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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ENGENHARIA DE LORENA GUILHERME FAGUNDES FERNANDES Construção e caracterização de mola helicoidal com memória de forma aplicada em um atuador linear termoativado Lorena 2014

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE ENGENHARIA DE LORENA

GUILHERME FAGUNDES FERNANDES

Construção e caracterização de mola helicoidal com memória de forma

aplicada em um atuador linear termoativado

Lorena

2014

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GUILHERME FAGUNDES FERNANDES

Construção e caracterização de mola helicoidal com memória de forma

aplicada em um atuador linear termoativado

Trabalho de Graduação apresentado à

Escola de Engenharia de Lorena da

Universidade de São Paulo para obtenção

do título de Engenheiro de Materiais.

Orientador: Prof. Dr. Sergio Schneider

Lorena

2014

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AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE

TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS

DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

Ficha Catalográfica Elaborada pela Biblioteca Especializada em Engenharia de Materiais

EEL USP

Fernandes, Guilherme

Construção e caracterização de mola helicoidal com memória

de forma aplicada em um atuador termoativado. / Guilherme

Fagundes Fernandes ; orientador Sergio Schneider. --Lorena, 2014.

45 f.: il.

Monografia (Trabalho de Graduação em Engenharia de

Materiais) – Escola de Engenharia de Lorena - Universidade de São

Paulo.

1. Ligas memória de forma 2. Molas helicoidais 3. Atuadores

4. Ligas de NiTi I. Título.

CDU 669.018

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Dedico este trabalho à minha mãe, Vera

Lucia Fagundes Fernandes, ao meu pai,

Wanderley Fenandes e ao meu irmão Glauco

Fagundes Fernandes, que transformaram os

inúmeros incentivos e apoios nesta etapa da

minha vida em um sonho se tornando

realidade.

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AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Dr. Sergio Schneider, pela oportunidade, ensinamento e vontade em ajudar neste

trabalho de conclusão de curso.

Aos funcionários do Departamento de Engenharia de Materiais da Escola de Engenharia de

Lorena, Bento Ferreira, Everaldo Pinheiro Bruno e Francisco de Paiva Reis, pela cooperação

e boa vontade.

Aos meus colegas Fabiano Eduardo Marques, Juliana Soares L’Abbate e Roberta Narezi

Pimentel Rosa, pelas conversas e intensa ajuda.

Aos meus amigos de república Alexandre Dutra Golanda, Caio Rodrigues Cabestré, Denyel

Mulia Miranda e Marcos Benedetti Groblackner, que me acompanharam nessa incrível

jornada.

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“Os que se encantam com a pratica sem a

ciência são como os timoneiros que entram no

navio sem timão nem bússola, mas tendo

certeza de seu destino”.

Leonardo da Vinci

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RESUMO

FERNANDES, G.F. Construção e caracterização de mola helicoidal com memória de

forma aplicada em um atuador linear termoativado. 2014. 45 f. Monografia (Trabalho de

Graduação em Engenharia de Materiais) – Escola de Engenharia de Lorena, Universidade de

São Paulo, Lorena, 2014.

Ligas com memória de forma (SMA) têm sido considerados como um dos materiais

inteligentes mais promissores. Eles podem fornecer novas soluções em diversas áreas, para

várias aplicações (por exemplo, atuadores, aplicação biomédica, sistemas de fixação, etc.).

Ligas com memória de forma demonstram uma capacidade única de recuperar a sua forma

inicial após a deformação através de uma transformação de fase termo elástica reversível, isso

permite as ligas com memória de forma recuperar grandes deformações, também

espontaneamente (pseudoelasticidade) ou através de um aumento da temperatura (efeito

memória de forma). Entre as ligas com memória de forma disponíveis comercialmente,

níquel-titânio (NiTi) são as mais requeridas devido a sua excelente performance e

confiabilidade, além de recuperar sua deformação, NiTi é atraente para várias aplicações

médicas, devido a sua biocompatibilidade, resistência à corrosão e seu comportamento sob

fadiga. O presente trabalho tem como objetivo principal a construção e a caracterização de

uma mola SMA de NiTi para aplicação em atuadores termoativados. As técnicas de análise

empregadas para a mola SMA foram, DSC e obtenção da histerese, e ensaios termomecânicos

para obter uma mola TWSME e ensaios para determinação das constantes elásticas da mola

na fase martensita e na fase austenita. Os resultados obtidos para as temperaturas de

transformação de fase foram Mi = 38,42°C ; Mf = 28,2°C ; Ai = 33,61°C e Af = 43,7°C. O

treinando da mola foi possível obter uma recuperação elástica média de η = 53,06%. Para os

ensaios de constante elástica da mola nas fases martensítica e austenítica foram realizadas nas

temperaturas de 25°C e 50°C, respectivamente, obtendo os valores de k25°C = 0,395 N/mm e

k50°C = 0,611 N/mm. A partir dos resultados obtidos foi possível desenvolver e testar um

atuador termoativado SMA capaz de acionar e desacionar um dispositivo eletônico.

Palavras-chave: Ligas memória de forma, Molas helicoidais, Atuadores, Ligas de NiTi.

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ABSTRACT

FERNANDES, G.F. Construction and characterization of coil spring shape memory

applied to linear actuator activated by temperature. 2014. 45 f. Monograph

(Undergraduate Work in Materials Engineering) – Escola de Engenharia de Lorena,

Universidade de São Paulo, Lorena, 2014.

Shape Memory Alloys (SMAs) have been considered as one of the most promising smart

materials. They can provide novel solution in several fields, for various applications (e.g.

actuator, biomedical application, clamping systems, ect.). Shape Memory Alloys demonstrate

a unique ability to recover their initial shape after deformation through a reversible thermo-

elastic phase transformation, it allows Shape Memory Alloys to recover large strains, either

spontaneously (pseudo elasticity) or through an increase in temperature (Shape Memory

Effect). Among the commercially available Shape Memory Alloys, nickel-titanium (NiTi) one

are outstanding due to their excellent performance and reliability, in addition to strain

recovery, NiTi is attractive for several medical applications due to its biocompatibility,

corrosion resistance and fatigue behavior. The present work aims to manufacture and

characterization of coil spring NiTi SMA applied to linear actuator active by temperature.

