Haydée Ribiero - Espacio Biográfico y Biblioteca Darcy Ribeiro

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A BIBLIOTECA DE DARCY RIBEIRO,“ESPAÇO BIOGRÁFICO” E A INTERLOCUÇÃOLATINO-AMERICANA

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  • Outros Espelhos:Dirio, Correspondncia, Biblioteca

    AA

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    A BIBLIOTECA DE DARCY RIBEIRO,ESPAO BIOGRFICO E A INTERLOCUO

    LATINO-AMERICANA1

    Hayde Ribeiro Coelho*Universidade Federal de Minas Gerais / CNPq

    RRRRR E S U M OE S U M OE S U M OE S U M OE S U M OO trnsito intelectual dos escritores latino-americanos noexlio implica uma reflexo terica sobre as relaes entrebiblioteca e espao biogrfico. Para o desenvolvimento destetrabalho, tomarei como ponto de partida algumas consideraestericas sobre a biblioteca e sua interface biogrfica. Emseguida, refletirei sobre a Biblioteca de Darcy Ribeiro no que serefere ao exlio e ao ps-exlio. Evidentemente que Darcy Ribeirono se descuidou do registro de sua memria no exlio pela AmricaLatina, como se pode verificar em seus livros autobiogrficos.Mesmo assim, meu olhar sobre sua biblioteca pretendeevidenciar outros aspectos ainda no estudados pela crtica.Para o desenvolvimento do texto, depois de mostrar a relaoentre biblioteca e espao biogrfico, situo o dilogo de DarcyRibeiro com a Amrica Latina e focalizo os Cuadernos de Culturalatinoamericana encontrados na Biblioteca de Darcy Ribeiro.

    PPPPP A L A V R A SA L A V R A SA L A V R A SA L A V R A SA L A V R A S ----- C H A V EC H A V EC H A V EC H A V EC H A V EDarcy Ribeiro, espao biogrfico, interlocuo

    latino-americana

    BBBBBIBLIOTECAIBLIOTECAIBLIOTECAIBLIOTECAIBLIOTECA EEEEE ESPESPESPESPESPAOAOAOAOAO BIOGRFICOBIOGRFICOBIOGRFICOBIOGRFICOBIOGRFICO

    O trnsito intelectual dos escritores latino-americanos no exlio implica umareflexo terica sobre as relaes entre biblioteca e espao biogrfico.2 Dentre asvrias possibilidades tericas existentes, os artigos de Tel Ancona Lpez (A criao

    * [email protected] Este texto foi originalmente apresentado no CIELLI, Colquio Internacional de Estudos Lingusticos eLiterrios, 11 de junho de 2010, com o ttulo Percurso intelectual e espao biogrfico: a Biblioteca deDarcy Ribeiro. Mantido indito, foi reapresentado na ANPOLL, com o ttulo A Biblioteca de DarcyRibeiro, espao biogrfico e a interlocuo latino-americana, 2 de julho de 2010. verso apresentadaforam feitos alguns acrscimos como a traduo de fragmentos do espanhol para o portugus. O textopertence pesquisa que desenvolvo atualmente no CNPq.2 Utilizo essa expresso segundo Leonor Arfuch. Cf. ARFUCH. El espacio biogrfico. Mapa del territorio,p. 33-66.

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    literria na biblioteca do escritor)3 e de Eneida Maria de Souza, (A biografia, um bemde arquivo),4 elucidam algumas das questes relativas ao percurso intelectual de DarcyRibeiro e sua biblioteca. No primeiro artigo, a autora (Tel Ancona) mostra que asbibliotecas so de capital interesse pela contribuio historia da leitura e gnesedas obras. As bibliotecas podem ser conservadas no seio de arquivos completos. Aosalientar a organizao das estantes e prateleiras, ressalta a importncia das dedicatrias,presentes nos livros, oferecendo informaes da biografia a quem estas se enderearam(...). Neste contexto aludido, o campo cultural pode ser recuperado. As cartas, crnicas,dirios, como salienta Tel Ancona Lpez, trazem contribuies tanto para o estudo dabiografia do escritor quanto para a abordagem dos aspectos relacionados vida literriae cultural do escritor.

