Hildegard von Bingen e as visões do além

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ORACULA 7.12 (2011) EDIO ESPECIAL

ISSN: 1807-8222

HILDEGARD VON BINGEN E AS VISES DO ALM

NeuciLopesdaSilva*

Resumo

Visionrios e profetas sempre estiveram presentes durante a histria da

humanidade. Na Idade Mdia quando poucas mulheres sabiam ler ou escrever,

Hildegard von Bingen, considerada uma profetiza por seus contemporneos,

produziuumavastaediversificadaobra.Esteestudoapresentaumacomparao

entre as imagens do juzo final contidas em algumas vises de Hildegard von

Bingen, descritas em seus escritos visionrios: Scivias, Liber Vitae Meritorum e

LiberDivinorumOperum.Essestextosdescrevemosprincipaiseventosdahistria

dasalvao.

Palavras-chave:HildegardvonBingen;vises;juzofinal;salvao.

Abstract

Visionaries and prophets were always present during the history of

humankind. In theMiddleAgeswhen fewwomencouldreadorwrite,Hildegard

von Bingen, considered a prophet by her contemporaries, produced a large and

diversework.Thisstudypresentsacomparisonbetweentheimagesofdoomsday

contained in some Hildegard von Bingens visions, described in her visionary

writings:Scivias,LiberVitaeMeritorum andLiberDivinorumOperum.These texts

describethemaineventsofsalvationhistory.

Keywords:HildegardvonBingen;visions;doomsday;salvation.

*LicenciadaemLetraspelaUniversidadedoEstadodoRiodeJaneiroepsgraduadapeloInstitutoTeolgicoFranciscanodePetrpolis.Email:[email protected].

Oracula7.12(2011)EdioEspecial223

Terminadoojuzo,cessaroosterroresdoselementos,osraios,troveseventosquesemovememtempestades,(...)porconcessodivina,sobrevirumaimensa,serenacalma.1

Introduo

Dcimafilhadeumafamliadenobresalemes,HildegardvonBingenteve

umavidaondeadoenaeosofrimentoestiveramsemprepresentes,alis, como

convm aos que vivem em fama de santidade. Aos oito anos, foi levada a um

mosteiroparaquefosseeducada.Desdecedotinhavises,comoquandoviuacor

de um bezerro antes mesmo dele ter nascido. Estes fatos, no entanto, eram

guardadosnomaisabsolutosegredo.Somenteaocompletarquarentaedoisanos,

suas vises vieram luz. No ano de 1141 ela ouviu uma voz que ordenava que

escrevesse tudo o que lhe fosse dito e mostrado. Surgiu assim o seu primeiro

trabalh e .oques estendeude1141a 1151

Alguns estudos atribuem suas vises a transtornos psicossomticos,

possivelmente,enxaqueca,doenaqueaacompanhavadesdeamais tenra idade.

As crises de enxaqueca causam dores de cabea crnicas e podem, no entanto,

manifestarsecomoutrascaractersticas,entreelasosurgimentoderaiosdeluzde

diversascores.SabinaFlanagan,historiadora,emseulivrointituladoIldegardadi:

vitadiunaprofetessa,abordaessaquesto.

Inseguracomrelaoorigemdesuasvises,HildegardrecorreaBernardo

deClairvauxpedindolhe que a aconselhasse sobre omelhormododeproceder.

Bernardo,ento, solicitaaoPapaEugnio III2queestabeleaumacomissopara

investigarasanidadementaldeHildegardbemcomoaortodoxiadeseusescritos.

ApsdiversasentrevistascomHildegardparaavaliarsuaconduta,hbitosdevida

e escritos, a abadessa foi considerada spela comisso.Graas repercussode

suasobrasde teologiaeescritosdecunhovisionrio,bispos,papasereis iamse

consultarcomaSibiladoReno.

AobravisionriadeHildegardvonBingenapresentaumamagnficafuso

de inspirao divina e intelecto humano. As vises deHildegard fazem parte de

uma verdadeira experincia mstica; um conhecimento de Deus que no nem

1HILDEGARDADEBINGEN.Scivias:conoceloscaminos.Madrid:Trotta,1999,p.484.


intelectualnemracional,masdizemrespeito fe intuio.Somaisdidticas

que extticas. Ela diz tlas em estado de viglia, ou seja, no so frutos de

alucinaesoude sonhos.A suaexistncia sed totalmentedentroda esferado

transcendente.