Analytical techniques employed for SMA coil spring were, DSC and obtaining hysteresis, and

thermo mechanical tests to get a TWSME coil spring and tests to determine the elastic

constants of coil spring in martensite phase and austenite phase. The results obtained for a

phase transformation temperatures were Mi = 38,42°C ; Mf = 28,2°C ; Ai = 33,61°C e Af =

43,7°C. The coil spring training was possible to obtain an average elastic recovery

η = 53,06%. For the testing of elastic coil spring constant in the martensitic and austenitic

phase were held at 25°C and 50°C respectively, giving the values of k25°C = 0,395 N/mm e

k50°C = 0,611 N/mm. From the results obtained it was possible to develop and test a SMA

actuator activated by temperature able to activate and deactivate a electronic device.

Keywords: Shape memory alloy, Helical springs, Actuators, NiTi alloys.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 Estrutura cristalina da (a) austenita, microestruturalmente ordenado e da (b)

martensita, menos simétrico. ……………………………………………………………....... 18

Figura 1.2 Dois caminhos de transformação em ligas de NiTi: primeiro estágio de

transformação B2 → B19’, segundo estágio de transformação B2 → fase-R → B19’,

transformação reversa B19’ → B2, fase-R → B2 ................................................................... 19

Figura 1.3 Histerese térmica na transformação de fase de uma liga com memória de forma.20

Figura 1.4 Representação de dois cristais separados por um contorno de macla. ..................21

Figura 1.5 Microestrutura da austenita e martensita em um plano bidimensional: (a) austenita,

(b) martensita maclada, (c) martensita demaclada. ..................................................................22

Figura 1.6 Relação entre temperatura de transformação de fase e tensão aplicada. ...............22

Figura 1.7 DSC de uma liga NiTi, mostrando seu comportamento durante o aquecimento e

resfriamento. ............................................................................................................................23

Figura 1.8 Gráfico Tensão-Deformação-Temperatura para SMA. Md é a temperatura de

transição entre a fase pseudoelástica e a austenítica que, para uma liga NiTi, é normalmente

acima da temperatura Af. .........................................................................................................25

Figura 1.9 (a) único cristal na fase de origem, (b) auto reorganização atômica na martensita,

(c) deformação na martensita (maclação e demaclação), (d) aquecimento até a temperatura

acima de Af (transformação reversa). ......................................................................................26

Figura 1.10 Efeito memória de forma mostrado microscópicamente; austenita é resfriada para

formar a martensita maclada sem sofrer alteração em sua forma, quando é deformada pela

movimentação dos contornos de maclas. A estrutura original austenítica e sua forma

retornarão após o aquecimento da SMA. .................................................................................27

Figura 1.11 Macroscopicamente o mecanismo OWSME; (a) Martensita, (b) Carregamento e

deformação na fase martensita (T < Mf), (c) Aquecimento acima da temperatura final da

austenita (T > Af), (d) Resfriamento até a fase martensita (T < Mf). .......................................28

Figura 1.12 Macroscopicamente o mecanismo TWSME; (a) Estado martensítico, (b) várias

deformações irreversíveis, (c) aquecimento, (d) resfriamento. ................................................29

Figura 1.13 Curva tensão-deformação: comportamento SE de NiTi SMA, pode ser observado

a grande deformação reversa, que pode chegar em alguns casos até 8%. ...............................30

Figura 2.1 Fixação do fio de NiTi no mandril cilíndrco na forma de uma mola helicoidal de

seção retangular. .......................................................................................................................32

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Figura 2.2 Forno utilizado para o tratamento térmico da mola. ..............................................32

Figura 2.3 Tratamento termomecânico para a produção da mola TWSME. ..........................34

Figura 2.4 Dispositivo usado na etapa de treinamento da mola helicoidal. ............................34

Figura 2.5 Desenho esquemático do projeto do atuador linear. ..............................................35

Figura 2.6 Atuador linear utilizado para a mola helicoidal SMA. ..........................................35

Figura 2.7 Dispositivo de ensaios mecânicos instalado na máquina da EMIC para

determinação da constante da mola. ........................................................................................36

Figura 3.1 Análise de DSC para a liga NiTi. ..........................................................................38

Figura 3.2 Comportamento elástico da mola durante 100 ciclos térmicos do treinamento. ...39

Figura 3.3 Comportamento da mola em compressão. .............................................................40

Figura 3.4 Histerese da curva força x temperatura para determinação das temperaturas de

transição de fases da mola SMA. .............................................................................................41

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1.1 Temperaturas de transição de fases para a mola SMA em função dos métodos

aplicados. ................................................................................................................................ .42

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LISTA DE SIGLAS

SMA Shape Memory Alloy

SME Shape Memory Effect

CCC Cúbico de corpo centrado

TTM Trabalho de graduação

MTI

DSC

SE

OWSME

TWSME

SATWSME

DEMAR

EEL

USP

Transformação Termoelástica Martensítica

Differencial Scanner Calorimeter

Superelastic Effect

One Way Shape Memory Alloy

Two Way Shape Memory Alloy

Stress Assisted Two Way Shape Memory Effect

Departamento de Engenharia de Materiais

Escola de Engenharia de Lorena

Universidade de São Paulo

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LISTA DE SÍMBOLOS

B2 Estrutura ordenanda CCC

B19’ Estrutura monoclínica

Mi Temperatura de início da transformação martensítica

Mf Temperatura de término da transformação martensítica

Ai Temperatura de início da transformação austenítica

Af Temperatura de término da transformação austenítica

Md Máxima temperatura em que a martensita é formada por tensão

dσ Derivada da tensão aplicada

dT Derivada da temperatura

T Temperatura (°C)

ε Deformação (%)

σ Tensão (MPa)

τ Tensão de cisalhamento (MPa)

η Recuperação elástica (%)

La Comprimento da mola na fase austenítica (mm)

Lm Comprimento da mola na fase martensítica (mm)

F Força (N)

Fel Força elástica (N)

ΔL

k

G

D

n

d

Deformação da mola (mm)

Constante elástica da mola (N/mm)

Módulo de cisalhamento (GPa)

Diâmetro da mola (mm)

Número de espiras da mola

Diâmetro do fio (mm)

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SUMÁRIO

1 INDRODUÇÃO ................................................................................................................ 17

1.1 Histórico de ligas com memória de forma ................................................................. 17

1.2 Transformação termoelástica martensítica ................................................................ 17

1.3 Propriedades mecânicas e funcionais de ligas NiTi ................................................... 23

1.4 Efeito memória de forma (SME) ............................................................................... 25

1.4.1 One Way Shape Memory Effect (OWSME) ...................................................... 27

1.4.2 Two Way Shape Memory Effect (TWSME) ...................................................... 28

1.4.3 Stress Assisted Two Way Shape Memory Effect (SATWSME) ........................ 29

1.4.4 Efeito Superelástico (SE).................................................................................... 30

1.5 Objetivos e justificativas ............................................................................................ 31