    Eneida Maria de Souza aborda a relao entre a crtica gentica e a biografia,evidenciando como esse enfoque propicia transcender o estudo imanentista e oapagamento da figura do autor que pode ser flagrada pelos resduos e pelos traos. Oesboo da biografia intelectual adviria do vasto material contido nos acervos como acorrespondncia, os depoimentos, as iconografias, as entrevistas, os documentos denatureza privada e da biblioteca.

    Tratar da Biblioteca de Darcy Ribeiro, tomando-a como totalidade, tarefa impossvel.Este impedimento decorre do carter rizomtico e labirintco de toda biblioteca. Nestadireo, o que se apresentar aqui diz respeito a um momento da vida de Darcy Ribeiroentre exlio e ps-exlio, o que propiciou ao autor de Mara (1976) construir elos decomunicao com vrios intelectuais da Amrica Hispnica, o que pode ser constatadopor suas publicaes, pelo envio de livros a Darcy Ribeiro de autores pertencentes svrias reas do saber, em sua correspondncia e em sua biblioteca, objeto especficodeste trabalho.

    Darcy Ribeiro ficou exilado no Uruguai entre 1964-1968. Depois de voltar doprimeiro exlio, 30 de setembro de 1968, foi preso no dia 13 de dezembro do mesmo anopor ocasio do Ato Institucional n. 5. No segundo exlio, participou de vrias atividadesintelectuais, em diversos pases da Amrica Latina: Venezuela, Chile e Peru (pasesque o escritor considera como segundo exlio). O terceiro exlio foi o do retorno aoPeru, depois de operado e salvo do cncer pulmonar.5 Em 1976, volta ao Brasil e se fixano Rio de Janeiro.

    O dilogo entre o eminente crtico ngel Rama e Darcy Ribeiro comea noUruguai, onde o antroplogo brasileiro esteve exilado em decorrncia do golpe militar,ocorrido em 1964 no Brasil. Nessa poca, no Brasil, Darcy Ribeiro era chefe da CasaCivil, no governo de Joo Goulart, deposto pelos militares.

    3 LPEZ. A criao literria na biblioteca do escritor.4 SOUZA. A biografia um bem de arquivo.5 RIBEIRO. Confisses, p. 445.

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    SSSSSITUANDOITUANDOITUANDOITUANDOITUANDO OOOOO DILOGODILOGODILOGODILOGODILOGO DEDEDEDEDE DARCYDARCYDARCYDARCYDARCY RIBEIRORIBEIRORIBEIRORIBEIRORIBEIRO COMCOMCOMCOMCOM AAAAA AMRICAAMRICAAMRICAAMRICAAMRICA LATINALATINALATINALATINALATINA

    Antes de ir ao Uruguai fazer minha pesquisa (Ps-Doutorado) sobre o exlio deDarcy Ribeiro, ainda no Brasil, percebi que havia fortes indcios que acenavam para odilogo entre o escritor uruguaio e o antroplogo brasileiro: a dedicatria da Transculturacinnarrativa en Amrica Latina (a Darcy Ribeiro y John V. Murra, antroplogos de NuestraAmrica); a meno obra do autor brasileiro no interior do livro sobre a transculturao;a comparao entre cronologias dos dois intelectuais e a referncia de Darcy Ribeiro,em Confisses, aos escritores ngel Rama, Eduardo Galeano e ao semanrio Marcha.Recortes do jornal j mencionado, encontrados entre documentos de Darcy Ribeirofuncionaram como vestgios para minha busca.

    Quando tive certeza do dilogo entre os dois intelectuais, Darcy falecera em1997 e, apesar de ter tido a oportunidade de lhe fazer uma longa entrevista, publicadasob a forma de depoimento,6 no lhe pedi, infelizmente, para que ele me falasse sobre oexlio, ngel Rama e os intelectuais com quem dialogou de forma mais prxima.

