HILA - Microensino

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    DOI: 10.4025/actascihumansoc.v31i1.1821

    Acta Scientiarum. Human and Social Sciences Maring, v. 31, n. 1, p. 33-41, 2009

    O microensino como instrumento de formao do professor deO microensino como instrumento de formao do professor deO microensino como instrumento de formao do professor deO microensino como instrumento de formao do professor de

    lngua portuguesalngua portuguesalngua portuguesalngua portuguesa

    Cludia Valria Don Hila

    Departamento de Letras, Universidade Estadual de Maring, Av. Colombo, 5790, 87020-900, Maring, Paran, Brasil.E-mail: [email protected]

    RESUMO. O objetivo deste trabalho, que se insere no grupo de pesquisa Gneros textuaise ferramentas didticas para o ensino-aprendizagem de lngua portuguesa (UEL/CNPq), apresentar parte de uma pesquisa acerca da importncia dos instrumentos de ensino para aformao do professor. Dentre estes, escolhemos o microensino por ser um dos maispresentes nas disciplinas prticas do curso de Letras. A fim de compreender o papel dessesinstrumentos, elegemos comocorpusos dirios escritos por trs estagirias, aps a realizaode sua experincia com o microensino, no ano de 2006. O referencial terico ancora-se naliteratura acerca da formao do professor, no Interacionismo Social e no InteracionismoScio-Discursivo. Os resultados, ainda no-conclusivos, tm demonstrado que osmicroensinos podem se constituir como verdadeiras ferramentas catalisadoras do processoreflexivo na formao inicial, mas dependem das mediaes realizadas pelos professoresformadores na conduo e avaliao desses instrumentos.Palavras-chave:formao inicial, microensino, mediao.

    ABSTRACT.Microteaching as a tool for the education of Portuguese languageteachers. As part of the research group Gneros textuais e ferramentas didticas para oensino-aprendizagem de lngua portuguesa (UEL/CNPq), this study aims to present partialresearch results on the importance of teaching tools for the process of becoming a teacher.Out of the tools available, microteaching was the one chosen because it is one of the most

    present in the practical disciplines/subjects in the Letters course. For a better understandingof the role of microteaching, the journals of three student-teachers, written after theirexperience with microteaching in 2006, were selected. The study is grounded on teachereducation, social interactionism and sociodiscoursive interactionism literature. Non-conclusive results have demonstrated that microteaching can be seen as a real catalytic toolfor the reflective process in pre-service education, but it is dependent on the mediation byteacher educators in the development and evaluation of this tool.Key words:pre-service education, microteaching, classroom interaction.

    IntroduoIntroduoIntroduoIntroduo

    A partir das reformas curriculares instauradas naltima dcada, nos cursos de licenciaturas, tem sido

    frequente, no mbito da formao inicial deprofessores, pensar em um currculo voltado,sobretudo, formao de um profissional crtico-reflexivo que: (a) privilegie a dicotomia teoria-prtica (OLIVEIRA, 2006; ABRAHO, 2002); (b)desenvolva a reflexo e a autonomia (BENEVIDES,2006; MAGALHES, 2004); (c) oportunize o realentendimento da configurao do trabalho doprofessor, com vistas a profissionaliz-lo(MACHADO, 2007).

    Nesse contexto, disciplinas com a finalidade da jconhecida Prtica de Ensino so trazidas para o inciodo curso, numa tentativa de fazer com que o professorem pr-servio experiencie, ao longo do curso (e no

    mais no seu final), situaes de sua prtica profissional.Todavia, apesar dessas transformaes de ordemestrutural e poltica, por muitos anos, predominou, nasinstituies, especialmente nas dcadas de 70 e parte de80 no sculo XX, uma formao eminentementeconteudstica e/ou tecnicista nos cursos de formao deprofessores (ABRAHO, 2002), deixando as chamadasdisciplinas prticas apenas para anos finais.

    Regra geral, no que concerne ao curso de Letras,essas disciplinas ou eram delegadas a professorescolaboradores, muitas vezes sem experincia e preparoterico-prtico para tal, ou ficavam para os professoresque estavam em incio de carreira nas instituiessuperiores, como ocorreu no meu caso. Em ambas assituaes, prevalecia muito mais a intuio, oempirismo nas aes em sala de aula, do que umafundamentao terica adequada para o exerccio do

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    professor-formador em ensinar a ensinar.Com a constituio das atuais Diretrizes

    Curriculares Nacionais para a Formao de professoresda Educao Bsica em nvel superior, aprovada em8/5/2001 e regulamentada na Resoluo no. 1, de 18 defevereiro de 2002, houve, definitivamente, nfase noschamados conhecimentos prticos, na integrao teoriae prtica docente, nos processos de transposiodidtica dos contedos, dentre outros, como eixosarticuladores dos novos currculos do curso de Letras.