2 MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................................. 31

2.1 Preparação da mola helicoidal ................................................................................... 31

2.2 Análise de DSC (Differencial Scanner Calorimeter) ................................................. 33

2.3 Treinamento da mola ................................................................................................. 33

2.4 Projeto do atuador linear termoativado ...................................................................... 34

2.5 Ensaio para determinação da constante elástica da mola........................................... 35

2.6 Ensaio para determinação das temperaturas de transição de fase da mola SMA

através da histerese ............................................................................................................... 37

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO ...................................................................................... 37

3.1 Resultados da análise de DSC ................................................................................... 37

3.2 Resultados do treinamento da mola ........................................................................... 38

3.3 Resultados do ensaio para determinação da constante elástica da mola .................... 39

3.3.1 Determinação do módulo de cisalhamento da mola ........................................... 40

3.4 Resultados do ensaio para determinação das temperaturas de transição de fase da

mola SMA através da histerese ............................................................................................. 41

3.5 Resultados do atuador linear termoativado ................................................................ 42

4 CONCLUSÕES ................................................................................................................. 43

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 44

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1 INDRODUÇÃO

1.1 Histórico de ligas com memória de forma

Ligas com memória de forma (SMA) são capazes de memorizar e recuperar a sua forma

original depois de serem deformados, com seu aquecimento acima da temperatura de

transformação de fase. Este efeito único de retornar a uma geometria original após uma

grande deformação plástica (próximo de 10%) é conhecido como Efeito de Memória de forma

(SME).

Os primeiros relatos para a descoberta do “efeito de memória de forma” foram relatados

nos anos de 1930, quando A. Olander descobriu o comportamento pseudoelástico da liga Au-

Cd em 1932 (OTSUKA, 1998). Em 1938, Greninger & Mooradian, observaram a formação e

o desaparecimento de uma fase martensítica pela diminuição e aumento da temperatura em

uma liga de Cu-Zn. O fenômeno básico do efeito de memória causado pelo comportamento

termoelástico da fase martensita foi amplamente relatado uma década depois, em 1949 por

Kurdjumov & Khandros e também em 1951 por Chang & Read.

No início de 1960, Buehler e seus colegas de trabalho da U.S. Naval Ordnance

Laboratory descobriram o efeito de memória de forma em uma liga equiatômica de níquel e

titânio, na qual pode ser considerado um grande avanço para os materiais com memória de

forma (BUEHLER, 1967). Esta liga foi nomeada Nitinol (Níquel-Titânio Naval Ordnance

Laboratory).

Desde então, as intensas investigações foram feitas para melhor entender o mecanismo

do seu comportamento básico. O uso de NiTi é interessante devido ao seu comportamento

funcional especial, o qual é completamente novo em comparação com as ligas de metais

convencionais. Ligas de NiTi com memória de forma podem fornecer novas soluções em

diversas áreas, para várias aplicações como, atuadores, sistemas de fixação, aplicação

biomédica, por exemplo.

1.2 Transformação termoelástica martensítica

Ligas de memória de forma de NiTi podem existir em duas diferentes estruturas

cristalinas em relação a temperatura, martensita (baixa temperatura) e austenita (alta

temperatura ou também conhecida como fase de origem). Várias propriedades do NiTi

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austenítico e NiTi martensítico, como módulo de Young, resistência elétrica entre outros são

particularmente diferentes (OTSUKA, 2005; DUERING, 1990).

A austenita é caracterizada por uma estrutura cúbica de corpo centrado (CCC), onde o

átomo de níquel está no centro da estrutura cristalográfica e o átomo de titânio está nos oito

vértices do cubo. A fase austenítica é microestruturalmente simétrica, por isso pode ser

considerada fase de origem. A estrutura ordenada CCC é do tipo B2. A fase martensítica do

NiTi é menos simétrica e caracterizada por uma estrutura monoclínica B19’. A Figura 1.1

mostra dois cristais de NiTi nas fases austenítica e martensítica.

(a) (b)

Figura 1.1 Estrutura cristalina da (a) austenita, microestruturalmente ordenado e da (b)

martensita, menos simétrico. (OTSUKA, 1998).

O comportamento único de NiTi é baseado na dependência da temperatura na

transformação de fase da austenita para martensita em escala atômica, na qual é chamada de

Transformação Termoelástica Martensítica (TTM). TTM gera propriedades funcionais como

resultado da necessidade da estrutura cristalina em acomodar um estado mínimo de energia

para uma dada temperatura (OTSUKA, 1998).

A TTM, e a sua reversão, é uma transformação de fase adifusional causada por tensões

cisalhantes onde ocorre a nucleação e crescimento da fase martensítica a partir da fase de

origem austenítica. A TTM pode ser ativada, de modo que as ligas de NiTi podem ser

transformadas de austenita para martensita e vice-versa, através de uma redução da

temperatura (Martensita Termicamente Induzida, MTI) ou pela aplicação de uma tensão

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mecânica (Martensita Induzida por Tensão, MIT). Por outro lado, a martensita se transforma

em austenita, ou pelo aumento da temperatura ou removendo a tensão aplicada. Isto mostra

que o carregamento mecânico e térmico tem efeitos opostos em ligas de NiTi.

Entretanto, sob certas circunstâncias, como trabalho a frio, ciclos térmicos, tratamento

térmico ou composição química, uma fase intermediária conhecida como romboédrica ou

fase-R, pode aparecer entre a austenita e a martensita, causando um comportamento de

transformação em dois estágios como é mostrado na Figura 1.2.

Figura 1.2 Dois caminhos de transformação em ligas de NiTi: primeiro estágio de

transformação B2 → B19’, segundo estágio de transformação B2 → fase-R → B19’,

transformação reversa B19’ → B2, fase-R → B2. (Adaptado de YANG, 2003).

Bataillard observou que a formação da fase-R ocorre em relação a campos de tensão

gerados por precipitados coerentes de Ni4Ti3. Khalil-Allafi e seus colegas de trabalho

investigaram o efeito do envelhecimento como uma função do tempo e temperatura e

sugeriram que a heterogeneidade química e microestrutural também desempenhavam um

papel importante na sequência de transição de fase observada nas transições de multi-passos.

Outra maneira de estabilizar a fase-R em ligas binárias de NiTi é introduzir discordâncias,

geralmente por trabalho a frio. Somente em ligas ternárias como NiTiFe, NiTiAl ou NiTiCo, a

fase-R é conhecida por ocorrer espontaneamente. Assim, a determinação da fase-R binários

de NiTi é sempre um desafio devido a presença de outras fases, defeitos e até mesmo as

texturas introduzidas (YANG, 2003; REN, 2005; AKDOGAN, 2008).