    No Uruguai, ao consultar o semanrio Marcha, tive uma grande surpresa. Em 24de maio de 1964, Darcy Ribeiro concede uma entrevista a ngel Rama que apresenta opercurso do intelectual brasileiro ao pblico uruguaio. Ao perguntar ao antroplogo sobrea nova gerao brasileira, so mencionados: Srgio Buarque de Holanda; Florestan Fernandes;Lus Costa Pinto; Victor Leal, Antonio Candido, Heron Alencar e Helcio Martins.7

    Como exilado, Darcy comeava seu destino de errncia, mas tambm deconhecimento da Amrica Latina, apoiado por seus amigos uruguaios, pelas vriasqualidades de ngel Rama: inteligncia, esprito integrador, abertura para o outro,crtica tica e poltica. Acredito que o acolhimento que Darcy Ribeiro teve no Uruguaipropiciou trocas culturais importantes e definitivas. Se Rama pode afirmar que o Uruguaimade me, parodiando Grahan Greene,8 Darcy pode dizer que sua trajetria de latino-americano ocorre no exlio.

    A propsito da relao entre Biblioteca e interlocuo latino-americana e o Brasil,no demais lembrar a referncia tambm importncia que a biblioteca de Monteviduteve para a elaborao de O povo brasileiro. A formao e o sentido do Brasil:

    Na verdade, para escrev-lo, mal compulsei os livros resultantes daquelas pesquisas, quechegaram a ser publicados. Ele foi feito da leitura de quanto texto me caiu nas mos sobreo Brasil e a Amrica Latina. Muitssimos, lembro-me bem, graas magnfica bibliotecaMunicipal de Montevidu.9

    Sem passar pelo Uruguai, Darcy no teria conhecido ngel Rama e, sem o amigo uruguaio,possivelmente, no teria participado de vrias atividades coletivas como: elaborao de

    6 COELHO. Darcy Ribeiro, p. 37-60.7 Veja-se a publicao desta entrevista em COELHO. Amrica Latina como alteridad: memorias de uncampo identitario, p. 185-190. Esta mesma entrevista est traduzida no artigo de COELHO. A culturana perspectiva de Darcy Ribeiro e ngel Rama, p. 165-183.8 Cf. PEYROU. ngel Rama, p. 8.9 RIBEIRO. O povo brasileiro: a formao e o sentido do Brasil, p. 13.

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    um captulo de Cuadernos de Marcha, cuja organizao foi do crtico uruguaio;planejamento da Enciclopedia Uruguaya e colaborao na Biblioteca Ayacucho.10

    A confluncia entre posies polticas semelhantes aproximou os dois intelectuaisno mbito das discusses sobre a cultura, sobre o papel do intelectual e a respeito dapoltica cultural autnoma para a Amrica Latina. Alguns desses aspectos foram tratadospor ngel Rama em Marcha e por ambos em um seminrio que considero seminal para acompreenso de parte do dilogo terico entre os dois intelectuais, voltados para areflexo sobre a Amrica Latina.11 Este seminrio foi realizado entre 26 e 30 de marode 1968, na Universidad de la Repblica, promovido pelo Centro de EstudiosLatinoamericanos. Todas as questes tratadas no seminrio esto presentes nas obrasdos dois escritores. O papel do intelectual, por exemplo, reaparece na obra de ambos deforma ampliada e retomada em novos contextos.

    A partir da Transculturacin narrativa en Amrica latina, abrem-se outros caminhosque permitem focalizar o compartilhamento de textos e ideias entre o escritor uruguaioe brasileiro, tendo em vista os campos literrio e cultural. No mbito do dilogo entrengel Rama e Darcy Ribeiro, publiquei vrios textos como: A cultura na perspectivade Darcy Ribeiro e ngel Rama; Darcy Ribeiro, ngel Rama exlio: rumo identidadesupranacional e ngel Rama y Darcy Ribeiro: compartiendo la amistad, los textos y elexilio. No segundo texto, na ordem mencionada, parti do livro Confisses, de DarcyRibeiro e o Diario, de ngel Rama, tendo em vista o registro do exlio sob a perspectivados dois intelectuais. Em ngel Rama y Darcy Ribeiro: compartiendo la amistad, lostextos y el exilio, recuperei o dilogo dos dois intelectuais no Uruguai e mostrei comoo conceito de transculturao narrativa podia ser lido no s a partir de Mara comotambm em O mulo, outro romance de Darcy Ribeiro.

