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HAYDÉE SANTAMARÍA E A MITIFICAÇÃO DE UMA “HEROÍNA DA REVOLUÇÃO CUBANA” CAROLINA DE AZEVEDO MÜLLER 1 Este artigo visa analisar parte do processo de mitificação da heroína cubana Haydée Santamaría pela memória oficial cubana. De forma breve, alguns eventos da trajetória política de Haydée precisam ser destacados: ela atuou ativamente durante toda a luta insurrecional cubana (de 1952-8); como enfermeira no ataque armado ao Quartel Moncada (1953); imprimiu e divulgou o manifesto de Fidel Castro (1926-2016) A História me Absolverá (1954); foi uma das fundadoras do Movimiento 26 de Julio (1955); trabalhou como uma importante articuladora política, entre outras funções. Após a vitória dos rebeldes do M-26 em janeiro de 1959, Haydée foi designada como presidente da recém-criada instituição cultural cubana Casa de las Américas, que acabou se tornando muito importante no cenário cultural da Ilha e da América Latina. Também foi uma das fundadoras do Partido Comunista Cubano (PCC) em 1965, presidente da Organización Latinoamericana de Solidaridad (OLAS) em 1967, dentre outras atividades. Haydée cometeu suicídio em 1980, por razões não conhecidas e, logo após isto, iniciou-se uma intensa produção textual em sua memória e homenagem, sendo responsável por consagrar sua imagem como heroína nacional, em que atentamos a construção de sua vida e caráter. Estes textos produzidos em homenagem à Haydée compõem parte da memória oficial cubana, em vista de que foram publicados em sites oficiais cubanos (revistas eletônicas) e na Revista Casa de las Américas (em suas edições em papel), instituição oficial ligada à Casa de las Américas 2 . No segundo periódico, os textos publicados são todos da década de 1980, já nos sites oficiais cubanos, os textos são provenientes do século XXI (apesar de, muitas vezes, não indicarem a data de publicação e/ou produção dos textos), especialmente a partir da 1 Graduanda em História pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Foi bolsista de IC da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) com a pesquisa Haydée Santamaría e a mitificação de uma “heroína da Revolução Cubana”, sob orientação da Profa. Dra. Mariana Villaça, durante o período 2016-8. 2 Este órgão é chefiado por Fernández Retamar (Cuba, 1930-), um escritor e uma importante figura política em Cuba. Desde 1965 é presidente da Revista Casa de las Américas e, desde 1986 (após o pintor cubano, Mariano Rodríguez (1912-90), sair da presidência) também é diretor da Casa de las Américas.

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HAYDÉE SANTAMARÍA E A MITIFICAÇÃO DE UMA

“HEROÍNA DA REVOLUÇÃO CUBANA”

CAROLINA DE AZEVEDO MÜLLER1

Este artigo visa analisar parte do processo de mitificação da heroína cubana Haydée

Santamaría pela memória oficial cubana. De forma breve, alguns eventos da trajetória política

de Haydée precisam ser destacados: ela atuou ativamente durante toda a luta insurrecional

cubana (de 1952-8); como enfermeira no ataque armado ao Quartel Moncada (1953);

imprimiu e divulgou o manifesto de Fidel Castro (1926-2016) A História me Absolverá

(1954); foi uma das fundadoras do Movimiento 26 de Julio (1955); trabalhou como uma

importante articuladora política, entre outras funções. Após a vitória dos rebeldes do M-26 em

janeiro de 1959, Haydée foi designada como presidente da recém-criada instituição cultural

cubana Casa de las Américas, que acabou se tornando muito importante no cenário cultural da

Ilha e da América Latina. Também foi uma das fundadoras do Partido Comunista Cubano

(PCC) em 1965, presidente da Organización Latinoamericana de Solidaridad (OLAS) em

1967, dentre outras atividades. Haydée cometeu suicídio em 1980, por razões não conhecidas

e, logo após isto, iniciou-se uma intensa produção textual em sua memória e homenagem,

sendo responsável por consagrar sua imagem como heroína nacional, em que atentamos a

construção de sua vida e caráter.

Estes textos produzidos em homenagem à Haydée compõem parte da memória oficial

cubana, em vista de que foram publicados em sites oficiais cubanos (revistas eletônicas) e na

Revista Casa de las Américas (em suas edições em papel), instituição oficial ligada à Casa de

las Américas2. No segundo periódico, os textos publicados são todos da década de 1980, já

nos sites oficiais cubanos, os textos são provenientes do século XXI (apesar de, muitas vezes,

não indicarem a data de publicação e/ou produção dos textos), especialmente a partir da

1 Graduanda em História pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Foi bolsista de IC da Fundação

de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) com a pesquisa Haydée Santamaría e a mitificação de

uma “heroína da Revolução Cubana”, sob orientação da Profa. Dra. Mariana Villaça, durante o período 2016-8.