Quando a austenita é resfriada, começa a transformação para a martensita, na qual a

temperatura deste fenômeno começa é chamado de temperatura de início da martensita (Mi),

enquanto a temperatura na qual a martensita é revertida completamente é chamado de

temperatura final da martensita (Mf). Quando a martensita é aquecida, começa a

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20

transformação para austenita, a temperatura na qual este fenômeno começa é chamado de

temperatura de início da austenita (Ai), enquanto a temperatura na qual este fenômeno é

completamente revertido é chamado de temperatura final da austenita (Af), (BUEHLER,

1967; DUERING, 1990) e Md é a máxima temperatura em que a martensita (martensita

superelástica) é formada por tensão, como é observado na Figura 1.3. A histerese ocorre

devido ao atrito interno do movimento atômico.

Figura 1.3 Histerese térmica na transformação de fase de uma liga com memória de forma.

(BUEHLER, 1967).

Devido as características da TTM, a tensão aplicada desempenha um papel muito

importante. Durante o resfriamento da liga de NiTi abaixo da temperatura Mi e na ausência de

tensões aplicadas, as variantes da fase martensítica se ordenam de uma forma auto eficiente,

com um total de 24 planos cristalográficos equivalentes, resultando em uma não observação

da mudança de forma macroscópica. O mecanismo pelo qual as variantes da transformação da

martensita em austenita por resfrimento é conhecido como maclação, na qual uma força de

cisalhamento pode produzir deslocamentos atômicos de tal modo que em um dos lados de um

plano (o contorno de macla) os átomos estejam localizados em posições de imagem em

espelho dos átomos no outro lado (BUEHLER, 1967; CALLISTER Jr., 2000). A maclação

em cristais ocorre quando dois cristais separados cisalham a mesma região em uma rede

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cristalina de uma forma simétrica, resultando no crescimento de dois cristais, separados por

um contorno de macla, como pode ser visto na Figura 1.4.

Figura 1.4 Representação de dois cristais separados por um contorno de macla. (Adaptado de

OTSUKA, 1998).

Com a aplicação de tensões nas estruturas de contornos de maclas, estes irão se

movimentar e durante esta deformação, produzirão uma forma para melhor acomodar estas

tensões. Este mecanismo de reorientação é conhecido como demaclação. Maclação e

demaclação são processos tipicamente usados em SMA, estes mecanismos são a base para

explicar as propriedades macroscópicas das SMA (WAYMAN, 1998).

A transformação de fase martensítica também pode ser induzida por carregamento

mecânico enquanto o material está na fase austenítica, neste caso a demaclação martensítica é

produzida diretamente da austenita por uma tensão aplicada por uma temperatura acima da Mi

(Martensita Induzida por Tensão ou MIT). Isto significa que a energia necessária para a

transformação martensítica pode ser proveniente, não só através de uma indução térmica mas

também por uma indução mecânica (OTSUKA, 2005; DUERING, 1990). É importante

ressaltar que a transformação MIT pode ser induzida no material num determinado nível de

tensão, porém, existe um intervalo de temperatura a partir de Af que esse fenômeno pode

ocorrer. A temperatura máxima em que pode ocorrer a transformação MIT é definida como

Md, conforme está representada na Figura 1.3.

A Figura 1.5 mostra a liga de NiTi nas formas austenítica e martensítica em uma visão

bidimensional. Como mostrado na figura, a austenita é simétrica e por isso tem uma

distribuição definida para os átomos, enquanto que a martensita pode ser encontrado em dois

alinhamentos diferentes com base no nível de tensão aplicada na liga. Baseada na direção da

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tensão, a martensita pode ser maclada tanto para esquerda quanto direita. Assim, de um ponto

de vista bidimensional, há duas variantes possíveis para a martensita (LIU, 2001).

(a) (b) (c)

Figura 1.5 Microestrutura da austenita e martensita em um plano bidimensional: (a) austenita,

(b) martensita maclada, (c) martensita demaclada. (DUERING, 1990).

A Figura 1.6 resume as considerações anteriores mostrando a relação entre as

temperaturas de transformação de fase, a tensão aplicada e a estrutura cristalina de uma liga

de NiTi.

A partir da figura, é possível observar que um aumento na tensão aplicada aumenta as

quatro temperaturas de transformação de fases de modo linear. O efeito da tensão aplicada

pode ser calculado de acordo com a regra de Clausius-Clapeyron, dσ/dT = constante

(OTSUKA, 2005).

Figura 1.6 Relação entre temperatura de transformação de fase e tensão aplicada. (Adaptado

de OTSUKA, 2005).

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23

Na Figura 1.7, mostra uma análise de DSC (Differential Scanning Calorimeter)

relacionada a uma liga de NiTi. Esta é a principal técnica utilizada para identificar as

temperaturas de transição de fase de uma liga de NiTi. Como é mostrado na figura, o intervalo

de temperatura para a transformação da martensita em austenita, decorrente do aquecimento, é

um pouco maior em relação a transformação inversa no resfriamento. A diferença entre as

temperaturas de transição no aquecimento e resfriamento formam uma histerese. Histereses

são geralmente definidas como a diferença entre as temperaturas nas quais o material é

transformado 50% em austenita no aquecimento e 50% transformado em martensita no

resfriamento. Esta diferença pode ser até 30-40°C e está relacionado com a energia dissipada

durante a transformação. (OTSUKA, 2005; BUEHLER, 1967).

Figura 1.7 DSC de uma liga NiTi, mostrando seu comportamento durante o aquecimento e

resfriamento. (Adaptado de OTSUKA, 2005).

1.3 Propriedades mecânicas e funcionais de ligas NiTi

Uma vez que a relação tensão-deformação de ligas com memória de forma é dependente

da temperatura, o módulo de elasticidade também depende da temperatura. O módulo de

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elasticidade é a razão entre a tensão aplicada e a deformação resultante, portanto, o

comportamento mecânico de uma liga NiTi é uma função da temperatura (OTSUKA, 2005;

BRINSON, 2004; GALL, 2001; WADA, 2005).

Em baixa temperatura, fase martensítica, o comportamento mecânico do material é

caracterizado pela grande deformação plástica após a retirada da tensão aplicada, na qual o

material pode ser recuperado com o aquecimento da liga (SME). A medida que a fase

martensítica é deformada, ocorre o processo conhecido como demaclação. O carregamento

mecânico na fase martensítica induz uma reorientação de suas variantes na qual resulta em

uma grande deformação plástica, que não é recuperada após o descarregamento mecânico. No

final da deformação e depois do descarregamento mecânico, é possível que apenas uma

variante martensítica permaneça se no final um patamar de tensão é alcançado, caso contrário,

se a deformação é interrompida no meio do caminho, o material irá conter várias variantes

diferentes (OTSUKA, 2005; SHAW, 2002).

