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HISTORIA

BRAZIL

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^OTA BENE

As notas do Sr conego doutor J. C. Fernandes Pinheiro vão assignadascom as iniciaes do seu appellido F. P.

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H I S T O R I A

DO BRAZILTRADUZIDA DO INCLEZ

ROBERTO SOLTHEY

P E L O

Dn

L U I Z J O A Q U I M DE O L I V E I R A E C A S T R O

E A N N O T A D A

C O N E G O DrJ. C. F E R N A N D E S P I N H E I R O

TOMO SEGUNDO

R I O DE J A N E I R O

LIVRARIA DE B. L. GARNIERR U A DO O U V I D O B , 6 0

PAR1Z, GARNIER IRMÃOS, EDITORES, R U A DES SAINTS-PÈRES, 6

1 8 6 2

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HISTORIA DO BRAZIL

CAPITULO XII

Os Francezes expulsos do Parahyba. — Os Pitagoares. — Os Inglezes i;oBrazil. — Expedição de Fenton. — Principio de hostilidades. — Willi-rington assola o Recôncavo. — Morte de Barreto. — D. Francisco deSouza governador. — Exploração de minas de prata. — Jornada deCavendish. — Toma Sanctos, queima S. Vicente, é repellido do EspiritoSaneio, e morre de pezares. — I.ancaster toma o Recife. — Raleighdesvia os aventureiros, dirigindo-os para a Guiana. —El Dorado.

Posto que constantemente rechaçados do Brazil, lòtfô.toda a vez que linhão tentado fundar alli uma feito- „* r S ^ria que fosse, não querião os Francezes abandonar ocommercio d'aquelle paiz. Fizerão agora do Para-

hyba o seu porto, onde se aluarão com os Pitagoares, senhores das terras entre aquelle rio e o Grande.D'um lado eslavão estes índios em perpetua guerra os

com os Cahetés, que olhavão como seus inimigos i:

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2 HISTORIA PO BRAZIL.

1583. turaes, embora fallassem a mesma l ingua; do outro ,' ora em guer ra , ora em paz, com os Tapuyas, quecomtudo erâo seus alliados no sertão contra os visi-nhos Tabarajas. Erão do grande tronco tupi, e dosmais cruéis d'aque lla raça, pois qu e jam ais poupavãoum prizioneiro. Auxiliados pelos Francezes commet-

térão estes selvagens terríveis devastações nos estabelecimentos vizinhos, queimando engenhos de as-sucar, assassinando e devorando todos quantos podiãoapanhar. Os povos de Pernambuco e Itamaracápedirão protecção ao governo, e derão-se ordens paracolonizar e fortificar o Parahyba. Nas visinhas.capitanias se levantarão forças para a expedição, cujocommando se deu a Fructuoso Barbosa, pondo-sen'elle as melhores esperanças. Os Pitagoares e Fran-

cezes attrahirão-no a uma emboscada, matando-lhegrande parte da sua genle : o resto tornou -se descontente, e queixando-se da ineplidão do general

muitos o abandonarão. Depois d'esta deserção e daperda soffrida, ja a força não estava a par do serviço;o inimigo, soberbo com a ter repellido, renovou osseus estragos, e os moradores de Pernambuco e I tamaracá instantemente solicitarão do governador, quelhes mandasse soecorro.

Barreto estava ja velho para tentar qualquer couzaem pessoa, nem elle en verdad podia deixar a Bahia;por quanto seis mezes havia apenas que era alli clie-gado, e a .iffluencia dos negócios, que provavelm ente

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HISTORIA DO BRAZIL. 5

se teiião accumulado sob o governo provisório, tor- 1583,

navão indispensável a sua presença. Succedeu poremachar-se n'aquella cidade parte d'essa formidável emais que desastrosa expedição, que Philippe II enviara commandada por Diego Flores de Valdes, asegurar o estreito de Magalhães, depois que Drakeo fizera temer pela posse do Peru . Vinte e três naushavião velejado de Sevilha, eapoz repetidas investidaspara ganhar o estreito, voltou Diego Flores a finalcom seis apenas á Bahia. Pediu-lhe Barreto que fosseexpulsar do Parahyba os Francezes; também ancorados no porto estavão dous navios ao commando de ergue um

i forte

Diogo Vaz da Veiga, em viagem para Goa; com estes n0 Paraliy,]

reunidos á própria frota deu Flores á vela para Pernambuco, onde se levantarão tropas, que marcharãopor te rr a , em quanto avançava a força nava l. Haviano rio quatro navios francezes. Entrou Flores, investindo-os com a sua c ap itan ia, a nau de Diogo Vaz

e todos os escaleres; os Francezes abandonárão-osseus navios, ateando-os, c reunidos aos selvagens napraia, fizerão uma demonstração de defeza contra odesembarque; mas de demonstração não passou. Ástropas desembarcarão sem opposição, as forças deterra chegarão, erigiu-se uma fortaleza de madeira,

e Flores deixou n 'ella cento e cincoen ta hom ens áí-ordens de Francisco Castrejon. Não podião entender -se Barbosa e este capitão ; contava o p ri m e i ro sergovernador do novo estabelecimento em virtude da

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Noticias. Ms.1, 1 1

Hcrrera.

4 HISTORIA DO BRAZIL.

1583 s u a antiga nomeação, e vendo que não lhe annuião

as pretenções, retirou-se para Pe rna m bu co , don demandou a el-rei um memorial. Castrejon sustentara

Abandona melhor a sua auctoridade, do que soube agora man-(.astrejon o ' l

-« rePc0.íptra-o ter o seu posto : apenas ido Barbosa, pozerão-lhe osPitagoares cerco. Guerra com estes ferozes selvagens

era couza a que elle não estava acostumado, peloque, lendo-os rechaçado uma ou duas vezes, retirou-se á pressa para Itamaracá, perdendo pelo caminhoalgum a da sua ge nt e. Sabido qu e foi isto em Pe rnambuco, reuniu-se nova força, com que Barbosatornou a recuperar o forte : sem demora se lhe man

darão soccorros, e veio um a horda de Tu pin am bás2"'u,sTá. assentar nas visinhanças suas tabas, dando e rece-Rocha Pitta. , , . . . . . .

3, §84-86. bendo auxilio contra o commum inimigo.Por estes tempos alguns espíritos audazes e era-

prehendorcs, que em mais favorável conjunetura deepocha e logar poderiâo ter produzido effeitos nàomenores que Manieheo ou Mahomet, tentarão estabelecer entre os selvagens uma hierarchia, um cultoritual e uma superstição amplo-der ramada, queentre todos devia servir de laço de união, de pontode contacto. Quem primeiro concebeu o pensamento,ninguém o sabe, se algum mameluco, como suppo-zerâo os Jesuíta s, se algum semiconverso' . Tornandodo christianismo dos Jesuítas o que lhes pareceu

1 Cremos que toda essa theogonia a que se refere o auetor não pas?ad u m a invenção dos Jesuitas. F. P.

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6 HISTORIA DO BRAZIL.

1583- deletéria (que se suppõe ter sido tabaco); e o sacerdote que havia passado por esta terrível purificação,como a couza se cham ava, ficava sanc to , e perfeitona sua vocação. Asseveravão aos seus sectários queasalmasdos seus maiores vi ríão n'um navio a livral-os de oppressores, exterminando os Portuguezes, e

que d'estes os poucos que escapassem serião convertidos em peixes, porcos e outras animalias. Todosque n'isto acreditassem irião infallivelmente depoisda morte para um logar de dilicias, mas os incrédulos serião despedaçados por bestas feras e aves derapina. Nem bastava aguardar esta libertação por

intermédio dos finados; era mister preparal-a e ac-celeral-a, obrando t a m b é m . Para este effeito partiãoda residência do papa, que era no interior, missionários pa ra en tre os índios sujeitos aos Po rtugu ezesou com elles alliados. E tão rápida se derramou acrença, que innumeros abandonarão as habitações,

pozerão fogo aos engenhos e cannaviaes, commetté-rão quantas tropelias poderão, nem deixarão vivoPortuguez que lograssem haver á unha. Alguns dosque tinhão filhos, chegarão á assassinal-os, para selivrarem de quanto*podia pear-lhes os movimentos.Os inauditos esforços dos Jesuítas em reclamar o seu

rebanho e preserval-o d'esla falsa doutrina, fizeraoabortar o plano. N'um sitio lançarão os índios convertidos-mão do propagador da rebellião, e, não lhesconsentindo o seu missionário fazer por suas mãos

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H ISTOR IA DO R R AZIL. 7

prompta e summaria justiça, forão reclamal-a do m7j-

governador, aquém levarão amarrado o delinqüente.Foi-lhes este então entregue á discrição, e elles cortarão-lhe a lingua, instrumento com que os haviailludi Jo a elles e a seus irmãos, e depois o eslrangu-

1 ° Jarr ic .larãO. 2 , 5 1 9 , 3 - 2 - 2 .

A desgraçada sujeição de Porlugal á Hespanha o* ingWs,havia envolvido o Brazil em hostilidades com osInglezes, que até agora ainda aqui não tinhão appa-recido como inim igos, posto que tivessem traficadocom os índios, antes de fundada S. Salvador1. Passados annos occorreu uma circuinstância que parecia dever ter por conseqüência o estabelecimento de

1 O primeiro Inglez que se menciona como tendo commerciado..'este paiz, é Master William Hawkins, de Plymouth, pae desir.JohnHawkins, « homem mui estimado do rei Henrique VIII, como principal capitão de mar. Armou um navio seu de duzentas e cincoentatoneladas, chamado o Paul ofPlimouth, en que fez duas viagens aoBrazil, uma en 1550 e outra cm 1552 ; da primeira das quaes trouxe

um rei brazileiro, como o chamarão, para o apresentar a Henrique VIU nos seus tiajos selvagens, á vista do que não ficarão poucomaravilhados o rei e toda a nobreza, e razão tinhão para isso. » Emreféns tinha ficado um certo Martim Cockeram, de Plymouth. Quasium anno ficou o cacique na Inglaterra, e morreu na viagem para apátria, o que se receou redundasse em damno da vida de MartimCock eram. Os selvagens porem , p lenam ente convencidos da lizura doprocedimento que com o seu príncipe se tivera, restituirão illeso o

refém. Hakhtyt, tomo 5, p . 700. Purchas, 1. 6, c. 4, p. 1179.Pelo anno de 1540 entregavão-se ao lucrativo e commodo trafico

do Brazil vários mercadores ricos e abastados de Southampton. Um certoPudsey, da mesma cidade, diz-se que fizera em 1542 uma viagem áBahia construindo não longe dVJi um forte. Ilakluyt, t. 5 , p . 7 0 1 .

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1

8 HISTORIA DO BRAZIL.

relações regulares entre a Inglaterra c estas colôniasportuguezas. Um Inglez, por nome John Wlntliall ,casou-se e domiciliou-se em Santos, e tendo optido,por influencia do sogro, licença para vir um navioinglez com mercadorias, escreveu aos seus amigos,mandou-lhes uma lista de artigos, que vendidos de-vião dar três por u m , e promelteu de carregar obarco de fino assucar secco para a volta. Despachou-se de Londres o llinion para tentar a aventura. Osm ercado res forão bem recebidos e de pa rle a pa rtereinou a maior confiança. Correu que quatro naviosfrancezes, expulsos do Rio de Janeiro, vinhão atacarSanctos, e os Inglezes emprestarão para a defezapeças e munições. Nem o fanatismo religioso prejudicou esta boa intelligencia; enterrou-se um Inglez na egreja, e qua nd o d e S . Sebastião vierão ordenspara que se não deixassem entrar nos templos osInglezes, por serem hereges, manifestou o clero deSanctos, intimando esta prohibição, o pezar que lhecausavasimilhante decreto, e a cau sad 'elle, pedindoaos extrangeiros que por tal o não tivessem em máconta. Mas tiverão máo fim tão bons principios; ef-fectuou-sepor estes tempos a usurpação de P h ilip p e,nem tardou que o Brazil tivesse o seu qu inh ão nasca lamidades1 , que a Inglaterra, entregando-se ao

1 Na viagem de Sarmiento (p . 571-5) se diz que em 1579 aparelhou algum grão senhor na Inglaterra uma expedição de dez naus,que passou o estreito, e depois retrocedeu, tencionando estabelecer-se

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10 HISTORIA DO BRAZIL

1 5 8 3 . c o m a noticia, de que dentro em poucos dias fallaria

o governador a Fenton, podendo os Inglezes enlre-lanto proseguir nos seus trabalhos de forrar decobre, carpinteirar, pescar e mais operações necessárias, mas qu e não erigissem forja nem fornosantes de terem visto o governador. Convidou Fentonestes hospedes para o jantar, e deixando-os na câmara, subiu á tolda, para consultar com os seus

officiaes sobre se os reteria prizioneiros. O vice-almi-rante Ward representou que as suas inslrucções lhesprohibião empregar a violência, excepto em defezaprópria ; o Mininn, ponderou elle, linha aberto aquium commercio, que similliante procedimento destruiria, tornando odiosos os Inglezes, quando haviamais que ganhar com bons modos do que recorrendoá força. Prevaleceu esta opinião, e offereceu-se umpresente, previamente preparado; consist iu empanno preto fino para Doria e os dous primeiros visitantes, três jardas a cada um para um gibão, eegual quan tidade para o governador, porem escarlatee rosicler.

Principio Mas o mal que W ard receava d'um procedimen tohostilidades, host il , ja Drak e o havia cau sa do; os Inglezes erão

odiados e todos os Hespanhoes na America os olliavão

Argentina, como piratas . O navio que Fellon havia tomado e24 . l 1 *

outra vez largado, encontrou-se com Flores, a quemdeu noticia de que andavão inimigos n'aquelles ma

res. Poz-se este a cruzar em busca d'elles, mas sem

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HIS TO RIA DO B B A ZIL . 11

resul tado; Ires dos seus navios porem entrarão em 1583-

Saneia Catharina e alli liverão novas de S. Vicente.Dizia-se que os Inglezes queriào estabelecer-se e fortificar-se n'aquella costa; que W hilhall a isto oschamara; que elles andavão propalando que D. Phi-lippe era morto e D. Antônio de posse de Por tugal ;e que em nome da sua rainha fazião grandes pro- "'li^n.'messas, com que induzir o povo a acolhel-os. Parled'esta historia podia ser verdadeira e o resto seriainventado pelos inimigos de Whilhall; mas a recordação ainda fresca das façanhas de Drake tudo tornava crivei, pelo que facilmente também se acreditoutudo isto. Duas horas depois de ter Doria deixado o

navio de Fenton, appareceua esquadra hespanhola,atravessou na barra, e preparou-se para o ataque.Não erão mais que dous os navios inglezes, poremm elho res. R ompeu a acção ao cahir da tarde, e durouem quanto deu luz a lua ; um dos navios hespanhoesfoi a pique *, e no decurso do dia seguinte ganharãoos Inglezes o vento e íizerão-se ao mar.

1 « Pela razão, diz Lopez Vaz, que estes três navios vinhão enfraquecidos e trabalhados de antigas tormentas, e tripolados com o refugode toda a armada hespanhola (achando-se n'elles embarcados os doentes e as mulheres), facilmente levarão os Inglezes a melhor, mettérãoum no fundo, e terião feito a m esmo a ou tro , se o houvessem que

r ido; mas elles não desejavão a perda de ninguém; e o maior valorque os homens podem mostrar, é por sem duvida deixarem de fazero mal que podem. » Esta parte do Discurso foi previamente trans-cripta por Hakluyt, que provavelm ente ao imp rimir o extrac to, nãotinha intenção de inserir depois o texto na sua integra. Como o ori-

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1 2 H I S T O R I A DO B R A Z I L .

1583. Foi este o pr imei ro ac to de hos t i l idade commet-

g l S tido no Brazil pelos Inglezes, que ainda assim nãoforão os aggressores; mas o Brazil era agora colôniahespanhola, e como tal exposto ás depredações detodo o ílibusteiro. Três annos depois da volta de Fenton destinou-se para o mar do Sul oulra expedição,cujas instrucções não erão egualmenle pacificas. Carregou o conde de Cumberland com as despezas da

aventura, de que foi commandanle Roberto Witli-rington. A elle se reunirão outros dous corsários,d'um dos quaes era Raleigh o armador. W ithringtoncapturou á embocadura do Prata dous chavecos portuguezes, que seguião para Saneia Fé *; as informa-

ginal não chegou a publicar-se, oíferece este descuido uma vantagem:a traducção não é a mesma, , e encontrando-se em am bas este comprimento aos Inglezes, deve presu mir-s e que irão foi interpolado peloIraductor. É grato deparar com este reconhecimento da generosidadeingleza na epoeba de Hrake e Cavendish. Herrera longe de exagerar,diminue a força ingleza e relata a aeção .com notável imparcialidade,prova bem convincente de quanto credito merece este inestimável

auetor.» D'aqui, diz Sarracoll, devião os mercadores e parte dos seus g ê

neros ser transportados ao Peru em cavallos e carretas. Levava estenavio por piloto um Inglez, por nome Abrabão Cooke, nascido em Lee,que tinha sido deixado pelo Minion de Londres. Inquerimal-o e aosdemais sobre o estado do rio, e disserão-no s que havia alli cinco villas,umas de setenta fogos, outras de m ais. Westas povoações ha grandeabundância de cereaes,"gado, vinho e varias fruetas, mas dinheiro deouro ou prata n a d a ; fabrica-se alli uma espécie de panno, que osmoradores trocão por assucar, arroz, m;.rmelada e doces, que era oque o navio levava. lão também a bordo quarenta e cinco negros, cadaum dos quaes dava no Peru quatrocentos ducados. Quanto á viagem

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ções que dos prizionciros houve fizerão-no suppor 158'que poderia tomar S. Salvador, e como o saque lheinspirava mais aífeição do que a passagem do estreito,desprezando a opinião do vice-almiranle, governoupara a Bahia. Apenas as vigias avistarão velas inimigas, mandou Cliristovão de Gouvca, o visitador Je- lieh Anr-

suita, chamar todos os índios convertidos que por ff'114'aquelles arredores inoravão, e estes formidáveis fre-cheiros salvarão a cidade e cobrirão-lhe as imme-diações; mas os Inglezes ficarão seis semanas nabahia, assolando o Recôncavo, e commettendo gran- san-acoii cm

' ' _° Hackluyt.

des devastações com bem pouco proveito próprio. 3- 769-'778-

Occorrérão estes tristes successos no governo de . ,'orlc° de Barrrlo.

Barreto, que morreu no fim de quatro annos deadministração. Abertas as vias de suecessão, que elletrouxera selladas, par a se abrire m em caso de mo rte,viu-se que nomeavào [o bispo D . Antônio Barreiros eo provedor mor da fazenda Chrislovão de Barros1

governadores conjunetos. Para rendel-os no governofoi nomeado Francisco Giraldes, senhor da capitaniados Ilheos, que seu pae Lucas Giraldes comprara aode Portugal, disserão-me que era esta a terceira que se fazia para oRio da Prata n'estes trinta annos. Em Sancta Fé descarregão os noviosas suas mercadorias para barcos pequenos, que sobem o rio á sirgaaté Assumpção. N'esta cidade e na de Tucuman (talvez Cordoba) umespadeirão de vinte reales prata vale trinta ducados, uma lata de marmelada vinte ducados, um espelho de mais de palmo vale trinta lis,pinturas e:n quadros de quatorze pollegadas, trinta a quarenta liscada uma. »"

1 E o unidor-gerãl Antônio Coelho d'Aguiar. F. P.

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14 HISTORIA DO BRAZIL.1S85- filho do primitivo don alario . Hon ra era esta, que

elle não ambicionava, c tendo por duas vezes sahidoa barra de Lisboa, e outras tantas tornado a entral-arepellido pelo temporal, pediu e obteve exoneraçãodo cargo, que foi então confiado a D. Francisco deSouza.

D.Francisco Nunca houve governador em quem tantas espe-de Souza ° t

governador. r a n ç a s s e pozessem.Um descendente do Caramuru,por nome Roberio Dias, era por estes tempos um doshomens mais ricos e poderosos da Bahia. Tinha ser

viços de prata para a sua capella e para a sua meza,e corria de plano que o metal de que erão feitos,fora tirado de minas que elle descobrira nas suaspróprias terras. Tanto se divulgara o boato, que ohomem não julgo u prud en te conservar o negociomais tempo em segredo, e assim foi a Madrid e offe-rcceu a el-rei achar-lhe mais prata no Brazil do queferro havia naBiscaya, comlanto, que em remuneração lhe desse o titulo de marquez das Minas. Pareceu demasiado alta a exigência; concedeu-se-lhe o

cargo de adm inistrador das m inas, acenando-se-lhecom mais algumas vantagens, com que talvez se houvera dado por satisfeito, se Philippe com algumainjustiça não fosse prometter ao novo governador otitulo que recusava a Roberio. A promessa so podiasurtir effeito, descobrindo-se as minas, e isto dependia de Roberio, que não estava resolvido a melteroutrem de posse das ho nra s, a qu e se julgava com

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 1 5

direito. Voltou com Souza ao Brazil, onde immedia-tam en te obteve licença de ir ás suas terras , pr ep ara r-se para a expedição. Este tempo em preg ou -o e lle,segundo se suppõe, em apagar todos os vestigios quepodessem levar á descoberta ; e quando Souza se poza caminho em busca das minas, contando certoachal-as, nem com a pista pôde dar-lhes. Roberiom anifestamente enganara o rei, qu er na prom essa,qu er no seu não cu m pr im en to ; e Souza, resentido dologro e da perda do seu marquezado em perspectiva,dissimulou a cólera, mas queixou-se á corte. Antesque chegassem ordens para o castigo, morreu o delinqüente, e com elle o segredo, que até para os her-

d , Rocha Pilta.

eiros o e ra 1 . 3, § 89-92.Em quanto os Portuguezes assim davão cata ás Expedição

n , . , t u T-, , ileCavemlisli.minas , veio Cavendish a assolar-lhes as costas. Esban- S ir w- Mon-

son em

jado o patrimônio da sua casa, pensou este aventu- í^ t i" :

reiro refazer ao corso a destroçada fortuna; e n u m a

primeira viagem que fizera á volta do mundo, taesbavião sido as atrocidades commeltidas que pormuito tempo deixarão nodoa no caracter da naçãoing leza . Os despojos que então trouxera havião-notentado a emprehender segunda expedição, mas detal forma os tinha elle dissipado ja, que teve de sahir

sem provisões bastantes, pelo que mandou adeantedous navios da sua esquadra, a tomar a cidade de

1 0 titulo de marquez das Minas veio a verificar-se na pessoa d'umneto de D. Francisco de Souza, Visconde do Prado. F. P.

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16

Tomadn

16 HISTORIA DO BRAZIL.1583' Sanctos, para que todos se abastecessem. Foi a popu-de drz. ' l i

lação sorprebendida á missa : um so homem tentouresistir, e foi morto, o resto ficou relido prezo na

tTnció. egreja todo aqu elle dia. Mas em logar de ba rg an harum supprimento de viveres como resgate, so cuidouCocke o vice alm iran te, de rega lar-se ebanquelrar-

se com o que achou. Aproveitarão os moradores otempo não so para fugirem, mas também para levarem tudo o que era portátil, de modo que quando oitoou dez dias mais tarde chegou Cavendish, achou umapraça sem habitantes nem m an tim en lo. Muitos índiosvierão offerecer-lhe a sua alliança, se quizesse exter

minar os Portugu ezes, e g ua rd ar pa ra si as terra s; n ãoera isto porem partido para um flibusleiro, eos nalu-raes não querião expor-se á vingança de seus antigooppressores, procurando caplivar as boas graças d'um

povo, do qual bem vião que era inútil esperar pro-tecção. Debalde se lenlou chamar os colonos outra

vez á cidade, convidando-os em nome de D. Antônio:este grito de guerra era demasiado velho, e desesperada de mais a causa. Mas com uma imprevidenciaque bem merecia a sorte que lhe acarretou, deixou-se a esquadra aqui ficar algumas semanas 1 , partindoa final menos provida de tudo do que viera.

4 Havia uma imagem de burro de Sancta Catlmrina, que Luiz, irmão do donatário Pedro de Góes, junetamente com sua mulher tinhãodado á villa de Sanctos; estava n'uma capellinha nas fraldao d'um ou -teiro chamado do nome da saneia. Os Inglezes alirárão a ima»em ao

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Cavcndishqueima

S. Vicente.

HIST OR IA DO BR AZ IL. 17

De caminho queimarão os Inglezes S. Vicente, se- 1S9'2

guirão para o estreito, não o poderão passar, e forãodispersos por um temporal. Cavendish voltou so ácosta do Brazil, e a cerca de três legoas de Sanctosmandou a terra vinte e cinco homens, que se apoderassem o mais depressa possível das provisões queachassem, trazendo-as a bordo para soccorro de seuscamaradas doentes e esfomeados. D'esta partida, composta dos principaes do navio, nem um so homemvoltou. Reunindo-se, atacárão-nos os índios, ao prepararem-se elles para reembarcar, e matárão-nostodos, poupando apenas dous, que levarão prizio-neiros a Sanctos, entrando na cidade cm triumphocom as cabeças dos mortos. Pouco depois fez Cavendish juncção com o Roebuck, um dos navios da suadesgraçada esquadra, e continuando a costear forãotodos assolando casas e plantações, até que um Por-luguez se encarregou de metter os dous barcos dentro da barra do Espirito Sancto, logar a que especialmente desejavão chegar, pela abundância de todasas couzas que alli pensavão achar. Não julgando prudente confiar implicitamente no dizer do seu prizio-

mar. Muitos annos depois tornou ella a sahir inteira n'uma tarrafa :erigiu-se-lhe nova capella, e em memória do longo tempo qu e jazera no

fundo do oceano, deixárão-lhe as cascas de ostras, que d'ella se Lm—vião pegado. Alli se venera ainda hoje cm dia, e os que mostrão aimage m, observão que o maior m ilagre foi não a terem os ico noclastas inglezes despedaçado antes de arremessarem ás ondas. Fr.Gaspar da Madre de Deus, 1, § 7 1 .

i i . 2

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18 HISTORIA DO BRAZIL.592' neiro, lançou ferro o commandante e mandou um

escaler a sondar a barra. 0 fundo que se achou nãopareceu sufíiciente; de balde o Po rlug uc z protestouqu e não tendo jamais sondado o ca na l, havia mettidodentro navios de cem toneladas; merecia a forca,qu er dos Inglezes, por q uere r fazei os nau fra gar ,qu er dos seus próprios conterrâneos por encarregar-

se de pilotar os inimigos, e Cavendish sem mais ce-remonia nem exame o pendurou da verga.

Tentativa Os botes entrarão a barra e descobrirão Ires naviosconlia

GsEanPctoito ancorados perto da villa. Sem perda de tempo queriao commandante mandar picar- lhes as amarras, mas

approximava-se a noute, e a gente recusou ir antesque amanhecesse. Toda a demora era perigosa; ocanal era péssimo, «jamais navios o navegarão peor,»diz Cavendish; passar a barra era impossível, e todoá volta estava o paiz em fogo. Comludo nenhum re médio havia contra a desobediência, e irritad o como

estava, teve o commandante de aguardar o bel prazerda sua gente. Ao raiar o dia offereceu-se esta para ir,e logo largarão os escaleres com oitenta homens ásordens do capitão Morgan. Levava elle instrucçõespara não saltar em terra, sob pena de morte, pormelhor que se lhe offerecesse o ensejo; pouco perigo

se receava da parte dos navios

1

, mas se algum visse,

1 « Sabia eu , diz Cavendish, qu e dos navios que freque ntão oBrazil nenhum era capaz de defender-se d'uma canoa, quanto mais

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 19

devia retirar-se; e se por outro lado descobrisse bom 159'2-e fácil desembarque perto da villa, mesmo então deviavoltar, para que o commandante em pessoa tentasse aempreza, com quanta gente podessem levar os boles.Com estas ordens partiu Morgan. Durante a noutelinhão os Portuguezes rebocado os navios "para defronte da villa, onde a largura do rio não excedia umtiro de besta de caça; meia legoa abaixo havião erguido duas trincheiras pequenas, ambas dominadaspor florestas e rochas sobranceiras. A do lado dopoente fez fogo, e segundo as instrucções que levava,queria Morgan retroceder. Alguns dos marinheirosjurarão que sempre por covarde o havião tido, eagora bem o provava elle próprio: moveu-o isto agrande cólera e declarou que desse por onde desse,havia de saltar em terra.

Avançarão pois: o fortim do lado do oriente, que cavendish. , . i • • . c j> rechaçadoainda ninguém havia visto, rompeu o togo, e d um morre

uc pGzsr.

tiro matou um homem e feriu dous. Resolveu-se então que a lancha mais pequena atacaria a bateria dooeste, e a maior a outra. Foi aquella a primeira queabicou em terra, e achando pouca resistência, tomou sem perda a trincheira. 0 lanchão que era demuito calado, encalhou, mas a tripolação vadeou

para a margem com água por cima do joelho. 0 baluarte era de pedra, e teria seus dez pés de altura.

de lanchas como estas, em que ião tantos arcabuzeiros, quantos po-dião sentar-se ao lado uns dos outros. »

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20 HISTORIA DO BRAZIL.592- Com dez dos seus camaradas o escalou Morgan, mas

então moslrárão-se os índios e os Portuguezes, erolando calhau s para baixo, o m atarão a elle e a cincodos seu s. O resto, pela maior parle mal feridos, fugiupara o bote, sobre o qual principiarão a chover fre-chas ; dos quarenta e cinco homens que havia abordo, um so não escapou seu damno, chegando algun s a trazer três settas cravadas. Incapazes de agüentar este desesperado c hu ve iro, larg arã o, deixandoem terras algu ns dos seus com pan heiros, preza p araos selvagens. Tendo-se assim safado chamarão os daribeira opposla que viessem ajudal-os. Embarcou apartida á pressa para esse effeito, a lancha poremdeu em secco, nem pôde ser o utra vez posta a nado ,sem que saltassem fora dez da tripolação. Entretantovoltarão os índios á abandonada bateria, e principiarão a alirar. Os dez Ingleses, sentindo as flechas,zunirem-lhes aos ouvidos, correrão á trinc he ira, eíizérão fogo para dentro pelas selteiras de baixo;mas em quanto assim se occupavão, o capitão doRoebuck, «o mais cobarde villão,» diz Cavendish,«quejamais viu a luz do sol, » mandou remar asafar d'alli, deixando aquelles bravos despojos doinimigo. Mettérão-se elles á água até ao pescoço,para serem recolhidos a bordo, mas os seus birban-tes de camaradas nenhuma compaixão tiverão, e« assim vilmente se pe rde rão estes ho m en s. » Depoisd'esta mallograda tentativa deixou Cavendish a costa

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 21

do Brazil, morrendo na viagem para a pátria tão de 1592

pezaroso como de moléstia.Baseada sobre nenhum plano fora esta expedição Expedição

. . . d e Lancaster.

miseraveTmente mal dirigida : a que se lhe seguiuparece ter sido concebida e executada con mais tac-tica do que nenhuma outra das d'estes corsários

aventureiros. Certos moradores de Londres aprestá-rão Ires navios, dos quaes o maior se computou dedezentas e quarenta toneladas, o menor de sessentaapenas, e o outro de cento e setenta. James Lancaster, fidalgo da mesma cidade, foi escolhido paraalmirante. Tinha elle, segundo dizia, sido educado

entre os Portuguezes, vivido entre elles como fidalgo,servido com elles como soldado, e morado-lhes nasterras como mercador; commeltia pois o que sepodia dizer traição m oral, tomando armas contra umpovo, entre o qual tanto tempo havia estado domiciliado. Foi Pernambuco o logar que elle resolveu

investir : arranjou dous Francezes de Dieppe bemversados na lingua dos índios, e deu á vela com umatripolação de duzentos e setenta e cinco homens emoços. Duas vezes na viagem rompeu um navio umdos mastros, e tendo por tanto volvido atraz paraconcertar, bem quiz a gente das outras embarcações

persuadir o almirante a disistir d'uma emprezapara que ja lhe falecião forças; mas elle respondeuque Barker, o seu vice-almirante, era por demaisresoluto para não se achar no ajustado ponto de reu-

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22 HISTORIA DO BRAZIL.

1594. nião, mal reparasse as suas avarias , e que nada o

faria desviar-se do rumo em que um a vez haviaassentado, sendo por estas mudanças de plano que amaior parte das expedições se havião mailogrado.Não o engan ou a sua con fiança. Barker r eu n iu se aelle na altu ra do Cabo Bra nco , ond e com o seu cha-veco ja havia capturado vinte e quatro velas a Hes-

panhoes e Portuguezes. D'um dos prizioneiros sou-berão que um galeão com rico carregamento daíndia naufragara na costa de Pernambuco, achando-se todas as m erca do rias arm aze nad as no Recife, portode Olinda. Alegres com esta noticia, tomarão osInglezes cinco das suas prezas, para serem empregadas segundo o caso o exigisse, e singrarão para a

ilha de Maio, onde armarão uma galeota de quatorzebancos, destinada para o desembarque, e de quehavião trazido as madeiras. Aqui se encontrarão comou tra esqua dra de corsário s, com mandada pelo capitão Venner, e composta de dous galeões, um hiatee urna preza biscainha. Venner de boa menle se as

sociou a Lancaster, e segundo o uso do mar, lavrou-se o ajuste por ambas as parles assignado, e peloqual devia Lancaster ter três quinhões e o outro oquarto de quanto se tomasse.

chegada D'alli governarão para o Recife, chegando á vistaao Recife. , , . D

20 die595arc°' P ° n u m a raeia n o u t e ^0 S u n s d e março. A'

entrada estavão sobre os ferros três navios hollande-zes grandes, da parte dos quaes era de esperar ai-

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HISTORIA DO BRAZIL. 23

guma resistência. Lancaster tripolou as suas cinco 1393

prezas, que erão de sessenta toneladas cada uma, eordenou á sua gente que se os Hollandezes fizessemalguma opposição, corressem sobre elles, e postofogo ás próprias embarcações, se mettessem nos es-caleres, ganhando assim a entrada. Era sua intençãodesembarcar com as lanchas apenas amanhecesse,deixando os navios fora do porto, até tomar os fortese a villa. Embarcou a gente para este feito, assumindo elle.o commando da galeola, q ue tripolou comoitenta homens de seu próprio bordo. Mas ao primeiro arrebol da aurora, viu-se que as lanchastinhão ido dar meia legoa para o no rte da barra ; eantes de poderem voltar veio a vasante, e a esquadraficou fora do porto toda á vista da villa. Tiverão porem a satisfacção de ver que os Hollandezes, lançand o espias, se arredavão do ca m inh o, removendoa principal causa de receio. Pela volta do meio diamandou o governador um mensageiro a saber o quepretendia aquella frota. Lancaster respondeu quequeria a carga do galeão; que a buscal-a vinha eleval-a havia, como o governador não tarda ria a vel-o.Entretanto guarnecérão os Portuguezes o forte outerrapleno á foz do porto, reunindo toda a força quehavia á mão, e que serião uns seis centos homens.Lancaster ordenou aos seus que á voga arrancad a remassem a abicar em terra com violência tal , que,despedaçadas as lanchas, não livessem em que fiar-se

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Toma

a cidade.

24 HISTORIA DO BRAZIL.159S mais do que em Deus e nas suas armas. Erão estes

flibusteiros excessivamente religiosos; para tudo tinhão o nom e de Deus na boca, e gran de esperançapunhão no auxilio divino para levarem a bom fimo objecto da sua viagem, d'uma viagem cujo únicoalvo era o saque e a rapina .

Serião duas horas da tarde quando Lancaster lar

gou de bordo com maré de feição; passou os Hollandezes, o forte prin cip iou a joga r, e um a bala levouquasi toda a bandeira da galeola. Os Inglezes vararão a embarcação em terra, mesmo por baixo dabateria, a um cabo de distancia d'ella; com o choquepartiu-se a poupa, o mar galgou por cima, e a ga-

leota afundou-se immedia tamen le : oulro tanto prac-ticárão as lanchas. Havia no forte sete peças debronze, cuja po nta ria fizerão os Po rtuguezes tão baixaque os tiros se perderão todos na areia, ficando feridoum so homem. Exultando com isto, pois que umadescarga bem dirigida devia ter sido de varrer,

exclamou Lancaster : A elles! a elles! Com o favor deDeus tudo é nosso! Assim correrão a escalara preça;desanimados retirárão-se os Portuguezes para umsilvado próximo, e sendo perseguidos, fugirão porum cam inho ainda enxu to, apezar da m aré quecrescia. Fez Lancaster então signal aos navios que

entrassem. Deixou uma guarnição no forte, assesloua artilharia contra Olinda, d'eonde receava o maiorpe rigo , e m arch ou sobre a villa baixa, como elle

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HISTORIA DO BRAZIL. 25

chama o Recife, composto n'aquelles tempos de 1595-pouco mais de cem casas. A' sua vista, embarcou opovo em caravelas e canoas e abandonou o logar,deixando aos vencedores o rico carregamento do galeão, e grandes depósitos de gêneros do paizi.

No governo da sua conquista não desenvolveu o Toma os, . i - i Hollandazes

almirante menos prudência, do que valor havia ao seu1 ' l serviço

mostrado em ganhal-a. Não se commetteu a menordesordem, nem pilhagem particular; talvez nemantes nem depois tenha havido bandoleiros que comtão rigorosa ordem e regularidade se portassem. Tão

grossos despojos não se deixavão remover á pressa, eforçoso era manter por algum tempo a posse da villa.Immedialamente se fortificou o isthmo em que estáo Recife, com uma palissada de nove pés de altura,para a qual na villa se encontrarão materiaes, e erigiu-se um forte para o qual do da boca do porto se

passarão cinco peças de artilharia. Feito isto enta-bolou Lancaster negociações com os Hollandezes,offerecendo fretal-os para a Inglaterra em termosque lhes parecerão vantajosos, pelo que de todo ocoração íizerão causa commum com os Inglezes.Dentro de alguns dias apparecérâo três galeões e duas

pinaças; formavão uma esquadra de corsários france-1 « 0 dia da nossa chegada, » diz o narrado r d'esta bem dirigida eprospera viagem, « era um a sexta feira sancta em que elles teempar costume fustigareu.-se a si próprios ; mas agora nos enviou Deuscjmo u m flagello gjral para todos, pelo que bem poderião te r poupado entre si aquelle trabalho. »

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26 HISTOR IA DO BRA ZIL.1595- zes, e succedeu que u m dos seus capitães ainda no a nno

anterior linha recolhido Lancaster na ilha da Mona,uma das Antilhas, onde naufragara. Pagou-lhe agoraLancaster o serviço, dando-lhe uma carga de pau brazil para o seu baixei e pinaça, e uma caravela de cin-coenla toneladas carregada do mesmo gên ero. Os outros Francezes p o r felizes se derão tom and o o seu qu i

nh ão no serviço a troco d 'um qu inh ão nos despojos, eassim obteve Lancaster u m corpo considerável de auxi-liares, que pagou generosamente com o que elle própr io não poderia ter levado, e por isso havia de destru ir.

No terceiro dia depois da chegada d'estes flibustei-ros, descerão de Olinda três ou quatro pessoas das prin-

cipaes da cidade para tractarem com o almirante.Apenas soube d'isto disse Lancaster que carecia ir abordo dos Hollandezes, e lá se deixou ficar, em despeito de repetidas mensagens, até que, esgotando-seaos Portuguezes a paciência, retirárâo-se. Perguntadopela razão d'este extraordinário proceder, respondeu

que conhecia bem este povo, como quem entre elletinha sido criado: « Quando nada podem fazer coma espada, disse elle, recorrem á lingua fallaz, pois fée verdade é couza que não conhece m . E para quehavemos de pa rlam en tar? Com o favor de Deus houvemos a quanto vínhamos, e bem pouco prudente

seria deixal-os fazer por nos tirarem com astucia oque ganhamos com a força. » Mandou pois dizer aosPortuguezes que d'elles nenhuma proposta acceitaria,

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HISTORIA DO BRAZIL. 27

e enforcaria o prim eiro que lhe trouxesse al g u m a. 1595,

Entretanto progredia o trabalho de carrega r o comboio. N'um ataque dado contra os invasores, tomarãoestes cinco carrocinhas das usadas no paiz, preza demaior valia para elles do que a artilharia e muniçõesque na m esma acção lhes cah irão nas m ãos, poisque sem estes meios de transporte não poderião lerembarcado muitos dos gêneros mais pezados. Namanhã seguinte, sem a menor desconfiança do quesuccedera, entrou no porto um navio com quarentaPortuguezes e uns cento e oifenla negros. Lancasterdeixou os negros irem para onde quizessem, e guardou os Portuguezes, que puxassem as carretas; comeste insolente emprego dos prizioneiros alliviando asua própria gente, incapaz de trabalhos pezados emtão calido clima.

Vinte dias havia ja qu e os Inglezes estavão senhores Teutativ0 de

do Recife, e apezar de terem tido de sustentar repe- ^í^víõs!6

tidos assaltos, sempre obrigados a conquistar á forçad'armos a água que bebião, pouco damno haviãorecebido. Não estavão porem ociosos os Portuguezes;pozerão fogo a cinco caravelas e deixárão-nas ir rioabaixo ao som d'a gu a. Com esta tentativa ja Lancasterhavia contado, e estacionado por tanto meia legoaacima dos navios seis lanchas bem providas de fa-teixas e correntes de ferro, com que harpoárão ascaravelas, encalhando umas e ancorando outras, ondeacabassem de arder.

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28 H ISTOR IA DO BR AZIL.1595 Seis dias depois, uma hora antes de meia noute,

ahl vierão descendo o rio três enormes jangadas achammejar ho rren da m en te; fixadas ao costado traziãocompridas varas, que não permillissem aos Inglezesdeitar os seus harpeos, e lambem tubos, carregadosde fogo de artificio, dos quaes não ousava a genteapproximar-se com receio de que o chuveiro de

chispas lhe incendiasse a própria pólvora. Com tudoou se havião de alar para o lado estas balsas, ou osnavios ardião irremediavelmente. Cingidos pois depannos molhados os cinctos e polvorinhos, avenlu-rárã o-s e os m ar in heir o s a harpoal-as, e, conse-guindo-o, derão com ellas em secco, onde arderão

até de manhã. Tentarão agora os Portuguezes picaras am arr as ao inim igo , m as nem isto lograrão, tãogrande era a vigilância. Preparava-se terceira tentativa por meio do fogo, e Lancaster bem via qued'estavez não escapava; mas ja então com toda a rapina abordo, estava elle prompto para fazer-se de vela.

Succedeu não haver maré senão de tarde. 0 almirante observou um banco de areia formado defrontedo logar, onde estavão fundeados os nav ios, e sobreelle algum a ge nte. Correndo immediatamente á villa,convocou os seus capitães, e dando conta do que vira,consultou-os sobre-se conviria fazer uma sortida, e

ver o que queria o inimigo; a sua própria opiniãoera que tendo de dar á vela aquella noute, loucurafora buscar sem necessidade a guerra. Outros houve

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HISTORIA DO BRAZIL. 29

porem qu e com b astante fundam ento ponderavão 1593-poder muito bem succeder, que o vento os nãodeixasse sahir tão cedo como meditavão, pelo quemelhor seria não desprezar precauções. A este argumento rendeu-se Lancaster; adoentado havia dousdias, não podia elle ir em pessoa, incapaz como seachava de marchar por aquella grossa areia. Masposto que pouco perigo receasse, em logar tão pertodos navios, que quarenta peças de artilharia se pode-riâo fazer joga r contra o inim igo que alli os investisse,entendeu que devião ir com forças respeitáveis, prevendo sempre o peor; e por conseguinte sahirão trezentos hom ens entre Inglezes e Franc ezes, a esle reconhecimento.

As inslrucções erão de de stru ir as obras queachassem, e depois voltarem. Ao approximarem-se,disparão-se-lhes alguns tiros e abandonou-se o posto.Acharão o principio d'um lerrapleno disposto paraum baluarte, e todo o trabalho se reduziu a queimaralgumas traves; mas vendo bandeiras a uma milhade distancia, fora do alcance dos navios, d'onde opróprio Lancaster estava promplo a apoial-os, paralá avançarão estes imprudentes. Pensavão voar avicloria ce rta, e na soffregridão de virem ás mãoscom ó inimigo, alguns se adeantárão ao grosso dapartida. Os Portuguezes os forão attrahindo, até queos envolverão no meio de todas as forças do paiz,Trinta e cinco dos da vang uard a cah irão logo m ortos,

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30 H ISTOR IA DO R R AZ1L.1595- e ent re elles o vice-almirante Barker, o seu ajudante,

e dous capitães francezes, sendo os outros perseguidos de perto, até que se pozerão debaixo da protecçãodos navios1 . Ao cahir da mesma tarde levantarãoferro e fizerão-se de vela onze embarcações de conserva, todas ricamente carregadas, e das quaes nemuma deixou de chegar a porto de salvamento.

Quando se vêem ricos, raras vezes se dão porsatisfeitos os flibusteiros, servindo-lhes com justiçade castigo essa mesma sede de rapina que primeiroos levou ao c rim e. Ha po rem razões para crer queLancaster se contentou com a sua fortuna, pois d'ellese não encontra mais menção feita; tornando o bomsenso com que dirigiu toda a expedição, provável oacerto com que saberia desfructar-lhe o producto.

iiackiuyt. No mesm o anno que Lancaster saqueava o Recife,7io. alcançavão os Portuguezes em S. Salvador um grande

triumpho sobre os huguenotes. Alguns corsários daRochella, a caminho para uma expedição de rapinacontra o litoral da Bah ia, tomarão o forte portuguezd e A r g u i m , na fronteira costa da África : saquearãoa egreja, demolirão os altares, e, em má hora paraelles, levarão sancto Antônio em tropheo. E sabendo

« A única noticia que d'esta expedição de Lancaster encontro em

escripto portuguez, é uma menção incidente na Relação annual para1601-2. Alli se diz erradamente que os Inglezes tractavão"de accom-metter Olinda quando assim forão rechaçados, e com verdade provavelmente que os Portuguezes deverão esta victoria aos índios convertidos. F. 114.

T. 3, p. 703

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HISTORIA DO BRAZIL. 51

que era elle o maior saneio dos Portuguezes e Brazi- 1595

leiros, pedirão a sua sanetidade que houvesse porbem conduzil-os á Bahia. Tão miserável foi a v iagem,e tanto tiverão que soffrer do mar e do escorbuto,que de toda a esquadra sos dous navios ganharão acosta do Brazil, e esses em tão laslimoso estado, quepor fortuna o tiverão entrar na Bahia como prizio-neiros, com as vidas salvas por única condição. Antes de feita esta composição lembrárão-se que tinhãosaneto Antônio a bordo, e o tractamento que lhehavião dado tornava o caso m ais feio ain da. Paraoceultar isto aos Portuguezes, alijárâo-no, esquecidos de que um saneto Antônio de pau não iria facilmente ao fundo. Para final confusão dos miseres,soube o saneto achar o caminho da cidade, e do cãesdistinctamenle o virão vir posto de pé, a marcharpor sobre as ond as. O governador e o clero o accom- ^'slo.panhárão em procisso triumphal, através da cidade,até qu e o forão inslallar na egreja dos Capuchinhos .0 castigo que se infligiu á Iripolação, ninguém odiz, masnum caso d'esta natureza não era provávelque se usasse de misericórdia, mormente havendomilagre de permeio. Tendo alguns selvagens roubado uma capella nos subúrbios de Piratininga, ouS. Pa ulo , como depois se ch am ou , foi um d'ellesque ajudara a queb rar um a imagem de ba rro daVirgem, feito prizioneiro, ligado á cauda d'um ca-vallo, e arrastado pelas ruas até espirar.

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Do r a d o .

52 HISTORIA DO B1UZIL.1595- A boa fortuna de Lancaster teria provavelmente

desafiado outras expedições, a não ter Ralegh offere-cido aos aventureiros inglezes muito mais tentadorengodo; e a fábula do-El Dorado, que á Hespanhacustou mais sangue e dinheiro do que todas as suasconquistas no novo m un do , serviu agora para desviar do Brazil estes inimigos. O theatro da jornada

de Ralegh fica fora dos limites d'esta historia; mas afabulosa terra do ouro foi buscada com egual cre-dulidade por parte do Brazil, nem deixará de vir aquia pello a explicação da origem d'uma ficção que tãoextraordinários effeitos produziu.

Por toda a costa do continente hespanhol na Ame

rica do Sul corria a voz d'um paiz sertanejo, ondeabundava o ouro. Referião-se estes boatos indubitave lm ente aos reinos de Bogotá e Tunja, hoje NovaGranada. Belalcazar, que partido do Quito, buscavaeste paiz; Federman, que vinha de Venezuela; eGonçaloXimenezdeQuesada , a procural-o, seguindo

o rio Magdalena, aqui se encontrarão. Mas lambemn'estas partes se fallava d'um rico paiz remoto; famaegual corria no Peru ; no Peru referia-se ella a Granada; em Granada designava o Peru ; e os aventureiros d'ambas as partes depois de apanhada a caça,principiávão outra vez a correr atraz d'ella. Não

tardou a confeccionarse um reino imaginário, queservisse de alvo a estas buscas, nem a respeito d'ellese inventavão contos com mais facilidade do que se

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HISTORIA DO BRAZIL. 33

acreditavão. Dizia-se que escapo do extermínio dos 1593.Incas', fugira um irmão m ais moço de Atapalipa,levando a maior parle dos thesouros, e fundara umimpério maior do que esse qüe sua família haviaperdido. A's vezes chamava-se este phantastico imperador o Grão Payliti, outras o Grão Moxo, outrasoEnim ou Grão Paru. Um impostor affirmou emLima ter estado na sua capital, a cidade de Manoa,onde não havia menos de Ires mil operários empregados na rua dos Ourives ; chegou até a apresentarum mappa do paiz, em que figurava um monte deouro, outro de prata e um terceiro de sal. As colum-nas dos paços imperiaes erão de porphyro e alabas-tro, de cedro e ebano as galerias; o throno de marfim, e de ouro os degraus por onde para elle sesubia.

