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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL (CPDOC) Proibida a publicação no todo ou em parte; permitida a citação. A citação deve ser textual, com indicação de fonte conforme abaixo. ARRUDA, Hailton Corrêa. Hailton Corrêa de Arruda (depoimento, 2012). Rio de Janeiro, CPDOC/FGV, 2012. 40 p. HAILTON CORRÊA DE ARRUDA (depoimento, 2012) Rio de Janeiro 2013

HAILTON CORRÊA DE ARRUDA (depoimento, 2012)cpdoc.fgv.br/sites/default/files/museu_do_futebol/hailton_arruda... · Eu estive aqui em 1974, depois desapareci, e voltei novamente; quase

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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE

HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL (CPDOC)

Proibida a publicação no todo ou em parte; permitida a citação. A citação deve ser textual, com indicação de fonte conforme abaixo.

ARRUDA, Hailton Corrêa. Hailton Corrêa de Arruda (depoimento, 2012). Rio de Janeiro, CPDOC/FGV, 2012. 40 p.

HAILTON CORRÊA DE ARRUDA (depoimento, 2012)

Rio de Janeiro 2013

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Transcrição

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Nome do entrevistado: Hailton Corrêa de Arruda (Manga)

Local da entrevista: Museu do Futebol, São Paulo - SP

Data da entrevista: 29 de janeiro 2012

Nome do projeto: Futebol, Memória e Patrimônio: Projeto de constituição de um acervo

de entrevistas em História Oral.

Entrevistadores: Clarissa Batalha e Fernando Herculiani

Câmera: Thiago Monteiro

Transcrição: Lia Carneiro da Cunha

Data da transcrição: 19 de abril de 2012

Conferência da transcrição : Thomas Dreux

Data da conferência: 19 de setembro de 2012

** O texto abaixo reproduz na íntegra a entrevista concedida por Hailton Corrêa de Arruda em 29/01/2012. As partes destacadas em vermelho correspondem aos trechos excluídos da edição disponibilizada no portal CPDOC. A consulta à gravação integral da entrevista pode ser feita na sala de consulta do CPDOC.

Fernando Herculiani – Bom, Manga, bom dia. A gente está muito feliz de você estar

aqui e te agradece imensamente, você aceitou o convite de vir até São Paulo para prestar

esse depoimento. Em nome da Fundação Getúlio Vargas e do Museu do Futebol, é uma

honra tê-lo aqui no Museu, hoje.

Hailton Arruda – Eu...Em primeiro lugar, bom, muito bom dia. Muy contente, depois

de tanto año. Eu estive aqui em 1974, depois desapareci, e voltei novamente; quase

cinqüenta año, aqui estou, em São Paulo. Um país que já cambió mucho quando Manga

estava aqui jogando. De qualquer maneira, eu estou muy contente, porque estou com minha

senhora presente, ainda mais o meu advogado que está acompanhando, procurador, e a

visita é muy importante para mim também, para entrevistar Manga, porque... aceitei essa

oportunidade.

F.H. – Manga, a gente pede que você inicie falando o dia em que você nasceu, o ano,

pra a gente começar, fale dos seus pais, do seu começo de vida.

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H.A. – Eu nasci em Recife, 1937, vinte e seis de quatro de 1937. Nasci em

Pernambuco. Dali minha carreira como juvenil de Sport Clube Recife. E joguei mais ou

menos três, quatro año com o juvenil, que tinha quinze, dezesseis años. Depois, com

dezenove año, me fui a Botafogo de Rio de Janeiro e joguei dez año em Botafogo. E

depois me fui para outro país, que foi Uruguai, em junho de 1968, onde dei todos os

campeonatos ao Nacional Montevidéu1. Joguei seis año. Depois me fui invitado por

Corinthians de São Paulo, onde estava o presidente Matheus2, um grande presidente,

homem que era um valor dentro de Corinthians. Não tive oportunidade de seguir em

Corinthians porque houve dois pontos do contrato que não pudemos acertar, e me vem a

Internacional de Porto Alegre, e aí me quedei em quatro año, fui campeão gaúcho e

bicampeão brasileiro. Depois, me afastei de Internacional, me fui a Operário de Campo

Grande, fiz boa apresentação no campeonato brasileiro, no campeonato nacional. Depois,

fiquei um año, não pude renovar contrato, vim a Curitiba. Em Curitiba, me fui...fui

campeão, terminamos com o Atlético Mineiro3, o Atlético, terminamos com penal, eu

peguei dois penal de cinco, e levantamos o campeonato a Curitiba. E daí me fui ao Grêmio,

Porto Alegre, fui campeão em 1979. E também dei um bom campeonato ao Grêmio.

Depois me fui a Equador, fui bicampeão pelo Barcelona. Depois me retirei, com 42 años,

jogando como arqueiro, e fui como treinador de goleiro das equipes, porque dei bom

trabajo. Os goleiros que estavam na seleção equatoriana são meus alunos, e até hoje está

jogando. E depois vim para cá, para o Internacional, fazendo meu trabajo.

F.H. – Legal. Manga, quem foram lá em Recife, as lembranças da sua família, seus

pais. O que é que eles faziam? Você morava com seus pais?

H.A. – Sim, morava. Nosotros... Eu morava, eu trabajava na fábrica. E como era 15

año, e você sabe que nós viemos de abajo, e todos jogadores. E de qualquer maneira eu

segui como jogador de futebol4, porque jogava também no barro, no sábado e domingo. E

eu me lembro que um senhor me deu uma oportunidade que... e me pôs no Sport Clube do

Recife, que era um bom goleiro juvenil. Eu me apresentei e fui contratado no Sport. E

nesse tempo, eu fiquei como seis año no Sport Clube do Recife e fui tricampeão juveniles,

1 Refere-se ao Club Nacional de Football um dos grandes clubes do Uruguai. 2 Refere-se a Vicente Matheus Bathe então presidente do Corinthians. 3 Aqui provavelmente o entrevistado se refere ao Atlético Paranaense. 4 Mais próximo do que foi possível ouvir.

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campeão torneio inicio e depois fui como titular na primeira do Sport. Daí foi minha vida

de pequeño, ao Sport Clube de Recife.

Clarissa Batalha – Era fábrica do quê, desculpa, fábrica do que em que você

trabalhava, Manga? A fábrica era do que?

H.A. – Não me lembro. Sei que era uma fábrica.

C.B. – Você lembra o que você fazia lá?

H.A. – Sim. Nosotros era empregado. (risos) Empregado ali. E daí do trabajo eu ia

treinar. Porque, mais ou menos, era três quilômetros para o estádio do Sport Clube de

Recife. E ai seguia o trabajo e seguia juveniles. Tu sabe que nesse tempo, o jogador

juvenile tinha que estar cedo no treinamento para se apresentar. Eu terminava meu

trabalho, saía correndo. E graças a Deus, mostrei minha qualidade de menor que era, e fui

contratado ao Sport Clube Recife, e segui. E depois joguei na primeira.

F.H. – Quando foi esse período em que você deixou de trabalhar só para jogar

futebol?

H.A. – Primeiro, quando tu está em um trabajo que não hay oportunidade de voltar

novamente a trabajar, ou tu decide, ou vai jogar ou vai trabajar. Eu tive minha chance de

seguir... treinando, e deixei o trabalho para voltar ao Sport Clube Recife. De qualquer

maneira, eles pagavam o salário que pagava a fábrica, e eu segui trabajando como juvenil.

F.H. – Naquela época, a sua família achou tudo bem você ser jogador de futebol?

Acho que naquela época tinha um pouco de preconceito com jogador. Você sentiu isso?

H.A. – Não. Não, não, não. Eu acho que não tinha problema nenhum. Eu me saia de

cabeça levantada e não... a família não se metia no meu trabajo de...de minha profissão, e

dava conselho. Me dava. Tem que caminar a largo, sem caminar para outro lado e sem...

sem problema. E graças a Deus, até hoje, qualquer equipe que me contrata...estava

contratando, contratava um goleiro e sabia que tinha bom resultado.

C.B. – Você tinha irmãos, Manga? Irmãos?

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H.A. – Sim. Eu tinha dois irmãos. Um era goleiro, jogava...um jogava no América e

outro jogava no Olaria, era goleiro. Jogava na primeira também. E cruzava Botafogo com

Olaria, a mim, me doía porque, quando tomava um gol, o hermano... E tinha de acontecer,

e ali, dava um abraço e levantar la cabeça, porque es cosas de futból. Ele está na dele, tem

de tratar de fazer um bom resultado e levar o campeonato para o clube. Acho que você

sabe que o Olaria, tu conhece muy bem, é um time muito pequeño, e é muito difícil

levantar um campeonato como o Botafogo.

F.H. – Perto do Botafogo.

H.A. - De qualquer maneira, você sabe como são os torcedores, non le gusta... mais

que seja hermano, eles querem que Botafogo gañasse a partida. E de qualquer maneira, eu

le cuidava, ele, que era menor do que yo. E de qualquer maneira não teve nunca... passou

nada no estádio quando jogava contra.

C.B. – Ele era mais velho?

H.A. – Não. Era mais pequeño.

C.B. – Mais novo.

H.A. – Sim, sim.

C.B. – E você que influenciou ele na escolha de ser goleiro?

H.A. – Não. Ele procurou o lado dele.

C.B. – Ele te copiava?

H.A. – Não. Ele vivia em casa, todos juntos, e ali ele foi treinar no Olaria, se quedó

aí na primeira. Eu dava conselho para ele que seguisse como um goleiro de qualidade, não

seja malcriado, não seja essa...não responda ao treinador. Isso é importante. Para tu ser um

bom jogador, tu não seja malcriado, tem de ser sensível para todos, responder a palavra do

treinador. E para ser na frente, ser esse goleiro muito importante para mim. Então esse

foi...jogou no Olaria como três, quatro año. E teve um que jogou no América, que foi da

defesa também. Jogou como três, quatro años também. E era de defesa. E jogava contra

mim também.

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F.H. – Manga, como que surge... desde pequeno você era goleiro? Porque era uma

posição diferente de todas as outras.

H.A. – Nesse tempo, tu sabe que jogava com muita terra, botava um pau ali, outro

aqui, e outro companheiro fazia...Então chutava um ou outro. E ali, saía negro, entrava

nove da manhã, saía quatro da tarde. E ali se jogava no rio, que tinha rio, para sacar todo

esse microbe que estava. E ali era todo dia, de manhã e de tarde. E tinha o quê? Doze año,

por aí. E fui crescendo, e sempre aí. Fazia a bola numa meia, com jornal e trapo viejo, uma

bolita aqui, amarrava e pateava. Que nesse tempo, para conseguir uma bola, era difícil, só

fazia com uma meia. E ali, pegava a pelota, fui aprendendo. E quando era sábado e

domingo, nosostros jogava...convidava uma equipe, jogava amistoso. Era o campeonato de

barro, como vocês sabem.

F.H. – Como chamava o bairro lá?

H.A. – Ah! Isso eu não sei. (risos) Tanto año. Muito año.

F.H. – E aparece um senhor e te leva para o Sport? É isso?

H.A. – Sim. Me deu uma carta, dizendo que apresentasse a Capuano, que era um

treinador, e dissesse que foi mandado por uma pessoa. Entreguei. E abriu a carta e mandou

me sentar. E eu fui. Depois me chamou, eu fui para o camarim, me deu um sapato que

tinha mais apertado (risos) e aí, uma camisa também. Sentei, esperando a ordem dele.

Depois entrei no arco, no tres palo, e fiz meu trabalho como arqueiro juvenil. Em dez

minutos me sacou da equipe e disse: “sai fora”. Mas depois me disse: “Não. Vamos

contratar usted, que usted, se vê que é um grande arqueiro.” E nesse momento, eu fui

juveniles, fui tricampeão pelo Sport. E já concentrava com a primeira do clube, para pegar

mais corpo. E depois, não sei se conhece Osvaldo Baliza, que era o arqueiro do Sport.