Os livros que compem o corpus visionrio hildegardiano

Ocorpusvisionriohildegardiano compostopor trsobrasque formam

umpainelqueabrangedesdetemascosmolgicos,atumaanlisedetalhadados

vciosedasvirtudes,combaseemaspectospsicolgicos.

osCaminhosdoScivias(Conhece Senhor)AbreviaturadeScitoviasDominifoiseuprimeirolivroescritoentre1141e

1151. Tratase do livro cujo esboo foi lido e aprovado pelo papa Eugnio III,

trazendolhefamaimediata.Compreendetrspartes:aprimeira,comseisvises,

trata do Criador; da criao e das relaes entre Deus, o cosmos e o homem; a

segunda,comsetevises,apresentaahistriadasalvaoabordandotemascomo

aPalavraencarnada,aTrindade,aIgreja,ossacramentoseosacrifciodeCristo;a

terceira,comtrezevises,centradanaaodoEspritoSantoparaedificaroReino

deDeuscomasvirtudes.

DeacordocomMarcialMaaneiroolivrosegueamanifestaodasvises.

No tem o formato de um trabalho teolgico, mas se costura com alguns fios

teologaisque lheconferemtextura.Os fiosso:criao,salvao,Verbo, Igrejae

humanidade.Oestiloliterrioproftico.3

LiberVitaeMeritorum(LivrodosMritosdaVida)4Escrito entre 1158 e 1163, est dividido em seis partes que apresentam

uma oposio entre os vcios e as virtudes, tema que era comum em sua poca.

Tratasedeumaobradeteologiamoralqueexplicaodiscernimentoentreobeme

2Cisterciense,comoBernardodeClairvaux.3 deBingen: (Profetisa 11

0 :139.MAANEIRO,Marcial.ParaconhecerHildegarda e terapeuta:1098 79).In:GrandeSinal:RevistadeEspiritualidade54.2(20 0)4Notexto,algumasvezes,substituiremosottuloLiberVitaeMeritorumporsuasiniciais(LVM).OmesmoocorrercomLiberDivinorumOperum(LDO).


omal. De acordo com Bruce W. Hozeski, fundador da International Society of

HildegardvonBingenStudies,oLivrodosMritosdaVida

um estudo da debilidade aparentemente inerente conscinciahumanaquenosseparadeDeus,umestudodosdefeitosmoraisedaverdadeira natureza do pecado. Este livro um dos mais sutis psicologicamente fascinante , e uma das obras mais trabalhadas quejamaissehaviaescritosobrearelaodosdiversospecadosatassuasvirtudescorrespondentes.Htrintaecincoparesantitticosdepecadosevirtudes.EnquantoSciviaspoderiaserconsideradoummanualdaf,oLiberVitaeMeritorumpoderiaserconsideradoummanualdevida.5

A obra uma espcie de guia de como adquirir merecimentos, a fim de

evitar ou reduzir, atravs da penitncia nesta vida, qualquer possvel castigo

futuro.Asvisesenfatizamaresponsabilidadeealiberdadedohomemnaescolha

deseucaminhoeinformamsobreasconsequnciasdesuaopo.

LiberDivinorumOperum(LivrodasObrasDivinas)Escritoentre1163e1173.Estdivididoemtrspartes,cadaumadelascom

umaquantidadedsparedevises;aprimeiracomquatrovises;asegundacom

umavisoea terceiracomcinco. ilustradocomminiaturasquerepresentamo

homem e o universo. Nele encontramos uma topografia da salvao e da

condenao,bemcomoumadiscussoacercada criaodomundoedo fimdos

tempos.EleapresentaahistriadasalvaodesdeAdoeEvaatoJuzoFinal.Seu

tom bem mais sombrio e pesado que o dos demais, no entanto a estrutura

cosmolgicaquedelesedepreendemuitomaisorganizada.