    Esses novos eixos articuladores colocaraminmeros professores, novatos e no-novatos,colaboradores ou no, e tambm os j h mais tempoefetivos na academia, na funo agora de professorestambm formadores, sem que eles tivessem tidoalguma formao para essa funo. Questes do tipo:Como realizar a transposio didtica docontedo?, Como desenvolver uma posturareflexiva no aluno? Como ensinar a ensinar?,passaram, da conversa frequente apenas dosprofessores da antiga disciplina de Prtica de Ensino,a permear a discusso dos demais professores docurso de Letras, anteriormente, distantes de questesenvolvendo a formao terico-prtica.

    No ano de 2005, tais questes ficaram maisacirradas, medida que o novo Projeto Pedaggicode Letras (PPL, 2006) orientou que, desde o incio

    do curso, o aluno tivesse contato, em todas asdisciplinas, com a relao teoria-prtica docente:

    [...] o novo currculo prope que todos os seuscomponentes contemplem a reflexo e aplicaoprtica de questes voltadas ao exerccio da docnciadesde o primeiro ano do curso, propiciando que oprofessor em formao tenha mais tempo paradesenvolver sua postura crtica frente profisso quepretende desenvolver (PPL, 2006, p. 13).

    Nesse sentido, quais seriam os instrumentos queauxiliariam o professor-formador a promover areflexo no futuro professor? Pensando, sobretudo,

    nessa questo, no intuito de colaborar com demaisformadores acerca da reflexo sobre prticas einstrumentos de formao que possam promover areflexo e a transformao de professores e alunos,neste artigo, analisamos as funes do microensino (outambm conhecido na rea de lngua estrangeira porminiaula) na formao de estagirios de lnguaportuguesa.

    O referencial do trabalho ancora-se nos estudossobre a formao do professor, na Ergonomia doTrabalho (MACHADO, 2007; CLOT, 2006;

    AMIGUES, 2004; SAUJAT, 2002), noInteracionismo Social (BAKTHIN;

    VOLOSHINOV, 2003; BAKTHIN, 1992; 1975;

    VYGOTSKY, 1988) e no Interacionismo Scio-Discursivo (BRONCKART, 2003; 2006). Essasteorias tm em comum o fato de considerarem otrabalho como uma atividade mediada por

    instrumentos.Os procedimentos metodolgicos adotados

    foram: (a) leitura da bibliografia acerca domicroensino em lngua estrangeira; (b) adaptao dasfases do microensino de lngua estrangeira paralngua materna: (c) interpretao das funes domicroensino por meio da leitura e anlise de diriosde bordo, realizados por um trio de estagiriasescolhidas de forma aleatria (de uma turma de 12alunos), do ltimo ano da Habilitao nica-Portugus do curso de Letras, na disciplina Prticade Ensino de Lngua Portuguesa. Os sujeitos

    escolhidos no tinham experincias anteriores emensino.

    A questo da reflexo na formao inicialA questo da reflexo na formao inicialA questo da reflexo na formao inicialA questo da reflexo na formao inicial

    A formao reflexiva do professor tem sidoconsiderada essencial no decorrer da formaodocente (GIMENES, 2002; SCHN, 2000;LIBERALI, 1997; 1999; MAGALHES, 1998).

    Para Shulman (1987), o processo de reflexoenvolve aes, como reviso, reconstruo, reao eanlise crtica, feitas pelo prprio professor emrelao ao seu desempenho em sala de aula, com

    explicaes e justificativas baseadas em evidncias.De forma similar, Liberalli (1997) reitera que areflexo pressupe a transformao de uma situaoanterior (no desejvel em algum aspecto). Issosignifica, segundo a autora, tornar visveis as relaesideolgicas que sustentam aquela situao, para queas aes que ali ocorrem sejam devidamentecompreendidas e, quando necessrio, modificadas.

    Em alguns casos, isso implica, tambm, tornarexplcito (para posteriormente ser modificado) ohabitus (BOURDIEU, 1990), isto , o sistema dedisposies, de representaes e de aes adquiridas

    ao longo do tempo que podem fazer com que osindivduos se comportem de uma determinadamaneira em determinadas circunstncias.

    Na viso de Bakthin e Voloshinov (2003), essasrepresentaes ancoram-se em dois grandes grupos: naideologia do cotidiano (isto , toda atividade mentalcentrada na vida cotidiana e nas formas de expresso a elarelacionadas) e nos sistemas ideolgicos (fixados namoral social, na arte, na cincia e na prpria educao)historicamente cristalizados. Esses dois movimentos tmcarter eminentemente dialgico, ou seja, ambosinfluenciam as aes dos sujeitos e so ao mesmo tempoinfluenciados entre si.

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    No caso do professor, comum que a perceposobre suas aes esteja baseada apenas ou maisfortemente na ideologia do cotidiano, nas crenasque ele construiu ao longo de sua formao, queprecisam ser compreendidas e trazidas tona por ummediador mais experiente (professor-formador,pesquisador ou outro) para possibilitar a reflexo dasaes docentes, luz tambm do discurso cientfico.Para que isso ocorra, ser necessrio promover umdistanciamento do sujeito com o mundo real paraque ele possa ser, dessa maneira, ressignificado.

