
pedagógico e político, como as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do
Campo e as diretrizes complementares. Em 2004, o MEC criou a Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad), que tem, entre suas atribuições, a de gerenciar
diversos programas voltados à melhoria das condições de ensino no meio rural. Uma iniciativa é o
Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em Educação do Campo (Procampo), que
tem como objetivo investir na formação em serviço de professores dos anos finais do Ensino
Fundamental principalmente os que têm o Ensino Médio e não frequentam uma universidade. A
educação no campo precisa valorizar a realidade de quem vive e trabalha na terra, precisa fortalecer
o vínculo do professor com a escola.
O movimento do campo no Brasil tem conseguido se articular colocando suas necessidades,
exigindo ações do Estado e exercendo influência nas orientações das políticas públicas para o
campo. Consideramos o grande salto do movimento do campo brasileiro, que é o reconhecimento
da educação como fator fundamental no processo de emancipação e de superação da barbárie vivida
no campo, e a clareza de que uma proposta de educação do campo tem, necessariamente, que incluir
a discussão do modelo de desenvolvimento a que estamos submetidos, que passa despercebido no
dia a dia das escolas, para que ele deixe de parecer normal e seja entendido como uma escolha que
provoca efeitos diretos na continuidade e possibilidade de vida no campo.
Conforme Maria do Socorro Silva (2004), em nosso país a educação do campo perpassou, e
ainda perpassa, momentos difíceis:
Para o Brasil, que foi colônia de exploração durante mais de 300 anos, o desenvolvimento de um sistema educacional não era considerado prioridade. Assim, as pessoas que exerciam as atividades agrícolas, ou seja, escravos – índios e negros africanos – e os colonos imigrantes, encontravam-se em situação de desvantagem, não podiam esperar políticas educacionais, pois não se considerava necessário saber ler e escrever para trabalhar com a terra. A escola brasileira, desde o seu início até o século XX, serviu e serve para atender as elites, sendo inacessível para grande parte da população rural. (SILVA, 2004, p.1).
Com relação à educação dos povos do campo, a LDBEN de 1996 foi promissora. O artigo
28, que se refere especificamente à oferta da educação para a população rural, prevê currículos e
metodologias apropriadas aos interesses dos alunos da zona rural, bem como prevê organização
escolar própria, com adequação do calendário escolar às condições climáticas e fases do ciclo
agrícola e adequação à natureza do trabalho da zona rural. Também se torna possível visualizar
alguma flexibilidade e autonomia em outros artigos dessa lei, que podem e devem ser utilizados
pelos gestores educacionais e escolares para a proposição de políticas educacionais para os povos
do campo.
O artigo 12, ao trazer os encargos dos sistemas de ensino, afirma que esses sistemas devem
articular-se com as famílias e a comunidade para criar processos de integração entre sociedade e
escola.
No que se refere aos docentes, nossa atual LDBEN define que estes, entre outros encargos,
devem colaborar com atividades que articulem escola, família e sociedade.
O artigo 23, parágrafo 2°, faz referência ao calendário escolar, que deve ser adequado às
peculiaridades locais, climáticas e econômicas, mas sem reduzir o número de horas letivas.
O artigo 26, referente ao currículo, abriu espaço para que as diferenças locais
complementem a base nacional comum a todos os estabelecimentos de ensino.
Para que essa conjectura se efetive na prática, se fazem necessárias posturas de trabalho
conjunto com a comunidade, como desafios que devem ser encarados para o enriquecimento da
gestão dos sistemas de ensino e do trabalho docente. Essa autonomia delegada à organização da
educação escolar possibilitou que os sujeitos sociais do campo, que tiveram seu direito à educação
negligenciado por muito tempo, passassem a ter a oportunidade de requerer políticas educacionais
específicas à sua cultura, a seu trabalho e às suas lutas, sabendo-se que essas lutas têm vários
objetivos: terra, saúde, respeito, dignidade, valorização dos produtos – alimentos que estão em
nossa mesa todos os dias – e também educação de qualidade, educação no e do campo.