Interessante ressaltar que encerrado com uma severssima advertncia

aosseusfuturoscopistas.Dizotexto:

Que ningum se atreva a mudar uma s palavra desta escritura, nemaumentandonemdiminuindo,paranoserapagadodolivrodavidaedetoda felicidade existente sob o sol, salvo para adicionar explicaes spalavras e as frases que foram pronunciadas com simplicidade, porinspiraodoEspritoSanto.QuempressuporagirdeoutromodosaibaquepecacontraoEspritoSanto.Eestepecadono lheserperdoado,nemaquinemnoalm.6

5 BINGEN. The Book of the Rewards of Life York:

Press,1997,pp.xvixvii. HILDEGARD OF (Liber VitaeMeritorum). NewOxfordUniversity6MIGNE,J.P.(Ed.)SanctaeHildegardisAbbatissaeOperaOmnia.Paris:Migne,1882,col.1038.


A estr a visutura d s es

Scivias e LDO apresentam as vises utilizando uma estrutura narrativa

bipartida:

Apresentaodaviso umavisointroduzcadanovaseo; Interpretaodaviso quedescritaemdetalhe.Apsaviso,umavoz

descedocuparaexplicarosignificadodoquefoivisto.Essainterpretao

apresenta uma riqueza to grande de pormenores, que chega a ser uma

espciedeexegesetextual,quasefraseafrase,cujoobjetivotornaromais

claropossvelosentidodasimagens.MasaprpriaHildegardenfatizaque

no o faz devido ao seu entendimento pessoal ou interpretao e sim

reproduzindo as palavras de Deus. Em uma carta enviada a Bernard de

Clairvauxelaexplica:

ConheoosentidointeriordaexposiodoSaltrio,doEvangelhoedeoutros volumes, queme foramostrado nesta viso. Como uma chamaardenteinquietoumeupeitoeminhaalmaensinandomeoprofundodaexposio. Mas no me ensinou as letras que desconheo em lnguaalem.Apenasseileremsimplicidadeenodecomporotexto.7

NoLVMaestruturaodasvisesreforadanoprlogoquandoHildegard

mencionaquenoano1158daEncarnaodoSenhor,ouviuumavozdoCuque

dizia: Tu, aquemdesdea infncia foidadoodomda revelaoverdadeira,no

corporal,masespiritual,peloEspritodoSenhor,transmiteascoisasqueagoravs

eouves 8.

NoinciodoSciviasopapeldavisionriaencontrasedefinidotalqualodos

profetasdoAntigoTestamentocujopapelera tosomenteode transmitiroque

lheserareveladoporDeus:

homemfrgil,cinzadacinza,podridodapodrido,dizeescreveoquevseouves.Masporquestmidoparafalarepoucohbilparaexporepoucoinstrudoparaescreverestascoisas,dizeescreve,nosegundoabocadohomem,nemsegundoa intelignciadeuma invenohumana,nem segundo a vontadede comporhumanamente,mas segundooquevseouves...segundoavontadedAquelequesabe,vedispetodasascoisasnosegredodeSeusMistrios.9

7 on.VidaevisionesdeHildegardvonBingen.Madrid:EdicionesSiruela,ECHTERNACH,Theoderichv19

INGEN.TheBookofth i97,p.123124.

8Cf.HILDEGARDOFB eRewardsofLife(LiberV taeMeritorum),p.9.9 PERNOUD, Rgine.Hildegard de Bingen: a conscincia inspirada do sculo XII. Rio de Janeiro:Rocco,1996,p.17.


Emumafamosacarta,conhecidacomoDemodovisionissuae,endereadaa

Gilberto de Gembloux, escrita aps o trmino do LDO, Hildegard expe mais

detalhadamente o modo de sua viso. Ela explica que no ouvia nem com os

ouvidos corporais nem comos pensamentos de seu corao, nempercebia nada

pelo encontrode seus cinco sentidos,masemsuaalma, comosolhos exteriores

abertos.

As vises do Alm

Nestebreveestudonotemosporobjetivoumaanlisemaisaprofundada

deumgrandenmerodevises.Sendoassim,optamosporfazerumacomparao

apresentando imagensdo JuzoFinal contidasemumanicapartedecadaobra.

Para facilitar nossa exposio escolhemos quatro aspectos que consideramos

interessantes: adescriodo fimdos tempos,aspenas impostashumanidade, a

visod lestes.asalmasemalegriaseternaseadescriodasmoradasce

Concentraremosnossaanlisenasseguintespartes:doSciviasutilizaremos

a12visodaterceirapartedolivro;doLVM,asextaparteedoLDO,a5viso,

quecorrespondesegundapartedolivro.

