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“HERÓIS DO DESERTO”: NOTAS SOBRE A INTELECTUALIDADE AMAZONENSE (1920-1960) Vinicius Alves do Amaral Universidade Federal do Amazonas (UFAM) [email protected] RESUMO É recorrente nos escritos dos artistas amazonenses a denúncia ao status quo cultural de seu Estado, ressaltando sempre o provincianismo destas paragens. No presente artigo, fruto de uma pesquisa ainda insipiente, tentamos analisar a ambiguidade desse discurso através de um pequeno estudo do campo artístico e cultural do Amazonas num de seus períodos mais emblemáticos: o intervalo entre o fim do boom da borracha na década de 1910 e a implantação da Zona Franca de Manaus nos anos 60. Importa-nos entender como as condições sociais e os movimentos artísticos se relacionavam nesse contexto, considerado pela historiografia tradicional como os “anos da crise”, de modo a suscitar tais menções a essa suposta pequenez do campo artístico e intelectual amazonense. PALAVRAS-CHAVE: Amazonas, Provincianismo, Campo artístico, Academia Amazonense de Letras, Clube da Madrugada. ABSTRACT It is applicant on the writing of the complaint to the artists Amazonian cultural status quo of their state, stressing always the provincialism of these stops. In this article, the result of a research still incipient, try to analyze the ambiguity of this discourse through a small study of the artistic and cultural Amazon in its most emblematic periods: the interval between the end of the rubber boom in the 1910s and deployment of the Manaus Free Mestrando em História Social pelo Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Federal do Amazonas e bolsista do Centro de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES). 1

Herois Do Deserto

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Artigo de Vinícius Alves do Amaral

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HERIS DO DESERTO: NOTAS SOBRE A INTELECTUALIDADE AMAZONENSE (1920-1960)Vinicius Alves do Amaral[footnoteRef:1] [1: Mestrando em Histria Social pelo Programa de Ps-Graduao em Histria Social da Universidade Federal do Amazonas e bolsista do Centro de Aperfeioamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES). ]

Universidade Federal do Amazonas (UFAM)[email protected]

RESUMO recorrente nos escritos dos artistas amazonenses a denncia ao status quo cultural de seu Estado, ressaltando sempre o provincianismo destas paragens. No presente artigo, fruto de uma pesquisa ainda insipiente, tentamos analisar a ambiguidade desse discurso atravs de um pequeno estudo do campo artstico e cultural do Amazonas num de seus perodos mais emblemticos: o intervalo entre o fim do boom da borracha na dcada de 1910 e a implantao da Zona Franca de Manaus nos anos 60. Importa-nos entender como as condies sociais e os movimentos artsticos se relacionavam nesse contexto, considerado pela historiografia tradicional como os anos da crise, de modo a suscitar tais menes a essa suposta pequenez do campo artstico e intelectual amazonense. PALAVRAS-CHAVE: Amazonas, Provincianismo, Campo artstico, Academia Amazonense de Letras, Clube da Madrugada.ABSTRACTIt is applicant on the writing of the complaint to the artists Amazonian cultural status quo of their state, stressing always the provincialism of these stops. In this article, the result of a research still incipient, try to analyze the ambiguity of this discourse through a small study of the artistic and cultural Amazon in its most emblematic periods: the interval between the end of the rubber boom in the 1910s and deployment of the Manaus Free Trade Zone in the 60s. Is important for us understand how the social and artistic movements were related in this context, considered by traditional historiography as the "crisis years" in order to raise such references to this supposed smallness of the artistic and intellectual Amazon.KEYWORDS: Amazon, Provincialism, Artistic Field, Amazon Academy of Letters, Dawns Club.