2 Este órgão é chefiado por Fernández Retamar (Cuba, 1930-), um escritor e uma importante figura política em

Cuba. Desde 1965 é presidente da Revista Casa de las Américas e, desde 1986 (após o pintor cubano, Mariano

Rodríguez (1912-90), sair da presidência) também é diretor da Casa de las Américas.

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década de 2010, com a publicação de diversos especiais em homenagem à Haydée ou de

celebração de eventos históricos da Revolução.

Os autores destes textos são provenientes, em sua grande maioria, da América Latina. São

ex-guerrilheiros, amigos de infância, familiares, artistas e/ou intelectuais que conheceram-na

por intermédio da Casa e por admiradores (este último grupo foi denominado desta maneira

devido que, após a análise de seus textos, foi possível concluir que eles não conheceram

Haydée em vida).

Os textos ao tratarem sobre Haydée realçam profundamente a passionalidade em sua

trajetória política. Os autores enfatizam que ela sempre foi uma mulher sensível, simples,

apaixonada, fiel ao Castro ao longo de toda sua vida, entre outras características passionais

que teriam designado-a à luta armada, e não reflexões políticas e/ou sociais (PRADO, 1999)3

sobre a ditadura de Fulgêncio Batista em Cuba (que concretizou o golpe de Estado em 1952).

Acerca da trajetória política e pessoal de Haydée, é importante salientar que muitos de

seus atos foram omitidos neste discurso oficial. Como sua atuação de articuladora política

para o M-26, que foi quase totalmente silenciada. Porém, seus atos pós-Revolução foram

quase todos omitidos, como suas atividades frente à Casa e demais ações até sua morte e,

essencialmente, se ela chegou a se posicionar contrariamente a alguma ação de Castro (como,

a título de exemplo, a aproximação da Ilha com a URSS). Isto reflete a “ilusão biográfica” do

sociólogo francês Pierre Bourdieu 4 (BOURDIEU, 1996:74-82), pois a memória oficial

cubana apagou possíveis incoerências na vida desta heroína, retrataram-na como uma mulher

cubana exemplar e acabam por significá-la como uma heroína da Revolução.

Em relação à aos atos de Haydée como presidente da Casa, muitas de suas atuações

efetivas foram silenciados por comentários que exaltam sua grande humanidade, sensibilidade

pela arte, que tratava todos como uma “mãe”, paixão pela Revolução e lealdade ao Castro.

Esta falta de informações sobre as atuações de Haydée não ocorreu apenas nos textos oficiais

e na bibliografia, mas também não temos materiais escritos pela própria, apenas poucas 3 Segundo a historiadora Maria Ligia Prado, a exaltação da passionalidade foi algo recorrente nas produções

biográficas sobre as mulheres que ataram nas Lutas de Independência latino-americanas no século XIX (PRADO,

1999).

4 De acordo com Bourdieu, a “ilusão biográfica” ocorre quando as produções biográficas estruturam a vida do

indivíduo biografado com começo, meio e fim já definidos, apagam as incoerências e atribuem um sentido

artificial à vida do mesmo (BOURDIEU, 1996).

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entrevistas que acabam por realçar muitos dos aspectos defendidos pela historiografia oficial

cubana. Não deixa de ser significativo que quase todas as cartas escritas por Haydée foram

“misteriosamente” perdidas (RANDALL, 2015).

A questão de Haydée não ter trabalhado como artista em nenhum momento da sua vida

introduziu o questionamento se ela seria o indivíduo mais adequado para a posição de

presidência de uma instituição cultural. Acreditamos que por ser integrante do “círculo de

confiança” de Castro garantiu-a sua posição de destaque5, e, ainda, posto ser uma heroína da

Revolução, Haydée transparecia a imagem deste acontecimento histórico para a Casa

(MOREJÓN, 2010). Como ela não possuía conhecimentos ou habilidades artísticas de fato, os

textos, numa tentativa de “justificar” sua função na Casa, afirmam diversas vezes que Haydée

desde jovem teve grande “sensibilidade” à arte.