    Esse distanciamento implica um processo debusca interior que, gradativamente, faz com que oindivduo tome o que comum como estranho e, apartir da, possa desenvolver uma crescenteconscincia de si e do prprio mundo. A palavraautoritria, to presente nas esferas da religio, dapoltica, da moral, da cincia (que no conduz,portanto, reflexo), contraposta palavrainteriormente persuasiva que compreende anegociao, o dilogo, a contrapalavra e oentrelaamento de nossa palavras s palavras dooutro (BAKTHIN, 1975). nesse contexto que areflexo pode encontrar espao para serdesenvolvida.

    Tomando como partida os estudos vygotskianos,poderamos juntar a essa discusso que a ideia dereflexo est associada noo de autoconscincia.

    Vygotsky (1988) esclarece que so as palavras que,diferentemente dos animais, permitem ao homemdar forma sua conscincia, a qual se constitui pormeio da reestruturao interna das atividades sociaisou externas ao indivduo. Assim, refletir significa iralm do emocional, do no-consciente, mas gerar oracional e o consciente. Em outras palavras, significatransformar um processo interpessoal emintrapessoal (VYGOTSKY, 1988).

    Para o autor, portanto, o processo deinternalizao envolveria uma srie detransformaes: (1) uma operao inicialmente

    representada por uma atividade externa reconstruda e passa a ocorrer internamente, a partirde operaes realizadas com os signos; (2) umprocesso interpessoal transformado emintrapessoal, a partir, portanto, do social para oindividual, o que reitera a importncia dosinstrumentos de mediao; (3) A transformao deum processo interpessoal num processo intrapessoal o resultado de uma longa srie de eventosocorridos ao longo do desenvolvimento(VYGOTSKY, 1988, p. 64). Este ltimo aspecto,alis, chama-nos a ateno para o fato de queprecisamos de tempo para amadurecer e de que o

    aprendizado no ocorre em uma relao temporalcausal imediata.

    Para que esse processo ocorra, fundamental opapel do outro, pois a partir dele que temos a

    possibilidade de adquirir a conscincia de nsmesmos. A formao dessa conscincia, assim,necessita de mediadores, no ocorrendo ao acaso.Bakthin (1992) ressalta que, ao produzir umenunciado, o locutor espera do outro uma resposta,uma compreenso responsiva ativa. no encontroentre essas duas instncias locutor e destinatrio que a interao se realiza e que a tomada deconscincia pode emergir.

    Esse espao temporal ser essencial para quepossamos entender o que Bakhtin (1992, p. 405)define como processo de monologizao (que, para

    Vygotsky, concebido como internalizao): apalavra do outro se transforma, dialogicamente,para tornar-se palavra pessoal-alheia com a ajuda deoutras palavras do outro, e, depois, palavra pessoal(com, poder-se-ia dizer, a perda das aspas). Ooutro, nesse sentido, assume papel fundamentalcomo mediador desse processo, podendo ser oprprio professor, os colegas, ou mesmo uminstrumento de ensino.

    Refletir, portanto, pressupe quando pensamosno processo de formao docente, inevitavelmentetrabalho de co-autoria, de colaborao/negociaoentre os participantes de uma situao determinada(professores, alunos, pais, coordenadores) e deenvolvimento em discusses acerca de questes domundo real do professorando/professor (como o quesignifica ensinar e aprender as razes que justificamdeterminadas escolhas em sala de aula, quer quantoao contedo, aos materiais, s tarefas solicitadas,quer quanto disciplina e sua organizao ou,ainda, s representaes que os alunos tm de simesmos e dos outros). nesse quadro que as aespodem ser compreendidas, questionadas erepensadas (MAGALHES, 1998).

    O trabalho do professor como uma atividadeO trabalho do professor como uma atividadeO trabalho do professor como uma atividadeO trabalho do professor como uma atividadeinstrumentadainstrumentadainstrumentadainstrumentada

    As definies sobre o trabalho do professor, naperspectiva da ergonomia, so mltiplas e variadas.Machado (2007), em vista disso, conclui ser maisprodutivo considerarmos esse trabalho como umobjeto terico em (re)construo, multidimensionale polissmico.