Quando D. Martin dei Barco escrevia a- sua Ar-(jcutnia, que foi pelos tempos da primeira expediçãode Ralegh, corria no Paraguay o boato de ter sidodescoberta a corte do Grão Moxo; D. Martim o referecomo noticia segura, lastimando que Cabeça de Vacavoltasse dos Xarayes, pois que se houvera seguidoavante na mesma direcção, teria sido o descobridorbemaventurado. Estavão estes paços, diz elle, n'uma

1

Para o México era o Grão Quivira o mesmo que Enim para o Peru ,o imaginário successor da decahida dynastia. Feyjoo (Th. Cril., t . 4 ,10, § 15) refere com alguma probabilidade a origem d'esta fábula ;'snoticias que os índios davão dos estabelecimentos francezes no Canadá.

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U HISTORIA DO BRAZIL.

«95 . ilha formada por um lago. Erão de pedra alva ; aentrada ergião-se duas torres e entre ellas uma co-lumna de vinte e cinco pés de a l to ; no seu cimovia-se uma grandiosa lua de prata, e prezos á suabase por cadeias de ouro estavão dous bões vivos.Quem passasse por estes dous guardas, entrava numqu adra do plan tado de arvores e regado por um a fonteargentina que esguichava por quatro tubos de ouro.A porta do palácio era de cobre, pequeníssima, eoseu ferrolho prendia na rocha viva. Dentro estavaum sol de ouro sobre um altar de prata, deante doqual ardião quatro lâmpadas de dia e de noute. Pormais manifestamente que estas ficções fossem extra-hidas dos romances de Amadis e Palmeirim, aindanão erão assaz grosseiras para a sedenta avareza

d'aquellas para quemsefabr icavão .0 reino imaginário obteve o nome de El Dorado

do trajar do seu im pe ran te, que linha o merecimento

de vestir á moda selvagem. Todas as manhãs lheuntavão o corpo com uma certa gomma aromaticade gran de preç o, e depois com um tubo lhe sopravãoem cima ouro em pó, até o cobrirem dos pés.até ácabeça; e á noute lavava-se tud o. Repulava o bár

baro este trajar mais magnífico e esplendido do que

o de nenhum outro potentado do mundo, e d'aquiveio o nome de Dourado que lhe pozerão os Hespa-nhoes. A historia de todas as expedições em pr eh en -didaspara conquista d'este reino , form aria um vo-

Ramusio.5 , ff. 416

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 35

lume não menos interessante que extraordinário. 1595-Não é possível que Ralegh acreditasse na existên

cia de similhante paiz, que não era a credulidade oseu defeito predominante; mas tendo formado o pro-jecto de colonizar a Guiana, serviu-se d'estas fábulascomo chamariz da avidez do vulgo. Procurando assimcom embustes envolver a nação n'uma empreza indubitavelmente de grande importância nacional,arruinou-se a si; as suas narrações so encontrarãodesconfiança, como crimes lhe imputarão as desgraças, e apezar de seus grandes e inquestionáveis talentos e até d'essa insigna morte que alias lhe teriatornado veneravel o nome, ficou na sua memóriauma mancha. Mas os seus sequazes terião ido exercerem outra direcção o seu mister de piratas, se elle osnão houvesse conduzido ao Orinoco, e o Brazil lhedeve um longo período de Iranquillidade; primeiramente forão os seus projectos que attrahirão os aventureiros a outro campo, e depois aterrou-os o seutriste exicio.

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HISTORIA DO BRAZIL.

1505 .

CAPITULO XIII

Expedições partidas do Maranhão. — Os Tapuyas. — Vantagens obtidaspelos Jes uíta s e dimin uição dos indíg ena s. — Pacificação dos Aymo-

r 6 s . — Estabelecimen to no Ceará. — Expedição dos Francezes á ilhado Maranhão. — Expulsa-os Jcronymo de Albuquerque. — Fundação dacapitania do Tara, e cidade de Belém. — Destruição dos estabelecimentos hollandezes na foz do Amazonas.

Expedições Em quanto os Inglezes buscavão na Guiana o Ello iaranhão. Dorado, tentava Gabriel Soares fazer a mesma desco-

Berredo. '

2, § 93. b e rta 5 partindo do Brazil; alcançou as cabeceiras do

rio S. Francisco, avançando quasi até á província deCharcas, mas taes trabalhos passara, e tão grandeperda de gente soffrera, que força lhe foi retroceder.Pero Coelho de Souza, colono da Parahyba, tentouentão por água a mesma empreza; não se diz em quedirecçâo, mas provavelmente foi pelo Amazonasacima. N'esta expedição sem proveito gastou elle

grosso cabedal, mas o máo resultado não o aterrouque não commettesse segunda. Depois de ler por onzeannos dirigido o governo foi D. Francisco de Souzarendido por Pedro Botelho, eo novo governador aco-roçoou Pero Coelho, dando-lhe a commissão de conquistar e colonizar com o titulo de capitão-mór.

Apparecérão uns oitenta aventureiros, que n'esta

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 37

descoberta jogarão vidas e fortunas : erão muitos 1595-d'entre elles versados nas línguas indígenas, e oito-centos índios os acompanharão como aluados. Parted'esta força seguiu a costa em dous caravelões comum piloto francez1, que a conhecia a palmos, avançando o troço principal por terra até ao Ceará. Alliengrossou o capilão-mór a sua gente, encorporando-lhe algunsdoslndios mais civilizados, e todos junctosproseguirão até á Serra de Ibiapaba. Os Tabajarésoppozerão-se á marcha. Mel-Redondo, um dos caciques, era auxiliado por um punhado de Francezesás ordens do senhor de Manbille, mas não pode impedir que os Portuguezes lhe tomassem Ires dos seusfortes; obteve comtudo condições favoráveis e sub-melteu-se com mais de trinta aldeias. Outro caciqueda Serra, por nome Juripari, ou o Diabo, foi maisfeliz na sua resistência, e apoz um mez de guerracom elle, por felizes se derão os invasores com receberem ordem de desistir da infructuosa jornada.

Pero Coelho retirou-se para Jaguaribe, então da viiiamajurisdicção de Pernambuco. Não desanimado ainda, Pero coelho.para aqui transferiu a sua família, principiando umacolônia, que chamou TSoca Lusitânia, e uma villa,a que deu o nome de Nora Lisboa. Procedeu porem

1 Diogo de Campos o chama Otuimiri, nome evidentemente maisKipinambá que francez, e provavelmente posto a este homem pelosíndios. Accrescenta Diogo que Pero Coelho nada fazia sem que o consultasse. Jornada do Maranhão, p. 2.

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40 H I S T O R I A D O B R A Z I L .1595- em certos logare s, cobrem-se de verd ura em outros as

suas vertentes. Subil-as é trabalho afanoso para quatro ho ras , em qu e, alem dos pés , ha m uitas vezes queajudar-se de mãos e joelh os; ganh o porem o viso,encontra-se o viajante n'uma região em que bellezasde todo o gênero como que porfião em enlear-lhe oso lh o s: avista roch as, cabeços, outeiros, valles, e vastassavanas, nuvens a seus pés penduradas sobre as pla

nícies, e na orla do horizonte o oceano. Curtos sãoalli os dias, sempre nevoadas as manhãs, e apressadas as tardes com os montes que se levantão aopoente, a cavalleiro dos outros. São frias as noutes,nem no inverno se supporlarião sem fogo. Notável éhaver alli pouca água, mas essa pouca é excellente.A esta circumslancia attribuiãó' os Tapuyas e Taba- *

jaras a escassez de toda a espécie de caça, não atlen-dião porem que a não mudarem freqüentemente depouso, devem as tribus caçadoras ver escassear-lhesdepressa o alimento.

os Tapuyas. Raça a mais antiga do Brazil, tinhão os Tapuyas1

senhoreado toda a costa do Amazonas ao Prata, até• qu e forão rechaçados pelos Tup is em epocha que não

podia ser muito remota, pois que vivia ainda emmemória de selvagens. Suppu nha-se que no serião seextendião ainda por toda a linha d u m rio ao outro,e que erão mais numerosos do que nenhuma outra

t Esta denominação de Tapuya, significando bárbaro, parece antesuma alcunha do que o nome d'uma tribu. F. P.

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1595.

2,73.

H ISTOR IA DO BBAZIL. 41

tribul.Seu nome significa Os inimigos, assim chamados da eterna guerra que fazião a todos os outrosíndios, e até uns aos outros. Comtudo de todos osíndios brazileiros erão estes os menos cruéis; os Portuguezes lhes compravão escravos, pois que ellesnunca matavão os prizioneiros, e o inimigo quen'uma de suas casas de residência podia asylar-se,estava seguro. Jamais Tapuya violou este sanctuario,por mais forte que fosse a sua cólera e grande a provocação. Anlhropophagos erão, mas de natureza pe- Noticiasculiar : os Tupis devoravão seus inimigos como o

1 Vasconcellos diz que algumas pessoas os tinhão por mais numerosos do que todas as outras tribus. Este escriptor divide todos os índios brazileiros em duas classes principaes, mansos e bravos. Incluindona primeira denominação todos os que fallão alingua tupi, chama Tapuyas todos os outros. Auctores mais modernos em pregão o nome v agamente, em logar da antiga designação genérica de índios. Vasconcellos quer contar entre elles mais de cem linguas differentes, e especifica os Aymorés entre as suas subdivisões. N'esta ultima asserçãoclaudica elle evidentemente : os Aymorés apparecérão pela primeira veznas provincias do sul, e so 180 annos depois da descoberta da Ame

rica : vinhão ainda mais do sul, do que a sua estatura é tal ou qualpresumpção, e a compleição prova. Falhvão uma lingua nunca até entãoouvida no Brazil. A' vista de todos os lad os de que tem os noticia, épois claro, que três grandes tribus ou nações emigrarão successiva-mente do interior para a costa, primeiro os Tapuyas, depois os Tupis,e afinal os Aymorés *.

O Jaboatão limita os Tapuyas entre o Grão Pará e Jaguaribe. Por todaesta extensão de costa, e no sertão, diz este escriptor, erão elles innu-

meraveis, especialmente ás margens d'esse rio, que d'elles tomou onome de Rio Grande dos Tapuyas. Preâmbulo. Digressão, 2 . Estância, 1, § 10.

Pensa o senhor Varnhagen que os Aymorés devem ser descendentesdos ralagões ou Araucanos. F. P.

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Maregraff.L. 8, c. 12

8, 13.

4 2 H IS T O RIA DO B R A Z IL .

1595- maior signal de ódio, os Tapuyas comião os seuspróprios mortos como ultima demonstração de respeito. Se morria uma c r i ança 1 , era comida pelospães, mas no cadáver do adulto todos os parentestinhão qu inh ão : guardavão-se os ossos para bodas,sendo então pulverizados, e tomados como a couzamais preciosa que offerecer se podia. 0 regulo d'uma

horda distinguia-se pela sua coroa ou tufo de cabello,e pelas unhas dos dedos grandes dos pés; unhascompridas era couza mui estimada e trazião-nas osparentes d'aquelle, e os que na guerra se havião assi-

gnalado, mas ás dos dedos das mãos se lhes limitavao privilegio, que.deixar crescer as dos pés era prero-gativa do chefe. A certos respeitos parece ter estetambém mettido a mão na seara do conjurador. Emcima d'uma esteira, no meio da sua tenda, estava um

cabaço gra nde coberto, que so elle podia olhar; opovo o fumigava quando fumava, e ia depôr-lhediante a caça e o mel que trazia das selvas, até ocacique permittir que se retirassem estas offertas.Dentro do cabaço havia seixos, pelo que parece tersido isto um empréstimo aperfeiçoado do culto da

maraeá. Pretendia o chefe curar moléstias com fricções e cuspiduras de tabaco; e quando uma donzellacasadoura não achava pretendente, marcava-a a mãe

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HISTORIA DO RRAZIL. 4 3

de verm elho debaixo dos olhos c levav a-lhe a el le , 1595-

qu e lhe pozesse en ca nto . Com cânticos e da nç as se

celebrava o nascer das P le iades , que parecem ter a l l i

passado por d iv indades . !acob Rabb>-

Mudavão os Tapuyas de logar de residência mais

freqüentes do que nenhum a ou t r a t r i b u . N a véspera

de l evan ta r - se o acam pam ento reun ia o cac ique os

con j u r ado r e s , pa r a s ab e r em que d i r ecção m ar cha r ,

e onde fazer a l to . Antes de par t i rem todos s e b anha -

vão, esfregavão com areia fina os corpos, e tornavão

a b a n h a r - s e ; depois faz ião es ta lar as ju nc tas , e a r r a -

nhavão-se deante do fogo com os dentes de cer tos

pe ix inhos , a pon to de esgu ichar o sangue em mui tas

par tes , operação que se r epu tava p reven i r e r emedia r lotVaAn.

a fad iga 1 . Apenas a lcançavão o logar des ignado, os

m anc ebo s cor tavão ram os , e com el les cons t ru ião

seus r anchos ou choças 2 ; fei to is to, sahião os homens

a caçar , pescar , e procurar mel , e as ve lhas , que ca

tassem fruclas e raizes, em q ua nt o as m oças em casa

prep arav ão a com ida á m edid a qu e lhes t raz ião os

in gr ed ien tes . A caça era t rab alh o, e não rec re io . Os

conjuradores indicavão a d i recção em que devia

buscar -se ; os mais exper tos na sc iencia encarregavão-

se d ' is to, e assim que descobrião cama ou cova, cer-

1

Jacob Rab bi, que viveu muitos annos en tre os Tapuyas, freqüentemente experimentou este remédio, de cuja efficacia se convenceu.2 Estas, segundo Vasconcellos, chamão-se Tapuyas, como os seus

moradores, pelo que não pôde ser na própria lingua d'elles, que estapalavra tem a significação de inimigos.

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S. Vasc.N o t . A n .

1, § 144-6.

4í HISTORIA DO BRAZIL.1595

- cava-se o logar, e se o animal escapava ás settas, oque era quasi impossível, lá estavão os cães, parasegural-o com certeza. Feita a caçada, levava-se oproducto para casa, dançando e cantando, sahindo oresto da horda ao encontro da partida com eguaes demonstrações de regosijo. A comida que se queria pre

parar, mettia-se n'um poço ou forno de terra forradode folhas; cobria-se depois de outras folhasede terra,e por cima se lhe accendia fogo, excellente e nãodesusado modo de assar. 0 chão lhes servia de meza,e po r toalha tinh ão folhas, de que comtudo nemsempre usavão. Tudo que se lhes punha diante por

via de regra era consumido, aturando o appetile selvagem em quanto aturava o mantimento; o resto dodia passava-se em jogos, indo os mancebos a cantar, eas raparigas a dançar atraz d'elles, cada uma atrazd'aquelle que amava. Quando ião de marcha fazia-seum a experiência de forças, para a qual servião ostroncos de duas arvores novas de egual grossura etamanho : dividia-se a horda em dous magotes, eaquelle que primeiro chegava com a sua arvore aologar em que devião fixar a residência, exultava sobreo outro. Guardavão-se então os ramos ao lado da

cabana do cacique, para servirem na primeira mudança seguinte.

«oiicias. A agricultura ficava a cargo das mulheres, outraMSarIgaraCíf. circumslancia em que estes índios se dislinguião dos

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 4 5

dias mudavão de pouso, pelo que jamais cultivavâo o 1595-solo. Hordas havia que em logar de arco usavâodardos de arremesso. No sertão da Bahia a oitentalegoas da costa enconlrava-se uma nação por nomeMaraques, entre a qual as mulheres trazião umaespécie de avantal, andando tudo o mais nu. Pescavaeste povo com rede de que os Tupinambás não sabiãofazer uso; fazião-nas de uma trepadeira comprida etenaz, e em quanto uns a arrastavão pela corrente,balião outros a água. Havia no seu território umaserra com salitre, e elles queimavão a terra, ferviãoas cinzas, e recolhião os saes crystalizados.

Passão os Tapuyas por terem sido macrobios maisque nenhuma das outras nações, posto que a longevidade a todas se attribua; as crianças principiavão aandar tão cedo que fazia pasmar, e começavão quasique logo lambem a nadar. Aformosear-se era privilegio do sexo masculino; furavão as orelhas e quando

rapazes cortavão o lábio inferior longitudinalmentepara formarem uma boca supplementar1. Fazia-seesta operação n'um logar especial, com assistênciade todo o povo a dançar e a cantar como n'uma cere-monia religiosa. Um conjurador deitava o padecente

1 Não é este costume menos hediondo que imm und o. Quando os

índios viajão pelas solidões, diz Knivett (Purchas., 1. 6, c. 7, p. l'22ft),vão munidos de grande quantidade de labaco, levando uma folha constantemente mettida na boca entre o lábio e os dentes, e como andão,llies vae escorrendo a saliva negra pelo orifício que teem no lábio debaixo.

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46 H ISTOR IA DO BR AZIL.1595- no chão, amarrando-o de mãos e pés, em quanto

outro com um instrumento de madeira fazia a inci-são e erguia a mãe clamoroso pranto. As faces somente se furavão quando o mancebo estava paracasar-se.

Descrevem os auctores como os mais indolentes e

imprevidentes dos Índios brazileiros os Tapuyas, quehabitavão a serra de Ibiapaba. Parecem porem leros jesuítas conhecido o valor da sua posição montanhosa, e emde ibiapaba. logar de emigrarem para as terras chãs em busca de

mais abundante pasto, cultivavão mandioca, milhoe algumas espécies de legumes, pouco na verdade de

cada couza, mas assaz para evitar falta absoluta. Osseus charlatães lhes tinhão inventado uma curiosacrença, de que o mundo se poria um dia com o debaixo para cima, e que então serião os índios senhoressobre os brancos. Egualmente tinhão descoberto umaengenhosa objecção contra o christianismo; a encar-

nação, dizião, havia tido logar unicamente por amordos brancos; quando a Deus aprouvesse remir os

Vida índios, encarnaria numa das suas-virgens, e então% §e2T4o. voluntários deixarião baptizar-se.

Tal era o povo que os Jesuítas Francisco Pinto eLuiz Figueira sahirão a reduzir, acompanhados de

setenta índios. Com estas novas superstições se tinhãoos ânimos dos Tapuyas fortificado contra elles; Pintoe a maior parte dos seus forão mortos, fugindo oresto para as florestas; d'onde escaparão para o

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HISTORIA DO RRAZ1L. 47

Ceará. Comtudo esse mesmo povo que assassinara 1595-Pinto, lhe collocou o espirito no paraizo d'elles.Tinhão os seus caciques, crião elles cada um suaaldeia grande debaixo da terra, para onde depois damorte ião todos os seus subditos, e para alli suppo-zerão que fora este padre a ser-lhes amigo c pre-ceptor.

Em ou tras pa rles do Brazil foi mais feliz a Com- Empregao-seos Pitagoares

panhia. Assolavão os Avmorcs a Bahia, e Botelho contra os1 < i Aymorés.

queria que o capitão de Pernambuco apresentasseuma força de Pitagoares para debellal-os. Ninguém,que não fosse um Jesuíta, podia levantar esta força;metleu-se F. Diogo Nunes enlre elles, e debaixo dassuas ordens se lhe pozerão oilocentos guerreiros escolhidos, sobre promessa de que, finda a guerra, vol-tarião ao seio de suas famílias. Ao chegarem a SãoSalvador estava passada a imminencia do perigo, maso official commandante em vez de recompensar estesalliados e despedil-os, resolveu aquartelar parted'elles na Bahia, e o resto nos Ilheos, para guarniçãod'estas capitanias, sem que esquecesse assignar-lhessua tarefa. Com paciência aguardarão os Pitagoaresalgun s dias, mas vendo então que nem se fazia guer ra ,nem os licenciavão, pedirão venia para regressarema seus lares , dizendo que se não l h'a dessem, a loma-rião. 0 commandante, acompanhado d'alguns dosprincipaes da cidade, gente que contava com estespobres selvagens, para lhes cultivarem as terras, foi

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48 HISTORIA DO BBAZIL.

1595. ter com elles, buscando em comprida harenga, per-suadil-ôs a que ficassem; mas elles, que diante dosolhos tinhão o horror da escravidão, responderão quesohre condição de se irem finda a guerra, haviãovindo.

Quem tão injusta intenção tinha podido formartambém não era homem que d'ella se deixasse demover por simplices representações contra a sua semrazão. Não podendo engodar os selvagens, determinoulevar pela força a sua avante; chamárão-se os soldados e os Pitagoares preparão-se para a batalha . Emgrande confusão andava revolta toda a cidade; dousconcelhos se celebrarão durante a noute, e em ambosse resolveu que se declarassem rebeldes estes hom ensoffendidos, e como taes se atacassem, sendo reduzidos á escravidão. Tão certo não era porem o trium-pho, que ao commandante tirasse todas as apprehen-sões do resultado, pelo que mandou aos Jesuítas nasaldeias circumvizinhas recado, que viessem a toda apressa em seu auxilio com quantos frecheiros podes-sem reunir para serviço de Deus e de S. M. Vierãoos Jesuítas; conhecião elles por demais o caracter dagente da governança, para que esperassem leval-apor motivos de justiça e boa política, e desejandoevitar maior mal immediato, pedirão aos Pitagoares,que consentissem em ficar. A resposta prompta foi .que farião o que os padres quizessem. Pouco depoisjulgou o commandante prudente mandar buscar para

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HISTORIA DO BRAZIL. 49

a cidade como reféns a maior parte dos caciques; a 1602-isso se recusarão estes, dizendo que bem lhe percc-bião a intenção, nem lhes assentava bem a elles abandonar seus companheiros. Outra vez se recorreu aosJesu ítas, e de novo prevaleceu a sua influenc ia; osPitagoares disserão que farião o que se queria, poramor d'elles, e não em attenção ao commandante.Em toda esta transacção mais é de admirar-se o poder que os missionários havião adquirido sobre osíndios, do que o uso que d'elle fizerão. Para prevenirem males presentes, tornárão-se cúmplices dainjustiça.

Quaesquer que tivessem sido as ciacumstancias, APoiaÇôe6. . . . dos Aymorí

que tornarão desnecessários os serviços ímmediatosdos Pitagoares, nem forão cilas de grande alcance,nem durarão muito. Os Aymorés inundarão as capi- 1002.lanias do Su l. Em Saneto Amaro abandonárâo-se propriedades do valor de trinta, quarenta e cincoenta m il

cruzados, devorados por esles selvagens os trabalhadores e fugidos os proprietários. Não era menosespantosa a força dos Aymorés do que a sua desesperada ferocidade; um punhado d'elles assaltava engenhos de assucar, em que havia nada menos de cempessoas. Viu-se um lançar mão d'um homem vivo, e

com elle defender-se, manejando-o e volteando-o tãomaneiro, como se fora um escudo 1 . A capitania dos

1 Inverosimil nos parece semelhante conto. F. P.

n. í

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50 HISTORIA DO B RAZIL .

*«» Ilheos ficou quasi destruida*. Porto Seguro tinha sidobem defendido, em quanto se havião deixado os índios mansos a cargo dos Jesuítas. Debaixo do sábiogoverno dos padres, vivião elles reunidos em aldea-mentos assaz fortes para se defenderem a si, protegendo os Portuguezes da colônia. Um capitão novoveio destruir este systema, na sua cega rapacidadedesfazendo as aldeias e distribuindo os pobres índiospelos colonos que os faziâo trabalhar, deixando-lheso cuidado de proverem á própria subsistência. Assimse vião obrigados a exporem-se sos ou em partidaspequenas, e os que não suecumbião ao trabalho erãotrucidados pelos Aymorés Privados do seu rebanho,e não se podendo manter sem elle, abandonarão osJesuítas os seus estabelecimentos; fugirão tambémquantos tinhão meios de fazel-o, até que a fina l mal

1 Van 1581, on escrivit de là, que depuis qiCils eurent receutine relique de S. George Marlyr, que le R. P. General de Ia Compa-gnie de Jesus leur avoit envoyée si.rans auparavant, ces Aymurés

qui emportoient tfordinaire le dessus cs guerres, quils faisoyentconlre les liabüans de ceste ville, dès que cesle precieuse despouilledu B. Marlyr S. George y fust portée, Ia fortune de Ia guerre sechangeant dèslors, ils estoient par apres tousjours battus, et per-áoyent beancoitp des leurs, sans quü y füt aucun Portuguais detué, et bien peu de Brasiliens, qui soustenoyent leur party. Ceqtfon altribuoit aux merites et aux prières de ce valeureux che-valier de Jcsus-Christ; et à ceste oceasion Von celebre sa feste av ec

grand solemnilé etrejouissanca. Jarric, 2, 528.Agora, vinte annos mais tarde, ve-se que a arma de S. Jorge tinhaperdido toda a efficacia. Em quanto estava fresca a relíquia excedião-se provavelmente os seus possuidores em esforços no própria defezacom esperançi e confiança.

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HISTORIA DO BRAZIL. 51

ficarião ainda na capitania vinte famílias miseráveis, í602

que d'alli não podião sahir, e que, sem escravos quepara elles trabalhassem, de hervas e raizes se nutriãounicamente. Assim se virão os Aymorés senhores detodas aquellas regiõe s, e ja a própria Bahia não estava

, . R e i . An n .

a coberto de suas correria s. 121-

Umas doze legoas ao sul da capital do Brazil vivia Aivaro nonas suas terras um abastado Portuguez por nome os è S a .Álvaro Rodrigues, que com vigor fazia a guerra aestes perigosos fronteiros. N'uma de suas expediçõescapturou duas mulheres que trouxe para casa. Umamorreu, e boas maneiras domesticárão a ou t r a ;

aprendeu o portuguez e tanto se affeiçoou ao novogênero de vida, que dan do-lhe Álvaro livre o regressoá sua tribu, recusou ella ir -se. Occorreu-Ihe então aelle, que poderia esta mulher servir para estabelecer-se a paz. Prestou-se ella prompta a secundal-o,e pondo se n'um logar, onde era provável que os

patrícios a ouvissem nas florestas, começou a cha-mal-os voz em grita, referindo o bom tractamentoque da parte dos Portuguezes en contra ra, e dizendoque querião elles ser amigos dos Aymorés, e tornal-os participantes das boas couzas que possuião : feitoisto depunha mantimentos no chão, instrumentos de

ferro, e as bugiarias que mais devião agradar, evoltava. Repetiu-se isto, até que dos índios algunsse affontárão a vir visitar Álvaro, que entretanto aocapitão da Bahia fizera saber a esperança que n u tria ,

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52 HISTORIA DO BRAZIL.

1602. pedin do as orações de todos os fieis a favor da suarealização. Alguns parentes d'esta m u l h e r deixarãoa final persuadir-se a irem a S. Salvador, e os presentes que alli receberão, e as maravilhas que navolta contarão, induzirão outros cincoenta a visitarem o com m andan te. Tão feliz suecesso se consideroun'aquella cidade para o bem do Estado o pacificoapparecimenlo d'esta gente, e tão inesperado, queüm dos espcctaculos com que a regalarão, foi umaprocissão de graças pela sua visita, terminada porum sermão da mesma natureza.

os Aymorés Estavão agora tão satisfeitos os Aym orés, que emestabelecidos

na iiiia hordas vinhão a aquarlelar-se em casa de Álvaro, ode Itaparica. *

qual logo requereu ao governador que o mais depressa possivel o livrasse d 'esles vorazes hospedes.Fáceis de persuadir quando os não prevenião suspeitas, estiverão os selvagens por ir para qualquerpar te , onde gozassem das commodidades do seu novo

gênero de vida e forão removidos para a ilha de Ila-parica, postos alli sob o cuidado de Ires Jesuítas,escolhendo-se uma ilha por nada haver assim querecear, caso recahissem nos antigos hábitos. Mas demasiado repentina fora a mudança : rebentou entreelles uma doença endêmica, que mal dava aos Je

suítas tempo para baptizar aos moribundos e enterrar os mortos. Apoz dez semanas d'esta pia tarefa,informarão ao governador que ou se havia de remover d'alli o rebanho ou todos perecerião. Voltarão

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54 ^ HISTORIA DO BRAZIL.1602

- remadores; seguindo todas as outras embarcaçõesem temerosa distancia.Ao chegarem ao alcance de voz do logar onde es

tavão occultos os Aymorés, chamou-os Domingos,dizendo-lhes que vinha de paz e como amigo. Passados alguns momentos sahirão da espessura, prepa

rados os arcos, dizendo-lhe que podia elle vir, masnenhum out ro , e apontarão o logar onde devião fazeralto as canoas. Passando pois a outros bateis os companheiros, adiantou-se elle sozinho no seu, visto oque depozerão os selvagens as arm as . Chegado ámargem disse-lhes Domingos a que vinha, e deu-

lhes far inha, que foi receb ida com gra tidão. Pediuentão que alg un s o accompanhassem á villa, promet-

tendo reconduzil-os na manhã seguinte com maiorporção de viveres para os seus amigos. Quatro pessoas se embarcarão promptamente com elle, sendoo maior numero que podia levar a canoa.

No outro dia veio elle effectivãmente com o superior trazer os quatro índios, aonde cerca de duzentosAymorés com suas famílias reunidos á beira do rio,os estavão aguardando. Um dos quatro visitantes,apenas saltou em te rr a , poz-se a par tir as seitas dosseus patrícios, dizendo que era finda a guerra, e boa

gente os padres, que nem tinhão arcos nem seitas,pelo que nada devia negar-se do que elles exigissem.D'esta vez acompanhárão-nos trinta selvagens para avilla, onde tão grande foi, ao vel-os, a alegria dos

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HISTORIA DO BRAZIL. • 55

moradores, que tirados da canoa os Jesuítas, em 1602-triumpho os levarão ao seu.convento ' . Facilmentese concluiu agora a paz, pedindo-se aos novos aluados, que do sertão trouxessem outros da sua nação,para da mesma forma se aproveitarem do beneficioda amizade dos padres. Nem tardou que altrahidapor este convite não apparecesse perto d'uma aldeiade Pitagoares convertidos uma horda em que vinhãoduzentos e cincoenta frecheiros. Os homens erão deelevada estatura, e em ambos os sexos havia muitaspessoas tão alvas como os Allemães : erão pois do s u l,pois que para haver assim branqueado com viverperpetuamente á sombra dos bosques, era este povodemasiado num eroso e por demais gu er rei ro . A' vistad'elles fugirão os Pitagoares,' mas dous da primeiratribu que havião sido os mensageiros para estes seuspatrícios, adeanlárâo-se á pressa, dizendo que vinhãode paz : sahirão-lhes ao encontro os Jesu ítas, levandoda villa quantidade de instrumentos de ferro, e provisões, e recebendo em bem acceita troca os arcosdos Aymorés. Lcvárr.o-nos aonde estavão os companheiros, que elles abraçarão com vivo sentimento deamor nacional. 0 effeilo que sobre aquelles selvagensproduziu a visla e a experiência dos còmmodos davida civilizada, foi tal qual o havião esperado os Jesuítas : correu a no ticia, e bem.depressa se formarão

1 Freqüentemente usa Southey da palavra convento em vez da de£ollegio. F. P.

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dos Jesuítas.

56 HISTORIA DO BRAZIL.1692

- dous aldeainentos contendo um mil e duzentos Aymorés e o outro quatrocentos, e a capitania que ateaqui so com os freqüentes soccorros da Bahia se h-

uei Ann v r a v a d e l o t a l destruição, viu-se efficazmente livrer r . 1 2 3 - 5 . Q 0 S s e u g i n ; m ig 0 S -

Triumpi.o Tão bem tinha o systema de Nobrega sido seguido .

por Ànchieta e seus discípulos, que no fim de meioséculo estavão todos os naturaes ao longo da costado Brazil, até onde se extendião os estabelecimentosportuguezes, reunidos em aldeias debaixo da superintendência dos padres da Co m panhia. Verdade é queo trabalho lho havião facilitado os senhores de es

cravos, consumindo tão depressa as suas victimas,que em muitas partes do paiz pouco restava aos missionários que fazer. Não havia artificio para inflammara animosidade reciproca das differentes hordas queaquelles miseráveis não pozessem por obra, paraqu e os indíg ena s não tivessem tempo de tomar fôlego,

reunindo-se contra o inimigo commum, e tambémpara que, andando em continua guerra, tivessemsempre escravos com que abastecer o mercado. Seguindo esta política, ensinarão os Tupinambás doRecôncavo e de Ifaparica, a desenterrar os craneosdos inimigos, quebral-os e queimal-os, em festa, com

a mesma ceremonia como se houvessem çanho umavictoria. Com estas artes tanto havia raleado a população que quando se querião escravos era mister emlongas excursões ir buscal-os ao sertão, tendo os

Noticias. Ms.

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1602.

HISTORIA DO BBAZIL. 57

Jesuítas da mesma forma de penetrar mui terraadentro em procura de catechumenos.

N'uma d'estas jornadas, não pouco se maravilhouum padre de ver que o cacique d'uma horda organizara para si um systema dechris l ianismo, fundadonas idéias que índios fugidos da costa lhe podião haver ministrado. Baplizara todos os varões Jcsuzes, eas íemeas Marias, e compozera uma espécie de liturgia, de que o mais que os Jesuitas poderão perceber,foi a invocação de Maria, mulher de Deus. Tinhainstituído uma ordem de sacerdotes, obrigados aguardar castidade sob pena de degradação do officio:a cruz estava em uso, posto que em pouca veneração,mas a única imagem que se enc on trou , foi um a derapoza feita de ce ra . Ao instituidor faltou poder ouarte para propagar o systema que inventara, e estamythologia m orre u provav elmen te com o seu anetor. "Yd

No governo de Botelho fizerão os Hollandezes umatentativa contra San Salvador. Ainda que sede daadministração, nem eslava bem fortificada nem bemprovida de artilharia esta cidade. Mas os moradoresportárão-se valentemente, e ou por que fizessem dosmeios de que dispunhão, uma ostentação de imporou um bom uso, lograrão ate rra r ou rep ellir os invasores. Comtudo despachou-se para Hespanha Diogode Campos Moreno, hom em de grandes talentos c nãovulgar experiência, a representar sobre a pouca segurança de tão importante cidade, e solicitar promp-

Rr - l . A n i l .

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58 HISTORIA DO DRAZIL.1<i02- tas medidas tanto para fortifical-a como para erguer

um forte no Recife. Cinco annos leve Botelho as re-

Dio deas do governo na mão, sendo então substituído

ieiJor por D. Diogo de Menezes, que dirigiu as suas vistas° 1608. ' i

para o Amazonas.Era então esta parte da costa freqüentada por.

Francezes e Ho llandezes, não sendo precizo grandeprevidência para conhecer que se Portugal se nãodesse pressa em apossar-se d'a qu ella s regiões, quecomo suas reclamava em virtude da linha de demarcação, outros o farião por conta própria.'As informações que acerca d'um desígnio d'esla natureza

por pa rte dos Francezes hou ve o governador d'umcorsário d'aquella nação, de tal importância forãoque elle enviou a Madrid um memorial instante. Aresposta que obteve auclorizou-o a seguir os seuspróprios planos preventivos, mas nenhum outroacoroçoamenlo lhe dava. Com pouco resultado tinha

Diogo de Campos procurado fazer valer na corte deHespanha o projecto de colonizar o Maranhão, poisque apezar das representações d'este homem hábilentendeu-se alli que o plano visava mais á satisfacçãode particulares interesses, do que ao bem do publicoserviço. O proceder de Pero Coelho algum funda

mento havia dado a esta suspei ta; e agora que eracerto ter a Fra nça olhos fitos no M aranhão, a cortehespanhola, sempre tardia e remissa nas suas resoluções, ap enas se deixou pos suir do sen time nto do

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HISTORIA DO RRAZIL. 59

perigo a ponto de pe rm ittir que o governador seguissea própria discrição. Era fazer bem pouco pois quefaltava gente e dinheiro.

A prim eira medida do governado r foi inteirar-sedas disposições desses índios de Jaguaribe, queCoelho tão vilmente opprimira e que t~o bem se

havião vingado^ 0 jovem Martim Soares Moreno (parente de Diogo de Campos), que servira na jornadada Serra de Ibiapaba, tão prudentemente se haviaconduzido com estes Tapuyas que Jacauna, um doscaciques, ainda o chamava filho; em virtude d'istoe do seu reconhecido tino, o nomeou Menezes capitão

da Serra. Sahiu elle a fundar esta nova capitania comsos dous soldados, contando qu e lhe man dariã o gen tee materiaes, apenas os houvesse, e confiando por emquanto na própria influencia sobre os naluraes, quetalvez se inquietassem, vendo-o chegar com maiscrescidas forças. Levara um capellão um sino, para

mentos e alfaias para um altar. Jacauna forneceutrabalhadores, e começou a fabrica duma egreja emlouvor de Nossa Senhora do Amparo c d'um forlecom a mesma invocação.

Não tardou que a fama do novo capitão crescessecom a tomada d'um navio hollandez por um corpo

de Tapuyas, obra de estratagem a, que na gu erra émuitas vezes synonymo de traição, por quanto met-

tera-se elle entre os inimigos disfarçado qual selvagem, nú e pintado de preto o corpo com o sueco do

1608.

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6 0 H I S T O R I A DO B R A Z I L .

i m genipapo' . Forão mortos quarenta e dous Hollandezes, provavelm ente toda a tripo laçã o, pois é esta acondição com que se guerreia, onde falecem osmeios de pô r a bom recado os prizioneiro s. Mas tantoque o governador deixou Pernambuco, para regressará Bahia, esquecerão-se de Martim Soares os funcionários subalternos, a quem havia sido commeltido ocuidado de lhe enviarem refo rços; nem foi este oúnico perigo. Um Portuguez, que preferia os Índiosaos seus conterrâneos, quiçá por que a freqüentevista da oppressâo lhe inspirara horror á sua próprianação, quiçá por que a companhia dos selvagensmelhor lhe dizia com os hábitos bravios, tenlou alienar os Tapuyas. Advertiu-os este homem que olhassem por si, so não querião ver renovada a tyranniaexercida por Pero Coelho, e tanto se lhe escutarão os

. conselhos que mais que um attentado se fez contra avida de Martim S oare s, de modo qu e outro menosintimamente versado na lingua e disposições dos na-turaes, e menos hábil em haver-se com elles, teriainfallivelmente perecido. Não tinha ainda Menezes

1 A narrativa de Berredo diflere tan to d'es ta, que diz elle, que osUollandezes tomarão os índios por Portuguezes, tão bem os haviMartim Soares disfarçado e disciplinado. Na escolha entre as duas ex

posições não havia que he sitar, ainda quando Diego de Campos nãofosse melhor auetoridade a respeito d'um parente seu, do que Berredo,que viveu quasi século e meio mais tarde : por quanto -se era fácildar Soares á sua pelle a còr da d'um índio, não havia meios de dar ácFesle a apparencia da d'um Portuguez.

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HISTORIA DO RRAZIL, 01

dado mais andamento aos seus p lanos de colonização 1611

d o M a r a n h ã o , q u a n d o tornarão a apparece r os F ran- de campos.

cezes dese josos de no Bra zil te n la re m f o r t u n a . 109-119'

A lgu ns an no s m ais a t r az t inha u m aven ture i ro

francez, por n o m e R i f a u l l , pi ra teado n ' e s ta cosia , e Expedição1 ' L franceza ao

t ão a r t e i r am en te sabido gan ha r as boas g raças dos 5Iaranha0-

naturaesque Ovyrapive, um de seus mais poderososregulos , o aconselhou a tentar descober tas c es tabe

lecer-se no paiz, empreza em que seoffercceu a acom-

panhal-o e ajudal-o. Com avidez abraçou Rifault a

i d é i a ; foi a F ra n ç a , e all i com o produeto dos seus

despojos e a ajuda de oulros, que fáceis se deixarão

persuad i r a tomar pa r te na a v e n t u r a , apparelhou trêsnavios, com que em 1594 voltou ao Brazi l . Foi re-

fractar ia a sua gente, os temporaes o p e r s e g u i r â o , e,

perdido o m elh or nav io , v iu-se obr igado a afe r rar á

i lha do Maranhão. Corre esta sete legoas de nordeste

a sudoes te , e quat ro de noroes te a sudes te 1 . Vasta

bahia a separa de ambos os lados do cont inente , deque f ica a duas legoas no rumo do oriente, e três no

do poente. Pelo sul está insulada pelo Rio dos Mos

qui tos , que não mede um t i ro de mosquete , de or la

a or la . A en tra da o r ienta l pela Boca do Pi r iá , tem

uma barra per igosa , pos to que freqüentemente p a s

sada por navios; do lado do occidenle n e n h u m r i s c ose co rre , po r qu an to em bo ra haja fa lta de água n a

1 Outros a fazem mu ito m aior , mas Berredo escreve indubitavelmente de sticr.cia própria, como governador, que foi, do Maranhão.

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04 HISTORIA DO BRAZIL.

'«12. demais a paciência aos huguenotcs, c o máo tempooflereceu desculpa para deixa r aos cap uc hin ho s ocuidado da ceremonia. Antes de dar á vela fizerão

• todos os aven ture iros aos seus officiaes promessasolemne de obediência, escripla e assignada por cadaum. De tres navios se compunha a esquadra : La Regente, em que ião os dous tenentes generaes Rasillye Ravàrdière ; La Charlotle, ao commando do barãode Sancy, filho, ou irm ão do terce iro associado; e aSaiulc Aune, de que era capitão um irmão de Rasilly. Não chegava bem a quinhentos homens a forçatoda. A 19 de março sahiti a frota; mal deixarãoporto quando cahiu um temporal que dispersando-aatirou com um navio a Falmouth , com outro a Plymouth, e com o terceiro a Dartmouth. Cada um deupor perdidos os companheiros; não tardou porem asaber-se o contrario, e os outros dous barcos vieràoreunir-se á almirante em Plymouth, onde o governador lhes prestou lão bons officios, que em poucos

Bi26r-ei33. dias poderão proseguir na derrota.„, . Ao sul da linha encontrarão tres galeões portugue-Chegao os o i o

FMa1râentóoa° zes qu e vinhão da ín d ia ; ne nh um a das frotas, depoisde se terem olhado, julgou prudente vir ás mãos, eseguiu cada uma o seu rumo. Poucos dias ancorarão

os Francezes na ilha de Fe rnâo de Noronha, ondeacharão um Portuguez com uns poucos de Tapuyasde ambos os sexos. Segundo estes mesmos dizião,tinhão sido para alli desterrados de Pernambuco,

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HISTORIA DO BRAZIL. 65

mais parecião porem fugitivos

1

; os frades facilmente

1612

converterão os índios, baptizárão-nos, e unirão emmatrimônio um casal d 'e ll es. Apenas souberão do Beffedo.fim da expedição, supplicárâo aos Francezes que d'allios levassem, proposta em demasia vantajosa paradeixar de ser acceita, pois qu e esta gen te sabia dar

informações sobre o estado do Maranhão.D'esla ilha sahirão os Francezes na tarde de 8 dejunho, e na manhã do dia 11 avistarão a costa doBrazil, onde depois de se terem detido por m uitosdias, refrescando apoz tão longa viagem, entrarão ábarra do Periá, o fundearão a doze legoas do Mara

nhã o2

, perto da ilha dcUpaonmery, depois chamadade Sancta Anna, nome que Rasilly lhe poz, por teralli chegado no dia da sancta. Àchavão-se no mesmoancoradouro dous barcos de Dieppe; por estes nadase soube que indicasse mudança nas disposições dosTupinambás, não obstante o que porem julgou-se

prudente que Des Vaux fosso adeante a dar com osseus amigos antes que avançasse a frota. Havia nailha vinte e tres hordas ou aldeias; Des Vaux entrou

1 Do Tractado do Successo do Galeão Sanctiago se veque em 1602,dez annos antes dVsla jornada, residia n'esta ilha um Portuguez comofeitor com treze ou quatorze escravos negros. Havia alli gado bravo, e

grande numero de ratos (como os chamão) de pernas tão curtas, quese movião aos saltos. Serião jerboas ? Cap. 10. Historia tragico-maritima, t. 2.

1 Teve lugar este successo no dia 24 de jull o, seguinte, o testimi:-nho do referido P. José de Meran. F . P.

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HISTORIA DO BRAZIL. 67

n.lo nos ensinãoaconhecel-o1? Elle e o seu povo,accrescenlou, se havião cançado de esperar remédioda parte da França, e com inedo de seus mortaes inimigos os Peros\ resolvido retirarem-se tão longepelo sertão dentro, que nunca mais christão os visse,c alli passarem o resto de seus dias, não curando

mais de campainhas, machados, navalhas, e maiscouzas que soião receber dos Francezes, contentes

1 O que segue é por demais suspeito, para ser inserto no texto :« Tão bem como os Peros sabemos que existe um ente, creador detodas as couzas, que é todo bondade, e que foi elle quem nos deu aalma, que é immortal. Cremos egualmente que pela maldade dos homens mandou Deus um dilúvio sobre todo o mundo, para castigal-os,sendo somente preservados um bom paee uma boa mãe, dos quaes todosdescendemos, e nós e vós éramos então uns. Mas algum tempo depoisdo dilúvio mand ou Deus os seus prophetas barbado s a instru ir-nos nasua lei. Estes prophetas offerecéião ao nosso pae duas espadas, uma depau, outra de ferro, quedas duas escolhesse uma; achou elle a de ferrodemasiado pezada e optou pela de pau. Mas o pac de que vós descen-deis, escolheu, n'este mais sábio, a de ferro. E depois fomos desgraçados, por que os prophetas, vendo que a nossa nação lhes não dava

credito, fugirão para o eco, deixando os vestígios de suas pessoas epés, de cruzes, tud« impresso na rocha perto de Patyòu. Desde entãoprincipiou entre nós a confusão das línguas, que antes d^sso todaserão uma; e não nós entendendo mais desde essa epocha, começamosa matar-nos e a comermo-nos uns aos outros, enganados pelo diaboJeropary. E para cumulo de nossas misérias vierão os m aldictos Perostomar-nos o paiz, quasi exterminand o a nossa grande e antiga nação,e reduzindo-nos aos poucos que somos. t>

Toda esta parte do discurso é provavelmente de invenção franceza.É de primeira intuição que os Tupinambás nenhuma tradição podiâoter acerca d'uma espada de ferro, antes de terem visto este metal,e tão torpamente foi forzada a tradição, para se lhes por na boca, quea espada de pau é a mais pezada das duas.

2 Denominação dada pelos selvagens aos Portuguezes. F. P.

1612.

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68 HISTORIA DO BRAZIL.

»*• com a miserável vida que havião vivido seus m aiores,a revolver a terra e cortar arvores com instrumentosde pedra. «Depois, dirigindo-se a Rasilly, disse:« G rande fama gan harás por teres deixado paiz tãobello como a França, abandonando mulher, filhos eparentes para vir aqui viver; e posto que tão formosacomo a tua não seja a terra, nem possas haver todasas couzas boas a que estás costumado, comtudo seconsiderares a uberdade do torrão, quão cheio é deaves, e de caça e de fructos, seu m ar, seus rios, aregorgitarem de peixe, e o bravo povo que te obedecerá, e te fará conquistar todas as nações vizinhas,serás con tente. Pelo que tan ge ao nosso alimento,em breve com elle te habituarás, e conhecerás entãoque a nossa farinha em nada o cede ao teu pão, quemuitas vezes hei comido. »

Mandou-se agora pelos capuchinhos. Um corsáriofrancez, que costumava depositar aqui a sua rapina,

assistiu com as tripolações de outros trez navios deDieppe á ceremonia do desembarque, e offereceu atodos uma ceia tão lauta á moda franceza, que nãohouve molivo para suspirar pelas golodices da Europa. Desde logo se principiou a construir um forteem que se montarão vinte peças de artilharia de

grosso calibre : continguo a elle um armazém paraas mercadorias que havião trazido os Francezes, e acurta distancia uma casa para os missionários, quena alegria de suas esperanças'a chamarão convento

Fundaçãode S. Luiz

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7 0 H I S T O R I A DO R R A Z I L .1612 por onde começávão agora os Francezes, e tirando a

irrefragnvel conseqüência que estes acabarião poronde acabarão aquelles, advertiu-os que, aproveitando da experiência, desconfiassem de todos estesestran geiro s. Rasilly percebeu que não havia so-plmma que sobrepujasse a ímpressHo immediataque este velho produzira, e prudentemente achou

escusa para retirar se, mas o effcito foi passageiro,como era de esperar. Os selvagens somente são tena-ces na s suas affeições, sejão boas ou m ás; poucoacostumados a raciocinar, não podem ter muitotem po presen tes as suas co nclusõ es. Exposta a suaopinião, era Mombore-Wasu velho demais para sentir

em si o ardor de fazel-a prevalecer; bem depressafoi pois esquecida. Todos osTupinambás da ilha sepozerão debaixo da prolecção da França, exemploque foi seguido por duas tribus da terra "firme, umacm Tapuilapcra com dez aldeias, c outra em Cumacom onze. Como para legalisar o seu direito a um

paiz de que com o pé de protegel-o vinhão apossa r-s e, induz irão Ravard ière e Rasilly seis doscaciques, a hastear a bandeira franceza ao lado dacruz.