Huscar de Figueiredo, jornalista e advogado, diria em artigo para a revista A Selva em 1937 que o Brasil recortado por desertos, cujo melhor exemplo a Amaznia. No apenas, o deserto geogrfico, seno tambm o poltico, o social e, para que no completar a srie? O intelectual (MAGALHES et. ali, 2001, p. 16). J o escritor Mrcio Souza em seu livro A Expresso Amazonense (1977) situa o Amazonas ainda como uma provncia, como (...) um mundo anestsico, a rebarba da histria que, por uma linguagem diferente da metrpole, no repartiu a totalidade da herana comum (SOUZA, 1977, p. 28). Ao contemplar as duas afirmaes pode se inferir que de 1930 a 1970 nada mudou. Ser?Buscando responder tal pergunta analisaremos a formao do campo artstico e intelectual amazonense num perodo considerado pela historiografia regional como os anos da crise. Tratam-se do espao entre as dcadas de 1920 e 1960, entre a decadncia da economia extrativista centrada na borracha e a ascenso do capitalismo industrial atravs da implantao da Zona Franca de Manaus. Por conta do andamento de nossa pesquisa e pela vastido do tema oferecemos aqui um estudo de carter introdutrio, baseado na anlise de farta produo memorialstica e acadmica.O ARTISTA SO OS OUTROS: UMA PERSPECTIVA TERICASobre nossa filiao terica, acredito que o termo campo artstico e intelectual j d uma boa pista. A proposta de Pierre Bourdieu cativa por propor uma conciliao entre duas vises antagnicas no que tange ao mundo artstico: a primeira (adotada principalmente por boa parte dos artistas), que o concebe como uma realidade apartada da realidade social, e a segunda (e aqui se inscreve uma vertente do marxismo que tem Lukcs como seu maior representante) que o enxerga como apenas mais uma engrenagem das superestruturas. Adotar a perspectiva da arte pela arte significa, para Bourdieu, perpetrar uma ocultamento das tenses sociais que so inerentes a qualquer grupo social. E compreender a arte como subproduto da ideologia capitalista negar uma srie de peculiaridades presentes nesse setor. Por isso, seus conceitos de campo artstico e habitus cumprem uma funo essencial de reforar a pluralidade de valores e prticas que a vida artstica possui. Bourdieu designa como campo um universo relativamente autnomo com relaes especficas, mas que disfaram as relaes objetivas (as relaes sociais). Estas relaes especficas seriam reguladas por disposies construdas historicamente e interiorizadas (BOURDIEU, 2010, pp. 65-66). Em outras palavras, o habitus seria a reunio das leis do campo artstico. Esses so os critrios com o qual a produo artstica dialoga. Aos artistas caberiam mil estratgias e prticas para legitimar sua obra, ou seja, conquistar uma posio invejvel nesse campo, que nem sempre significa ter sucesso financeiro[footnoteRef:2]. [2: Segundo Roger Chartier, Bourdieu identificou nos campos culturais duas caractersticas peculiares: Primeiro, esse status de mundo econmico invertido, onde as aes so gratuitas e no visam o lucro; segundo, a sua poderosa capacidade de auto-reflexo e conscincia de si. CHARTIER, 2002, p. 141.]

Guiado pelo intento de produzir uma abordagem que abarcasse a complexidade da arte e da realidade social, Bourdieu produz uma reflexo original e de fundamental importncia para a historiografia da arte, como salienta o historiador Roger Chartier:A obra, o artista, o filsofo s existem dentro de uma rede de relaes visveis ou invisveis que definem a posio de cada um em relao posio dos outros, ou seja, a uma posio social, em relao a uma posio esttica. E me parece ser esta uma linha essencial do trabalho de Bourdieu: sempre pensar as relaes que podem estar visveis nas formas de coexistncia, de sociabilidade, ou de relaes entre indivduos, ou ainda de relaes mais abstratas, mais estruturais, que organizam o campo (...) da produo esttica, filosfica, cultural num momento e lugar dados (CHARTIER, 2002, p. 140).Compreendendo a arte como uma tessitura coletiva entre o universo esttico e o mundo social, Bourdieu nos fornece uma importante orientao para pensar os artistas amazonenses: precisamos entender este campo como um espao que, atravs de um processo scio-histrico, se constri em meio lutas e tenses sociais. Estes embates definem e redefinem o que a arte amazonense deveria ser, como veremos a seguir.ERA UMA VEZ UMA CIDADE ESTAGNADA...Na historiografia amazonense, tradicionalmente se constituram dois marcos: primeiro, o perodo ureo da borracha e, em segundo lugar, o perodo subsequente geralmente considerado como os anos da crise. Trataremos aqui rapidamente da construo e desconstruo desses momentos-chave da historiografia regional.O Amazonas, alado condio de provncia em 1850, comea a se desenvolver nessa mesma dcada graas normatizao da navegao vapor. Na lista de produtos exportados dessa regio, a borracha ainda tinha uma presena tmida. O boom da borracha se inicia entre 1880 e 1900, em meio a expanso da indstria de pneumticos. Manaus j tinha uma forte tradio como cidade porturia, mas com a riqueza do ouro negro ela se modifica radicalmente.Manaus foi uma das poucas cidades brasileiras a ter vivenciado a belle poque, quando, ao finalizar o sculo 19, passou a usufruir dos benefcios que a sua prspera situao financeira permitia. Toda riqueza da regio era proveniente de uma s fonte a borracha e o lucro proveniente da comercializao deste produto sustentou um amplo e frgil imprio, gerando uma nova condio econmica que repercutiu em todos os setores da sociedade amazonense. (...) Nesse sentido, Manaus sofreu uma mudana radical em sua visualidade, sua populao foi ampliada com a introduo de elementos