Também em relação à sua posição na Casa, acreditamos que Haydée não teve poder de

fato na instituição, dado que, como dito, não temos conhecimentos sobre suas ações efetivas

na Casa, nem nos textos ou na bibliografia. Ainda, a presença de Fernández Retamar como

presidente da Revista Casa (e, desde 1986 também da Casa) introduz o questionamento se não

era ele quem realmente definia as atividades da Casa enquanto Haydée ainda era presidente,

em vista de que era e ainda é uma figura política muito influente no cenário cultural cubano e

latino-americano. Nos especiais da Revista Casa em homenagem à ela foram publicados

diversas cartas em que artistas e intelectuais enviavam suas condolências. Entretanto, elas são

direcionadas a Fernández Retamar e não à Casa diretamente ou a Silvio Rodríguez (diretor da

Casa designado logo após a morte de Haydée).

Acreditamos que Haydée ficou “a margem” do poder em Cuba pós-Revolução e que isto

inclusive poderia ter incentivado seu suicídio em 1980. Porém, não podemos nos esquecer

que a Casa se tornou uma das duas entidades culturais mais importantes em Cuba

posteriormente a 1959, sendo o ICAIC a outra (VILLAÇA, 2010). Tal cargo a garantiu-a

grande influência em âmbitos culturais na América Latina com o contato com diversos artistas

e intelectuais, como atestado nos textos publicados na Revista Casa.

5 Como dito por Sílvia Miskulin, ocorreu a centralização do poder na mão dos guerrilheiros do M-26 (também

membros do PCC) a partir da disposição dos mesmos nos maiores cargos das principais instituições cubanas

(MISKULIN, 2009).

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Outro aspecto presente no processo de mitificação de Haydée pela memória oficial

cubana se trata da construção generificada em torno da imagem dela. Isto foi estruturado

desde o movimento rebelde, em vista de que os jovens do M-26 desenvolveram uma norma de

comportamento para a luta armada, baseando-se nas concepções de gênero presentes nas

biografias dos heróis e heroínas independentistas cubanos e latino-americanos do século XIX.

Em função disto, as mulheres foram afastadas da primeira linha de batalha e apontadas para

atividades que tradicionalmente são designadas às mulheres, tendo que se submeterem a

estrutura patriarcal do movimento (SADDI, 2009).

Assim sendo, Haydée e Melba Hernández6, desejavam participar do Moncada, porém, os

homens do movimento rebelde não permitiram. Desta forma, elas peitearam para participar do

ataque armado e, segundo o texto de Marilys Suárez Moreno: “no falto el deseo de protegerlas.

Llevarlas al combarte resultaba penoso a la sensibilidade de Fidel”. Ambas criticaram tal

postura e exigiram participar do ataque, afirmando: “si estamos en pugna abierta contra

cualquier tipo de discriminación, ¿por qué establecer en esto distinciones?” (SUÁREZ

MORENO, s/d). Apesar delas terem debatido para participar do ataque, Fidel e Abel

continuaram discutindo sobre tal possibilidade e, enfim, outro homem foi quem definiu que

elas poderiam participar: o médico e guerrilheiro cubano Mario Muñoz (1912-53), para elas

auxiliarem no hospital como enfermeiras (e não no ataque armado).

Isto posto, quando do processo de mitificação das heroínas cubanas do século XX, a

imagem da mulher mambisa (atuante das Lutas de Independência cubanas do século XIX) foi

essencial para o processo. Isto foi incorporado especialmente na imagem da negra cubana

Mariana Grajales (1815-93), a combatente independentista que se tornou mais conhecida na

história cubana. A construção da imagem de Grajales em Cuba afirma que ela era corajosa,

fiel, determinada e capaz de sacrificar seus próprios filhos e a si mesma pela liberdade da

pátria. E, desta maneira, ela se tornou um mártir da nação cubana. A figura de Grajales se

tornou um dos maiores elos entre o passado, presente e futuro, da construção do caráter

6 Melba Hernández (Cuba, 1921-2014) foi uma guerrilheira do M-26 e atuou no ataque ao quartel Moncada em

1953. Após a Revolução foi uma das fundadoras do PCC, se tornou presidente do Comité Cubano de Solidaridad

con Vietnam del Sur, embaixadora de Cuba na República Socialista do Vietnã, entre outras atividades. Porém,

não teve grande atuação política pós-Revolução e em seu processo de mitificação pela memória oficial cubana,

sua atuação como guerrilheira é exaltado quase que unicamente e não há grandes comentários sobre suas ações

após 1959. Melba faleceu em Havana decorrente a diabetes.

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nacional cubano: “resurrecting the mambisa figure and linking her to the Revolution was one

of the first acts of revolutionary mythmakers. Their mission was to root the 1959 Revolution

in an authentic past” (STONER, 2003:82).