Durante o descarregamento mecânico, a martensita demaclada se transforma em

austenita devido a sua instabilidade na temperatura acima de Af, de modo que, um patamar de

menor tensão, relacionado com a transformação inversa, aparece na curva tensão-deformação-

temperatura (Efeito Superelástico, SE), em geral, sem que haja deformação plástica (OLSON,

COHEN, 1982), como pode ser observado na Figura 1.8.

A martensita é geralmente uma fase menos simétrica em relação a austenita, por isso

existem várias maneiras pelas quais a martensita pode ser formada apartir da austenita. No

entanto, existe apenas uma maneira na qual a fase martensita retornará para fase austenita.

Com o resfriamento da austenita, uma auto organização das variantes martensíticas são

formadas. Durante a aplicação de tensão, há a migração dos contornos de maclas, resultando

em uma distribuição fora do equilíbrio das variantes martensíticas. Entretanto é importante

ressaltar que não importa qual é a distribuição da martensita, pois existe somente uma

estrutura austenítica possível nas quais estas variantes podem retornar. Portanto, as variantes

martensíticas devem retornar para o estado sem deformação original, assim retornando ao

estado austenítico. Com isso, a acomodação da sua forma é devido ao movimento dos

contornos de maclas, devido a baixa simetria da estrutura martensítica e quando a estrutura

austenítica mais simétrica é retornada, a deformação por maclação deve também desaparecer

(OTSUKA, 2005; DUERING, 1990; SCHERNGELL, 1998).

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25

Figura 1.8 Gráfico Tensão-Deformação-Temperatura para SMA. Md é a temperatura de

transição entre a fase pseudoelástica e a austenítica que, para uma liga NiTi, é normalmente

acima da temperatura Af. Adaptado de OLSON, COHEN, 1982.

Com o diagrama de temperaturas de transição de fases, não há uma mudança na forma

da amostra resfriada acima de Af até Mf, quando a amostra é deformada abaixo de Mf, este

continua deformado até ser aquecido. A recuperação de sua forma se inicia em Ai e é

completada em Af. Uma vez que a forma tenha sido recuperado em Af, não há alteração na

forma quando a amostra é resfriada abaixo de Mf e a memória de forma pode ser reativada

apenas deformando a martensita novamente (LIU, 2001).

1.4 Efeito memória de forma (SME)

O efeito memória de forma (SME) é a capacidade do material em memorizar uma forma

pré determinada, mesmo depois de várias deformações. A mudança de forma com a variação

de temperatura são principlamente atribuidos a transformação de fase martensítica. Efeito

memória de forma é um fenômeno na qual um material mesmo deformado abaixo de Ai,

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recupera sua forma original em virtude da transformação reversa por aquecimento acima de

Af. Em particular, ligas de NiTi exibem SME quando suas amostras são deformadas abaixo de

Mf ou em uma temperatura entre Mf e Ai, acima na qual a martensita se torna instável.

Como mostrado esquematicamente na Figura 1.9, uma estrutura ordenada austenítica

quando resfriada abaixo de Mf, em função das tensões de atrito cisalhantes, será formado uma

estrutura martensítica maclada. Com a aplicação de uma tensão externa suficiente, irá ocorrer

uma reorganização atômica, formando uma estrutura martensítica demaclada que após o

aumento da temperatura T > Af retornará a forma de origem, estrura ordenada austenítica.

Figura 1.9 (a) estrutura ordenada austenítica, (b) estrutura martensítica maclada, (c) estrutura

martensítica demaclada, (d) estrutura ordenada austenítica. (Adaptado de OLSON, COHEN,

1982).

A transformação reversa induzida por aquecimento recupera a deformação plástica, desde

que as variantes martensíticas tenham sido reorientadas por tensão, a reversão para austenita

produz uma grande tensão de transformação com a mesma amplitude, porém com sentido

oposto a deformação plástica, assim, a SMA retorna sua forma original da fase austenítica (d).

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Figura 1.10 Efeito memória de forma mostrado microscópicamente; austenita é resfriada para

formar a martensita maclada sem sofrer alteração em sua forma, quando é deformada pela

movimentação dos contornos de maclas. A estrutura original austenítica e sua forma

retornarão após o aquecimento da SMA. (OLSON, COHEN, 1982).

O fenômeno do efeito memória de forma (SME) pode ser observado basicamente em

quatro modos de comportamento. Em particular, o fenômeno descrito acima é chamado de

One Way Shape Memory Effect (OWSME).

1.4.1 One Way Shape Memory Effect (OWSME)

Ocorre quando a SMA é colocada a uma temperatura abaixo da transformação final da

fase martensita (T < Mf), deformada plasticamente por um processo mecânico de

carregamento/descarregamento e aquecida acima da temperatura final da austenita (T > Af),

para recuperar a estrutura original da austenita na ausência de cargas externas. Se,

posteriormente ao OWSME, a SMA for submetida a um outro ciclo térmico em condições

livre de tensão, não ocorrerá transição de fase. Assim, para repetir um ciclo OWSME é

sempre necessário uma deformação plástica da SMA. A Figura 1.11 representa uma sequência

de etapas da ocorrência desse tipo de efeito.

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Figura 1.11 Macroscopicamente o mecanismo OWSME; (a) Martensita, (b) Carregamento e

deformação na fase martensita (T < Mf), (c) Aquecimento acima da temperatura final da

austenita (T > Af), (d) Resfriamento até a fase martensita (T < Mf). Adaptado de

TAKEZAWA, 1976.

1.4.2 Two Way Shape Memory Effect (TWSME)

No mecanismo OWSME descrito acima, somente a fase austenita é memorizada. Porém,

é possível relembrar a forma da fase martensita sob certas condições, e obter um

comportamento do tipo TWSME que é caracterizado por uma mudança de forma espontânea

da SMA quando ela é aquecida e resfriada alternadamente, na ausência de carregamento

mecânico. Este fenômeno demanda um tratamento termomecânico especial da SMA

denominado treinamento (training).

Um dos procedimentos mais utilizados para realizar o treinamento está representado na

Figura 1.12. A nível microscópico, a razão pela qual o material relembra sua forma é

explicada a seguir. Na condição imposta de severa deformação da martensita, discordâncias

são introduzidas para estabilizar a fase martensita. Essas discordâncias existem na fase de

origem após reversão da fase martensita para austenita no aquecimento (TAKEZAWA, 1976;

SCHROEDER, 1977; OSHIMA, 1975; NISHIDA, 1981; MIYAZAKI, 1982).