e costumes de procedncias diversificadas, aliados a outros fatores (MESQUITA, 2006, p. 142).Contudo, a Primeira Guerra Mundial atrapalharia a pauta de exportaes amaznicas. Alm disso, sementes de seringueira haviam vingado na sia. Em pouco tempo, a produo asitica superou brasileira lanando o Amazonas e o Par em meio grande crise. Assim sendo, a partir da dcada de 1910, Manaus encontra-se completamente estagnada, at que em 1967 o Estado encontra uma nova atividade econmica capaz de tir-la do maramos. Trata-se da industrializao, incentivada pelo governo atravs da instalao da Zona Franca de Manaus. Em poucas linhas, essa a narrativa tradicional que encontramos sobre a primeira metade do sculo XX no Amazonas. Recentemente, muitos historiadores e demais pesquisadores das Cincias Sociais dedicaram uma ateno especial em revisitar esses momentos histricos demonstrando que nem tudo era ureo e muito menos estagnado.No que tange aos pouco explorados anos da desolao, so essenciais os trabalhos de Jos Aldemir de Oliveira, Manaus de 1920 a 1967: A Cidade Doce e Dura em Excesso, e Jos Vicente de Aguiar, Manaus: Praa, Caf, Colgio e cinema nos anos 50 e 60. Ambos relativizam a imagem cristalizada de um intervalo de tempo pautado pela imobilidade ao demonstrarem que havia uma movimentao cultural e social prpria em Manaus.Jos Aldemir Oliveira ocupa-se da relao entre os homens e o meio urbano, enxergando a construo do espao como um esforo cultural eivado de tenses sociais. Os festivais folclricos realizados no ms de junho, por exemplo, mobilizavam toda a cidade. Cada quadrilha de cada bairro competia pelo ttulo de campe. No entanto, a partir de 1970, o evento vai sendo empurrado para locais mais distantes pelo poder pblico at que boa parte de sua popularidade decai. Eis, portanto, um bom exemplo dessa tenso social na construo da espacialidade: o poder pblico, comprometido com o aparelhamento da cidade para a implantao do capitalismo industrial, desmobilizando prticas populares.Jos Vicente Aguiar lembra que tambm no se poderia falar de estagnao no meio cultural destacando a importncia de um quadrante urbano em especfico. A regio compreendida pela Praa Heliodoro Balbi (mais conhecida como Praa da Polcia), o Colgio Estadual D. Pedro II, o Caf do Pina e o Cinema Guarani, para o autor, encarada como um verdadeiro complexo de oxigenao cultural. O ensino humanista, a boemia, a sensibilidade cinematogrfica e a sociabilidade ofertada pela praa alimentariam inclusive movimentos artsticos (AGUIAR, 2002, p. 155).A concluso para o qual ambos parecem confluir de que o manto da estagnao encobre uma cidade com um ritmo dos mais ricos. Fica claro, ento, que as narrativas tradicionais, tanto da Belle poque manauara quanto da grande crise, foram construdas por uma elite urbana fortemente apoiada no extrativismo que, desconsiderando a condio dos demais grupos sociais, classificou esse momento com base na sua condio em especial, qual seja, a crise econmica. Nunca demais lembrar, portanto, que (...) da mesma maneira que a cidade no produzida de modo equnime, a crise no pode ter o mesmo significado para o conjunto de seus moradores (OLIVEIRA, 2003, p. 137).CAMINHOS VENTUROSOS: IMPRENSA, EDUCAO E POLTICAAo investigar as razes do periodismo amazonense, a historiadora Maria Luza Ugarte Pinheiro encontra no processo de aparelhamento da provncia do Amazonas a origem da expanso da cultura letrada e, por conseguinte, impressa (PINHEIRO, 2001, p. 43). Expanso essa tmida, mas que com o boom da borracha toma novos contornos. Pinheiro, no entanto, foca sua anlise para as pequenas folhas e revistas que aps a crise da borracha em 1910 se difundem. Alm de permitirem a participao de setores mais populares, os peridicos tambm eram importantes veculos de cultura (CRUZ, 2000, p. 81).Afinal, em um pas onde os livros constituam mais um artigo de luxo trazido pelas casas importadoras no poderia ser diferente; as primeiras editoras de sucesso no Brasil datam de 1930 e 1940. Em Manaus, os livros ainda eram financiados pelo Estado ou pelo prprio autor, sendo impressos em pequenas tipografias. Talvez o empreendimento de Jos Srgio Cardoso, j nos anos 50, seja o mais prximo de uma tentativa de se efetivar um mercado editorial no Amazonas (VASCONCELOS, 2011, p. 268).Outra importante dimenso o ensino. A formao de muitos membros da elite urbana amazonense foi realizada ou no Rio de Janeiro ou no exterior durante boa parte do perodo ureo da borracha. O contraste entre o ambiente cosmopolita em que estudaram e o cenrio limitado em que atuariam um ponto a se considerar na construo do discurso do provincianismo amazonense. Ainda que o Amazonas seja precoce no que tange histria da universidade no Brasil, a Universidade Livre de Manas (fundada em 1909) esfacelou-se aps a grande crise sobrevivendo apenas alguns cursos como a Faculdade de Direito, Odontologia e Farmcia. Dado ainda a predominncia do bacharelismo, no raro encontrarmos em vrios crculos culturais muitos artistas e intelectuais diplomados em Direito[footnoteRef:3]. [3: Com base num levantamento preliminar, podemos citar: daqueles ligados Academia Amazonense de Letras e ao Instituto Geogrfico Histrico do Amazonas temos Pricles Moraes, Waldemar Pedrosa, Aderson Menezes, Aderson Dutra, Geraldo Pinheiro, Lenico Salignac Souza, Andr Arajo, Mirthrades Corra, Arthur Czar Ferreira Reis e Oyama Ituassu; j entre aqueles pertencentes ao Clube da Madrugada entre 1950 e 1960 temos Francisco Vasconcelos, Alusio Sampaio, Carlos Gomes, Benjamin Sanches, Ernesto Pinho Filho, Sebastio Nores e Raimundo Theodoro Bottinely.]