F.H. – Naquela época. Ah, é, ele estava no Sport.

H.A. – Ele foi a Portugal e teve um acidente, quebrou a perna, e tinha outro goleiro

do juvenile, que era yo, e outro era mais...era jovem, não tinha experiência, e outro

arqueiro, que era o segundo, que se quedó em Portugal. E tinha que levar outro. Disse:

“Não. Vamos levar Manga”. E eu nunca entrei num avião, primeira vez e tal. E cheguei lá

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em Portugal, a treinar, mostrando igual meu trabajo juveniles. Vai o arqueiro, se le

machuca o dedo. Já não tinha arqueiro. Só tinha Manga. Então Manga entrou. Jogamos

com o Benfica. Mostrei minha qualidade lá. E vim como titular.

F.H. – Chegou ao Brasil como titular?

H.A. – Titular. Mostrei, campeonato pernambucano. Aí foi, me contratou o

Botafogo.

F.H. – Manga, você morava em Recife. Você torcia para o Sport? Você torcia para

algum time?

H.A. – Eu lhe digo, eu, o time que me contrata, eu faço meu trabajo o ano, que tem

dois años, três años de trabajo, eu faço, esperando ser campeão. E você nunca vai

prometer. Eu, do primeiro año, primeiro dia do campeonato, eu trato de fazer uma boa

campanha para levantar o campeonato. Esse é o meu trabajo quando me contrata. E graças

a Deus todos os clubes que me contratou foi campeão. Menos Operário. Mas Coritiba,

Grêmio, Internacional, Botafogo, Barcelona del Equador, todo isto. E são campeonato muy

importante. Usted para ganar um campeonato brasileiro, bicampeonato brasileiro, qual é a

equipe que ia ganhar seguido? É muy difícil. Ganha um hoje, depois de dez dias você é

bicampeão. Não é seguido. Passei um campeonato invicto. E passei mil, duzentos e

sessenta minutos sem tomar gol. No Uruguai, eu fiz um gol de arco a arco. No Nacional.

Quer dizer, isso são a minha vida de goleiro.

C.B. – Manga, quando você começou a jogar, que você foi viajar, você imaginou que

você ia viver do futebol para o resto da sua vida? Aquilo era o que você queria fazer, ser

jogador de futebol?

H.A. – Claro. Graças a Deus eu...Meu pensamento era chegar...ser uma figura

importante, bom goleiro, porque é visto na vitrina, entende, a gente (em espanhol). Então,

cada dia de treinamento eu fazia a treinar mejor, me colocar bem, segurar mais firme a

bola. Isso era o meu pensamento não? E na viagem, igual. E tu sai...Como na seleção

brasileira, tu vai na seleção, o orgulho, tu vai na seleção e tu vai como titular jogar com a

Alemanha, lá na Alemanha, jogar com a Suécia, a Rússia e tudo. Me sinto feliz, saber que

tu está produzindo como goleiro não? Esse é o meu pensamento de pequeño, ser uma

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pessoa que era...para ser bem visto na vitrina, no periódico, na televisão. Esse é o meu

pensamento. E graças a Deus, Deus me ajudou, e estou aqui.

F.H. – Deu certo. Manga, nessa época, não tinha, a Clarissa perguntou, sobre você

querer ser goleiro, nessa época não tinha preparador de goleiro, como que era o

treinamento? Você treinava sozinho, você inventava os treinamentos?

H.A. – Em primeiro lugar, eu nunca vi - (años) – treinador de goleiro. Eu fui do

Sport, não tinha, eu fui ao Grêmio, não fui , não teve no Internacional, não teve na seleção

brasileira, não teve em Botafogo, nenhuma equipe. Ainda mais em el Equador. Nenhum

teve um treinador de goleiro. Manga quando retirou, já não foi arqueiro, eu fui treinador de

goleiro. Ahora todo mundo é treinador de goleiro. Aparece em todo clube. Está bem. Tu

foste arqueiro, agora tem a oportunidade de amostrar tua qualidade. Eu amostrei a minha

em Equador. E estou aqui em pé como treinador de goleiro. Agora, já deixei. E agora tenho

um carnê de treinador de goleiro, de treinador, de profissional. Já tenho um carnet de

cancha de treinador. E graças a Deus, o meu trabajo, o conhecimento também, e sempre

estava, como treinador, vendo a charla (o papo), como jogavam os jogadores. Isso é

importante. Porque tu tem, o corpo técnico, tem que estar na reunião da saída do jogador

que vai entrar na cancha. Eu sempre estava presente.

F.H. – Voltando. Você estava no Recife, você foi tricampeão lá, você falou, no

Sport...

H.A. – Sim, de juveniles.

F.H. – Isso. De juvenil. Depois no profissional. E como foi sua ida para o Botafogo?

Quem te leva? Como sai esse contrato? Alguém vai lá?

H.A. – Primeiro, primeiro, usted deve conhecer João Saldanha, não?

F.H. – Sim, João Saldanha.

H.A. – Que descanse ya. Ele aí foi, contratou a Manga do Sport Clube do Recife, eu

fui a Botafogo. Eu tinha 19 años, estava meio perdido no Rio de Janeiro...(risos)

F.H. – Já tinha ido para o Rio?

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H.A. – Sim. Primeira vez que eu vou ao Rio de Janeiro. E você sabe que quando um

jogador é contratado, tem põem num hotele, e tu está solito aí, e... tem que pensar, mañana,

que tem treinamento, e na quarta-feira tinha de jogar com o Flamengo, à noite...(risos) É

tua estréia. Então disse, puxa vida! O nervo... Eu saí do Sport e vim para um time grande

como o Botafogo. A minha estréia foi no Maracanã, à noite. E estava um pouco nervoso

porque via muita gente no Maracanã. Primeira vez no Maracanã. E graças a Deus,

entramos no Maracanã e fizemos um bom resultado e ganhamos a partida.

F.H. – Vocês ganhavam muito do Flamengo naquela época.

H.A. – O Flamengo... (risos) Não por respeito que tinha com a gente, não... Porque o

jornalista, quando... “hoje, já gastou o bicho do Flamengo?”, eu digo: “sim.”.E com isso já

passou... essa piada já aconteceu quando jogava com o Flamengo. “Já gastaste o prêmio, o

bicho?”. Eu digo: “Já, já”.

F.H. – Antes do jogo.

H.A. – Antes do jogo. No treinamento. Então saía no perió...no jornal que Manga já

gastou o prêmio, o bicho. (risos) Então, até hoy habla. Até hoje fala. Então...Eu estou

falando um pouco... porque eu vivi muito no Uruguai e Estados Unidos, hablo muito

espanhol. Está meio... português está meio...

C.B. – Está dando para entender. Está dando para entender.

F.H. – Está tranqüilo. Está ótimo. Você está entendendo a gente.

H.A. – Sim, sim. (ri)

C.B. – Manga, deixa eu perguntar, onde é que você morou no Rio de Janeiro?

H.A. – Eu morava em Copacabana.

C.B. – Em Copacabana. E morava com alguém, outros jogadores?

H.A. – Sim. Eu tinha um compromisso, depois me separei, há mucho año, e...

C.B. – Você já era casado nessa época?

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Transcrição

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H.A. – Tinha me casado, tinha me separado.

C.B. – Sim.

H.A. - Não deu. Aí pronto. E aí procurei meu caminho por outro lado. Graças a

Deus.

C.B – Certo.

F.H. – Nessa época, você chegou no Botafogo já como titular ou você ficou na

reserva, treinando?

H.A. – Eu lhe digo, eu, quando um clube me contrata, sempre titular. Não adianta.

Tu vai contratar um arqueiro para ser o segundo arqueiro, não me sirve, a mim. E

contratou, eu fui titular. E tinha Cacá, o goleiro do Botafogo também, que era um grande

arqueiro. Se tu contratar um arqueiro... vou contratar Manga, e vou para o segundo

arqueiro, prefiro não ir. Então vim para o Botafogo contente porque...como titular.

Entende?

F.H. – E você chegou no Botafogo em 1959, 1960, por ali, já era um grande time. Já

era, talvez, o maior time do Botafogo de todos os tempos. Como que era esse grupo, esse

ambiente? Quando você chegou já estava o time formado?

H.A. – Eu cheguei em 1959. E já estava formado ali. Que tinha Garrincha, e Zagallo

do outro lado, tinha Didi, Paulo Valentim, que foi para o Boca, e Didi, a “folha seca”.

Tinha Nilton Santos, Amarildo, Chicão... Ei! E fui conhecendo essa gente. Tu sabe, quando

vem um goleiro novo, e a gente mira de lado, “será que é bom esse goleiro? Vem do norte

lá, de Recife. Acho que não sirve”. Já mostrei minha qualidade no treinamento, nas

partidas do Botafogo. E fui duas vezes bicampeão. Bicampeão em 1961, 1962, 1967, 1968,

e 1965, fui campeão. E daí me desliguei do Botafogo. Me fui para o Uruguai. Do Uruguai,

levantei a Copa Carranza5, em Espanha, depois a Interamericana6, que fomos à final com

Estudiantes, a Copa Continental, e levantei três vezes o campeonato nacional,

5 Refere-se ao Troféu Ramon de Carranza. 6 Refere-se ao Torneio disputado entre os campeões da Taça Libertadores da América e da Copa dos Campeões da CONCACAF. Tal torneio foi disputado 18 vezes entre 1968 e 1998. Porém não houve nenhuma final entre Nacional – URU e Estudiantes – ARG. O entrevistado deve estar se referindo à final disputada em 1971 entre Nacional – URU e Cruz Azul – MEX.

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Transcrição

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bicampeonato, a Copa Montevidéu. Depois me fui ao resto do mundo. Na Suíça, como

arqueiro, e aí, outra festa, do Hastings7, como titular. Sempre estava invitado, como foi

aqui. E ainda mais, sempre junto da minha senhora, que é equatoriana, que está sentada ali;

uma grande senhora, grande mujer, sempre acompanhando, em todo lado, o meu trabajo, e

onde vou. Isso é muy importante. E aí, estamos aqui, viajando todo lado aqui, em Brasil.

Aceitei a invitação de vocês.

C.B. – E como era jogar com Garrincha?

H.A. – O Garrincha, em primeiro lugar, era meu companheiro de quarto. (risos) Você

sabe que é um... gostava de pescar e comer mariola. Mariola é um dulce.

C.B. – Maria Mole. É isso?

H.A. – Sim. É um dulce. É um dulce. E... “Vamos comprar dulce e vamos pescar”.

(risos) E ali estava a concentração do Flamengo, mais um quilômetro, e Botafogo, se

concentrava tudo junto ali. E aí Garrincha ficava ali, porque tem um quintal muy grande

ali, aí, conversar, fumar seu cigarrito, e aí ia pescar, de tarde, depois do almoço, ia pescar.

Uma hora, duas horas, que dava uma licença. E eu acompanhava Garrincha. E sempre fui

um amigo dele em todos os sentidos. Um cara maravilhoso. Nunca arrumou problema com

nada. Isso era importante.

F.H. – E essa pescaria era onde, no Rio?

H.A. – Ele pescava na praya, São Conrado. Aí, pegava o carrito que tinha ele, de

Pau Grande, e chegava, metia a varita aí com a tripita essa, e pegava o peixito, esse

chiquito. (riso)

C.B. – Ele jogava futebol melhor do que pescava?

H.A. – Não. Esse senhor, nós já tínhamos o prêmio já garantido se jogava com

Garrincha. Um senhor jogador. E tinha Quarentinha. Es esó non? Bombardeio. Eu acho

que os três clubes maravilhoso, Botafogo, Internacional e Nacional de Montevidéu. Os três

clubes que eu joguei eram...muita figura importante, um valor... chegava na cancha, já

sabia o resultado. 7 Mais próximo do que foi possível ouvir e grafar.