    A pesquisadora, baseada em trabalhos deBronckart (2003; 2006), Clot (2006), Amigues(2004) e Saujat (2002), elenca algumas caractersticasdesse tipo de trabalho: (1) uma atividade situada,pois sofre interferncia do contexto mais imediato e

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    mais amplo (conforme VOLOSHINOV;BAKTHIN, 1976); (2) uma atividade pessoal e,ao mesmo tempo impessoal, pois, apesar de engajaro trabalhador em suas dimenses afetivas, fsicas,

    cognitivas, no se desenvolve de forma plenamentelivre, pois est atrelada a prescries internas (dainstituio escolar) e externas (documentos oficiais);(3) uma atividade prefigurada pelo trabalhador,pois ele reelabora as prescries que lhe so dadas deacordo com seus limites e seu contexto; (4) interpessoal, medida que envolve a interao comoutros indivduos presentes na situao; (5) transpessoal, no sentido de que orientada pormodelos do agir especficos da profisso; (6) conflituosa, j que o trabalhador precisa fazerconstantemente escolhas para (re)direcionar seu agir

    ante as prescries (seja em relao s prescries,aos instrumentos de ensino, ao agir dos outros etc.);(7) mediada por instrumentos materiais esimblicos, j que o trabalhador se apropria deartefatos socialmente construdos e disponibilizadospara ele no mbito da profisso ou da disciplina; (8) interacional, pois, ao agir sobre o meio com autilizao dos instrumentos (materiais ousimblicos), o trabalhador transforma esse meio e osinstrumentos, ao mesmo tempo em que por elestransformado; (9) pode ser fonte de crescimentopara novas aprendizagens ou fonte de impedimentoquando o trabalhador se v totalmenteimpossibilitado de agir, gerando o sofrimento, oestresse e a vontade de desistir da profisso.

    Dentre essas caractersticas, interessa-nos, nesteartigo, em especial, o papel dos instrumentos. Emrelao a eles, Amigues (2004) colabora com essadiscusso afirmando que a atividade do professor mediada por objetos ou ferramentas que auxiliam oseu agir. Dentre elas, destacam-se: (a) asprescries que orientam em boa parte o agir doprofessor, por exemplo, as escolhas de seus prpriosobjetos de ensino; (b) os coletivos, que sodimenses coletivas que interferem no agir doprofessor (no nosso caso, esse coletivo formadopelos professores de Prtica de Ensino); (c) as regrasdo ofcio, compreendidas como aquilo que liga osprofissionais entre si, que instauram umaconscincia comum entre si; (d) as ferramentas,que auxiliam o professor tanto na transposiodidtica, como na (re) configurao de sua prtica,desde as mais fsicas (como o quadro-negro, o livrodidtico) at as discursivas (as vrias formas deinterao presentes na sala de aula).

    Para entender melhor a noo de instrumento,Schneuwly (2004), com base em Marx, considera aao humana como tripolar, isto , envolve (1) o

    sujeito, (2) o objeto ou situao e (3) osinstrumentos de mediao. O instrumento faz amediao entre a atividade do sujeito e seu objeto.Quanto mais variada a utilizao de instrumentos,maior a chance de a atividade ser bem-sucedida. Porisso, o autor defende a ideia de que o instrumento,mais do que a materializao da ao, pode tambmmodificar o prprio sujeito, bem como a suapercepo em relao situao em que se encontra.

    No que diz respeito prtica docente,Schneuwly (2000) considera que essa prtica vistacomo um processo de dupla semiotizao: de umlado, presentificada por meio de tcnicas de ensinoe materializada por meio de objetos, folhas,exerccios; de outro, esse objeto topicalizado nasaes discursivas do professor. Assim, a noo deinstrumento abarca tanto os elementos materiais(textos, folhas, esquemas e projetos de ensino),como os discursivos (explicaes orais, sessesreflexivas, debate e seminrios).

    No caso especfico da disciplina Prtica deEnsino de LP (e tambm de lngua estrangeira), nocurso de Letras da Universidade Estadual deMaring, inmeros instrumentos de ensino soutilizados pelos professores que fazem parte dessecoletivo, dentre as quais: (1) planos de aula; (2)dirios (introspectivos, de leitura, de aprendizagem);

    (3) sesses reflexivas; (4) estudos de caso; (5) anlisereflexiva de aulas; (6) sequncias didticas e projetosde ensino e (7) o objeto deste artigo - o microensino.Sobre ele trataremos na prxima seo.

    O microensino no contexto da disciplina de prticaO microensino no contexto da disciplina de prticaO microensino no contexto da disciplina de prticaO microensino no contexto da disciplina de prtica

    ensino de lngua portuguesaensino de lngua portuguesaensino de lngua portuguesaensino de lngua portuguesa

    Foi na literatura acerca da formao do professorde lngua estrangeira que buscamos a base inicialpara a constituio dos microensinosespecificamente de lngua portuguesa no curso deLetras.

    O microensino ou micro-teaching, desenvolvido nadcada de 1960, tinha como funo bsicapossibilitar ao futuro professor a vivncia de umaprtica simulada de um determinado contedo ouhabilidade de lngua estrangeira. Wallace (1991,p. 93) concebe esse gnero composto por quatrofases:

    1) Orientaes preliminares (Briefing):momento em que o estagirio recebe as orientaesdo professor-formador sobre a elaborao domicroensino, o contedo a ser trabalhado, sua formade organizao e de durao.

    2) Miniaula (que ns denominamos demicroensino): quando o estagirio ministra parte de

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    uma aula para seus colegas (ou para a prpria sala emque far o estgio).