    Revisito este percurso para enfatizar que o antroplogo brasileiro manteve umdilogo profcuo com ngel Rama, indo alm do Uruguai. Na Venezuela, os vnculosafetivos e intelectuais so reforados. ngel Rama, como Diretor Literrio da BibliotecaAyacucho, exilado naquele pas, convida Darcy Ribeiro para elaborar o prefcio deCasa-grande & senzala, encarregando-o, juntamente com Antonio Candido, de selecionaras obras brasileiras que iriam integrar a Biblioteca Ayacucho. Mesmo depois da mortede ngel Rama, o autor de Mara continuar colaborando com a Coleo da BibliotecaAyacucho, como se verifica pela publicao de a Fundao do Brasil. Testemunhos (1500-1700), livro organizado por ele e por Carlos Moreira Neto, 1992.

    Ao encontrar o livro Transculturacin narrativa, dedicado a Darcy Ribeiro e a JohnMurra, na biblioteca do antroplogo brasileiro, pude verificar como h uma dedicatriaque se justape primeira. A escritura sobre a escritura bastante significativa. Estavaem Paris e, em maio de 1983, escreve: Para Darcy, maestro de vida, que es lo importante,um abrazo fraterno de ngel Rama. Mais do que um antroplogo da Nossa Amrica,Darcy era um mestre da vida. Este aspecto suplanta todos os laos profissionais, criando

    10 A propsito da participao do Brasil na Biblioteca Ayacucho, veja-se o texto de COELHO. O Brasilna Biblioteca Ayacucho: vertente literria e cultural, p. 85-103.11 A respeito desta questo, conferir COELHO. Amrica Latina como alteridad: memorias de un campoidentitario, p. 299-311.

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    elos viscerais e intransferveis. No s esse o livro de ngel Rama encontrado naBiblioteca de Darcy Ribeiro. Em carta de ngel Rama para Darcy Ribeiro, enviada deWashington, datada de 6 de maro de 1981,12 o crtico uruguaio pede ao antroplogobrasileiro um texto para inclui-lo em uma antologia do pensamento latino-americanodo sculo XX, organizada a pedido dos alemes que, no ano de 1982, desejariam dedicarateno especial Amrica Latina. Nas palavras de ngel Rama, o sculo do pensamentocomearia por Mart e seria concludo, de forma destacada, com o estudo de DarcyRibeiro. Este livro, mencionado na bibliografia de ngel Rama13 como Der Lange KampfLateinamerikas, realmente publica vrios autores latino-americanos entre os quais seinclui o antroplogo brasileiro com o captulo Kulturelle Keatvitt (1978).14 Na cartaa que me referi (6 de maro de 1981), ngel Rama fazia aluso possibilidade deutilizar um ensaio de Darcy publicado na Universidade do Mxico, v. 26, n. 6-7, fev. de1972, apresentado em um colquio organizado por Leopoldo Zea.

    Outros intelectuais, alm de ngel Rama, comungaram com Darcy Ribeiro aideia de integrao latino-americana. Leopoldo Zea, Roberto Fernndez Retamar, PabloGonzlez Casanova so alguns destes autores. A interlocuo entre eles, com exceode Pedro Gonzlez, foi evidenciada em meu texto A recepo crtica de Darcy Ribeirona Amrica Latina, mas a relao entre biblioteca e a biografia do escritor no foiestudada por mim no texto mencionado.