Proceder Queixara se Jai.y-Wasu que os Portuguezes lhedos ' . J

°

Francezes. matavão os conterrâneos por fenderem os lábios etrazerem cabellos com pridos, c que em sigmil deignomínia ropavío a cabeça a quantos subjugavão.Com mais prudência <e houverão os Francezes a res-

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HISTORIA DO RRAZIL. 71

peito dos costumes dos índios. Se quereis, dizião, 1 6 í l

furar as faces, furae-as á vontade; e se gostaes depintar a pelle de França vos traremos, cores maisbcllas do q ue ne nh um a que possu is. Mas pa ra quefazer o que é tão incommodo? Se no lábio inferiorfosse necessária um a fenda, Deus a ter ia feito; e se ciaude

d'Abbeville.

furos fossem de algum preslimo nas orelhas, furosff

-61

-n'ellas teriamos como no nariz; e da mesma sorte sefosse melhor não termos barba, nenhuma nos cresceria . Os Tupinam bás do M aranhão perceberão obom senso d'esta linguagem, e diz-se que a escutarão. Forão as couzas indo bem, e os dous comman-

dantes, que procedião com a maior unanimidade,concordarão agora que fosse Rasilly a França traclar Vo

a'Fw ça'.Uy

dos negócios immediatos da colônia; feito o que voltaria a tomar sobre si toda a gerencia, indo Ravar-dière residir na mãe pátria. Obrigou-se este ultimoa manter tudo no estado em que ficava na ausência

do collega, promovendo lambem com a melhor vontade a propagação da fe catholica. Ciauded'Abbevillefoi com Rasilly á Europa, levando seis Tupinambás,não baptizados, para dar aos Parizienses o especta-culo da christianização d'cstes selvagens. Esta partedo plano surtiu maravilhoso cffeito : verdade é que

trez d'clles morrerão pouco depois de se verem emterra, mas os outros trez fazião um dia de festa,onde quer que apparecião, e o rei e a rainha regente

^ ^ l L ' ° Berredo,

lhes forão padrinhos. 175-186.

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' 72 HISTORIA DO BRAZIL.

16»3. Infelizmente para os Francezes linha ja o governo

X do Brazil voltado a altenção para o lado do Maranhão,Tostar3

e muito anles que a menor noticia d'estes entreloposna direcção do ^ r r, _„„„ _._

Amazonas. chegasse a Madrid, ja Gaspar de Souza, o novo governador, recebia ordem de proseguir na descobertae conquista do rio das Amazonas e partes adjacentes,

acenando com promessas de especial favor a todosos que fossem nesta jornada. Repetidas representações tinhão a final feito recear a côrle hespanholaque o Pará ainda fosse invadido por aquelle lado.Recommendava-se ao governador que fosse estabelecer a sua residência em Olinda, donde melhor acce-

lariaa expedição, cujo commando se deu a Jeronymode Albuquerque, por ler viajado muito pelos sertõesde Pernambuco, ser versado na lingua tupi, e gozar

Diogo e n l r e a s tribus do norte dos foros de grande prolec-de Campos, t.

tor e amigo da raça india. Em toda a historia daAmerica porlugueza e hespanhola, nada sorprehendetanto como a manifesta insufficicncia dos esforçosinvidados e meios em pregado s p ara os fins a que sevisava, e os resultados que se colhião. Este arma-

e,pedTç!oadc mento, para facilitar o qual teve o governador gene-d-AÍbúqTr- ral do Brazil ordem de m udar de residência, no-

meando-separa com m andan te um hom em da primeiranobreza e importância no paiz, compoz-se de sos cemhomens en qu atro navios. Jeronymo fez-se de velado Recife, no Ceará tomou Martim Soares, deixandoem seu logar Estevão de Campos, c seguiu para o

que.

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HISTORIA DO RRAZ1L 77.

Buraco das Tartarugas l que deságua nos baixios 1615

ou parcel de Jericoacoara; alli plantou na foz do riouma fortaleza com palissada, que chamou de NossaSenhora do Rosário, e despachou Martim Soares comum dos navios a reconhecer a ilha do Maranhão.Tendo aguardado por muito tempo a volta d'este, ounovas suas, cançou-se Jeronymo de esperar, edeixando quarenta soldados ás ordens do sobrinho,regressou por terra a Pernambuco, onde chegouumas dez semanas depois de ler d'alli sabido, comgrande desprazer do gov ernador, que d'elle presu -

, , , . Berredo.miera mais z e l o e m e l h o r e s s e r v i ç o s . 188-193.

Aprestavão p o r esle t e m p o o s H o l l a n d e z e s u m a r - Diogo. . . . . de Campos

mamento que se suppunha dirigido contra estascostas. Eslava então em Madrid requerendo o galardão de seus longos serviços, Diogo de Campos Moreno, sargento mór do Brazil, e próximo parente deMartim Soares. Como suecede a homens que so teem

serviços que fazer valer, nada mais que promessaspodia elle obler: não escrupulizou porem a corte emexigir d'elle novos serviços, negando-Ihe a recompensa dos antigos, e convidou-o a ir cooperar para oprojecto de colonizar o Maranhão. Qualrocenlos soldados se lhe promettérão apenas chegasse a Lisboa,

mas depois de tel-os por mezes esperado n'aquellacidade, teve de parjircom os que pode haver, que

1 Ou antes Bahia das Tartarugas, como a chamam os nossos chro-nistas. F. P.

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74 HISTORIA DO RRAZIL.1G13- não forão nem a quarta parte d 'aquelle numero.

Entrou no Recife em maio de 1 6 1 4 , e achou outraMa°ranMo.<0í). expedição apercebemlo-se debaixo do mesmo com-

194-c0' mand ante e para o mesmo inten to,fi investido Havião-se descuidado do novo forte, deixando adiEario. guarnição tres mezes sem provisões alem das que

íeii .

por si mesma podia obter. Comtudo tinha ella repel-lido um formidável ataque dos indígenas, obri-gando-osa supplicar a paz. Estas boas novas vierãoestimular o governador que immediatamenle mandouum caravelf o de reforço para aque lle presidio, comtrezentos soldados e material de toda a espécie,

excepto que por indesculpável negligencia d'aquellesa cujo cargo estava abas tecer o navio , e d'aquellescuja obrigação era ver como isto se fazia, sahiu obarco com dous arrateis apenas de pólvora a bordo.Jam ais reforço chegou tão op po rtuno . Tres dias depois appareccu um navio francez commandado pelo

se nh or de Pratz, com doze capuch inho s e trezentoso ,i0 ju„ho. homens para a colônia da ilha do Maranhão. Tinhãosabido do mingoado estado da guarnição, e contandoachar estas obras de madeira defendidas por sosvinte e cinco Portuguezes meio mortos de fome, desembarcarão duzentos homens, e antes de travada a

peleja, cantarão a vicloria. Os Portuguezes porem,guarnecendo um passo, recháçarão-nos para bordo.Martim Mais de anno era decorrido desde que Martim

Soares im - ip C E u ? o p a a r . a ° S o a r e s fôra m í m«ado a reconhecer a ilha do Mara-

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HISTORIA DO BBAZIL. 75

nhãosem que d'elle se houvesse nova; nem consta l c u

que o governo do Brazil tivesse conhecimento doestabelecimento alli formado pelos Francezes, emquanto não chegarão noticias d'cste capitão. Tinhaeste descoberta a colônia, e reconhecida bem a suaforça, procurado voltar contra a monção. Couza éesta quasi impossível; tão constantes soprão os ventosem sentido opposlo, qu e um a briza do M aranhão paraPernambuco se olha para assim dizer como milagrosa. Perdido na tentativa um mastro, teve a finalde demandar a Hespanha, como o caminho maiscurto para casa; d'alli despachou desde logo o pilotocom a noticia para o Brazil, e foi elle mesmo exporo caso ao ministro em Madrid. Sabido isto, expedirão-se novos despachos a Souza com ordem positiva de d irig ir toda a sua altenção para a conquistado Maranhão. Havia muito que se trabalhava nospreparativos; Jeronymo de Albuquerque estava naParahyba, levantando um corpo de índios, e Diogode Campos procurando debalde transportes paralevar as tropas, de que havia trezentos hom ens sem

i , . . , , Berredo.

contar os índios e munições para abastecel-as. §201-8.Novas difficuldades occorrérão; so dos dízimos se segunda

podião tira r os fundos para a jornada , e logo n'esta de jerony.ro1 l J

° de Albuqucr-oceasião chegou uma ordem para remissão de tal que-imposto. Impossível era cumprir o decreto, c o governador appressou a partida das forças. Sahirâoimmedialamenle dous caravelões a fazer juneção

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10 u

76 HISTORIA DO BRAZIL.com Albuquerque, que se suppunha dever achar-seno Rio Grande (do norte). Por elles novas instrucçõesse mandarão; principiava o governador a recear queos seus projectos fossem lon ge demais, c por isso limitou as operações ao lerrilorio entre o rio Tiloya e ailha do Periá, onde A lbuqu erque devia fortificar-se,não avançando mais sem ordem d'clle ou da corte.Grandes couzas se esperavão d 'um a expedição em quese desenvolvera actividade tão superior á costumada.Gregorio Fragoso d'Albuquerque, sob rinho do commandante, deu o nobre exemplo de acceitar um posiode capitão com soldo de soldado, c todos os demaisofíiciaes o.imitarão. Quatro companhias se formar,*ode sessenta praças cada u m a ; os voluntários formavãocorpo separado, os recrutas forão retidos nas fortalezas e na prizão até poderem ser mcttidos a bordo.Traclava-se exactamenle de embarcar, quando do Riode Janeiro chegarão alguns navios carregados def a r in h a : logo requereu Diogo de Campos instantem ente m ais algum as provisões, ponderando que oarmamento d'ellas carecia para seis mezes, sendoimprudente confiar em matéria de mantença nasmais sinceras promessas de fornecimento. Em conseqüência d'esle requerimento obteve seis mil alqueires, e mais animada sahiu a expedição, posto quem iserav elm ente provida sem vin ho , azeite, medicame ntos, m edico nem cirurgiào-barbeiro. De soe-corros espiriluaes comtudo não levava mingoa. Dous

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HISTORIA DO BRAZIL. 77

capuch inhos de Saneto Antônio havião offerecido vo-l61í

-luntar ios os seus se rv iç o s: o P . F r . Cosme de S. Da-

miâo era u m , e o out ro o P . F r . Manoel da P ie da de ,

Brazi le i ro de nasc imento , de famí l ia nobre , e versado

na 1 i ngua t up i . N enhum a a j uda receberão do gover

nador estes miss ioná r ios , o que bem mos t ra qua l não

seria a penúria do t h e s o u r o ; pessoas p ias comtudoos su pp r i rã o não so com param ento s e a l fa ias de

egre j a , m as também com abundan tes p rov i sões de

q u e poderão soecorrer cfficazmente os aven tu re i ros .

Com sua affabilidade, zelo e não fingida virtude

ganharão e merecerão estes frades a boa vo ntad e de

t odo o a r m am en t o . Animavão e acoroçoavão a gen te ,mas ao mesmo tempo tão per fe i tamente conhecião a

deficiência de tudo o necessár io , q u e chamarão esta ,1 Jornada do

;i jo rnada mi lagrosa . Maranhão.

Encont ra rão no caminho o nav io que soecorrera o Junc _o

for te das Tartarugas, e que havia setenta e cinco Aibuqúerqm

dias forcejava por m on t a r P e r nam b uco . N o t e r ce i r odia alcançarão o Rio G rand e, e pas san do a sa lva

mento sua per igosa bar ra , derão fundo dent ro . Jero

nymo de A lbuq uerque j a e ra chegad o , e aqu i pas

sarão os dous ' commandantes revista ás suas forças

r e u n i d a s ; compunhão-se de dous galeões , uma cara

vela e cinco caravelões, não sendo mais do t rezentosos sold ad os; de índios havia apenas duzentos e t r in ta

e quat ro ás ordens de doze caciques , embora se sou

besse que nas dependências do for te do Rio Grande

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78 HISTORIA DO BRAZIL.lü l t

- se não contavão men os de quin hen tos frecheiros.Camarão 1, cacique cujo nome repetidas vezes tem deapparecer d'aqui por deante, devia ir reunir-se-lhescom mais quarenta marchando por terra. As mulheres e crianças dos alliados erão mais de trezentas.

Estava tudo prompto para o embarque, quando a

Albuquerque occorreu que os navios erão demasiadamente pequenos, que havia risco de irem a pique,e que, encontrando-se qualquer dos piratas que decontinuo infestavão a costa, seria certa a ruina, poisque as embarcações não erão de combate, nem sepoderião montar as tres pecinhas, em que consistia

toda a artilharia. Por todas estas razões resolveumarchar por terra com a maior parte das tropas.Diogo de Campos admittiu a força da argumentação,observou porem que referindo-se a objecção maisimportante á incapacidade dos navios, cumpririaexperimenlal-a, embarcando a gente, pois que dou

tra forma se não poderião da r ao governador boascontas. Também fez ver, que com este novo arranjoseria Jeronymo o responsável pela segurança dasduas parles da expedição, ambas expostas a perigo,susceptível a partida de terra de soffrer" falta de águae de mantimento antes de chegar ao forte do Ceará,

1 Nào sei se será este o nom e tupi, ou a sua traducçã o, ou, o queé mais provável, uma alcunha posta pelos Portuguezes*.

* Não foi alcunha e sim traducção litteral da palavra indigena Potex.F. P.

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HISTORIA DO BRAZIL. 79

logar aprazado para a nova jun cçã o, e a de m ar 1Gli

segura preza dos corsários, se os encontrasse, privada como ia da sua principal força.

Depois de perdidos dous dias em hesitações cedeu ^§1° dLo commandante ao pezo d'cstas razões. Outros dous Tartaru°as-

depois da sahida do Rio Grande, entrou a expediçãona bahia d e l g u a p e . Entretanto viera o enjôo do marem reforço da opinião de Jeronymo de Albuquerque;desembarcou elle pois com os índios, c apoz dousdias de m archa foi reun ir-se á frota em Nossa Senhorado Amparo, d'onde se despachou para o forte dasTartarugas um navio com o annuncio da chegada.Havia quatorze mezes que o capitão do presidio doCeará esperava esta expedição, a que se reunia coma flor da sua gente, ficando cm seus logares outrosque bem estimarão ver-se livres de navios tão atulhados. Chegou também Camarão, vindo do Rio Grande,e lendo soffrido tanto pelo caminho, que d'isto fezpretexto para obter licença de ficar alli, a cevar-se,em phrase selvagem, com seu irmlo Jacauna, oamigo de Martim Soares. Mas toda a dialectica deAlbuquerque foi perdida para resolver Jacauna amandar mais de vinte índios ás ordens d'um de seusfilhos, triste compensação por quarenta desertoresque no território d'esle se havião refugiado; e nemisto se conseguiu sem que o commandante deixassealli algumas de suas índias, e um filho seu própriode dous annos de edade como reféns e penhores da

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80 HISTORIA DO BRAZIL.1614 sua boa fé, tão profunda impressão deixara nos âni

mos d'estes Tapuyas a perfídia de Pero Coelho.Ma estação era esta; a vizinhan ça de aldeias de

índios relaxava a disciplina, o logar era insalubre, eos ratos roião os cabos. Passou-se Diogo de Campospois para a bahia de P a r a m e r i m , trez graus ao sulda lin ha , e alli d esem barcou a sua ge nte, aguardando o commandante. Chegado este, ainda cincodias se gastarão antes que outra vez se podessemreunir os a luados; dobrarão então a ponta grandedo parcel de Jericoacoara (que é do mais fino jaspemulticor) e desembarcarão no forte ou presidio dasTar tarugas. Ei a este u m péssimo logar para os naviosainda que os Francezes o frequentavâo, pois não lhesofferecia ab rigo . Albuq uerq ue pensou que o rio Ca-mussy seria mais seguro ancoradouro, mas examinada achou-se tão difficil a entrada e tão pobre a

Berredo220-34. terra, que melhor pareceu ficar onde se estava.

Decepção Antes de avançar mais convinha grangear a boaGrão Diabo, vontade dos Tapuyas da Serra de Ibiapaba, com osquaes de novo se havião travado relações amigáveis,e dos Taramambezes de Titoya, que Martim Soareslinha conciliado ao ir reconhecer o estado da ilha doMaranhão. Da sua amizade não se esperavão grandes

couzas, mas teria sido perigosissima a sua inimizade,caso tivessem os Portuguezes de seguir por terra.Mandou-se chamar o poderoso regulo Juripariguazu,o Grão Diabo, pensando Albuquerque convencel-o

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HISTORIA DO BRAZIL. 81

de que era este commeltimento de egual interesse 1014-para ambos, e obter d'elle os soccorros ja prometti-dos, quando não contava com que viessem a ser pre-cizos. Mas os que alli tinhão estado de guarniçãologo asseverarão ao commandante que erão inteiramente vãs taes esperanças, e que o Grão Diabo nãopoderia achar nome que melhor lhe assentasse. Muitonão havia ainda que elle, á força de instâncias, a i - 'cançara dous soldados portuguezes que o ajudassemcontra outros Tapuyas; e ganha a victoria, graças aeste reforço, edevorados os prizioneiro s, teria comidotambém os dous auxiliares, a não ter sido sua mulherI tabú, qu e a muito custo o pôde dissuadir do inte nto .Ouvido isto, dispoz-se Albuquerque a receber umaresposta evasiva, e a com ella contentar-se. Por conseguinte, quando dous embaixadores do Grão Diabovierão dizer que uma moléstia contagiosa lhe estavadizimando o povo, mas que apenas esta cessasse,cumpriria elle a promessa, o commandante julgouprudente dar-se por satisfeito e despedil-os presenteados.

A máxima mais commum na boca d'um Portu- ChegSo, , _ , 7 - i á illia d o

guez e paciência quando nao lia remédio. Apoz a nova Periá.

decepção consolárâo-se os aventureiros, praclicando .esta tão prestante virtude, e recommendando a mal-aventurada empreza a Deus, e ás orações dos capuchinhos. Tiverão porem o conforto de ouvir a pri

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82 H ISTOR IA DO BR AZI L.

4614. m e r i m . Com missa cantada e tangeres de flautascelebrarão os frades o dia do seu patriarcha SanFrancisco, commungando muita gente e assistindotodos ao serviço divino com extrema alegria e devoção; e no domingo seguinte, dia de Nossa Senhorado Rosário, pregou Fr. Manoel o primeiro sermãoque retumbou por aquellas praias, e também o primeiro que o pregador havia composto. Concluída apractica, houve revista geral, parada e combate simulado em honra da sancta. Todas estas couzas ani-mavão e divertião o povo, levantando-lhe os espíritosquando mais carecião de acoroçoamento. A falta dossoccorros com que havia contado aqui, tornava aexpedição muito mais fraca do que se calculara; osíndios das vizinhanças do Maranhão estarião por semduvida em alliança com os Francezes, nem se podiaesperar cooperação ao avançar. Por outro lado, seos Portuguezes se retirassem, seria com perda dareputação, e deixando expostas as fortalezas. Reuniu-se um concelho, e a resolução unanime foi de fortificar o rio Titoya, primeiro logar de que rezavão asinstrucçõês. Chamárão-se os pilotos, e soube-se quenenhum so d'entre elles conhecia a entrada da cor-

. rente. Nunca em tal se havia pensado. Um certo Sebastião Martins affirmou conhecer o porto do Periá,ilhota que também figurava nas instrucçõês, e paralá se resolveu seguir. Embarcou a gente sem murmurar, posto que em navios tão pouco próprios para

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HISTORIA DO RRAZIL. 83

transportes, que não havia onde deilar-se de noute, t614

nem outro mantimento, que esperar a bordo, alemde farinha detnandioca e água.

Na madrugada seguinte ao dia da sahida, disseSebastião Martins que a terra que se avistava ficavaa Ires legoas do Periá; os outros pilotos declararãonão a reconhecerem, e elle próprio d'ahi a poucoconfessou haver-se enganado, mas, fosse o vento maisfresco, que toda a frota se teria provavelmente perdido. Affastou-seelle de novo da costa, largando todoo panno, pois Martins calculou agora que ainda ficava a mais de desazeis legoas o porto. Impossívelera ganhal-o senão com uma hora de noute pelomenos; com tudo nada mais se podia fazer do quedemandal-o, e entral-o com o escuro, n.lo conhecendo ninguém outro ancoradouro onde aguardar odia. Era favorável o vento; atinou-se com o canal,e por elle se passou a salvamento, ainda que tocandofreqüentemente em bancos de areia \ Tão senhorade si era porem esta gente, que ao roçarem com aquilha as embarcações, nenhuma voz se ouvia, senãoa do commando, não fosse algum desnecessário ala- *rido aterrar os que atraz vinhão, pondo-os assim em Berredo

238-42.

1 Para se julgar da boa fortuna que teve a expedição, basta ver o roteiro que Pimentel dá para esta perigosa navegação : « Com toda a m;i-ruja no convés e pela enxarcia en trae de N. E. para S. 0 . en tre cachopoe cachopo, evitando quanto virdes, e apenas vos achardes dentro dapenedia, tomae o prum o na mão, e não tem aes, go vernando parao Cabedelo, defronte do qual dareis fundo. » Piloto do Brazil, p . 5 2 .

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84 HISTORIA DO BRAZIL.

Jorltdí do m a ' o r perigo . A's dez hora s lançarão ferro tres legoasM3Ín3i0° r io acima.irresoiução Desde logo saltarão em terra os cfcus comman

quequer" dantes com parte das tropas, para assegurarem n;manhã seguinte o desembarque ao resto, caso apparecesse opposição. Ao romper o dia viu-se que endeserta a i l h a ; tomou-se posse d'ella com as ceremonias do costume, e Francisco de Frias, o engenheiro em chefe, poz-se a catar sitio em que plantaium fo rte. Achou m uitas posições boa s, mas em Iodaifaltava a água. Fácil era obtel-a, abrindo poços, masos soldados que havião estado de guarnição em NossaSenhora do Rosário, ao uso de tal água altribuiãotodas as moléstias que tinhão soffrido. Correu deboca em boca a descripção que fazião dos seus pade-cimentos, e a ilha do Periá a todos se tornou logoodiosa. Olhavão-na como logar necessariamente mortal, e disfarçando o medo com ostentação de bravura,clamarão que era mister buscar posição mais pertodo inimigo, que alli não havia que combater senãoos animaes ferozes, e morrer de sede. A' lesta d'estes

* berradores achava-se o alferes Sebastião Pereira,quiçá animado com ver que Albuquerque para amesma opinião se inclinava. Persuadira-se este commandante que fácil lhe seria chamar a si os Tupinambás do Maranhão, fazendo-os romper a alliançafranceza, e indecizo sobre o que faria, nenhum amedida tomava para defeza da posição que oecupava.

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H ISTOR IA DO R R AZ1L. • 85

Diogo de Campos, soldado mais velho, e a quem a 1614-experiência ensinara a precaver-se sempre dos perigos, conjurou-o que completasse as linhas ja principiadas. A isto respond ia o outro que não via inim igode quem acautelarse, pois que, quanto aos Francezesdo M aranhão, ou toda a his toria não passava d'um ainvenção de M artim Soares, ou , se alli os havia, tãopoucos erão que não se atreviâo a mexer-se dos seusfortes. Absolutamente impossível era, dizia elle, quepovo tão am estrado na gu erra como os Francezes,deixasse aberto este porlo, tão perto d'elles, e importante como era, se tivesse forças com que se nh ore al-o .Estava pois resolvido a avançar direito sobre o Maranhão, ultimo filo do governador eda corto de Madrid, e se a navegação parecesse por demais perigosapara os galeões, so com os caravelões se iria.

Não maravilhou esla linguagem menos a Diogo de Aconselha

Campos, do que o mortificou. Replicou que era pre- D i S í u 7 e

cipitado o projecto de investir a ilha do M aranhão ,abandonada a estação que se occupava, e que assegurava livre accesso a ella. Em todo o caso, fossemexactas ou não as noticias que de M artim Soares setinhão, não seria perder tempo fortificar esta posição, que, mesmo segundo os argumentos de Albuquerque, era essencial para segurança do Maranhão.Cumpria recordar que a alterosa nau, que accom-mettera o presidio das Tartarugas, devia estar agorafundeada junclo do estabelecimento francez, com

a i lha .

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86 HISTORIA DO BRAZIL.

muitos outros navios de maior ou menor força, e que

mal iria á frota, desapercebida como vinha para entr ar em acção, se com elles se enc on trasse. O melhorque fazer podião, craforliíicarem-se on de estavão, omandar recado tonto a Portugal como ao governador. Por mais poderosos que fossem os Francezes,não poderião tolher-lhes o receberem reforços, em

quanto mantivessem aquelle posto; e os Tupinambásmettidos no interesse da Fran ça, sabendo que osPortuguezes vinhão aluados com seus morlaes e terríveis inimigos os Taramambazes, mais se horroii-zarião ainda d'esta alliança do que da força das ar-

Berredo.

§ 247. mas contrariassahe Rangei Parecerão estas razões ter al gum pezo sobre o

a um , ° r

rm e n t o

C i"

a n i m o u e Albuquerque, que n'um bote de seis remosmandou outros tantos soldados a reconhecer a ilhado M aranh ão, exa m inar-lh e a ba rra , e, sendo possível, apanhar um prizioneiro. Foi comm andando a

partida Belchior.Rangel, natural do Rio de Janeiro,mancebo de grandes esperanças, e mui versado emgrande numero de l ínguas indígenas. Na manhaseguinte principio u o com m anda nte a buscar logarpara o seu acampamento, tomando comsigo Diogode Campos; pouco faltou porem que a este se aca

basse a paciência, vendo quatro dias perdidos emtão improfrcuas e frivolas delongas, sem que nastrincheiras se desse uma enxadada. De nada serviiíosuas exclamações conlr a esta inqualificável impru-

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H ISTOR IA DO R R AZIL. 87

dencia, até que com a longa ausência de Rangel 1614-principiou o próprio Albuquerque a inquietar-se, emandando chamar Campos á sua tenda, disse-lheque receava ler sido tomado o bote, mas assim comoassim cumpria prover á própria segurança. Esperando que o outro não teria tempo de mudar de propósito chamou o ajudante general o engenheiro emchefe, e sahirão ambos, embora fosse noute, a procurar posição mais perto da barra. Acharão umacom um lago de água doce ao lado: deu-se ordempara que logo de madrugada começassem os trabalhos, mas nesse mesmo momento appareceu uma luzá entrada da bahia, e chegou Rangel com o seu bote.A parte que deu foi ter explorado todos os canaesperto do Maranhão sem ter visto gente nem embarcação franceza; mas que defronte d'aquella ilhahavia um logar chamado Guaxenduba mui própriotanto para acampar como para manter a tropa, regado como era por delicioso rio, que tornava possível toda a cultura. Perfeitamente a coberto do inimigo ficava o caminho para alli, torcendo-se porentre muitas ilhas que encobrião totalmente a passagem. Em quanto Rangel estava contando isto aocommandante, ouvirão os soldados o mesmo da bocados companheiros; renovarão pois os clamores contrao plano de alli se entrincheirarem, e, esquecida todaa disciplina, insistirão por que os conduzissem maisperto do inimigo. Sem tentar de fôrma alguma fazer

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88 HISTORIA DO RRAZIL.1614- calar estes clamores, recolheu-se Albuquerque á sua

tenda.Fassão-se Diogo de Campos contava ainda que as obras prin-

r.uaxenduba. cip ia rião de m anhã , seg undo a ult im a resoluçãotomada. Mas o catavento da opinião de Albuquerquegyrara de novo, e apoz mais dous dias de irresoluçãoe ócio, deu elle ordem de tornar a embarcar, eaproar para Guaxenduba, em despeito de todas asdissuasões do seu immediato. Tão satisfeito estava ocommandante com as noticias que Rangel trouxera,e tão confiado na sua im ag inaria influencia sobre astrib us ind íge na s, qu e ao desfraldarem-se as velaspara sahir, offereceu a Diogo de Campos a apostad 'um pa r de me ias de seda, em como antes de sab-bado teria alguns índios do Maranhão ás suas ordens.Respondeu es te : « Muito folgarei com perdel-as, pelogrande regosijo que todos teremos em tal caso; maslembrae-vos be m , que qu erere i recebel-as, seganho.»

Po r en tre tão inn um era ve l m ultidão de ilhas segu ia a de rro ta, qu e po r esta razão, e por ser dia desancta Ursula e das suas companheiras, poz-se onome de Onze mil Virgens ao logar onde se passoua primeira noute. Quatro dias levou esta penosa passage m , tocando m uita s vezes os navios, e encalhandoalgumas no lodo e areia branda, em que as quilhaspenetravão tanto adentro que os navios ficavão aprumados, quando, retirando-se, os deixava a maré em

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HISTORIA DO BRAZIL. 89

secco. A final porem ganhou-se o po rto, indo a frota d614

tão vistosa de bandeiras, flammulas e galhardetes,que do M aranhão se deu por ella, e logo um a linhade fogos ao longo da costa communicou o rebate aoforte de S. Luiz. Não custou muito a Diogo de Campos interpretar este signal. « Quer parecer-me,senhor, » disse para Albuquerque, « que lenho ganhas as meias, e que por índios alliados vereis Francezes inimigos. Não são accidentaes estes fogos, nemobra de selvagens. Tractemos pois de entrincheirar-nos sem demora, e de descarregar os barcos. » Desembarcarão os Portuguezes sem opposição, e resolverão alli fortificar-se. Antes que podesse o engenheirodar principio á obra, outra vez balanceou a resolução de Albuquerque. Primeiro opinava por umasimples palissada nas matas á moda dos índios,quaes se usavão no sertão, sendo estas, dizia, asúnicas fortalezas precizas em taes paragens. Depoistinhão-lhe alguns dos Tapuyas falado n'outra posiçãosobre o rio Mony, perto da foz de Itapicurú, queerradamente tem sido por vezes chamado o Maranhão,e para alli se inclinava a passar-se. Fizerão-no Diogoe o engenheiro a final abandonar tal projecto, edeixar-se ficar onde estava; e dous dias depois dachegada mandou que os frades tirassem sortes ámissa, para determinar debaixo de que invocação seconstruiria o forte. Sahiu a Natividade de NossaSenhora, e n'essa mesma tarde se principiarão as

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90 HISTORIA DO BRAZIL.16 i4 ob ras, debaixo da soberana protecção da sancta, como

•28 d'e.ut.7 g e c r i a >

Presumrçuo Não tardou a vir da ilha um cacique tupinambá,querqüc. queixando-se do tra ctam en to recebido dos Francezes

e dando conta das forças d'elles. O que refcrião oscompanheiros não combinava com as suas palavras,mas Albuquerque era fácil em acreditar o que iade accordo com as suas próprias idéias, e difficil emdar ouvidos ao que as conirariava. Offereceu-se esteselvagem'a chamar ao partido portuguez algumasdas ho rdas do M aranhão, e o gen era l, confiando cegona veracidade d'estas falas, mandou com elle cincodos seus mais seguros alliados, retendo como refénsdous da comitiva do índio, que se dizião filhos doutro caciqu e da ilh a. Ficou agora persuadido que socom tra cta r assim com os na tu ra es , obteria posse dailha, nem todas as advertências de Diogo de Camposlhe poderão abalar a absurda confiança. Ainda embem qu e a sua enfatuação não im pediu o progressodos trabalhos, assestárão-se as poucas peças quehavia, e levantárão-se as ob ras ex terio res . Em quantoassim estavão empregados, aventurárão-se algumasmulheres e crianças dos índios imprudentementefora do a rra ia l, e embora estivessem a pequena distancia, desembarcou um a pa rtida de selvagens dailha, e cahiu sobre ellas. Principiarão por matar cdesmembrar quatro raparigas com horrível barbaridade; um Tapuya, que por acaso se achava perto,

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tentando defendel-as, teve a mesma sorte, mas estava 1G14,

dado o reba te, e elles retirarão se a toda a pressa comos prizioneiros. Entre estes ião a mulher e filho deMandiocapua, um dos caciques dos Tabajares. Adean-tando-se a todos os seus companheiros, atacou elleos inimigos antes que podessem largar na canoa, emortos dous e alerrados os outros, galhardamente

libertou os prizione iros, sendo ja sen ho r da em barcação, quando lhe chegarão em auxilio os Portuguezes e a sua própria gente .

São tão raros entre selvagens os exemplos de virtude, que quando se dão cumpre memoral-os poramor da natureza humana deshonrada nas particularidades da vida selvática. A mulher de Mandiocapuaatirou-se ao pescoço de seu marido accezo em cólera,supplicando-lhe a vida do chefe dos Tupinambás, acuja intervenção devião cila e o filho as suas. Foipois poupado o Tupinambá, recebendo os seus companheiros o merecido galardão de suas façanhas.Pozerão-no a ferros, c a Tapuya agradecida com solicitude e car inh o o sup pria todos os dias do necessáriomantimento. Vencido d'esta bondade e do bom tracta-mento que recebia pela humanidade que elle próprio havia mostrado, de sua livre e espontânea von-

Informações

tade contou aos Portuguezes quanto sabia da forca verídicaso i • > ,j um

dos Francezes e das medidas que estavão tomando. $$££l™

Todos os passos, disse, por água e por terra, estavãotomados pelo inimigo, para cortar a retirada aos

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92 HISTORIA DO RRAZIL.

1014. Po rtug ue zes ; os Tu pinam bás , que os tinh,\o vindovisitar, e os cinco índios q ue os acompanharão, jaziãoem ferros no forte de S. Luiz, onde havião sido postosa tormenlos para confessarem quanlo[sabião. Accres-centou que na manhã seguinte virião duas lanchasarmadas a reconhecer o acampamento, que brevemente seria accommettido, e que o apparecimentod'estas embarcações confirmaria a verdade do quedizia. Não erão tão fáceis de abalar como as suas resoluções as esperanças de A lb uq ue rq ue; estava aindapersuadido que os insulanos para elle se passarião,acreditando que so a precaução dos Francezes embloquear os portos, impedia que elles se não tivessemainda declarado a seu favor. Comtudo até ao pontode m an da r aprestar dous caravelões que levassem

Jornadado Maranhão, despacho s a Pern am buco , ainda reconheceu elle o

4 0 - 4 2 .perigo da sua situação257-2G2.

Na outra manhã apparecérão effectivamente as

duas lanchas, como o prizioneiro annunciara; ed'um forte chamado de S. José, cm Ilapary, na margem opposta, dispararão os Francezes em signal deguerra duas peças, a que com egual descarga responderão os Portuguezes, içando todas as bandeiras.Coma maré da tarde approxim ou-se um a das lanchas

a rec on he cer, trazendo a bo rdo v inte e cinco homens,ao commando do senhor de Pralz, official distincto,c genti lhomem da câmara d'el-rei de França. Mandou Albuquerque a atacal-os, mas, demandando a

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 95

lancha pouca água, metterão-se os Francezes entreos baixios, aonde não foi possivel perseguil-os. Tresdias dep<iis sahirão, comboiados por outros tres, oscaravelões, que levavão officios para Pernambuco,sem que uma grande nau franceza, fundeada nabahia de Arassagi, podesse interceptar a volta do

comboi que lhe passou a barlavento. Tornou-se tãoborrascoso o tempo que os Francezes, rebentandodous cabos, e perdendo dous ferros, derão-se porfelizes com poderem recolher-se a S. Luiz. Não tiverão os Portuguezes então consciência do perigo aque havião escapado, mas Diogo de Campos diz que

fora esta uma das maiores mercês da Providenciadurante toda a jornada. Pouco depois tremulou uma Traição dos

Francezes.

bandeira branca sobre um banco de areia no meiodo canal deGuaxenduba.O commandante, suppondoisto obra dos insulanos indígenas, mandou Rangel

n'um dos caravelões com uma jangada, na qual chegar ao banco, quando o navio não podesse avançarmais. Ja elle eslava com a sua gente na jangada,quando os soldados recusarão desembarcar, sem dalealdade que com elles se usaria, terem melhorprova do que a branca bandeira dos Francezes, pois

ja muitos d'estes se podião distinguir disfarçadosentre os índios que se preparavão para recebel-os.Effectivamente rompeu logo vivo fogo de mosquetariacontra os Portuguezes, e se a lancha se não dessepressa em soccorrel-os, todos terião cahido prizio-

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94 HISTORIA DO RRAZIL.

mi- neiros, único fito dos Francezes com este baixo procedimento. Indignado como estava Albuquerqued'esta violação das leis geraes da guerra, que é dointeresse de todas as nações observar, imputou-atoda aos Francezes, continuando a crer que os Tupinambás secretamente o favorecião.

Cheia d'estes insulanos não tardou a atracar umacanoa grande a Mamuna, perto do forte d'Albuquer-que; sorprehendidos os selvagens, atirárão-se dousa nado, atravessando o canal que mede duas legoasde largura; o resto entregou-se aos Portuguezes, ecom uma dissimulação, que a fuga dos companhei

ros devia revelar, fingirão ter vindo amigos e nãoprizioneiros. Deixou-se o commandante embair poreste atrevido artificio, e tractando excellentementeos supposlos hospedes, deixou-os ir na sua própriacanoa. Mas tinha um d'esles homens a mãe em Pernambuco, provavelmente escrava alli, ena esperança

de tornar a vel-a, recusou ir-se com os companheiros.Confessou este homem ao capuchinho Fr. Manoel daPiedade, que a canoa tinha vindo a um reconhecimento, que na manhã seguinte atacarião os Francezes os navios, e, tomando-os, como confiadamenteesperavão, passarião a investir o forte por mar e

Berredo.263-9. por terra.

Quer campos Correu o frade immediatamente a dar avizo d'isloos navios, a Diogo de Campos. Fechava ja a noute, mas este,

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HISTORIA DO BRAZIL. 95

ao commandante recado que ia para bordo dos na- 16U-vios, a defendel-os até á ultima gota de sangue. Aponlo de embarcar eslava elle ja, quando appareceuAlbuquerque na ribeira a retel-o, dizendo que nãose havia de sacrificar a gente na defeza de quatropranchas podres, convindo sim poupal-a para manteraquelle paiz, de que elle em nome do rei tomaraposse. Em resposta perguntou-lhe Campos cheio decólera, que contas daria ao rei de tal perda, e dodesdouro que colherião as armas portuguezas, especialmente aos olhos dos Tapuyas? A isto retrucou ocommandante, que quanto a dar contas ao rei , sobresi tomava esse encargo, e que a gloria das armasportuguezas não carecia de nova prova, mas antesesperava firm al-a exterminando a final estes France-cezes. E mandou alar á margem os navios, com a

Berredo.

proa para terra. 220,1.Desde o primeiro apparecimento dos Portuguezes Tomão

em Guaxenduba premeditava Ravardière este ataque,t res

'""^faltavão-lhe porem informações sobre as forças emeios de defeza do inimigo. Umas obteve-asdos cincoTapuyas a quem deu tratos, e os Tupinambás, queAlbuquerque imprudentemente pozera em liberdade,levárão-lhe as de que carecia ainda. Embarcações

ligeiras de toda a espécie se tinhão previamenteapromptado, e sem mais demora despachou elleagora Pizieu, Pratz seu tenente general, e o cavalleirode Rasilly. Ao romper d'alva chegarão aonde estavão

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HISTORIA DO BRAZIL. 97

as communicações entre aquelle ponto e G uax enduba, 16 l i

se buscasse algum canal, que passasse pela vizinhailha das Guayabas, desconhecida dos Francezes, couzanão difficil de descobrirse com auxilio dos índios.Marcou-se para este serviço o dia seguinte, mas na 16 j e n0v.mesma tarde veio um soldado dizer a Campos emsegredo, que era intolerável o que estavão soffrendo,e que elle com setenta outros ião safar-se por terra,único meio de salvação possivel, o qu e lhe commu-nicava pelo respeito que lhe votava, e para saber sehavia boa razãop ara esperar prompto soecorro, sei^oporião fogo á pólvora, obrigando assim o resto doexercito a seguir-lhes os passos. Asseverou Campos aeste homem que todas as medidas estavão tomadaspara obter immediatamente reforços, acerescentandoque esperava que não incendiassem a pólvora semque o inimigo estivesse por cima d'ella, se por ventura viesse antes dos soecorros. Agradeceu-lhe e aosamigos a confiança que n'elle tinhão posto, e pro-metleu não lhes atraiçoar o segredo. Approvou Jeronymo d'Albuquerque esta prudente resposta de Diogo,e disfarçadamente se tomarão precauções para segurar o deposito, meltendo a pólvora entre as provi-çnpo Berredo.s u e a . 278-2S0.

Mandou-se agora Rangel com cento e vinte solda- SaheRangeidose trinta dos melhores frecheiros índios a exami- aESSíSr.

nar todas as avenidas da ilha das Guayabas, sendoeste o pr im eiro passo para execução dos planos de

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98 HISTORIA DO RRAZ1L.

ioi i. Diogo de Campos. Comsigo levarão gu ias para a praiaonde devião embarcar, e que ficava a quatro legoas;perderão-se comtudo no caminho, e apoz vinte equatro horas de incessantes fadigas, vadeando oraarroios ora lodo, que lhes dava pelos peitos, volverãoao aca m pa m ento. Impacien te d'esta dem ora , offere-

ceu-se Diogo a ir em pessoa por água com o engenheiro em chefe lodo o caminho. Em quanto aguar-davão a ma ré , appareceu o inim igo á foz do porto, eentão virão os Po rtugu ezes quan ta razão tinhão deale grar- se , por não terem Rangel e a sua gente atinadocom o caminho, achando-se assim concentrada toda

a força, tal qual era.investem Vinha Ravardière em pessoa com sete navios eos Francezes . T-,

comos quarenta e seis canoas, quatro centos hrancezesePortuguezes.

qu atro m il Tup inam bás . Viu elle qu e os Portuguezesestavão irregularmente acampados, e o seu forte

levantado sem arte perto d'uma eminência, quecompletamente o dominava. Immediatamente destacou metade da sua força a apoderar-se d'esle postoim porta n te . Ia esta gen te dividida em duas companhias, com mandada uma por Pratz e a outra porPizieu, e com o costumado ardor dos Francezes sal

tarão todos á água, qu ere nd o cada q ual ser o primeiro a ga nh ar a terra . Com esla precipitação molharão polvorinhos e bandolas. Vendo esta impaciência,alirárão-se os índios fora das canoas, cobrindo immediatamente a praia; formidáveis de verem-se ei;, >

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HISTORIA DO BRAZIL. 99

elles, com suas plumas, seus broqueis variegados de 1614-muitas cores, e sobre tudo pelo seu num er o . Nãotinha Albuquerque força com que estorvar-lhes ointento; trazia cada Tupinambá seu lio de fachinas,e principiarão a fortificar-se, em quanto Pizieu abria

trincheiras d'alli até á praia, para conservar com-municação com a frota. Apoz um ligeiro tiroteiofoi Diogo de Campos consultar com o co m m anda nte ,que achou a olhar por um óculo para o inimigoatravés das esp ingardeiras do forte. « Senhor, lhedisse, não é este tempo para olhar por vidros. » —

« Que cum pre fazer, senhor capitão? » foi a resposta.Tornou-lhe Diogo : « Confiar em Deus e servir-nos denossos braços, que não lhe vejo outro rem éd io . Seao mesmo tempo Os accommettermos por dous lados,seguramente os bateremos, e Deus nos dará um diaglorioso. » Mandou Albuquerque dar .immediata-

mente uma boca cheia de biscouto e um golo devinho a cada homem, esahiu, deixando apenas trintainválidos no forte.

Dividindo o grosso da sua pequena força em douscorpos de setenta Portuguezes e quarenta Tapuyascada um, para si tomou um e deu o outro a Diogo,

encorporada a maior parte dos alliados n 'uma reserva .pequena, que ficou ás ordens de Gregorio Fragoso.Devia Diogo atacar o inimigo na ribeira, em quantoJeronymo se encarregava de forçar o cabeço. Avan

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100 H I STOR I A DO R R AZIL.

\

Gi

'*• seus porem mexião-se com tão ta rdio e remisse- passo,que bem se deixava ver que de boa wntade corre-rião em sentido opposlo. Virou-se elle e perguntando-lhes com aspecto severo, se não erão ja os mesmoshomens que em Periá se havião amotinado por nãose verem assaz perto do inimigo, jurou que extende-

ria morto a seus peso primeiro que tentasse fugir.Daparte d'um homem de tão bem conhecida resolução,e com uma pistola engatilhada, produziu esta ameaçao desejado effeito. Animou-os também dizendo que acoragem dos Francezes jam ais ia alem da primeiraexplosão. Cobrarão valor os soldados, e elle ordenou

qu e o corpo de reserva investisse pelo flanco o imigo no mesmo mo m ento qu e elle o caregasse pel;n i -

a

Berredo. f r p n l p290-4.

Ia dar-se o signal do combate quando appareceuum cometo com uma caria de Ravardière para ocommandante. Abriu-a Diogo, pois que nem Jero

nymo en tendia francez, nem havia tempo que perder. Maravilhava-se o general francez da incompa-ravel temeridade dos Portuguezes, que assim seaventuravâo a atacar o maior monarchada christian-dade dentro d'aquelle território de que elle emnome de S. M. havia tomado posse. Comtudo, por

amor da coragem que esta temeridade implicava, epara poupar sangue christão, offerecia ao generalportuguez termos honrosos, dando-lhe quatro horaspara considerar se queria acceital-os ou correr os

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HISTORIA DO BRAZIL. 101

azares da guerra. Diogo mandou inteirar o comman- 1614-dante do conteúdo d'esta carta, o mais resu m ida mente possível, dizendo-lhe que uma das máximasde Ravardière era proseguir nos preparativos emquanto negociava, e conjurando-o que não concedesseao inimigo a van tagem d'esta dem ora , mas desse osigna l. Depois de ver-se no campo da bata lha, nãoconhecia Albuquerque fraquezas, e rompeu o con-fliclo na ribeira.

Levou Diogo de vencida as primeiras trincheiras; Derrotadosr . Francezes.

do outeiro descerão os Francezes (ignorantes do perigo que a elles próprios ameaçava, pois o comman

dante tomara um desvio pela floresta) a soccorrer osseus conterrâneos, e por breve espaço viu-se elleexposto a dous fogos; mas Fragoso com os seus Tapuyas carregou-os pelo flanco, e Jeronymo vendo aposição de Diogo, cahiu também inesperadamentesobre os inimigos, mudando de marclja. Curto mas

sanguinoso foi o conflicto. Os Francezes e os seusaluados abandonarão a ribeira e retirárão-se para assuas obras no cabeço. Immediatamente poz Diogofogo ás canoas que tinhão sido puxadas pa ra te rra .Seguirão os Portuguezes a victoria, e assaltando estasobras, completamente derrotarão o inimigo. Ao pr in

cipio não se abalou Ravardière a soccorrer a metade dasua força que entrara em fogo, tão grande a sua confiança na superioridade numérica d'ella, tão profundo o seu desprezo dos que a combatião; quando

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102 HISTORIA DO BRAZIL.

viu o perigo era ja ,tardc. Não podia chegar nas suas

lanchas por falta de água, agora que vasara a maré;as canoas tinhão ficado em secco e fora de alcanço,de permeio uma margem lodosa. Tenlou operar umadiversão investindo o forle, mas também alli o poucofundo o impedia de approximar-se, e com a suapobre art i lharia mantinhão.os inválidos uma viva

canhonada. Pizieu, que commandava o destacamentofrancez, cahiu. Cento e cincoenla dos seus compa-triolas ficarão mortos no campo, nove forão feitosprizioneiros; alguns estavão armados de espingardasde dous canos, então invenção nova. Baterão-se comgrande denodo, preferindo morrer com o seu com

mandante a entregarem-se. Tirando partido dotri um pho , qu eim ou Diogo ao inimigo todas as canoas que tinhão sido aladas para terra, quarenta eseis em numero, e algumas d'ellas de setenta e cincopalmos de comprimento e vinte e cinco remos porbanda. Todas forão destruídas com os seus esquipa-

menlos. Entre os Portuguezes onze mortos, dezoitoferidos. Nem cirurgião nem ambulância havia naexpedição; appareceu porem um rapaz que sabiacomo ligar uma ferida, e na falta de qualquer outromedicamento applicava o óleo de copaiba, ou deazeitona, ou trapos molhados, e punha-se a psalmear

o enfermo.De parte a parte se passou a noute em grande des-

assocego. Apezar de vencedores não desconhecião os

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H1ST,0RIA DO BRAZIL. 103

Portuguezes a desproporção de suas forças. Pozerào- J01í-

se guarda s dobra das , pois índios hos t i s t inh ão desem barcado bastantes para os manterem alerta e inqu i e

tos ; faltavão provisões; o inimigo os bloqueava com

seus navios, e meio de salvação nenhum se via .

Incapazes de se preoecuparem do fu turo , celebrarão

os índios alliados toda a noute com cantares e danças

a sua victor ia , e as mulheres percorrião o campo cantando as proezas de seus maridos, e proclamando os

nomes dos inimigos que elles havião vencido e cujas

cabeças havião quebrado. No co rrer da no ute veio o

cacique da ilha te r com os Por tuguezes , informando-

os de que os Francezes estavão na m aior co nste rna

ção. A manhã confirmou a not icia , pois em signal delucto t inha o inimigo colhidas todas as bandeiras , e

nem tambor nem clar im se lhe ouvia a bordo dos

navios. Dos pr izioneiros so ube A lbu qu er qu e qu e a

toda a hora se esperavão de Cuma na terra firme seis

ou setecentos índ ios, qu e devião reunir-se ao ar m a

mento francez, e preparou-se para novo assalto. Comeffeito appareceu logo d 'ahi a pouco este esperado

reforço em dezaseis canoas grandes, a demandar o

r io Mony, onde desembarcar . Ainda houve tempo de

oecupar a r ibeira com cem mosqueteiros, e os índios

atravessarão para o outro lado. All i muitos saltarão

em ter ra ; mas encontrarão fugitivos da derrotada Jorna<ia

° do Maranhão.

véspera, e apenas sabida a má for tuna de seus ami- K 64"5-

gos, r eembarcá rão e retirárão-se mais depressa do

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104 HISTORIA DO RRAZIL.1614

- que havião vindo, levando muitos de seus conterrâneos, que ávidos aproveitarão esta occasião de csca-Berredo.