E foi através dessas lutas que nasceram, dentro dos movimentos sociais do campo, mais
especificamente nos acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),
escolas que buscavam imprimir uma metodologia diferenciada e condizente com os anseios das
lutas dos povos do campo, as escolas itinerantes, uma busca de uma educação que humaniza a partir
do saber comunitário e que, ao institucionalizar-se, torna-se utilitarista.
Essa luta por uma educação do e no campo (e não apenas para o campo), nascida dos e nos
movimentos sociais do campo, tomou contorno nacional e gerou o que Antônio Munarim (2008)
nomeou de Movimento Nacional de Educação do Campo. O autor salienta que:
[...] a experiência acumulada pelo Movimento Sem Terra (MST) com as escolas de assentamentos e acampamentos, bem como a própria existência do MST como movimento pela terra e por direitos correlatos, pode ser entendida como um processo histórico mais amplo de onde deriva o nascente Movimento de Educação do Campo. (MUNARIM, 2008, p. 59).
Não se pode negar que a essência da educação do camposurge da luta dos movimentos
sociais pela reforma agrária e pela terra.
Em 2002, a aprovação, pelo Conselho Nacional de Educação, da Resolução nº1, de 3 de
abril, que instituiu as Diretrizes Operacionais da Educação Básica nas Escolas do Campo,
representou uma conquista política importante para Movimento Nacional de Educação do Campo.
No texto dessas Diretrizes, o parágrafo único do artigo 2º demarcou, com clareza, a concepção de
escola do campo defendida pelos sujeitos sociais que a ela se atrelam. Sua identidade é definida
pela sua vinculação às questões inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e nos
saberes próprios dos estudantes.
Também a Resolução CNE/CEB nº 2, de 28 de abril de 2008, estabelece diretrizes
complementares, normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento
da Educação Básica do Campo.
Para complementar, ainda temos as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, referência
em educação do campo, uma lei de operacionalização da educação composta por um conjunto de
princípios e de procedimentos para serem observados nos projetos das instituições que integram os
diversos sistemas de ensino e que visam adequar o projeto nas Escolas do Campo nos diferentes
níveis e modalidades as leis da educação. Discute os eixos temáticos e alternativas metodológicas
do ensino campesino.
A Diretriz Curricular da Educação do Campo deve ser observada, pois ela é um conteúdo
para a gestão de Políticas Públicas Educacionais. Seu texto, conectado às Diretrizes Nacionais,
reformula a concepção de campo para além do perímetro rural e leva em consideração as
especificidades de cada povo:
[...] essa compreensão de campo vai além de uma definição jurídica. Configura um conceito político ao considerar as particularidades dos sujeitos e não apenas sua localização espacial e geográfica. A perspectiva da educação do campo se articula a um projeto político e econômico de desenvolvimento local e sustentável, a partir da perspectiva dos interesses dos povos que nele vivem. (PARANÁ, 2006, p. 22).
3.3 A Escola na Educação do Campo
Apesar da legislação posta que ampara a educação do campo, esta requer um olhar de
educador, de gestor com o perfil para o campo. Deve haver a compreensão e entender que o campo
não é apenas um espaço de produção agrícola, pois ele deve ser também um espaço de vida.
Necessita-se do movimento da comunidade escolar para que a escola se firme. Se não tem meio de
subsistência para a comunidade sobreviver, a escola também tende a “minguar”. O grande mal da
escola moderna é fazer “divórcio” com a vida. Isso acontece tanto no discurso ideológico quanto
nas práticas (até mesmo nas práticas curriculares).
O profissional da educação do campo está diante de um grande desafio que é a mudança do
modelo de educação presente no campo, que, na atual conjuntura, prepara para serem bajuladores à
lógica do capitalismo, para as regras do agronegócio, e este, por sua vez, não necessita de vida, nem
de gente, pois a máquina substitui, o computador comanda. Há necessidade de se levar em
consideração uma série de aspectos do mundo rural que influenciam a vida da sociedade campesina,
como o sentido do tempo, a sazonalidade, a migração e a própria história do movimento social do
campo.