Este mesmo personagem é exaltado no periódico Revista Mujeres, órgão oficial ligado à

outra instituição recém-criada pós-Revolução, a Federación de las Mujeres Cubanas (a FMC

foi dirigida por outra guerrilheira do M-26 que foi considerada heroína da Revolução, Vilma

Espín7). Esta revista foi o segundo periódico que mais publicou textos sobre Haydée, em que

enfatizam, quase que exclusivamente, seu papel como guerrilheira. Isto se trata, novamente,

de uma continuação histórica entre o XIX e o XX na história cubana.

As características atribuídas à personalidade de Grajales acima mencionadas também

apresentam-se nos textos sobre Haydée. A memória oficial cubana defende sua personalidade

como a de uma mulher que era fiel ao Castro ao longo de toda sua vida (nunca questionando

nenhuma de suas atitudes, nem na luta insurrecional e nem no pós-Revolução), corajosa ao

lutar, mesmo que isso custasse a vida de seus entes queridos (especificamente a de seu irmão,

Abel Santamaría e de seu noivo, Boris Santa Coloma8) e a questionar em seu julgamento no

tribunal os soldados bastianos que torturaram e assassinaram muitos rebeldes. Isto refere-se a

quando os soldados de Batista levaram um olho de Abel e os testículos de Boris para Haydée,

para tentar obrigá-la a falar sobre o movimento rebelde, porém, ela não revelou nada. Acerca

deste último aspecto, a ação de Haydée foi glorificada por Fidel Castro em seu manifesto A

História me Absolverá: Castro exalta como Haydée teria dito aos soldados que Boris “não

morreu, porque morrer pela pátria é viver”. E, para ele: ”o nome da mulher cubana jamais foi

colocado numa altura tão elevada de heroísmo e dignidade (CASTRO, 2011:65)”. Desta

maneira, Haydée foi exemplar e corajosa por defender bravamente a liberdade de Cuba.

7 Vilma Espín (Cuba em 1930-2007) foi uma guerrilheira atuante no M-26. Após o golpe de Estado de Batista

em 1952 Espín atuou ao lado do guerrilheiro Frank País em diversas atividades: participou do levantamento

rebelde em apoio a desembarque da embarcação do Granma, em 30 de novembro de 1956; foi integrante da

Dirección Nacional do M-26, e após a morte de Frank País, foi nomeada para Coordinadora Provincial da

província do Oriente, dentre outros trabalhos. Após a Revolução foi designada para a presidência da

recém-criada instituição Federación de las Mujeres Cubanas (FMC), integrou o Comité Central do PCC, entre

outras atividades. Faleceu devido a uma doença prolongada (a qual não foi divulgada).

8 Abel Santamaría (Cuba, 1927-53), irmão mais novo de Haydée, foi um dos grandes líderes do movimento

embrião do M-26. Boris Santa Coloma (Cuba, 1928-53) foi um guerrilheiro do mesmo grupo. Ambos foram

torturados e assassinados pelos soldados de Batista, no cárcere, após o fracasso ao assalto ao Quartel Moncada

em 27 de julho de 1953. Os dois rebeldes foram considerados mártires e heróis da Revolução após 1959.

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Retomando, a imagem criada em torno da imagem da mulher mambisa era visada para

construir novos valores à nação cubana. A bravura, dedicação e seu sacrifícios dessas

mulheres se tornaram exemplos a serem seguidos (STONER, 2003). De forma semelhante, as

ações de Haydée foram descritas de forma romantizada para expressar sua trajetória política

como exemplar e assim influenciar as seguintes gerações. A autora cubana admiradora

Marilys Suárez Moreno afirma que:

[Haydée] no está físicamente entre los que aman y construyen el porvenir de

la patria. Más ella, que era ternura y sensibilidad, fortaleza y dignidad,

pervive aun después de su muerte, porque su nombre trasciende la proeza del

Moncada y se asienta definitivamente en la historia de la patria cubana

(SUÁREZ MORENO, s/d).

Esta concepção da mulher exemplar cubana e a imagem de Grajales também foi algo

presente após a Revolução. Durante o processo de legitimação do ideal do “homem novo”

cubano, defendido pelo guerrilheiro Ernesto “Che” Guevara9, em que os homens deveriam se

tornar legítimos revolucionários. Os ideias de justiça, coragem, honra e necessidade de

defender a pátria foram exaltados e a mulher foi vista como essencial para a construção dessa

nova sociedade cubana (SANTOS, 2013). Também, no discurso oficial pós-1959, verificou-se

a associação da mulher cubana como mãe e guerrilheira (SANTOS, 2010). Na glorificação da

imagem de heroína da Haydée, este ideal também apresenta-se fortemente, em vista de que

diversos textos realçam que Haydée se preocupava com todos como uma mãe, tanto enquanto

atuava como guerrilheira quanto foi presidente da Casa.