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Transcrição

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F.H. – Quando que você sentiu, Manga, que você começou a se tornar um grande

goleiro do Brasil e que vai vir à seleção? Você lembra desse momento?

H.A. – Me lembro. Me lembro quando eu fui...sai de Botafogo, fui para o Uruguai e

aprendi o trabajo, como saía o goleiro uruguaiante e aprendi também o goleiro argentino;

e, se jogava fora do arco, hablava o noventa minuto, gritava com su lateral, o lateral

esquerdo, lateral direito, a defesa, como cobrir de um lado, cobrir outro. Isso, tu eres

responsável da área pequena, a área grande. Por isso que o arqueiro tem que ser muy vivo,

tem que ter quatro vista; e não ficar calado, não ficar dentro da área, dentro do gol. Não

sirve. E eu não sou assim. Eu aprendi. E depois que aprendi, subi lá em cima. E graças a

Deus fazia uma boa atuação noventa minuto. Tinha minha falha. Eu não vou dizer que

Manga era... Tinha minha falha. Mas eu não falhava duas vezes. Era um jogador, um

goleiro muito rápido. Quando vinha um dianteiro matar a bola no peito, eu já estava junto.

Nunca soltava a bola. E jogando sem luva igual. E saía bem. E, sempre, os dirigentes que

me contratava sabia que tinha, no final, o campeonato.

F.H. – Mas você vai para o Uruguai em que ano?

H.A. – Eu fui, junho de 1968.

F.H. – 1968. Mas antes da ida para o Uruguai tem a Copa do Mundo não é?

H.A. – Eu estive em 1966. Antes de 1966, eu estive na seleção.

F.H. – Quem que era o treinador na época?

H.A. – Sempre, eu estava com Vicente Feola. Depois estava Coutinho. Vicente,

Coutinho, o capitão.

F.H. – Capitão Cláudio Coutinho.

H.A. – Depois foi Zagallo. E aí foi meus treinadores. Eu estava no Uruguai, eu

estava no Internacional de Porto Alegre, e viajava com a seleção. Não importa que fosse

segundo ou terceiro arqueiro. Importa tu defender teu clube, teu país, e estar na delegação.

Eu sempre estava aí no meio, com Gilmar e Castilho, esse que morreu.

F.H. – Antes de 1966. Gilmar e Castilho.

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Transcrição

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H.A. – Então sempre estavam os três arqueiros. Depois apareceu Leão, que é um

grande arqueiro, tem meu respeito também. De qualquer maneira, estava com Leão junto.

Depois, estive com Valdir Pereira, com Ubirajara... Esses arqueiros. E assim eram os

arqueiros. Eu tratava de fazer um bom trabajo no treinamento.

F.H. – E, antes da Copa, você já estava sendo convocado pelo Feola.

H.A. – Certo. Sim. Eu joguei muita partida amistosa.

F.H. – Fez excursão também, pela Europa?

H.A. – Sim, eu fiz excursão pela Europa. Eu joguei em Marroc8, joguei na Rússia,

joguei com Alemanha, com Suécia e, no Maracanã, com Portugal também. E joguei três

vezes com Portugal, tudo amistosa, e com a Alemanha, no Maracanã, e com a Rússia, com

Iashin9, que teve essa bola que bateu na nuca do... empataram de dos a dos. E o estádio

com mais de setenta mil, setenta mil pessoas. De qualquer maneira, eu... muy contente...

F.H. – Foi contra...Essa partida que você contou...

HA. – Foi com Rússia.

F.H. – Como foi o lance?

H.A. – Dois a dois foi.

F.H. – Dois a dois. Mas esse lance, que você falou que bateu...

H.A. – Eu chutei um tiro de meta, e estava o russo, aí, bateu na cabeça, a bola entrou.

Mas de qualquer maneira... aconteceu. E eu segui na seleção brasileira, me deu uma

oportunidade, segui igual.

F.H. – Isso foi antes da Copa?

H.A. – Antes da Copa.

C.B. – Aí você já estava acostumado a viajar de avião?

8 Provavelmente o entrevistado se refere ao Marrocos. 9 Refere-se ao goleiro da URSS Lev Iashin, conhecido como Aranha Negra.

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Transcrição

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H.A. – Não, não me gusta avião. Mas de qualquer maneira, era a profissão, era um

trabalho, tu tem que seguir. Se tu vai, um trabalho, que tem uma oportunidade, tu vai... Se

dependesse de mim, eu me quedo em casa não? (risos) Que o avião... não me gusta. Esse é

o meu pensamento. Cada um diz: não, eu adoro avião. Me adora estar em bajo, abajo. De

qualquer maneira, é a profissão, tinha que viajar para todo lado. Viajei como cinco mil

quilômetro. Desde que fui jogador. Aqui, campeonato brasileiro, quanta volta. Dois anos

seguidos. Depois, a seleção e todo, e viagem com o Internacional e com o Botafogo, na

Europa. Nós tinha um mês de viagem, todo, em janeiro, entre Internacional, em Porto

Alegre, e Botafogo, de Rio. E Nacional de Montevidéu. Viajava para todo lado.

F.H. – Você sentiu muita diferença, com essa ida para o Uruguai, do futebol que era

jogado aqui e que era jogado lá?

H.A. – O problema é que o futebol lá em Uruguai é muy duro. Eles são muy forte. E

Brasil joga muito toque, entende? Joga, toca para as paredes. Esse é o futebol brasileiro,

futebol bonito, elegante. E o futebol lá do Uruguai é um futebol...que são valente, são forte

essa gente,entende? Vai com todo. E aí joguei seis año. E fui campeão. E jogar com

Peñarol... Peñarol é um time difícil, que jogava com Figueroa, em Peñarol. E depois foi

meu companheiro no Internacional.

F.H. – O goleiro era o Mazurkiewicz àquela época?

H.A. – Quem?

F.H. – Mazurkiewicz era o goleiro?

H.A. – Mazurkiewicz. Goleraço. E aí encontrava os dois.

F.H. – Manga e Mazurkiewicz.

H.A. – Sim. E aí, fomos na Copa10, metemos 3 a 1 a Peñarol e classificamos, fomos à

final, em 1971, com Estudiantes, em Mar del Plata. Que fomos campeão. Perdemos em

Mar del Plata, 1 a 0, ganamos, 1 a 0, no Uruguai; a terceira partida, um campo neutro,

jogamos em Peru, aí ganamos, 2 a 0. Aí fomos campeão da Copa Libertadores da América.

10 Refere-se à Libertadores da América.

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Depois jogamos a Copa Continental, que jogamos duas partidas: na Grécia, empatamos 1 a

1, e o treinador era Pusca11...

F.H. – Que era o...

H.A. - O espanhol. Esse da... Depois, jogamos a segunda parte no Uruguai,

ganhamos de 2 a 1. Aí fomos campeão. Aí depois jogamos a Copa Carranza, Espanha, aí

fomos campeão. A Copa Interamericana, tudo isto.

F.H. – Ganharam tudo.

H.A. – E saí contente, porque... depois, vim para o Corinthians. E não deu certo.

Internacional foi rápido...

C.B. – Os jogadores uruguaios recebiam bem os jogadores brasileiros?

H.A. – Sim. Aí jogava um goleiro, tal de Célio Taveira, um goleiro... um

centroavante brasileiro. Os dois brasileiros que tinha era Manga e ele. E o treinador era

Zezé Moreira. Não sei se recorda.

F.H. – A o Zezé.

H.A. - Zezé Moreira tem um irmão também.

F.H. – Irmão do Aymoré.

H.A. – Sim. Ele que me mandou contratar e... e fomos campeão. Eu era tranqüilo.

Jogava muito trancado.

F.H. – Ele chegou a ser seu treinador aqui no Brasil, o Zezé?

H.A. – Zezé Moreira? Eu não sei. Eu sei que, depois que eu saí, ele seguiu no

Internacional. Depois, eu não sei o fim dele, porque me fui ao Equador, não tem muy

contato, não tem.

F.H. – Mas Manga, a gente queria voltar um pouquinho, para você falar da Copa do

Mundo de 1966, que é um pouco o nosso foco. 11 Mais próximo do que foi possível ouvir e grafar.

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H.A. – Diga. Em 1966, você sabe que eu não estive bem. A primeira partida pelo

campeonato do mundo, eu fui sincero, e estava um pouco nervoso, uma partida que...

F.H. – Ah! Você fala o terceiro jogo já.

H.A. – A partida com Portugal, que quebraram Pelé. E uma decisão, porque Brasil

tinha que ganar de 2 ou 3 a 0, e nesse tempo, não podia trocar jogador, eu levei um

pontapé no braço, que não podia... Igual, como valente, seguia treinando, jogando, porque

não podia cambiar goleiro nem nada. E perdemos para Portugal, 3 a 1. Aí foi a salida de

Brasil. Brasil já estava fora quando jogou com a Hungria, que perdeu. Esperando um

milagre que acontecesse com Portugal. Mas não aconteceu.

F.H. – Mas Manga, a preparação para essa Copa do Mundo foi muito longa. Foram

muitos jogadores convocados. Você lembra disso?

H.A. – Sim, me lembro. Porque tinha um... como cinqüenta jogadores. Nós

estávamos em Lambari... Lambari, no interior, Caxambu, Teresópolis ou Petrópolis, não

sei, e trinta dias, vinte dias de um lado, e jogadores, você sabe, feito um quartel, muito

jogador junto, entende? Lejo, e... A gente almoçava, sempre estava junto, passava cinema à

noite, e ia depois, vinte dias, na outra cidade, treinamento, o frio. E jogador que não estava

acostumado. Tinha cinco goleiros nesse tempo. E tu fica nervoso, que vem um corte aí.

Quando disseram “amanhã vai um corte de quinze jogador, hein. O que chama se queda, o

que não chama se va”. Então...Assim mesmo, como está. E tu fica nervoso. E sai o jogador,

um corte. E tu vê que chora, porque quer ir, quer, na seleção não é? Lutar tanto, e não

seguir na seleção. E aí se va o jogador, esperando outra oportunidade. Aí tu sigue

trabajando. Não saiu nenhum arqueiro. Aí, uma semana, disse: “vamos a ter outro corte”.

E vem o alfaiate sacar a ropita, tudo... Já sabe quem vai. Aí disse: “aí vai sair mais tanto

jogador. Eu vou dar o nome que se queda, o resto se va”. O primeiro que saiu, Edson

Nascimento, o Pelé. O homem, uma figura. Depois vem Garrincha. Gilmar está escolhido.

Pois bem. Disse: “Haílton Corrêa, Manga”. Aí eu me quedei. 1966. Aí foi saindo os

jogadores, aí ficou Valdir Pereira...Valdir Peres comigo. Três arqueiros. O resto se foram.

F.H. – Quem ficou, você? Quem que eram os goleiros?

H.A. – Eu e Gilmar.

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F.H. – Você e Gilmar. Os outros eram Valdir... Você lembra os outros?

H.A. – Ficou os três. E viajou mais um...como vinte e três jogadores. Mas aí demos

um abraço nos que não foram, mas como amigo. Isso são coisas da vida. Nosotros não

temos culpa. Eles que escalaram, e tem sua reunião, como técnico, saber quem se queda,

quem se vai. Então... E graças a Deus vim na seleção, mesmo como segundo arqueiro.

F.H. – A relação era boa entre todo mundo na seleção, em 1966, se davam bem, era

um grupo unido?

H.A. – Claro, maravilhosa. Eu acho que não teve, nunca teve problema. E era vinte e

três jogador ou vinte e cinco jogadores que acompanham a delegação. Todo que entrava na

cancha, nós dava um abraço, que se saísse bem, tem de ganar. Que não aconteceu contra a

Hungria em 1966. Perdemos. E a Hungria já tinha ganado a partida antes. E Portugal

também ganou, depois, da Bulgária, e Brasil já se caiu fora. Tinha ganado de dois, três

gols de Portugal. E ali saiu, que quebrou Pelé, quebrou Da Silva, e ficamos dois jogador

menos. E Portugal, pegaram bastante forte a defesa; e a Pelé igual, porque Pelé é uma

figura, um homem...que dava o resultado à seleção brasileira, que é um homem valente. Aí

saiu Pelé, e se acabou.