O ensino secundrio representava uma porta de entrada e, posteriormente, uma promessa de estabilizao aos homens de letras do Amazonas. A expanso de instituies de ensino, iniciada em meados do sculo XIX, legou o Ginsio Amazonense D. Pedro II e o Colgio Dom Bosco, duas entidades para as quais afluram os filhos dessa aristocracia falida. Ali, por iniciativas dos professores ou alunos, fundaram-se grmios literrios e jornais estudantis[footnoteRef:4]. [4: Sobre a intelectualidade estudantil ver LIMA, 2012.]

O fato de muitos desses artistas se sustentarem no mais exclusivamente de seus cargos polticos, como faziam os intelectuais do Imprio, mas de sua produo simblica seja em artigos nos jornais, em peas de publicidade para as empresas e o governo ou ministrando aulas nas instituies de ensino marca uma ruptura. Estamos falando aqui da profissionalizao do intelectual, iniciada para Srgio Miceli durante a Repblica Velha por conta de um grupo de artistas que ele chama de anatolianos devido admirao que cultivavam pela arte francesa (MICELI, 2001, p. 54).Ora, os anatolianos tinham conscincia da marginalidade em que se encontram diante da Repblica Mundial das Letras e, mais que isso, no interior da prpria sociedade brasileira: afinal, em sua maioria so oriundos de famlias tradicionais em decadncia. Com as portas da poltica fechadas para esses segmentos sociais, restavam procurar alternativas na imprensa, na literatura ou na educao. Contudo, talvez melhor seja dizer que as portas da poltica permaneciam entreabertas, uma vez que a expanso da cultura letrada corre em paralelo com a constituio de uma burocracia estatal.Na Manaus de 1910 podemos encontrar dois exemplos interessantes: enquanto o jornalista e escritor negro Alcides Bahia posicionava-se como porta-voz de faces polticas como a famlia Nry, atuando inclusive como assessor durante seu governo, o mdico e tambm escritor Adriano Jorge havia sido eleito deputado federal apoiando a campanha civilista de Ruy Barbosa. Na mesma dcada, em meio crise poltica que culminou com o bombardeio da capital amazonense pela Unio, Adriano Jorge pegaria em armas para lutar contra Silvrio Nery enquanto Bahia defendia seus compadres nas pginas da Folha do Amazonas (BRAGA, 2011, p. 42; BRITO, 2011, pp. 26-27).Entre as dcadas de 1910 e 1920, o Amazonas permeado por uma srie de incidentes polticos, frutos de lutas no interior das oligarquias locais. O cume do descrdito popular para com a poltica tradicional viria em 1924, com o sucesso (efmero) da rebelio tenentista. No de se admirar que em 1930 ascenda ao poder estadual o escritor e poeta lvaro Maia, que em seu poema Cano de F e Esperana conclama que o povo e a elite amazonense se unam para modernizar um Amazonas negligenciado pelos arranjos da Repblica do Caf com Leite. Sob os auspcios de Getlio Vargas, Maia seria nomeado interventor federal novamente entre 1935 a 1945 (BITTENCOURT, 1973, pp. 62-64). H tambm o caso do historiador Arthur Czar Ferreira Reis, indicado para governar o Amazonas em 1964 pelo prprio Marechal Castelo Branco, mas voltaremos a ele mais tarde.IMORTAIS BARS[footnoteRef:5] E CAVALEIROS DE TODAS AS MADRUGADAS [5: Este o nome de uma das muitas etnias que viviam onde hoje se localiza a cidade de Manaus que com o decorrer do tempo transformou-se em sinnimo de manauara.]