Ofimd sostempo

Grandes cataclismos destruiro o mundo; toda a criao se agitar, o

mortale impurodesaparecer,nestetomameaadorqueoScivias iniciaasua

descriodofimdostempos.

Diasdetribulaoseroosltimosdias:muitoscataclismossobreviroegrandes sinais anunciaro o ocaso domundo... o terror abalar toda aface da terra, as tempestades a agitaro violentamente... E assim comoumhomem, quando se aproxima seu final, se v prostrado pormuitasenfermidades premonitrias e, chegada a hora de sua morte, sedesvanece entre dolorosas aflies, assim tambm os mais terrveiscataclismosprecederoaofimdomundoeodissolveroemseueclipse,entreimensosterrores:poisoselementosdesencadearotodoohorrordequesocapazes,porqueseraltimavezquepodemfazlo.10

Chegadoo fim, ummovimento inesperado e repentinodesprenderoselementos:todasascriaturasseestremecero,irromperofogo,osaresse agitaro, as guas transbordaro, a terra estremecer, os raioscrepitaro...etodoomortalquehouvernoar,nagua,naterra,deixaravida.O fogomovertodooareaguaenchera terra inteira:eassim

oserpurificadoparaqu puronomundosedesvaneatud eoqueforim 10HILDEGARDADEBINGEN.Scivias:conoceloscaminos,p.480481.


comosenuncativesseexistido,comosediluiosalquandoseencontranagua.11

Ocuemudecerenquantoressoarasentenadojuzo

EntoosCusenvolveroseuslouvoresnosilncioenquantooFilhodeDeus pronuncia a sentena de Seu juzo sobre os justos e sobre osinjustos, e ouviro com nobre reverncia como os julga, quandodocemente recompensa aos justos com o jbilo celestial, epavorosamente envia os injustos s penasdo inferno.Ealinohaveroutrasdesculpasnemperguntassobresuasobras,(...)aliasconscinciasd b u s coshomens, onsema s,e tarodes obertasedesnudas.

A assustadora descrio do fim do mundo retomada no Liber Vitae

Meritorum. A viso refora a ideia de que o Juzo Final ser um evento de

propores jamais vistas. A visionria anuncia que no final do mundo Deus

mostrarseupodercomas forasdoscuseabalar todososconfinsda terrae

assimt ranteseujulgamento.

12

odaalmaseprepararparacomparece

Oltimolivrodocomplexovisionrio,LiberDivinorumOperum,apresentaa

quintaviso,quecorrespondesegundapartedovolume,nosseguintestermos:

13

Visoassombrosa,ondenossedescrevecomosmaissutisdetalhesomundo subdividido em cinco partes, mas tambm as dimenses e asqualidades de suas partes, tanto as cheias de luz e delcias como ascheiasdehorror,decastigosedetrevas.

Apartirdestepontotemosadescriopormenorizadadetudooquevisto

eouvidoporHildegard:

PercebiocrculodaTerradivididoemcincosetores,umaleste,outroaoeste,oterceiroeoquartoaosuleaonorte,oquintonocentro.Cadaumdesses setores tem o aspecto de um arco estendido.Umdeles, o setorleste, resplende de claridade, enquanto o oeste est parcialmentecoberto de trevas; o setor sul, este se divide em trs zonas, duas quemostram os castigos e a do meio, nenhum castigo, mas monstrospavorosos que lhe conferem um aspecto aterrador. [...] Em direo aleste, percebi, acimada curvaturada terra e a certa altitude, umabolavermelhacontornadaporumcrculocordesafira.Duasasassaampeladireitaepelaesquerdadessasbolas,elevavamsedosdoislados,depoisseencurvavam,ficavamfrenteafrente,prolongavamseatametadedacircunfernciaterrestre,aqualcircundavam.(...)Dessabolapartia,atomeio das asas, um caminho sobre o qual cintilava uma estrelauminosa.l

14

11Idem.12 83.

OFBINGEN.TheBo heRewardsofLife(LiberVitaeMeritorum),p.265.Ibidem,p.4

13HILDEGARD okoft14PERNOUD,HildegarddeBingen,p.78.