Além disso, após 1959 a historiografia oficial cubana também defendeu a mulher cubana

como heróica e forte, e atuante durante todo o percurso histórico cubano. Isto está relacionado

com a importância atribuída à mulher cubana que, posteriormente a Revolução, deveria

continuar lutando, agora dentro das perspectivas revolucionárias (VASSI, 2007). Este aspecto

também interliga-se com a imagem da mulher mambisa, dado que sua atuação nas Lutas de

Independência cubanas no século XIX foram vistas com o marco inicial da luta armada das

mulheres cubanas.

9 Che Guevara (Argentina, 1928-67) se uniu ao M-26 em 1956, quando conheceu alguns dos principais

guerrilheiros que estavam no México (aguardando para abarcaram no Granma e entrarem em Cuba). Atuou

politicamente de diversas formas no governo cubano pós-1959. Foi assassinado em 1967, na Bolívia, enquanto

estava lutando num movimento rebelde. É considerado um dos maiores líderes da Revolução Cubana.

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O ideal do sacrifício pela pátria também era algo profundamente glorificado pelo discurso

oficial cubano desde do século XIX. Isto influenciou os rebeldes do século XX que também

exaltaram o ato e incorporaram-o na norma de conduta do M-26 (SADDI, 2009). Ao

sacrificar a si mesmo pela pátria, isto promovia o combatente do século XIX e o rebelde do

século XX ao status de mártir. Dentro deste aspecto, o suicídio de Haydée foi visto pela

memória oficial cubana, em alguns momentos, como um ato de martírio.

Haydée suicidou-se, aos 57 anos de vida, no dia 26 de julho de 1980, exatamente no 27º

aniversário do assalto ao Moncada. Haydée não era apenas uma figura importante da

Revolução, mas também foi considerada uma das “Heroínas del Moncada” (junto com Melba)

e, deste modo, seu suicídio implicou em ações específicas do governo cubano.

Para analisarmos o suicídio de Haydée nós utilizamos não apenas os textos que englobam

a memória oficial cubana mas, também, textos dos escritores cubanos Tania Díaz Castro10,

Roberto Jesús Quiñones Haces11 e Carlos Alberto Montaner Suris12, autores que já tiveram

problemas com o governo cubano e publicam em periódicos estadunidenses não ligados ao

mesmo governo13. Em função disto, é necessário ter cuidado ao analisar estes textos, devido a

posição exacerbada contrária ao governo cubano. Além disso, os testemunhos dos exilados

cubanos Guillermo Cabrera Infante14 e Carlos Franqui15 foram essenciais. Ao analisar tais

10 Tania Díaz Castro (Cuba, 1939-) é uma escritora que teve alguns de seus livros publicados pela Unión de

Escritores y Artistas de Cuba (UNEAC). Foi presa em 1989-90 por pedir um plebiscito contra Fidel Castro e

atualmente reside nos EUA.

11 Carlos Alberto Montaner Suris (Cuba, 1943-) é um escritor, jornalista e político que, em 1961 ele e outros

jovens foram aprisionados e condenados pelo governo cubano, acusados de integrar um grupo terrorista contrário

ao governo. Fugiu da prisão e da Ilha, indo morar na Espanha e nos EUA.

12 Roberto Jesús Quiñones Haces (Cuba, 1957-) é um escritor e poeta ainda residente em Cuba. É membro da

UNEAC e também escreve para o CubaNet.

13 Tais periódicos são CubaNet (conhecido por sua posição demasiada contrária ao governo da Ilha) e Neo Club

Press.

14 Guillermo Cabrera Infante (Cuba, 1929-2005) foi um escritor, romancista, roteirista, contista e jornalista

cubano. Após 1959 foi editor do periódico Revolución e construindo um suplemento do jornal, o Lunes de

Revolución, momento em que começou a ter desavenças com o governo castrista. Em 1962 se tornou dissidente

político e diplomata em Bruxelas e, em 1965 exilou-se em Madri e depois em Londres, local onde veio a falecer.

15 Carlos Franqui (Cuba, 1921-2010) atuou como guerrilheiro no M-26 e foi um dos fundadores do periódico

Revolución, órgão do M-26, e continuou a dirigir o jornal até 1963. Algumas de suas atividades pós-1959

envolveram também dirigir a Radio Rebelde em 1958 e o Congreso Cultural de la Habana em 1968, no mesmo

ano que rompeu com o governo cubano e exilou-se na Itália. Faleceu em Porto Rico.