O mdico Djalma Batista numa srie de ensaios (Cultura Amaznica: Um ensaio de interpretao) publicados na dcada de 1950 fala de duas geraes que estavam tentando salvar culturalmente o Amazonas, apesar dos trancos e barrancos (BATISTA, 2006, p. 77). Ao que se conclui, ele est falando dos artistas reunidos ao redor da Academia Amazonense de Letras (AAL) e do Clube da Madrugada (CM), respectivamente. Acreditamos que a precariedade da consolidao desses grupos enquanto centros, mesmo da AAL, no permita que se fale em movimentos monolticos e irreconciliveis. Contudo, inegvel que durante um momento ambos estiveram em confronto.Acalentou-se por muito tempo a ideia de fundar uma academia de letras em solo manauara at que em 1918 a iniciativa efetivada. possvel falar de um ecletismo no interior da agremiao, onde a literatura romntica e a poesia simbolista encontravam boa acolhida. Apesar de cultivarem o preceito da arte pela arte, os imortais tambm se ocupavam de debater os grandes problemas amaznicos a formao de um campo de saber interdisciplinar com o sugestivo nome de Amazonologia pelos intelectuais reunidos no s na AAL, mas no Instituto Geogrfico e Histrico do Amazonas merece um estudo parte.Em 1954 na Praa da Polcia nasce o Clube da Madrugada, fruto de inquietaes de jovens bomios inspirados pelo modernismo. Importante dizer que muitos deles anos antes simpatizavam com o beletrismo: Os grmios literrios estudantis, de onde saram, homenageavam lvares de Azevedo, Castro Alves, Gonalves Dias e Olavo Bilac (SILVA, 2011, p 13).No se pode creditar ao distanciamento geogrfico toda a culpa pelos ecos tardios da Semana de Arte Moderna de 1922. preciso considerar a articulao entre esse grupo artstico hegemnico e a rede de ensino em que atuavam: Logo no se pode compreender inteiramente o funcionamento e as funes sociais do campo de produo erudita sem analisar as relaes que mantm, de um lado, com as instncias, os museus, por exemplo, que tem a seu cargo a conservao e, de outro lado, com as instncias qualificadoras, como por exemplo o sistema de ensino, para assegurar a reproduo do sistema de esquemas de ao, de expresso, de concepo, de imaginao, de percepo e apreciao objetivamente disponveis (...) (BOURDIEU, 2009, p. 117).O contato com a nova literatura brasileira se deu em uma srie de viagens que alguns destes jovens realizaram entre 1951 e 1952 Porto Alegre e ao Rio de Janeiro. Em novembro de 1955, na Revista Madrugada (que possuiu apenas uma edio), estes jovens publicam seu Manifesto: O Manifesto Madrugada, partindo do status quo, mediante constatao de que as atividades culturais, no Amazonas, sofriam um atraso de meio sculo, radicaliza em vrios pontos o comportamento intelectual de seus afoitos signatrios, que o redigiram numa hora de entusiasmo (...). Urgia, pois, fazer um manifesto (TUFIC, 1984, pp. 27-28).Ao CM caberia, portanto, a tarefa de colocar o Amazonas no rumo da evoluo artstica nacional, introduzindo os ideais modernistas principalmente na literatura e nas artes plsticas. O que significava produzir uma arte condizente com a realidade local, ou seja, re-descobrir a Amaznia atravs de sua prpria linguagem (TUFIC, 1984, p. 46). Evidente que a AAL figuraria, para os clubistas, como o reduto maior do provincianismo dada a sua histrica hostilidade para com o modernismo basta lembrar que um de seus mais destacados membros, o fillogo Joo Leda, reuniu uma multido para vaiar e desmoralizar Mrio de Andrade quando de sua visita cidade em 1927 (SILVA, 2011, p. 11).A prpria atitude menos despojada que os clubistas mantinham (as reunies na praa, as exposies de artes plsticas ao ar livre) tambm representava um confronto para com a dinmica mais restrita da produo dos acadmicos. preciso lembrar ainda que a figura do nacional-popular passa a ser recorrente no pensamento nacional, espraiando-se para o terreno da economia (nacional-desenvolvimentismo) e da poltica (populismo) (PCAUT, 1990, p. 105). No Amazonas o trabalhismo, atravs de Plnio Coelho e Gilberto Mestrinho, passa a ganhar terreno nas eleies de 1954. Ainda que seja tentador estabelecer uma conexo entre o CM e o trabalhismo, difcil reconhecer o movimento como uma voz unssona no que tange poltica: podemos encontrar entre suas fileiras desde monarquistas como Luiz Bacellar at comunistas como Theodoro Bottinely[footnoteRef:6]. Entretanto, muitos de seus fundadores creditavam ao movimento um fundo social bastante ntido quando afirmam que se tratava de uma literatura de classe mdia, mas onde j se nota a presena do homem na porta das fbricas, nos sindicatos e no cais, lutando pelos seus direitos (TUFIC, 1984, p. 47). Assim, a luta esttica assume contornos de luta de classes. [6: Conexes entre o Clube da Madrugada e o trabalhismo podem ser encontradas tanto no ensaio de Mrcio Souza quanto na dissertao de Arcngelo da Silva Ferreira.]