    A A A A A BIBLIOTECABIBLIOTECABIBLIOTECABIBLIOTECABIBLIOTECA DEDEDEDEDE DARCYDARCYDARCYDARCYDARCY RIBEIRORIBEIRORIBEIRORIBEIRORIBEIRO EEEEE OSOSOSOSOS CUADERNOSCUADERNOSCUADERNOSCUADERNOSCUADERNOS DEDEDEDEDE CULCULCULCULCULTURATURATURATURATURA LALALALALATINOAMERICANATINOAMERICANATINOAMERICANATINOAMERICANATINOAMERICANA

    Da vasta biblioteca do escritor brasileiro destaco os Cuadernos de Culturalatinoamericana que eram publicaes avulsas destinadas a professores e alunos comtextos centrales de la historia y la cultura latinoamericanas. Conforme Leopoldo Zea,esses cadernos foram publicados sob o patrocnio da UNAM e reeditados em dois tomos.Depois, reaparecem em 1993, em trs volumes pela Fondo de Cultura Econmica. Umdos princpios que norteou essa publicao pode ser observado no seguinte fragmento:

    Textos clssicos daqueles que se empenharam em fazer expressa a identidade dessesnossos povos e, a partir da tomada de conscincia dessa identidade, lutaram por atingirsua libertao frente s dependncias que afetavam essa identidade e colocavam emdvida a relao de igualdade de seus homens com outros homens e com isso seu direito autodeterminao como povos entre povos.15

    12 Cf. RAMA. Correspondncia de ngel Rama para Darcy Ribeiro. 6 de maro de 1981 (FundaoDarcy Ribeiro).13 Cf. RAMA. La crtica de la cultura en Amrica Latina, p. 400.14 Agradeo professora Myriam vila que traduziu o ttulo da obra organizada por ngel Rama (Alonga luta da Amrica Latina) e o nome do captulo da autoria de Darcy Ribeiro (Criatividade cultural).15 Veja-se a traduo do texto: Textos clsicos de quienes se empearon en hacer expresa la identidadde estos nuestros pueblos y, a partir de la toma de conciencia de esta identidad, lucharon por alcanzarsu liberacin, frente a unas pendencias que afectaban esa identidad al poner en duda la relacin deigualdad de sus hombres con otros hombres e con ellos su derecho a la autodeterminacin como pueblosentre pueblos. (ZEA. Fuentes de la cultura latinoamericana, p. 15.)

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    Os Cuadernos, a que tive acesso, traziam uma apresentao, contendo indicaesbibliogrficas sobre o escritor e sobre o texto a ser lido. A origem dos mesmos tambmera evidenciada, o que possibilita hoje ao leitor confrontar os textos dos autores, levandoem considerao aqueles que lhes antecedem e lhes do continuidade, sendo projetadospara o futuro.

    Leopoldo Zea publica dois desses cadernos. O primeiro deles, intitulado AmricaLatina largo viaje hacia si misma, v. 18, 20 novembro de 1978, apareceu na Revista ElCorreo de la UNESCO, setembro-outubro 1977. Nesse texto, o autor salienta que aconscincia de pertencer a dois mundos trar para os latinoamericanos a necessidadede construo de uma Filosofia da Histria que quase antagnica Filosofia europeia.A histria do pensamento latinoamericano ser marcada pela oscilao entre o desejo eabsoro da cultura europeia (Domingo F Sarmiento, Jos Mara Luis Mora e FranciscoBilbao) e a discusso crtica dessa complexidade a que se filia o prprio texto de LeopoldoZea. O filsofo mexicano vai recuperando a tradio crtica que se mostra em Bolvar,Jos Enrique Rod e Jos Mart.

    Em outro caderno, cujos temas foram a negritude e o indigenismo, Leopoldo Zeamostra como o colonizador e o conquistador, com base na ideia de superioridade raciale cultural, justificaram o direito dominao. A negritude e o indigenismo, focalizadoscomo bandeiras de reivindicao do homem na frica e na Amrica Latina, osurgimento daqueles conceitos e o que representaram em termos de avanos tericos epolticos so recuperados no texto do filsofo mexicano. Originalmente, o texto deLeopoldo Zea foi apresentado em Dakar, patrocinado pela Universidade do Senegal. Aoreferir-se ao conceito de negritude, mostra que

    um conceito que nasce do mesmo homem que sofreu dominao e discriminaes emnome da superioridade do homem que no negro, sobre o que tem a pele desta cor. este homem negro, e em uma determinada situao histrica, entre as duas grandesguerras mundiais, o que cria o conceito que ser erguido frente ao homem branco ediscriminador. Um afro-americano e um africano, Aim Csaire e Leopoldo Sedar Senghor,criam o conceito como expresso da ideologia de homens e povos que na Amrica e nafrica se negam a sofrer dominao e alienao de seu ser, a partir da suposta inferioridadedos homens que tm uma determinada cor da pele.16