O professor deve estar preparado para trabalhar com os alunos da zona rural, ou vindo do
campo para estudar na cidade. Para planejar suas aulas, o professor deve levar em conta a cultura
desses alunos. É preciso considerar as características e as necessidades próprias do estudante
campesino, dado seu espaço cultural.
As DCE (Diretrizes Curriculares da Educação Básica) têm o papel de organizar suas lutas.
Em Educação do Campo consta que:
[...] valorizar a cultura dos povos significa criar vínculos com a comunidade e gerar um sentimento de pertença ao lugar e ao grupo social. Isso possibilita criar uma identidade sociocultural que leva o aluno a compreender o mundo e transformá-lo. (DCE – Educação do Campo, 2006, p. 33).
A Educação do Campo é parte essencial do desenvolvimento territorial, que se configura
como espaço que reúne, como moradia, trabalho, educação, conforto, dignidade.
Precisa-se buscar avançar na compreensão das políticas públicas para a Educação do
Campo, identificar os principais caminhos feitos pelas Diretrizes Operacionais para Educação nas
escolas do campo. A necessidade de um calendário específico para a preservação das singularidades
da escola do campo. Em época de safra, a família necessita de mão de obra do/a filho/a estudante:
“Os tempos camponeses são diferentes dos tempos urbanos” (MARTINS, 2008).
Consequentemente, o educador que atua no campo deveria estar lotado somente numa
escola, deveria poder contar com concurso específico para a escola do campo, com o incentivo ao
vínculo permanente, dedicação exclusiva gratificada, a exemplo do ensino superior, caso contrário
não tem como haver compatibilidade de calendário/horário.
Conforme Fernando J. Martins,
Há, nesse sentido, iniciativas como a pedagogia da alternância e do trabalho como princípio educativo que visa a vincular os tempos educativos com as necessidades da educação do campo. [...] São situações possíveis. [...] A escola do campo é, por si, um “laboratório”, não no sentido da ciência experimental, mas no sentido de práxis. [...] em vez de sacrificar os tempos educativo-cogniscitivos com atividades “extra-escolares”, a ampliação dos tempos escolares, incorporando tais atividades na dinâmica escolar, pode contribuir para a superação do caráter assistencialista que têm assumido tais atividades, tornando-as realmente formativas. (MARTINS, 2008, p. 93-106).
O que se faz fundamental é inserir o campo como elemento articulador do trabalho. Contar
com disciplina específica no currículo. E, para que o PPP esteja de acordo com o projeto da escola
do campo, todos precisam estar envolvidos, comunidade interna e externa. E, para que isso se
efetive, tem que haver condições materiais e de trabalho proporcionado pela equipe pedagógica; e,
na maioria das vezes, essa equipe não existe, pela falta de demanda nas escolas consideradas de
pequeno porte, para contratar pessoal.
O PPP deve dar atenção especial às necessidades básicas de aprendizagem do estudante
residente no campo. Deve ser como um instrumento de inserção na comunidade e ação
democratizadora. Faz-se necessário construir estratégias de aproximação da comunidade com a
escola. Ações integrantes e desafiadoras para a consolidação da educação do campo, como: Semana
Camponesa (feira cultural/ ciências/ artesanato/ plantas medicinais - pastoral da saúde/ culinária/
festas típicas), assim como questionários que envolvam a comunidade externa e interna.
É preciso entender a realidade, onde estão as crianças, os adolescentes e os jovens e quais
são seus anseios com o processo educacional para suas vidas. O trabalho é extremamente educativo,
a escola deve estar articulada ao projeto da comunidade. Caldart (2004, p. 23) nos lembra da
necessidade de educar os povos do campo a partir das diferentes identidades. Ou seja, sem qualquer
recusa de contaminação do quotidiano desses sujeitos.
Cabem, por fim, algumas indagações: onde, quando e com quem essas crianças, esses
jovens, irão aprender a ser camponeses, se esses ensinamentos (agrícolas) devem começar desde a
tenra idade?