Graas s explicaesque se seguem,podemos compreenderque se trata

do globo terrestre, que se encontra dividido em cinco reas. Este conjunto, na

realidade,poderiasercomparadofiguradeumserhumano:

Tudoissosignifica,queohomem,doqualaterrasmbolo,encontranoscincosentidosqueosustentaaforaparabuscarascoisasnecessriaseaorientaoparaasalvaodesuaalma.

Aadmirvelsabedoriaeopoderdoartficedivinorefulgemeapesardaterra ser redonda, dividiua em cinco partes e semelhana destadiviso,dotouohomemnestavidadoscincosentidos,enavidafuturaorestituirntegrodopdatumba.

Deus(...)revelaseusprodgioseseupoder,porquetambmfezacarneeos ossos do homem de tal modo que, embora reduzidos a p, serodevolvidosintegralmentenofinaldostempos.15

Adescrioprossegue,fornecendodetalhesmaisesclarecedores:

Deus em sua clera julgar estas obras e se vingar destruindoascompletamente,porquedaramorteaosquenosearrependeremeoscondenar ao inferno.Nesse tempo, haver sobre a terra, por todas aspartes,combatesespada,osfrutosdaterradesaparecero,eoshomensperecerodemorterepentinaoupelasmordidasdasferas.16

Aspenas

Aps sabermos como ser o fim domundo, algumas perguntas se fazem

inevitveis. De acordo com o julgamento divino, quem seriam os condenados?

Quais seriamaspenas infligidasaeles?Quaisas causasdesuacondenao?Nas

visesdeHildegardtodasestasquestessorespondidas.

NotocanteaoscondenadosinteressanteressaltarquetantooLiberVitae

MeritorumquantooLiberDivinorumOperummencionamaexistnciadediferentes

castigos impostos s almas e fazem meno aos lugares cujas penas so mais

brandas.As almasdosquenopossuemo sinaldobatismoseriamsubmetidas a

castigosmaisbrandos:

estas almasnoestavamsubmetidas agraves tormentos,mas estavamnastrevasdaincredulidade,porque,notinhamsidobatizadasenquantoestiveramemseucorpo,emborasemopesodeoutrospecados,estavammarcadaspelopecadoquecausouojuzodemortesobreAdo.17

para castigar as culpas dos muitos pecados com os quais os homensofendemajustia,foramco ocantosdaterralugaresdelocadosnosquatr

15MIGNE,SanctaeHildegard16Ibidem,col.909910.17HILDEGARDOFBINGEN.TheBookoftheRewardsofLife(LiberVitaeMeritorum),p.267268.

isAbbatissaeOperaOmnia,1882,col.903.


veniais,(ouseja,doshomensquepecamporignorncia).18

Noentanto,diferentedestinoestreservadoaosquevoparaaGeena,pois

ela contm em si todo gnero de penas, uma vez que se trata do domnio dos

espritosmalignosqueinfundiramtodososvciosnoshomens.Emboranotenha

podido ver o que se encontrava na Geena, Hildegard foi capaz de ouvir que ela

contm todo tipo de tormentos, de misrias, de horrores e de penas. (...)

indistinguveisgemidoseextraordinrioeindistinguvelrangerdealmasdoentes,

(...)rud 19osdepenascomooestrondodomarecomoosomdemuitasguas.

Satisfazendoumpoucoo interessepeloassunto,oLDOdescreveos locais

decastigobemcomoalgunstormentos,lencontrados:

Estessooslugaresinfernaisondehabundnciadetodosostormentosenohnenhumconsolo.(...)Nelas[nastrevas]sotorturadastodasasalmasqueviveramnoesquecimentodeseuCriador,nafaltaabsolutadef e por terem realizado aes execrveis. Por esta razo sabese queestastrevasinfinitasexistem,masnosovistas,jqueoinfernoeseusatrozes tormentos o homem pode conhecer com sua inteligncia, masenquantovivernocorponopodevlosemsuaplenitudecomosolhosmortais,enemtampoucocapazdedistinguirquetormentosexistemequantosso,comotampoucoconheceasuaprpriaalma,nemquaissou a o se sm ritos,enqu nt vivernomundo.20

o frio no vero, o calor no inverno (...) a presena de imagensmonstruosas e aterrorizantes (...) epidemias enviadas aos homens eanimais (...) lama, fedor insuportvel e fumaa e outros tormentosparecidos.21