F.H. – Pelé já estava um pouco machucado na preparação, não estava? Você lembra

disso?

H.A. – Não, não. O Pelé era um tipo, que ele gostava, sempre, estar treinando.

Treinava até de goleiro. Eu me lembro, em Marroc12, Pelé quebrou a cabeça, levou tres

punto. Ele fez gol, fez tres gols contra Marrocos. Ganhamos de 3 a 0. E o Pelé não... para

ele, estava no treinamento, contente, sempre... [inaudível]. E sempre na cancha.

F.H. – Outra coisa que se falava desse elenco é que tinham jogadores já muito

velhos, que já tinham passado pela Copa de 1958, que estavam naquele time meio porque

já eram campeões em outros momentos. Você sentia isso, que tinha gente ali que já estava

um pouco?...

12 Provavelmente refere-se ao Marrocos.

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H.A. – Você sabe que nosotros não dava conta, porque quando a seleção brasileira

contratou tanto jogador, Djalma Santos, Bellini, Mauro, essa gente, Zito... para mim é um

orgulho estar junto com eles, junto com eles não? E Garrincha, Pelé... Eu acho que o Brasil

tinha uma equipe muy valente, uma equipe que tinha muy jogador experiente, que tinha seu

valor. Isso que a seleção brasileira...Eu não estava preocupado com quem é que tinha mais

idade. Eu acho que ele tinha um valor. São valente. Era a figura. Jogador como Bellini,

Djalma Santos, Gilmar. Eu acho que... uma alegria. Eu acho que a preocupação, se tinha,

era da gente da torcida, algum... Mas dos companheiros, nosostros, não. Nem sequer o

corpo técnico.

C.B. – Manga, nos amistosos que vocês estavam jogando antes da seleção, você

estava sendo o goleiro titular. E aí, nesse primeiro jogo contra a Bulgária, o Gilmar que

joga. Como é que você se sentiu? Você estava esperando ser o titular?

H.A. – Não, não. Eu estava jogando como...a primeira, Brasil, amistoso, e uma

semana depois, já com concentração, e sabendo que ia jogar com a Bulgária. E fomos para

o vestiário. No vestiário, chegamos, já viemos com a roupa verde; só sacar o pantalão e...

e já dá massagem. Eu estou lá sacando minha ropita, daqui a pouco, Vicente Feola disse:

“O time joga com Gilmar, fulano... E nesse tempo, não tinha segundo arqueiro. Eu tive que

pegar minha bolsa e subir na arquibancada, para assistir a partida contra a Bulgária. Que

ganamos de 2 a 0. Gol de Garrincha, e gol de Pelé. E aí foi sempre titular Gilmar. Eu

respeito. Um grande arqueiro. E depois, com Hungria, ele se le machucou e não pôde

jogar, eu joguei contra Portugal.

F.H. – Ele se machucou no decorrer da partida? Durante a partida ou foi depois, no

treino?

H.A. – Não, não. Isso foi numa partida. Foi numa partida. Tu sabe que o joelho não

se cura em dois minutos, uma semana. Ele dói mucho, ele dá derrame. Aí ele disse que não

podia jogar. Jogou Manga. E tive muita sorte e jogar bem. De qualquer maneira, eu

agradeci a Deus que estava inteiro ainda, porque, ainda assim, jogar mal, ainda fui na

seleção brasileira, convocado.

C.B. – Como que era assistir ao jogo na arquibancada?

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Transcrição

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H.A. – Um pouco nervoso. Porque quando tu estás jogando, tu esquece de todo, a

gente grita – sai aqui, sai para o outro lado, e jogando, em qualquer estádio...então, me

sentia bem.E ainda mais, como estava como segundo arqueiro, a gente admirava: por que

não está na banca? E não podemos falar nada porque estamos ali com a gente da seleção

que está cuidando os jogadores e está todo num grupo. A gente está torcendo que ganamos

nosostros. E quando ganha, vão para o camarim13 , depois que terminou noventa minutos,

abraçamos ele, e estamos junto novamente.

F.H. – Manga, só para recuperar. O primeiro jogo com a Bulgária, 2 a 0. O Brasil fez

uma boa partida para você? Você lembra desse jogo?

H.A. – Eu me lembro que o Brasil jogou muy bien, muy bem. Primeiro gol, que ia

bater a falta Pelé, e bateu Garrincha, fez o gol, primeiro gol. E ali o Brasil começou a jogar

como sabe jogar. E depois veio o segundo gol de Pelé, e terminamos, graças a Deus

ganamos a partida, 2 a 0. Estamos tranqüilo. Mas já Hungria já tinha ganado da Bulgária.

E depois, na outra semana, jogava Brasil e Hungria. E Portugal jogava com a Bulgária.

Bulgária perdeu as três partidas.

F.H. – Era o mais fraco do grupo.

H.A. – O mais fraco. Aí jogou Brasil com Hungria. E Brasil não esteve bem,

perdemos, 3 a 1. Aí a Hungria fez quatro pontos. Não era seis. Quatro pontos. Brasil tinha

dois. E depois ia jogar Portugal e Hungria. E Brasil jogou com Portugal, que eu joguei, e

perdemos, 3 a 1.

F.H. – Você lembra desse jogo? Os problemas que o Brasil teve? Por que não deu

certo ali?

H.A. – O problema, quando o treinador escala os onze jogadores, nós damos o grito

de salida e pedimos que fazemos uma boa partida, que ganamos um bom resultado.

Tratamos de fazer um noventa minuto a ganar essa partida, que é muito importante; ainda

mais que o país, o mundo inteiro está vendo o resultado. Então, na hora que vai o jogador...

E Pelé estava bem, todo estava bem. Jogou Edu na ponta. Eu estava confiado que ia

classificar, porque tendo Pelé na seleção, o homem...muy valente, o homem mete gol. Mas 13 Refere-se ao vestiário.

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tomano um gol muito cedo, muito temprano. Aí ficou desesperado os brasileiro para

empatar. Quando pegaram Pelé, deram lenha, e aí Pelé não pôde continuar. Depois

pegaram Da Silva também, que era outro morenito, também, nas pernas; e seguiu jogando,

porque não podia trocar jogador. E aí algum jogar do Brasil chegou no camarim14 a chorar

pela derrota. Todo mundo está conversando... Ih! Que o Brasil perdeu, jogou mal, esto... É.

Porque é muy difícil. São noventa minutos. Duzentos millones de brasileiros que estão

esperando esse resultado. E esse resultado não saliu. Então, as propostas que vinha era...

Brasil, mundial. Se está esperando os jogadores, para isso, para aquilo, para esto.

Marcamos uma salida, para sair de manhã para chegar à noite, não se via. Depois, viajar

de noite para chegar de manhã, escondido. Todo isto, entendeu? Para não chegar de dia

aqui, para a gente não esperar, para não ter problema. Tem de sair de dia para chegar de

madrugada, escondido, e cada um se va a sua casa. Mas se dá conta depois que tu vai para

o teu clube, tu tem de treinar, se apresentar. Então tem de ser valente. Vamos sair e chegar

de dia, para mostrar a personalidade da seleção brasileira. Aí chegamos de manhã, mais ou

menos, por aí, às dez da manhã. Levar na cabeça. Aí Deus, que está mirando, está

acompanhando... e não passou nada. Mas o problema é que tem que sair de manhã para

chegar à noite. (risos) Quanto mais noite, melhor, que estão dormindo (risos). Menos o

repórter. Dormindo a gente, não vai lá no aeroporto pegar. Então, ficamos tranquilito.

Eram as notícias que davam lá na Inglaterra. Estão esperando o pobre de Manguito aí.

Manguito não esteve bem. Vai pegar mal. (risos)

C.B. – Manga, vocês tinham alguma notícia desses outros times que vocês jogaram

contra? Vocês faziam análise dos outros times? Vocês conheciam os outros jogadores, da

Bulgária, da Hungria, de Portugal? Vocês já conheciam os craques dos outros times?

H.A. – Já. E nosotros, sempre, Vicente Feola botava...fazia um casse15 , nós assistia.

Depois do almoço, um dia antes, nós assistia. O jogador mais perigoso de Portugal, que

nem Euzébio, José Augusto, aí nós via como... E tinha algum muito alto, a gente, quando

era um córner, tinha muito jogador alto de Portugal. E Vicente Feola sempre contava ali –

aqui, cuidado, esse é mais frouxo, esse só tem a esquerda, vamos passar para o lado da

esquerda, porque ele não tem a direita. Então, isso era uma conversação do corpo técnico.

14 Refere-se ao vestiário. 15 Refere-se ao vídeo dos jogos das outras seleções. “Cassete”.

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E nós assistia como jogadores da seleção. Tu sabe que Euzébio é um jogador muy rápido e

estava todos noventa minutos, em todo lado. E nosotros não... não procuramos segurar esse

senhor. E foi que derrotou a seleção brasileira.

F.H. – Você acha que o diferencial desse time de Portugal era o Euzébio, mesmo?

H.A. – Eu acho que Euzébio era o piloto. Porque era um homem... Como Pelé. É

como tinha Maradona, como tem esse de Barcelona, de Espanha, um 10. Era assim. Então

tinha que cuidar esse morenito. Não cuidaram, ele foi e fez o segundo gol e o terceiro gol.

E aí já foi abajo. E o brasileiro tem que levantar a cabeça e voltar ao Brasil.

F.H. – Você falou dessa preocupação da volta. Brasil vinha de um bicampeonato,

1958 e 1962...

H.A. – E em 1966, não dá. E a gente... você sabe, quando tu já vai de viagem, a gente

disse “vamos trazer o tricampeonato”. Tricampeonato? Sim, sim. E todo mundo, festa,

foguete e... quando tu entra dentro do avião, maravilha, porque aí não vai passageiro

particular, só vai jornalista e jogador de futból. E tinha sua comidita já pronta. Está

sentado.... tua comida. Então, levaram uma torta bonita, feito uma cancha, e...pensa na

partida que fizemos, amistosa, depois... E viemos o campeonato, e não continuamos no

tricampeonato. Esse foi nosso pensamento, sair de Brasil e trazer o campeonato, o

tricampeonato. Pela chave que estava, não estava tão... Classificava dois. E os dois malos,

que era Hungria e Bulgária... E Hungria sacou nosotros. E ficou somente Portugal e

Hungria, dos quatro. E saiu Brasil, que é uma potência mundial. E ficamos fora.

F.H. – E olhando hoje, pensando nesse time de 1966, o que você acha que poderia ter

sido diferente? Não você, o Brasil mesmo. Algum jogador, um esquema, o treinador, o que

poderia ter sido diferente, para dar certo?

H.A. – Eu acho que Brasil é um país muy grande, um país que tem millones de

jogadores. Eu acho que quando o treinador entra na seleção brasileira se fica muy nervoso,

pela convocação de tanto jogadores, que chama este, não chama este; e o jogador está bem

no campeonato brasileiro, no campeonato nacional, que amostrou o ano todo, que está na

seleção, no momento, não está, e outro jogador que não podia estar na seleção, está na

seleção. Então... E uma potência muy grande nesse país, quando vem a convocação da

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seleção brasileira. E você não dorme de noite. O treinador diz: “amanhã, ainda vou

convocar trinta jogadores”. E tem que meter lá os pontitos, e chamando, e tem outros que é

muito mejor, e não está na seleção. E acontece em toda seleção mundial, não só em Brasil.