    3) Crtica: o momento em que se faz ovisionamento da aula, quando gravada, e so feitas as

    discusses, avaliaes.4) Reapresentao da aula (Reteach): momento

    em que o estagirio, aps ter sido exposto aoscomentrios e crticas, refaz a aula e a ministranovamente.

    Allen e Wai-Ping (1996), considerado um dosfundadores desse instrumento, desenvolveu ummodelo de microensino denominado de 2+2, como seguinte funcionamento: um trio deprofessorandos ministra durante 5 minutos umalio que envolve uma habilidade lingusticaespecfica; estes so observados pelo professor

    supervisor. Findado o tempo, os estagirios fazemuma autoavaliao do seu microensino e, nasequncia, quatro pares de colegas, previamenteescolhidos pelo professor supervisor, assumemtambm a posio de colaboradores, devendoapresentar dois comentrios positivos e duassugestes de melhorias em relao s aesdesenvolvidas pelos estagirios (da a justificativa domodelo 2 + 2). Por fim, o trio de estagiriosreconfigura as suas aes e apresenta novamente aaula. Toda a sesso, ressalta (ALLEN; WAI-PING,

    1996) deve ser filmada, se possvel at com mais deduas cmeras, a fim de que todos os elementosverbais e no-verbais consigam ser captados. Nofinal da sesso, esse material entregue aosestagirios para que possa servir como instrumentode reflexo de suas prticas pedaggicas.

    A diferena para o modelo tradicional demicroensino que esse destaca o papel assumidopelos colegas, que passam de uma atitude passivaanterior (j que apenas assistiam ao microensino)para uma atitude ativa e reflexiva, medida queprecisam observar, analisar e dar sugestes.

    A partir, ento, do modelo de Wallace (1991) e deAllen e Wai-Ping (1996), no caso do nosso contexto deensino, fizemos algumas adaptaes, configurando aseguinte estrutura para o microensino (Figura 1):

    Ressaltamos, ainda, que os microensinos, comoinstrumentos de formao, dependemfundamentalmente das formas de mediao realizadaspelo professor no momento da sesso reflexiva.Sinalizar erros, desacertos e apont-los exigem muitocuidado, a fim de que os estagirios possamcompreender esses momentos no como erros efetivos,mas como hipteses de configurao de uma aula. Porisso, esses desacertos no devem ser diretamente

    apontados, mas evidenciados de forma mais dedutivapor meio de questes do tipo Por que fiz isso?, Qualfoi o resultado dessa ao?, Como poderia ter feito?,Como os alunos receberam essa atividade? etc.

    FASES ENVOLVIDAS NO MICROENSINO NA REA DE LP

    1.Preparao: definio do contexto de ensino da regncia do aluno; escolhade um eixo de ensino (leitura, produo textual, gramtica, anliselingustica) ou de um contedo/tpico especfico de ensino, a serdesenvolvido para 1 hora-aula, de acordo com o projeto de regncia daescola (ou unidade concedente do estgio).

    2.Elaborao do plano de aula: o estagirio elabora um plano para serdesenvolvido para 1 hora-aula, tendo em vista seu contexto de regncia esua sala de aula.

    3. O microensino: apresentao de apenas 20 min da aula (pois, pelo nmerode estagirios em sala, no possvel estender esse tempo), em que osestagirios assumem a funo social de professores da srie em que faro asua regncia). Para tanto, os estagirios recortam um momento planejadodessa aula para apresentarem. Parte simula as aes e reaes de alunos da

    srie em questo e parte da sala (quatro a seis alunos), juntamente com oprofessor-formador, realiza uma observao pormenorizada dos aspectosconstitutivos da aula, para posterior debate (em cada sesso alteram-se asequipes de reflexo). O grupo de observao dever ser instrudo peloprofessor-formador em relao aos aspectos que precisam ser observados,podendo ser utilizado o modelo 2 + 2 de Allen e Wai-Ping (1996) ou umroteiro de avaliao especfico das estratgias envolvidas em umadeterminada prtica lingustica. Em 2 horas-aula trabalham-se doismicroensinos, ficando o restante do tempo para a sesso de reflexo. Apesarde sabermos da importncia de esse momento ser gravado, nem sempreisso foi possvel, na nossa prtica, por falta de condies tcnicas.

    4. Sesso de reflexo: finalizado o microensino, os estagirios em crculo,junto com os demais colegas do grupo, avaliam suas aulas e se autoavaliam.Em seguida, os colegas, a partir do roteiro de avaliao instrudo peloprofessor, tecem seus comentrios. Por fim, o professor-formador, casotenha ficado algum aspecto importante ausente das reflexes anteriores,provoca o questionamento desses aspectos entre os estagirios, jamais

    agindo como censor, mas como estimulador de reflexes acerca de aspectosque devem ser revistos, reformulados ou melhorados. A funo doprofessor como mediador nesse momento, bem como o tipo de questoque ele formular, visando ao desenvolvimento reflexivo dos estagirios,so condies fundamentais para que o processo alcance xito. Para orientaresses futuros professores, trabalhamos, de forma geral, com quatroquestes norteadoras (que so desmembradas dependendo das aes decada estagirio), retiradas de Smith (1992, p. 114): O que fao?, O queisso significa?, O que me levou a agir dessa forma?, Como posso agirdiferente?.