298-514. pulirem-se.Enceta Procurou Ravardière desabafo á sua cólera n'uma

Ravardière .uma carta ao general portuguez, na qual o accusava de

conespon- ° r a • x

víbüquerque. haver violado as leis da guerra retendo-lhe o cometa,e lhe lançava em rosto a crueldade dos Tapuyas. Maismoderada foi a resposta de Albuquerque : insistia nodireito do rei de Hespanha e Portugal sobre todasestas te rra s, queixando-se da não provocada aggressãoda parte dos Francezes, e especialmente da traiçoeira

bandeira de tregoa. Pelo que tangia á barbaridadeim pu tad a aos seus alliad os , dizia ter enterrado omelhor que poderá os Francezes que havião cahido,não sendo verdade que fosse mutilado algum dosseus cadáveres, embora um dos Tupinambás de Rava rdière cortasse o braço a um Portuguez morto den

tro das trinc he ira s, q ue sem elle teve de ser sepultado. Mas disto me não maravilho, acerescentava,pois estou velho, e ha muitos annos que ando costumado a taes couzas. Ravardière gabava-se do bomIractamento que dava aos índios prizioneiros, podendo alias vingar-se n'elles. A isto alludia o Portu

guez na sua resposta, dizendo que se o commandantefrancez julgasse a propósito enforcal-os, mao serviçofaria aos seus conterrâneos prizioneiros no arraial,mas que n'este ponto era senhor de sua vontade. Um

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HISTORIA DO BRAZIL. 105

prestes a dar á vela para Portugal, e a bordo se lhe 1614-havião achado cartas, em que os soldados referião,e por ventura exageravão as difficuldades e perigosem que sevião. Ravardière mandou estas cartas ao

commandante portuguez, pensando com isto fazeralgum mal, mas Albuquerque as devolveu com umaresposta ambigua, dizendo que verdadeiro era o contexto das ca rtas , comtudo como alguém se podia terequivocado no sentido, as devolvia para que commais vagar fossem lidas.

Motivou islo uma carta ja muito mais moderada da Aju.tão-setermos

parle do commandante francez que perguntava pelos vaenmaf

eos

nomes dos prizioneiros, convidando Albuquerque a P°rtnsuezes.abrir negociações; também lhe pedia que escrevesseem francez ou hespanhol. Respondendo, lamentou o

Portuguez que mais Francezes n'elle não tivessemtido confiança, salvando assim as vidas. « Enterrei osmortos, dizia, como a minha própria gente, a quem

é a floresta honroso monumento. O corneta vos diráo estado em que estamos. Melhor o teríamos tractadose estivéssemos nonosso próprio paiz, mas aquisomos homens que vivemos d'uma mão cheia de far inha, e uma posta de cobra, quando a podemoshaver, e os que d'esle passadio não gostarem, não

busquem anossa companhia. » Mais e mais cortezse foi tornando a correspondência. Ravardière fez a

Jeronymo um com primento por usar do mesmo n om eque o grande A lbuquerque, removeu a frota para a

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106 IIISTOBIA DO DRAZIL.iel4- ilha das Guayabas, e manifestou o desejo de que lho

mandassem a conferir com elle Diogo de Campos,por que fallava francez, e também por que em outrostempos ja tinhão pelejado os dous um contra o outroquando Diogo servia o príncipe de P a r m a . Foi poiso ajudante gen eral com Gregorio Fragoso de Albuquerque a bordo da nau de Ravardière, vindo dousofficiaes francezes entregar-se como reféns nas mãosde Jeronymo .

Passou-se em mutuas disculpas e reciprocas civi-lidades a entrevista, que mais foi visita do que conferência. Mas na manhã seguinte propoz Ravardièreestes termos: haveria paz até fins do anno seguinte,cessando n'este meio tempo todos os actos de hostilidad e, travada en tre as dua s pa rles por falta de seentenderem mutuamente as intenções e com grandeperda de sangue chrislão; dous fidalgos um portuguez e ou tro francez irião a Fra nça , e outros dous da

mesma fôrma a Hespanha, para exporem o caso aSS. MM. Christianissima eCatho l ica ; nenhum dosPortuguezes ou dos aluados d'elles poria pé, semprevia permissão, dentro do raio de dez legoas dosfortes e portos francezes, exceptuados os comman-dantes e seus criados, que teriâo plena liberdade de

passar e repassar; que logo que chegasse a resoluçãofinal das duas cortes, aquelle dos dous partidos querecebesse ordem de evacuar o paiz, o faria sem maisdetença dentro do prazo de Ires mezes; finalmente

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HISTORIA DO BRAZIL. 107

que d'ambas as partes se porião em liberdade os 1014-prizioneiros. Obrigou-se Ravardière a retirar imme-diatamenle os seus navios, deixando livre ingressoao abastecimento que esperavão os Portuguezes, eexigiu d'clles a promessa que, embora recebessemreforços, não renovarião as hostilidades.

Altamente vantajosos como erão estes termos,comludo quando Albuquerque os expoz aos seus offi-ciaes, observarão estes que como indispensável preliminar devia Ravardière apresentar a patente quelinha do rei de França, d'outra fôrma devia serolhado como pirata, bannido do seu paiz por heresia,e homem com quem nenhum calholico podia traclar.

Depressa se preencheu esta formalidade, apresentando Albuquerque primeiro os seus papeis, e disfarçando assim a exorbitância de tal exigência. Assi-gnárão-se então os artigos, e no dia seguinte 29denov.i / ~ n , , ÍVrredo.

levantarão os fcrancezes o bloqueio. 320351.

Mal se virão assim desassombrados os Portuguezes, Tumulto, . entre os

fizérão uma procissão em acção de graças, e princi- Tupinambás.piárão a fabricar uma egreja á sua divina protecloracom a invocação de N. S. da Ajuda1. O cirurgiãofrancez teve ordem de ir tractar dos Portuguezesferidos, e Ravardière pediu que Diogo de Campos e

F r. Manoel da Piedade fossem ao M aranhão apaziguaros Tupinambás amotinados, por supporem que

1 Para ella deu uin dos missionários frànce/.es um frontal de altare unia vestimenta bordada pelas mãos da duqueza de Guise.

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108 HISTORIA DO BRAZIL.düH- segundo o tractado devião ser repartidos entre as

potências signalarias e vendidos como escravos, damesma fôrma que Pero Coelho vendera os Tapuyasdepois da sua jornada de Ibiapaba; tão fresca lhesvivia ainda na memória esta acção detestável. Conseguirão socegal-os Diogo e o frade, e feito isto, forãoao convento dos capuchinhos, que apezar de nãoacabado ainda, podia ja conter vinte missionáriosdebaixo da obediência de Fr. Archanjode Pembrock,

chegado, havia poucos mezes, com dezasele irmãos.D'elle souberão que a rainha regente chamara aoreino Bavardière, cujo proceder, dizia o franciscano,não se podia tolerar n 'um a colônia calholica entreselvagens; por qua nto em bora m uitas virtudes oadornassem, os abomináveis erros da sua heresiatodas lornavão de nenhum proveito. Pizieu deviasubstituil-o no commando. Talvez isto tivesse desgostado Ravardière, e o pouco interesse que ja tomavapela colônia, pôde até certo pon to explicar o haverelle proposto aos Portuguezes termos mais vantajosos do que elles tinhão direito de exigir, nem razãopara esperar .

lastrucções Foi Gregorio Fragoso escolhido para a embaixadad o s |-v , . .

eommissarios a 1'ariz em companhia de Pralz. Continhão as suaspoi tu j juezes . _

instrucçõês alguns factos curiosos que devia exporao embaixador hespanhol . Havia de insistir*no desdemuito tempo cabido e sustentado direito dos Portuguezes a estas terras, do qual as suas muitas expedi-

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HISTORIA DO BRAZIL. 109

ões a este mesmo ponto da costa erão prova incon- im-testavel. Não se podia dizer por occupar um paiz quetinha mais de Ires mil habitantes portuguezes, e m u itas cidades e villasbem conhecidas, e em verd ade, sea falta de moradores era motivo para se tomar possed'um logar, e assenhoreal-o por direito de occupação,

lambem Silves no Algarve, eAlgeziras perto de Gi-braltar, podião ser tomadas com egual titulo. Deviapintar o estado florescente da colônia dos Francezes ;tinhão encontrado novas madeiras e novas tintas,uma pescaria de pérolas, pedras preciosas, por amordas quaes andavão ja brigados, e, segundo elles pró

prios, dizião minas de lapislazuli. Tão pouco deviaesquecer o damno que provinha, de haverem ellesfundado um porto, onde os piratas, que infestavão oBrazil e a fronteira cosia da África, a todo tempotinhão certeza de serem bem recebidos e encontrarprovisões. Muitos Portuguezes alli se tinhão visto em

ferros, que, arrastando as suas cadeias, havião sidoobrigados a trabalhar nos campos como escravos,mais crua tyrannia, dizia-se, do que a dos mouros daBerberia. Tomados pelos piratas, tinhão estes desgraçados sido conduzidos para alli, onde em tão mísero captiveiro os conservavão, afim de que não

levassem a nova aos estabelecimentos brazileiros,desejando os Francezes que alli os deixassem t ran-quillos em quanto possível para que mais seguros searraigassem. Accrescentava-se que os colonos estavão

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110 HISTORIA DO BRAZIL.161i- solicitando a protecção da Inglaterra, para o caso de

abandonal-os a França, e isto se altribuia á religião

de Ravardière, e ás suas relações com o conde de

Montgomery, que tinha mil parentes no primeiro

d'estes re inos .Fizerão-se estas instrucçõês no firme presupposto,que jamais allespanha desistiria das suas pretençõesao Maranhão ; e Albuquerque, calculando com a expulsão dos Francezes como couza que mais cedo oumais tarde havia de ter logar, explicava ao embaixa

dor quanto seria para desejar-se conservar alli todosos que podessem ser induzidos a mudar de nacionalidade, pois que ja estavão estabelecidos e ligadoscom os na tu ra es , e conhecião o paiz, pelo que osupplicava que invidasse todos os seus esforços paraa favor d'estes se fazer uma excessão ao interdicto

contra colonos estrangeiros. Adoptada esta medida,dizia elle, menor difficuldade haveria em colonizara ter ra ; os Tupinambás íicariào quietos, e podia-sepassar a expellir do Cabo do Norte os Hollandezes quealli prin cip iavão a fortificar-se á foz do Amazonas.

Com estas instrucçõês em barcou Fragoso com

Pratz para F ran ça n 'u m navio francez. Diogo deCampos offereceu-se a ir á Hespanha, e Albuquerquede tão boa mente acceitou a proposta, que os maliciosos pensarão que era vontade dever-se livre d'elle.Não merecia o commandante esta imputação : Diogo

Berredo.501-512

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HISTORIA DO BRAZIL. 111

e o outro com prazer o deixou ir, por saber que a 1614-negociação a ninguém podia ser confiada, que maislhe zelasse o feliz êxito, nem que mais hábil fossepara a bom fim leval-a. Para a viagem tiverão osPortuguezes de comprar aos Francezes por-duzentos

mil reis a caravela tomada na bahia de Guaxenduba \ Berredo.Não forão por muito tempo guardados os termos <jUebrno os, , . P ,. T Tortu^nezes

do traclauo; intracçoes pequenas, senão abertam ente o nadado.auetorizadas, forão pelo menos permittidas por ambas as partes. Passado pouco affluirão a Albuquerque ossoecorros, uns da Bahia e Pernam buco, tr a

zidos por Francisco Caldeira de Castello Branco;outros de Portugal conduzidos por Miguel de SequeiraSanhudo. Becebidos estes reforços, fez elle saber aRavardière, que da sua corte lhe havião chegado.in-strucções, declarando estas terras patrimônio legitimo da coroa de Portugal, pelo que se via na neces-

1 Aqui termina o excellente diário d'esta jornada, que Beredo en-corporou na sua historia. D'esla circumstancia se infere com altrumaprobabilidade, que fosse elle esctipto pelo próprio Diogo de Campos,sendo a sua partida o ultimo faeto que se refere. Principia a T, deagosto de 1GIÍ e finda a 4 de janeiro de 1615. Se se attender a quea historia da conspiração, que so podia ser sabida dos dous comman-dantes, se acha n este escripto, attingirá esta desconfiança o gra u dequasi certeza.

Depois da publicação da primeira edição d esta obra , foi o própriodiário impresso pela Academia Real de Lisboa, na sua Collecção de!\oticias para a Historia e Geographia das Nações Ultramarinas

que vivem nos Dom ínios Portuguezes, ou lhes são vizinhas. 1 .1 , n° 4 .Ahi se dá elle por indubitavel obra de Diogo de Campos, impressa domanuscripto original.

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112 H IST O RIA DO BRA ZIL.161*- sidade de dar por findo o Iractado; esperava porem

que com a amizade dos dous não succederia o mesm o,e que Ravardière a preservaria, entregando a ilha,caso em que lhe assegurava bom tractamento, e retirada livre para os seus soldados. Demasiado seguro

da victoria ao principio, deixara-se o commandantefrancez também abater demasiado pelo primeirorevés. Quiz negociar ainda. Enviou-se-lhe Caldeir,;,

e elle concordou em evacuar a ilha do Maranhão dentro de cinco mezes com todos os seus fortes, sobrecondição que os Portuguezes lhe pagariâo a artilharia

alli deixada, fornecendo-lhe transporte para toda aõi de jni. sua gente. 0 historiador portuguez diz que não lhefalecião de todo as esperanças de receber n'este co-menos reforços taes, que lhe permiltissem fallaraoestipulado, mas em penhor da sua boa fé, entregouo forte d e l t a p a r y 1 , de que Albuquerque desde logo

tomou posse.Envião-se Entretanto chegara Diogo de Campos a Lisboa, enoVas forças, deixando que o com panheiro M aillart fizesse quantas

representações e queixas quizesse, ponderou com urgência ao governo a necessidade de enviar sem perdade tempo reforços consideráveis. Era então viso-rei

de Portugal D. Aleixo- de M enezes, esse arcebispocujo nome é tão celebre na historia dos christãos doMalabar; e elle, reputando piratas os Francezes do

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HISTOR IA DO BR AZIL. ' H3

Maranhão, affectou-se indignado de que com elles se1614

tivesse feito mesmo um traclado, posto que por estese entregasse de facto a colônia nas mãos dos Portuguezes, nem mais nem menos que se a houvessemconquistado em boa guerra aberta. Não se perdeutempo. Deixando a Maranhão em jan eiro , ch egara

Diogo em março a Lisboa. Com o sobrinho MartimSoares e soccorros adequados voltou a Pernambuco,onde achou o governador Gaspar de Souza, activandoegualmente os seus aprestos, em conseqüência dosavizos que de Guaxenduba havia recebido . Montavatoda a força a novecentos homens em sele galeões e

duas caravelas. A Alexandre de Moura, antigo capitãomór de Pernambuco, se deu o commando das forçasde terra 1 ; Diogo de Campos era o a lm irante, e a 5 deoutubro entrarão n'esse mesmo porto da ilha doPeriá, onde os Francezes havião fundado á sua primeira chegada, mas que por desmazelo e para sua

própria ruina, assim havião deixado duas vezesaberto ao inim igo. Albuquerque foi a bo rdo ; viu queMoura viera com poderes supremos como general,trazendo ordem expressa para quebrar as estipula-ções que vigoravão, e completar sem demora a conquista.

Sem murmurar submetteu-se Albuquerque a este Entre<ra

impolitico cerceio da sua auctoridade, passando a ^ O j I . *

1 Com o titulo de governador geral d'armada e conquista. F. P.

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114 ' HISTORIA DO BRAZIL.

10,4 - cumprir as ordens do governador com a mesmacomplacência, como se ellas nenhuma quebra implicassem da sua própria palavra e honra. Investiu oforte de S. Luiz, aonde todos os Francezes se haviãoacolhido. Ravardière, agora no habito de sujeitar-sea quanto lhe impunhão, consentiu em render-se

immediatamente e sem condições. Foi pois entregueo forte. Deu-se o commando a Campos e o generalfrancez com mais de quatrocentos de seus conterrâneos, Ia forão velejando no rumo da França. Algunspoucos, ligados por casamentos com os naturaes,ficarão na ilha. Assim se perdeu para a França o

Maranhão por culpa de Ravardière : contentasse-seelle ao principio com interceptar aos Portuguezes ossupprimentos, o que a sua superioridade por marmuito bem lhe permitlia fazer, que estes terião, ouprocurado retirar-se por terra, caso em que muitos

338-I0Õ' havião de perecer, ou capitulado sem um tiro.

Do convento dos capuchinos tomarão posse os fra-Expedição l

da o ° p a r i .

r a u e s ^'^ acompanhavão a expedição. Moura, em virtude da auctoridade de que vinha revestido, nomeouJeronymo de Albuquerque capilão-mór da conquistado Maranhão, e Caldeira também capilão-mór dadescoberta e conquista do Grão Pará, nome meioportuguez, meio tupi, com que se designava o riodas Amazonas. Tinhão se apanhado todas as informações que Ravardière colligira sobre esta desco-

Berredo. berta, e ainda antes do fim do mez, encetou Caldeira

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1614.

HISTORIA DO BRAZIL. 115

a sua jornada com duzentos homens em tres navios.Entrou a frota na perigosa barra de Seperará, hoje J»™J»0o

a da cidade de Belcm, e depois de ter desembarcadoem muitos logares mao grado dos índios, escolheuCaldeira posição para o seu novo estabelecimento,dando a estas conquistas o nome de Grâo-Pará, porse reputar sobre as margens do immenso r io ; enganava-se porem, pois que se achava n 'um a vasta bahiaformada pelas fozes do Maju, Acará e Guamá. Aquidesembarcou a 5 de dezembro, dia de S. FranciscoXavier, e alçando a imagem d'este saneto, principioua ediíicar uma cidade com o nome e invocação deN. S. de Belém. Mal escolhido fora o local: sete ouoito legoas atraz deixara Caldeira uma ilha chamadado Sol, que Berredo diz ser em todas aquellas paragens a melhor situação para uma colônia. Belémporem fica entre pantanaes, e em logar tão indefensável que , segundo a mesma competente auetoridade ,apezar de todas as^suas obras exteriores e fortifica-ções, é na difticuldade da barra, a seis legoas dacidade, que consiste a sua maior segu rança. Depressavenceu Caldeira a tal ou qual defeza que oppozerão osnaluraes, e tão habilmente os soube pôr de feição,que elles próprios o ajudarão a erguer a fortaleza.As novas da sua fortuna resolveu mandal-as porterra, e foi o alferes Pedro Teixeira enviado ao Maranhão n'esta difficil mas importante commissão. Tentarão os naturaes de Cayté exterminal-o a elle e a sua

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116 HISTORIA DO RRAZ1L.

leu; genie, mas Teixeira os reduziu á obediência, tomandoposse'd'aquelledistrictoque, mais tarde se tornouuma das capitanias dependentes do Pará. Em S. Luiz(pois assim devemos chamar aquelle logar agora quese tornou portuguez) foi recebido com tanto pasmoquanta alegria, como a primeira pessoa que fizera

esta jornada; e de lá voltou por mar, levando arti-ÍOMIIIVl h a r i a e munições e paga para a tropa.

Nos seus despachos para Lisboa ponderava Caldeiraa grande importância de suas descobertas, e a necessidade de assegural-as contra outras nações europeas.Nas ilhas sem conta erão os índios numerosos e pací

ficos, e a terra, pelo contrario de outras partesd'aquelle estado, excellente para o plantio de cannade assucar e estabelecimento de engenhos. Actual-mente produzia abundância de algodão, pita, tabacoe uma linla escarlate extrahida de certas fructas;erão estes os gêneros de que os estrangeiros vinhão

á procura. Também havia pérolas, dizia elle, e muitos indícios de minas de prata e outras riquezas.Sadio era o paiz, excellentes os ares, e nada emsumma o resto do Brazil comparado com estas novasdescobertas. Outras nações porem cobiçavão a possed'esle paraizo. Os índios o havião informado de que

uma colônia de Inglezes com mulheres e filhos seestabelecera rio acima, cento e vinte legoas alem dasua fortaleza; c que os Hollandezes, plantado umforte na margem do norte, alli tinhão fundado en-

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HISTORIA DO BRAZIL. 117

genhos. Demais, entre os índios que elle persuadira ml-

a virem estabelecer-se á roda de Belém, encontraraum Francez e um Hollandez, que dous annos anteslinhão sido deixados entre os indígenas, para lhesaprenderem a lingua; e ambos havião declarado queem maio ultimo esperavâo da Hollanda um a expe^-dição de quinze navios, mandada a fundar no rio umestabelecimento permanente. Em conseqüência destes despachos recebeu o governador Luiz da Silva carta do

1 . Arcebispo de

instrucçõês de Lisboa para reforçar ímmediatamente ^f^";!Caldeira e ir-lhe preparando mais soecorros. *6?6.dMs'.

E n t r e t a n t o n ã o f i c a r a C a l d e i r a o c i o s o . T e n d o s a b i d o

q u e u m a l t e r o s o n a v i o h o l l a n d e z e s t a v a a n c o r a d o n ac o s t a , a q u a r e n t a l e g o a s d e B e l é m , d e s p a c h o u

T e i x e i r a c o m v i n t e h o m e n s e m d u a s c a n o a s a a b o r -

d a l - o . D e f e n d e r ã o - s e o s H o l l a n d e z e s c o m o q u e m s a b i a

q u e p o u c a c l e m ê n c i a t i n h a q u e e s p e r a r , n e m o sP o r t u g u e z e s t i v e r ã o o u t r o m e i o d e v e n c e r , s e n ã o

p o n d o f o g o ao n a v i o , e m q u a n t o e s t a v ã o a b o r d o , er e t i r a n d o - s e d e p o i s nas c a n o a s . S o u m H o l l a n d e z

e s c a p o u . F oi o c a s c o a p i q u e e m p o u c o f u n d o , ea p e n a s c u r a d a s as f e r i d a s q u e n a a c ç ã o r e c e b e r a ,

v o l t o u T e i x e i r a e t i r o u do m a r as p e ç a s , r e f o r ç o q u en ã o p a r e c e r á s e m i m p o r t â n c i a p a r a a n o v a c o l ô n i a ,

s e n o s l e m b r a r m o s d e q u ã o m a l p r o v i d o d e a r t i l h a r i ah a v i a i d o A l b u q u e r q u e . G r a n d e r e v é s foi e s t e p a r a osH o l l a n d e z e s , q u e , se t r a f i c a v ã o c o m p r o v e i t o n o r i o ,

t e n d o f e i t o r i a s e s t a b e l e c i d a s e m m u i t a s d a s i l h a s d a

QueimaTeixeira um

navioboPandez.

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118 HISTORIA DO BRAZIL.mL sua embocadura, com nenhum perigo havião contado

da parte dos Portuguezes, nem de fôrma nenhumaestavão preparados para alli competir com elles.

insurreição Guarnecidos todos os fortes da ilha do Maranhão edos

Tupinambás. C ü n l j n e n t e adjacente, voltara Moura a Pernambuco,ficando Albuquerque a edificar uma cidade á volta

do forte de S. Luiz com o mesmo nome e o mesmopadroeiro. No primeiro anno tudo foi bem, mas osna tura es d'eslas partes pertencião pela m aior parte atribus que para alli se havião retirado, fugindo átyrann ia dos Po rlug ue zes ; nem tinhão esquecido oque a seus pães ouvirão, nem as mais recentes atro

cidades de Pedro Coelho, e pa ra os fazer sacudir aforçada obediência, pouca instigação bastava. Mathiasde Albuquerque, f i lho de Jeronymo, commandavaem Cuma, populoso districto perto da ilha; pareciãomui contentes os selvagens, dando até esperanças dese converterem, e ficava tudo em apparente tranquil-

lidade, quando o pae o chamou a S. Luiz. Durante asua ausência passarão por alli alguns Tupinambásvindos do Pará com cartas de Caldeira para Jeronymo. Havia um índio de Cuma, por nome Amaro,que apezar de criado pelos Jesuítas no Brazil, era muiaffeiçoado aos Francezes, recordando com má von

tade seus antigos amos. Tomou elle as cartas, eaffec-lando lel-as deanle dos caciques, que não conhecendoas letras não podião convencel-o de falsidade, fel-oscrer que todos os Tupinambás devião ser declarados

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HISTORIA DO BRAZIL. 119

escravos apenas se recebessem aquelles despachos. 1614.

Foi quanto bastou. Na mesma noute cahirão os selvagens sobre a guarnição, composta de trinta homens,matárão-nos Iodos durante o somno, e logo despacharão a todas as suas hordas mensageiros que exci-lassem uma insurreição geral. Mas Mathias de Albuquerque lhes reprimiu o ataque de um lado, e

Caldeira o antecipou do outro. Sabendo este qu e elleslhe querião accommeller a sua nova cidade, ou fingindo sabel-o, poza ferro e fogo os Tupinambás doPará, sendo maior que a offensa o castigo. m-uv..

Por este tempo morreu Jeronymo de Albuquerque; Morte, , , • i i i

rie J- d 'Albu-

c 'ntava setenta annos de edade, e os cuidados do-go- querque.v rno, e a ancicdade de supprimentos que vinhãomenos regularmente do que se esperava e carecia,lhe accelerarião o termo da existência. Para suecessornomeou Antônio, seu filho mais velho, com BentoMaciel Parente e Domingos da Costa Machado por

accessores. Antônio entendeu que de nenhum haviamister. Domingos da Costa não estava disposto aimpôr-lhe a presença d'um conselheiro mal visto;não assim Maciel, que do pouco caso em que lhetinhão a auetoridade se mostrou resentido em termostaes, que Antônio Albuquerque primeiro o fez reco

lher prezo, e depois o mandou para Pernam buco comDomingos, que alli ia embarcar para Portugal a requerer a recompensa de seus serviços. iw.edo.

M - i i i , « 0 - 4 5 0 .

IN a o era so do lado do Maranhão e Amazonas, que

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120 HISTORIA DO DRAZIL.1614- as tentativas de aventureiros particulares para se es-

mtureiroinglezes

no Brazil.

vcnturfiiros

inglezes tabelecerem na America portugueza, inquietavão ogoverno hespanhol. Gondomar, cujos talentos diplomáticos o facto atlesta de ter sido o seu nomeentão mais conhecido na Grã Bretanha do que na suaprópria pátria, descobrira durante a sua residênciaem Londres que alguns aventureiros inglezes appa-relhavão navios para sé estabelecerem e fortificarn'um porto entre o Espirito Saneto e o Rio de Janeiro.Tinhão reconhecido o logar, e estribavão as esperanças em Ires Brazileiros que com elles havião tomadoparte na empreza, por nomes Gaspar Ribeiro, JoãoGago e Manoel de Oliveira. Parecem estes indivíduoster sido mamelucos, pois que os Inglezes confiavãono conhecimento da lingua indígena, e ligações queelles tinhão no paiz; ora as únicas relações que emcommetlimento d'esta ordem podião ser de utilidade,devião ser com as tribus naturaes. Erão porem homens de alguns haveres, e tinhão jogado na aventuraconsiderável cabedal. Também n'isto se meltérãoalguns Francezes, se de boa fé, ou como espiões deGondomar, não é liquido; o que é certo é qued'ellereceberão seiscenlos ducados, fosse como indemni-zação pelas perdas soffridas com o mallogro da especulação, fosse como paga de seus serviços. Senhorde todo o conluio, achou o embaixador meios deacção sobre os senlimentos e receios dos sócios brazileiros. Ribeiro e Gago forão levados a sacrificar todo

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HISTORIA DO BRAZIL. 121

o capital que havião arriscado nos aprestos, a reco- 1614-nhecer a sua falta, fazer acto de contricção, e entregar-se á mercê d'el-rei. Antes d'isto ja o governadorgeneral Gaspar de Souza recebera ordem de estarde sobre avizo,*para fazer abortar o plano , e pre nd erestes homens por traidores, apenas chegassem aoBrazil, onde provavelmente devião preceder os seusassociados inglezes. Agora encarregárâo-no de re-muneral-os.com  honras e mercês1 pelo grande sacrifício, feito, e pelo meritorio proceder que haviãotido, abandonando o caminho errado que trilhavão,e resolvendo viver e morrer como christãos e verdadeiros Portuguezes no serviço de seu rei legitimo.Tão fácil não se deixou persuadir Oliveira, irmãode Gago; Gondomar disse que era impossível con-vcrtel-o, cego como o diabo o tinha posto com omedo de que o rei o mandaria enforcar, se o houvesse á mão, e lambem com as vantagens de quegozava entre os Inglezes, e perspectiva de aindamaiores lucros. Mas depois de escripto isto, tãopouco estava o embaixador o acostumado a poupar-se a esforços no desempenho de seus deveres offi-ciaes, tornou a mandar chamar Oliveira para fazermais uma tentativa antes de fechar os despachos, enYlla foi feliz. Asseverou-lhe Gondomar que se per-

1 Tão illegivelmente está escripta no despacho original a remuneração, que se lhes concedia, que não, pude descobrir, nem mesm oconjecturar, que somma os algarismos querião exprimir.

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122 HISTORIA DO RRAZIL.1G14- sistisse no seu intento, em todas as egrejas e por

todo o Brazil seria proclamado traidor, e o medod'esta infâmia pôde sobre elle mais que todos os outros motivos. Yirão-se agora sem um so guia os Inglezes, cujos navios estavão ja de verga d'alto; a suamelhor esperança era perdida, e Gondomar, concluindo que a empreza por força seria abandonada(como p arece que succedeu), cong ratulou a corte pornão haver outros subditos hespanhoes envolvidos em

DAg!delèíl.' s imilhantes desígnios.

Ai.ieias Dor mais desarrazoado que seja o governo hespa-pira defeza nhol na sua política e remisso nas surfs medidas,

da costa. . .

jamais adormeceu na sua vigilância. Em conseqüência talvez d'este frustrado plano procurárão-se agorameios de evitar que inimigos, como indiscriminadamente se chamavão todos os estrangeiros, desembarcassem no Brazil, cortassem pau do mesmo nome,e se fixassem no paiz. Recommendou-se ao governa

dor que estabelecesse de cem a duzentos índios n'umaaldeia, sobre o rio Magnahé, de fronte da ilha deSancta Anna, onde soião desembarcar os interlopos,c que fundasse um estabelecimento similhante sobreo Pernipe, onde os inimigos cortavão as madeirascolorantes, principal mercadoria que a este vedado

paiz vinhão buscar. Um índio, chamado Manoel deSouza, que pelos seus grandes serviços era muito es-limado, devia commandar um dos novos aldeamen-t o s : era elle então pr incip al da aldeia de S. Lourenço

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HISTORIA DO BRAZIL. 123

do Rio de Janeiro que pertencera a seu avô Marti- 4615-m ão1, pessoa tão distincla no seu tempo que el-reiD. Sebastião, pelos seus merecimentos, lhe mandarao habito da ordem de Christo. Amador de Souza,filho do mesmo Martimâo etio de Manoel, seria o

capitão do outro. A cada aldeamento se daria um Je

suíta, Entendeu-se que embora estes índios não po-

dessem tolher o desembarque aos contrabandistas(o que so com uma armada forte se conseguiria),podião comludo suas ciladas e emboscadas tornar-setão faties, que não mais se atrevessem os extranhosa cortar madeiras; e em caso de necessidade do Riolhes iria sotcorro de tropas, não sendo grande a

distancia. Os índios para estes estabelecimentos ha-Car (a Regia

vião de ser Carijós, trazidos da villa de S. Paulo.Também se expedirão ordens para reparar e aug-

nientar os fortes das capitanias da Parahyba e Espirito Saneio para pol-os a coberto de qualquer sor-

preza. Tinha havido tenção de fortificar a ilha de

Ferniio de Noronha, mas por emquanto sobeesteve-seDespacho.

na execução, para atlender a outras couzas que pa- Msu,

de161

87de

xeccrâo mais instantes. Até ao estreito de Magalhães intenção de, . . fortificar

se exlendia o ciúme da corte d'Hespanha: inquietou- °Meas„l^es

dc

se ella por terem alguns estrangeiros examinadoaquelle passo, obtendo da sua navegação conhecimentos mais exaclos do que possuião os subditos de

Sua Magestade, e mandou por tanto aD. Luiz de Souza1 Era este Martimâo, ou Martim Âffonso, o famoso Marigboya. F. P.

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124 HISTORIA DO RRAZIL.1617 ordem de expedir duas caravelas que explorassem

bem, uma por um lado e outra por outro, todoaquelle canal, levantando mappas, e averiguando senão haveria alguma posição que, bem fortificada,dominasse a passagem. 0 lamentável êxito da tentativa de Sarmiento n'este mesmo sentido trinta annosantes (quando quatrocentos Hcspanhoes com trintamulheres alli forão postos em dous estabelecimentos,onde perecessem á necessidade e outras misérias inseparáveis de tão mal concebidas e peor executadasemprezas), parece que ja em Madrid se não lem-bravão d'elle; mas outrotanto não suecedia no Brazil,e posto que o governador, tendo representado umavez sobre as difficuldades do projecto, recebesse or-

Despachos.5?.m i°6ne dem Qe c u m P n r as suas instrucçõês, se appareces-15i6eiíT' sem bons pilotos, abandonou-se a idéia á vista de

i6i8!n" suas ulteriores representações,ciúme a Mostrava o governo da metrópole não ter menos

esKgêirot. consciência da importância dos seus domínios brazileiros, do que da sua pouca segurança; e se umaextrema vigilância e uma desconfiança sempre alertapodessem preservar de perigos uma colônia remota,sem ser precizo cuidar em meios adequados de defeza, nada teria empecido o Brazil. Nenhum governo

podia ser mais aclivo em colher informações sobreos desígnios de seus inimigos, e n'este empenho bemo servião òs seus agentes. Aprestárão-se em Amster-

dão dous navios para uma d'essas aventuras de com-

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1 0 1 7 .

HISTORIA DO BRAZIL. 125

mercio e pirataria, que n'aquella epocha era vulgarfazerem-se de sociedade. Tinhão os armadores suasrelações com certas pessoas no Brazil, que se haviãocompromettido a apromptar carregamentos de paubrazil, e levar-lhes ao mar em barcos de pescaria;mas, se falhasse esta parte do plano, devião os naviospôr-se a corso em busca de prezas, e em ultimo casotentar uma investida contra o Maranhão. Fez-se saberisto ao governador para que os mercadores estivessemde sobre avizo e armassem seus navios: recommendou-se-lhe também que provesse não so a que não soffressedesfalque a renda, mas também a que não padecessequebra a fama, couza especialmente para considerar-se. Com este rebate mais se exasperou o ciúme contra os estrangeiros, e expedirão-se ordens de expulsardo Brazil todo o forasteiro, fosse quem fosse, quealli estivesse estabelecido, sem respeito a pessoa ai- {^ 'dè1

guma, embora tivesse tirado licença para residir.Não passara comtudo ainda um mez e ja esta orde-nança era revogada, encarregado o governador deremetter á metrópole uma lista de todos os exlra-nhos que houvesse no Brazil, con informações sobreo comportamento de cada um, opinião em que eratido, importância de seusteres , e modo devida queseguia. Se contra alguns houvesse justos motivosde suspeitar que se empregavão em mercancia decontrabando, ou a entregarem-se a ella excitavão osestrangeiros, devião prezos ser remettidos para Lis-

sept. 1617.

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126 HISTORIA DO BRAZIL.,617- boa com as provas que contra elles houvesse, ou in -

Despaciio. ternados ser postos em logares onde d'elles nadaMs. 8d'out. .

1617. podesse recear-se.Medo dos Até dos Argelinos se temia um desembarque noArgel inos. . . . , ,

Brazil. Tinhão elles ultimamente saqueado a ilha de

Sancta Maria, levando captivos a maior parte dos

moradores de Porto Saneto. Recebeu pois D. Luiz deDespacho

Ms. "

5 de dez. Souza ordem para precaver-se, não fossem estes ini-ifii7. - r i '617

migos extender até ao Novo Mundo as suas depredações. Pouco depois ordenou-se ao governador que

regressasse a Bahia, tendo expirado o prazo da suaD". M s. °

L L

^ifiiíT'0 residência em Olinda, nem sendo mais necessa na

alli a sua presença para prover á conquista do Maranhão . Mandou-se-lhe uma esquadra para guardaracosta, mas logo se declarou que as rendas da coroaoutra nenhuma despeza mais comportavâo. 0 go

verno da índia concedera uns novos direitos de consulado para fim análogo, e devia D.Luiz consultar

com as câmaras sobre o modo de levantarem-so osfundos precizos. Um imposto como o do consuladoem Por tugal , era o que ao governador se lembravaque propozesse. Deu-se-lhe por mui recommendadaa urgência do caso, sendo tão numerosos e aventureiros os inim igos, e crescendo o mal com a tardança

do remédio; devia pois empregar todos os meios deDespachos, persuadir os povos a annui rem aos propostos tribu-M s. 14 d'ag.,

r l, . i-

28 d'ag, tos, tao claramente se reconhecia nas câmaras o th-6 d e n o v . , '

d e d1618.

• reito-de lançar fintas.

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HISTORIA DO BRAZIL. 127

Por este tempo parece a corte de Madrid ter*re- 1618

ceado da parte da Hollanda alguma couza mais do doCfiihòder , _ D. Antônio.

que a sua habitual actividade em mercadejar com osíndios, ou do que os seus antigos projectos de fundarestabelecimentos no Amazonas. Os agentes portuguezes em Flandres denunciarão queD. Manoel, filho do

prior do Crato D. Antônio, a quem succedera naspretenções, enlrctinha correspondência com o Brazil.A pessoa que se indicava como em communicaçãocem elle, era um tal Francisco, que tinha o posto decapitão na Parahyba, perto da cidade da Bahia, erelações judaicas na Hollanda. Um franciscano, por

nome Fr. Pedro da Annunciação, chegara ultimamente a Flandres para este negocio, e apparelhavão-se alli com destino ao Brazil navios em que devia iro sobrinho d'um certo Gabriel Ribeiro, de quemFrancisco eslava á espera. Sem confiar implicitamente n'esta informação, não deixou o governo

hespanhol de inquietar-se com um plano que nassuas conseqüências podia por ventura fazer reviveras pretenções da casa de D. Antônio. Incumbiu poiso governador de preparar-se contra qualquer em-preza que podessem tentar os Hollandezes, inque-rindo com a maior reserva sobre o caracter e con-

ducla de Ribeiro, e procedendo como por maisacertado tivesse o bem da justiça e da coroa, de modoque, a haver verdade n 'isto, se pozesse termo a qual- cana itegia.quer receio d'esla parte. ide^pt.

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128 HISTORIA DO RRAZIL.1618' Aos Judeos disfarçados, e a esses desgraçados, a

chrfftaos* quem a opprobriosa denominação de christãos novosnovos ' , • • i

no Brazil. expunha ao desprezo e ódio de seus visinhos, deviana verdade ser fácil tornarem-se mãos subdilos noRrazil, vivendo como vivião debaixo de continua impressão da in justiça e sem razão qu e soffrião. Nem

lhes falecião motivos para rec earem que o maisinfernal systema de perseguição que jamais inventoua maldade dos homens, estivesse a ponto de. ampliar-se a uma parte dos domínios portuguezes, cfljamaior fortuna era ter até então escapado a similhanteflagello. A inquisiç ão , que ainda mais do que de

ou tro qualq ue r paiz foi a desgraça de Hespanha ePor tug al, prend era ultim am en te no Porto quasi todosos mercadores de origem judaica, por mais remotaque fosse. Neste acto, como em todos os da mesmanatureza, fora a superstição pretexto, a cobiça motivo. Muitas das victimas estavão envolvidas nocom-

mercio com o Brazil, e o inquisidor-geral requereudo governo que ajudasse o saneto officio a haver aporção da fazenda d'ellas, que se achasse nas mãosdos seus agentes n'esle paiz. Derão-se pois a D. Luizde Souza instrucçõês que nomeasse para este cffeitoum m inistro confidencial a qu em pre staria lodo o

apoio. Mais se lhe ordenou que remettesse uma listade todos os christãos novos do Brazil, com as maisminuciosas informações que podesse colher sobreseus haveres e logares de residência, apontando par-

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l .s tado.

HISTORIA DO BRAZIL. 129

ticularmenle os que dentre elles podessem ser sus- ltil8-peitos de m anter relações com os estran ge iros . Peza- M lodenov.

das como forão as alribulações que os Hollandezespouco depois acarretarão sobre o Brazil, não é im provável que a guerra que se seguiu obstasse á intro-ducção do saneto officio alli, medida que parece meditava então a corte de Madrid.

No governo de D. Luiz de Souza forão reguladas e Dospczasdofixadas asdespezas do estado, tendo reinado até entãogrande desordem e irregularidade nos pagam entos.Os vencimentos todos do governador e de vinte apaniguados não passavão de dous contos, incluindoquatrocentos mil reis que annualmenle se deviãodistribuir em remuneração de serviços públicos. Arenda annual do bispo e.do seu cabido erão douscontos oitocentos e oitenta e quatro mil re i s ; os vigários de doze parochias da capitania da Bahia tinhãocada um sua congrua de setenta e tres mil novecentos e vinte reis; oitenta e dous mil reis por annoerão a consignação dos capuchinhos da cidade; outrotanto tinhão os benedictinos e cento e vinte os Jesuítas. 0 maior ordenado civil e judicial era de quatrocentos mil reis, c o maior soldo militar de cento esetenta e dous mil e oitocentos reis. A despeza totalda capilania da Bahia era de dezoito contos, seis-cenlos e oitenta e um mil oitocentos e quarenta reis;com as do Rio de Jane iro gastavão-se m enos qu inhentas libras; e em todo o Brazil, incluindo todos

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150 HISTORIA DO BRAZIL.1618 os seus estabelecimentos civis, judiciaes, militares e

Regimento, ecclesiasticos, não se gastavão por an no mais deMs. de. 24

dout.i6iG. quinze mu libras.Propostapara Tão pouco custava então a administração d'estas

adminis- r . . .

\lfu™a°l colônias, e comtudo era o governo mais rico da Eu-PaM brazil. r Q p a ^ue ge q u e ;x a v a u e n g 0 poder fazer mais despezas

para proteg el-as, nem pa ga r o qu e se havia gasto coma jo rnad a do M aranhão e ave ntu ras no Amazonas.Nomeou-se uma meza para cobrar por via de exe-

Despacho. cução todas as dividas de que o lhesouro real fosseMs. de 10 de 3 . \

jmi.i6i7. credor. As décimas das capita nia s do norte (e erãoestas as mais productivas) arrendárão-se em 1618por sessenta e sete mil cruzados, devendo parte serpaga em rou pa para a guarniç ão como de costume.Ficava esta somma aquém do producto dos annosan ter iores , pois que se allega ler sido o preço maisalto que se pôde obter, tendo-se plantado menos

Despacho, canna, e havido m ortalidade entre os escravos. 0 pauMs. de 29 de ' r

I28rde*-uí8, brazil era remettido para a metrópole por conta doa?. de

e 1628. rei, até que se podesse fazer um conlracto vantajoso;continuado por alguns ajinos este systema, taes inconvenientes n'elle se acharão, e tão activo foi o contrabando, que o governo tomou em consideração se

não lhe seria m elh or en trega r este ram o dos seusnegócios inte iram ente nas mãos dos Jesuítas, que,pela sua grande e amplo-derramada influencia enlreos índios, mais facilmente do que ninguém poderião

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1618.

de baleias.

HISTORIA DO BRAZIL. 131

o resultado d'esta deliberação, perdeu-se de vista oplano com o rebentar d'uma contenda, não pelotrafico n'um artigo de producção, mas pelo domíniodo próprio solo.

0 principio do governo n'esta epocha parece ter Pescar

l ° de balei

sido que todos os gêneros de grande valor commer-

cial produzidos pela natureza, erão realengos, pertencendo lanto á coroa em virtude de tal máxima tudoo que d'estes produetos se podia converter em the-souro, como d'ella seria esse mesmo thesouro, se fosseachado em espécie. No caso de minas preciosas era oprincipio reconhecido pelo direito europeo, e quandoo ampliarão ao pau brazil, parece ter-se admittido odireito exclusivo como um privilegio que a coroaadquirira pelas suas despezas com a descoberta ecolonização do paiz. 0 que n'isto havia d'impoliliconinguém o suspeitara, e até agora nenhum outroeffeito mao se notara, do que o da grande tentaçãoque se offerecia ao commercio de contrabando. Masa ampliação d'este principio ás águas ter-se-ia limitado á pesca das pérolas, a não ter sido a cobiça d'um

indivíduo que no governo de Gaspar de Souza propozpagar ao thesouro cincoenta mil reis por anno peloprivilegio exclusivo de matar baleias. A' impopularidade da medida não se attendeu, e a somma,mesquinha como era, foi acceita na bem fundadaesperança de maior beneficio para o futuro. Comeffeito dentro de poucos annos ja a renda tinha

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17,2 HISTORIA DO BRAZIL.l c l8- sub ido a doze vezes aquella q u a n t i a , e ao l indar o

gov erno de D. Luiz de Souza ap pa re ce u u m a offerla

para ar re n d ar esta pescaria p or cinco an no s a scte-

centos mil re is annuaes , e pagar a renda em Lisboa ,

on de pod eria ser app licada pa ra o serviço geral do

es tado, bas tando a demais receita do Brazil para suas

despezas, e sendo esta evidentemente um excesso

l iqu ido . Pareceu a proposta em ext re m o vanta josa ,

lendo-se r eceado aba t imento no conl rac lo , por ler

havido grande fal ta de assucar no anno precedente, eDespacho. ~

,Inovei6822,'e descido p ro po rc io na lm en te o preço d e todas as couzas.

D. Luiz porem, cuja adminis t ração chegara ao seu

term o, repr esen tou f ranc am ente ao re i qu e a justiçae l ega l idade d'esle monopólio e r ão m u i questioná

ve i s ; que como medida f iscal era desnecessário para

o esta do , send o para o povo o nero so nos seuseffeilos

direc los sobre o c o m m c r c i o . Ha\ia muitos Jesui tas ,

dizia el le , que em conversa t inhão emittido a opi

n ião que similhante couza não podia ler fundamentolegal nem equi ta t ivo . O re i podia lançar um imposlo

sobre cada baleia que se apanhasse, e sobre o azei te

que d 'el la se extrahisse; era esta sua indubitavcl

prerogat iva , se lhe parecesse bom fazel-a valer,-e

todas as pessoas serião em consciência obrigadas a

pagar o d i re i to ; mas conver te r em monopólio um apesca que era l ivre, era o que como soberano catho-

lico e chris tâo não podia. Tão l ivre era no Brazil a

l inguagem do di re i to no re inado dos Phi l ippes . Nem

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 133

d' is to havia necessidade, proseguia o ex-governador, d618

pois que pagas todas as obrigações do thesouro,

deixava e l le no erár io , ao ent regar a adminis t ração,

um saldo de cincoenla e qu at ro m i l e seiscenlos c r u

zados, dos quaes dez mil em dinheiro; e o conlracto

se tornaria intolerável oppressão , aeceitando-se os

lermos do proponente, que exigia que não se lhe

laxasse o preç o ao azeite. Poria isto á m er cê do con-

Iraclador os engenhos para os quaes era este pro-

ducto de tão indeclinável necessidade. Talvez se

aüendesse a esta par te da representação de D. Luiz

de Souza, mas não era provável que um governo

que embora prospero no Brazi l , se achava envolvido

cm grandes despezas na Europa, abandonasse um

monopólio que lhe havião posto nas mãos, c toda a

pescaria continuou desde então a fazer se ja por con

lracto, ja por conta da coroa. M^itfe;

Também no governo de D. Luiz de Souza se pro- ,,esca

palou que na capitania de S. Vicente havião Gonçalo dl' |, er 0 ÍIS

da Cos'a d'Almeida e João Percs d escoberto um a

pesca de pérolas. Duvidoso era o valor do achado, e

deixou-se que os aventureiros por certo espaço o ex

plorassem em próprio provei to ; mas o governador

recebeu instrucçõês secretas para protegera pescar ia ,

se fosse profícua, contra corsários e in ter lopos eu-

ropeos de qualquer nação que fossem. M d VTd.-

Havião-se renovado as pesquizas em busca de ouro,. , , Cata de o n rn .

proseguindo-se 11 ellas com muila perseverança no

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Noticiade minas de

prata .

134 HISTORIA DO BRAZIL.

1618. governo de D. Francisco de Souza, e activando-asespecialmente Salvador Corrêa de Sá no Rio de Janeiro. Mas como á espectativa não correspondesse o

Despacho, resultado, declarárão-se as minas abertas a todos os"ovdi67i8e subditos d'el-rei, para que nellas trabalhasse quem

quizesse, conform e as leis , e pagando o qu in to, comose praclicava nas índias hes pan ho las. Por este mesmotempo offereceu-se um certo Melchior Dias Morea amostrar ao governo riquíssimas minas de prata quehavia descoberto, promctlendo-se-lhe em recompensa,se assim o cumprisse a fidalguia, o cargo de admini stra do r das m esmas m ina s, e, a respeito da con-

Despacho. cessão de terras que requeria, todos os favores quedez. i6i7.c s e lhe podessem fazer sem lesão de terceiro. Mas

como as de Roberio Dias acabarão em tristes decep-mâr.'27i6i8. ções estas offertas brilhanles. A corte porem apren

dera a cuidar no Rrazil em outros produetosque nãofossem so os melaes preciosos. Exigiu informaçõessobre o algodão e outras plantas, das quaes, se dizia,podião fazer-se mechas para serviço do exercito e daarmada. Em Sergipe tinhão-se encontrado minas desalilre, de que se podião tirar por anno dous milquintaes. Grande falha d'esle artigo havia em Portugal, e o rei mandou estabelecer no Rrazil uma fabrica de pólvora : devia ir de Lisboa uma pessoaperita n'esle mister, e e em outra parle das colôniasapparecesse mais sa lilre , havia o gov ernador de rc-melter para a melropole amostras avulladas. Enlen-

Minasde salitre

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HISTORIA DO BRAZIL. 135

dia-se que a pólvora poderia fazer-se mais barata no1618

-Brazil do que na mãe pá t r i a , e contava-se com qu e

. , . Despachos.

alli se fabricasse bastante para o próprio c o n s u m o , e M S. de 29 d«1 l l jun. e 5 de

para exportar para esta . <lez-161T-

Entre tanto v iu-se a capi tania do Pará per turbada C ^ S B^ , S

por dissenções serias. Andava Antônio Cabral , sobr i nho de Caldeira , inimizado com um capitão chamado

Álvaro Neto, bom soldado, e gera lmente es t imado,

e um d ia, no logar m ais pub lico da villa, c ah ind o

sobre elle, assassinou -o. Ao alarid o que se fez, ac u-

dirão Paulo da Rocha e Thadeo de Passos, amigos

íntimos do mo rto , e vendo Caldeira no a j u n e t a me n t o ,d'elle exigirão just iça. Mas o commandante, que fora

um tanto avesso a Neto, não estava disposto a tomar

as devidas medidas para castigo do matador. Não

poderão os capi tães ver is to, e tão l ivremente ma

nifestarão a sua jus ta indignação, que percebendo-se

a si próprios em perigo, acolherão-se ao conventodos frades de Saneto A ntôn io. R ep rim ind o po r em

tjuanto o seu resent imento, mandou Caldeira recolher

o sobrinho á prizão ; mas passados alguns dias deixou

que o supplicassem para suspender o processo, at-

tendeu ás solicitações que lhe fazião, sobre pretexto

de se carecer dos serviços do prezo contra os índiosrebellados, e pol o em l iberdade. Sol tando então os

diques á sua cólera contra os dous capi tães que se

havião asylado, mandou uma part ida de soldados

qu e se apoderassem d 'el les .