    Tratando do conceito de indigenismo, evidencia que este

    tem assim sua origem na preocupao latino-americana de assimilar a um grupo socialmarginalizado como foi o indgena, as tarefas que devem ser consideradas comuns atodos os latino-americanos, sejam ndios, brancos ou mestios. A negritude, ao contrrio, um conceito que tem sua origem no prprio homem de raa negra.17

    No contexto da discusso sobre negritude, indigenismo e Amrica Latina, aoretomar a afirmao cartesiana de que todos os homens so iguais pela razo, Leopoldo

    16 ZEA. Cuadernos de Cultura Latinoamericana: Negritud e Indigenismo, p. 6.17 O trecho em espanhol : El indigenismo tiene as su origen en la preocupacin latinoamericana deasimilar a un grupo social marginado como lo ha sido el indgena, a las tarefas que se considera debenser comunes a todos los latinoamericanos, ya sean estos indios, blancos o mestizos. (ZEA. Cuadernos deCultura Latinoamericana: Negritud e Indigenismo, p. 17.)

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    Zea acentua que todos os homens so iguais por serem distintos, isto , indivduos.18

    Em Nuestra Amrica y el Ocidente, o poeta e ensasta Roberto Fernndez Retamarbuscava contextualizar as denominaes de Amrica Latina, atualizando-as para o sentidousado por Jos Mart (Nossa Amrica). Para a elucidao do conceito de Ocidente,apoia-se nas ideias de Leopoldo Zea que, em 1955, associou o mundo ocidental ouOcidente ao capitalismo. A independncia poltica das colnias mostrada pelo dilogoque estabelece com o iderio de libertao representado por Simn Bolvar e Jos Mart.Em contrapartida, como tambm ressalta Leopoldo Zea em Amrica Latina largo viajehacia si misma, a ideia de superioridade europeia ocorre no pensamento de autores naColnia, fora da Metrpole. Citem-se, nesse caso, Domingo Faustino Sarmiento e JuanBautista Alberdi. Embora no fosse comum ao tempo, Roberto Fernndez Retamar assinalaque Pasado el primer tercio del siglio XIX, un esclavo negro cubano de gran talentoescribir su autobiografa,19 mostrando a dolorosa condio de escravo.

    A divulgao do marxismo-leninista na Amrica Latina, segundo RobertoFernndez Retamar, foi responsvel por trazer a compreenso do pensamento de JosMart e de outros autores. A discusso, em torno da ideia de Ocidente, traz o debatesobre o sentido de ps-ocidental que est associado superao do Ocidente pelainstrumentalizao terica que torna capaz de ultrapassar a viso capitalista. RobertoFernndez Retamar menciona Jos Carlos Maritegui, os cubanos Julio Antonio Mella yRubn Martnez Villena como representantes desse pensamento marxista-leninista.

    Pablo Gonzlez Casanova, em Indios e negros na Amrica Latina, discute aquesto identitria no contexto do capitalismo. Para ele, os aspectos econmicostranscendem as questes raciais que hoje diramos tnicas. Com certeza, este constituium dos aspectos polmicos, sujeito a vrias discusses, o que no ser realizado nestetexto, considerando o propsito do nosso trabalho.

    ngel Rama, sob a perspectiva literria e crtica em Aportacin original de unacomarca del tercer mundo latinoamericana, entrelaava o estudo da cultura e da literatura,ressaltando o papel do intelectual latino-americano que tinha desenvolvido uma atitudeantiimperialista no se limitando a copiar, seno buscando a frmula secreta que permitisseinverter o signo do copiado ou aproveitado e geralmente o tem encontrado nos elementosantitticos20 que apareciam na Europa. Uma espcie de moral bretchiana (...).21