    5. Elaborao de um dirio de reflexo do estagirio acerca de seumicroensino. Finalizada a sesso, feitos os apontamentos, o professor-formador solicita que os estagirios escrevam um dirio refletindo sobre omicroensino em seus aspectos organizacionais, metodolgicos,interacionais e outros. Esse momento importante para causar odistanciamento da situao que, conforme Vygotsky (1988) e Liberalli(1997), so essenciais para que o indivduo internalize o conhecimento

    necessrio a sua ao e tambm alcance a reflexo.6. Novo microensino: nos casos em que a aula foi muito problemtica,solicita-se que os estagirios faam novo planejamento da aula e apresentemnovamente o microensino. Esse momento importante para reavaliarcondutas, repensar posicionamentos tericos e demais aspectosrelacionados aula.

    Figura 1.Fases envolvidas no microensino de LP.Fonte: Allen e Wai-Ping (1996) e Wallace (1991).

    O professor-formador far com que os prpriosestagirios cheguem s suas possveis incoerncias(procedimentais, organizacionais, interativas). Se, aocontrrio, o trabalho do professor-formador nessemomento for de mera avaliao ou conformeGebhard (1990), trabalho de superviso diretiva o

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    qual visa atribuir uma nota, o professor-formadorpode representar uma ameaa para o aluno emformao, o que, para o autor, pode colocar em riscoou restringir o progresso de seus alunos. Oprofessor-formador ou o pesquisador, na viso deGebhard (1990), no pode, assim, assumir umaatitude avaliativa explcita, mas uma postura decolaborao, de provocao de indagaes e dequestionamentos mobilizados para a reflexo do agirdocente.

    Dessa maneira, esses instrumentos, se bemaplicados, podem potencializar o processo dereflexo e de aprendizagem do estagirio e, ainda,conforme, Ortale e Martins (2007, p. 81), serextremamente ricos para:

    [...] discutir questes especficas ligadas preparao, organizao e ao contedo das aulas; -investigar aspectos da interao professor-aluno emsala de aula, tais como: posicionamento e postura doprofessor, gerenciamento de turnos, participao emotivao dos alunos; - estudar a construo dodiscurso pedaggico do aluno-professor; [...] -mapear crenas e construtos tericos que subjazem prtica pedaggica dos professores-alunos; - realizarestudos sobre as condutas dos colegas de classe quedesempenham o papel de alunos durante a miniaula;- repensar a prtica de professores que atuam noscursos de licenciatura, bem como a prpriaestruturao dos cursos de formao inicial.

    O que dizem os dirios dos alunos?O que dizem os dirios dos alunos?O que dizem os dirios dos alunos?O que dizem os dirios dos alunos?

    Como uma das fases do microensino, utilizamosos dirios reflexivos, no intuito de proporcionar aoaluno-professor maior afastamento de sua prtica nomicroensino e de auxiliar as professoras-formadorasna triangulao entre o que se comentou oralmentena fase de reflexo com o que efetivamente osestagirios escreveram em seus dirios.

    Para esta anlise, utilizaremos o dirio de trsestagirias aqui nomeadas de Helena, Ana e Michele,

    realizados no ano de 2006. A escolha dessasestagirias ocorreu por elas representarem posiesrecorrentes dos estagirios, por ocasio da escriturados dirios. Essas posies traduziram-se pelasseguintes categorias de anlise:

    - no-aceitao do estagirio das observaesfeitas pelos professores-formadores e colegas;

    - interface entre o momento de reflexo e denegao das avaliaes;

    - aceitao dos comentrios e desenvolvimentoreflexivo.

    No primeiro caso, temos o exemplo de Helena queassim escreveu no seu dirio, acerca dos comentriosrealizados por colegas e professoras-formadoras:

    No concordei com quase nada em minha sesso.Ns nos esforamos ao mximo para fazer tudocerto. Pesquisamos as tiras que as crianas pudessemgostar, fizemos um material colorido e tudo mais.

    Na verdade me decepcionei com a avaliao de vocsprofessoras, no apontaram nada de muito concreto,e tambm no entendemos por que no trabalhamoscorretamente a questo do contexto de produo.Tambm no concordei com os colegas quedisseram que a gente foi muito tradicional na aula,no dando espao para os alunos interagirem. Senunca demos aulas, como podamos fazer isso?Creio que estamos sendo muito cobradas por algoque no nossa responsabilidade.