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130 HISTORIA DO BRAZIL.

leis. Pouco casu fazem os Por luguezesd 'umhomic íd io ' :Caldeira . . . .

deposta peio uma ma policia e peor religião tirão-lhes todo o receio de castigo, tanto .humano como divino, mas tudoo que cheira a sacrilégio os horroriza. Forão os soldados de ma vontade ao seu mandado, e voltarãonada feito; um dos frades tinha recebido d'elles

uma contusão accidental, o que mais lhes augmen-tara o horror. Mandou então o commandante setentahom ens a arro m ba rem o convento ; derão estes traçacomo gastar o resto do dia com uma palissada exterio r, e ret irár ão -se , dizendo, que fora imprudenteenlrar com noute fechada. Impaciente aguardou Cal

deira a au ro ra , que lhe havia de pôr nas mãos osseus inimigos; mas ao romper d'alva achou amotinada toda a guarnição, que, carregando-o de ferros,elegeu em seu logar Rallhazar Rodrigues de Mello,o official qu e havia sido m an dad o a forçar o convento. Acceitou este o com m ando , pretextando coac-

ção, restabeleceu a or de m , e m andou avizo do quehavia suecedido ao governador D. Luiz de Souza, eá corte de M adrid. A gu erra com os índios rebella-tlos, como oschamavão, continuava ainda, nem haviaderrotas que intimidassem este povo bravo e oppri-rnido. Amaro, que com a sua manha provocara a

insurreição, foi feito prizioneiro e despedaçado naboca d'uma peça. Acommcltérão os naluraes o forte

1 Como qua- ' todas a,- proposições geraes é falsa semelhante a>sei-c;uo. F. P.

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H I S T O R I A D O B R A Z I L . 1 3 7

de Belém, e todos os esforços dos Portuguezes forão

10ltí

-precizos para a defeza, mas morto por um tiro feliz B ^ ^

o coudel dos assaltantes, retirárão-se estes. m-i6um-

Entretanlo tinha Domingos da Costa entregado Domingo,Maciel nas mãos do novo governador, D. Luiz de ^ ^

Souza, em Olinda, que era então, como logar mais

visinho do theatro da acção, o Maranhão, a residência do governador general. Mas as accusações esc rip-tas de Anlonio de Albuquerque não poderão tantocomo a defeza pessoal do accusado; innocentado detoda a culpa foi Maciel tom ar o commando contraos Tupinambás, e D. Luiz, confirmando com uma

palentea nomeação de Antônio de Albuquerque paraa capitania, deu-lhe por ajudante Domingos da Costa,e no caso de não concordarem os dous sobre matériade importância, devia ter voto decizivo o ouvidoryeral Luiz de Madureira. Desconfiou po rem que Al-=buquerque não acceitaria a capitania com estas con

dições, e logo nomeou Domingos da Cosia para suc-ceder-lhc, se assim acontecesse. Bom fundamentotinha a desconfiança, pois que Albuquerque, alle-gando ler de ir a Madrid por causa da morte do pae,resignou o governo. 469471.'

0 mesmo navio em que ia Domingos p a ra S . Luiz, r.cmettem-se

levou também Jeronymo Fragoso de Albuquerque, Portugal o»J ° l i ' amotinados-

primo de Antônio de Albuquerque, nomeado para a «leBeiem.capitania do Pará. As suas instrucçõês erão remelterprezos para Portugal o assassino Cabral, seu tio Cal-

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Bento

138 HISTORIA DO BRAZIL.

cio deira, Balthazar Rodrigues, que acceitara o governodas mãos dos amotinados, e os dous ofíiciaes que

eCntoeMaciei havião capitaneado a revolta. Apenas feito isto, principiou o novo capilão-mór a proseguir d'um lado naguerra contra os míseros Tu pin am bás , em quantoBento Maciel, que de Pernambuco trouxera oitentasoldados e quatrocentos frecheiros indígenas, começava da opposta praia de S. Luiz a sua carreira deextermínio até Relem, matando e arrastando á escravidão quanto índio apanhava. Trazia ordens parainquerir ainda mais sobre a sèdição, e posto que osmais culpados tivessem ja fugido ou sido remettidospara Portugal, uns poucos de pobres diabos que porsua desgraça se havião deixado ficar, julgando aparte que tinhão tomado mui insignificante parahaver de altrahir altenção, forão prezos e embarcados para a metrópole, onde jazerão annos e annosnos cárceres, com pouca probabilidade de jamais selhes instaurar o processo. Executada esta parte dasua commissâo, tornou Maciel a atirar-se aos selvagens. Dizia o capitão-mór que bastava ja de vingançatomada, sendo tempo de conceder a paz, mas Macielrespondeu que, lendo sido nomeado para o com-mando n'esta guerra, era a elle que locava dizerquando havia de ter fim. Sentiu Jeronymo Fragosotoda a insolencia d'esta resposta, faleceu-lhe poremo tempo de promover a demissão d'esle homemdamninho e sanguinár io , pois morreu dentro de

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 139

poucas semanas, lendo nomeado seu primo Mathias 16i9'

d'Albuquerque para sueceder-lhe. O povo o depoz,pretendendo que nenhum capitão tinha poder denomear suecessor, e elegeu Custodio Valente e umfrade para o governo. Teixeira vociferou contra estasmedidas, mas reconciliárão-no com ellas, admit-

tindo-o como terceiro á governança. Macielquiz fazer

• valer o seu direito á auetoridade, m as como l h 'onão admitlissem, foi por deante no seu nefando trafico de caçar índios para vendel-os escravos. Nãotardou que Valente embarcasse para Portugal; ofrade não se vendo assaz popular na sua nova qualidade, recolheu-se ao convento, e ficou o governo

nas mãos de Teixeira. Veio então Maciel a Belém,onde tentou suscitar contra elle um levantamento,mas, sendo o novo commandante tão activo comovigilante, nada conseguiu, e vendo gorarem-lhe todosos planos, voltou ao Maranhão, onde ergueu um 1(i'20

ü í i i e l o .

forte á embocadura do Itapicurú. r,i-m.

Com a administração de Domingos da Costa ia 1021.prosperando o Maranhão. Parece que o governo.de ao

cM'a

ers

ll3o

M a d r i d j u l g o u e s t e s n o v o s e s t a b e l e c i m e n t o s d i g n o s , ios 0A 0ç ôres .

de mais atlenção, do que o Brazil jamais mereceradesde a morte de D. João III. Jorge de Lemos Biten-cjurl, sobre promessa d'uma commenda que valia

quatrocentos mil re is, levou dos Açores duzentos colonos, aos quaes logo se seguirão outros quarentacujo fornecimento o provedor-mór d'estas i lhas,

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H „ H I S TO R I A DO B R A Z I L

Mui. membro da mesma familia, conlraclou também coma coroa. Chegarão estes reforços m ui opportunos paraencherem o vácuo que as bexigas havião deixado nacolônia. Os índios soffrérão terrivelmente, passandopoucos do terceiro dia depois de manifestada a moléstia. Mas não consta que a doença alcançasse d'enlre

os naturaesos que vivião inimigos dos Portuguezes,tão vasto espaço de devastação se havia posto depermeio,

u neno. No anuo seg uin te veio Diogo de Mendonça Furludodo S S ão . por g overnado r gen eral. Com elle vinha Antônio

Moniz Barreiros, rico morador de Pernambuco que

havia barganhado com o governo o oflicio de prove-dor-mórda fazenda real, obrigando se a erigir dousengenhos de assucar na conquista do Maranhão. Afimde tornar esle negocio mais lucrativo a todos os respeitos para elle mesmo, achou meios de persuadiro governado r a da r-lhe ao filho a capitania de S. Luiz,

apezar de haver muitos outros pretendentes, quetodos devião ter melhores direitos, e apezar de nãoser o jovem Barreiros manifestamente de edade, paraconíiar-se-lhe similhante cargo. A islo se obviouobrigando-o a consultar sobre lodosos negócios importantes com Fr. Luiz Figueira, jesuíta, que com

outro da.mesma ordem o acompanhava. Mal pozerãoestes Jesuítas pé no M aran hão, logo contra elles seexcitou uma assuada. Com tanta resolução e perseverança tinlia a Companhia combalido oin iquo pro -

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10-21.

HISTORIA DO BRAZIL. III

ceder dos Portuguezes para com os nattiraes, e oexecrando systema da escravidão, que não podiadeixar de ser temida e odiada pelos senhores d'escra-vos. Não bastou, para proteger estes padres, o seucaracter religioso, e o .senado da câmara de S. Luizleve de requerer ao capilão-mór que os fizesse sahir

da capitania o mais depressa possível; mas Figueira,que presente estava ao fazer-se este requerimento,respondeu que havião de fazcl-o em postas se queriãoque abandonasse o exercício do seu dever n'aquelle

logar. Tanto o novo capitão, como o seu predecessorDomingos, invidárão toda a sua aucloridade e in

fluencia, buscando apaziguar o povo. Para socegar-llie os clamores, foi precizo que os dous Jesuítasassignassem uma promessa escripta de jamais se ingerirem com os índios mansos, sob pena de desterroimmedialo, c perda de todos os bens que podesse

. • lierreilo.

possuir a sua ordem. 492 96.

Por este tempo foi Maciel legalmente nomeado ca- Mac dr> i - i i capitão do

pilão-mor do Para, depois de por duas vezes tertentado fazer-se tal a si mesmo por meios indevidos.Arreceava-seopovo de sua bem conhecida crueldade,mas elle achou desafogo para ella nos pobres índios

entre os quaes fez Teixeira po r sua ordem terríveisestragos. Na primavera do anno seguinte chegouLuiz Aranha de Vasconcellos em commissão especialde Madrid, para explorar o Amazonas e reconhecertodos os logares oecupados pelos Hollandezes e outros

Pará.

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142 H ISTOR IA DO BR AZIL.im- interlopos. Suas instrucçõês mandavão-no ir a Belém

consultar com Maciel, e alli decidir em concelho comelle, com o capitão da sua caravela e os dous pilotos,de que lado principiar a exploração, se da banda dacapital, se do norle, onde se suppunha acharem-seestes intrusos. Resolveu-se que principiaria do lado

Berredo. , , »

499-501. dO S U l .E.pediòo Não tardarão a chegar a Belém repetidas noticiasao Curupá e , , . 1 i • • • nbocas do de achar-se Aranha cercado de inimigos no no lu -

Amazonas.

rupá, e Maciel sahiu immediatamente a soccorrel-ocom setenta soldados c mil frecheiros indigenas n'umacaravela e vinte e duas canoas. Achou Aranha ja de

volta : era falsa a nova de ter sido cercado, mastinha encontrado colonos no Curupá, e outros ramaesdo grande rio, não podendo por falta de força effec-tuar o seu reconhecim ento. Resolveu-se que ellevolveria atraz, e Teixeira com elle no outro navio,em quanto Maciel costearia com as canoas, sondando

todos os rios até ao Curupá, que seria o logar dajuneção. Effectuou-se esta, tendo-se Teixeira que seseparara do outro, visto em grande perigo de baixios,correntes, tempestades, falta de piloto, e numerososbarcos inimigos que frequentavão aquellas paragens.Ao mesmo tempo chegou de Belém outro destaca

mento, que Maciel ordenara que o seguisse. No Curupá acharão aventureiros hollandezes, inglezes efrancezes, com trincheiras para defeza do porto, egrande copia de naturaes por auxiliares. Maciel os

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HISTORIA DO BRAZIL. 143

expediu d'este posto, investiu muitas das suas outrasfeilorias que queimou, e seguiu para a ilha dosTocujús, uma das da barra do Amazonas. Havia aquimuitas e bem fortificadas feilorias, que todas forãoabandonadas á approximação dos Po rtuguezes. Preparava se Maciel para dar caça aos fugitivos no in te rior da ilha, quando-soube que em soecorro d'elles

vinha um navio de considerável força: investiu-o equeimou-o, perecendo toda a tripolação excepto ummoço, com tão atroz crueldade se fazia n'aquellestempos a guerra por mar! Tinha sido intenção deMaciel formar um estabelecimento na ilha dos Tocujús, mas abandonando o projecto voltou a Curupá,e alli, n'um logar chamado Mariocay, plantou umforte que ainda hoje conserva o nome de Saneto Antônio, sob cujo padroado foi erguido. Preenchidoassim o fim da expedição, regressou a Belém.

A partir d'este tempo, assumiu Maciel o titulo de

Primeiro Descobridor e Conquistador dos rios dasAmazonas e do Curupá; Luiz Aranha, que pr im eirodo que elle havia en trado no Curupá, tomou o mesmofalso e pomposo cognome, aprazendo-lhes a ambosesquecer que havião encontrado Europeos no ultimorio, que a gigantesca corrente havia sido navegada

por Orellana e pelo desesperado aventureiro Lope deAguirre vindos do outro lado do continente, e queeste mesmo labyrinlho de ilhas e canaes, que era omais que elles tinhão visto , havia sido explorado m ais

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\\\ HISTORIA DO BRAZIL.

'621- d'um século antes por um dos seus próprios conlcr-

raneos, piloto da costa, por nome Meirinho, e cujo

roleiro para uso dos que tentassem a mesma difficil

MI Ci navegação, existia ainda.1024. Com razão se co ns iderarão em Madrid como de

o Maranhão o-rande importância estas conquistas, e sendo as an-e o Para & *•

" t o "1

ligas capitanias ja vastas basta nte para um so gover-in'XT nador, e as communicações do Maranhão para Per

nambuco lão difficeis pelo co ns tan te vento leste,forão as conquistas do Maranhão e Pará separadasdo governo geral do Brazil, com o titulo de Estado,para cujo primeiro governador foi nomeado Fran

cisco Coelho de Carvalho. Mas ja os dias mãos doBrazil se approximavão, e em logar de .alargaremos seus estabelecimentos n'aquelle paiz, virão-se os

MS-tfiB Portuguezes a ponto de perder quantos ja possuiào.

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HISTORIA DO BRAZIL. 145

. • , 1 6 2 2 .

C A P I T U L O X I V

Formação d'uma companhia das índias Occidenlaes na Hollanda. S. S al

vador tomada pelos Hollandezes e restaurada pelos Hespanhoes e Portuguezes commandados por D. Fad rique de Toledo. — Negócios doMaranhSo. — Fazem os Hollandezes sahir nova expedição e apoderão-sede Olinda e do Recife.

Se Philippe IV tivesse cahido nas mãos d'um ministro prudente, seria pela paz, pela restituição doPalatinado e pelo casamento da infanta com o p rí n cipe inglez, que terião terminado as tregoas de dozeannos com a Hollanda : ter serião poupado m uita smisérias á Europa, e a Hespanha houvera tido tempode refazer-se de suas exhaustas forças. Mas Ph il ip pee Jaime I forão bigodeados nas suas disposições pacificas pelos seus favoritos, e Olivares e Buckinghamsão auctores dos crimes e desgraças que se seguirão.

Com razão prezavão os Hollandezes sobre todas ascouzas a liberdade : depois da liberdade vinha a ganância. Atacando as colônias hespanholas, empobre-

cião o inimigo, e a si próprios se enriquecião aomesmo tempo. Era o que no oriente havião feito com A

tão bom resultado que pozerâo-se agora a olh ar pa ra ft"a America, e propoz-se a encorporação d'uma com

hollandezadias

Occidentaes.

U

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146 HISTORIA DO BRAZIL.1622- panhia das índias Occidenlaes, cujo fim principal

devia ser fazer conquistas no Brazil. Serias objecçõesmilitavão contra esta proposta. Ponderava-se que eraa Hollanda mui pequena para tão ambiciosos pro-jectos; que para duas companhias seria difficil achargente; e que os productos do Brazil e das possessõesasiáticas erão tão similhantes que uma companhiafaria mal á outra, trazendo ao mercado gênerosquasi os mesmos. 0 Iriumpho, se triumpho houvesse, excitaria a inveja das potências europeas oraamigas, e da inveja cedo nasceria a hostilidade.Mas não havia que contar com a victoria. Como osda índia não erão os estabelecimentos portuguezesno Brazil; alli se tinhão os colonos no decurso d'umséculo ligado com os naturaes, que lhes darião poderoso auxilio contra quaesquer invasores, cumprindorecordar que tilo fáceis como ilh as tomadas se nãodefendião conquistas n'um continente.

Em resposta a estas objecções dizia-se que os naturaes ardião por arrojar o jugo dos Portuguezes, eque estes mesmos, uns por ódio a Castella, outrospor seus casamentos com christãos novos, e conseqüente receio da inquisição, ou de boa mente fariãocausa commum com os Hollandezes, ou fraca resis

tência lhes opporião, para o que bastava Iractal-osbem e dar-lhes e plena liberdade de consciência.S. Salvador e Olinda, as duas praças, cuja posse maisimportava haver, erão ambas accessiveis por mar; e

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HISTORIA DO BRAZIL 147

vencidas ellas, fácil era o cam inho do Pacifico, e á i m

mão ficavão os thesouros do Peru. Assim ficaria privada a Hespanha dos próprios meios da .guer r a . Eque se arriscava com a tentativa? Do estado nada seexigia senão homens que serião levantados e manti

dos á custa da companhia, e que, não sendo assimutilmenle empregados fora, podião tornar-se perigosos dentro do paiz. Também como é costume, seperverteu o christianismo, fazendo-o servir aos finsda ambição e da avareza, e como motivo para invadir

o Brazil se allegou que uma religião pura iria poreste meio assentar-se na America. Prevalecerão estesargumentos: organizou-se a companhia ', derão se-lhc plenos poderes, e prohibiu-se por vinte annos atodos os outros subditos das Provincias Unidas o

commercio com a America, e com a fronteira costada África do Cabo da Boa Esperança ao Trópico de pr. io.5'. S. Giuseppc.

Câncer. Todos os seis annos devia a companhia dar „p-5]-1 Cespedes.

conta do seu estado. L% 5 'c-u-

Não erão indignos dos vastos meios postos á sua 1623.

disposição os espíritos da nova companh ia, que resolveu principiar as suas operações por uma tentativa contra a capital do Brazil. Tomou-se esta ousada

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contrao Brazil.

148 HISTORIA DO BRAZIL.1623- dos quaes se esperava menos resistência do que da

• parte dos Hespanhoes, como gente mais fácil de ganhar-se por amiga, ou de obrigarse por pacifica a

ippareiha-se viver auieta e su jeita. Depressa se apparelhou umauma frota • J l .

frota ao commando de Jacob Willekens; por almirante lhe pozerâo o famoso Pedro Pietersz Heyn, que

de simples marinheiro se erguera áquelle posto.Hans Vandort foi por general de terra. Por intermédio dos judeos estabelecidos no Brazil, se colherãotodas as informações necessárias, que era n'aquellesdias a Hollanda o so paiz da christandade onde esteopprim idissimo povo vivia tranquill o , e pilotos hol

landezes erão de todas as couzas com que mais fundam ento havia para contar-se. Mas assim como osHollandezes compravão informações, também asvendião : e houve em Amsterdão mercadores quemandarão recado a Lisboa, advertindo o governoque se a ameaça se dirig ia con tra a índia, o golpe

era destinado ao Brazil. Egual admoestação fez ainfanta Isabel de Flandres para Madrid. Mas nadapodia despertar Olivares : era systema da côrle hespanhola enfraquecer Portugal por todos os modos,e ou não deu credito á denuncia, ou não considerouquaes serião para as suas próprias colônias as conse

qüências de perderem-se as portuguezas.Sahiu a frota em dezembro de 1625; um temporal

a dispersou á vista de Plymouth, e so em Cabo Verdese pôde effectuar de novo a junc ção. Passada a linha,

Dispersãoila armada

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. HISTORIA DO BRAZIL. 149

abrirão os commandantes as suas instrucçõês, e 1623

acharão ordem de atacar S. Salvador, capital doBrazil. Nenhum a comm issão lhes podia ser m ais bemvinda, mas nova tempestade contrariou-lhes as esperanças, e outra vez se dispersou a armada. Vandortfoi repellido para Serra Leoa; Willekens forçou orumo contra o vento, e ganhou o Morro de S. Paulo,a doze legoas da Bahia, onde se poz a capear ao larg o,aguardando Vandort : também esperava que estademora diminuiria a inquietação que causara o seuapparecimento, suppondo os Portuguezes que elleteria vindo alli arribado.

Descuidavão-se os Brazileiros a si próprios quasi s. salvadortanto, como a corte de Madrid se esquecia d'elles.Bardejava o Hollandez perto da costa a doze legoasda capital havia ja tres dias, e ainda o governador *nenhum avizo recebera; e o prim eiro que lhe foi sorezava d'um navio. Não tardarão novas mais certas,e então principiou elle a fortificar postos longamentedemais abandonados; passou revista ás suas forças,que monlavão a mil e seiscentos mosqueteiros1 cmdezaseis companhias, e reun iu na visinhança quantospodião pegar em armas. Era então bispo da BahiaD. Marcos Teixeira, personagem que exercera cargosna universidade de Coimbra, na sé de Évora e na

1 Compunha-se este exercito irregu lar de mo radores ás pressas a r madas e sem practica alguma d'arte da gue r ra ; não passando de 80homens a tropa de linha, segundo o testimunho de Brito Freire. F. P.

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150 HISTORIA DO BRAZIL.1623- inquisição de Lisboa, com o credito que podião dar

laes officios. Beinava entre elle e o governador alguma má vontade, c talvez isto motivasse divergênciade opinião na actual conjunctura. Terião combatidoos que do Beconcavo havião sido chamados paradefeza da cidade, se o inimigo se houvera mostrado,quando elles esperavão; poucos dias bastarão paraarrefecer-lhes o a rdor, e sentindo os males de suaausência de casa e dos negócios, perdida a paciênciapersuadirão-se a si e aos outros que os Hollandezesso havião vindo como de costume a piratear navios.O bispo injustificavelmente lhes augmentou o descontentam ento , dizendo publicam ente que não cria noper ig o , e que maior mal se faria a estes indivíduosdetendo-os, do que poderião compensar os serviços

« que auferisse o estado; e não contente ainda comusar de tão damninha linguagem na conversação, no

Tamaio de mesmo sentido pregava do púlpito. O resultado foiVargas. 35. r- ° . r

B"to Freire, que as forças ru ra es, anim adas com o exemplo deinsubordinação da parte de quem por primeiro devertinha inculcar a obediência, amotinadas desertarãoda cidade. Não tardou o prelado a ter razão de arrepender-se do seu próprio feito; e querendo reparal-oquando avizos repetidos não deixarão mais duvida

sobre a força e designios dos Hollandezes, offereceuao governador seus próprios serviços pessoaes, comos da sua casa e do seu clero, para defeza da cidade;pois, dizia, embora lhe incumbisse pelejar mais com

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1623.

HISTO RIA DO B RAZ IL . 151

o r a ç õ e s d o q u e c o m a r m a s , c o n f i a v a q u e o S e n h o r ,

ordenando-lhe q u e a r r i s c a s s e a vida p e l a s a l v a ç ã o d e

s u a s o v e l h a s , l h e d a r i a f o r ç a s p a r a sacrifical-a se

fosse mister, e o a j u d a r i a c o n t r a u m i n i m i g o r e b e l d e

n ã o so a o r e i , m a s l a m b e m a D e u s . E r a notório

q u a n t a a s u a p o b r e z a , n ã o t e n d o e l l e n u n c a r e c e b i d o o

q u e e s t a d o l h e d e v i a p a r a s u a s u s t e n t a ç ã o , m a s a i n d a

l h e r e s t a v a a l g u m a b a i x e l a , e s e a quizessem p a r a

m a n t e n ç a d o s s o l d a d o s , s e r v i ç o d e S . M . o u b e m d a

c i d a d e , prompta e s ta v a : f i n a l m e n t e , p e d i a ao g o v e r

n a d o r q u e , e s q u e c i d o q u a l q u e r d e s a g r a d o , l h e m a r

c a s s e u m l o g a r o n d e m e l h o r a p r o v e i t a s s e . F o r ã o p o i s

e l le e os seus cr iados e o seu c o r p o d e clérigos

pos t ados na s é , onde desde l ogo princip iarão a m o n

t a r g u a r d a . P e l a s u a p a r t e n ã o ficou o g o v e r n a d o r

a t r a z e m g e n e r o s i d a d e : of fe rece u sus t e n to a quem

d'elle c a r e c e s s e , p a r a q u e n in g u ém s o b p r e t e x t o d e

f o m e a b a n d o n a s s e a* c i d a d e . M a s d e m a s i a d o t e m p o

se hav i a pe rd ido na i nacção : t aes , com o Willekens o s

e s p e r a v a , f o r ã o o s effeitos d a l o n g a i n d e c i z ã o , e

q u a n d o , r e u n i d a o u t r a v e z a s u a f r o t a , e i ç a d o o s a n -

g u i n e o p a v i l h ã o c o m u m b r a ç o e m p u n h a n d o e s p a d a

n u a , s e a p r e s e n t o u d e a n t e d e S . S a l v a d o r , p o u c o s

p re p ar at iv o s a c h o u , e po uc os m ei os de de fez a. Aidenburgh.

A v i s l a d a a f r o t a e c o m a g r a n d e z a d o p e r i g o d e a n t ed o s o l h o s , p o s t o u o g o v e r n a d o r á p r e s s a a s s u a s t r o

p a s n o s p o n t o s d e d e f e z a, e e r g u e u n a p r a ç a u m a

f o r c a , d e c l a r a n d o que q u e m a b a n d o n a s s e o s e u p o s t o

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152 HISTO RIA DO RR AZ IL .

1623. m or rer ia d'aquella m or te affrontosa. Pozerão-se osnavios debaixo da artilharia d'um baluarte que ficavaao mar, tripolados elles próprios para a defeza; e o

Tamaio bispo andou n'um escaler exhortando a fazerem va-de Vargas. r

fí56- lentemente o seu dever os que estavão a bordo. Lm

qu anto o inim igo se conservou a distancia, forão as

peças bem servidas, de modo que o navio hollandezqu e vinha na frente ficou desarvorado , e morto oseu capitão, homem de grande fama. Então fez Heynlargar Ires lanchas com vinte homens em cada uma.Vendo-as avançar e suppondo que os vinhão abordar,acobardárão-se os Portuguezes, e fugirão para terra.

Alguns, que com o cuidado da própria conservaçãonem tudo havião esquecido, pozerão fogo ao maiordos na vi os '; d'este se communicou o incêndio a maisIres, e como prêmio da sua fácil victoria levarão osHollandezes oito.

Animado com isto, resolveu Willekens accom-

metter a bateria que também havia sido bem servida.Quatorze baleis se tripolárão com vinte marinheiroscada um, e o próprio Heyn se poz á frente. Não sodo terrapleno, mas também da praia se lhes faziafogo vivo. Erg uia -se a m ura lh a da bateria oito ounove pés acima da água, e sendo este o ponto mais

1 Tamaio de Vargas diz que os Hollandezes os incendiarão. Não erãoelles tão loucos, que fossem de stru ir o q ue tão brevem ente deviape rten cer -lhe s. Podemos seguir sem hesitação os auctores hollandezes,pelo que toca aos seus próprios movimentos.

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HI STORI A DO BRAZIL. 153

efficaz de defeza, havia alli postados de quinhentos 1025-a seiscentos homens. Mas a sorte dos navios e a resolução com que avançava o inimigo intimidou-os. Foio cornela de Heyn o primeiro homem que trepou ,e o mesmo Heyn o segun do 1; aquelle foi morlo, masos marinh eiros escalarão o muro, uns com o auxiliode seus croques, outros com o dos hombros dos companheiros. Este perigoso feito custou apenas quatromortos e dez feridos aos Hollandezes. Os Po rtuguezes j . deLaet.

V. 14 .

metterão-se ao mar e escaparão; e Heyn, vendo queo logar ficava ao alcance de tiro da pr aia , que cresciaa noule, e que a sua gente estava mui fatigada e

quasi exhausla a pólvora, encravou as peças e volveuá armada.

Emquanto os marinheiros jazião este rude serviço,desembarcavão mil e duzentos homens de terra eduzentos e quarenta de mar ao commando do sar-gento-mór Albert Schouten. Não se oppoz a menor

resistência, embora se visse na praia grande copiade gente armada de arcabuzes, arcos e lanças, comum official a cavallo para commandal-a. Porem malo inimigo poz pé em terra, desappareceu esta desordenada multidílo. Dous homens 2 ião na expedição

1

Este feito d'armas é assumpto d'uma gravura n'um livro hollandez popular : As vidas dos Almirantes.- Frederico Rutter e Rodrigo Petrin os chama Tamaio de Vargas,

mas seus nomes erão Dirck de Ruyter e Dirck Pieterszoon Colser. Eeste um exemplo das metamcrphoses por que passão no portuguez e

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1625.

154 H ISTOR IA DO R R AZIL.

que tinhão sido prizioneiros na Bahia, e, conhe

cendo bem a localidade, servião ora de gu ias aosseus; estreita era a pas sag em , e um pu nh ado de homens resolutos podia ter causado grande damno aosinvasores, que desassombrados marcharão até aossubúrbios. Alli lhes fez frente o filho do governador,e com bra vu ra tal que os Hollandezes perderão al

guma gente, chegando, segundo a sua própria confissão, a ver-se em risco de serem baralhados, a nãoterem sido os esforços pessoaes de Schoulen. A posição que lão tardios havião escolhido os Portuguezes,era insustentável, e o inimigo alojou-se nos arrebal-des, á espera da manhã. Entretanto guarnição e

moradores, dando tudo por perdido, evacuarão apraça. Foi o bispo o primeiro a retirar-se, levandoseiscenlos homens. Tomou elle o único partido razoável ; debaixo do domínio do terror pânico, nadahavia que fazer, e ainda que a coragem dos Portuguezes se não desmentisse faltara totalmente quem a

dirigisse.Ao romper o dia trouxerão os Hollandezes duas

poças de campanha, fazendo-as jugar contra as portas da cidade; sobre as muralhas porem se mostrouum Portuguez com uma bandeira branca, dizendo-lhe que podião entrar seg uro s qu e estava deserta a

praça. Nem acreditar querião elles ao principio em

hespanhol os nomes hollandezes. A cidade de Zutphen (conhecida comoo logar onde Sidney foi ferido de morte), Vargas a chama Izutifel!

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HISTORIA DO BRAZIL. 155

tanta fortuna, e ao abrir-se a porta entrarão em or- i623-

dem de batalha, e com a maior c autela. O governadorcom seu filho, e alguns homens de sua casa, tentou defender o seu paço, como se esta vã ostentação de valorpessoal podesse excusar-lhe ou altenuar-lhe á inérciado anterior procedimento 1 . Os Hollandezes poremnão quizerão malal-o 2 , e assim sem combate, nem

sequer demonstração de defeza, lhes cahia nas mãosa capital do Brazil. Nem aqui parou a sua boa fortuna, e doze navios entrarão no porto antes que podesse saber-se da conquista. Forão enorm es os despo-jos. Um que n'elles teve seu quinhão, diz que os F . Giuseppe.soldados medião ouro e prata aos chapeos cheios, e cespedes.

que muitos paravão Irezentos ou quatrocentos florinsn'um lance de dados. Era que o governador a todos AWenimrgh.os moradores proh ibira sob pena de m orte tirar dacidade couza algum a de seus hav eres, julgando assimimpedil-os de abandonar a praça. Achárão-se muitasimagens de prata, entre as quaes treze de tamanho e

valor m aiores, representando a Virgem Maria e osTamaio de

d o z e a p O S t o l o S . V argas. 4 0.

1 Fr. Giuseppe de S. Teresa diz, que elle não quiz render-se emquanto não lhe promettérão a liberdade, mas que apezar d'esto Wille-kens, com brutal infidelidade, o retivera prizioneiro. Esta accusação<om a própria absurdidade se refuta.

'- Não se pode attribuir a van ostentação de valor pessoal a heróica resistência do governador Mendouça; nem tão pouco deve sertachado d'inerte o seu procedimento ulterior, achando-se, como o confessa Southey, baldo de recursos para oppòr-se á invasão hollandeza.F. P.

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156 HISTORIA DO RRAZIL.1623- Assumiu Vandort o com m and o, conforme suas ins-

Sntee°ssa trucções, e princip iou a fortificar a praça ; tinha em

Cidade' Flandres aprendido a arte da guerra e era soldado degra nd e cre di to . Deparou as fortificações antiga s, eaccrescentou-lhes outras novas, no que se empregarão dous hábeis engenheiros. Até se quiz abrir umcorte através da lingua de terra em que estava assentada a cidade, insulando-a assim, mas achou-se demasiada a distancia. Espalhárão-se proclamaçòes,offerecendo liberdade , gozo pleno de seus bens, elivre exercício de sua relig ião a todos que se submet-

lessem; attrahiu isto muitos negros, muitos indígenas e obra de duzentos christãos novos, que trabalharão por persuadir outros a seguirem-lhes o exemplo. Expostos como anda vão aos insultos d'um povo-supersticioso e beguino, e sempre.com o medo dainquisição dean te dos olhos , nad a lhes podia ser maisbem vindo do que esta mudança de senhores.

Tin hão os Portuguezes supposto ao principio queesta expediçãp hollandeza tinha por único fim osaque, não a conquista, e por isto fora talvez que tãofraca resistência havião opposto. Mas agora que seacharão nos malagaes sem casa nem ab rig o , e comm ulh ere s e filhos á roda de si, salteou-os a vergonha;

e quando virão que o inimigo em logar de carregarnavios e embarcar com o roubo, andava fortificandoos m uro s e preparando-se para assenlar-se comosenhor nó Brazil, renascerão-lhes os brios nacionaes

Itefazem-seos

Portuguezes

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 157

e principiarão a ver como recuperar a honra própria 16'2"e a do seu paiz. Beunirão-se o bispo e os principaesfunccionarios civis e militares no Espirito Saneio,uma das aldeias de índios no Beconcavo, onde tinhã oos Jesuítas uma residência; e considerando Mendouçamorto para todos os fins do estado, abrirão as viasde suecessão, que havião tido a precaução de levarna fuga. Era Mathias de Albuquerque, então governador de Pernambuco, a pessoa n'ellas nomeada.Mandou-se-lhe recado da sua nomeação, e passou-sea eleger quem commandasse até que elle chegasse.Antão de Mesquita de Oliveira, o ouvidor gera l, foio primeiro escolhido; a sua avançada edade lhe nãodeixava forças para tamanho cargo. Nomeárão-seentão os dous coronéis1 Lourenço Cavalcante d'Albu.-querque e João de Barros Cardozo; dous chefes nãofazião liga . Posta pois de parte esta eleição, não ta rdou a conferir-se o commando ao bispo D. Marcos Cb?Ioes'm . . l

R. Pitta.

leixeira. 4, g3s.Não passou este prelado ex abrupto do seu caracter 0 bispo

episcopal para o militar. Vestiu primeiro o habito .mamS"de penitente, fez preces publicas, e depois tomouarmas, trazendo uma roupeta por sobre o arnez euma cruz ao peito; para mais distineção usava de

chapeo verde, talvez porque era esta en tre os Portu-

1 Nessa epocha não se conhecia na Hespanha e Portugal a patente decoronel, empregando-se em seu lugar a de mestre de campo. F. P.

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158 HISTORIA DO RRAZIL.

1625. gUeZes a còr da esperança1 , e por estandarte alçouo crucifixo. A sua primeira medida foi prohibir acultura do assucar e do tabaco, cm que os Hollan-nezes começarão a traficar, ainda anles de finda aprimeira semana. Compunha-se a sua força de mil equatrocentos Portuguezes e duzentos e cincoentaíndios 2 . Foi postar-se sobre o Rio Vermelho acercad 'uma legoa da cidade, fortificando o seu campo coma artilharia d'um navio que havia escapado, niel-tehdo-sepor um rio do Recôncavo. 0 seu povo ganharaan im o, e forão a seu favor os prim eiros recontros.Vandort sahiu com uma partida a reconhecer terrenoe cahiu n 'u m a cilada : um chuveiro de seitas lhematou o cavallo, ferindo a elle p ró pr io , e depois oacabou'Francisco de Padilha. Activo e valoroso emextremo, não era este um inimigo generoso : deixouque os índios mutilassem o cadáver do capitão hollandez, e como prova do seu feito levou, sem nariznem orelh as, a cabeça ao bisp o! Fora Vandort trintaannos soldado, e os próprios Portuguezes lhe gaba-vão o honroso proceder e rigorosa disciplina quemantinha. Melhor fortuna não teve Allert Schoutens,que succedendo no commando nf.o tardou a ser

1 Sempre foi distinctivo dos bispos o chapeo preto com borlasverdes. F. P.

2 Cespedes diz, obra de 1,200 ao todo, mas a estatisca supraacha-se na Jornada Bahia, e funda-se na auctoridade dos despachosdo próprio bispo. Tamaio de Vargas diz 400 Portuguezes.

a

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 159

morto por uma bala de mosquete. O irmão Willem, ,C23*a quem se devolveu o mando, era muito inferior ásua posição, e cada dia ia crescendo a fama das armasportuguezas e diminuindo a das hollandezas. Comcaracterística barbaridade' se fazião de parte a parleas hostilidades. Dos Portuguezes se disse qu e matarãoum official, que mandavão para Pernambuco, porque tendo chiguas nos pés, não podia marchar tãodepressa como querião os conductores, e os Hollan- Jornadadezes em represálias fizerão sahir os seus prizionei- c-23-ros, e am arrados uns aos Outros, os arcab uzárão . 0bispo não desprezava meio espiritual ou temporalque podesse estimular o animo do seu povo, e emvirtude do seu cargo de commandante em chefe armou cavalleiros Padilha e outros tres officiaes que sehavião assignalado.

Comtudo apezar d'estes revezes que lhes deverião jornada deHsvn

ter resfriado a confiança, tinhão-se os Hollandezes a contra

Angola.

si próprios por tão fortes, por tão fracos os Brazileiros e a Hespanha tanto por baixo, que Willekens sefez de vela para a Hollanda com onze navios carregados de despojos, deixando os outros a Heyn, quepoucos dias depois partiu em infructifera expedição

1 Aldenburgh refere alguns actos de atroz crueldade da parte dosBrazileiros; mas falia, como da couza mais natural do mundo, de tero coronel (Schoutens) entregu e um prizioneiro p ortuguez aos n eg ro s,que o fizessem em portas, e de terem este brincado com elle, comofazem os gatos com um rato!

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um

160 HISTORIA DO BRAZIL.

para Angola. Vastos erão os projectos da companhiadas índias OccidentaeS; queria assenhorear-se deLoanda, e assim d'u m golpe asseg urar o suppri-mento de negros ás suas próprias conquistas no Brazil, fechando aos Portuguezes o seu mercado costumado. Mas Loanda tinha sido soccorrida a tempo, ea vigilância do governador Fernão de Souza desbaratou todos os intentos do inimigo, baldando-lhe astraças. Mais feliz não foi Heyn n'uma investida quede volta para a Bahia, deu ao Espirito Saneio, instigado por um Flamengo, que lendo previamente alliresidido e sido condem nado á morle por certo crime,fora perdoado, e regressando á pátria, pozera-se aoserviço da Hollanda. Succedeu achar-se n'aquella

villa Salvador de Sá, filho do governador do Rio deJaneiro, de marcha para o Recôncavo com soecorros,e Heyn, perdidos mais de cento e vinte homens emdous mallogrados assaltos, abandonando a empreza,seguiu para a Bahia. Achou as armadas de Portugale Hespanha de posse da enseada, e, faltando-lhe forças com que combatel-as, velejou para a Europa.

Medidas: Grande alvoroto causarão em Madrid as novas da<lo °fovcruo -

hespanhoi. perda da Bahia. A corte, que advertida do golpenada fizera para evital-o, percebeu-lhe depois de re

cebido todas as conseqüências, inquietando-Se provavelm ente a inda mais com dizer-se que os Inglezes

Tamaio de ™o u n i r s u a s forÇas ás ho llandezas, e fazer rei doVargas. 60. rj razi[ 0 eleitor palatino. Dignas da sua superstição

Assaltocontra oEspiritoSaneto.

Jornadada Bahia.

C. 21.

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HISTORIA DO BRAZIL. 161

e da sua pujança forão as medidas adoptadas pela ,623-corte hespanhola. Mandou ordem aos governadores Bljt0 Freire

de Po rtugal que inquerissem dos crim es que havião expedes.acarretado esta visitação da vingança divina, e consequentemente os punissem. Preces, que pela suarepetição em nove dias successivos se chamavão no

venas ', se mandarão fazer por todo o re ino, rezando-se depois da missa uma ladainha e orações formuladas para esta occasião. N'um dos nove dias deviasahir uma procissão solemne do povo em todas ascidades, villas e aldeias, e dos religiosos em todos osmosteiros. Expoz-se o sacramento em todas as egrejas

de Lisboa. Esquipou-se a grande armada do Oceano,como a chamavão os Castelhanos, para restaurar acidade perdida, e quatro esquadras sahirãologo doTejo com reforços para os logares que mais em p erigo 1624se reputarão. Foi n'uma D. Francisco de Moura .atomar o commando na Bahia2, outra singrou para

Pernam buco, outra para o Rio de Jane iro, e a quartapara Angola.

Bem conheciáo os Portuguezes o valor das suascolônias; a cidade de Lisboa deu cem mil coroaspara despezas do governo na restauração de S. Salvador ; o duque de Bragança contribuiu espontânea-

1 Rogamos encarecidamente aos lectores que não se esqueçam queo auctor é protestante, e que por isso não p erd e occasião ^ach inca lhar a nossa sancta crença. F. P.

- Com o simple titulo de capitão-mór do Recôncavo. F. P.

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162 HISTORIA DO BRAZIL.1624

mente com vinte mil, o de Caminha com dezaseismil e quinhentas. Os nobres vendo, que pela primeira vez se mostrava zelosa do bem de Portugal acorte de Madrid, e lisongeados por ter-lhes el-reiescripto de seu próprio punho, requerendo-lhes seusserviços, offerecérão com promptidão sem exemplo

as pessoas e a fazenda. Em verdade Philippe se dirigira a elles por um modo que lhes açulava todo oorgulho do patriotismo. Não duvido, dizia elle, quetaes vassallos em tal occasião por me servirem sesacrifiquem, e que mais necessidade haverá decon-tel-os que não embarquem, do que de incital-os a

fazerem-no. Pois, por minha fé, tanto os amo e estimo que me alegrara de arriscar na jornada minhaprópria pessoa, provando-lhes o meu desejo não sode conservar essa coroa, mas de augmental-a e en-grandecel-a, como taes vassallos merecem. Animadoscom taes exhortações, embarcarão como voluntários

homens que tinhão exercido os mais altos cargos,entre outros Affonso de Noronha, que ja fora viso-rei da índia. Não houve família nobre em Portugalque para este armamento não desse um de seusfilhos, decidindo a sorte muitas vezes entre irmãosqual d'elles havia de ser o aventureiro, mui ambi

ciosos todos, para que de molu próprio renunciassealgum os seus direitos a ser da partida.

Reinava em Lisboa a maior azafama : dia e nouteJornada

da^ia. s e trabalhava nos aprestos, revezando-se a gente.

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 1 6 5

Concedeu-se um jubileo a quantos embarcassemn'esta importanlejornada contra um inimigo herege,e para corroborar-lhes o zelo catholico, derão-se-lhesbandeiras, cm uma das quaes se via a representaçãoda milagrosa Conceição, e cm outra a imagem desancta Thereza. A D. Manoel de Menezes se deu ocommando da força portugueza, composta de 4,000

homens em 26 navios1, que devião fazer juncçãocom os Hespanhoes em Cabo Verde. Pela primeiravez tomava Olivares a peito-o interesse de ambos ospaizes, e quando um astrologo, famoso n'aquellestempos, lhe disseque receava que a lua de janeiroencontrasse a armada fora do porto, respondeu ofavorito que mais temia que ella a achesse dentro \

1 F. Bertolameu Guerreiro da-nos uma resenha das provisões quelevou este armamento : 7,500 quintaes debiscouto, 884 pipas de vinho, 1,518 dietas de água, 4,190 arrobas de carne, 5,739 de peixe,1,782 de arroz, 122 quartos de azeite, 95 pipas de vinagre. Queijos,passas, figos, legumes, amêndoas, ameixas seccas, assucar, doces, es

peciaria e sal em abundância; 22 caixões de medicamentos, 2 phy-sicos, um cirurgião quasi que por navio, 200 camas para os doentes, ecopia de meias, sapatos eca m iza s; 510 peças de artilh aria, 2, 5 04balas redondas e de cadeia, 2,710 mosquetes e arcabuzes, 209 quintaes de chumbo embalas, 1,555 piques e meios piques, 202 quintaesde mechas, 500 de pólvora e mas 500, que a armada espanhola deviatrazer de Cadiz e Sevilha. O dinheiro que se levava para os casos for-tuitos erão 20,000 cruzados em reales. Jornada da Bahia, c. 17.

Também Tamaio de Vargas faz alarde dar provisões de boca e deguerra e dos instrumentos que ião na armada. O carvão de pedrafigura na sua lista e carvão doce, que não sei o que seja, para refinara pólvora. P . 6 1 .

2 Comtudo foi Olivares depois da sua queda aceusado perante a

1624.

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164 HISTORIA DO RBAZ1L.162i- Deu elle pressa á expedição, que , apezar d'isso, se

esquipou mais vagarosa que a portugueza, tendo estade esperal-a quasi nove semanas no fatal clima deCabo Verde, com grande dispendio de vidas. Levavãoos Hespanhoes quarenta velas e oito mil soldados aocommando de D. Fadrique de Toledo. Tão poderosa

i625-

armada jamais cruzara até então a linha.Entretanto recebera Mathias de Albuquerque no-

Morte d o * x

i . i s p o ^ a p e a . i o v a g j a s u a c h . a m a c [ a ao governo em virtude das viascommando. ^ s u c c e s s ã o , e também por nomeação directa da

metrópole. Apresentar-se em pessoa no theatro daacçào não fora prudente. Não havia reunir tropas

sufficientes para expulsão dos Hollandezes, e o systema adoptado de pical-os, atacando-lhes os poslosavançados, e malando-lhes as forrageadores, produziao effeito seguro de enfraquecel-os e desanimal-os, epara este serviço uma força mais regular teria sidode menos prestimo e mais sujeita a perdas. Conten

tou-se pois A lbuqu erque com m an da r Francisco Nunes Marinho de Sá ' a tomar o commando, para quepodesse o bispo voltar toda a sua attenção ás couzasespirituaes, obstando especialmente a que o inimigodisseminasse suas doutrinas heréticas, o que os Portuguezes temião mais ainda do que a força das armas.Inquisição de crer a astrologia e consultar astrologos. Llorente, Hisl.de rinquisilion, c. 3i .

1 Chamava-se este governador da Parahyba, delegado por Mathiasd'Albuquerque para fazer as su as vezes na Bahia, Francisco Nunes Marinho d'Eça. F. P.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 165

De Madrid se recommendou mui particular vigilan- 1625-cia contra este perigo. Seis mezes estava ja o bispo da Baíua.em campo, tendo commandado durante trez ; as in- Ce|i>|Je>-acostumadas fadigas da vida militar, e de tal cargo,forão maiores do que podia elle soffrer, e pouco d epois da chegada de Francisco Nunes entregou o espirito nas mãos do Creador. Como morresse no campo,enlerrárão-no n'uma capellinhaemTapazipe, d'ondehavia expellido os Hollandezes: com nenhuma pedrase lhe marcou o jazigo n'estes tempos de confusão, equando mais tarde quizérão os Portuguezes honrar-lhe devidamente as cinzas, ja o logar estava esquecido '.

Com egual proveito foi o mesmo systema de guerra chegada. . . J ° da armada

continuado por t rancisco Nunes, e depois por D. Fran- Jus°b'^spa"

cisco de Moura, á sua chegada de Lisboa, para tomar* Se lhe tivessem achado os restos, teriâo sido boas relíquias,* pois

que aos amigos do falecido bispo não faltarão razões com que pro-pol-o candidato á sanctidade. 0 chronista real, Tamaio de Vargas, lhe

foi conferindo por própria auctoridade o titulo, e as honras de milagroso. Diz elle : Amábale cada uno como á padre y venerábalecomo á santo, no oyendoolro nombre de Ia aclamacion de todos;porque verdaderamentc d zelo en Ia defensa de Ia religion, Iacaridad con su pucblo, ei exemplo en todos los exercidos de v ir-lud, le califcaban en todas Ias ocasiones por tal, dando ei cielotestimonios de Io que se servia de sus acciones con los favores quehazia á aquel campo por su intercesion; porque faltando algu-

nas vezes por Ia noche Ia pólvora 6 los viantenimientos, â Ia manam todo se cumplia, con tanta copia que alribuian los soldadosa diligencia mas que humana esta prov ision, llamando guerramilagrosa a Ia que asislian, y reverenciando en qualquiera accionmas a su prelado, como causa destas maravillas. FP. 4 6.