    18 Trecho em espanhol: Todos los hombres son iguales por ser distintos, esto es, individuos. (ZEA.Cuadernos de Cultura Latinoamericana: Negritud e Indigenismo, p. 21.)19 RETAMAR. Cuadernos de Cultura latinoamericana: Nuestra Amrica y el Ocidente, p. 13.20 No contexto, a que se refere ngel Rama, ressalto ao civilizadora europia aliada ao genocdiorealizado pela cultura europia: sculo XVII (comrcio de escravos negros); torturas e crimes na Rssiade Stalin ou na Espanha de Franco. Segundo Rama, estas figuras mencionadas nada tienem queinvidiar a nuestros Trujillos, Somozas, o Stroessner. (RAMA. Cuadernos de Cultura latinoamericana:Aportacin original de una comarca del tercer mundo: latinoamrica, p. 14.)21 A verso em espanhol do trecho traduzido : no limitndose a copir, sino buscando la frmulasecreta que permitiera invertir el signo de lo copiado o aprovechado, y generalmente la h encontradoen los elementos antitticos que aparecan en Europa. Una especie de moral brechtiana (...). (RAMA.Cuadernos de Cultura latinoamericana: Aportacin original de una comarca del tercer mundo:latinoamrica, p. 14.)

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    Os aspectos assinalados relacionam-se proposta enunciada desde o incio destetexto:

    Estas pginas propem elucidar o que expressa seu extenso ttulo: se existe ou se se podededuzir a possibilidade de uma contribuio literria original, da Amrica Latina para aComunidade Mundial, e, em particular, a europia-ocidental. Em caso afirmativo, qualseria seu sentido e qual sua estrutura interna. 22

    Darcy Ribeiro tambm participa desses cadernos com o texto La culturalatinoamericana. Trata de forma sinttica de suas teorias divulgadas nos livros quecompem os Estudos de antropologia da civilizao.23 As questes bastante polmicas, quecircularam nos Cuadernos de Cultura latinoamericanos, pertencentes Biblioteca de DarcyRibeiro, fizeram parte de seu tempo e semearam questes para outras bibliotecas. Nessesentido, importante recordar o que diz Alberto Manguel. O crtico coloca-nos diantedos vrios sentidos de biblioteca: as bibliotecas como entidades em crescimentoconstante,24 a biblioteca como espelho do universo25 e a biblioteca como obra emcurso toda estante vazia um anncio de livro por vir.26

    Os vrios escritos desses autores alimentaram outras buscas, impulsionaram acriao de outros livros / bibliotecas que vieram metaforicamente preencher as estantesvazias/ plenas de pensamentos voltados para questes coletivas e singulares de nossaAmrica. Estabelecendo um confronto entre os artigos que compem os cadernos,verifica-se que Darcy Ribeiro est mencionado textualmente em todos eles,27 o que meparece bastante significativo. Isso mostra, no mbito da Amrica Latina, que DarcyRibeiro foi referncia para vrios intelectuais nas diferentes reas do saber: crticaensastica e literria (ngel Rama e Roberto Fernndez Retamar); Sociologia (PabloGonzlez Casanova) e Filosofia (Leopoldo Zea). Da mesma maneira estes autores foramimportantes para Darcy Ribeiro. Como exemplo, menciono a incorporao de textos de