Estocondenadasasalmasdaquelesquenoprocederamdeacordocomos

desgniosdeDeus,ouseja,aquelesque:

enquanto estiveram no corpo foram negligentes com o perfume dasvirtudes (...)homicidas,estupradores, ladres, (...)almasarrancadasdocorpo dos que, no momento da morte, apenas tiveram tempo de searrependerdeseusmuitosegravespecadoseque,notendosentidooperfume das virtudes, se salvaram com dificuldade (...) almas quecolocando em segundo plano o gosto pela vida verdadeira, preferiramfavorecer a concupiscncia (...) homens sem f, que enquanto da carne

18 SanctaeHildegard

INGEN.TheBookoftheRewardsof VitaeMeritorum),p.268.MIGNE, ,col.906.

19 Life(LiberildegardisAbbatissaeOperaOmnia,col.913.

isAbbatissaeOperaOmniaHILDEGARDOFB

20MIGNE,SanctaeH21Ibidem,col.907.


estiveram no mundo imitaram os incrdulos (...) adlteros, glutes ebbados.22

A trilogia visionria hildegardiana apresenta a mesma explicao para a

condenao das almas. Os rprobos, unidos ao Demnio e seu anjos, sero

enviados aos suplcios eternos, pois preferiram se guiar por suas prprias

vontades que pelos preceitos divinos. Deus sempre est pronto para castigar a

impiedade,afaltadef,ospecadoseosterrveiscostumesdaquelesquetentamse

opor a Ele. Em Scivias a viso faz uma clara referncia ao evangelho segundo

Mateus(25,46)aoafirmarquenos infernossotantososgritosdedorerguidos,

queultrapassarooquantooentendimentohumanocapazdecaptar:poisestes

damorteeternapadecero,comoJesusvaticinanoEvangelho.23

Asalmasemalegriaseternas

OLVMressaltaoqueparansdeveriaservircomoconsoloofatodeque

da mesma forma com que ningum capaz de revelar as misrias infernais,

ningumcapazderevelarasalegriaseternas,maspodemosteracertezadeque

na glria do paraso, purificada dos pecados, se alegram os homens que se

aproximaramdeDeuspeloarrependimento,penitnciaeboasobras.No juzoda

ressurreio as almas dos justos recebero alegrias muito maiores que as que

possuemagora.

Portanto,quemestpreocupadoemevitaros tormentos infernais, fujadodiaboe rejeite suas inspiraes... tal comonenhuma lnguahumanapode explicar estas alegrias, nenhuma cincia humana ser capaz dedescreverasmisriasinfernais(...)Estascoisasforamreferidaspelavivavozdaluzviventeinfalvelesodignasdef.Quemtemfasconsideraid n cu adosame teeasrecordaparaagirbem.24

A glria do paraso, da qual o primeiro homem foi expulso, estcircundadaporumaclaridadetointensa,comovs,queohomemnocapaz de distinguir o que contm, a no ser como por um espelho.Ademaisestembelezadacomumafrondosafloraoquenomurcha,eperfumada com o suave perfume dos aromas, e est repleta deinumerveisdelciasquealegramasalmaspurificadasdetodognerodepecados. Essas almas que se encontram ali vestem, com glria ainda

omaior, vestidodaimortalidadeeahonraqueAdoperdeu.25

Todos estes recebem a alegria das alegrias e a beleza de inefveisornamentos, porque serviram ao seu Criador com as boas obras

22

,Scivias:conoceloscaminos,p.485.Idem.

23 EBINGENBINGEN,TheBookoftheRewardsofLife(LiberVitaeMeritorum),p.273274.

HILDEGARDAD24HILDEGARDOF25Ibidem,p.285.


inspiradasporEle.NojuzodaressurreioserochamadosbenditosdemeuPaieentoreceberoalegriasmuitomaioresqueasquetmagora.Pois, enquanto agora s se alegram na alma, ento ao contrrio, teroalegriasnocorpoenaalma,alegriasinefveisapontodequenenhuma

criaturasercapazdemanifestlasaomundomortal.26

Aglriarecebeoseleitos,oHadesdevoraosrprobos.