No entanto, acredito que seja necessrio perguntar se realmente havia uma classe mdia envolvida no Clube da Madrugada. Ou seria esse um trao colhido do discurso modernista que tanto encantavam os clubistas? preciso lembrar que apesar de declararem filiados ao movimento nascido em 1922, sua produo est em maior sintonia com a Gerao de 1945, conhecida por rejeitar alguns preceitos de seus predecessores (PINTO, 2012, p. 150). Ou seja, de que modernismo estamos falando? Inmeras so as perguntas e acredito que ainda estou longe de respond-las adequadamente. O que importa por hora reconhecer que o CM mobilizou recursos os mais variados para alcanar sua legitimidade enquanto grupo artstico.Desde os mais tradicionais, como a imprensa, at os mais recentes naquele momento, como o rdio e o cinema. Central nesse processo a figura do escritor Alusio Sampaio, eleito lder do movimento entre 1961 a 1964. Sampaio, por meio de seus contatos, consegue um espao para o CM nas pginas de um jornal de grande circulao, O Jornal: o Suplemento Madrugada durou por 10 anos. Alm disso, havia o programa Dimenses na Rdio Rio-Mar, mantido com a ajuda do radialista e clubista Eramos Linhares. Quanto ao cinema, o CM estabeleceu contato com os cineclubes que proliferaram pela cidade no comeo da dcada de 1960. Alguns de seus eventos, como a II Feira de Artes Plsticas, foram filmados por estes jovens amantes do cinema.Outro ponto essencial era o intercmbio mantido com grupos artsticos de outros centros culturais, como Braslia e Fortaleza. Colaboraes eram sempre remetidas ao Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, considerado ento como um dos maiores rgos de divulgao cultural do Brasil. Assim, no surpresa que em 1966 mesmo o padre Raimundo Nonato Pinheiro, ardoroso defensor da Academia Amazonense de Letras, reconhea o mrito do Clube da Madrugada: Como quer que seja, entendo que a linha do Clube da Madrugada no deve ser a de oposio Academia Amazonense de Letras. Ambas as entidades devem visar ao incremento literrio e artstico, tendo em mira o progresso cultural do Amazonas (PINHEIRO, 1966). Alm disso, em 1969, os poetas Elson Farias e Jorge Tufic unem-se ao cl de imortais bars.Ainda assim pairava sobre os clubistas uma longa lista de eptetos em sua maioria, depreciativos como rebeldes sem causa ou bomios pretensiosos. Aps 1964 seriam acrescentados mais alguns: comunistas e subversivos. Conforme Tufic:Tiveram, pois, que bater no Amazonas cata de subversivos, onde vieram encontrar, numa lista previamente confeccionada, o nome de um Clube que cheirava a clula comunista. Tanto bastou para que a chancela madrugada entrasse como tema obrigatrio dos ipes-emes[footnoteRef:7], mediante a priso de clubistas indiciados (TUFIC, 1984, p. 58). [7: Inquritos Policiais Militares, institudos por decreto-lei no dia 27 de abril de 1964.]

Exemplo maior dessa perseguio pode ser o caso do padre e tambm poeta do CM, Luiz Ruas. Preso nos momentos iniciais do novo regime no 27 Batalho de Caadores, l traduziu o livro de Rimbaud, Uma Temporada no Inferno (FARIAS, 2006, p. 67). Contudo, aps Arthur Reis ser indicado governador o relacionamento tanto da AAL quanto do CM com o governo melhoram. O historiador pretendia sincronizar os planos de modernizao do Estado (compreendendo aqui, entre outras medidas, a implantao da Zona Franca de Manaus) com o desenvolvimento cultural, por isso investiu em concursos (prmio Estelita Tapajs), publicaes (srie Edies Governo do Estado) e at mesmo vdeos promocionais Trata-se de Amazonas, Amazonas (1966), dirigido por um Glauber Rocha muito contrariado.Seu sucessor, o empresrio Danilo de Mattos Areosa, seguiria a poltica cultural esboada pelo historiador, que havia migrado para a presidncia do recm-criado Conselho Federal de Cultura. Em 1967, o Seminrio de Reviso Crtica da Cultura no Amazonas organizado pela Secretaria de Cultura e conta com a participao de membros tanto do Clube como da Academia. Das discusses no Seminrio nasce a proposta da Fundao Cultural do Amazonas, destinada a incentivar os eventos artsticos e folclricos. Areosa oficializaria a Fundao alguns meses depois (FARIAS, 2006, pp. 109-111).Parece contraditrio que o Estado tenha assistido o campo artstico amazonense justamente num momento de grande represso e censura, realizando o que tanto os imortais quanto os clubistas clamam h anos: uma poltica cultural. Entretanto, a poltica cultural prometida pelos governos de Reis e Areosa no vingou, sendo a Fundao Cultural extinguida anos depois (TUFIC, 1984, p. 62).Longe de representar uma concesso de homens sensveis s causas artsticas, as aes de Reis e Areosa eram realizadas de acordo com uma linha de pensamento esposada por