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166 HISTORIA DO RRAZIL.1625- o commando. A L28 de março de 1625 apparecérâoá

vista da enseada as armadas combinadas de Portugale Hespanha. Animados e enlhusiasmados a este aspecto, entenderão os Brazileiros qu e tão grand e terrordevia elle incutir nos Hollandezes como lhes inspirava coragem a eiles, e que ren do para si toda agloria da cidade restaurada, inveslirão-na precipitados, e forão repellidos mui cortados. Adeanlou-semais cautelosa a armada; D. Fadrique sabia que poderosos reforços se havião levantado na Hollanda, ereceava não tivessem chegado antes delle. Averiguado que lal se não dera, entrou na enseada comrufos de tambores e toques de clarins, bandeirasdespregadas e pavezados os navios promplos para aacção. Também os navios, muros c fortes hollandezes deixavão esvoaçar todas as suas flammulas e bande ira s, içadas qu er em ho nra de amigos quer emdesafio a inimigos, como quer que viessem estesrecemchegados. Com grande cuidado linha sido fortificada a cidade segundo os melhores princípios daengenhar ia , sciencia em que nenhum povo tinha aexperiência dos Hollandezes; noventa e duas peçasde artilharia a defendião, e o Forte Novo atirava combalas irtcendidas.No porto havia dez navios de guerrae dezoito mercantes . Vendo a força da p raça e sabendoque não podia tardar a frota da Hollanda, convocouD. Fadrique um concelho de guerra em que propozdesembarca» tres mil homens, c deixar o grosso da

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HISTORIA DO BRAZIL. 167

força a bordo para interceptar ao inimigo os soe- 1625-

corros. Objectou-se que com tão pouca gente apenasse poderia formar um acampamento, sendo assimimpossível cançar o inimigo conservando-o alerta emdifferentes pontos. A conclusão foi que desembarcaria metade do exercito, e que a armada se prolongaria de Tapagipe até Saneto Antônio, bloqueando

assim os navios no porto, o cortando todos os suppri-mentos ao mesmo tempo. Sem opposição se effectuou si d e março.o desembarque, pois que a guarnição, composta dedous a Ires mil homens de todas as nações, alem degrande numero de negros (a maior parte provenientesdos navios de Angola, que havião sido aprezados), Ce

6s)pfJes

eslava dividida, nem tinha um chefe hábil. G- r ? 1 U 6 Í í > p e *Um lanço das fortificações ficara imperfeito, em Fazem os

parte por que Willem Schoutens se fiava na profun- " i ™sortida feliz.

didade do fosso, e mais ainda, por que com demasiada confiança contava com a actividade do seu pró

prio governo e prostração da Hespanha. Costumavadizer que o mais que tinhão de fazer, era domar osnaluraes, sendo impossível que a armada hespanholachegasse primeiro que a hollandeza; e ao ver entradana enseada uma frota, affirmava ser a sua, até quetão manifesta foi a verdade, que elle não mais pôde

illudir-se a si próprio com suas obstinadas presup-posições. Desde logo se tractou de fortificar aquelleponto. Não passou desapercebida esta fraqueza, nemfaltou quem aconselhasse ao general sitiante que por

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168 HISTORIA DO RRAZIL.1625 alli salteasse a cid ad e: foi elle ao principio da mesma

opinião, mas reflectindo que em taes tentativas sempre a perda recahe sobre a flor do exercito, e que oinimigo, conscio do seu ponto vulnerável, o eslavafortificando, achando-se apercebido para a defeza,optou por approxes mais lentos e seguros. Mas asiropas continhã o o inim igo em menos respeito doque fazia o seu commandante ; andava em confusãoo cam po e pouco ou nada se velava. Perceberão-noos sitiados, e uma manhã sahiu Hans Ernest Kijfcom dous troços de trezentos homens cada um, sor-preh endeu o ar ra ia l, e foi fazendo grande matança,até que julgou prudente retirar-se. Entre os mortoscontou-se o mestre de campo D. Pedro Osório.

M o t i m Tendo aprendido a appreciar os recursos e adidas tropas . .hoiiamiezas. vidade dos Hollandezes, aprestara o governo hespa-

nhol esto arm am en to em escala conveniente. Assegurara-se porem ao commandante, que acharia

dinheiro na Bahia e em Pernambuco, e em ambosos logares nada de novo, alem de que na natureza dopaiz e falta de meios de transporte lhe surgião diffi-culdades desconhecidas nas gu err as europeus. Re-missa não fora a com pan hia hollandeza em apromptarsoecorros para a praça ; apenas sabida a sua tomada

apercebera com grande presteza duas poderosasesquadras, o se uma serie de furacões violentos eponteiros as não houvesse detido nos portos da Hollanda, bem podia tel-as D. Fadrique ja achado á sua

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 169

chegada na Bahia. Felizmente para elle estava com- 1625-pletamente relaxada a disciplina da guarnição, e oconynandanle hollandez muito abaixo do importantecargo que occupava. Um inimigo mais hábil muitoteria molestado os sitiantes, que nas suas operações Tamaio de

tudo tinhão de acarretar á mão e força de braçossomente, mas depois da primeira sortida o únicoesforço que fez Willem Schoutens foi tentar incendiara armada do bloqueio, lançando-lhe de noute dousbrulotes. Ao primeiro movimento dos dous navios,os barcos de vigia hespanhoesdesconhecendo-lhes aintenção, derão rebate que o inimigo buscava evadir-se por m ar , e n'esta crença toda a armada poz-se aopanno para perseguil-o; a não ter sido isto, talveztivessem os Hollandezes colhido algum resultado doseu estratagema. Um dos brulotes foi cahir entredous dos maiores navios, mas ja não a tempo decausar-lhes dam no; o outro atracou a alm iran ta, chegando a derreter-lhe d'um bordo o alcatrão, mas os A^ndano. 4° ' Tamaio de

Hespanhoes depressa evitarão o perigo, e fazendo Vargas' 1U

larg ar um bole impedirão a fuga aos hom ens do bru -lote. Alguns morrerão queimados, e um, que se lançara ao mar, foi apanhado para lhe amarrarem umpezo aos pés e tornarem a aliral-o á água!

Conscio do grande perigo a que escapara, resolveuD. Fadri(|ue destruir sem mais detença os naviosdos Hollandezes. Para fugir a isto leváráo-nos estespara perto dos fortes, mas desguarnecerão-se assim

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170 H I ST O R I A DO B R A Z I L .

1025- do lado da praia : abriu-se na rocha um caminho poronde descer a artilharia, e com ella se melteu apique a maior parte das embarcações 1. #

Entretanto tornava-se descontente a guarnição,clam ando con tra o desm ando do chefe, que esquecidode todos os seus deveres entregava-se a devassidòesde toda a espécie2, até que a final, levantando-se, oprende u, pondo Kijff em seu lo ga r. So serviu estemotim de tornar mais violento o espirito faccioso dasoldadesca. Schoulens dispunha ainda d'um partido

1 Dous notáveis exemplos derão de seus sentimentos religiosos ossitiante s. Um soldado m ulato atirou-se ao meio do inimigo, e comrisco imminente troux e um corp oral (segundo pareceu a seus cama

radas), que prezo a uma lança, tinha em zombaria sido arvorado comopendão. 0 outro caso foi mais curioso : tendo um Hollandez mantido,que os chamados irmãos do Salvador erão filhos de José e Maria, nãodescançou Francisco de Melo de Castro em quanto não obteve licençade o reptar por esta opinião, não so blasphcma e herética, mas também offensivã da Virgem. Recusou o Hollandez a requesta, por conveniências justificadas (era mui provavelmente algum capellão), quedando bastantemenle acreditada Ia piedad con ei deseo, como vic-

loriosa Ia causa por sujusticia. Tamaio de Vargas, 122.Tinhão ido n'esta jornada capellães tanto francezes como inglezes,

que pregavâo todos os domingos. Aldenburgh, § 1 7 7 . Tiverão a impru,dencia de pregar ao alcance de tiro de peça dos sitiantes, que de certoentenderão que seria uma acção extremamente meritoria matar estesherezes no próprio acto de suas damnadas devoções. Um domingo poisprincipiarão a fazer fogo sobre a egreja du ran te o serviço divino, ecomo uma bala levasse as pernas a trez da congregação, deu-se o Pastor

por avizado, para buscar lugar mais seguro. Aldenburgh, 201.2 .1. de Laet diz na sua linguagem clara e sem rode ios, que emlogar de olhar pela defeza da cidade hy gingh liever inde hoeren-huy-sen, ende blcef op A' Hof sitteu swelghende ende suypende. \rer-

liael van W. Indien, 5 1 .

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1 7 - H I S T O R I A DO B R A Z I L .

u'-" Sancta Thereza da torro da calhodral, segundo asordens expressas do próprio rei. Desembarcou um

batei cheio de sanclos, trazidos provavelmente entreos outros maleriaes para supprir o logar dos que

terião sido derrelidos ou mutilados pelos Hollandezes,e os religiosos celebrarão a extraordinária ccremoniade açoutar os púlpitos profanados pelos capellàesheréticos! Também desenterrarão os hereges, que

havião sido sepultados dentro do recineto da cidade,levando-os para terreno não sagrado fora dos muros.Mostrou-se cmnludo algum respeito á memória deVandort, como para allenuar a maneira vergonhosaporque depois de iirorto fora mutilado. Deixarão queo corpo repouzasse no seu túmulo, nem do monumento lhe lirárão o escudo, a espada, as esporas <•o pendão carmezim, em quanto a "uarimào bollan-

' . "

S232- deza se demorou na Bahia.Menos havia solfiido a cidade na sua tomada do

guerra religiosa. Ucvela-se otc sentimento no mote feliz que po/ ao

seu livro, e que não pouco prazer devia dar-lhe ao ailul-u :

Justinusl\ T. Pompeii Ilistor. lib. XIX

\h 1'IHLIPPO, cujus Hostes,

insignibus Dei canspeelis, conseienliii deliclorinn lerrili, abjecti*

armis fugam cupessitnl; pmnasque violalxrcligimtis sanguivc et c;r-dibus suis peniltint. ÍNCMMI:IU. (JI.VMÍH IA m^ AILIMIMNK.S HATH>M>

I'IIILIPI'0 GLiiiii» DEKI i : illum vindicem mcrilrtjii; illum ultorem

rclitjiotium, iptad orbis viribusexpiari ilebuit, solum, qui píneula

cxigeret, exsúlhse úigmtm.

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HISTORIA DO BRAZIL. * 173

que agora na sua re stau ração . Os Hollandezes vinhão 1625

a conquistar o paiz para o conservarem, e por issotinhão procurado conciliar os naturaes, nem, sancti-ficada pela sua causa, havia a longa guerra sustentada na pátria desmoralizado a nação. Mas os Hespa-nhoes e Italianos do exercito de D. Fadrique tinhãosido criados en tre todos os excessos da vida m ili ta r;os Portuguezes não forão remissos em adquirir osvicios de seus camaradas, e assim não houve logarpublico nem particular que ficasse immune de suas

\ lireeeyra.

violências. A perda dos sitiantes fora de cento e vinte k-*> P-5?i lamaio de

e quatro mortos e cento e quarenta e quatro feridos, a"^;

Alguma difficuldade havia em cumprir as condi- Dimcuidade~ T ? * J 1 1 1 1 de mandar os

çoes. fora tempo em que um general hespanhol Hollandezesne nh um a intenção teria de dar-lhes execução, mas Europa.ja a Hespanha não tinh a nas suas forças essa confiança, que promettia impunidade a qualquer quebra

de tractado; a nação, posto que negando sempre aculpa de Alva, tinha consciência da infâmia que ellaacarretara sobre o paiz, e o seu antigo caracter honrado renascia. D. Fadrique tinha a peito regastar emtoda a plen itude a sua palav ra, nem estava menosancioso de descartar-se dos Hollandezes do que estes

de se sentirem em liberdade. Escasseavão os viveres;o paiz á volta da Bahia tinha sido theatro da guerra,e por conseguinte apezar da sua fertilidade naturalnem para a armada dos vencedores offerecia viclua-

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1 6 2 5 .

17 4 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

Sem perda de tempo mandou o general ás outrascapitanias por todos os gêneros que cilas podião fornecer : a Pern am bu co por farinha de trigo, biscouto,vinho e azeite; a Boipeba, Ilheos e outras parles aos u l , por farinha de mandioca. Imme lialamente seconheceu o que bem se podia ter previsto, a saberque a mãe pátria não mandava para o Brazil maisfarinha de trigo, vinho e azeite do que o necessáriopara consumo dos moradores mais abastados, e quenão havia onde achar sobresalentes. Era velha e avariada a farinha de trigo que obliverào, e ainda quehouvessem querido fazer biscoutos, nem padeimshavia, nem fornos. Tiverão pois de conlentar-se mmfarinha de pa u, e ainda bem , que d'ella poderãohaver quasi dezenove mil alqueires, quantidade comque apenas se podia viver a meia ração. Bepanirão-senavios velhos, c apressou-se a construcção de novos.Tanto tardava o esperado armamento da Hollanda,que ja sobre sua demora corrião vários boatos outomara outro rumo, ou tormenlas o havião dispersado. Vierão comtudo novas de ter elle passado asCanárias a .» de ab ril, e pouco depois um navio portuguez que tinha sido tomado pela frota bollandezae depois retomado, noticiou a sua próxima chegada.lmmediatamente se embarcarão os dous mil prizitneiros em navios desmantelados, fundeados debaixda art ilharia da fortaleza. Mais difficil era paigeneral dispor da sua própria força; muitas embar

i-

o

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H ISTOR IA DO BR AZ IL. 175

cações estavão enca lhada s, ou tras sem aguada nem 16&

victualhas, mas apromplárão-se quantos se poderãoesquipar, e resolveu-se aguardar no porto o ini- Cespedes.

migo.6, 13.

A 22 de maio appareceu á vista uma armada hol- chesa »ma

1 l armada

landeza de trinla e quatro velas, commandada por hollam,ezn

Boudewiin Hendrickszoon, e entrou á enseada, sup-pondo S. Salvador ainda em poder de seus compatriotas. 0 aspecto das bandeiras catholicas depressadesenganou Hendrickszoon, que com a sorpreza queisto lhe causou deixou escapar o ensejo de obter assi-gnalada victoria, sendo tudo confusão entre Hespa-

nhoes e Po rtuguezes. Heyn lhes teria ann iqu ilado aarmada, que com a anciã de desafiar o inimigo,corria a dar nos baixios. Mas a força do almirantenão era para retomar a cidade; tinha a bordo muitosdoentes, e por mais avizado houve demandar umporto, em que elles podessem restabelecer-se, do que

com risco de mutilar na acção a própria frota, causarao inimigo um damno de que nenhum proveito tiraria. Fez-se pois na volta do norte, e impcllido pelofuracão passou O linda, onde o povo, contando ja comser accommettido, se ape rcebia pa ra a defeza. Levou-o o vendaval até á Bahia da Tra ição , onde deu

fundo; alli estavão os Petiguares4dispostos a ligar-se1 Brito Freire (§ 286) falia como bom homem do rigor com que

estes naturaes forão punidos, por haverem recebido bem os Hollandezes. « Ja que deixamos de recompensal-os, diz-ellc, quando antiga-

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§ 5 1 7 , aI S

17t i H I S T O R I A D O B R A Z I L .

I625- com quem lhes apparecesse como libertador, c oHollandez desembarcou os seus doenles, fortificando-se o melhor que pôde. Achava-se então no BeriloFrancisco Coelho de Carvalho, primeiro governadordo Maranhão e Pará, depois d* separadas estas dasou tras cap itan ias e arvoradas em Estad o. Alli acabava de che gar, cam inh o do seu novo governo,quando veio a nova da tomada d e S . Salvador, sabidaa qual, lhe pedirão que ficasse onde eslava, para defeza de províncias mais em perigo do que as d'elle.

uerredo. Apenas este capitão ouviu que Hendrickszoon desembarcara a sua gente, reuniu tropas de Pernambuco eParahyba, com que ir desalojal-o. Não fallavào aocommandante hollandez forças com que resistir, calguns de seus officiaes julgavão tão favorável a posição para os fins da Companhia, que cumpria man-lel-a e fundar alli um estabelecimento. Movia-ostambém um honroso sentimento de humanidade, deque poucos exemplos offerece a historia do seu século. Allegárão a crueldade que haveria em abandonar os Petiuuares, que se tinhão mostrado amigosfieis, ao seguro e severo castigo que os Portuguezeslhes não po up arião . Mas a esl.i consideração nenhumpe/o se deu; resolveu-se deixai-os que olhassem porsi como podessem, por quanto crescia ç num ero dosdoentes, e Hendrickszoon, vendo-se assim diariam ente

mente nos servirão, também devêramos agora moderar-lhes o r.iv-l i i i o . n

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 177

enfraquecido, e receando que a arm ada hespanho la )0'23

o perseguisse, reemb arcou e deu á vela, ficando-lhecheio de sepulturas o acampamento.

Se não houvesse partid o, ja D. F ad rique estavapreparado para bloqueal-o com a sua frota da Bahia,desembarcando 800 homens para cooperarem comuma força pernambucana de 1,000 Portuguezes e

1,500 índios . Os Petiguares padecerão, como se havia previsto. A tarefa de punil-os pelo qu e se cham ouquebra de fé ao seu rei, foi confiada aos Tobajares,sob o commando d'algun s Portuguezes que ne nh um arepugnância sentirão a este deshumano officio emque os emprega vão.

A má fortuna da expedição hollandeza porem apenas principia ra no Brazil. Metade da arm ada investiuPorto Ri o, d'onde foi rechaçada com grande perda;a outra metade, tentando sorprehender S. Jorge daMina, foiegualmenterepellida. Hendrickszoon morreu do contagio, e os sobreviventes, cançados de pi- G Giuseppc.ratear , e desanimados, amotinárão-se a final, obri- c.esPedk

gando os ofliciaes a voltar á Hollanda. BarWs.

Suscitou-se questão sobre a força q u e deveria

deixar-se para guarda da cidade. D . Juan Faxardo

aconselhava 1 ,2 0 0 homens pelo menos, e compostos

das tres nações, Portugu ezes, H espanho es e I ta l ianos ,invocando o principio q u e cada u m sent i r ia maior

es t imulo de ser o pr imei ro a cumpri r seus deveres .

O marquez de Cropani era de opinião, qu e o n u m e r o

n. 12

1'. l f i .

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178 HISTORIA DO BRAZIL.1625« fosse de 2,000, não se deixando Italiano n e n h u m . O

com m andante resolveu deixar so m il, e esses todosPortuguezes, não podendo, entendia elle, o paiz,exhausto como estava, sustentar mais, e se se misturassem as tres nações, ou mesmo duas que fossem,mais facilmente produzirião os sentimentos de nacionalidade, animosidade e rixas, do que emulaçãoútil . O saque que se havia retom ado ao inim igo, e deque não era possível dispor com vantagem, foi dividido pela tropa segundo o posto de cada um, primeira distribuição d'este gênero feita a um exercitohespanhol. Também os índios tiverão seu quinhão.Com e^ual generosidade se houve o general com aguarnição hollandeza, cujas bagagens não registrouao embarque, tendo-lhe mostrado sempre humanidade e cortezia, com que ella não conlava, e que comgratidão reconheceu depois derestituidaa seus lares .

ncs.iu Egualmente fatal ás duas partes foi esta jornadada armada , ,

ponugueza. da Bahia. D. Fa dr iqu e deixou o novo gov ernado r,D. Francisco de Moura Bolim, com guarnição suffi-ciente na cidade, e fez-se de vela para a Europa , levando as tropas hollandezas. Do marquez de Ibino-josa tinha recebido avizo de que se propunhào os

1 Fizera elle uma occasião saliir a sua gente, para passar-lhe re

vista n'iuna formosa manhã, quando, como não é raro na líahia, efreqüentíssimo no Maranhão, no decurso de uma hora se cobriu lodoo ceo , principiando a chover a cântaros. Eu ei liraiil hasta los ciclo-micnlen, exclamou o general, dizendo do clima o que pensava dopovo. Yieyra, Senti., t. i , p. '2ítj.

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HISTORIA DO BRAZIL. 179

Inglezes accommettel-o em viagem, e em virtuded'csta mal fundada denuncia, singrou para leste emlatitude 35°, pensando evitar inimigos com quemnão estava em estado de bater-se. Foi-lhe o resultadomais desastroso ainda, do que se houvera cabido emcheio no meio d'elles. Tempestades dispersarão aarmada; tres navios hespanhoes e nove portuguezesforão a pique, escapando apenas uma pessoa, umfrade Trinilario, apanhado depois de ter boiado dousdias agarrado a uma prancha. A almirante aferroua ilha de S. Jorge, alagando-se, apenas a deixou atripolaçào, que das fadigas do m ar e falta de a lim en totanto havia soffrido que bem poucos se restabelecerão. Outros dous navios da armada forão capturadospor uma esquadra hollandeza. 0 Almirante deQuatro Villas com D. Juan de Orellana a bordo teveainda mais desgraçada sorte. De conserva com outrodera este galeão combate a uma rica nau hollandezaque vinha da costa da África e capturou-a; a prezaincendiou-se 1, e o Almirante ardeu com ella, pere-

1 Tamaio de Vargas diz, « era costume desesperado d'estes h e -reges, antes do que cahirem nas mãos dos catholicos, porem termo asuas vidas por meio do fogo, dando assim principio ao seu eterno castigo no mesmo elemento. Sepultão até certo ponto a razão e o sentimento em copia de vinho e de pólvora, e mettendo-se no porão, man

dão algum moço ig nora nte chegar fogo aos ba rri s, e Ia. vão voandopara o inferno , a soffrer o castigo devido a seus er ro s. » P. 1 6 2 . Quehumana linguagem esta do chronista real! Mas é caracleristica do seuséculo, paiz e religião.

Acredita-se geralmente que aguardente e pólvora torna a carne

\0-í\

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ISO HISTORIA DO BRAZIL

1 Ü25 cendo a maior par le da t r ipolação. Menezes , que

sahira do Tejo com v inte e seis na vio s, voltou com o

único em que i a . O rei de l l e s p a n h a , r econhecendo

o ze lo com que o havião servido Por tuguezes nVsta

j o r n a d a , concedeu a todos os fidalgos por mais uma

vida as pensões e logares que t inhão de sua coroa, o

que , como requer ia a jus t iça , não se extendeu m e

ramente aos que vol tarão , mas a quantos t inhão em

barcado . 0 h i s to r i ador hespanho l , Ccspedes , observa

q u e esla doaçlo excedeu cm generos idade quan tas

jamais hav ião fei to os an te r io re s reis de P or t uga l .

Eiveeyra admitte a grandeza e liberalidade das con

cessões, mas accrescenla que e r a ' com o s e P h i l i ppe

anlevisse ja a próxima emanc ipação de Por tuga l e

qui/.osse ser tão generoso á custa alheia.

ifeitosd.s Tinhão-se os pr iz ionei ros hol landezes apar tado da

.a "ifoíiando. armada a inda a tempo de escaparem aos desas t res .

Na Hollanda imputárão-lhes maisá própria relaxação

e desobediência do que á super ior idade dos l l espa-

nhoes a perda da c idade 1 , pelo que todos os olha vão

morta. Sei isto d'um dos Teslimunhos Vivas de William Muntington,(|ue tinha sido desertor, e tomara esta receita antes de receber as chi-baladas.

1 . 1 . de Liei aftirma que elles tinhão na cidade provisões para tresou quatro mezes, e Avendano na resenha que faz do material apn-

hendido, refere 6,000 fanegas de farinha de trigo, e '2,000 pipas devinho, quantidade incrível. Mas Aldenburgh, cujo diário mostra sermuito fiel, diz que o mantimento era escaso e que se comião cavallos,cães e gatos. Era uma grande impievidencia matar os gatos, porquanto, acere-centa elle, tornárão-se tão numerosos ratos e ratazanis,

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HISTORIA DO BBAZIL. 181• , i i i • 1 6 2 5 -

como homens que tinhão deshonrado o seu paiz, emerecião o desprezo dos inimigos. Mas a restauraçãod e S . Salvador, e mais ainda a mal aventurada expedição de Hendrickszoon desanim ara os Hollandezes;reviverão com nova força os argumentos que se havião feito valer contra o estabelecimento da Compa

nhia das índias Occidentaes, e até aquelles que favo-recião os projectos ambiciosos d'ella, confessarão quequanto mais longe da pátria se empregavão os soldados, menor era o respeito á aue toridade, e maisdifficil refreal-os. Mas o príncipe de Orange, perli-naz nas suas idéias, oppoz-se ao partido da paz, e

como a guerra contra uma poderosa potência marítima é uma loteria que sempre tentará aventureiros,prevaleceu a sua política. Becuperada a Bahia, re - CoDlinuão o

i i • 1 • j 1 • Hespanhoes

cahirão os Hespanhoes na sua habitual indolência, a descuidar*1 _ do Braz i l .

nem se tomarão medidas para segu rar o Brazil, por

mais lamentável que tivesse sido o modo por que semanifestara a sua falta de segurança. Bepelidas perdas por mar obrigárão-nos a final a pensar em algumremédio, e concordou-se em que o melhor seria terna America uma poderosa força naval. Besolvidoisto, era a primeira questão saber onde se construi

ria e esquiparia esta armada... na Europa, ondehavia á mão os materiaes, ou no Brazil e índias hes-que não deixavão a gente dormir na cama, atrevendo-se aos pés, mãoso cabec,i.

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18'2 H I S T O R I A DO B R A Z I L .

"'-" panholas , onde abundavão madeiras melhores?Esta questão não chegou a resolver-se, nem o ministério satisfeito com ler ventilado o negocio, atirou aoestado em que a achou, deixando que seguissem as

Bri to Fre ir e .

§3oi. couzas seu caminho.oliveira Xinguem molestou Francisco de Moura no seu

^nvernador .governo, até que no anno seguinte foi rendido por

"'"27 Diogo Luiz de Oliveira. Tinha esle novo governadorservido muitos annos nos Paizes Baixos, e oecupadocargos importantes, no que tudo havia adquiridogrande reputação e muita experiência como soldadoe como estadista. Mas devia agora haver-se com uminimigo marítimo, contra cujo desesperado espiritode empreza, não havia talento militar que valesse.Outra vez entrou Heyn na enseada da Bahia com oitonavios grandes e quatro hiales. Já se sabia que elleandava na costa, c com receio d'esta visita tinhão-sccollocado debaixo da artilharia da fortaleza dezaseisnavios que estavão no porto, e guarnecido de Iropaquatro dos maiores que, postos do lado de fora comobaterias, protegessem os outros. Oliveira ainda nãojulg ou isto sufficiente, e assestou qua ren ta e duaspezas grandes debateria em differenles ponlos parabater o inimigo, se commellessc a tentativa. O vento

JílT,!'na e r i l t e , T a l 1 I Ievn vei , ,> guinando contra elle, mettero seu navio enlre as duas maiores baterias flucluan-tesdos Portuguezes, postando-sede maneira quees-les nem dos fortes nem da praia lhe podia fazer

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H I ST O R I A DO B R A Z I L . 183

fogo1, sem ferirem os seus próprios conterrâneos. 1627-Dous únicos navios da sua frola o poderão seguir evir ás mãos com o inimigo. N'esta brilhante acçãorecebeu Heyn duas feridas. Dentro de meia horalinha afundido uma das baterias fluetuantes ; as outras encalharão e os doze navios mais pequenos nenhuma resistência podião oppôr. Vierão os Hollandezes em botes, picárão-lhes as amarras, e levárão-nostodos, excepto tres dos menores que estavão vazios.Não podendo porem pôr a nado o navio de Heyn, Brit0 Frejfe

que, sobre ter soffrido na acção grandes avarias, §30S'ficara em secco ao vasar a maré, ateárão-lhe fogo;outro dos seus navios voou, e em ambos perderãoelles mais de trezentos homens2. No dia seguintepassou o almirante revista ás suas prezas; as quatromaiores carregadas as mandou para a Hollanda, ou-

1 J. de Laet no Novis orbis diz que assim mesmo a fizerão, evUdentemente exagerando a maravilha d'uma acção ja assaz maravilhosa.Para prova do contrario basta ver que alguns escriptores portuguezes

arguem Oliveira por não ter mandado fazer fogo dos fortes, indesculpável como teria sido sacrificar assim a sua própria gente.

2 A auetoridade de Brito Freire acha-se confirmada por uma brevenarrativa da acção, impressa sob este titulo : Le siége de Ia Ville deGroll, au pa ys de Frise, pa r le Princc dOrange. Enscmble, Ia

Dcffaite de Ia Flotte Espagnolle dam Ia Baye de Todos los Santos,au Rrcsil, par les Hollandais, 1627. Este boletim, como se pôdechamar, dá como de 32 o numero dos navios que Hejn atacou, em

quanto Laet o eleva a 36. Brito Freire quer que fossem apenas 16, eaceusa Lael de exageração gratuita : elle próprio é digno de credito nomais subido ponto. Dos materiaes e artilharia que se encontrarão nosdous cascos que ficarão, se inferiu que era intenção dos Hollandezestomarem segunda vez a cidade.

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1027

l.U HISTORIA DO BRAZIL.

Iras qu atro reun iu-as á sua frota, o o nsio que-

mou-as.Vinte e quatro dias se deixou Heyn ficar na en

seada, voltando outra vez a ella depois d'um cruzeiropara o lado do sul, e então tenlou capturar quatronavios n u m dos rios do Recôncavo. Mais diflicil eperigosa ainda do que a primeira era esla cm preza.

Estavão as embarcações algumas milhas pelo rioacima, e nenhuma precaução se havia desprezado,tanto para as pôr seguras, como para cortar a retirada ao inimigo. 0 almirante pavezoti os seus baleisde couros crus tirados das prezas que fizera, subiu acorrente, e, se não pôde apanhar os quatro barcos,

trouxe um, e a melhor parte do carregamento detodos. NYsla acçào cahiti Padilha, o m atad or de Vandort. Depois d'esla façanha, Heyn, vendo «pie nadalhe restava que fazer, deu á vela, cnconlrmi a frotado México, e caplnrou-a toda. Ksla apprehensào, amaior que jamais se tem feito no mar, indemnizou

a Companhia das Índias Occidenlaes amplamente deIodas as perdas soffridas; viu-se ella em eslado deemprestar dinheiro ao governo, e com maior ambi-ção q ue nunca renovou os seus planos de conquista.Um dos seus capitães', que infestava a costa do Bra-

1 (àirnelisCornelisz Jol, hoineiii de grande nomeada no seu tempo. OPortuguezes escrevem-lhe i> mune .lolo, c eostuiiião chamai-o l'é d<l'au, da sua perna de madeira, liadu/indo asMin a alcunha que oHollandezes lhe da vão de HoaW-beeii.

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H I S T O R I A DO B R A Z I L / 185

zíl, apoderou-se da ilha de Fernão Noronha, forlifi- ml-

cou-a e principiou a colonizal-a; esta medida, sehouvesse sido efficazmente executada, poderia tersido fatal aos Portuguezes, elles porem ainda comtempo o perceberão, e immedialamente fez o governador sahir uma expedição de força sufficiente queaprizionou os colonos, queimou-lhes as casas, e des- .

truiu-lhes as plantações. 31°-

Com Francisco Coelho viera um reforço de missiona- , ^s0"»5.•* do .Maranhão.

rios capuchinhos debaixo da obediência de Fr .Chr is -tovão de Lisboa, que n'estas conquistas occupava ocargo de custodio da sua ordem, equivalente ao de

provincial. Em quan to o governador se demorava emOlinda, Fr. Christovão, julgando em S. Luiz maisnecessária a sua presença, para alli seguiu com osseus irmãos. Levou comsigo um decreto que privavaos colonos de seus direitos sobre os índios all iados1 ,o sq uae s, tendo de livres o nom e, tinhão de escravos

a realidade; e os colonos submelterão-se, quiçá commedo dos poderes ecclesiaslicos de quem vinha como Berredo.

519-522.

visitador e commissario da Inquisição. Feito isto,seguiu para Belém, onde tentou pôr em execução omesmo decreto. Mas alli ainda o povo estava mais

1 Remov ia todas as mercês das administrações das aldeias dos

Índios. Estas administrações devião ser equivalentes ás que os Hespanhoes chamão encomiendas. Não se davâo os índios como escravosa estes concessionários, mas davão-se os serviços d'elles : era maisuma servidão do que uma escravidão, com a differença que se faziãotrabalhar os servos como escravos.

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ISO HISTORIA DO BRAZIL.

1627. dispos to do que no Maranhão a oppòr-se ao que lhe

contrar iava os in teresses do momento , e o senado da

câmara inventou um pre texto para s u s p e n d e r o ediclo

rea l : d i r ig ia-se , d iz ião os vereadores , ao governador

do Estado, pe lo que , sem que este chegasse, nada se

podia fazer para dal-o á execução . F r . Cbristovào

teve por prudente su je i ta r -se a es ta demora , e m p r e -

hendendo e n t r e t a n t o u m a expedição missionária para

ex plo rar o r io To ca nti ns . De volta resolveu tenlar se

pelo te rro r po de ria levar os colon os a o bede cerem e

achando-se a ponto de sahir de Belém, publ icou uma

pastora l em que excommungava todos os que cont i

nuassem a conse rvar a s suas ad m in i s t r a çõe s , como

estas concessões se chamavão. A câmara renovou o

seu requer imento th ; ad iamento , obse rvando que elle

próprio reconhecera a va l idade do fundamenlo alle-

g a d o , a g u a r d a n d o c o m paciência s e l e m c z e s ; aceres-

cen t ou t a m b é m , que especificando a carta regia uni

cam en t e a s adm i n i s t r a ções de S. Luiz, não seincluião

necessa r i amente as do Grão Pará ; que a inda que

assim fosse, o sen ad o a pp ella va pa ra o rei con tra o

decreto, e que se el le custodio persis t ia na sua excom-

n i u n h ã o , também d'el la ap pe l lav a, pois qu e os co

lonos por s i mesmos havião conquistado o paiz, nem

podião conserval-o sem fazerem trabalhar para s i os

n a l u r a e s . F r . Chrislovão e ra f ranc i scano , ordem

então infensa aos Índios, por que Las Casas, que pr i

meiro se levantara como defensor d'aqnella raça op-

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HISTORIA DO BRAZIL. 187

primida, fora dominicano : talvez isto explique a 1627-facilidade com que elle cedeu, retirando a sua de-nunciação, acto que por muito tempo lhe tornoupopular a memória entre os Portuguezes do Pará.Logo depois da sua partida, requererão os Jesuítaslicença á câmara para fundarem um convento emBelém, e o procurador por parte do povo recusou-a,allegando que ja havia na cidade dous mosteiros, eque estando dado todo o terreno, faltava logar paraterceiro. A verdadeira causa da recusa foi medo dosystema que os Jesuítas seguião a favor dos indígenas;o erro politico de estabelecer instituições monasticasn'uma colônia nova não entrou em linha de conta.

Restaurada S. Salvador, e sendo ja excusados os commetti-T, mentos dos

seus serviços n aquellas paragens, passou t rancisco Hoiiandezss.Coelho a tomar posse do seu novo governo; acompanhou-o a S. Luiz o novo capitão-mór do Grão Pará,Manoel de Souza d'Eça. Exemptas do seu quinhão no

perigo geral não tinhão ficado estas províncias donorte. Duas vezes havião os Hollandezes acommeltidoo forte do Ceará, e ambas Marlim Soares os repelliracom grande perda. De novo entrou no Curupá umapartida de duzentos Hollandezes; Teixeira os desbaratou, perseguiu-os até ao rio de Philippe, destruiu

alli duas feilorias fortificadas, e, não deixando pedrasobre pedra, arrazou terceira, a que os fugitivos sehavião acolhido. Entretanto fizera-se Maciel mereci-damente impopular com o seu gênio tyrannico; mas

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IKK H I S T O R I A D O R R A Z I L .

t o d a s a s v e ze s q u e o p o v o s e d i s p u n h a a l e v a n t a r - s e

em tumulto declarado tinha elle arte de dar-lhe ásidéias differenle direcção, armando sempre algumaexpedição nova contra os míseros índios que elle iaexterminando com desapiedada e ineançavcl barbar idade. Succedeti que reunida n'u m a de suas grandeslestas de embriaguez unia partida de Tupinambás,rolando a conversa sobre valcntias, e de quão facilmente darião cabo dos Portuguezes, se qui/.essem,apontarão alguns com bazofia o meio por que isto seconsiguiria. Não passava isto do tagarelar de ebrios,vã bravata do que poderia fazer-se, não ' revelaçãoinvoluntária do que se meditava; mas bastou paraque o feroz Maciel, lançando a mão a vinte e quatrocaciques, 11'esse mesmo dia os fizesse literalmentedespedaçar por alguns de seus inveterados inimigos,os Tapuyas. Bárbaro como era o povo de Belém, estaatrocidade o encheu de h o rr o r; e se não fosse o esperar-se todos os dias o novo governador, nem lodo otalento e ousadia d'estc desalmado o lerião preservadomuito tempo dos justos effeilos da indignação popular .

dl.,,.-,*>-,.. Ja Manoel de Souza tinha serv ido com distineção< ' J U ' i T i i l ; t p r l o - J

1 '-""'"' n'estas conquistas, pelo que foi alli recebido com

universal alegria. Também elle, como todos os seuspredecessores, era de opinião que não podia a colôniasubsistir sem escravos; porem menos sanguinárioque Maciel, preferia ás da violência aberta as vias do

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HISTORIA DO BRAZIL. 189

trafico. Offerecia este systema melhor pé de defeza in-n.

aos amigos da escravidão em Po rtuga l, mas em ve rdade era ainda mais perverso e detestável, junetandoa traição ao crim e de injusta guer ra . Foi Teixeira oescolhido para estas expedições commerciaes, acompanhado do capuchinho Fr. Christovão de S.José.Subirão os dous o Amazonas até uma aldeia dos Ta-puyusus, e sabendo d'elles que traíicavão com uma .populosa nação do rio Tapajós, que do nome d'estese chamava, metterão-se por elle, e encontrarão eslanova Iribu dos Tapuyas n'uma situação a que nãofaltava encanto de bosque ou água para tornai a deliciosa. Eslava este povo mais adeantado do que os seusvisinhos; do que viu e d'elles pôde tirar inferiuTeixeira que estes selvagens devião as suas maioresluzes ao commercio com os territórios hespanhoes, oque porem não era possível. Esta descoberta foi oúnico resultado da viagem; o mais que o agente pôdetrazer forão algumas redes primorosamente trabalhadas, e mais algumas bagatelas, mas escravos pre-zavão-nos muito alli para que houvessem de vendei-os. De fado o prizioneiro que não é immolado passaa ser olhado como um dos da Iribu, e a mera inferioridade de condição depressa se esquece onde não haoutra desegualdade real ou imaginaria.

Fez-se esta expedição sem que se praclicassemexcessos, mas as iniquidades que de ordinário seperpetravão, vierão a ser tão clamorosas que o gover-

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190 HISTORIA DO BRAZIL.1627 nador do Maranhão p roh ibiu absolutam ente taes

excursões, prohibição para a qual a obstinação dopovo e a avareza dos da governança souberão obtertaes modificações que dep ressa a tornarão phantas-tica. Depois d*isto foi Teixeira empregado em destruir

1629. um estabelecimento novo formado na ilha dosTacu-jos pelos interlopos; a que nação estes pertenciãoninguém nol-o diz, sabendo-se apenas que o commandante era um írlandez por nome James Purcel ' .Apozlonga e poríiada defeza capitularão, sendo extraordinariamente favoráveis as condições qu e obtiverão,pois que permittindo-se-lhes levar todos os seus ha-veres, prometteu-se-lhes passagem livre para Portugal. Fm despeito de todos estes esforços para extirpai-os, teimavão os Inglezes e Hollandezes emmandar navios a estas paragens, e formar estabelecimentos para cultura do tabaco, concorrência que

'ssZt&i. sensivelmente prejudicava o commercio do Pará.iV,1Mr-i)(> En tretanto preparava a Com panhia das índias oc-

uma'ZCí cidentaes novas investidas contra o Brazil. Não eraevnedir.lo . , , r> i • J

contra avizado accommetter segunda vez a Bahia; por de-1'crnaiiiliiico. ° •

mais dura fora a experiência que se fizera dos espíritos dos Portuguezes n'aquella província, nem haviaque esperar coadjuvação de negros e Judeosja uma

vez tentados á revolta c depois abandonados. Pelasprezas procedentes de Olinda, que freqüentemente

1 Gemes Parcel.

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H I ST O R I A DO B R A Z I L . 191

se capturavão, sabia-se do estado de Pernambuco, 162í*offcreccndo ellas próprias vivas provas das riquezasdaJerra1. Calculou-se que n'esta capitania poderiãoannualmente carregar de assucar cento e cincoentanavios: também seus portos erão outras tantas estações, donde sahirião os corsários a interceptar osgaleões da índia. Afim de conservar o desígnio tãosecreto como fosse possível, esquipou-se em diffe-rentes porlos a armada, que sahiu por esquadrilhas,sendo Cabo Verde o logar de reunião. Mas segredosd'csta natureza jamais se escondem, se á cata d'ellesandão agentes hábeis. Segunda vez mandou a infantaIsabel avizo á corte de Madrid, asseverando que eraPernambuco o logar ameaçado. Immediatamente seexpedirão ordens a Oliveira que reparasse e augmen-lasse as forlificações da Bahia, sendo possivel quetornasse a ser este o fito dos Hollandezes, e provesseá segurança de Olinda. Obedecendo, fez o governador seguir Pedro Corrêa da Gama para aquella cidade, onde as obras de defeza progredião com umvagar, conjunctamente attribuivel ao caracter dopovo, á incredulidade com que elle recebeu a noti-

1 Diz-se (Castr. Lus., 1, § 28) que também aqui forão os Judeos, ouChristãos novos que convidarão os Hollandezes. É isto tão pouco pro

vável, depois do que succedera na Bahia, que com segurança poderiaolhar-se como accusação falsa, se Fr. Manoel do Salvador nos não assinasse razão sufficiente e justificação plena do comportamento d1 estagente, dizendo que ella soubera que ia estabelece r-se a Inquisição emPernambuco. Valeroso Lucideno, p . 10.

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192 HISTORIA DO BRAZIL.um- cia , e á secreta p ersu asã o em q u e estava de qu e,

G.Giuseppc. vindo os Hol l andezes , não havia em Ol inda quemP. 89 .

'"^V:"5 ' podesse res is t i r - lhes .„ , Eslava Mathias de Albuquerque por es te t empo emMatluas de .

AlmaqnTàre Madr id ; a cap i t an ia de Pernambuco e ra do i rmão

para o l i razi l . , , , , . • «• • • ,

d e l le , ninguém pois podia ler mais interesse em

defendel-a , sen do esta um a das razões por qu e o nomearão general com podeies i ndependen t e s do go

ve rn ad or . O utro m ot ivo im pu tou -se a Ol ivares : e rão

tão ins igni f icantes os reforços que mandava, que bem

devia crer que pessoa menos interessada não acceita-

ria a c o m m i s s à o 1 . Os his tor iadores por tuguezes car

rega o de supererogatorias cu l pa s a memória d'eslcinfe l iz minis t ro . Se não se derão forças, proveio de

Lisboa a culpa, que não de Madrid. Um dos governa

dores de Po r tu ga l achava-se po r cas am ento aparen

tado com os A l bu q i i e rq u e s , polo que devemos presu

mir que não fal tar ia nem interesso em levantar forças

sufficienles nem vontade pa ra concede l -a s ; massobre te rem se m pr e os concelhos d'aquelle governo

carec ido de v igor , falecião agora l am be m os meios,

não se tendo a inda resarcido as pezadas perdas do

u l t i m o a r m am en t o . O b t i dos a l guns hom ens e malc-

Leriaes p o u c o s 2 , f ez - se A lbuquerque cm ou tubronarisNi». de |I)"2Í) de vida para o Recife ,

i*. i ;> . '1 Sumido a assew ração de au. toi d.,.-, Memórias diárias da Guerra

de Pernambuco apenas com vinte e si pio soldados partira de Ij>l oaMathias d A l l i u q u e r q u c . Y. ] '.

- K iclia Pitta diz lre> c a r a v e l a s . G. (iiusepjie ap en as u m a . 0 | m -

I I . 1 ' i l l . t .t, i .*>s.

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HISTORIA DO BRAZIL. 195

Sobre terreno tão desegual se achava edificada a i&2J-

cidade de Olinda, que quasi por impossível se tinhafortifical-a com segurança: a sua maior defeza pareceter sido um convento de Benedictinos fortificado pertoda praia. Pelo sul forma o rio Bebcribe o porto do

Varadouro : estreito isthmo de areia lhe é ribeiraaustral, e sobre ella crescera outra cidade a quatromilhas de Olinda, chamada de Saneio Antônio do

Recife. Fora este o logar tomado por Lancaster, que E-iado°

r 1 de Olinda.

da sua situação o chamou Cidade Baixa. Crescera,por que entre o recife de areia e outro que era de

penedia, havia um porto commodo e seguro. Mathias

de Albuquerque ao chegar achou Corrêa, dandofrouxo impulso a obras insufticientes; uma guarni ção de 130 homens; as fortalezas taes quaes erãoainda não reparadas; a pouca artilharia que havia,quasi inútil, por falta de carrelas e artilheiros; poucas armas, e ninguém que fosse dextro no seu ma

nejo. Quarenta annos antes ja o auetor das Noticiasapontava a necessidade de segurar este logar importante, mas nem o seu memorial, nem o resultado da

expedição Lancaster, produzira sobre o governo o

menor effeito. Alguns dos moradores mais reflecti-dos bem vião o perigo ; do alto do púlpito se pregava

que se o povo se não arrependia da sua preguiça ede seus peccados, não tardaria Olinda a ser escrava

meiro é mui deleixado para ser crido, o segundo por demais malicioso.

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[&>'.'.

194 UISTORIA DO BRAZIL.

dos Hollandezes '; e as pessoas mais principaes, que

ouvião a advertência , exasperadas expulsavào daegreja o pregador. Depois da sua chegada ainda ogeneral perdeu tempo, como se elle próprio duvidasse da realidade do perigo contra o qual foramandado a prover. A rainha da llespanha dera ultimamente á luz um filho, não lendo tido ale enlào

senão filhas que tão depressa morrião, que anles defeitos os vestidos de gala para seus nascimentos, sercqueriào outros de luclo para seus funeraes: o nascimento d'um príncipe e herdeiro, sempre motivode regosijo, o era pois agora dobradamenle. ForaMathias que trouxera a noticia, e como com primen tos

lisongeiros coslumão ser mais acceitos á ròrlo doque serviços reaes, em logar de trabalhar por pòrOlinda em estado de defeza, so traclou de festas efolgares, e pompas e galas, nem em toda a cidade se

'V,§V;li! cuidava em outra couza2. No m eio d'osla> inoppor-lunas oecupações chegou uma pinai i mandada pelo

governador de Cabo Verde com a\izo, de que a armada hollandeza, que alli estivem dous mezes a

1 O prosador F r. Antônio llosado custava di1 tri<<-:i>lilljns; suas palavras crào : .Soa mais díffercnça do que a de uma so letra, está

Olinda clamando por Olumla ; e por Olunda ha de ser (thrazadti

Olinda, que onde falta lauta a justiça da terra, não tardaramuito a do ceo. li. Freire, Sj ."7 .

- K Minimamente injusta similhanto aceusarão, por quanto Mal lua-dWlbuquerque empri.^ou convonicntemrnte os fraco* 1.1 ur-os do «piodi-punha pira a dolrza da capitania. V. I'.

C a s l . L u

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 195

reun ir-se, dera a vela pa ra o Brazil. A própria im - 16 2°-

minencia do perigo offerecia um argumento paraduvidar d'elle: se os Hollandezes demandassem Pernambuco, dizia-se, deverião necessariamente terchegado antes do avizo, que dera á vela depoisd'elles. Continuarão pois va len tem en te as festas, gas-tando-se de má vontade um pouco de trabalho com

1 Cast. Lus.as obras de defeza. 2> I 6-

De mais de cincoenla velas se com pun ha a armada chegada d..1 armada

hollandeza, ás orden s de Henderick L oucq, qu e vinha hollandez;l

como general em chefe; Pieter Adriaenszoon era alm irante, e o coronel Diderich van W arden burc h

commandava as tropas. Tinha velejado da Hollandaem divisões pequenas; oito navios com o general abordo forão esbarrar na altura de Tcneriffe com aarmada hespanhola composta de quarenta velas, maspelejando com denodo, e manobrando com destreza,escaparão os Hollandezes, c a Deus renderão a gloria

d'uma salvação, que nenhuma razão tinhão para esperar . Chegarão a Cabo Verde en septembro, mas soem fins do mez seguinte sahirâo o Texel as forças deWardenburch. Contava a expedição toda cerca de7,000 homens, metade dos quaes erão soldados.Effectuada a juneção , suspendeu-se o ferro a 26 de

dezembro, e a 15 de fevereiro de 1630 appareceua armada á vista de Olinda, oito dias depois doavizo.

En tretanlo tinha-se discutido se conviria remover

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sl9

Cast. Lns .