Oseleitosseencaminharoparaaalegriacelestial,cheiosdoesplendordaeternidade,juntocomsuaCabea,MeuFilhoecomobemaventuradoexrcitodosCus,emmeiodeumaimensaglria.27

OLDOapresenta,muitovagamente,umadescriodequaissoasalegrias

encontradaspelasalmasdosjustos.Deacordocomotextoaparteorientaldeque

falamos brilha com grande claridade. Porque nela est o lugar do prazer e das

delciasqueacolheasalmasbeatasemum lugaragradvel.Estaparteconvidaa

almaafixaroolharinteriornavisodaverdadeiraluz.28

Adescriodasmoradascelestes

NacasademeuPaihmuitasmoradas(Jo14,2).

Essa passagem evanglica que d asas imaginao humana, gerando

muitas discusses, explicada por Hildegard no Liber Divinorum Operum da

seguintemaneira:

Interpretaseassim:OFilhodeDeus,aoprometeravidaeternaquelesqueneletmf,disse: Namoradaceleste,quepertenceaomeuPai,hmuitasmoradasde acordo comomrito de cadahomem,de talmodoquecadaumterseuaposento,conformenavidacorporaltenhaamadoebuscadoaDeus.29

OLiberVitaeMeritorum retomao tema,mas tambmnosatisfazanossa

curiosidade.Ele explicaque asmoradas celestiais so tantasque esto acimada

capacidadeintelectualdoserhumano,enenhummortal,cobertopelacarne,pode

abarclas com sua cincia e assim sendo, tampouco so reveladas a Hildegard,

nemelasnemoqueelascontm.

Naptriacelestialhumnmeroextraordinriodemoradasdemuitasdelcias,incalculveisporpartedohomem,queestoreservadasparaohomememproporo s aespor ele realizadas emvirtude da graadivina.(...)Acarneoprimidapelopecadonosabesuportarossegredosdascoisascelestes,anoserquandoestreforadapelaforadagraa

26 p.286.

BINGEN,Scivias:conoceloscaminoIbidem,

27 s,p.484.ildegardisAbbatissaeOperaOmnia,col.906.

HILDEGARDADE28MIGNE,SanctaeH29Ibidem,col.940.


divina.Nenhumhomemsobrecarregadoporcarnemortaljamaisviuemtodaasuaperfeioasalegriasdosmilagrescelestes,amenosqueDeusquer mostrar essas coisas a certos santos em uma viso e a algunsprofetas que falaram, como Isaas falou do adorno do primeiro anjo eJoomostraemseuApocalipse,quandoexplicaosadornosdaJerusalmcelestial.30

Consid aeraes fin is

A linguagem ricamente simblica, contida nos textos apresentados, deixa

claroqueodestinoltimodoserhumanoest,decertaforma,emsuasprprias

mos.Asalvao,prometidaporDeus,dependedobomusoqueelevenhaafazer

de seu livre arbtrio, atravsdo empregodas virtudes.Agindo emconformidade

comavontadedivina,elealcanarasalegriasdaPtriaCeleste.

HildegardvonBingenfoiumamulherdeintensaexperinciadeDeusede

profunda f e tambm uma apaixonada pela pessoa humana. No pensamento

hildegardianoamorteestemoposiovidaeterna,estaagrandeinimigaaser

vencida.Asalvao final,ouseja,avitriadahumanidadesobreamortesser

viabilizada atravs da utilizao das virtudes. A nicamaneira de se alcanar o

paraso por meio da prtica das virtudes manifestadas na terra por meio da

encarnao do Filho de Deus. A Palavra de Deus Encarnada uma importante

presena no mundo, onde a revelao divina e a experincia humana esto

intimamenterelacionadas,constituindoumaespciedematrimniomsticoentre

Deuseahumanidade.

A importncia da Sibila do Reno no se deve apenas ao fato de ser uma

presena feminina no pensamento filosficoreligioso medieval. A riqueza da

narrativamticaesimblicacontidaemsuasvisesrevelaumcarter identitrio

fundam lproduoint l oMedievo.enta electua d

No podemos afirmar se o Juzo Final ser precisamente nos termos

descritosporHildegardenemonossointuitoentrarnomritodessaquesto.No

entanto,podemosrefletirapartirdasdescriesdeixadasporquemfoiagraciada

comvisesdoalm.

30HILDEGARDOFBINGEN,TheBookoftheRewardsofLife(LiberVitaeMeritorum),p.287.


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O cu emudecer enquanto ressoar a sentena do juzo

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Hildegard von Bingen e as visões do além