    Neste caso, as avaliaes e comentrios realizadosna sesso parecem no causar nenhuma mudana emHelena ou a tomada de conscincia. Isso se explica

    inicialmente pelas prprias representaes de Helenaem relao ao trabalho do professor-formador,quando diz me decepcionei com vocs professoras,no apontaram nada de concreto. Essasrepresentaes, segundo Bronckart (2003), so pr-constitutivas das aes realizadas pelos sujeitos. Nocaso de Helena, essas representaes materializam-sena j conhecida ideia do professor como detentor dosaber, to evidente na pedagogia tecnicista, dealgum que tudo prover. o discurso autoritrio, na

    viso bakthiniana, que prevalece e que impedeHelena de refletir sobre suas aes. Da mesmaforma, quando escreve sobre o julgamento doscolegas, Helena tenta justificar-se de suas aesequivocadas afirmando que nunca demos aulas eque estamos sendo muito cobradas por algo queno nossa responsabilidade. Mais uma vez, eladelega essa responsabilidade ao professor-formador.

    a ele que cabe dar as instrues corretas para queela possa agir em uma situao desconhecida. E darinstrues corretas no significa negociar, observarpara agir, mas dar um modelo a ser seguido.

    Bronckart (2003), com relao a esse contexto,evidencia que como seres humanos participamos dediferentes formas de avaliaes sociais, seja aplicando

    critrios de avaliao, seja julgando a pertinncia donosso prprio agir. A partir dessas avaliaes,surgem, na verdade, as representaes e as valoraesem relao ao agir pessoal e ao agir coletivo queconstituiro a pessoa humana. No caso de Helena,seu agir evidenciou a representao de um professorainda provedor de conhecimentos do aluno, dotcnico que deve suprir e se responsabilizar pelasfalhas do processo educativo. Na viso bakthiniana,essas apreciaes valorativas em relao ao professorfazem parte do sistema ideolgico cristalizado queHelena construiu em sua formao e que o ensinosuperior ainda no ressignificou.

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    No segundo caso interface entre o momentode reflexo e de negao das avaliaes- temos o casode Ana que escreveu em seu dirio:

    O microensino realmente foi uma boa oportunidadede encararmos uma sala de aula. Realmente algunsaspectos de nossa aula no saram da forma quepensvamos. Agora caiu a ficha do que discutimosem nossas aulas acerca da interao professor-aluno.Quando a professora me perguntou quemrespondeu as questes de leitura? meu cho caiu,como podia ter sido to autoritria? claro que deviater dado tempo para o aluno, ouvir mais, mas talvezpelo tempo do microensino e pela avaliao(queramos mostrar que fizemos bem) agimos deforma tradicional, perguntando e j respondendo,sem dar tempo dos alunos se quer pensarem, a aaula no fluiu. Agora percebi como esse aspecto

    importante numa aula, porque de nada adiantaplanejarmos questes adequadas de leitura se nolevamos em conta o prprio aluno, se queremosimpor a resposta que julgamos correta. No sei porque agi assim, mas acho que se tivssemos tido maistempo talvez fizssemos diferente.

    Ana deixa bem evidente, nesse fragmento, que omicroensino e a pergunta realizada pela professoraformadora fizeram com que percebesse uma aoincoerente no que diz respeito aos aspectosinteracionais da aula, o que denota que teveconscincia da ao, quando afirma ter sido

    autoritria na conduo das perguntas e no terdado espao para o aluno responder. Houve,conforme Magalhes (1998), um questionamentoacerca de suas prprias aes, o que caractersticoda reflexo. Ao discurso autoritrio, reconhecidopela aluna, segue-se o discurso persuasivoestabelecido por meio da pergunta da professora-formadora, instaurando o processo de reflexo e deconscincia da ao de Ana.

    No entanto, por duas vezes, Ana justifica suasaes serem incoerentes pelo tempo. Se tivesse tidomais tempo, talvez, fizssemos diferente, afirma.

    Assim, suas aes no se justificam pelas evidncias,pelo conhecimento efetivo da situao (o quedenotaria reflexo total de sua ao), mas por fatoresexternos, alheios ao momento. Da mesma forma, ofato de apontar o professor-avaliador como um dosimpedimentos para que agisse de forma diferenterefora que, em muitas situaes, o interlocutor domicroensino, que deveria ser o aluno da srie emque a aula se desenvolve, passe a ser o professor-formador, isso modifica todo o planejamento daaula, confirmando o que Bakthin (1992) afirmaquando afirma que o interlocutor quem realmentedefine o enunciado.

    Neste caso, obviamente, o interlocutor real o

    professor, mas o virtual o aluno da srie em que sedar a regncia e para ele e em funo dele que aaula planejada. Todavia, muitos dos estagiriosainda no conseguem se livrar desse interlocutor

    real, do sistema de avaliao e, muitas vezes, parte desuas aes (inclusive mais autoritrias) podem serexplicadas por esses motivos. Alguns, por exemplo,tendem a apresentar a aula em forma de seminrio,no assumindo a posio social de professores.

    No caso de Ana, quando alega a questo dotempo, no se justifica, no demonstra que tenharessignificado esse momento luz das evidncias daprpria aula, o que a coloca num momento deinterface entre a conscincia de parte dos fatos (ereflexo) e a no-conscincia de outros fatos.