4 Conclusão
Os aspectos analisados foram o envolvimento – participação – na proposta de trabalho por
parte dos professores participantes, as discussões por eles levantadas, a apresentação de propostas
para melhorias no ambiente escolar rural com a construção efetiva da escola do campo. Sabe-se que
é preciso um comprometimento dos envolvidos no processo, criar uma estrutura que dê conta de
projetos voltados para as especificidades do campo, sempre com a grande preocupação de não
promover o esvaziamento de conteúdos, mas com uma lógica inclusiva, tratando nossas crianças e
adolescentes com respeito e dignidade.
Isso, porém, não é tarefa simples, uma vez que, nas escolas do campo, há poucos professores
efetivos, pois a maioria são professores PSS, o que causa uma alta rotatividade e sobrecarga de
trabalho a equipe pedagógica/administrativa, que é formada por uma única pedagoga com o cargo
de diretora, maisa secretária, ambas com a carga horária de 20horas. Mesmo assim, a escola
funciona com vários projetos de contraturno: (i) salas de apoio (Português/Matemática), (ii)
CELEM (Alemão), (iii) PACC (Literatura), (iv)bem como a frequência neste curso de extensão. E
cabe mencionar aqui as dificuldades de a escola estar localizada em um espaço rural em que a
poeira é intensa e há somente uma funcionária para os serviços gerais.
Essa realidade mostra que, efetivamente, não há o reconhecimento e a valorização da
diversidade sociocultural no âmbito pelo direito à igualdade e ao respeito às diferenças das
comunidades interioranas. Tudo é sucateado, desde a estrutura de recursos humanos até a
infraestrutura predial, e essa falta de tudo é justificada pelo pequeno número de alunos. Tudo
contribui para um déficit social, econômico, cultural e histórico de vulnerabilidade dos povos do
campo.
O paradigma educacional das escolas rurais não é emancipatório. Mesmo que existam políti-
cas públicas específicas voltadas para educação do campo, continua sendo uma educação dominan-
te, ou seja, prevalece um modelo urbanizado de educação, que coloca em prática os fundamentos da
divisão social do trabalho, impostos pelo sistema capitalista, que oficializa a condição de que alguns
foram feitos para obedecer e outros para pensar, reproduzindo preconceitos e estigmas e reforçando
mitos sobre o homem e a mulher do campo. A realidade é que, enquantoescola do campo, não temos
autonomia nenhuma. Tudo é regido pelas mesmas políticas públicas de educação urbana.
Enquanto gestora da escola, ao consultar o NRE (Núcleo Regional de Ensino) para rever al-
gumas características da escola do campo, enquanto aspectos políticos e pedagógicos e a organiza-
ção curricular que leva em consideração o respeito aos tempos e modos de ser, viver e produzir do
campo, suas reais necessidades e interesses, a relação com a terra e o meioambiente e a incorpora-
ção do espaço com suas especificidades e peculiaridades, para poder fazer possíveis desdobramen-
tos na organização do currículo escolar, as respostas são as mais desanimadoras possíveis. Efetiva-
mente, não há o reconhecimento nem a valorização da diversidade sociocultural da comunidade no
âmbito do direito à igualdade e do respeito às diferenças e resgate da identidade da população aten-
dida, como prevê a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e as Diretrizes Opera-
cionais para a Educação do Campo, que apresentam princípios e procedimentos que visam adequar
o projeto institucional das escolas do campo às Diretrizes Curriculares Nacionais. Há, na prática,
um único sistema a ser seguido, tanto para as escolas urbanas quanto para as escolas do campo.Fi-
cam os desafios como:
• consolidar a identidade da nossa escola como sendo do campo;
• promover formação continuada para pais, que, em nossa comunidade, possuem uma vi-
são errônea da escola do campo;
• formação continuada para docentes e funcionários, pensando nos tempos e espaços esco-
lares, que precisam ser diferentes nas escolas do campo, e pensando também em CUR-
RÍCULO;
• demanda adequada;
• abertura de Ensino Médio, tendo em vista continuidade e permanência dos nossos alunos
no campo, além de ser uma maneira de manter a comunidade “viva” por mais gerações.
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