parte das classes responsveis pelo golpe de que a cultura precisava ser normatizada. Os elementos influenciados pelo comunismo ou pelo trabalhismo seriam evitados, embora a cooptao tambm faa parte desse plano afinal, o novo regime necessitava de legitimidade simblica imediata. Alm disso, havia um mercado cultural em expanso no pas em 1964 e a modernizao encetada pelo regime que veio a seguir no inibiu este movimento, mas trabalhou para control-lo. Enquanto a arte subversiva era expurgada por meio da censura, as demais eram regulamentadas.A partir de 1964 so baixadas inmeras leis, decretos-leis, portarias, que disciplinam e organizam os produtores, a produo e a distribuio dos bens culturais regulamentao da profisso de artista e de tcnico, obrigatoriedade de longas e curtas-metragens brasileiros, portarias regularizando o incentivo financeiro s atividades culturais etc. O Estado promove ainda reunies de empresrios, da rea pblica e privada, como o Encontro dos Secretrios de Cultura ou o Congresso da Indstria Cinematogrfica Brasileira. Dessa rede de atividades, interessante notar que as crticas ao controle estatal tenderam a se dirigir quase que exclusivamente ao aspecto da censura (ORTIZ, 2012, p. 89).Acredito que aqui exista uma confluncia entre um governo decidido a controlar este meio e artistas ansiosos para conferir maior legitimidade seu ofcio. Nem todos agiam em conformidade ideolgica com o regime. Um grupo em especial construiu sua identidade em contraponto essas medidas culturais oficiais: so os jovens que ao final da dcada de 1960, influenciados em parte pela contracultura, formam grupos de teatro experimental e ajudam a definir o que conheceramos como Poesia Marginal.A CONSCINCIA DA PEQUENEZ OU DURO SER ARTISTA NOS TRPICOSAs desvantagens de ser artista em Manaus entre 1920 e 1960 no cansam de ser citadas pelos mais variados nomes. Djalma Batista, por exemplo, no j mencionado ensaio elenca um rol assustador de condies desfavorveis: o isolamento geogrfico, a precariedade dos servios urbanos (a m iluminao, falta de gua, racionamento de alimentos), escolas e colgios em frangalhos, a defasagem nas informaes sobre o mundo e as grandes ondas de migrao para os grandes centros. Em suma, a falta de estmulo e a necessidade imperiosa de ganhar a vida so os dois grandes fatores responsveis pela manuteno do provincianismo (BATISTA, 2006, p. 83).Aqueles que mesmo cientes de todos esses obstculos ainda se aventuram a produzir arte no Amazonas so para o bom doutor verdadeiros heris. Diante da fragilidade do seu meio, estes homens lanam mo de inmeras estratgias para viabilizar seus projetos. A mais comum em todo esse perodo foi a aproximao com grupos sociais relativamente poderosos como o empresariado, a Igreja Catlica e principalmente o Estado. Vejamos o caso do Teatro Escola Amazonense de Amadores fundado por Gebes de Mello Medeiros em 1944, sob os auspcios do Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo: Ressurge, em 1959, sob o patrocnio e com todas as benesses do novo governador, Gilberto Mestrinho. Em 1964, quando o grupo recebe voz de priso em Macap, pela encenao de A Prostituta Respeitosa, so figuras bem conhecidas do governo militar que socorrem os artistas: Jarbas Passarinho, no Par e Arthur Csar Ferreira Reis, no Amazonas, que haviam apoiado oficial e financeiramente a viagem do grupo (AZANCOTH, COSTA, 2002, p. 17).O poeta Elson Farias fala da falta de apoio oficial que os clubistas sentiam. Cita o caso do livro Frauta de Barro do poeta Luiz Bacellar, premiado no Rio de Janeiro em 1959, mas que s foi publicado em 1963, aps passar pelas editoras So Jos e Srgio Cardoso e por dois rgos estaduais de governadores diferentes (FARIAS, 2006, pp. 107-108). Djalma Batista atribui Academia Amazonense de Letras (a qual presidiu entre 1967 e 1968) um papel essencial na promoo de concursos literrios, ciente de que estariam bem amparados nessa empreitada: No Silogeu alegar-se- falta de recursos. Mas diremos: nada tinha a Academia, e o interventor Nelson de Mello, em 1934, deu-lhe um prdio e instalaes, que o governador Leopoldo Neves restaurou, em 1950. No h presentemente saldo em caixa, mas qualquer Governo do Estado alcanar a extenso da proposta (BATISTA, 2006, p. 93).De uma gerao posterior ao CM, Mrcio Souza tece em seu livro um longo manifesto contra o provincianismo motivado pela perda trgica do amigo, o pintor Hanneman Bacellar. O garoto negro e pobre que tinha sido relevado como um talento promissor em uma das Feiras de Artes Plsticas do Clube da Madrugada suicidou-se em Belm em 1971, aps agredir seus parentes. A obra de Bacellar, radical em sua essncia, foi desqualificada pela opinio pblica, fundamentada