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textos pretendemos compreender sobre o ato da Haydée, posto que a memória oficial cubana

possui uma posição muito clara acerca disto.

A memória oficial cubana defendeu em 1980 e até os dias atuais apenas uma única razão

para o suicídio de Haydée: os traumas sofridos por ela após Moncada em 1953, quando Abel e

Boris, já aprisionados, foram torturados e assassinados pelos soldados de Batista. Os textos

afirmam que Haydée nunca teria superado tal evento e em 1980, após anos de sofrimento,

decidiu dar um fim à sua vida.

Os textos não mencionam que Haydée se suicidou e quase nunca nem chegam a comentar

que ela morreu. Existem alguns poucos textos que comentam que ela se suicidou, mas de

forma sutil. Quando estes poucos textos relatam que ela cometeu suicídio, não expressam

como foi o ato (com um revolver colocado dentro de sua boca (DÍAZ CASTRO, 2013) e

também não mencionam onde ela se suicidou, informação que também não é comentada pela

bibliografia. Cabrera Infante relatou que houve a especulação de que ela cometeu o ato em

seu escritório na Casa, e a escritora Margaret Randall16 mencionou que o filho mais velho de

Haydée, Abel Enríque Hart Santamaría17, encontrou o corpo de sua mãe, mas não informa

aonde (RANDALL, 2015:192). Isto demonstra o desejo do governo cubano de falar o mínimo

possível sobre o ato de Haydée.

A data também foi/é silenciada pela memória oficial cubana, posto que ocorreu numa

celebração de um evento de suma importância para a Revolução, o 27º aniversário em

homenagem ao Moncada (mesmo ano em que Fidel dedicou a celebração à memória de Abel

(FRANQUI, 1988:366). O governo cubano realizou a declaração oficial, afirmando que teria

16 Margaret Randall (EUA, 1936-) é uma escritora que se mudou para Cuba em 1969, viveu na Ilha durante

alguns anos (não temos conhecimento de quando ela deixou o país) e conheceu Haydée. Em 2015 ela publicou a

obra Haydée Santamaría, cuban revolutionary: she led by transgression em homenagem à Haydée. Randall

propõe-se nesta obra a ir contra os textos publicados sobre Haydée (os quais são nossas fontes, porém, a autora

não os compreendeu como parte da memória oficial cubana), todavia, acabou por reafirmar muito dos aspectos

defendidos por tais textos. Apesar disto, esta obra foi de profunda importância para o desenvolvimento desta

pesquisa, por nos trazer informações novas e diferentes testemunhos sobre Haydée..

17 Haydée casou-se com o guerrilheiro Armando Hart (Cuba, 1930-2017) ainda na luta insurrecional, em 1956.

O casal teve dois filhos: Abel Enríque Hart Santamaría (Cuba, 1960-2008), que se tornou advogado, e Celia

María Hart Santamaría (Cuba, 1963-2008), antropóloga, escritora e membro da IV Internacional (organização

comunista trotskista). Ambos dos filhos faleceram num acidente automobilístico em 2008. Celia María redigiu

alguns textos em homenagem à sua mãe.

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ocorrido dias depois da comemoração, porém, isto logo se tornou insustentável e o governo

cubano manifestou que ocorreu no dia 26 (CABRERA INFANTE, 1996:180).

Algo que se tornou controverso foi o local em que ela foi velada, situação que não é

comentado por nenhum texto. O funeral da Haydée foi privado e restrito aos familiares e

amigos, e não realizado publicamente na Plaza de la Revolución, como no caso dos outros

heróis de 1959. Ainda para ocultar que foi um suicídio, cobriram o ferimento de bala no

crânio embrulhando sua cabeça com um lenço vermelho (IBIDEM). Ao analisar nossa

bibliografia, sabemos que o local do funeral de Haydée gerou questionamentos de alguns

indivíduos, como da sobrinha de Haydée, Niurka Martín Santamaría, e do próprio Fernández

Retamar (numa entrevista cedida à Randall e não em seu texto que engloba nossa

documentação (RANDALL, 2015:113). Além disso, segundo Cabrera Infante, Fidel não foi

ao funeral e nem declarou algo publicamente sobre o acontecimento (o escritor também

comenta que Haydée teria redigido uma carta para Castro se despedindo, todavia, seu

conteúdo nunca se tornou público (CABRERA INFANTE, 1996:280).