Em todo. Porque o Brasil, quanto jogador tem mejor de que os europeus? E... É uma

potência. E o treinador fica preocupado, disse “eu podia chamar esse, ou chamo esse?” Há

um conselho de outra gente que “leva esse jogador”, então ele vai, leva, e deixa outro

mejor. Então eu acho que nesse momento, o responsável todo são o treinador, na hora que

escala a convocação, e se não sai bem ou sai bem. Porque é muito difícil, tu ser um

treinador da seleção, saber que tem que convocar trinta jogador para depois sacar sete, e

algum mejor, que está jogando o ano todo, o outro que não foi, e voltou à seleção

brasileira. Eu acho que é muito difícil para um treinador quando está na seleção.

F.H. – Você já falou da volta para o Botafogo. Mas quando voltou da Inglaterra, você

falou que não teve muito problema com a torcida, mas você sentiu, na sua volta ao clube,

que você era cobrado, que as pessoas te apontavam, falavam de você?

H.A. – Mas de qualquer maneira, tu sabe, quando tu chega à seleção, que tu fracassa,

sempre diz “ah...levou um peru”, assim que lhe dizem. Quer dizer, agüentamos, porque são

coisas da profissão e estamos para isso, para muitas coisas. Então não lhe diz, quando tu

faz uma defesa, “que linda defesa”. Quando tu leva um frango, não Manga, como todos os

arqueiros brasileiros então a culpa... Se tu joga 89 minuto bien, e passa um minuto, leva

um frango, tu é culpado da derrota. É como Barbosa, em 1950. Como ficou a família. Eu

sei que ele teve sua vontade de pegar essa pelota. A pelota passou no palo que ele estava.

Aconteceu. A gente não esquece nunca mais. Essa bola que passou, todo mundo diz que foi

a falha de Barbosa. Eu como arqueiro, eu nunca le digo. Esse homem foi um grande

arqueiro da seleção brasileira. Aconteceu. Pode acontecer com todos. Manga falhou,

Gilmar falhou, Castilho, todos arqueiros brasileiros têm sua falha. Quando ele pega duas

pelotas, diz que são o mejor goleiro de Brasil, melhor goleiro que tem para a seleção

brasileira. Quantos goleiros tem acá que quer ir na seleção? E tem de São Paulo, grande

arqueiro, e tem de Corinthians, tem de Palmeiras, tem de Flamengo. E tu tem que pensar

quais são os que vão para a seleção. E se fracassa... por que deixou o outro que estava

mejor? E isso foi o que aconteceu com Barbosa, e a gente não se esquece. E caso, nosotros

também, se tu não faz... Agora, o campeonato que teve, que ganhou Holanda contra Brasil,

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quem diria que perdia? Que Brasil estava ganando. Perdeu de 2 a 1. E a gente aqui se

mordia, queria pegar vivo, acá. E graças a Deus não passou nada com o muchacho.

F.H. – Com Júlio César ou com Felipe Melo?

H.A. – Não. Eu lhe digo, que o Brasil não classificou, eu não culpo a Júlio César a

nada. Eu acho que aconteceu. Eles ganharam de 2 a 1, e Brasil não soube aproveitar que

estava ganhando de 1 a 0. Aí veio a oportunidade da Holanda, e meteu os dois gols de

cabeça. E aconteceu. E saiu o Brasil fora. Com o empate, o Brasil se classificava, ou ia

para o penal, não sei.

F.H. – Você falou do Barbosa. Você chegou a conhecê-lo?

H.A. – Eu? Não, não, não conheci. Eu era juveniles ainda, em 1950. Acho que era

pequeño. E o Barbosa, eu vi que era um goleraço este. Sim. Um respeito muy grande.

Como Osvaldo Baliza, um goleiro grandão. Nesse tempo, em Brasil, tinha muito pouco

arqueiro. O arqueiro, em Brasil, era pouco. Aqui tinha Barbosa, tinha...aí veio Gilmar,

agora veio...outro goleiro...Castilho, depois apareceu Manga, aí veio Leão, Valdir Peres,

veio Félix, que jogou em 1970. E não era arqueiro bem visto. Entende? Só Gilmar que

era... Aí, depois, apareceu outros goleiros aí. Eu estava nesse meio também, porque lutava

para estar sempre na vitrina, para ser um conhecimento da gente e dos periodistas.

F.H. – Manga, o Barbosa, ele fala que aquele lance ele levou para o resto da vida, e

ele sempre pensou muito no lance, porque ele foi cobrado. Você ainda pensa em algum

lance, alguma falha sua, que você poderia ter feito diferente, na seleção ou em algum time?

Ou já passou tudo?

H.A. – Não. Eu acho que quando tu falha, ainda mais na seleção brasileira, que

falhou... Eu falhei com a seleção brasileira, eu dormi tranqüilo. Eu fiz o meu dever.

Aconteceu. E o caso de Barbosa, é um caso diferente, entende? Porque, depois que tomou

esse gol, já se perdeu ele, já ficou perdido, já todo que saía... esse pensamento que falhou

contra o Uruguai em 1950, com duzentas mil pessoas. Com resultado, o empate, era

campeão Brasil. Então... se foi para o outro lado e se preocupou, e já não foi um grande

arqueiro.

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F.H. – Depois daquilo.

H.A. – Claro. E o caso meu também, que... Quando tu entra numa seleção tu quer

amostrar seu valor. Eu sempre lhe disse, em 1966, Manga não jogou bem. Eu não vou

mentir. E graças a Deus, eu joguei, depois, na seleção, mostrei minha capacidade como

grande arqueiro.

F.H. – Depois então, mais alguma de Copa do Mundo...

C.B. – Você lembra de ter acompanhado essas copas anteriores, ouvir pelo rádio,

quando você era garoto, Copa de 1954, 1958?

F.H. – Não. Eu, enquanto estava em Brasil, acompanhava, que estava aqui em Rio de

Janeiro. E depois que me fui afora de Brasil, há trinta año que fui ao Equador, aí já não

tinha muito contato com o futebol brasileiro. É muy difícil. Às vezes, só assim, uma notícia

que sai, um lance, nada más. E não tem... Aonde eu joguei, como Uruguai, aqui em Brasil,

é muito difícil, ver como estava o campeonato e todo isto. E tanto año também. Já depois,

você sabe, não temos muito contato. Esse é o resultado, a saída de Manga fora de Brasil.

Nem a seleção. A seleção vai jogar, aí esperamos esse dia para ver. Mas não tenho

conhecimento de dias, como está jogando o futebol brasileiro.

F.H. – Manga a gente precisa fazer só uma pausa, que é por causa da fita, que é uma

hora.

H.A. – Está bem.

[FINAL DO ARQUIVO I]

F.H. – Manga, então você falou dessa volta da Copa do Mundo, tudo que você

passou em 66. E aí você voltou para o Botafogo. Você permaneceu mais um tempo no

Botafogo, não é?

H.A. – Sim. Eu fiquei em Botafogo até junho de 1968. E aí me fui campeão em

1968. E daí me fui ao Uruguai. Fizeram negócio com Uruguai, com o passe.

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Transcrição

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F.H. – Mas por que que teve a saida do Botafogo?

H.A. – Não. Eu... É que o Nacional Montevidéu, teve um empresário que achou

que...queria contratar Manga e fez negócio com Botafogo; Botafogo entrou em acordo e

vendeu.

F.H. – Ah, sim, foi uma proposta de lá.

H.A. – Uma proposta do clube. É como qualquer jogador,que vem um empresário,

faz uma proposta, se tu...tu te gusta, tu va. Então, o empresário veio, disse “olha, vim fazer

negócio com seu passe. Você quer ir jogar no Uruguai?”, eu digo: “sim”. Aí fecharam, em

duas horas, três horas de conversação, aí eu me fui a Montevidéu.

F.H. – Tem um episódio muito falado também, que é um desentendimento seu com

João Saldanha.

H.A. – Sim. Eu acho que... não vou responder, porque se eu respondo isso... Já

passou tanto año.

F.H – Não, tudo bem.

H.A. - Não adianta. Ele é um periodista, eu respeito. E o periodista respeitava a

Manga. Não posso responder, porque se va muy largo isto,entende? Tu tem que ter um

valor, uma personalidade na cancha, para mostrar. Eu a mostrei.

F.H. – Sim. Depois disso, vocês se entendem. Tranqüilo.

H.A. – Não, não.

F.H. – Tudo bem. Aí teve essa ida para o Uruguai, que você falou das diferenças do

futebol. E lá você vai ganhar muitos títulos, não é?

H.A. – Lá, eu me fui, eu cheguei lá no Uruguai, cheguei, junho de 1969...1968. Tu

sabe que quando tu chega e... me fiquei num apartamento... Eu cheguei terça-feira, terça-

feira, eu cheguei no Uruguai e fiz exame médico, fui aprovado. Tu sabe que um jogador

tem que fazer exame médico, para ver se ele está bem. Eu estava bem. E, por meu contrato,

fiquei no apartamento, não fui treinar. E tinha um torneio entre, entre... Boca Júnior, River

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Transcrição

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Plate, Barcelona, de Espanha, e estava Santos e estava Nacional de Montevidéu. Cinco

equipes. Então, na quarta-feira, jogou Nacional com Boca Júnior. Boca Júnior meteu 6 a 0

no Nacional. Então... Eu não estava. Nem treinando. E Nacional jogava sábado. Então,

como era sábado, de manhã, me batem na porta, disse: “Manga, você tem que viajar para a

Argentina. São vinte minuto”. Eu...minha vez e... Peguei a maletín, me fui à Argentina. E

da Argentina, me deram a chave, eu fiquei num quarto, aí depois fomos almoçar. Não me

disseram nada. Pensei que ia descansar um pouco. Eu fiquei vendo televisão. Daqui a

pouco chega o roupeiro com a chuteira, luva... Eu digo: “para que esto?” – “Não.

Mandaram trazer para usted”. Eu digo: “Mas para quê? Eu não estou treinando”. Aí disse:

“Olha, a saída para o estádio...A partida é a las ocho. Tem a charla16 a las seis. Tem que

sair pronto daqui do quarto”. Eu vesti minha ropita, saí. Digo: sem treinar!? Aí me fui. Aí

perguntei, eu digo, eu perguntei, digo: “Com quem vão jogar?” Disse: “Não. Vamos jogar

com o Santos. O Santos de Pelé”. “Puxa vida! – eu digo – com Pelé ainda?” E tinha Pepe,

Mengálvio, Coutinho, Zito, Orlando. E fomos. Primeiro tempo, nós estava ganhando, 2 a 0,

de Santos. Minha estréia. Bombardeio...E estava molhado a cancha. Pepe pateava muito

duro, muy forte. Bateu no peito, aqui... Doía duro. Com o frio... E terminamos 2 a 2 a

partida. Aí, contentes de... Manga fez uma boa apresentação. Aí veio a terceira partida,

que...

C.B. – Quem fez os gols do Santos? Você lembra?

H.A. – Pelé e Pepe. Então veio a terceira partida, jogamos com Barcelona, de

Espanha. E ganhamos 2 a 0 da equipe de Barcelona. Depois veio a outra partida com River

Plate. Ganhamos, 2 a 1. Eu joguei três partidas. Joguei com Santos, com River Plate e

joguei com Barcelona. Nesse tempo, era dois pontos. Eu fiz cinco pontos em três partidas.

Então, terminou o campeonato, foi campeão o Boca. A final foi Santos com Boca. Então,

no outro dia, chegamos no Uruguai, a gente, a televisão, tu sabe como é que é, “agora

temos arqueiro!” E me fui treinar no dia seguinte. Tinha cinco goleiro no clube. E lá não

tinha treinador de goleiro. Disse: “olha, vamos botar esse brasileiro para chutar, para ver se

é bom mesmo. Estão falando que esse é bom goleiro. Vamos testar”. E deixavam os

atacantes bombardear. Eu que tinha... pateava, eu...tuc, tuc... E o treinador disse: “não, esse

senhor é bom, bom arqueiro, hein”. (risos) E foi sacando. Os arqueiros se foi. Um jogou no

16 “o papo”.