    Finalmente, quando afirma no sei por que agi

    assim, Ana deixa clara a noo de habitus deBourdieu (1990), bem como a de sistemasideolgicos historicamente cristalizados em Bakthine Voloshinov (2003). Ou seja, os modelosinternalizados pelos anos de vivncia no sistemaescolar, concomitante aos sistemas ideolgicos a eleinerentes, levam Ana a agir, na aula de leitura, deforma autoritria, no dando tempo e espao para aleitura do aluno, pois foi esse modelo que elainternalizou ao longo de sua formao. dessemodelo que Ana alimenta, em parte, o seu agir.

    O ltimo caso representativo, agora de completa

    reflexo, o caso de Michele que escreve em seu dirio:Ser professor realmente uma tarefa complexa, nosentido de envolver muitas facetas. O nossomicroensino foi realmente importante parapercebermos isso. Tnhamos relativa confiana nocontedo-estrutura composicional do gnero notciaon-line. Pesquisamos muito, lemos, mas realmente omomento de transpor para a sala de aula desconhecido e desafiador. Quando a professora nosperguntou qual a diferena entre a notcia impressa ea notcia on-line? percebi que no tinha levado emconta o suporte para elaborar as questes de leitura.Ora, dependendo do suporte, mudam-se as condies

    de produo. Vou j usar isso para rever a nossa aulaem torno da estrutura, fazendo um exerccio decomparao entre o formato da notcia nos doissuportes. Tambm concordei com o fato de que ostipos de exerccios, apenas perguntas-respostas, tornoua aula um tanto enfadonha para a srie. Creio que seusarmos um quadro interativo, caa-palavras ouexerccios do gnero, a aula ser melhor.

    Michele, diferentemente das outras, consegueenxergar, por meio dos comentrios das professoras-formadoras e dos colegas, os pontos lacunares de suaaula, como o excesso de exerccios do tipo pergunta-resposta e a no-considerao do suporte para setrabalhar a estrutura composicional do gnero

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    notcia on-line. No prprio dirio, a aluna jreconfigura suas aes pensando em novas formas deexerccios, bem como na importncia do suportepara o melhor entendimento do gnero. Neste caso,

    percebemos que o processo de reflexo, marcadopela tomada de conscincia, pela ressignificao daao e at pela reconstruo de uma nova ao, foiatingido. Em outras palavras, Michele, a partir domicroensino, em que confronta a sua palavra com apalavra do outro (representado pelo professor-formador e pelos colegas), em que diferentesapreciaes valorativas so trazidas tona, consegueretomar suas aes, refletir sobre elas e reconstru-las. Isso s ocorreu na medida em que a reflexoocorreu por intermdio de uma atividadeinstrumentada o prprio microensino, o que

    corrobora com a importncia dada pela Ergonomiaaos instrumentos que regem o ofcio dos trabalhos,neste caso, o professor em formao.

    Consideraes finaisConsideraes finaisConsideraes finaisConsideraes finais

    A utilizao dos microensinos, comoinstrumentos de formao no processo de formaodos estagirios, mostrou-se importante, pois:-auxiliou grande parte dos estagirios a tomaremconscincia de suas aes, o que caracterstico doprocesso de reflexo;- oportunizou sala repensarcrenas e representaes sobre o papel do professor,

    bem como a importncia dessas representaes parao agir do professor;- evidenciou aspectos da aula quenormalmente no so tidos como os maisimportantes no mbito da formao, mas queexercem influncia determinante para o xito daaula, como aqueles relacionados interaoprofessor-aluno; - exps aspectos relativos aocontedo que podem ser reconfigurados;- mapeoudificuldades dos estagirios em relao aoplanejamento, disposio do tempo, gerenciamentoda sala, seleo de exerccios;- exps a importnciado estudo dos instrumentos de ensino na formaodo professor.

    evidente que, apesar dessas contribuies, nemsempre, os microensinos levaro o futuro professor ater atitudes reflexivas, exatamente, porque issodepende: (a) das formas de mediao que seroutilizadas pelo professor-formador no momento daavaliao dos alunos; (b) das representaeshistoricamente cristalizadas sobre ensinar e aprendertanto dos professores-formadores como dosestagirios; (c) da relao de confiana assumidapelos formadores e estagirios e, principalmente, (d)das discusses orientadas por intervenes maispersuasivas, no sentido bakthiniano do termo, emenos autoritrias.

    De qualquer forma, esse instrumento podepossibilitar a construo de significadosextremamente profcuos para a formao inicial, medida que, ao simular uma prtica, desnuda

    tambm seus aspectos lacunares que, se,devidamente negociados, construdos em parceriascolaborativas, auxiliam os futuros professores aentenderem a dimenso reflexiva que subjaz ao atode ensinar e de aprender.

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    Received on April 3, 2008.Accepted on March 10, 2009.

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