Acerca das razões para o ato de Haydée, Díaz Castro, Montaner Suris, Quiñones Haces,

Cabrera Infante e Franqui compreenderam-o como um ato político. Os três primeiros autores

ainda defendem que isto representou uma “falha” na Revolução. Todos esses cinco autores

também foram enfáticos em afirmar que o governo cubano empenhou/a-se significativamente

em silenciar o suicídio.

Um evento que foi considerado por Díaz Castro, Montaner Suris (MONTANER SURIS,

2011), Quiñones Haces (QUIÑONES HACES, 2015) e Franqui como uma das principais

razões para o suicídio da Haydée foi o Êxodo de Mariel. Este acontecimento refere-se a

quando 130 mil cubanos deixaram a Ilha em direção aos EUA por barcos no porto Mariel, em

torno de abril e outubro de 1980 (GOTT, 2006:302). Não deixa de ser peculiar que nenhum

texto de nossa documentação comentou sobre tal evento. Franqui chega a afirmar que Mariel

foi o ponto final para Haydée e que ela teria dado sua resposta final a Castro.

Haydée no pudo más. Protestó violentamente. Discutió con Ramiro Valdés y

Raúl Castro. El Mariel había ocurrido a fines de mayo. Un mês después,

ironías de la historia, Fidel dedica el 26 de julio de aquel año de 1980 a la

memoria de Abel Santamaría. Haydée entonces dio su respuesta al Mariel, a

Fidel Castro, al fracaso de la revolución. Para ella el 26 de julio era otra cosa.

Y para conmemorar la fecha se disparó una ráfaga de ametralladora. Y en

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Cuba fue como si hubiese suicidado y muerto la revolución. (FRANQUI,

1988:366).

Desta forma, a memória oficial cubana silencia o suicídio de Haydée ao máximo e quase

nenhum texto menciona sobre o ato e quando comentam, detêm-se pouco no assunto. Em

função de pouco comentarem sobre, a memória oficial cubana, ao tentar “justificar” o

acontecimento (isto de maneira sutil, posto que não declaram diretamente que ela se suicidou

ou mesmo que faleceu), publicou diversos textos que afirmam que Haydée nunca superou os

traumas de Moncada e como a morte de diversos companheiros ao longo de sua vida também

afetou-a profundamente, como da outra ex-guerrilheira que também foi considerada heroína

nacional, Celia Sánchez18, em janeiro de 1980. Sánchez é descrita por alguns textos como

uma grande amiga de Haydée. Segundo a filha mais nova de Haydée, Celia María Hart

Santamaría, seu nome foi dado em homenagem à Sánchez (algo que atesta a grande amizade

entre ambas) e que a morte da mesma teria influenciado na ideia de Haydée cometer suicídio

meses depois (HART SANTAMARÍA, 2005).

Como comentado anteriormente, há certo desejo da memória oficial cubana em

transformar Haydée numa mártir da Revolução de 1959. Isto quando os textos defendem que

Haydée, em 1953, teria sacrificado seus entes queridos (Abel e Boris, sendo o primeiro mais

enfatizado que o segundo) pela liberdade da pátria e, posteriormente em 1980, a si mesma. A

jornalista cubana Marta Rojas, que conheceu Haydée ainda na luta insurrecional, afirmou que:

cuando [Haydée] murió también me preguntaron qué yo pensaba, hoy reitero

lo que respondí entonces: Haydée, en el fondo, fue también un mártir del

Moncada que durante un tiempo venció con creces su muerte, íntimamente

deseada aquel 26 de julio, junto a Abel y a Boris cruelmente torturados, por

eso fue dos veces ejemplar. (ROJAS, 2010).

Em alguns momentos do processo de construção da imagem como herói e mártir da

Revolução, é empregado um teor religioso cristão. Segundo a historiadora Mariana Villaça, ao

18 Celia Sánchez (Cuba, 1920-80) foi uma das principais líderes do M-26 e teve um grande papel na Sierra

Maestra. Após a Revolução, ela foi designada como secretária do Consejo de Estado, trabalhou no Parlamento,

foi membro do Comitê Central do Partido Comunista Cubano e integrou a Dirección Nacional da FMC, entre

outras funções. Faleceu devido a um câncer no pulmão. Sánchez é uma das heroínas de 1959 mais conhecida

internacionalmente. A historiadora Andréa Schactae analisa os ideias de feminilidade presentes nas produções

biográficas sobre Sánchez, ver: SCHACTAE, A. M. 'Mulheres Guerreiras': gênero e ideal de feminilidade na

biografia da cubana Celia Sánchez. Fazendo Gênero 10, 2013, Florianópolis, entre outros artigos.