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Transcrição

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Flamengo. Dominguez. Um grandão. Depois foi para Boca. Depois, um equatoriano,

Renato García. Também foi goleiro. Estava comigo. Se foi. Depois, Toriote. Foi três

arqueiros, não quis mais estar com Manga, se foram para outro lado. Então fui titular seis

anos em Nacional Montevidéu, amostrando o trabajo todo. Dois campeonato da Copa

Montevidéu, que conta com Corinthians e Palmeiras, Boca Júnior e River, Peñarol e

Nacional. Nós fomos campeão duas vezes. Campeonato, três vezes, Nacional. A Copa

Carranza, Espanha, também, fomos lá, fomos campeão. Jogamos quintas e sextas. Aí veio

a Copa do Mundo...Ih! Varremos todo. (risos)

F.H. – É. Talvez o maior time da história do Nacional. Você esteve no maior time da

história do Botafogo... e depois no maior time da história do Nacional.

H.A. – Ah, sim, sim. E de Nacional. Eu acho. Jogador de Nacional Montevidéu... Eu

estive agora, em junho de 1968... junho agora. Uma festa. Quarenta años. Eu e minha

senhora fomos. Fomos invitados. Uma festa maravilhosa. Os jogadores todos, que jogou

em 1971, fomos campeão. Mil e quinhentas pessoas. Maravilhoso. Uma festa espetacular.

E me fiquei quatro, cinco dias. Você lembra no dia que não podia parar avião em Chile, na

Argentina?

F.H. – Sei.

H.A. – Eu estava no Uruguai. E graças a Deus, muita gente... Há tanto año que eu

joguei lá, e a gente tem um carinho muy grande. Um bom trabajo. Ainda mais, um arqueiro

que faz um gol de arco a arco, é muy difícil, no Uruguai. Tudo aconteceu. E foi aí quando

me retirei do Nacional.

F.H. – Você falou da diferença do futebol uruguaio para o brasileiro. Lá era mais

fechado, você falou não é?

H.A. – Claro. Porque o Uruguai joga mais forte. E o Brasil é um time que joga de

toque, entende?

F.H. – Mas eu queria saber a diferença da torcida. Você sentiu diferença?

H.A. – Não. A torcida brasileira vai, aqui... grita muito, gritando com os jogadores, e

lá, em Uruguai, muy pouco, está exigindo muy pouco. Aqui exige mucho. Aqui, tem que

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Transcrição

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ganar a partida. E lá no Uruguai não. No Uruguai é pouco. Ainda mais um país que a gente

vai muito pouco para o estádio quando joga Peñarol e outra equipe, ou Nacional, Bela

Vista ou Cerro. Não é uma torcida que leva cinqüenta, como Corinthians, Palmeiras, como

Flamengo. Tu tem essa vontade de chegar na cancha, de dar os noventa minutos, para

ganar sua partida. No Uruguai, joga o Nacional, eu joguei muita partida, dez mil pessoas,

cinco mil pessoas. Jogar com o Cerro, jogar com Central, Boca Júnior, muy pouca pessoa.

Não é como aqui no país.

F.H. – Mas no clássico lá...

H.A. – São mais exigentes aqui. Aqui são muy exigente. Aqui, tem que ganar. E já

pelea. “Olha, tem que ganar a partida”. Já quer tombar o treinador. Lá, não. Lá não tem

esse negócio. A gente lá...está tomando seu chimarão e aí...vendo a partida, e comendo o

seu assadito, e nada más.

F.H. – Aqui, você falava que ganhar do Flamengo era tranqüilo, era fácil. E lá? Você

falava isso para o Peñarol também?

H.A. – Não, não. Eu, aqui, porque... estava no treinamento, e um jornalista disse “já

está o bicho garantido, o Flamengo?”, eu digo “já, já gastei já”. Mas lá no Uruguai, nunca

hablei, nunca falei isso com o Peñarol.

F.H. – Mas eram jogos muito duros?

H.A. – Eram muito difícil as partidas. Mais que seja pequeña, era difícil. Então

disse... muito jornalista uruguaio disse “por que você pega muita bola com a mão quando

vem baixa?” – eu digo: “é o costume”. Essa bola que vem assim, eu fazia com a mão,

pegava com a mão. E era a confiança que tinha. E muito jornalista que tinha no Uruguai

disse que nunca viu um goleiro fazer assim. “É falta de respeito à torcida?” Digo: “Não,

não. É meu jeito de goleiro”. Sempre acostava dois metros para não soltar da pelota, para

recuperar, e igual me saía bem.

F.H. – Por que a saída do Nacional?

H.A. – Primeiro, eu estava em casa e recebi uma chamada, que estava o presidente

do Corinthians, Vicente Matheus. Me fui. Mais ou menos, às dez da mañana. Então,

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Vicente Matheus sentou- como está aconcedendo a entrevista- disse que veio me contratar.

Já tinha conversado com a gente diretiva de Nacional, ia trazer para Corinthians. Eu digo

está bem. Digo: “Não hay problema. Vamos conversar. Quanto usted vai cobrar?” Digo:

está bom. Os quinze por cento... Essas coisas. Aí, tudo combinado, essas coisas, dois

pontos que tinha mais de conversar. Aí fui para casa, para entregar a chave da casa ao

clube. Recebo uma chamada internacional de Porto Alegre. “Tem que vir aqui porque é

uma chamada de Porto Alegre”. Eu me fui, atendi o teléfono e... Presidente Eraldo

Hermann. Disse: “Eu sou presidente de Internacional, me quero conversar contigo no

aeroporto, que vai fazer escala em Porto Alegre”. Eu digo “está bem”. Para conversar. E

Vicente Matheus contente, porque... todos os representante, todo, para cuidar. E fizeram

escala em Porto Alegre. E eu não tinha chance de... Era trinta minuto afora aonde estava o

presidente de Internacional. Aí... era um pelado na cabeça, aí me fui hablar com ele, por

respeito, que dei a palavra. Ele disse: “Manga, eu quero lhe contratar.” E viu a mão toda

torta, toda... (risos) Contratar esse goleiro horrível assim. E disse: está bem. Digo: Hay dos

pontos do Corinthians. Eu [inaudível] o contrato hoy e exame médico”. Tem que fazer

exame médico, e o contrato. Aí... E não recebi. Tinha que vir no outro dia para fazer o

contrato. E não me gostou. E os dois pontos, também, não entrou no contrato. E se respeita

a torcida do Corinthians, porque estava acompanhando. E não teve nada, não realizou esse

contrato. E peguei o avião, me vim a Porto Alegre. Estava esperando o presidente. Vinha

fazer exame médico. Nada sabia os periodistas. E, em dois minutos, apareceu toda a

televisão e... A primeira coisa, dizem assim: “Já contrataram um goleiro que tem 31 año”.

Eu digo: “Puxa vida!” [inaudível]. Eu digo: “Primeira coisa, tem que ver na cancha.

Quando você vê na cancha, você aí pode hablar esto. Ver o valor que tem. E fui

tricampeão. De todo lado que fui... Acho que... não le gustou o que aconteceu. Manga foi

campeão, está vendo aí, três vezes. E a gente que disse “não, tem 31 año”. Aí gente que

achou que eu tenho quarenta e dois año. Quanto me contratou Coritiba? Quanto contratou

o Grêmio? E Barcelona de Equador? E não segui jogando porque não quis jogar mais em

Barcelona de Equador. E o Grêmio, porque contratou Leão, eu não quero. Digo: le contrata

Leão, eu vou ser segundo arqueiro. Prefiro ir embora. Aí me fui para o Equador. Mas... E

todos os clubes que fui, fui titular e levantava o campeonato, nunca tive problema com

nada. E sempre... a hora de treinamento e todo.

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Transcrição

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F.H. – E era um grande time o Internacional também. Grandes jogadores. Você era

mais próximo de alguém ali? Do Rubem Minelli, o treinador?

H.A. – Lá, quando eu cheguei, estava Figueroa, que estava em Peñarol. E Rubem

Minelli era o treinador não? Eu chamava de maestri, porque...a confiança, o

respeito...entende? Eu dizia para ele: maestri, amanhã, temos que ganar essa partida no

interior. Campeonato gaúcho. O campeonato brasileiro. Disse: “Sim, Manga. Essa vitória é

muy importante”. E o time que nós tinha era muito importante. Tinha Escurinho, Paulo

Carpegiani, tinha Falcão, Batista, Caçapava. O resultado do campeonato brasileiro, nós

varria também, nós ganamos, varremos os dois, o bicampeonato, varremos, ganamos São

Paulo, ganamos o Fluminense no Maracanã, ganamos todo mundo. E graças a Deus... E foi

assim as palavras de mim ao treinador Minelli. E fomos campeões. Eu não sei se recorda aí

quando eu quebrei o dedo. E joguei com dois dedos quebrados, contra Cruzeiro.

F.H. - Quando foi isso?

H.A. – Eu quebrei o dedo segunda-feira, na semana.

C.B. – No treino?

H.A. – No treinamento. Não tinha treinador de goleiro. Eu fui... Tuc. Quebrou os

dois dedos. Esses dois acá17. E fui para o Hospital Menino de Deus. Chegou o doutor,

botou a mão na cabeça...”Que te passou?” A placa lá... Quebrado. Botou uma tala de...na

segunda-feira; na terça-feira, tem que botar o gesso. Botamos o gesso aqui. Digo: Doutor...

a que horas é a partida? – Disse: Às quatro da tarde. Disse: Você está fora. Me ao

treinamento na quarta-feira, com Rubem Minelli... “como está maestro”? Eu digo... “que

horas é a partida?” - “Às quatro da tarde”. – “Sim. Às duas da tarde estou por aí”. E fui

com uma piola aqui... A gente do Cruzeiro lá, estava o bombeiro jogando água, que estava

um calor danado. E o Cruzeiro contente, disse: não está Manga aí, vamos varrer. E eles

tinha Tostão, Batata, Nelinho, essa gente. Palhinha. Chegou Manga lá no camarinho, já

estava... não sei conhece Schneiz18, já cambiando para jogar. Aí olhei, e estavam os

dirigentes, um mirava para o outro, disse: puxa, Maguita fora. Então disse: “doutor, me

traga a tesoura”. Doutor trouxe a tesoura, disse que não queria, me cortou, sacou gesso. Os 17 Entrevistado indica os dedos aos quais se refere. 18 Mais próximo do que foi possível ouvir e grafar.

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Transcrição

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dois dedos estava muy gordo. Estava roxo. Doutor deu uma injeçãozita, aí botou algodão,

gaze, algodão, gaze... Tu sabe, tu, para jogar, tem que firmar la sumula primeiro. “Não,

não, manda para o Cruzeiro”. E Cruzeiro mandava para cá, para saber se Manga jogava ou

não jogava. Aí o juiz ia novamente. Aí Cruzeiro firmou. Aí o meu dirigente Internacional,

eles botavam a roupa. Eu não podia amarrar sapato. Como podia? Com uma mão só. A

mão direita, hein. E aí, a camisita... e não tinha caneleira, não tinha faixa, nesse tempo.

Disse: “vamos na cancha”. E do ginásio, já estava vestido, tem que sair. Então, fizemos

uma rodita lá, gritamos olé, olé, olé... entramos na cancha. Eu sempre entro como primeiro

arqueiro. Entrei como último. E a gente dizia: joga Manga. E a gente de Cruzeiro me

mirava, para mim. Como está jogando com a mão quebrada? Tranqüilo. Aí começou a

partida. Bombardeio de todo lado, de Cruzeiro. E cada bola que eu pegava, me doía. Doía.