196 HISTORIA DO BRAZIL.

parte dos moradores e da propriedade; aconselhava»»alguns esta precaução, dizendo que os homens com-bateriâo mais desassombrados, sabendo cm segurança as famílias, e nada receando porellas. Prevaleceu po rem a opinião de que onde mais havia queperder maior esforço se fazia para a defeza, e publicou-se um bando, prohibindo que ninguém se retirasse da cidade, nem d'clla removesse couza alguma.Não podemos porem levar a mal a desobediênciaáquelles que apezar d'esla ordenança vião a pardoperigo a pouca esperança de se oppòr uma resistência efficaz : as principaes riquezas forão pois secre-

J. de Lael . .

15, c. 2G. lamente tiradas da cidade.Apenas do cabo de Saneio Agostinho se avistou aarm ada hollandeza, mandou-se recado a Olinda, ondeao apparecer o inimigo estava em armas Ioda a forçatal qual era. A' inlimação que Loucq mandou fazer,respondeu-se com uma descarga de mos<|uclaria con

tra o escaler, c de parle a pa rte rom peu a canh onada.Achavão-se os Hollandezes perto bastante para que asua ar tilh ar ia sorlisse effeito, mas o m ar ia tão cavado que era impossivel fazer certeira a mira. .Nãopoderão entrar no porto, por que na barra se haviãoafundido barcos que vedassem a passagem. Km-

quanlo continuava a canhonada, deixou Warder-burch a armada divertir o inimigo, e seguindo comdezaseis navios para Pau A m arello, obra de trez aquatro legoas ao norle da cidade, alli poz em terra

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HISTORIA DO BRAZIL. 197

com Ioda a segurança quanta gente pôde desembar- 1629.

car antes de fechara no ute . Dormirão na pra ia, pondoguardas do lado das m alas, e na m anhã segu inte saltou o resto das tropas.

A primeira medida do commandante foi despediros navios, para que n'elles não pozessem os soldadosos olhos como meios de retirada, ficando apenasalgumas canhoneiras armadas de onze bocas de fogoao lodo. Dividiu depois as suas tropas em tres divisões, cuja artilharia consistia em sos quatro peçasde campanha. Pouco depois das ave-marias chegou aOlinda a noticia d'estc desembarque. Muitos, que porobediência ao edicto não se tinhão ainda retirado dacidade, não poderão agora resistir ao terror pânicoque se apoderou d'elles; as mulheres e crianças fugirão para o campo; os maridos seguirão as esposas eos filhos ião atraz para prolcgercm os pães; osobjectos mais porlateis e preciosos erão apanhadosá pressa, e muitas couzas cahião com a precipitaçãoda fuga. Alguns alirárão-se a roubar as mulheres cas crianças , chegando-se a dizer que os Portuguezessoffrérão mais da sua própria canalha do que doinimigo. Muitos escravos aproveitarão o ensejo de seemanciparem, oestes como fossem homens ou bru-lacs por natureza, ou sedentos de vingança pelosmãos Iractos recebidos, dobravão a confusão, saqueando as casas e deilando-lhes fogo.

IN"a manhã seguinte poz-sc Wardenburch em mar-

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198 HISTORIA DO RRAZIL.

"'^ cha, acompanhando-o as canhoneiras ao correr da

ic"dea<fev. cosia. Um punhado de homens acobertados com ode 1630

mato o fizerão soffrcr o baslanle para provar quãofacilmente um inim igo activo o houvera derrotado.Ao chegar ao rio Doce achou-o crescido de m ais, parase avenlurar a passal-o. Do outro lado algumas obras

se havião erguido, guarnecidas com alguma gentepara defeza d'eslc vantajoso posto; mas apenas ella,vasando a maré, viu os Hollandezes disporem-se avadear a correnle com água pelos peitos, cahiu-lhea alma aos pés. As canho neiras rom perão o fogo, nãotão efficaz que fosse irresistível, n\:\< desde logo se

levantou uma voz que este ataque da banda do marlhes cortaria a retirada, e os defensores niellérãopernas. Mathias, que ficara no Recife, illudido pelofogo que a armada entrelinha depois da partida deWardenburch, chegou ao ponto do perigo real exac-tamenlea tempo de leslimunhar a vergonhosa fuga

do seu destacamento. Dt balde tentou ineller a genleem lo rma, e como renovar a acção com as tropas quetrazia, e em quenâo havia mais que fiar, seria desesperado commcllimento, resolveu retirar-se e defender o passagem do rio Tapado, que ainda ficavaen tre os Hollandezes e Olinda. Baldado in ten to ; os

que á margem do Doce havião deixado o animo, nào<» recobrai ifio facilmente ,í do Tapado; ainda o commandante Ia não linha chegado e ja a maior parle dagenle lhe linha debandado, pelo que os ofliciaes c

11. Frei refi, 33-2.

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HISTORIA DO BRAZIL. 199

os poucos soldados que reslavão lhe aconselharão que 1C50

r Cast. I.U-

se recolhesse á cidade. 2, ie, n.Wardenburch poderia ter-se servido do inimigo Ennãoos

1 , . . . H ollandezes

fugitivo como de guias, mas um mulato prizioneiro na cidade.o conduziu por caminho mais seguro, e sem resistência entrou elle na parte alta da cidade. Foi Salva

dor de Azevedo o único official portuguez que fez oseu dever; reuniu um punhado de bravos, e tomandoposse do collegio dos Jesuítas alli se defendeu comdenodo, até que desfeitas cahirao as porlas. 0 reduetoá entrada de Olinda lambem por momentos deteveos vencedores. Orgulhosos com o tr iu m ph o , parecia-

lhes a estes que mostrarem-se bastaria para obrigara guarnição a render-sc : uma viva descarga de mos-

quetaria e grossos canhões os desenganárão. Haviaporem no baluarte dous Hollandezes, Àdrian Franke Cornelis Jan, que o alraiçoárão.

Entregou-se agora a cidade ao saqu e, e o resto do

dia passou-se em excessos, que desdou râo não so avictoria mas até a natureza h u man a 1 . Em Portuguez,cujo nome era André Pereira Themudo, não pôdever a profanação das egrejas; elle so com a fúriad'um Malayo que se vota á morte, investiu uma partida d'cstes saqueadores, matando muitos antes que

podessem subjugal-o. Os despojos forão poucos para1 Taes excessos devem ser lançados por conta dos aventureiros,

escoria de Iodai as nações que tanto abu ndaram no exercito hollandez. F. I».

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1030.

w - i'M i H I S T O R I A D O B R A Z I L .

0 que espcravão os Hollandezes; se se tivessem posto

a perseguir os fugitivos em logar de saquearem casase egrejas, a maior parle dos moradores e das riquezas moveis de Olinda lhes teria cabido nas mãos. Maspr imeiramente se entregarão a todas as paixões bru-laes e depois ao delírio e lou cura s da em briagu ez.

1 nsmeltiãoos pés nos sapatos de taeào alio das dam asde Olinda, arremedando-lhes pelas ruas o andar;outros cnvcrgavf.o as vestes dos sacerdotes e i rman-dades religiosas; outros apoderando-sc das varas dosofliciaes de justiça, divertião-se com macaquear os

irnij,,'.. aclosda auetoridade. Comtudo no meio d'esla confusão salvou Wardenburch a cidade de ser queimadapelos escravos, que d'csta forma qtieri.o exprimir aalegria que sentião, recuperada a natural liberdade.Fnsinados pela experiência da Bahia, enlendião osllollande/.es que maior mal do que bem lhes resultaria dos serviços ifesla gen te, em parle por que aferocidade africana a levaria a cruéis represálias, eem parte por que muitos dVnlrc cila reprcscnlariãopapel dobre, para o que lhes não fallarião nem occasião, nem arte , nem corag em . Tanto pezo se achoun'estas razões que deixados ficar mui poucos apenasd'estes negros fugidos, se expulsarão todos os outros,que fossem ler com s.rUS antigos senhores, e obrarcomo inimigos declarados, se assim lhes conviesse.

tiiuMjucrqut Resolvera Mathi.is <le Albuquerq ue retirar-se pri-

'.í;'",i''" ilicitamente sobre o rio Tapado e depois sobre a ei-

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HISTORIA DO BRAZIL*. 201

dado, mas sem sequer parar em nenhum d'estes pon- 1ü3o\

tos, viu-se levado mais pela cobardia dos seus do

que pelo valor dos contrário s, até ao Recife. De m en orextensão do que Olinda era esta praça melhor fortificada. Para defendel-a bastaria a força com que ellesahira, mas tal havia sido a deserção na retirada,que ao recolher-se achou-se o general sem gente com

que guarnecer as obras. O mais que se podia fazerera guardar o passo entre as duas cidades : mandoupois levantar uma trincheira que cortasse a estrada,pensando ao menos demorar os Hollandezes, mas

estes descobrirão outro caminho, e os Portuguezesretirárão-se. Não restando mais esperança de defen

der o Recife, mandou Albuquerque pôr fogo aos

navios e armazéns, ardendo trinta embarcações e

muitos milhares de caixas de assucar alem d'oulrasmercadorias de grande valor1. Vendo a conflagração,sentiívo os Hollandezes mais a perda dos seus des-

pojos, do que se alegrarão com esta prova de aban

donar o inimigo a defeza. Se porem pouca prezarestava á rapacidade, não faltava pasto á intempe-rança. Tanto nas casas do Recife como nas de Olindaencontrarão os conquistadores fartura de vinho, en

tregando-se a seus bestiaes appeliles com excesso tal,

que os próprios escravos, que olhando-os como in-

venciveis em torno d'elles se havião apinhado na

1 . 1 . de Laet diz que os Portuguezes n'um documento official avaliarão a su i perda cm 2,000,000 de ducados.

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202 HISTORIA DO BRAZIL.iGJ° esperança de obterem a liberdade, agora, vendo-os

jazer por terra insensíveis, os desvalijavão de seusdespojes. Houve alguns que, correndo a dar com ogeneral portuguez lhe disséráo, que se quizesse acabar com os Hollandezes, baslava-lhe pical-os comoodres de vinho. Olfereceu-se uni eampoiiez paracahir sobre elles com alguns de seus camaradas, mastemeroso de traição deixou Albuquerqueperdero ensejo.

i«vc.-iíin-e Faltava reduzir ainda os dous fortes de S. Fran-o« fortes. . -,

cisco e S. Jorge, nem eiuqtianlo estes estivessem empoder dos Portuguezes podia a armada entrar no

porto. 0 segundo que, ficando do lado de Olinda,devia ser o primeiro investido, linha apenas Irespeças de ferro sem ca rreta s, rud em en te montadas emli aves, exacl.imentc como os primitivos colonos dePernambuco as havião assestado contra os selvagens.Mais de oitenta pessoas não cabião no forle, cuja

construcção não impunha mais respeito do que aforça da sua guarnição; mas a posição era importante. Tinha Antônio de Lima o commando, e infec-cionados do terror geral todos os seus soldados oabandonarão á excepção de sete. Mandou elle ao general avizo da deserção e pedido de reforço. Ao che

gar esta mensagem suecedeu estar presente JoãoFernandes Vieyra, niancebo de dezasele annos. Natural do Funchal na Madeira, embarcara com so-»onze annos para o Brazil em busca de fortuna, Ira-

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HlsToRIA DO BRAZIL. '205

zendo por único capital os seus talentos. Offereceu lK0-

este joven immediatamenle os seus serviços, e outros vinte lhe seguirão o exemplo; acceila a offerta,preparou-se Lima para defender o seu posto com estepunhado de homens'. Cinco dias se passarão semque se desse ataque algum : na quinta noute tentarão os Hollandezes sorprehender o forte. Mas quemviera voluntário oecupar similhanle posto não erapara dormir n'ellc : com as traves, preparadas parareparar a fortaleza, fazião os defensores lombar asescadas dos assaltantes; as granadas de mão arremessadas entre elles, aliravão-nas outra vez parafora anles da explosão, e assim repellirão o ataquecom considerável mortandade de inimigos. Mas dezhomens da tão pequena guarnição, linhão ficadomortos ou feridos. Alguns dos próprios soldados,que ultimamente linhão desertado do forte, tendo-opor insustentável, voltarão agora a elle, envergonhados de que ou tros o defendessem, bebendo anim ono esforço extranho, tão fáceis como antes haviãoservido cobardia no terror alheio. Não erão poremobras aquellas, que por largo espaço se deixassemmanter, e os Hollandezes baterão os muros até quepouco mais forão do que um montão de ruinas . Albuquerque fez uma fraca demonstração de querer

1 Acha-se hoje exuberantemente provado que nem-uma parte tomou João Fcrnandez Vieira na defeza do forte S. Jorge nem a ella seadiou ptvsonte. F. P.

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<-. G uso |i[ 'i1'. tC».

B r i t o Fie i i§ 31

f.aít. Ia

201 HISTORIA DO RRAZIL.

103:.. SOCt.01TOr o forle : a sua genle havia perdido o animo,

empalhou até que a maré, crescendo, tornou diflicilde nadear a Beberibe, e depois fez dYsla difliculdadepretexto para retirar-se sem nada haver tentado.Rendeu-se pois a praça com condições honrosas, e

£,:>fL -'oão Fernandes Vievra salvou a bandeira, passando-aCgVl i t . ' . , ,

2, S-M--.N. a volta do corpo .Em seguida foi intimado o forte de S. Francisco.

Fm tenente oppoz-se á pusillanimc inclinação do ca-pilão, dizendo que com a espada na mão sempre seoblinhão melhores condições do que com ella nabainha; mas prevalecerão conselhos mais baixos, e

1 Os Hollandezes c\ijjii-".o dYsles b rav o s u m ju ram en to d e n ão

pecarem em a r m a - por se i s me/cs con t ra os invasores , mas e l les , qur

não se t inhão rendalo min siniilhante cond ição , também a cila se nãn

iiuizorão su je i ta r ajíora , pelo que forão pre/.os, porem soltos passadas

I oucos dias. Tal é a versío portuiíiioza ; a hollandeza é o u t r a . Si-pimdn

islã eompunlia-sc a guarn ição de SI) ;i |)|) l ioiuens; não se llic pci -

inittiu sahir da praia com honras mi l i t a res , e depo is recusará» qua

ren ta p res ta r o ju r am en to a que se hav ião oln i^ado i\os termos da

cap i tu lação . Por conseguinte forão d e s a r m a d o s e reu.ellidos prezospara Ol inda , onde no nulro dia derão o juramento , e furão postos cm

liberdade. ( . / . de Laet, lN'.i-)!M).)

fionlradirtorias como são estas duas versões , parece-m e qr.e em

nenliuiiia ha fals idade direela ou in ten cion al . Os lerm os forão prova

ve lmen te os ipie d izem os Hol landezes . mas é na tu ra l que metade dos

l'ortugUeZe> naili soubessem da cond ição , c no es tado de exallaeào c

ctuiiplet.i indisciplina, se recusassem a o j u r a m e n t o . A prizão tTuiua

noule podia induzd-os a snjeitai-su a c m c o m p r o m i s s o coiiiplllsoi .o ,ijiie el le- cm taes ciicuinslancias pouco escrupulfi lerião em qiieljiar,

ou rntfo o comn.amianto l.ollandez (q u e pai ei e le r qm i ido lazer a

iMieira com coi\czia c u m p r a , e conc iliar se o | ovo) pol-os-ii em l i -

lurdade [ a r a lmar-so do cuidado do iMia:dul-os.

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 2 0 o

o mais que pedirão os si liados foi licença para man - ,U3Ü

darem recado a Mathias d'Albuqtierque e tçes diasde tregoas, findos os quaes se renderião, se não fossem soecorridos. Nem Ires horas foi a resposta, a quese acerescentou a ameaça de não dar quar te l, se apraça fosse levada de assalto : á vista d'isto en trego u-se o capitão e a arm ada hollandeza entrou no porto

em triumpho. Nove dias depois chegarão reforços.daHollanda' .

Contava Olinda ao caíiir nas mãos dos Hollandezes'2,000 moradores, afora cerca de 130 religiosos. Possuía um collegio de Jesuítas, um convento Benedic-lino, outro Carmelita 2 e outro Franciscano; um

1 A curta narração que Ericeyra nos faz da perda de Olinda estárecheada de inexactidòes. Diz elle que Albuquerque antes de partir dePortugal, protestara contra a mesquinhez das forças que lhe davão ;(pie nenhum tempo perdeu em pôr ludo no melhor estado de defezapossível; e que por muito tempo defendeu valentemente a passagemdo rio Doce contra numero superior. Com a costumada malícia atira oCarmelita * toda a culpa sobre Olivares, mas sempre confessa que opovo de Olinda não acreditava no perigo. Raphael de Jesuz e RochaPitta estão de accordo em censurar Albuquerque : o primeiro exprimea opinião de João Fernandes Vieyra, juiz inquestionavelmente competente, o segundo pinta provavelmente o comportamento do generalsegundo os sentimentos com que era recordado no Brazil.

2 J. de Laet erra chamando-o Dominicano; os frades d'esta ordemjamais fundarão casa no Brazil —não sei porque feliz sorte para o paiz,— e o convento Carmelita está marcado na vista que elle deu da c i -

aHa manifesto equivoco nesta citação; porquanto o conde da Ericeir:

nunca foi carmelita; o auetor quiz talvez referir-se a Frei José de S. Thereza, carmelita descalço, e auclor duma estimada Istoria delle giterredei regno dei Brasile. F. P.

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2IHI H I S T O R I A I M I l ; n A Z l r .

10o

°- mosteiro de freiras, uma Misericórdia, tino igrejasparochhies, d'umadas quaes dizem (^conquistadores

que era mui formosamente edificada, e cinco ermi-dasna cidade c suas cercanias. A força militar compunha-se de tres companhias regulares, nominalmente de cem homens cada uma, mas cuja quinta

parle por via de regra eslava no hospital, e de Irescompanhias dos moradores, com egual numero depraças. Os commerciantes e mercadores abastadosdiz-se que não erão menos de duzentos, a alguns tiosquaes se calculavào fortunas de L2 0,000, de 00,000e até de 00,000 cruzados.

0 Becifc, como porto, e por conseguinte foco principal dos negócios, tinha também uma populaçãoconsiderável; pela ordem tio tamanho era então aterceira villa de Pernambuco, sendo Iguaraçu a segunda. Oitenta a noventa navios aqui carregavào Iodos os annos de assucar e pau brazil, sendo este

ultimo reputado o melhor que o paiz produzia. Doslivros da alfândega se via que nos quatro annosde lli*20 a lü'25 não tinhão sido importados menosde IÒ,4ÕO escravos de Angola para a capitania. Kmverdade era muitos dos engenhos tamanhos comoaldeias não pequenas. Os Hollandezes dizião que Per

nambuco era o paraizo do Brazil e valia bem um

dade . Ve-ta estampa, dá-se ao togai o nome de Maiim do l i i . da dePernambuco. Ainda pois não edura e m desuso a antica deitou iua "aboriiíena d e Marinj.

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HISTORIA DO B R A Z I L . 207

reino. Este paraizo, em que abundavão os escravos,oassucar e o tabaco, estavão elles resolvidos a fazerem-no seu. Do porto e da capital ja erão senhores,e tão seguros estavão da conquista, e determinados affuardaroque ganhassem, que na expedição ja tinhãolevado todo o pessoal para a administração das colô

nias conquistadas.

1 6 3 0 .

J. de Lacl.191.

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2 0 8 H I S T O R I A D O B R A Z I L .

IfV.O

CAPITULO XV

\.-ampamcnlo do Bom Jesus . — Calabar deserta para os Hollandezes e

faz mudar a fortuna da poeira . — Negros dos palinares. — Itcilur-eão d i ilha de Itamar íca, Rio loande, 1'araliybn, acampamentoc Sazarelli,

iiefazcm-se Mas cm Pernambuco, como antes na Bahia, malPortuguezes. tinlião os Po rtuguezes abandonado a cidade, que logo

se reorganizarão, recobrando animo. Mais a falia dedirecção do que de coragem devemos altribuir o seufeio proceder anterior; nenhuma previsão linha havido, nada de preparativos contra o perigo que seavisinhava, e quando este afinal lhes estourou sobreas cabeças, o primeiro pensamento de cada um foiassegurar um asylo á sua família, abandonada a esperança de salvar a cidade. Depois de tudo perdido,e retirados todos para as brenhas e desvios, era a vozdos bravos a que se escutava, que so esses davào

iTito Freire, agora conselhos, recaliindo o com man do sobre aqncl-les que a natureza creara para mandar. Lra lambemdo caracter do general obrar com acerto, quando lhedeixavào tempo para considerar; homem vagoroso epolítico, faltava lhe presença de espirito, e perlur-

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HISTORIA DO BRAZIL. 209

bavão-no os casos repentinos \ Disse elle agora aos J635

Portuguezes que os Hollandezes conquistavão pelolucro e não pela gloria; que cobiçavão Pernambucopelo assucar e tabaco que produzia, e que por isso omelhor plano de operações era manter o campo, eimpedil-os de cultival-o. Immediatamente se princi

piarão obras sobre um outeirinho equidislanle deOlinda e do Recife, a uma legoa de cada um d'esteslogares, e cuatro canhões tirados d'um navio hollandez naufragado erão toda a artilharia. Com alegreazafama se proseguia n'estas obras, e ao passo queellas se adeantavão crescia o numero dos trabalha

dores, vindo alguns a residirão abrigo d'ellas, outrosa reunirem-se ao arraial, e com tal presteza se hou-verão todos, que ja o acampamento do Bom Jesus

E fermío

estava cm estado defensável antes que os Hollandezes ° arra,ial do

1 Bom lesuz.

o soubessem principiado. Occupavão-se os conquis

tadores com arranjarem-se na cidade e regular ogoverno das suas conquistas, quando devião ter seguido o primeiro triumpho; mais tarde conhecerãoo erro, mas ao principio alegrou-os a noticia dospreparativos do inimigo, pois quantos mais Portuguezes se reunissem, mais decizivo seria o golpe,

entendião elles, e maior o espolio. Hadrian Frank,que conhecia bem o paiz, offereceu-sea guiar por umrodeio os seus patrícios ao arraial para sorprehen-

1 Injusta nos parece similhante apreciação do caracter de Mathiasd'Albuquerque. F. P.

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2 1 0 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

1 6 3 0 . u e i _ 0 ) m a s Mathias de Albuquerque vigiava, o emlogar de aguardar o assalto, foz sahir uma partidaao encontro dos assaltantes. Com esta não conlavào

J§i93 ae '' os Hollandezes, c não podendo resistir ao ímpeto daC ' " s ' investida, fugirão, deixando quarenta no campo.

Emboscadas. Afoutárão-se com a victoria os Portuguezes; sabendo que o general ho llandez ia do Recife a Olindacom uma escolta de 000 homens, postos de emboscada o sorprehendérào; desbaratada a sua gente,morto um dos pastores hollandezes, ler-se-ia ellepróprio rendido, se o seu cavai I o , recebendo ligeiraferida, o não tivesse arrebatado em desesperada car

reira. E Ia foi e lle deixando perto de |0 mortos. Tanlofoi crescendo o perigo de passar d'um a praça á outra, que fi/erào os Hollandezes um regulamento,ordenando que todas as vezes que uma partida estivesse para tentar a jornada, se disparassem duaspeças, e sahisse d'ambos os pontos um destacamento

a segurar o cam inho.Estabelecerão agora os Portuguezes uma porçf;»»de postos avançados debaixo de officiaes, que pelamaneira por que devião combater, se ehairiárâncapitães de emboscadas. Um d'esles postos foi confiado ao Jesuíta Manoel de Moraes e ao seu rebanho

de índios, de que elle fizera conjunctainenle christãos e soldados. Camarão ' o cacique Ca rijo, oecupava

1 Era ousado guerrilheiro natural do Ceará e fora levado a l'ern

buco por Martim Soares Moreno. K. P.

o u -

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 211

outro com o seu povo; e João Fe rna nd es Vieira tinh ao commando d'uma partida, que noute e dia deviaestar en campo. À força principal compunha-se deagricultores, que vinhão ao acampamento quandopodião furtar tempo ás suas occupações, e reliravão-se quando a sua presença era necessária em casa, demodo que continuamente vinhão e ião, mas os quetinhão fugido da cidade ou moravão na immediatavisinhança do inimigo, estabelecerão alli a sua residência fixa. Mas grandes trabalhos se pa ssavã o. Omantimento era necessariamente escasso quando si-milhanle multidão se reunia de improvizo em simi-lhante logar, suecedendo muitas vezes não terem ossoldados mais do que uma espiga de milho pararação. Be roupa ainda eslavão peor do que de sustento, pois expulsos de suas casas, como havião sidoaquclles homens, nada tinhão salvado . 0 que m aislhes custava era apparecerem sem sapatos, pois que

andar calçados era um signal com que se distinguiãodos escravos, e ao principio também não podia estafalta deixar de ser um mal real, mormente n'umpaiz infestado de chiguas. Contra estas adoptárão-seos preserva li vos de que fazião uso os ind ige na s, e pararemoverem o pezacfelo moral , deitarão os officiaes

fora os seus sapatos, andavão descalços como ás pra-as1 . Achou se isto depois tão conveniente n'um paiz

1 Stedman marchou descalço durante a sua terrível campanha no

1030.

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•212 HISTORIA DO BRAZIL.IO:J0- cortado de rios e lagoas, que havia muito ja que

n.Freire, cessara a necessidade, e ainda durava o h abito . Naestação chuvosa inulilizavão-se tão freqüentementeas mechas que Wardenburch achou necessário ar-

J . .le Laet . , . . . .

i''«. mar de lusis uma companhia .Apeno de Entretanto fortificavào-se os Hollandezes nos seus

M parles, novos dom ínios, o que poderão lazer sem interru pç ão ,depois de terem os Portuguezes, tentando duas vezesestorval-ós, sido de ambas rechaçados com grandeperda. Um boato de que abi vinha D. Fadrique denovo com poderoso armamento, a tractar os Hollandezes de Pernambuco, como fizera aos da Bahia, ani

mou muito os Portuguezes, e o inimigo, quer acreditasse quer não, teve a prudência de obrar como sea couza eslivesse im m ine n t c , aiignientando as fortiíi-cações n'essa conformidade. Perto dos seus quartéisdemorava uma ilho ta, d'um tiro de pistola em compr im en to , e coberta de arbuslos e mato rasteiro, onde

aves de varias espécies soião pousar de noute, vindoás seis da larde, e indo-se ás seis da man h ã , cm tãograndes bandos que escurecião os ares : apezar davisinhança dos Hollandezes, e do freqüente atirar atodas as horas, não abandonarão estes pássaros o lo-

Surinão, seguindo o conselho que lhe dera um neg ro velho, c a queelle acreditou t er devido a vida. Ta lvez seja impossível a introducçãode sl a practica num exercito, e p erigosa a ten tativa, mas em longasmarchas ecom mao tempo, concorrem ella tanto para a comniodidade,como para a saúde e conservação da tropa.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 21

gar, em quanto se não cortou o arvoredo para lenha 1630

e para as fortificações.De Portugal não chegavão recursos, e Albuquer

que, cançado de esperar, foi de desesperado assaltarOlinda, sendo repellido com grande mortandade. Naguerra irregular estava porem sempre doladod'ellea vantagem, nem tardou que os Hollandezes sentissem falta de viveres: linhãoem verdade o mar aberto,mas o paiz era do inimigo. Água não havia no Be-cife, senão a que se tirava de poços abertos na praia,e quede tão imperfeitamente filtrada mal servia deágua doce; pão tinhão de comel-o hollandez, e dequeimar lenha da Hollanda, apezar de terem a floresta ao pé da porta, tão bem guardavão os Portuguezes as avenidas1. Se se aventuravão a sahir em

1 Joannes de Laet nos conta um caso, que caracteriza o deshu-mano svstema de guerra que então se seguia. Tinhão-se capturado elevado para o Recife m uitos navios de escravos vindos de Angola. Aosnegros varões pouco importava servir senhores hollandezes ou portu

guezes, ou pegar em armas d'um ou outro lado; mas as mulheres ecrianças consumião mais mantimento do que convinha no estado emque se achavão as provisões; por isto e pela vida que os soldados fa-zião com estas Mulheres (chamavão-se a religião e a moral em apoiod'uma medida que tinha por único fim economizar viveres), forãoexpulsas do Recife as negras e o seus filhos, e conjunctamente os Portuguezes aprizionados nos navios negreiros. Serião ao todo cento evinte pessoas. Não se tinhão ellas ainda afastado muito das trincheiras,

quando uma partida de índios ao serviço dos Portuguezes fez fogosobre ellas, matando sete ou oito; fugirão as pobres mulheres paratraz com as crianças nos braços em direcção á cidade, mas ao ap-proximarem-se da emboscada hollandeza, também d'alli lhes fizerãofogo. D'ambas as partes fora isto engano fatal, não crueldade dehbe-

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2 1 i H I S T O R I A D O B R A Z I L .

1 0 3 0 . ] J U S C ; 1 u e mantimento ou fruclas, cabiào nas ciladasdos emboscados. Quanto aos Portuguezes faltavào-lhes munições, c tinhão de derreter os seus utensílios de eslanho, e o chumbo das suas redes de pescaria, com que fazer balas; mas as certeiras armasdos índios n ãofalhav ào, nem era peq uena a perda queos Hollandezes soffriào com este vexatório e acabru-nhador systema de guerra , l inhão de haver-se comum inimigo exasperado e implacável que os odiavadobradamenle como hereges c como invasores. OsHollandezes affirmão que Albuquerque não consentiuem mitigação algu m a dos horrores da gue rra , quequeria ver feita com lodo o rigor, não dando, nempedindo quartel, e recusando até resgatar o seu próprio confessor, um pobre Franciscaiio, que cahiranas mãos do inimigo . Também accusào os Portuguezes de terem envenenado os poços donde hebiao os

J ' ' o l a e t . , . .

104. Hollandezes .

i.iciinào-bc Tinha Albuquerque oulros inimigos alem dos Ilol-aljrunscolonos asubmette-

rem-se. ra da , antes tiverão os llollanile/es a humanidade de deixar voltar ossobreviventes. Jaerlisrk Yerhael, I'.• 8. «

1 Jol sahiu com os baleis para o que J. de Laet (bania ilha de Antônio Vaz a fazer acuada nos cacimbas, ou poros abertos na areia : asua vista fugirão alguns Portupne/es, que eslavão envenenando a

água. Iioiis soldados morrerão de repente depois de lerem bebidod'ella, os oulros restabelecerão-se com soecorros médicos,  \s--iin  narraLaet o caso a p. l ü i . I'uz cm e.rifo a palavra de repente, que elleemprega, porque faz duvidar da accusai ão : uma tai raiada imprudente de a".ua fria pôde mais facilmente causar morte repentina, doque qualquer veneno, que iVcsla fôrma se adminístias-e.

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 2 1 3

làndezes. Habitantes havia que, comtanlo que ven- J63°-

dessem os seus produetos, pouco lhes importavaquem era o com prad or; destituidos de lodo o sentimento de patriotismo,*so suspiravão por traficar com B-Jfâ re 'os conquistadores. Tres indivíduos que se aventurarão a iniciar este com mercio, forão descobertos eenforcados. Havia porem muilos cujos desejos erão

os mesmos, en'uma noute lançou-se fogo á casa emque o general dormia, tendo elle por mais prudenteatlribuir a culpa ao acaso do que procurar e punir oculpado. De facto, o jugo dos Hollandezes poderiater sido voluntariamente recebido, a não ter sido adifferença da religião. Esse mal que sobre todos

(orna um povo descontente, a falta de justiça, eraseveramente sentida em Olinda; commettião os poderosos as maiores iniquidades, e não havia alcançarreparação d'ellas. Pouco antes de chegarem os Hollandezes, clamou um dos moradores voz em grita napraça do mercado : « Onde estão os irmãos da Mise

ricórdia? A justiça é morta aqui em Pern am bu co ,por que não vêem elles a enlerral-a? » Esta perversão da lei, e geral corrupção dos costumes na infelizcapitania, é reconhecida dos Portuguezes. A Bahia eramelhor governada como sede da administração, eninguém, á excepçào dos christãos novos, queria alli

bem aos invasores.

Tractando sempre de augmenlar o numero dos E x p e ( , j c 5 o

<e,,s parciaes, expunhão-se os Hollandezes o menos """"'de "llamai

C

contra a ilhado

maraca.

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216 HISTORIA DO BRAZIL.

1630 q u e p 0diào á insidiosa e mortífera guerra em que

erão tão mestres os seus inimigos. Fortificavão ospontos mais seguros nas visinhanças do Becife, epreparavão-se a extender por mar as suas conquistas,dirigindo contra a ilha de I tamaraca, oito legoas aonorte de Olinda, a primeira expedição. Era-lhes desumma importância a posse d'es(e lo ga r, onde se po

dião haver provisões c madeira não menos indispensável. Melhor cultivada do que povoada eslava a ilha,que media cerca de dez legoas de circumferencia;contava vinte e tres engenhos, mas o principal estabelecimen to, cham ado villa da Conceição, com punha -se de cento e trinta moradores apenas, alem d'uma

guarnição de sessenta homens, commandados porSalvador Pinheiro, o governador. Insignificante comoera esta força, não foi aos Hollandezes fácil a conquista, c em logar de persistirem na tentativa, plantarão um forte a tiro de mosquele da fronteira terrafirme, dominando a entrada d'um porlo em que acha-

vão fundo navios de trezentas toneladas. N'esle re-dueto, que chamarão Forle Orange, deixarão oitentahomens com doze peças de artilharia, e voltarão aoBecife. Quasi defronte do novo forte ficava a antigavilla de Iguarassu, que os Portuguezes mandarão

t.li'iT' immediatamenle reforçar, para que o inimigo nãot. Freire. * 1 i

jsic, passasse a outra banda.xjue.* Entre tanto não tinha a perda do Becife causadon M-Xiii. pequena inquietação e perplexidade na corte de Ma-

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H ISTOR IA DO BR AZJL. 217

drid. Conscios da miserável fraqueza a que estava ™30.reduzida a sua grande monarchia, redigirão os estadistas hespanhoes um melancholico memorial desuas atribulações e perigos, para ser presente a Olivares e ao próprio rei. Se se fazia sahir uma armadaa restaurar Pernambuco, devia dar á vela em agostopor causa da monção, mas não era possível aprestal-ono correr do anno. Assim, quando ella chegasse, jaos Hollandezes estarião vinte mezes de posse da suaconquista, nem havia que duvidar que empregariãoelles este tempo em fortificarem-se e segurarem-se.Na costa de Pernambuco não havia outro porto alemda Parahyba, agora que o Becife era perdido, nemaquelle admitlia navios de grande porte. Onde poisacharia abrigo a armada, ou onde desembarcariatropas e artilharia n'uma costa em que até umaligeira briza podia sossobrar embarcações? Perto doinimigo nenhuma esperança de effectuar um desembarque, experimentado como elle era na guerra, epreparado como devia estar, e ao longe o paiz cobertode matagaes e paues, desfiladeiros perigosos quepassar, e rios que atravessar, e tudo isto com contrários, que de toda a vantagem sabião tirar partido.Mas dado que todas estas difficuldades se vencião,que se punhão as tropas em terra, e se assentavacerca ao Becife, devia este sitio ser negocio de tempo,e durante elle que havia de ser da armada?Cruzandon'uma costa aberta e exposta, so por milagre esca-

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-218 H I S T O R I A DO B R A Z I L .

paria a algum desastre grande. Se entrasse a oiaoào

chuvosa antes de rendida a praça, serião as tropasdizimadas pela doença, nem sem infinito perigo egrande perda se deixaria effectuar o reembarque.Tão pouco, estaria a arm ada cm estado de volver áEuropa, e onde se aprovisionarião e darião ciena osnavios?

Ainda isto não era tudo. 0 pr im eiro custo do armamento, a parte com que a llespanha devia carregar, serião dous milhões: restava ainda a despeza dosreforços e fornecimentos, e vinte navios havião deser também esquipados para a costa da l lespanha.Por quanto, achando-se no Brazil a arm ad a, ficava

desguarnecido o litoral do reino, e, allento o estadodas giiarnições, não era impossível que em qualquerponlo fizesse algum inimigo conquistas que pozessemem sobresalto a monarchia inteira. Também lirariãoexpostas as índias. A França tinha então oitenla oucem navios prompb s para serviço, c poderia sttppòr-

se que em quanto as forças da llespanha se empre-gavão em Flandres, na Itália ou no Brazil, não percebesse ella quão fácil seria atacar as índias? Havanaera o único logar capaz de resistir, c esse mesmo,não sendo soecorrido, podia cahir; e perdido clicouCarthagena, ou Porto Bello, acabavão as remessas de

dinheiro, que ale um bloqueio d'aquelles portospodia demorar por annos. Considerando pois todasestas difficuldades e inmensura\<;is males, e a per

ita

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HISTO RIA DO BR AZ IL. 219

lotai do Brazil, que era segura se se mallograsse o fim 163°-

da expedição, o único expediente seguro, e que pro-mettia alguma esperança, seria mandara Albuquerque dous mil homens de tropas escolhidas com um pol c

r0ece'Ms.

chefe resoluto que o ajudassem a elle e ao povo do de'0PiSo.paiz a continuar com as hostilidades, cujo um seriacançar os Hollandezes, desenganal-os dos esperados

lucros, e afinal induzil-os, segundo todas as probabilidades, a abandonarem o paiz1.

Adoptou-se o parecer. Despachárão-se com diffe-rentes intervallos nove caravelas, com gente deguerra que desembarcando onde podesse, fosse en-corporar-se á gente do acampamento do Bom Jesus.Algumas d'eslas embarcações forão aprezadas pelocruzeiro inim igo, e dos soldados que chegarão a saltarem terra poucos alcançarão o logar; do seu destino.Não se fizerão maiores esforços, por que a corte preferia deixar os Pernambucanos libertarem-se por § sss, ÕSS.

si mesmos como podessem, e esperava que a vexatóriaguerra que elles fazião, frustrando o principal fimdos Hollandezes, os induziria por fim a desistiremda empreza. Também se dizia que os Albuquerquesconfirmavão a corte e os governadores de Portugaln esta opinião, esperando rehaver com o tempo o quehavião perdido, e receando que, se a corte enviasse

1 0 curiosissimo documento que deixo aqui extractado foi trans-cnpto do original, em poder do marquez de Gouvea, herdeiro do condede Portalegre, D. João da Silva.

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2'2o HISTORIA DO BRAZIL.

1630. grandes forças a reconquistar a capitania, não lhes

seria esta restituida, com o fundamento de ter sidoperdida nos azares da guer ra 1 . Mudou-se porem depolítica apenas se soube em Madrid que os Hollandezes apparelbavão para Pernambuco uma poderosaarmada ás ordens de Adriaen Jansz Paler, general degrande credito, c de Martin Tbiisz como almirante;

consistia esla força em 0,500 praças, e ião também como colonos muitas famílias hollandezas, ejudeos ricos q ue querião erguer suas tendas n'anuella

(.lllK'|iJiO. ° - L 1e 1

i ' . u - 2 . t e r r a 0 c cjde f l |ai u a promissão. Também se suppozque a frota cruzaria cm busca dos galeões do México,

na esperança de segunda preza como a de Heyn.Sabido islo, esquipou-se cm Lisboa uma armada;erão castelhanos a maior parte dos navios, mas a

despeza so Por tuga l ca rregou com e lla. Teve D. Antônio de Oquendoo commando, e a armada dirigia seá America hespanhola, mas devia primeiro lançar

soecorros no Brazil. Dez caravelas com mil homens,Portuguezes, Hespanhoes e Napolitanos e doze canhões debronze, erão destinadas a Pernambuco;n'ellas ia Duarte de Albuquerque, o senhor da capitania. Devia a armada demandar primeiro aBahia,mal pensadas instru cçõês, salvo se se queria evitar o

1 A maneira por que Brito Freire refere este boato, mostra quãogeralmente era acreditado. Diz elle : Creio, que so da m alícia nasceu

esta murmu ração, mas t orna fo i Ião publica, os reneraveis respei

tos dahistoria meobriijárS,, n escreeel-a. querendo omilill-a,

§ 402.

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HISTORIA DO BRAZIL. 221

inimigo, pois ' que derão ao a l m i r an t e ho l l andez ,63°

tempo de a ferrar o Becife, de se m ba rca r as suas t ro

pas e mun ições , prep ara r tudo par a a b a t a l h a , e

sahir a dal-a com dezaseisbons navios. §403-9.

A armada de Oquendo c om pu nh a-se de v in te ga - Ac,1° nava'-

leões de gu erra, das doze caravelas com trop as pa ra

Pernambuco e Parahyba, e vinte e quatro vasos mer

cantes carregados de ass uc ar da Ba hia , q u e ião d e

baixo do seu comboio. Ao apparecerem as velas ini

migas, aconselhárão-no que t i radas dos t ranspor tes

as tropas, as distribuísse pelos navios d e g u e r r a e

pelas embarcações mercantes maiores, mas el le ,

julgando-se ja assaz forte, mandou-as descahir a so-

tavento. Travada a acção, ganhou elle o vento ao

navio de Pater , e harp oo u-o, segu indo-se u m con-

flicto desesperado: bem querião os Hollandezes safar-

se , mas Juan Coslelho, um dos capitães h e s p a n h o e s ,

saltando a bordo do inimigo, passou um cabo á volta

do mastro do traquete, serviço que lhe custou a vida.

Orçou segundo navio a accommetter O quendo pelo

outro bordo. Cosme do Conto Barbosa , vend o-o, met-

teu entre os dous o seu ba rq u in ho , q u e foi im m e -

diatamente ao fundo , send o elle próprio a p a n h a d o

do mar e feito priz ioneiro; mas parece que esta atre

vida manobra salvou o general hespanhol . E g u a l -

mente bem secundado não fo i o commandante hol

landez pelos seus capitães, a alguns dos quaes faltou

o animo n'este dia. Não tardou a pegar fogo o navio

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•222 H I S T O R I A D O R R A Z I L

1050

de Palcr, e os Hespanhoes tantas balas sobre ellefaziáo chover, que não havia esperança de atalhar aschammas 1 . Oquendo cortou agora o cabo que oprendia ao navio inimigo, e cuja destruição era inevitável, mas o seu próprio vaso eslava tão completamente desmantelado, que sem auxilio não poderia

evitar a m esma so rle. J uan de Pra do veio dar-lhereboque. Salvar o navio hollandez era impossível,mas Paler, como muitos oulros, poderia ter provavelmente escapado á m orte , nadando para os Hespanhoes, que apanhavào a gente que vião no mar;cm logar porem de tental-o, tomou a bandeira, en

rolou-a á volla da armadura, e precipitou-se nasondas de cabeça para baixo 4 . En tretan to atracou oalmirante hespauhol o hollandez, e foi a pique.

Acção sanguinosa foi esta, bravamente pelejada departe a parte : os Iles-panhoes tinhão a vantagem do

» F r. Manoel Salvador diz (Vai. lueideno, p . lõ) que para o incendiarem, envolverão os lantiiLMiozes uma bala em panno embreado,e atirárão-na ao casco do navio hollandez.

s Concordãu os Pu;tu.Sfiic/e* referindo isto em honrado seu ininnuo,nem amisão os Hollandezes de se haverem portado mal na acção. J. d''

Laet porem aflirma que dos capitães hollandezes poucos li/erão o si u

dever: não imputa culpa a Palcr, mas também nada quer saki: d«ter-se este sacrificado com a bandeira, antes diz que d. pois de se trvsostido duma corda ao costado do navio em quan to pod e, na esperança de que viria algum bote salvar-lhe a. vida, cahiu 0 comniaiidaii.ca final exhausto de forças *.

' Continua .Vtscher [les llollaitdais au lirésil) a versou de I.aet e pücem duvida as palavra* aUribuidas ao almirante hollainle/., cujo verdadeironome era Adriaan Janszoon Paler. V. I'.

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HISTORIA DO BRAZIL. 225

numero, os Hollandezes a da grandeza dos navios e 10 3°-

do pezo do metal : egual foi a perda d'ambos os lados,

ao todo uns tres mil homens. Ao cahir da noute

ainda as duas armadas estavão á vista. Ao conde de

Bagnuolo (Giovanni VincenzoSan Felice), que tinha

o commando dos reforços destinados a Pernambuco,

ordenou Oquendo que, seguindo a costa, entrasse

no primeiro porto que podesse; mas primeiro julgou

necessário dos mil homens tomar trezentos, para

supprir em parte a perda soffrida. Ao amanhecer não

se avistava o inimigo, e Oquendo, cingindo-se ás

suas instrucçõês, proejou á Hespanha a comboiar os

galeões, mas é de crer que não fosse tão prompto em G Gill,eiip,obedecer ás ordens que trazia, se desejasse renovar B.Freire.

1 J § 407-23.

a acção.

Entretanto acostou-se Bagnuolo á terra, ganhando HoUa0„jezCí

o porto da Barra Grande, a trinta legoas do acampa

mento do Bom Jesus. Uma caravela, commandada

por Antônio de Figueiredo, separou-se da frota, eacossada do inimigo correu ao norte, até que entrou

no rio Potengi1. Nenhuma tentativa se fez de al

cançar a Parahyba, prova de que erão os Hollande

zes os senhores do mar. Desembarcarão comtudo as

tropas a salvamento, fazendo juncção com Mathias

d'Alhuquerque apoz difficil e penosa marcha. Sa-1 Nome indígena do que vulgarmente se chama Rio Grande, e pre-

ferivel por que o portuguez serve conjunctamentepara designar o r io,a província e a capital, sobre haverem outros muitos Rios Grandes.

queim;nOlinda.

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2 2 1 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

16:,

°- bendo que os Portuguezes linhão recebido reforços,não sabião os Hollandezes quão insignificantes esteserão. A chegada de Bagnuolo os in qu ie to u ; eslavãoas suas próprias forças consideravelmente desfalcadas, e acharão que os Portuguezes, lendo ja manifestado tão firme propósito de resistência, agora

engrossados com esles soecorros mais audazes setornarião. Toda a força activa que havia em Olinda,noBecifee fortes adjacentes, não chegava a 1,000 hom e n s 1 . Julgarão pois agora os Hollandezes necessário concentrarem-se no Becife, antes que alli fossematacados, e resolverão abandonar Olinda, resolução

lanto mais de boa mente adoptada, quanto maiorera o perigo de passar d'um logar para o oul ro . Assentado isto, mandarão perguntar a Mathias dWlbu-querque se queria resgatar a sua cidade, alias seriaqueimada. Bespondeu este : « Queimae-a, se a nàopodeis guardar, que nós saberemos edificar outra

melhor . » Tirarão pois os Hollandezes o sino, c osmaleriacs das casas que podião servir-lhes para suasedificações e obras no Becife, e depois entregando ologar ás chammas, toda esta florescente cidade foi

' Tinhão os Hollandezes Í>,XM) soldados validos, 180 doentes,

91 rapazes, ?!• tambores e cometas, 102 negros, alem d'algumas pessoas pertencentes ao trem das bagagens, e outras avulsas. Os serventes neg ros erão i>7í>, e T27>, o menor numero creio eu, erão mulher e s ; e em Olinda havia 90. A bordo dos navios havia 2,2 iO homens.O numero total de pessoas a sustentar era de poluo mais de 7,0(10 e."liii no Forte Orariüc ./. de Laet, 2 4 8 .

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 225

preza do fogo, excepto um único pardieiro de barro , >631-que ficou illezo em quanto ardião em torno casas,egrejas e conventos.

Não tardou que os Hollandezes soubessem quão A Parahybadiminutos os reforços chegados aos Portuguezes , ecomo en razão do mao proceder dos chefes deviãoantes enfraquecel-os do que tornal-os mais fortes.Bagnuolo instalou-se á parte, indo Duarte d'Albu-

querque aquartelar-se com o irmão, cada um com asua gente. Ambos estes novos commandantes con-cordavão numa couza, e vinha a ser em favorecer astropas regulares que havião trazido, tractando deresto os habitantes armados, posto quede facto fossem estes a força e a esperança da capitania : ellesa havião defendido, e elles a res tau rar ião , se restaurada tinha de ser. De pressa descobrirão os Hollandezes esta miserável política, e preparárão-se a tirard'ella partido : abrirão relações com Bagnuolo, queimprevidente as admittiu; seguiu-se uma troca mutua de cortezias e presentes entre os commandantes, o que desgostou os Portuguezes, e ao inimi<moffereceu ensejo de sondar e apalpar os descontentes.