    22 Traduo do trecho retirado dos Cuadernos: Estas pginas se proponen elucidarlo que expresa sulargo ttulo: si existe o puede deducirse la posibilidad de una apoertacin literaria original, de AmricaLatina a la Comunidad Mundial, y, en particular, a la europeo-occidental. En caso afirmativo, cul serasu sentido y cul su estructura interna. (RAMA. Cuadernos de Cultura latinoamericana: aportacinoriginal de una comarca del tercer mundo: latinoamrica, p. 5.)23 No me detive no detalhamento sobre este texto, porque j o fiz no artigo de COELHO. DarcyRibeiro, a Amrica Latina e as epistemologias fronteirias, p. 92-93.24 MANGUEL. A biblioteca noite, p. 56.25 MANGUEL. A biblioteca noite, p. 56.26 MANGUEL. A biblioteca noite, p. 56. Cf. Vejam se as referncias e respectivas pginas dos Cuadernosmencionados. CASANOVA. Cuadernos de Cultura latinoamericana: Indios y negros en Amrica Latina,p. 7; RETAMAR. Cuadernos de Cultura latinoamericana: Nuestra Amrica y el Ocidente, p. 6; ZEA.Amrica Latina: Largo viaje hacia si misma, p. 6. Especificamente, ngel Rama no menciona DarcyRibeiro no cuaderno Aportacin original de una comarca del tercer mundo: latinoamrica.27 Cf. Vejam-se as referncias e respectivas pginas que fazem meno aos textos de Darcy Ribeiro:CASANOVA. Cuadernos de Cultura latinoamericana: Indios y negros en Amrica Latina, p. 7;RETAMAR. Cuadernos de Cultura latinoamericana: Nuestra Amrica y el Ocidente, p. 6; ZEA. AmricaLatina: Largo viaje hacia si misma, p. 6. Especificamente, ngel Rama no menciona Darcy Ribeiro nocuaderno Aportacin original de una comarca del tercer mundo: latinoamrica.

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    Leopoldo Zea (La integracin Latinoamericana)28 e de Pedro Gonzlez Casanova (Laofensiva conservadora).29

    Considerando os rumos da Literatura Comparada hoje, importante verificar queo percurso biogrfico de um intelectual como o de Darcy Ribeiro pode iluminar muitosdilogos no mbito da literatura e da cultura latinoamericana. O breve enfoque dosCuadernos, encontrados na biblioteca do autor de Mara, foi uma das inmeraspossibilidades para se entender a rede de dilogos instaurada entre as Amricas noexlio brasileiro e no que chamo de ps-exlio.

    AAAAA B S T R A C TB S T R A C TB S T R A C TB S T R A C TB S T R A C TThe transit of the intellectual Latin American writers in exileimplies a theoretical reflection about the relationship betweenthe library and biographical space. To develop this work, Iwill take as starting point some theoretical considerationsabout the library and its biographical interface. Then reflecton the Darcy Ribeiros library in relation to the exile and post-exile. Obviously, Darcy Ribeiro did not neglect to record hismemory during the exile in Latin America, as seen in hisautobiographical books. Still, I intend to look at his library tohighlight another aspects that havent been studied by criticsyet. To develop the text, after showing the relationshipbetween the library and biographical space, I situate thedialogue of Darcy Ribeiro with Latin America and focus someCuadernos de Cultura latinoamericana found in the library ofDarcy Ribeiro.

    KKKKK E Y W O R D SE Y W O R D SE Y W O R D SE Y W O R D SE Y W O R D SDarcy Ribeiros Library, biographical space and Latin

    American interlocution

    RRRRR E F E R N C I A SE F E R N C I A SE F E R N C I A SE F E R N C I A SE F E R N C I A SARFUCH, Leonor. El espacio biogrfico. Mapa del territorio. In: ____. El espaciobiogrfico. Dilemas de la subjetividad contempornea. Buenos Aires: Fondo de CulturaEconmica, 2007. p. 33-66.

    CASANOVA, Pablo Gonzalez. Cuadernos de Cultura latinoamericana: Indios y negros enAmrica Latina. Universidad Nacional Autnoma de Mxico, Facultad de Filosofa yLetras, Unin de Universidades de Amrica Latina, jun. 1978.

    CASANOVA, Pablo Gonzlez. La ofensiva conservadora. In: RIBEIRO, Darcy. CARTA:falas, reflexes, memrias. Informe de distribuio restrita do senador Darcy Ribeiro.Braslia: Gabinete do Senador Darcy Ribeiro, [s. d.]. p. 79-87.

    28 ZEA. Cuadernos americanos: La integracin latinoamericana.29 CASANOVA. La ofensiva conservadora.

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    COELHO, Hayde Ribeiro (Org.). Darcy Ribeiro. Belo Horizonte; Centro de EstudosLiterrios da UFMG; Curso de Ps-Graduao em Letras-Estudos Literrios, 1997.

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