Chorava de dolor. E valente ali. Terminou primeiro tempo. Aí, “doutor, me doi muito”. O

doutor sacou gaze... tinha sangue! (risos) O dedo já lastimado, todo. E disse: “Vai entrar

em ginásio ahora?” Digo: “Não, não. Vamos cobrir novamente”. Aí cobriu, gaze, pedi que

apertasse mais, apertou... Se via a dolor, que estava gordo... de chute, não é. E Nelinho

pateava Joãozinho, essa gente... Figueroa fez um gol aos quinze minutos do segundo

tempo. Aí explodiu o Beira Rio. Aí foi quando o Cruzeiro... aí começou a atacar. Atacava

de todo lado. E Manga pegando. Subia no alto, pegava de todo lado. E graças a Deus fui

campeão, com dois dedos quebrados. (risos) Que é muy dificil, que um goleiro brasileiro

nesse tempo vai jogar assim. Agora, nesse tempo, não joga. E o ano em que eu joguei,

1974,1975, 1976, com distensão, com todo. E nunca quebrei perna nem braço, só o dedo. E

o dedo... e sem luva, sem nada.

F.H. – Nenhuma contusão muito longa você teve? Não ficou muito tempo parado

assim?

H.A. – Sim, sim. E eu acho que a consideração que tinha com a torcida, o respeito,

que é bom, e por isso que eu estou aqui ainda, com...vivo ainda. Porque me cuidava

mucho, e sempre estou cuidando, com minha senhora junto. Estamos juntos e recebendo

todo... e a gente que chama a viaje... E eu, como me cumprimentam, venho, mas tenho

procurador, que é o advogado, também, que estamos junto. E nunca temos problema com

nada. Tive a alegria a voltar, depois de cinqüenta año, em São Paulo.

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Transcrição

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F.H. – Manga, no Inter, você falou, vocês varreram tudo, ganharam tudo. E por que

que vem a saída do Internacional? Por que você vai sair do Internacional? Que momento é

esse?

H.A. – Primeira coisa, eu tinha... Eu trabalhei em Barcelona de Equador. Eu estava

em Miami, de Miami vim para Equador, fui contratado em seguida, rápido, como treinador

de goleiro. Trabajei um año. Você sabe que, quando termina um contrato, em janeiro, aí

começa a chamar. Primeiro chama o jogador, depois chama o corpo técnico. Não me gusta

estar esperando mucho. Então eu disse a minha senhora que vamos manter uma escolinha

de goleiro, para ver se...se vamos... vai acontecer. E tinha uma cancha de um clube, que

tinha dez canchas, dez campos. E aí me deu a oportunidade, me deu a oficina, teléfo..., me

deu a cancha, qualquer cancha, eu podia treinar. E nós ia de mañana registrar os

muchachos. Tinha uma gente que fazia todo isto. E no fim, em vinte e três de fevereiro foi

a inauguração da escolinha de Manga. Conhecimento em Equador. A foto maravilhosa, e

apareceu quarenta arqueiro nesse dia. Quarenta. A televisão acompanhava todo o

treinamento, os periódicos. E quando eu vi os arqueiros eu digo: puxa vida! E todo

vestidito, com guante19 , eu digo está bem, vamos treinar. E dando uma charla20 de dois

minuto, um calentamento, e aí vamos treinar no arco. Aí comecei fazer meu trabajo com

eles. E foi aprovado a escola de Manga em Equador.

F.H. – No equador, depois que você tinha parado já?

H.A. – É, tinha parado. Porque apareceu Internacional, que ia jogar a Copa, jogar

com Emelec e jogar com Deportivo de Quito. E tinha que fazer uma homenagem, no hotel,

com Manga. Almoçamos com o presidente, eu e minha senhora, com os dois diretivos do

clube, e me invitaram, se queria vim a Porto Alegre, eu disse que sim. E tinha oportunidade

de trabajar com os goleiros menores. A mim, não me disse nada o presidente. Não

respondeu. Não disse nada. Disse que Manga era fenômeno, não gostava de barreira...

Contente. Depois tinha voltar, novamente, ao Equador, jogar com o Emelec. Aí uma

chamada de Porto Alegre, que tinha um contrato com Manga, Internacional. Então

almoçamos com o presidente, conversamos e aceitamos a proposta do clube. Ele fez a dele,

eu fiz a minha proposta. Me fui a Porto Alegre e fiz meu trabajo que... a trabajar com a

19 Luvas. 20 Papo.

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Transcrição

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categoria da base, que é importante, e depois ir trabajar também com o Consulado21

Internacional. Que é importante. Era meu trabajo, que tinha com Internacional. Eu viajava

com minha senhora junto em todo lado. Quarenta ou cinqüenta viagem por año. Eu acho

que era muito importante. Ia com o transporte de Internacional, como trinta pessoas, por aí,

dirigente também. Eu acho que... Para conseguir sócio, que é importante. Eu acho que foi

uma alegria para mim a voltar, depois de trinta año que eu passei em Equador. E torcida do

Internacional me recebeu bem. Eu acho que depois que eu fui, agora, saí, pedi para sair do

Internacional, não quis jogar mais, segui entende? E voltar novamente... que meu segundo

país é o Equador, um país que me trata muy bien, eu le quiero mucho. E vou voltar. Se

Deus quiera, no trinta e um, nós estamos já de volta em Equador.

F.H. – Que bom. Manga, mas, antes dessa passagem no Equador, você jogou no

Coritiba, no Grêmio e no Operário?

H.A. – Aí, primeiro, de Internacional eu fui para Operário, em Campo Grande. Daí

me fui a Curitiba. Ao Grêmio, de Porto Alegre, e Barcelona, de Equador.

F.H. – E como foi jogar no Grêmio depois de ter sido um ídolo no Internacional?

Teve alguma...

H.A. – Você sabe que é tão difícil. Tu sabe que quando tu joga num clube há quatro

año, já estava acostumado com essa gente. E depois, me sai de Internacional e me fui a

Campo Grande, a Curitiba. Depois veio um empresário, disse: “Manga, eu vim te

contratar”. Eu, como profissional, eu tenho que aceitar. Então eu fico desempregado. Se eu

não aceito, eu fico desempregado. Então recebi a oportunidade de voltar a Porto Alegre e

jogar pelo Grêmio. Mesmo assim, eu fui bem recebido por Internacional, jogando contra

Internacional. O carinho que eles teve comigo, até hoy. E fui campeão pelo Grêmio. E

derrotamos o Internacional. E voltei ao Internacional, e a gente me apoiou mucho. Eu sou

um profissional. Eu acho que [inaudível] está a profissão. Você aqui está na televisão, se a

outra televisão convida, você tem que ir. Disse: “vou pensar cinco vezes”, aí vai me pagar

mais ou menos, eu me vou. Entende? E esse eu tenho... E todo jogador que tem a sua

profissão tem que ir entende? Eu joguei dez anos em Botafogo. Então disse, dez anos em

Botafogo, tem que ficar toda vida? Não. Fui para Nacional de Montevidéu. Joguei seis

21 Mais próximo do que foi possível ouvir.

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anos em Montevidéu. E tem que ficar toda a vida aí? Então vou para outro lado. Não que

eles mandaram embora. Nenhum clube que eu fui jogador como arqueiro nunca me

mandaram. Eu sempre estava em primeiro lugar, titular e campeão, todo año. Quando

contratam um arqueiro, que dizem não, contratar fulano, vai ser titular, então prefiro seguir

para outro lado.

F.H. – Manga, como foi sua caminhada para o fim da carreira? Porque vários

jogadores que a gente entrevista falam da dificuldade de se parar de jogar futebol. Porque

você faz isso desde os quinze anos e até os quarenta e cinco.

H.A. – Eu, desde que me retirei do futebol, eu sempre segui trabajando na cancha.

Eu trabajei em Miami seis año. Eu tinha uma escola de arqueiro em Miami. Em Equador,

trabajei em Emelec e Deportivo de Quito. E [inaudível] em Barcelona. Todo tempo que eu

estou, até hoy, eu estou na cancha. Não fiquei parado nem sem trabajo. E sempre está na

cancha, trabajando toda a vida. Em Internacional, eu estava com a base de arqueiro.

Trabajei quase dois año. E tenho...agora, estoy por acá, vou seguir em Equador, já como

tenho agora carnê de treinador, e tenho a oportunidade, amostrar meu trabajo, como o

conhecimento. Isso é importante.

C.B. – Manga, a gente está aqui conversando, você ainda não explicou o porquê do

seu apelido. Quem que deu esse apelido – Manga? Desde criança?

H.A. – Sim. Em primeiro lugar, você sabe, Sport Clube de Recife tinha uma cancha

de treinamento, em Recife, e aí tinha esse... mangueira, que estava ao redor da cancha,

mais ou menos vinte metros; e a gente que ia assistir o treinamento nesse tempo... E o

mango caía, o mango maduro. Então, eles não tinha meio de passar, porque o muro... tinha

segurança. E ali chegou, disse: “oi, me dê um mango”. Eu via lá, jogava um mango para

ele. “Oi! Me dê esse mango. Mango!” Aí o apelido de Manga, surgiu das criaturas que foi

para pedir, no treinamento que estava, porque tinha muito galho de manga, de manhã, com

o vento, caía muito mango maduro. E o muchacho disse: mango, mango... Então, pegou o

apelido. Até hoy, nadie chama Hailton, me chama Manga.

F.H – Ninguém te chama de...

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H.A. - No mundo inteiro. Ninguém sabe. Manga. É em Uruguai, é em Peru, em la

Argentina... Nadie é Hailton. É Manga. Quem me diz aqui que é Hailton? Vem um

torcedor... Manga. Qualquer lado que eu vou. E assim...Para mim é importante. E todo

jogador que não tem um nome, aí, eu não posso dizer aí, porque... mas... E a mim, minha

qualidade... Manga. Eu... muy contente, porque me saí bem. É conhecido mundial aí que é

Manga, não é Hailton. Hailton está na FIFA, na seleção. Tu vai a Internacional, pergunta –

Hailton... hay um goleiro brasileiro, Manga, todo mundo sabe. A Uruguai, vai a Uruguai

diz, quem é Hailton? Não sabe. Mas Manga... Ah, é ele mesmo. É um conhecimento muy

grande. Mas com o nome de Haílton, não.

F.H. – Manga, você acompanha, como você falou, você está tentando, está a busca

de voltar a ser treinador, quer ser treinador e tudo mais, o goleiro na atualidade, o que

mudou, para a sua época, assim?

H.A. – Eu acho que tanto año que eu joguei... Eu vejo o campeonato brasileiro,

campeonato paulista, no momento que tenho oportunidade de ver, e os arqueiros está

aprendendo mucho, já sabe dominar a pequena área e a grande. Eu acho que o que tem dos

arqueiros... eu não sei, não ofendendo a eles, nem quero ofender, mas o arqueiro, ele tem

que gritar os noventa minuto e estar dirigindo a primeira área e a segunda, porque ele é o

último homem, e o goleiro tem que jogar na cinco e cinqüenta. E tem arqueiro que está

muy plantado dentro do gol. Ele tem que sempre estar atento os laterais, o esquerdo, lateral

direito, a defesa. Não importa que a torcida grita. A mim, sempre gritou que eu estava

nervoso. “Mas é muito nervoso”. Porque gritava noventa minuto.

F.H. – Saía rouco.

H.A. – Vai que seja Figueroa. Não. Vai que veja Falcão. Não. Eu mandava...

barreira...não...Criar barreira? Eu digo não. Saia. Porque eu tinha confiança em mim. E tem

arqueiro que não tem confiança. Está tomando gol muy lero, muy longe. O goleiro que tem

confiança deixa aberto. Vê muito mejor. E dá dois passos na frente, a goleira fica chiquita.