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29

Figura 1.12 Macroscopicamente o mecanismo TWSME; (a) Estado martensítico, (b) várias

deformações irreversíveis, (c) aquecimento, (d) resfriamento. Adaptado de TAKEZAWA,

1976.

Uma vez que o material tenha aprendido este comportamento, após o treinamento, é

possível modificar a forma do material de uma maneira reversível e sem tensão ou carga

aplicada, apenas variando as temperaturas Af e Mf.

1.4.3 Stress Assisted Two Way Shape Memory Effect (SATWSME)

Neste caso, a SMA é deformada por uma carga mecânica que é mantida durante o

processo de aquecimento – resfriamento (Mf > T > Af). Portanto, um deslocamento sob carga

(trabalho externo) pode ser obtido ou, se a SMA é deformada por uma transformação prevista,

um esforço mecânico é gerado.

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30

1.4.4 Efeito Superelástico (SE)

Este comportamento pode ser considerado efeito memória de forma (SME) mecânico

porque envolve a formação e reversão da fase martensítica por carregamento mecânico. Se a

SMA está na temperatura final da austenita (T > Af) e é carregada, haverá a formação de uma

variante martensítica quando a tensão crítica é excedida e sua reversão ocorre quado SMA é

descarregada. O termo superelasticidade é usado porque a deformação é não linear e

reversível. Deformações da ordem de 10% podem ser facilmente obtidas.

NiTi superelástico são ligas usadas em aplicações na qual demandam excelente

flexibilidade e torqueabilidade. O NiTi tem a habilidade de absorver largas quantidades de

energia de deformação e devolvê-la quando a deformação é removida. A elasticidade do NiTi

é aproximadamente dez vezes maior que do aço, além disso, são capazes de manter a força

constante em uma ampla faixa de deformação. Tais características tem sido explorada no

ramo da ortodontia, onde forças constantes são aplicadas na correção (movimento) dos dentes

com maior conforto para os pacientes. A Figura 1.13 representa tipicamente uma curva

tensão-deformação do comportamento superelástico sob condições de carregamento e

descarregamento.

Figura 1.13 Curva tensão-deformação: comportamento SE de NiTi SMA, pode ser observado

a grande deformação reversa, que pode chegar em alguns casos até 8%. (OTSUKA, 2005).

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31

1.5 Objetivos e justificativas

Neste trabalho, o objetivo foi construir e caracterizar uma mola helicoidal com memória

de forma para aplicar em um atuador linear termoativado. Como as transformações de fases

presentes na liga NiTi envolvem deformações na mola e indução de carga, associada a forma

memorizada, é possível aplicar a mola SMA em algum dispositivo de acionamento por

deslocamento. No presente trabalho, esse efeito foi usado para acionar um interruptor elétrico

assim que as temperaturas de transformações forem atingidas. O atuador construído pode ser

utilizado para acionar um sistema de refrigeração, circuito com alarmes, lâmpadas, etc., na

faixa de trabalho das temperaturas de transições de fases presentes na liga.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

Nesta seção serão descritos os materiais, equipamentos e procedimentos experimentais

realizados para a obtenção e caracterização da mola helicoidal com memória de forma a ser

aplicada em um atuador linear termoativado. Primeiramente, o material escolhido foi uma liga

comercial de NiTi superelástica utilizada em arcos ortodônticos.

A partir do fio ortodôntico, foi realizado um tratamento termomecânico para a obtenção

da mola helicoidal. Após o tratamento, uma pequena amostra foi retirada para análise de DSC

(Differencial Scanner Calorimeter). Com a mola helicoidal foi realizado um treinamento

(training), tratamento termomecânico para obter TWSME. Finalizada estas etapas, foi

construído um atuador linear termoativado com essa mola helicoidal, capaz de acionar um

circuitos elétricos para aplicações diversificadas tais como: alarme, luz de advertência,

acionar um circuito de refrigeração, etc.

Todos os equipamentos utilizados, bem como a realização dos métodos descritos

abaixo, foram realizados no DEMAR-EEL-USP.

2.1 Preparação da mola helicoidal

Para a preparação da mola helicoidal com características SMA foi utilizado um material

de fácil aquisição no mercado. A idéia é tentar usar fios comerciais de NiTi superelástico

usados em arcos ortodônticos. Optou-se por uma liga comercial de NiTi com diâmetro do fio

d = 0,508 mm , comumente usada em arcos ortodônticos. O fio foi pré conformado em um

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mandril cilíndrico e fixado em suas extremidades para evitar o desenrolamento do mesmo,

conforme mostra a Figura 2.1. O mandril escolhido apresenta um diâmetro externo próximo

ao diâmetro interno da mola.

Figura 2.1 Fixação do fio de NiTi no mandril cilíndrico na forma de uma mola helicoidal de

seção retangular.

A mola SMA produzida possui oito espiras, com diâmetro D = 6 mm. Depois de fixada

no mandril o material foi submetido a um tratamento térmico adequado para estabilizar a

geometria de mola e suas características de memória de forma. O tratamento foi feito em um

forno com controlador de temperatura onde o termopar utilizado foi do tipo K. A temperatura

foi aumentada gradativamente, a partir da temperatura ambiente, até a temperatura desejada

de 500°C mantendo-se nestas condições por 15 minutos. O resfriamento subsequente foi lento

realizado no próprio forno desligado. A Figura 2.2 mostra o forno e acessórios utilizados para

a realização do tratamento térmico citado.

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33

Figura 2.2 Forno utilizado para o tratamento térmico da mola.

Após este tratamento térmico o fio foi removido com a forma definida como mola, e

submetida a um teste de deformação na temperatura ambiente sendo posteriormente aquecida,

demostrando sua capacidade de recuperação de memória de forma. Este teste foi um requisito

básico para continuidade do trabalho para a sua aplicação prática.

2.2 Análise de DSC (Differencial Scanner Calorimeter)

O objetivo da utilização da análise de DCS é determinar as temperaturas de transição de

fases da mola SMA. Para a análise de DSC (Differencial Scanner Calorimeter) foi retirado um

pequeno pedaço da extremidade da mola. Nesta técnica mede-se a quantidade de calor

absorvida ou liberada por uma amostra ao ser sujeita a um ciclo térmico de aquecimento e de

resfriamento que atravesse o intervalo de temperatura de transformação, com isso foi possível

avaliar as temperaturas de transformação de fase, ocorridas entre a martensita e a austenita.