em uma mentalidade que, no dizer de Souza, enxerga a arte nunca como trabalho, mas como ornamento (SOUZA, 1977, p. 27). Bacellar ao recusar ser enfeite afastou-se das franjas da cooptao e com isso pagou o preo da marginalizao, preo a que nenhum artista estaria imune: E lembramos de Hanneman atravessando para sempre a calada do Palcio Rio Branco, em Manaus, segurando sua tela Cafun. Esta cena sempre poder se repetir, assim como o seu ltimo ato, com qualquer artista perseguido (SOUZA, 1977, p. 21).Temos aqui, portanto, exemplos de segmentos mais e menos prximos dos jogos do poder. A ambgua relao com o Estado no privilgio apenas destes homens que se dizem encarcerados em um horizonte pouco atraente, mas de artistas e movimentos no pas inteiro. Ela se deve em parte s suas conexes com a elite dirigente, mas tambm com suas pretenses ideolgicas, como o pesquisador Daniel Pcaut afirma ao analisar a principal semelhana entre a gerao de 1930 e a de 1960:Tanto uns como outros se consideravam responsveis pela organizao racional da esfera social. Esse encontro no decorre do fato de que os que agem diretamente sobre a sociedade estejam convencidos de que somente o Estado pode promover as mudanas necessrias. Decorrem do fato de se situarem muito naturalmente, ainda que com posies diferentes, num plano acima do social, e de se considerarem co-autores da produo das representaes do plano poltico (PCAUT, 1990, p. 184).No plano amaznico, essa construo de realidades racionais (e ideais) parte sempre da constatao de uma realidade indesejada, qual seja, o provincianismo e a crise econmica. Chega ao ponto de Djalma Batista sugerir um projeto de desenvolvimento regional atravs da dialtica entre campo intelectual e econmico. A lgica de seu discurso bem compreensvel: o Amazonas se encontra rebaixado econmica e intelectualmente, para tanto preciso quebrar a mentalidade de sua elite por meio do conhecimento e da arte para que se formem quadros comprometidos com a poltica de valorizao da Amaznia (BATISTA, 2006, p. 90).H mudanas substanciais no campo artstico e intelectual amazonense entre 1930 e 1960, com a formao de novos movimentos e novas articulaes com grupos sociais distintos, mas essa persistncia na enunciao do provincianismo pode apontar inmeras possibilidades de interpretao. Talvez por conta da fora desta barreira material e mental, as mudanas paream se realizar com um ritmo prprio, mais lento, o que pode dar a impresso de que anda mudou. Contudo, tambm podemos estar falando de uma estratgia discursiva das mais bem elaboradas: afinal, cada artista e cada grupo precisam dimensionar a sua importncia histrica e nada melhor que eleger uma tradio consolidada ou uma dificuldade de grandeza maior como inimigo. Em seu Manifesto, o CM se prope a reatualizar o Amazonas artisticamente. Mrcio Souza em seus ensaios no desconsidera a validade da iniciativa do Clube, mas este optou pelo legalismo e com isso (...) secou seus impulsos bsicos e fez o movimento girar nos eixos saindo da posio contestadora e crtica par ao nvel incuo da boemia a gravitar na ordem do poder (SOUZA, 1977, p. 152). A obra, tanto escrita como teatral, de Mrcio Souza representaria esse sopro de vida. Assim sendo, cada qual reivindica a si um lugar ao sol na eterna luta contra o provincianismo. H tambm que se considerar a fertilidade desse tema na produo artstica desses movimentos. Afinal, no podemos esquecer que o esforo de transpor os limites esterilizantes da provncia pode ser a matria prima inicial desses autores e no apenas retrica ou subsdio para projetos ideolgicos. Estamos falando aqui de algo mais profundo, de uma condio existencial especfica motivando a produo artstica como sugere Selda Vale Costa:Talvez se trate mais de visualizar a provncia como espao cultural e evidenciar que o insulamento, o sentir-se s, abandonados pelo governo federal, pelo Brasil, essa temtica-lamento constante, talvez seja mais uma armadilha, uma espcie de subterfgio, uma metfora para no se mirarem nem medirem seu prprio peso como intelectuais. Entretanto, esse ilhamento, real ou idealizado, cria as condies para uma migrao para dentro de si mesmos, certo ensimesmamento, que cria e recria, elabora e inventa uma ideologia da amazonidade (COSTA, 2007, P. 306).Fica assim perceptvel o quanto esse discurso ambivalente e quo complexo a esfera artstica e intelectual amazonense pode ser. Forjado em meio a interesses diversos, oscilando entre a retrica e a denncia, podendo ser entendido tanto em perspectivas ideolgicas como psicolgicas, o discurso sempre reiterado do provincianismo denunciador de um campo artstico rico e pouco estudado at agora.

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