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analisar canções latinoamericanas em homenagem a Guevara, os compositores transmitiram a

ideia de sua imagem “como mártir, cristão generoso, solidário, sem vaidade alguma –

perceptível em “Hombre”, na qual Silvio Rodríguez constrói a idéia de Che como um homem

muito simples e piedoso que não tem sequer um sobrenome” (VILLAÇA, 2006:363). Valores

semelhantes são vistos nos textos sobre Haydée, ao descreverem que ela era uma mulher

generosa, sensível, justiceira, simples, piedosa e que não tinha muita vaidade. Tais atributos

constituem o apanhado geral que busca transformar Haydée numa mártir da Revolução.

Também é importante salientar que o suicídio não é visto como a morte esperada de um

herói, que precisa morrer em campo de batalha, defendendo sua pátria. Todavia, no caso de

Haydée, o ex-guerrilheiro negro do M-26 Juan Almeida19, escolhido para proferir o discurso

do funeral de Haydée (isto é algo peculiar, dado que nenhum texto ou obra bibliográfica

comentou sobre uma profunda relação de amizade entre ambos) defendeu que julgar o ato

dela seria injusto, visto que era conhecido seu sofrimento pós-Moncada. De acordo com

Almeida:

por principio, los revolucionarios no podemos estar de acuerdo con el

suicidio. La vida del revolucionaria pertence a su causa y a su pueblo, y debe

dedicarla a servirlos hasta el último átomo de energía y el último segundo de

existencia. Pero no podemos juzgar fríamente a la compañera Haydée. No

sería justo (ALMEIDA, 1980).

De todo modo, o suicídio de Haydée não poderia suscitar questionamentos de que poderia

ter sido um ato político, como uma resposta aos rumos da Revolução e das ações do governo

cubano. Portanto, seu sofrimento de décadas, devido as consequências do Moncada, foram

tomadas como a única razão para o ato de Haydée. Eventos como Mariel, a possível falta de

concordância dela com a aproximação da Ilha com a URSS, ou até o fato de seu marido desde

1956, Armando Hart, o Ministro da Educação20, ter deixado-a por outra mulher meses antes

de sua morte (isto, justamente para não deixar transparecer uma imagem negativa dessa

importante figura política do governo cubano), entre outros fatores, não são mencionados. De

qualquer modo, independentemente das razões que teriam levado Haydée a cometer suicídio,

19 Juan Almeida (Cuba, 1927-2009), guerrilheiro do M-26 que, posteriormente a 1959 foi considerado um dos

heróis da Revolução. Se tornou escritor e ganhou o prêmio literário da Casa de las Américas.

20 Armando Hart (Cuba, 1930-2017) tamb´me foi um guerrilheiro do M-26. Após a Revolução foi designado

como Ministro da Educação (cargo que, primeiramente, foi designado à Haydée, que recusou).

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sejam elas políticas, pessoais ou o conjunto de ambas (o que acreditamos ter sido mais

provável, ainda mais devido a data escolhida por Haydée), as implicações de seu ato se

tornaram nitidamente políticas.

O processo de mitificação da Haydée pela memória oficial cubana, desde 1980 até os dias

atuais, se trata do desejo do governo cubano de exportar a imagem desta heroína (ainda mais

considerando que os textos são divulgados por meio da internet, algo que possibilita aos

estrangeiros conhecerem mais sobre a história dos heróis e heroínas cubanos). Ao afirmarem

que a Haydée era amável, sensível, leal durante toda sua vida ao Castro, apaixonada pela

Revolução, pela Casa de las Américas (silenciando possíveis atos que não teriam agradado o

governo, ou até se ela teria questionado as ações de Castro), pela liberdade e por Cuba, os

textos transmitem uma imagem positiva não só da Haydée, mas também da Revolução e das

demais heroínas cubanas.

Fontes citadas

ALMEIDA, Juan. Ante la muerte de la compañera Haydée Santamaría. Cuba: Revista Casa

de las Américas, n. 121, 1980.

DÍAZ CASTRO, Tania. El suicidio de Haydée Santamaría ¿Comprendería que asaltar el

Moncada fue una locura que segó la vida de su hermano y su novio?”. EUA: CubaNet, 2013.

HART SANTAMARÍA, Celia María. Este, el prólogo. Cuba: Cuba Debate, 2005.

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QUIÑONES HACES, Roberto Jesús. El suicidio más famoso de la revolución cubana.

Algunos suicidios significativos fueron los del comandante Félix Pena y Osvaldo Dorticós.

Aunque sin dudas, el más famoso de todos fue el de Haydée Santamaría. EUA: CubaNet,

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ROJAS, Marta. La Haydée que conecí. Cuba: La Jiribilla, 2010.

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