O ciclo térmico utilizado para a análise de DSC teve o intervalo observado entre 10°C à

90°C, com taxa de aquecimento e taxa de resfriamento constante de 10°C/min.

2.3 Treinamento da mola

A mola de NiTi foi submetida a um tratamento termomecânico para memorizar, além da

fase austenítica, a fase martensítica, este tratamento especial da SMA é denominado

treinamento (training). Para este tratamento termomecânico foram realizados ciclos de

aquecimento e resfriamento em diferentes estados de compressão para produzir a mola tipo

TWSME, e esse tipo de tratamento termomecânico escolhido baseia-se na repetição de ciclos

como ilustrado na Figura 2.3.

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34

Mola no estado inicial

Aquecer a mola em T > Af

Deformar e resfriar a mola em T < Mf

Mola no estado martensítico após retirada da tensão

Figura 2.3 Tratamento termomecânico para a produção da mola TWSME.

A partir do estado inicial da mola, o treinamento para a produção da mola TWSME foi

iniciada com o aquecimento da SMA, até uma temperatura acima de Af, mantida nesta

temperatura durante 5 minutos. Em seguida a mola SMA foi comprimida e resfriada a uma

temperatura abaixo de Mf, também mantida por 5 minutos nesta temperatura. Esta repetição

de aquecimento e resfriamento/carregamento foi realizada em um total de 100 ciclos, assim

foi possível medir a taxa de recuperação da mola durantes os ciclos. A Figura 2.4 mostra o

dispositivo utilizado na etapa do treinamento da mola helicoidal.

Figura 2.4 Dispositivo usado na etapa de treinamento da mola helicoidal.

2.4 Projeto do atuador linear termoativado

O projeto e construção do atuador linear foi desenvolvido para uma mola SMA, na qual

com a variação da temperatura, ser capaz de acionar e desacionar um circuito elétrico devido

a alteração de volume da fase martensítica e austenítica. Para a construção do atuador linear

Mola helicoidal

comprimida

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foram utilizadas peças de ligas de alumínio, com exceção do parafuso de ajuste. O interruptor

é acionado por uma força mínima de 0,8 N, e o parafuso de ajuste tem a finalidade de aplicar

uma pré carga próxima desse valor.

A Figura 2.5 mostra um desenho esquemático com detalhes construtivos do atuador

linear e a Figura 2.6, mostra o atuador linear construído e preparado para os testes finais.

Figura 2.5 Desenho esquemático do projeto do atuador linear.

Figura 2.6 Atuador linear utilizado para a mola helicoidal SMA.

2.5 Ensaio para determinação da constante elástica da mola

Os ensaios para determinação da constante elástica da mola foram realizados em duas

temperaturas, temperatura ambiente (25°C) e uma temperatura acima de Af (50°C), com o

objetivo de comparar as constantes para a mola na fase martensítica e austenínita. Os testes

foram realizados em um recipiente com água, na temperatura ambiente (25°C) para a

determinação da constante elástica na fase martensítica e, com o auxílio de uma fonte externa

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de calor, até atingir uma temperatura acima de Af (50°C), para a determinação da constante

elástica na fase astenítica. Os ensaios foram realizados na máquina da EMIC modelo DL

3000, sob testes de compressão, com um extensômetro modelo EE050 do mesmo

equipamento para medições de pequenas deformações. Para os testes de compressão, foi

utilizado uma célula de carga de 20N e os ensaios foram realizados a uma velocidade de 4

mm/min. Para as medidas da temperatura, foi utilizado um termômetro digital da ALLA

FRANCE com a faixa de medição entre -50°C a 200°C.

Todos os ensaios foram realizados em triplicata, sendo calculado uma média para as

constantes em ambas temperaturas. Na Figura 2.7 é possível observar como os componentes

do sistema de medidas estão montados na máquina EMIC para a realização dos ensaios.

Figura 2.7 Dispositivo de ensaios mecânicos instalado na máquina da EMIC para

determinação da constante da mola.

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37

2.6 Ensaio para determinação das temperaturas de transição de fase da mola SMA

através da histerese

O objetivo deste ensaio é confirmar e determinar as temperaturas de transição de fase da

mola SMA através da histerese do gráfico Força x Temperatura. O ensaio consiste em manter

uma extremidade da mola fixa e observar a força exercida na outra extremidade com a

variação da temperatura. Os ensaios foram realizados na máquina da EMIC modelo DL 3000,

onde mediu-se apenas a força exercida em uma das extremidades. Para as medidas da

temperatura, foi utilizado o termômetro digital da ALLA FRANCE citado anteriormente.

O ensaio consistiu em realizar um ciclo térmico, variando a temperatura entre 28°C à

53°C e observando a força exercida na extremidade da mola. Com a histerese é possível

observar uma grande variação de força em curtos intervalos de temperaturas, nas quais

determinamos as temperaturas de transição de fase da mola SMA.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta seção, são apresentados os resultados obtidos na análise de DSC, no treinamento da

mola, medidas da constante elástica e o módulo de cisalhamento para a mola SMA e a

determinação das temperaturas de transição de fase através da histerese força x temperatura.

Todos os dados são correlacionados, assim como são feitas todas as discussões pertinentes.

3.1 Resultados da análise de DSC

O objetivo da utilização da análise de DSC consistiu em se determinar as temperaturas

de transição de fase da martensita e austenita. Esta técnica foi escolhida devido a sua

simplicidade e rapidez.

A amostra foi submetida a um ciclo térmico de aquecimento e resfriamento variando a

temperatura entre 10°C à 90°C, com taxas constantes durante o ciclo de 10°C/min. Com isso

foi possível avaliar as temperaturas de transformação de fase, ocorridas entre a martensita e a

austenita. Os resultados obtidos neste ensaio são mostrados na Figura 3.1 e suas temperaturas

foram assim definidas: Mi = 38,42°C ; Mf = 28,2°C ; Ai = 33,61°C e Af = 43,7°C.

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Figura 3.1 Análise de DSC para a liga NiTi.

3.2 Resultados do treinamento da mola

O objetivo do treinamento é fazer com que a mola memorize, além da fase austenita a

fase martensita, com um tratamento termomecânico obtendo assim uma mola TWSME. Após

100 ciclos térmicos pode-se calcular a recuperação elástica média final do material η, na qual

pode ser definido como η = [ (La – Lm) / Lm ] x 100% , onde La e Lm representam o

comprimento da mola na fase austenita e martensita, respectivamente.