Se tu dá para trás, abre. Então tem arqueiro...Não são todos arqueiros brasileiros. Tem

arqueiro que se fica dentro do gol, demora a sair. Se tu tem um atacante que está

disputando com defesa, o arqueiro está saindo para quê? Tu choca os três. Primeiro tu tem

que ver que defesa está com ele. Ou senão, quando um atacante está solito, tem que encarar

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mais rápido, não esperar que vai driblar. Tu vai encarar, chocar com ele. Esse era meu...

quando era arqueiro, goleiro. E eu vejo, pelo campeonato brasileiro, campeonato paulista,

campeonato carioca, que hay muito goleiro que demora a sair. Dá muito punho. Sabe o que

é punho? Se tu dá um punho, tu tem que pegar la pelota. Se hay bola lá no alto eu me

agarro, porque é mais fácil. Então é eso. Falta mais a segurança entende? Hay muito bom

goleiro em Brasil, mucho, mucho. Mas tem que sair mais, gritar, dirigir a primeira área e a

segunda. Gritar com lateral, marca ali, marca aqui. E não jogar, perder partida boba,

ganando partida. O arqueiro não se concentra. Muita partida que le vejo, ganando, o

resultado... dois gols, não le diga nada – dois gols, e perde a partida, empata a partida.

Entende?

F.H. – Entendi.

H.A. – Você está ganhando de 2 a 0, você... Como? Bota a bola para fora aí e sigue,

sigue. Não. Quer jogar bonito, dá a bola em frente a área. Tu está... quando dá a espalda

para trás, já roubou. Os goleiros, já pega os goleiros dentro do arco. Não hay chance de

salir. E eu acho que o conhecimento, em córner, de falta... A mim, nunca me gustou

barreira. Uma barreira que eu le fiz, com Cruzeiro, que estava pertito, e fiz uma barreira.

Mas não... não queria. Cinco homens mais alto, tapar o primeiro palo, o baixito ali... com o

Cruzeiro. E Nelinho é um senhor que batia muy forte. E graças a Deus, você viu aí, no

lance aí, que sempre está atento. Porque tu está no arco sabendo que quando Nelinho pega

uma bola é muy perigoso. Ele batia de todo lado. E eu sempre estava atento. E pegava...eu

peguei todas de Nelinho, todas as pelotas. Todas. Com a mano, sem mano, todas eu

peguei. E quando fomos jogar em Belo Horizonte, 5 a 4, que perdemos lá, maravilhoso.

Tomei cinco gols. O último foi de penal. E assim. O goleiro tem que estar atento, tem que

ver quem batia forte, os atacantes, o mais rápido. Esse era o meu trabajo como arqueiro.

Eu aprendi mucho.

C.B. – Você lembra qual foi a defesa mais difícil que você fez?

H.A. – Sim. Hay duas defesas mais difícil. A primeira foi essa com a mano. Porque

quando estava ganando o Cruzeiro, 1 a 0... e foi um córner contra Internacional. Eu estava

no arco. E tinha dois jogadores de Cruzeiro que estava me acochando para não salir.

Quando o juiz apitou, que a bola partiu, eu sali e levantei os dois braços, me quedó um

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braço só, e a bola foi com a mano, se quedó. E eu não podia bajar porque, se eu bajo aqui,

ele rouba a pelota. Eu tenho que mirar de lado, os dois lados. Se não tem, eu segurei. Aí

está na fotografia, está em todo. E a outra, a segunda... A segunda foi essa da mão trocada,

que eu espalmei para trás. Depois vem a terceira, venenosa esta, que Nelinho bateu, que a

bola ia para cá, eu tive que virar o corpo, pegar do outro lado, quase quatro metros sem

soltar a bola. E depois uma bola de Palhinha, pegando já na linha. Fora o bombardeiro

antes que deu o Cruzeiro. E para mim foi maravilhosa.

F.H. – Foi seu maior jogo?

H.A. – Sim. E a outra, foi uma alegria tão grande... quando faz um gol de arco a arco.

Tu faz um gol que é oitenta e cinco metros e tiene onze jogadores. Eu chutei, lá no

Uruguai, me fiz um gol de arco a arco, de goleiro a goleiro. Uma satisfação muy grande.

Fica na história.

F.H. – Sim. Esse nem o Rogério fez.

H.A. – Sim. E acho que... acontece, mas é difícil. Para tu meter um gol de arco... um

goleiro bem coberto... Eu chutei bastante forte, ela cobriu a defesa e o goleiro. E a bola

estava entrando. E a gente gritando: Deixa! Não toque na... Aí... na história. A gente quer

abraçar Manga, e eu digo: que passó? – Um gol de arco a arco. E nesse dia foi uma festa

no vestiário. E compraram uma torta, no treinamento...(risos) Pela alegria. Uma satisfação

muy grande, porque... aconteceu. E Nacional ficou mais alegre, porque aconteceu no time

dele, um arqueiro que ele contratou.

F.H. – Manga, você também era um grande defensor de pênaltis. Você pegava

muitos pênaltis?

H.A. – Sim. Pegava e levava. (risos) Sim. Eu le peguei um pênalti de Peru, como em

1971, porque...Estava na quarta final. Estava Palmeiras, LAU, de Lima, e Nacional

Montevidéu. Esse grupo de três. O que ganasse ia para a final com Estudiantes. Então

Palmeiras jogou primeira partida em Peru, ganou de 2 a 0. Você deve conhecer Anchieta.

F.H. – Anchieta. Ponta.

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H.A. – Jogou no Grêmio. Jogava comigo. Então Nacional tinha que jogar com o

LAU e Palmeiras, em São Paulo. Empatamos. Lá estava 0 a 0. Aos quarenta minuto do

segundo tempo, Anchieta pegou a bola com a mano. Aí foi penal. Então...sessenta, setenta

mil pessoas, os peruanos lá... me fui...Eu sempre, quando... sempre abro as pernas. Quando

boleia assim, defendi com as pernas, e a bola se foi. E aí terminou. E aí veio a televisão,

“como atacou a pelota”... eu digo: “eu não sei. Eu estendi a perna. E foi, defendi o penal”.

E dali... Não era três pontos, era dois pontos e um ponto. Aí fomos jogar com o Palmeiras.

Você conhece o Luis Artime, o argentino. Jogou no Fluminense. Metemos 3 a 0 em

Palmeiras. Aqui, 3 a 0 em Palmeiras. E fizemos três pontos. E tem que jogar com LAU, em

Peru, em casa, e Palmeiras. Palmeiras vai, ganha do LAU aqui. Fez quatro ponto. Tem que

jogar LAU com Nacional. Ganamos. Fizemos cinco pontos. A final, Palmeiras e Nacional.

Metemos 3 a 1 no Uruguai. E classificamos. Foi à final com Estudiantes. Perdemos, em

Mar del Plata, 1 a 0. A segunda partida ganamos, 1 a 0. A terceira partida, campo neutro, aí

fomos jogar em Peru. E levamos bandeira, bandeirita, e entregamos pela cidade, oitenta

mil pessoas lá, muito argentino... Ah!(risos) Muito argentino. Tu sabe o argentino como é.

É uma torcida muy grande.

F.H. – Futebol, sua paixão.

H.A. – Sim. Aí jogava Bachamé, Madera, Bilao, esses jogadores muy famoso. Aí

começou a partida e... Ganamos, fomos campeão, 2 a 0. Choravam os argentinos. Me

deram patada em todo lado. Eu quando pegava a pelota, me davam... assim, me dava

patada... “levanta brasileiro!” E eu com a bolita... Nesse tempo, não tinha sete passo, sete

segundo. Eu pegava a pelota, levava lá na área e ficava mirando se vinha um argentino. O

juiz não dava a tarjeta amarilla. E pegava essa bola, metia para fora. Até chegar essa

pelota, o tempo passava. Fazia a defesa, metia fora. E ganamos, 2 a 0, fomos campeão.

F.H. – Bom. Agora, você está na carreira de treinador, você vai começar, está

procurando algum time para começar a treinar?

H.A. – Não. Eu tenho carnê de treinador já faz, mais ou menos, uns seis meses, por

aí. Graças a Deus, o conhecimento que tenho...Tanto que eu fui contratado nas equipes

equatoriano, que era corpo técnico do clube, sempre estava na charla22. E eu sei que o

22 Papo.

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conhecimento... tanto año que fui goleiro, que fui jogador, e um conhecimento muy grande

que tenho, tive um carnê de treinador. Estou muy contente. E aí... Entende? Vai ver o valor

que tem esse carnê de treinador, de amostrar a qualidade e... Isso é importante.

F.H. – Tem uma questão que é que muitos goleiros se tornam treinadores. Grande

parte. Acha que tem algum motivo especial para isso?

H.A. – Como?

F.H. – Grande parte dos goleiros se tornam treinadores de futebol

H.A. – Claro.

F.H. – Tem algum motivo especial, você acha?

H.A. – Bom. Porque... que le gusta. Já não quer treinar arqueiro, disse eu quero ser

agora treinador de primeira, ou um time de segunda, para depois subir para a primeira.

Entende? Eu acho... Hay muito treinador de goleiro que tem aí, não só de goleiro, também

é atacante, entende? E são mais inteligente, porque jogou tanto año e sabe o que aconteceu

dentro da cancha, entende? E hay muito treinador que não foi jogador. E aí...Muitos que

está aqui nesse país, aqui, são jogador de futból, já sabem, o conhecimento na cancha,

aonde está o lado mais fraco, o lado mais difícil, entende? Por isso que... me gostaria. E aí,

vamos ver o tempo para mais adiante.

F.H. – Manga, para encerrar, a gente tem feito uma pergunta a todos os jogadores

que a gente está entrevistando, que é sobre a Copa de 2014, que o Brasil vem a sediar

daqui a dois anos. O que eu queria saber são duas coisas. A primeira, sua expectativa para

o futebol da seleção, o time do Brasil, e a outra é a questão da organização, do país se

preparar para o evento.

H.A. – Eu acho que... você sabe, quando a Copa do Mundo... vai fazer no Brasil... no

mundo... um país tão grande como o Brasil, tem duzentos millones, tem capacidade de

fazer uma seleção do mundo. Ainda mais, fazer a seleção, e tem aqui os valores, que vai

ver o europeu quem é o jogador brasileiro... um país muy grande, que tem que fazer vinte

seleção. Eu acho que Brasil tem capacidade de fazer a Copa do Mundo nesse país, um país

maravilhoso. Ainda mais, acho que uma oportunidade que teve em 1934 e 1950, e agora

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vai ter em 2014, aqui em Brasil. Eu acho que...hay três años, dois años. Espero que termine

mais rápido, para começar a Copa do Mundo. E essa gente, europeu, que vem para cá, vai

ficar contente, ver o Brasil mais avançado, um Brasil que tem capacidade de trazer esse

europeu, e está na sua casa, segunda casa, que é sua segunda família, assistir a uma copa

do mundo, que vai ser muy bonito, e ver ainda mais os brasileiros, que são muy contente, o

brasileiro alegre, o brasileiro que vai ter muy respeito e o carinho com essa gente que vai

apresentar sua delegação que vem para Brasil.

F.H. – Obrigado.

H.A. – Nada.

F.H. – Bom. Então é isso. Muito obrigado. A gente agradece muito.

H.A. – Eu agradeço essa oportunidade aqui em São Paulo, pela periodista, sempre

está dando atenção a minha senhora e ao advogado, que estamos sempre junto, e agradecer

a outra oportunidade, outro momento de estar presente aqui com vocês, sabendo que tem

muito carinho, aqui, nessa gente, porque sempre...Manguita sempre jogou aqui em São

Paulo, ganando ou perdendo, a cara era igual, e sempre saía feliz, porque... ganando, tu vai

contente, quando perde, cabeça baixa, mas, de qualquer maneira, sempre saía contente

aonde jogava, no Rio, em São Paulo, Bahia, todo lado, e estava feliz, porque sempre estava

presente nas partidas.

F.H. – Obrigado. Acho que é isso.

M. – Nada mais?

[FINAL DO DEPOIMENTO]