A Figura 3.2 mostra o comportamento elástico da mola durante 100 ciclos térmicos do

treinamento, podendo ser calculado uma média para a recuperação elástica de η = 53,06%,

após 50 ciclos térmicos.

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39

Figura 3.2 Comportamento elástico da mola durante 100 ciclos térmicos do treinamento.

Com o tratamento termomecânico de treinamento, após 100 ciclos realizados, foi

possível obter TWSME e uma recuperação elástica de 53,06% para a mola.

3.3 Resultados do ensaio para determinação da constante elástica da mola

Os resultados da constante elástica da mola são critérios de seleção de materias para a

escolha da aplicação do material, por isso a necessidade de se obter as constantes elásticas da

mola na fase martensítica e na fase austenítica.

Estando a mola em seu estado relaxado e fixa em uma extremidade, ao se aplicar uma

força (F) à sua extremidade livre se observará uma deformação na mola. Hooke, ao observar

este fato estabeleceu uma lei relacionando força elástica (Fel), reação da força aplicada e a

deformação da mola (Δl), conhecida como Lei de Hooke. Matematicamente temos Fel = k. Δl ,

onde k é a constante elástica da mola na qual traduz a rigidez da mola, ou seja, representa uma

medida de resistência. Quanto maior for a constante elástica da mola, maior será a sua

resistência.

Para os ensaios realizados, foi utilizado um extensômetro eletrônico para medição de

pequenas deformações no corpo de prova. Para os cálculos da constante elástica da mola,

devemos considerar o extensômetro como uma mola, na qual possui uma constante elástica

kext = 0,118 N/mm. Tais testes houve a necessidade de uma pré carga no sistema de

intensidade 0,1N, nas quais devem ser consideradas para o cálculo final da constante elástica

da mola. Assim os dados obtidos experimentalmente da força resultante podem ser expressa

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por: FR = Fmola + Fext + 0,1 , nas quais podemos determinar a constante elástica para a mola

através da Lei de Hooke. Os ensaios foram realizados em triplicata e uma média da constante

elástica para temperatura ambiente (25°C) e para uma temperatura acima de Af (50°C) foram

obtidas. A Figura 3.3 ilustra a melhor representação gráfica destas curvas para as temperaturas

de 25°C e 50°C e suas constantes elásticas médias assim calculadas: k25°C = 0,395 N/mm e

k50°C = 0,611 N/mm.

0 1 2 3 4 5 6 7 8

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

4.0

K50°C

= 0,611 N/mm

K25°C

= 0,395 N/mm

SMA 50°C

SMA 25°C

Fo

rça

(N

)

Deslocamento (mm)

Figura 3.3 Comportamento da mola em compressão.

3.3.1 Determinação do módulo de cisalhamento da mola

As formulações referentes à teoria de molas helicoidais foram usadas para determinar o

módulo de cisalhamento da mola. As seguintes equações foram usadas:

3

8

d

DPK

2Dn

dK

CC

CK

615,0

)44(

)14(

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41

dDC

G

Onde é a tensão de cisalhamento, é a deformação de cisalhamento, K é o fator de

correção de tensão e G é o módulo de cisalhamento. Assim, para a mola helicoidal construída

com D = 6 mm , n = 8 espiras e d = 0,508 mm, foi calculado o valor do módulo de

cisalhamento da mola na fase austenita cujo valor foi aproximadamente GA = 23 GPa. Este

valor está de acordo com aquele encontrado por Otsuka e Wayman (1998) (OTSUKA,

WAYMAN, 1998) que foi GA = 23 GPa.

3.4 Resultados do ensaio para determinação das temperaturas de transição de fase da

mola SMA através da histerese

O objetivo deste ensaio é a determinação e comparação das temperaturas de transição de

fase da mola SMA com a análise realizada pelo DSC. A Figura 3.4 mostra claramente a

presença da histerese no ciclo de aquecimento/resfriamento, a qual foi possível obter as

temperaturas de transição de fase. Tais temperaturas foram assim obtidas: Mi = 40°C; Mf =

32°C; Ai = 32°C e Af = 44°C.

25 30 35 40 45 50 55

-0,1

0,0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

Resfriamento

Aquecimento

Forç

a (

N)

Temperatura (°C)

Figura 3.4 Histerese da curva força x temperatura para determinação das temperaturas de

transição de fases da mola SMA.

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A Tabela 1.1 compara as temperaturas de transição de fases obtidas pelos métodos DSC

e pela histerese. Ambos procedimentos se mostraram satisfatórios em relação sua praticidade

e tempo de execução.

Tabela 1.1 Temperaturas de transição de fases para a mola SMA em função dos métodos aplicados.

Método

DSC Mi = 38,42°C Mf = 28,2°C Ai = 33,61°C Af = 43,7°C

Histerese Mi = 40°C Mf = 32°C Ai = 32°C Af = 44°C

Temperaturas de transição de fases

3.5 Resultados do atuador linear termoativado

Com os resultados obtidos do treinamento da mola TWSMA e de suas constantes

elásticas, foi possível construir um atuador capaz funcionar no intervalo de temperatura que

envolve as transformações de fases martensíticas em austenítas e vice-versa, capaz de ligar e/

0ou desligar um circuito elétrico com o atuador termoativado desenvolvido nesse trabalho.

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43

4 CONCLUSÕES

A partir de um estudo teórico, realizado em ligas NiTi com memória de forma, foi

possível realizar o projeto e a construção de um atuador linear termoativado que aciona um

interruptor elétrico capaz de ser usado num circuito elétrico que pode ser usado em diversas

aplicações no intervalo de temperatura de transformação de fase avaliadas.

Os resultados apresentados neste trabalho foram válidos e atingiram os objetivos

esperados. A mola SMA construída foi do tipo TWSME e montada no atuador foi capaz de

acionar o interruptor quando T > Af e desacionar este mesmo dispositivo quando T < Mf. O

parafuso de ajuste permite uma pequena variação nas temperaturas de atuação devido a

variação da pré-carga.

As temperaturas de transição de fase obtidas neste relatório, tanto por DSC quanto

pela histerese, decorrentes dos tratamentos térmicos e termomecânicos realizados, foram

encontrados em uma faixa de temperatura satisfatória, o que levou o sucesso da aplicação do

atuador liear termoativado em acionar e desacionar o interruptor elétrico.

As constantes da mola nas fases martensítica e austenítica foram suficientes para

exercer a força necessária de acionamento do atuador.

O módulo de cisalhamento encontrado para a fase austenítica está dentro do esperado

e de acordo com outras pesquisas realizadas por outros autores para molas SMA cujo valor foi

GA= 23 GPa.

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