Encerrando-se no Becife, tinhão os Hollandezes até

aqui deixado os Portuguezes concentrarem n'umponto único as suas forças, e conservavão-se comogente sitiada, posto que tivessem bastante tropa disponível, e fossem senhores, do mar. Agora porem

15

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226 HISTO RIA DO RR AZ IL.1C31- resolverão adoplar medidas mais ousadas, e fizerào

sahir 5,000 homens a atacar a Parahyba. Conhecerão-se então as más conseqüências de Olinda destruída : em quanto os Hollandezes a occupavão, nãopodião os Portuguezes deixar de distrahir parte dassuas forças para vigial-a. Acontecera ter sido aquellaa estação da gente levantada na Parahyba, e comoesta ja para aquelle effeito não fosse necessária,deixou-a Mathias d'Albuquerque voltar a suas casas,fazendo conjunetamente seguir os duzentos homensdestinados a reforçarem aquella capitania. A caravela de Figueiredo, que linha corrido acossada atéao Potengi, e era reputada perdida, também d'ai livelejou para a Parahyba, onde chegou a salvamentoexactamente n'esta critica conjunetura. Levava abordo oito peças de artilharia e alguns bons engenheiros, sobre ir carregado de munições, de que napraça se sentia grande mingoa.

iDeLichtuar Um forte chamado do Cabedello defendia a barra:cerco ao ,

, rf,\ne, „ estava em miserável estado, tendo-se demolido as

do Cabedello. '

obras antigas, e achando-se por completar as novasque devião substituil-as. Lich thart, que commandavaas forças navaes ', queria forçar a entrada, mas ocommandante de terra convenceu-o de que era correr

excusado perigo, pois que as tropas depressa se as-' Segundo o testemunho de .Netscher não foi o almirante Lichthart,

e sim o tenente coronel Callenfels quem commandou esta expedição.F. P.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 227

senhorearião do logar. Infeliz conselho! Fácil era 1631-passar pelo forte, e a Parahyba teria cahido. João deMatos Cardozo, o capitão do forte, era um velho demuita experiência e reputação; consigo tinha 60 homens da sua própria guarnição, e 160 vindos dePernambuco, e con esta gente sah iu a fazer frenteao inimigo. Ao prepararem-se para saltarem terra,

notarão os Hollandezes que os Portuguezes, postadosmais longe do forte, erão os que estavão em melhorordem, em quanto que os que lhe ficavão mais próximos, se mostravão descuidados, dando-se por seguros com a protecção d'elle : desembarcarão poisd'este lado, abrindo na areia uma trincheira para se

cobrirem. Impediu esta trincheira a marcha de600 homens que vinhão da villa; seguiu-se um vivotiroteio, sendo os Portuguezes repellidos para as florestas, através das quaes ganharão comtudo o forte.De noute erguerão os Hollandezes um reducto queos Portuguezes de manhã accommettérão e levarãode assalto, perdendo a vida Jeronymo de Albuquerque Maranhão, irmão de Antônio, capitão da Parahyba. Godinho, que commandava o reforço trazidopor Oquendo, morreu também victima d'uma ridícula confiança no diminutivo da sua estatura. Passeava sobre a muralha, quando lhe pedirão que

descesse, por ter o inimigo assestado a alguma distancia duas peças que jogavão n'aquella direcção : asua resposta foi que não havia artilheiro que acer-

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228 HISTORIA DO BRAZIL.,c51- (asse em tão pequeno alvo, e dentro em poucos m i-

B. Freire. .

§ «•». nulos estava feito em pedaços.Lffd-.nu.ioos Apenas sabido o fim da expedição dos Hollandezes,llollainl.ze, V ' . '

o cerco, mandou Mathias d 'A lbuquerque tjualro companhiasem soccorro da Parahyba. Na mesma tarde do dia dasua chegada derão ellas um assalto ao inim igo , e namanhã seguinte principiarão a levantar trincheirascm frente ás qu e os sitiante s linhão erg uid o. Sucee-

' derâo-se alguns combales bem feridos. Tentarão osHollandezes sem resultado im ped ir o inimigo de conclu ir estas ob ras ; atacárão-nas de noule com a mesmamá fortuna, e outra vez no dia immcdiato á horaque sabiáo deverem os Portuguezes e Hespanhoesestar á meza ou a dormir a sesta, c so a guarda ordinária no seu posto. Foi este um renhido conílielo :os Portuguezes perderão perto de cem homens, entreos quaes o commandante dos últimos reforços, e umFranciscano descalço, que animava os soldados dando-lhes absolvição de seus peccados e combatendo á suafrente. Mais um assalto e teria cabido o forte; masos Hollandezes tinhão sofírido tanto, que levantarãoo cerco , deixando no campo gra nd e parle do seutrem e cento e oitenta mortos.

M.iiocrada Contra o Bio Grande se dirigiu agora a primeiraoiVràTrio expedição. Este estabelecimento devia-o Portugal aos

Orande. . . . . . _ . . _ . .

missionários Jesuítas, linhaoos naturais d aqui in festado seriamente Pernambuco, cujo commandante

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HISTORIA DO BRAZIL. 229

charcontra elles em pessoa; desbaratou-os, mas de 1631-pouco servia pôr em fuga umas poucas de tribus sel-vicolas, que apenas partido o inimigo voltavão aosantigos paradeiros e inveterados hábitos de devastação. Os Jesuítas os pacificarão, ganhando cento ecincoenta hordas á alliança portugueza. Era um dospadres tão mestre na architectura m ilitar como na

de eg re ja s: levantou a plan ta d 'um forte, os seusirmãos derão aos índios o exemplo de trabalhar nasobras carregando pedras ás costas; elles o principiarão e concluirão, e depois de feito ficou sendo a fortaleza mais segura do Brazil, não pelo avantajado dasua posição, mas pela solidez das suas obras e excel- Iie[ (.^

n

lencia da sua construcção. Coroava elle um rochedo fl Uò

á entrada do rio Potengi, e a meia legoa ficavão algumas habitações poucas, que n'este raro-povoadopaiz tinhão obtido o titulo de cidade. Pensarão osHollandezes sorprehender este logar, mas um navioportuguez os havia avistado, e ainda levou a noticia

á Parahyba a tempo de poder o governador mandarpara alli seu irmão Malhias d'Àlbuqu erque M aranhãocom trezentos*Europeose egual numero de naturaes;assim guarnecidas erão as fortificações por demaisformidáveis para que podessem ser investidas com G- Gi^ppe.probabilidade de tr iumpho. § wfTík

•Considerável era ainda o commercio entre Porlu- ln,porl:nicia

gal e Pernam buco , apezar da perda da capital e do de Kam-éthseu imp ortante po rto. Dos navios que se aventuravão,

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651.

230 HISTORIA DO BRAZIL.

grande parte era tomada, e poucos escapavão semcombate, mas os lucros dos que chegarão ao seudestino erão taes que uma viagem dada a salvo animava mais os ave nture iros, do que m uitas perdidaspodião desacoroçoal-os. Vendião as suas mercadoriaseuropeas por preços enormes, onde havia tantoscompradores e tão pouco quem satisfizesse a demanda, e compravão os productos do paiz muiloabaixo do seu valor pela necessidade que todos linhãode vender. Um porto sete legoas ao sul do Becife erao grande m ercado d'cste trafico; chamavão-no Pontalde Nazaré th, d'um serro com uma famosa capella noviso, onde uma imagem de Nossa Senhora de Naza-reth fazia m ilag res e era visitada dos rom eiros. Aboca do porto formava-a um a abertu ra n'esse arre-cife, que se exlende ao correr da costa de Perna m buco; quatro canhões de ferro a dominavam, e na suamarcha do logar onde desembarcara até ao acampamento do Bom Jesus, erguera alli Bagnuolo dousreduetos. A guarnição compunha-se de sessenta praças, que acabavão de ser reforçadas do Porto dosAfogados com duas vezes este numero. Foi a estelogar que os Hollandezes se atreverão em seguida;mas percebendo logo maior demonstração de resistência do que esperavão, costeárào mais meia legoa,pensando desembarcar n'um braço de mar, que fll-gures se mettia pela terra de nt ro . Succedeu poremque uma partida de cincoenta mosqueteiros por alli

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HISTORIA DO BRAZIL. 231

passasse, escoltando uma somma considerável de mi-

dinheiro remetlida pelos mercadores da Bahia aosseus correspondentes aqui para ser empregada emassucar, sendo este então o modo usual de pagamento. Esta gente, vendo os Hollandezes prepararem -se para saltar em terra , postou-se a coberto na espessura, fazendo um fogo constante e mortifero sobreos bateis, que immediatamente se fizerão ao largoaterrados da grande perda que soffrião da parte deinvisíveis inimigos. Concluiu logo o commandanteque dos reduetos se teria feito sahir um destacamentogrande para obstar ao desembarque; a força quen'elles ficara devia pois estar mui desfalcada, e fácilseria sorprendel-a e subjugal-a. Nada tão especiosocomo este raciocinar; ao darem os Hollandezes oassalto acharão alli toda a força dos Portuguezes,forão rechaçados com perda de setenta homens, e áhistoria de Nossa Senhora de Nazareth aceresceumais um milagre. Apezar d'isto, julgou Bagnuoloprudente'plantar aqui um forte, e foi em pessoaconslruil-o, sendo velho e experimentado engenheiro. Ninguém afora elle próprio ficou satisfeitocom a obra; mal escolhido o logar e por demais longe

D. Freire.

da barra. § *&•

Principiavão ia os Portuguezes a desesperar de rroposta.ie1 " °l comprar aos

soecorros efficazes da metrópole, inquielando-os por " " f*

isso tanto mais os boatos que os Hollandezes adrede conqui£l;i;-propalavão de estar a chegar um poderoso arma-

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2.12 \ HISTORIA DO BRAZIL.1632- mento da Hol landa . NYste estado de dcsacoroçoa-

mento t en tou-se uma miserável negoc iação . Fm ta l

Pedro Alvares, que tendo sido prizionciro dos Hollan

dezes co nh ecia a lg u n s dos seus*ofliciacs, foi enviado

com instrucçõês secretas de Duarte e Mathias d'Albu-

q u e rq u e , pa ra v er se o in im igo es tar ia d ispos to a

evacuar a sua conquis ta , recebendo como resgate

os m i lh ar es de ca ixas de assu car em qu e se concor

dasse . Fazendo entes de razão sobre esta proposta,

suppozerão os Hol landezes que os A lbuquerques re -

correr ião a este meio como ao único de p rese rvarem

os seus grandes interesses no paiz, que tanto ser ião

perdidos para el les se os conquistadores se m a n t i v e s

sem na sua pos se, com o se a recu pe rass e o rei , q u e

em ta l caso querer ia ser indemnizado dos seus sacr i

fícios. A lgu ns forão de opinião qu e convinba ne go

ciar sobre esta base, não para vendera praça , mas

para obter par te do assucar . Apoy. m adur a de l i b e r a

ção julgou-sc porem impolilico a n i m a r similhanlcs

prop os tas ; os Por tuguezes acreditarião que mais cedo

ou mais ta rde se abandonar ia a conquis ta , e nenhum

querer ia conf iar nos Hol landezes pondo-sc debaixo

da sua p ro t e c ç ã o , ao que j a a l guns parecião inc l inar -

se . Declarou-se po is a Ped ro Al vares que era intenção

dos Hol landezes gu ard are m e extenderem suas con

quis tas ; mas que se quizesse aconselhar os Albu

querques a d i s i s l i r em de sua inútil oppos ição ,

deixando os conquistadores na posse mansa e paci-

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H I S T O R I A DO B B A Z I L . 2 3 3

fica do paiz, devia esperar bom galardão. O plano do 1632-inimigo era agora tirar aos Portuguezes toda a esperança e reduzil-os á maior miséria, destruindo osengenhos e assolando o paiz.

Alé aqui pouco tinhão os Hollandezes que enso- caiabarberbeccr-se com o tnumpho das suas armas. Havia „ „°s.

* Hollandezeí.

dous annos que erão senhores do Becife, e nada maistinhão adeantado, se não erguerem um forte na ilhade Itamaracá; todas as outras tentativas havião abortado, e os Portuguezes desbaratados ao principio quasique sem combate, possuião ja os hábitos e a confiançada vida militar. Um deserlor veio restabelecera su

perioridade dos invasores. Foi este um mulato1

nascido em Pernambuco, por nome Domingos Fernandes Caiabar, que tinha servido dous annos entreos seus conterrâneos, sido ferido duas vezes e ganhoalguma reputação. Se, commetlido algum crime,fugiu para escapar ao castigo; se o tractamento rece

bido dos commandantes o desgostou; ou se, o que émais provável2, com a traição, esperou melhorar defortuna, é o que se não sabe. Mas foi o primeiro Pernambucano que desertou para os Hollandezes, e sea estes fosse dado d'entre todos fazer selecção de um,

' Todos ns nossos chron istas qualificam a Caiabar de mameluco e

não de mulato. F. P.- Inelinamo-nos para este hypothese pelas razões que minuciosa

mente expendemos em um trabalho nosso e que denominamos : 0llrazil Hollandez, e qu e m ereceu as hon ras da publicação no T. 2 5da Rev. Trim. do Instituto llist. e Geogr. do Brazil. F. P.

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234 HISTORIA DO BRAZIL.

1632. n g 0 ierião escolhido outro, tão activo, sagaz, empre-hendedor e desesperado era elle, nem havia quemmelhor conhecesse o paiz e a costa. Foi recebido comostentoso agasalho. A indiscrição de Bagnuolo deuaos Hollandezes occasião de suborna rem outro aquem tentou o acolhimento feito a Caiabar; e dentroem pouco não podião os Portuguezes fazer movimento que os Hollandezes o não soubessem anles.Alguns soldados napolitanos desertarão, e Bagnuolo,desejando rehavel-os á mão, mandou ao Becife offe-recer prizioneiros hollandezes em troca. Os mensageiros forão relidos alguns dias sem obterem audiência; fez isto crer aos Portuguezes que algumaexpedição se preparava, c logo a todos os postos quejulgarão mais expostos, mandarão recado, que setivessem de sobreaviso especialmente a Nazareth,Serinhaem elguarassú .

Chegou tarde a advertência. Caiabar emprehen-

dera guiar os Hollandezes a esta ultima villa, e en-tregal-a nas mãos d'elles : tão seguro ia do seufeito, que levou comsigo iOO negros para trazeremos despojos. Sahirào os Hollandezes á meia noute,atravessarão as ruinas de Olinda, e sorprchcndéràoa villa, estand o os m orad ores a ouv ir missa. A má

fortuna que os invasores até agora havião experimentado, fel-os tractar os Portuguezes como inimigosde quem tinhão de tirar vingança, não como povocujas boas graças lhes importava conciliar. Os ho-

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236 HISTORIA DO RRAZIL.1C32- onde saquearão e queimarão outro estabelecimento;

depois levou-os ao Bio Formoso, sorprehcndendocinco navios ja quasi abarrotados. Advertidos poreste d esastre, edificação os Portuguezes alli um forte,montando-o com duas peças e guarnecendo-o comvinte homens ao comm ando de Pedro d'Albuquerque,

mesquinha defeza contra similhante inim igo . Caiabarvoltou e investiu o forlim, mas jamais cumprirãosoldados mais resolutamente o seu dever do queeste punhado de Portuguezes. Aguentárão-se atécahirem mortos dezanove; o vigésimo, posto queferido em tres partes, atravessou o rio a nado, e ocommandante acliárão-no estirado por terra, com umtiro de mosquete nos peitos. Forão os Ilollandeztassaz generosos para testimunharem a sua estima atão valente capitão, e tendo-o traclado com especialcuidado, depois de restabelecido o pozerão em terrana America hespanhola, donde voltou á metrópole,

B§ «££" que o galardoou com o governo do Maranhão.Embaraço e Não forão estes os únicos serviços que Caiabar

inBaegnuVe prestou aos Hollandezes; ensinou-lhes o systema deguer re ar , com que tanto havião soffrido, e mostrou-lhes como oppòr emboscada a emboscada, de modoque na primeira tentativa de sorprehenderem o inimigo cahirão os próprios Portuguezes n'uma cilada.Confundido por estas repelidas perdas, ja Bagnuolonão sabia que fazer, nem de que lado apereober-.se para a defeza; sempre os seus destacamentos chegi-

>s

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H I S T O R I A D O B R A Z I L . 257

vão tarde de mais, e exactamenle a tempo de pre- 103-senciarem os estragos que ião a evitar. Assim alena-zado e perplexo, deixou-se elle ficar por algumtempo n'um estado de continuo sobresalto, mas deinacção : envergonhado preparou-se para assaltar oforte Orange, mas com tão pouca precaução o fez,que sabida a sua intenção, foi soccorrida a fortaleza.Tentou comtudo a empreza, despiu o mais próximoestabelecimento portuguez da sua artilharia paraguarnecer as próprias baterias, e desenganado a finalde que nada faria contra tão sólidas obras, retirou-se, deixando estas peças ao inimigo. Não admiraque os Brazileiros o suspeitassem de traição: ha umcerto grau de imbecilidade que com ella facilmentese confunde, pois que produz os mesmos effeitos1.

Entretanto mandou a companhia das índias Occi- osHollandezes

dentaes ao Brazil dous directores, Matlhiis Yan Ceu- envi?°len e Jchan Gijsselingh, como commissarios, inves

tindo-os de plenos poderes, tanto para evacuarem opaiz, caso não vissem esperança de melhor futuro,como para proseguirem na conquista com vigornovo. Trouxerão consigo tres mil homens com provisões e munições em abundância. Menos satisfeitocom este reforço do que offendido por lhe cercearem

a auetoridade, resignou Wardenberg o commando e1 Summamente injusto é similhanle juízo de Southey acerca do

conde de Bagnuolo, a cuja perícia deveu-se a retirada para Sergype ea defeza da Bahia contra Napan. F. P.

commissarios.

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238 HISTORIA DO BRAZIL.1632- embarcou-se para a Hollanda, sendo substituído por

Laurens de Bimbach, velho e experimentado soldadoque de boa mente acceitou o supremo commandom ilita r sujeito á direcção dos commissarios. Depressatomarão estes a sua resolução : os azares da guerraerão agora a seu favor, e persistindo, havia esperançade con quistar todo o paiz. Principiarão pois por fazeraos Portuguezes uma proclamação, em que depoisde offerecerem protecção a todos, que se submellcs-sem, proleslavão com sin gular descaro que os Hollandezes erão innocentes deante de Deus edo inundode quaesquer desgraças e estragos que resultassemda prolongação das hostilidades jaecrescentando q u e ,se o povo persistisse na sua opinião, devia preparar-se para todas as extremidades d'uma guerra justa daparte d'un inimigo, cuja paciência e clemência li-

V>'; 2981' n n ^ ° s ' u 0 P o s l a s á m £ u S u u r a prova.Tiverão os commissarios a fortuna de descobrir as

relações secretas que com os Portuguezes tinha umcerto Leonardt Van Lom, funecionario civil no Becife.Este miserável aven tureiro viera da Hollanda a persuasões d'alguns Portuguezes de Amsterdâo paraservir de espia, com promessa de que receberia cin-coenta mil ducados, se em conseqüência das suas

revelações se restaurasse a cidade. Todos os que tomarão parte n'esle Compromisso jurarão solemnc-mente que, se um fosse descoberto, não denunciariaos outros, e sobre isto ouvirão missa e partirão uma

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HISTORIA DO BRA ZIL. 239

hóstia. Van Lom comtudo tornou-se suspeito, e sendo 1632-descoberto, confessou tudo. Cortárâo-lhe dous dedosda mão direita, e foi depois decapitado e esquartejado; quanto ao mulato, que servira de mensageirona correspondência com os Portuguezes, foi estrangulado e decapitado.

Havia sobre o rio dos Afogados um posto deconsi- victorias. . . dos

deravel importância, como situado onde principia a Hollandezes.fértil planície de Capibaripe * : tendo-o assaltado noanno anterior, havião os Hollandezes sido repellidoscom considerável perda. Benovando agora com maiores forças a tentativa, tornárão-no, e passando adeante

guiados por um desertor até segunda estação, egual-mente a ganharão. Na sua defeza se distinguiu oFranciscano Fr. Belchior; com um chuço por arma,matou quanto Hollandez se lhe poz ao alcance peloque e por outros serviços análogos, levando-se-lhetambém em conta os merecimentos religiosos, foi

depois feito bispo. D'ahi a pouco salteárão os Hollandezes terceira estação, com maior perda para os Portuguezes e menor para elles próprios. Tinhão adop-tado agora esse execrável modo de guerra que osHespanhoes practicavão ao principio contra os índios,e ensinavão cães a perseguir os fugitivos que se em

brenhavão pelos pantanaes. Tomadas estas estações,erigirão na primeira um forte, que chamarão Wil-lem, guarnecendo-o com força sufficiente.

1 Alias Capeberibe. F. P .

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24 0 HIST OR IA DO BRA ZIL.

1Gy- A n i m a d o s c o m e s t a s v i c l o r i a s , resolverão os H o l -Assaltão o s , , . ,

Hoiiandi-zes,o landezes a s s a l t a r o a c a m p a m e n t o , e c o m o v e r d a d e i r oa c a m p a - l

'"repeiiiVs1 " e s p i l u ü d'um desertor, recomiiiendou-lhcs Caiabarque escolhessem o dia de sexta feira saneia ', em que

, os Portuguezes estarião entretidos com as ceremoniasda sua religião. Se enlravão o acampamento, dizia-

se, era d'elles a província. Commelteu Bimbach cmpessoa a einpreza á lesta de tres mil homens', masos Portuguezes *ouberão-lhe en tempo do desígnio ;concentrarão pois as suas forças e ao approximarem-sc os assaltantes, romperão contra elles um fogoterrível. Talvez por falta de outras carregavão-se com

balas de mosquele as peças, o que tornava mais mortíferos os tiros, cahindo o próprio Bim bach. A suamorte derramou a confusão entre os Hollandezes, e,se os Portuguezes os tivessem perseguido na retirada,teriâo ganhoassignalada victoria; mas Bagnuolo, queprezo pela go la, assistia á acção sentado numa ca

deira, reprimiu o ardor dos seus, dizendo que a fugado inimigo era provavelmente um estratagema paraallrabil-os a uma cilada, e assim se perdeu a ocea-

10'"- sião que não volta. Do pouco cuidado que á llespanha merecião estas colônias é prova nào ter Mathiasd'Albuquerque, apezar de dever a cavallaria ser da

» Concorda a mór parte dos chromstas que fora este assalto iaquinta-feira (Tendoen<;as. F. P.

* Diz iNetscher que apenas mil e duzentos homens  cominand.ua Rimbach. F. P.

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HISTORIA DO BBAZIL. 241

maior utilidade para os Portuguezes e dar-lhes deci- 'm:>-

dida vantagem sobre os invasores, podido nunca obtermais do que uma companhia e essa mais nominal do s*í K J&

que rea l, pois queso vinte praças erão montadas. §46477-Tendo sido quem aconselhara este desgraçado as- i * ™

salto, receava Caiabar não estivessem por tal os Hol- 'lelUimain<:

landezes indispostos contra elle , e para restabelece r

o seu credito propoz a Sigismundo Van Schoppe, onovo commandante, conquistar a ilha de Itamaracá.0 primeiro mallogro de egual tentativa fora maisdevido á culpa dos próprios invasores do' que aosmeios de defeza que possuíssem os Po rtuguezes , porisso fez-se agora sahir uma força adequada. Depressa

perceberão os Hollandezes que havia no forte faltade gente e de munições, e duas mulheres que apre-hendérão no bosque, conlárão-lbes que tudo quantoera do sexo feminino tinha sido posto fora pela escassez dos viveres. A' primeira intimação respondeu combravura o capilão Salvador Pinheiro : não estava tão

mal provido como su pp un hão , disse, e em ultimocaso sabião os Portuguezes roer solas, quando o serviço do rei o exigia. Mas ao fazer-se-lhe segundaintimação por intermédio d'estas mesmas mulheres,vendo que era descoberta a sua fraqueza, ped iu ellesuspensão de arm as por qu atro horas ; concederão-lheduas, e n'esse espaço capitulou com condição de sah ira guarnição com armas na mão e mechas accesas, elevar as imagens e alfaias de egreja, e todos os mora-

n. 10

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2 4 2 H I S T O R I A l> < i B R A Z I L .

i6od dores que quizrssein abandonar a ilha. poderião lambem fazel-o livremente transportando com sigo osseus haveres. Assim se rendeu a villa da Conceição ecom ella toda a ilha. Os Hollandezes cantarão 7VDeiiin na abandonada egrcja, dando salvas de alegriapor esla fácil e importante conquista. Marchava Mathias dWlbuquerque a soccorrer a praça quando lhechegou a noticia do seu rendimento, c nVslas marchas e contramarchas se exlenuavão de corpo e espirito as tropas brazileiras. Iguarassú tinha sido reoc-cupada pelos Portuguezes depois da sua destruiçãopelos Hollandezes, e Figueiredo, o mesmo official quetanto a tempo trouxera soecorros ao forte do Cabedello, e se distinguira na sua defeza, aqui c o m mandava: impossível era porem defender este posto contrainimigo tão superior, pelo que foi abandonado áapproximação d'elle. Foi esta uma perda considerávelpara os Po rtuguezes, qued'alli liravão supprimenlosde ge nle , dinheiro e nianliiiicnlo. A maior parle dasriquezas que se tinhão podido salvar d'01inda aquiestavão depositadas, e entre os despojos que eahirào

c. ii.ii. agora nas mãos do inimigo acharão se ouro c jóiasJ->w 'à;.»i'!' em considerável quantidade.

Como logar onde em perfeita segurança dos Por

tuguezes podião fazer suas plantações, era a ilha dellamaracá da maior importância para os Hollandezes.Dous Francezes vindos da Europa a eslabcleccrem-scna ilha de Fernão Noronha, para aqui forão enviados

M.iir^í? u.if«d» -ti u n i a .

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HISTORIA DO BBA ZIL. 24 3

com obra de trin ta n eg ro s d 'am bo s os sexos, a fim d e "103r

'cultivarem differentes gêneros para uso da compa

nhia D'aqui também os Hollandezes infestavâo o

nor te de Pernambuco . Emprehendérão u m a e x p e

dição con tra um log ar qu e elles próprios chamão

Mongianguape onde t inhão os Jesuí tas uma r e s i d ê n

cia, e para onde se havião ret i rado as t ropas da guarnição de Igua ras sú . Não erão estas assaz numerosas

para poderem resis t i r com a menor esperança de

bom resul tado, e a inda descobr i rão o in imigo a

tempo de effectuarcm a sua re t i rada . Vingárão-se os

Hollandezes sobre o log ar , qu eim an do todas as sua s

vistosas ha bitaçõ es, qu e com o taes as de scr ev em .Procederão assim por que os Jesuí tas mantinhão os

espíritos do povo alli e em todas as partes do paiz,

pelo que por força havia de ser destruido esle n i n h o .

Com o m esm o sentimento de vingat iva host i l idade se

enviou de Ilamaracá um des tacamento cont ra o en

genho de- João da Costa Brand ão , por ser ho m emactivo na defensão do paiz. A casa de residência e

todas as obras com alguns 1000 pães de assucar nas

formas, tudo foi preza das c h a m m a s , e aos demais

edifícios fez-se o mal que o tempo p e r m i t t i u . 3oie, SM!

Quando na Europa se regulavâo as hos t i l idades Esta-

unicamente pelas leis que ás partes belligeranles « S ede guerra.

aprazia pôr a si m es m as , cham ava - s e a gue r r a boa

ou má, seg un do o esp irito com q ue se fazia : na má

não devia o mais f raco esperar c l emênc ia . Mas pelos

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ItlJ.I

2U HISTORIA DO RRAZIL.

fins do século décimo sexto foi preva lecendo ge ralmente o systema moderado, posto que mais pelamutua vantagem que n'isso ia para todos, do que porque se tivessem tornado mais hum anos os principies .De natureza anômala fora até aqui a guerra no Brazil : dava-se ou não se dava quartel, e os prizioneiros,

se não erão immolados, nem por isso deixavào deficará mercê do aprezador. Bagnuolo propoz agoraque se pozesse term o a este systema, que levava atantos actos de barbaridade, e que se fizesse a guerrasegundo os princípios seguidos nos Paizes Baixos.Com prazer foi aeceita a proposta, e concordou-se nas

condições. Não se queimaria egreja alguma, nem sedeslruirião ou desacatariam imagens; mas se de dentro de qualquer templo se oppozesse resistência, ouse alguém tentasse fortificar-se em alguém, não seriaem tal caso obrigatório este artigo. Km batalha,recontro, emboscada, ou de qualquer fôrma que um

soldado cahisse no poder do inim igo , logo que pedissequartel, nenhum mal mais se lhe faria, entregandoo prizioneiro as suas arma s e quanto comsigo levasse,exceplo camiza, calças, gibão, meias e sapatos. 0resgate d'um mestre de campo, oifi-rcll-herr, oucoronel, foi fixado 11'uin inez de soldo; um lenenle

coronel, sargenlo-niôr 1; commissario de ordcnaiiçasdevia pagar na mesma razão; um capitão quarentacruzados de dez real es de prata eida um ; um tenenteo soldo d'um mez; um a I feres ou porta-bandeira

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HISTORIA DO BRAZIL. 215

quinze cruzados; um sargento ordinário, nove; um

soldado razo, quatro. Os prizioneiros devião requisitar do commandante da praça para onde fossemremettidos um tambor que aos seus conterrâneoslevasse avizo do numero e nomes d'elles, e o resgatedevia ser pago dentro de vinte dias depois de feita anotificação; passados trinta dias sem se fazer inteiro

pagamento tanto do resgate como da conta das come-dorias, perderia o prizioneiro o direito a quartel,ficando á mercê do aprezador. A taxa para mantençad'um soldado foi fixada n'um real de prata por dia.Os marinheiros forão comprehendidos n'eslas condições, quer aprizionados em combate por mar ou por

terra, quer atirados á costa pela força do tempo; masos que viessem em navios pertencentes á coroad'Hespanba serião excepluados, excepção que os Portuguezes não devião tera dm iüid o, salvo entendendo-sc que estes serião trocados na Europa.

Outra prova de que os Hollandezes representavão

o papel do mais forte na eslipulação d'estas condições é que o respeito dos paizanos devião seguir-scas mesmas regras que nos Paizes Baixos entre ossubdilos do rei e as Provincias-Unidas, pois que emvirtude d'este artigo os habitantes que fizessem causacommum com os invasores, ficavão exemplos do

justo casligo que alias receberião. índios e negrosdevião pagar a metade do resgate d'um soldado, masse se servissem d'armas defezas, não terião direito a

le ;

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1 0 " .

2 4 6 H I S T O R I A R O B R A Z I L .

quartel. Não se havia de atirar com balas envene

nadas, mastigadas, entrançadas ou encadeadas, nemcom pedaços de ferro ou chumbo. Tão pouco se deviafazer uso de e spinga rdas de cano raiado' (é este talvezo único caso em que a moderna practica de guerraé menos escrupulosa do que o costume d'aquellcs

tempos); as armas de fogo legaes erão arcaluizes,

mosquetes, espingardas de fuzil, clavinas o pistolas.Nenhuma offensa se faria a qualquer prizioiieiro, eos clérigos, mu lhe res e crianças terião as vidas salvas.O resgate d'um capellão fixou-se n'um mez de salário, e o d'um religioso, ou padre d'aldeia, em quatromoedas de oito. Pregadores, preleilores o m l e s i a s -

ticos da communidade hollandeza serião equiparadosa cappellães. Se um so homem fizesse muitos prizioneiros, ficaria detido o principal dVnlrc estes, eserião soltos os oulros, obrigando-se estes pelosrespectivos qu inhõ es de resgate para com o seu representante forçado. Todo o prizioneiro convicto de ler

occullado a sua verdadeira qua lidade e condição, cnegado a verdade, seria castigado como merecia paraexemplo. Quem quebrantasse estes termos, ou violasse o quartel dado, seria punido do morte paraplena salisfacção da parte contraria. Todos os prizioneiros existentes serião sem resgate postos em liber

dade por ambas as parles. Esles artigos forão assi-

1 Rifle barrelled guns.

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menln.

HISTORIA DO BRAZIL. 247

gnados por Mathias d'Albuquerque e Bagn uolo d'um lü53-

lado, e po r Van Ceulen e Sijsselingh do o u tr o . ' 351.°c'

Debalde recorrião os Brazileiros ao seu governo Emprehen-dem os

em busca de au xilio efficaz; p er su a d id a , ou affec- m]afJ™S0

lando-se persuadida de que não tard ião os H o l l a n - '

dezes a cançar-se d 'uma conquis ta , tão obs t inada

mente disputada, parecia a corte de Madrid com asua inércia que r e r entregal-a a el les . As perdas que

em lantos combates soffrião os Por tuguezes por

nenhuns reforços erão reparadas , nem contavão ja

mais de 1200 hom ens , em quan t o que o i n i m i go

continuamente estava recebendo supprimentos de

tropas e maleriaes . Perceberão os commissarios afraqueza dos Portuguezes, e pensando entrar o acam

pam ento por meios m ais vagarosos, po rem m ais se

guros e menos arr iscados do qu e assaital-o, resolverão

pòr-lhe cerco em re g ra . Bagnuo lo estava então a u

sente, inspeccionando as suas novas obras no Naza-

r e l h . Mathias de Albuquerque apenas soube do quese preparava , mandou-o chamar , reuniu toda a sua

pequena força, fez sa hir do acam pam ento q ue m não

podia pegar em armas, e poz fogo aos cannaviaes na

direcção em que podião en co brir os m ovim entos do

inim igo . Occupárão os s i t iantes as suas posições, m as

um a difficuldade havia que cont inuava a ser insuperável. Os quartéis ficavão apenas a meia legoa do

forte W i l l e m ' , comtudo era quasi impossivel arrastar1 llonslruido 110 local do antigo forte Emilia. F. P .

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 2 4 9

tbeatro da guerra, nem por isso ficavão fora do aí- 1C35-cance de Caiabar, que lá levou os Hollandezes, equeimou a primeira aldeia. Descrevem estes a po-voação como não somenos que Iguarassú e egual-mente bem edificada. Também queimarão muitascasas boas dos arredores. Procurarão uma grandeporção de pau brazil, que um dos prizioneiros disseter sido por alli algures enterrada ou escondida porfalta de opportunidade de exportação, mas receandoalgum estratagema, desistirão da busca. A segundaaldeia, que ficava a um dia de jornada, soube defender-se melhor. Este systema de guerra era lerrivelpara os habitantes do paiz, mas dizia m elhor com oespirito vingativo d'um desertor, do que com asvistas dos Hollandezes, da pa rte dos quaes havia tantafalta de política como crueldade em assolar umalerra que esperavão possuir. Nem tardou que obtivessem vantagens mais importantes.

Francisco de Yasconcellos da Cunha veio de Lisboas Joscom dous galeões e cinco caravelas, Irazendo seiscen- uí^iofpo,

, - . Va.-co i.tello.-.

homens e muilos suppnmentos de todo o gênero,ossoecorros de grande importância para as débeisforças dos Portuguezes. Chegou a frola á vista daParahyba, Ires legoas ao norte da barra, perto do

rio M amangoape, onde eslava estacionado um officialportuguez com alguns dos melhores pilotos da costa,por ser paragem freqüentada dos navios de Lisboa.Um destes pilotos linha avistado um navio hollan-

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11 . 1 ' i r Í I ' C .

S í l l » T - l l .

2:»0 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

dez, que disparados alguns tiros de peça, se fizera

no rumo do sul; apenas apparcceu a esquadra, sahitielle a dar parle d'islo, accrescenlando que erão estestiros signal para reunir outros navios que andavãocruzando de conserva. Aconselhou pois ao commandante que se acolhesse áquelle porto, dizendo que apilolal-o vinha. Em logar de seguir imniediatainenteo conselho, reuniu Yasconccllos os seus officiaes, edeixou-se persuadir por"elles a seguir trinta legoaspara o norte até ao Potengi. De manhã achou-seperto da Bahia da Traição e viu Ires navios hol lan dezes, que vinhão a inveslil o. Das caravelas umasencalharão, outras entrarão no Potengi, onde forão

tomadas. Não tentarão os Hollandezes ab orda r osgaleões com receio das tropa s, mas tal fogo fizera osobre elles, que obrigarão o mais pequeno a vararem terra, salvando-se a gente, parle da carga e dezpeças d'arlilharia. 0 outro sustentou a acção peloresto do dia, e de noute melleu-se á Bahia Formosa,

onde Yasconccllos desembarcou immedialamcnte asua gente. De manhã entrarão lambem os Hollandezes e da pr im eira bordada meltérão no fundo onavio, ja meio despedaçado do combate da véspera.

D'esla deserta enseada removeu Yasconccllos atropa e o material que pôde salvar, para uns enge

nhos de assu car, qu e fica vão cinco legoas terra adentro. Apenas d'islo se soube no acampamento, ordenouMathias d'À lbuq uerque que os artigos menos volu-

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 2 5 1

mosos e mais preciosos seguissem por terra, embar- 1G33-cando o resto em Cunhau, porto que ficava a seislegoas d'alli, onde quatro barcas da Parahyba esla-rião promptas pare recebel-os. Escoltou pois Vascon-cellos o seu material até á praia, viu o melter a bordo,e dando tudo por feito, voltou aos seus quartéis. Mallinhão as barcas suspendido ferro, quand o virão virentrando um galeão hollandez e quatro sumacas,embarcações ligeiras que serviâo para entrar nos riosque não admillião outras de maior calado. Debaldctentarão os Portuguezes escapar; pozerâo fogo a tresdas suas barcas e a quarta foi tomada. Mas agoravirão-se os aprezadores a seu turno cm perigo,deixando-os avasante na barra a tiro de escopeta dapraia. Depressa teve Vasconcellos avizo d'is to e volveuatraz a atacar o inim igo; cahiu a no ule , estava ellea uma legoa do lheatro da acção, e os seus officiaespersuadirão-no a desviar-se um pouco para onde fica vão uns pastos nos quaes a gente poderia descançare refrescar. Nem a elle nem a nenhum dos seus conselheiros cnlrou na cabeça que a m aré não esperariapor elles, e quando na manhã seguinte chegarão ápraia onde iiião os Hollandezes! EsLcs com a pressade safarem-se linhão deixado de revistar uma dasbarcas, que incendiada pelos Portuguezes, não haviacom tudo ardido, e o que n'ella se achou foi o queescapou de lodo este comboio, tendo perdido Yasconccllos nãoso os seus sele navios, mas também tres

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IItioGrame

2ò2 HISTORIA DO RRAZIL.

1655. AJndos em seu soccorro. Durante todo o correr dagu err a nun ca os Portuguezes soffrérão m aior perda,nem quiçá m aior dcsa ire. Dos seiscentos homensque vinhão na armada, apenas cento eoitenta chegarão ao acampamento.

ehuo do Foi Bagnuolo agora a Parabvba a inspeccionar umnovo forte, chamado de Saneto Antônio, que se estava erguendo do lado opposto do rio defronte do doCabedello para melhor dominar a entrada. Malhiasd'Albuquerque o acomp anhou. Emquanto ambos assim estavão oecupados, sabiu do Becife uma esquadra contra o Bio G rande , logar para alacar o quallinhã o vindo da Hollanda ord ens reiteradas : o destacamento era forle, e mais formidável o tornavaachar se Caiabar a bordo. Pedro Mendez de (iouvoacomniandava a importante praça do Bio Grande;tinha treze peças c oitenta e cinco homens, com quebem podia defender tão segura fortaleza, e mandoupedir soccorro á Parahyba, como á eslação maispróxima. Solido com era o forle, tinha a grandedesvantagem de ficar-lhe a cavalleiro uni oulciro deareia, que nem todos os esforços dos Portuguezes poderão lirar d'alli , pois mal o arrazavão, njlindava ovento outro no mesmo logar, o que talvez fosse devido ao próprio forte, e Caiabar sabendo d'is(o, parualli conduziu o.s sitiantes. No segundo dia foi Couvi aferido, achando-se sobre as muralhas, e impossibilitado de fazei' couza alguma, em conseqüência do que

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251 HISTORIA in> RRAZIL.1633. o castigo que infam a. Quan to peor me tradárão os

Portuguezes, tanto maior será o vosso e o meu merecimento, conservando-nos lieis ao serviço dVUfs,especialmente agora , que o inimigo os ajnrla. Ou

virão-lhe os seus as razões e elle levou aos seus op-pressores um corpo de alliados constantes, com os

quaes os serviu tão bem, que mereceu na historiamenção honrosa.

Fazem o, Mas lambem os Ho llandezes acharão alliados entrellollamlezcs „„ . , , , , . .

a i i i a n m s o s naturacs, e os Portuguezes sotlriao dos Índios dezentre °

ns selvagens. v e z c s m a j o r ( | a i l i n i) do filie CailSavão. Do Becife SC

enviarão alguns Tapuyas á capitania do Lio Grande

antes da tomada do forte, para que da força e poderque tinhão os Hollandezes de conquistar o paiz e da

resolução em que estavão de o fazerem, informassem os seus conterrâneos. Ao desembarcarem enlrogarão ao capilão hollandez uma corda com dezoitonós, dizendo-lhe que cada dia desdesse um , e pro-

mellendo estar de volta ao desatar-se o ultimo. Masdepois de ter aguardado vinte c Ires dias, fez-se o

navio de vela sem os índios. Nove annos antes d'cstaepocha tinha Bandervijn Ilendrichsz levado jovensindígenas da Bahia dafraiç o para a Ho llanda, ondeforão cuidadosamente educados ao geilo dos Hollan

dezes, sendo cinco dentre elles enviados por diffe-rentes vezes aos .landins, tribu tapuya, que habitavano sertão da capitania, e passava por ainda maisbarbara do que qualquer outra da mesma raça.

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HISTO RIA DO BR AZ IL. 257. . . • , 1033.

havião principiado a exercer a sua vingança sobre ooado, quando nada mais encontravão que trucidar,e dentro d'um cercado, onde tinhão sido mortos porgosto, apparecérão as assadas de mais de duzentosanimaes. 0 paiz pareceu aos Hollandezes tão agradável e fértil como podia desejal-o o coração do ho

mem, mas maravilhou-os que os Portuguezes fossemdar o nome de Bio Grande ao Potengi, que quatrolegoas acima do forte deixava de ser rio, posto quena sua foz fosse tão largo como o Mães. Os naturaesporem lhes disserão que a torrente havia sido antigamente muito mais considerável, e mostrarão um

leito secco por onde ella correra . 0 que tinha sidofeito das águas não o sabião, mas alguns d'ellestinhão seguido este canal secco tres semanas pelosertão dentro, vivendo decaça, raizes e cajus.

Às hordas tapuyas, que obedecião a Jandovi, erão d0s™f^°,chamadas Tararynck pelos visinhos, e olhavão como

sua uma extensão de terras banhada por cinco rios.0 primeiro d'estes, conhecido por dous nomes, Wa-rarugi e Ociunou, dizião alguns que ficava a cincodias de jornada do Potengi, indo mulheres e crianças no farrancho, outros que a dez. 0 Quoaouguhcorria a um dia de jornada mais para Ia, e o Ocioro

a outros dous. Nenhum d'esles nomes se pode jareconhecer1. A pouco menos de dous dias mais

1 Salvo suppondo que o Ociunou e Ocioro, por um engano possível,trocassem na lista a sua ordem natural, caso em que o segundo bempoderia ser o mesmo que o Ceará Mirim.

i i . 17

J. de Laet-101-2.

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2 . \8 H I S T O R I A DO B R A Z I L .

*,,::' adeante ficava o Upanema, ainda assim chamado '; emeio dia alem o AVoroiguh. Todos estes rios se in-culcavão consideráveis. Também havia dous lagossalgados, um perlo da cosia, o outro no inte rior , aque um soldado ho lland ez, que o foi ver, calculouoito milhas de circuinferencia. Julgavào-se estes Índios cgualmente com direitos ao Ceará, d'onde ali-menlavão a esperança de expellir os Portuguezes.

A nação que se reputava senhora legitima dYslevasto território compunha-se de cerca de 1,000 pessoas, divididas em duas tribus, uma debaixo doman do de Jandovi, a outra quecomprehendiaa maiorparte da mocidade, debaixo de Wesetyawa. Cinconações estavão alliadas com esla; os Arykcuma ouAeiki, de quem era cacique Coctaouly, povo fracocuja alliança parece ter sido um estado de sujeição;os Juckeryjou ás ordens de Marikaou, «pie ja linhãoservido no arraial do Bom Jesus contra os Hollandezes; osKereryjou ou 0c ionec iou \ debaixo de Nonhu(quando oceorre esta dupla nomenclatura, uma é adesignação tupi, oulra a tapuya 3 , do que se pôdeinferir que em ambas as línguas era significativo onom e); os Pajoke sob Kidoa, e os Aponoryjou sob

i Denomina-se hoje AppoiK. F. P.

* lie lal modo se acham desfigurados estes nomes qm : difíicll («achar os seus correspondentes nas nossas chronicas. F. P.'• Como ja fixemos ver nunca a palavra taputpi designou trihii alguma

entre os indígenas do Brazil : sendo synonvma da de bárbaro comque cs Tupis niilii0sca\aiii us seus contrários. K. P.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 259

Jarepo. Todos estes confinavão com Jandovi pelo ser- 1G"tão, e como elle estavão separados do Bio Grande porum paiz que a falta de água tornava difficil de atravessar. Por inimigas tinhão quatro nações: os Jenhodebaixo de Kischonou, que vivião tão perdidos pelointerior, que de nenhum povo christão tinhão nemsequer conhecimento; os Woyana, cujo cacique eraWaracapo-wassu; os Carary, que obedecião a Kinioou-koiou, elicavâo muito atraz do acampamento; e osCarary-wassu, ou Carary Grandes, que linhão porchefe Ca rapo ta, e habitavão na mesma direcção. Estastres ultimas tribus linhão servido os Portuguezescontra os Hollandezes. 0 povo de Jandovi nada sabiados Aymorés, que, segundo os Hollandezes, nuncapassarão para o norte do S. Francisco. Taes forão asinformações sobre o paiz e seus selvagens hab itantesque os Hollandezes obtiverão dos alliados Tapuyas. ' 403.M

0 interprete que linha sido enviado a Jandovi Negociações,, „ , . . com Jand ov i .

trouxe resposta que elle nao podia vir com o seupovo, por não se achar água no verão entre o Ociunou e um cabeço alto chamado iMoytyapoa, n u m adistancia de tres dias de jornada, excepto algumapouca aqui e alli nas fendas dos rochedos e essa sa-lobra. Suppoz-se que seria isto máo humor, pelo

que se lhe mandou uma carta em devida forma,manifestando o desejo que o s senhores ho llandezeslinhão de ver Jandovi, rei dos Tararynck, pa ra aju starem com elle quanto havião de dar-lhe por cada

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1032 6 0 H I S T O R I A D O B R A Z I L .expedição contra os Portuguezes. Sentiào, dizia amissiva, que d'outra vez, qtrt; viera ao Bio Grande,tivesse regressado pouca» satisfeito, mas escusavão-sede toda a culpa, pois que não lhe sabendo das intenções, tinhão ido tractar d'oulras couzas necessárias,

alem de que não fora favorável o vento para trazel-os.Para outra vez que desse a conhecer o seu intenlo,para que elles podessem cooperar, o que era impossível sem tal recado prévio. Davão-lhe parle que csla-vão a ponto de tomara Parahyba, e emquanlo alliestivessem cnlrctidos, iria boa parle de suas tropas

reunir-se a elle, e assolar o paiz para cortar ao inimigo lodosos soecorros por terra, sendo os Hollandezes senhores do mar, o que seria de grande vantagem para elle Jandovi e seu povo, pois que nãofaltavão engenhos com abundância de despojos paratodos. Também lhe mandarão presentes e mais llic

terião mandado se houvessem achado Tupis paracargueiros através do paiz secco, pois que não havia(jue fiar nos subditos de Jandovi, que ja uma voztinhão aberto uns pacotes que lhe erão destinados cfurtado o que ia de ntr o. Assim mesmo o presentearãocom um vestido húngaro carmezim e outro còr de

laranja; alguns fardos de artigos de veslidura maispequenos, duas dúzias de camizas, tres hallabardaspequenas douradas, tres facões prateados, uma dúziade machados, duzentas navalhas, e uma immensi-

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HISTORIA DO BRAZIL. 261

Tararynck que linda vindo ao Bio Grande se deu uma 1633-camiza, algumas navalhas e uma boa ração de vinhopara dous dias de jornada.

Assim attrahidos pelo cheiro dos presentes, da r a - l H o ^ e ° * s

pina e da vingança, affluirão os selvagens de Jandovi deVnhan.á cosia, onde tomarão terríveis represálias por passadas offensas. Os Portuguezes os tinhão pela. maisbarbara das tribus tapuyas, e n'esla occasião bemjuslificárão'a sua preeminencia na deshumanidade,assassinando mulheres e crianças, velhos e doentes,na ausência dos que terião defendido suas familias,senão andassem em armas alhures, sem suspeita d'estainvasão terrível. Por este tempo dous marinheiroshollandezes, que feitos prizioneiros com seis camaradas tinhão sido postos a trabalhar nas forlilicações deCunhau, da caravela onde eslavão detidos no rio saltarão á água, nadarão para a margem do norte, cchegarão ao forte do Bio Grande. As informaçõesdadas por estes .homens induzirão os Hollandezes aemprebender uma expedição contra aquella praça,indo Stackhouwcr por mar e Artiszensky por terracom pouco mais de duzentos hom ens, sendo a quintaparle Tapuyas. Approximou-se este ullimo na escuridão, os cães dentro do forle fizerão o seu dever,

. mas a guarnição apezar de assim despertada não sequiz incommodar a ir ver se havia perigo, e graças aesta indesculpável negligencia foi sorprehendida,perdendo-se sem difíiculdade uma fortaleza muito

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2 6 2 H I S T O R I A D o R R A Z I L .,r,:'3 capaz de resistir a similhanle ataque. O capitão Ál

varo Fragoso dWlbuqucrque foi feito prizioneiro comtreze homens, onze forão mortos, o resto escapoupela fuga. Quando Stackhouwcr chegou, ja a partidade terra estava de posse da fortaleza. São era intenção

dos Hollandezes guardal-a , pelo que despindo-a detudo, carregarão o que lhes fez conta n'uma caravelaque por falta de conhecimento do canal bateu naspedras n'um logar onde nada pôde salvar-se. Ar-

liszensky explorou o rio, para verse alli se poderiafacilmente desembarcar gente que marchasse con Ira

a Parahyba : mas havia no c am inho Ires rios quelornarião por demais difficil a marcha. Feito istovoltou ao Becife. Assim que Jandovi soube de tal,mandou recado aos Hollandezes que muito folgavacom haverem elles tomado o forte; senlia poremterem dado quartel aos Portuguezes em logar de

exterminal-os todos, acerescentando que se aquelladevia ser a practica, não contassem com elle.

o5 Tiimims. Ao mesmo tem po tinhão os Portugu ezes ou tro inimigo incommodo. Obra de trinta legoas pelo sertãodentro ficavão extensas florestas de palmeiras chamadas o s / V z / w m ; era alli o refugio dos negros que

se evadião á escravidão, eque provav elm ente escolhé-rãoo sitio pela similhança que offerccia comjjscena-riodo seu próprio paiz. Das myriadas d'esles desgraçados, que linhão sido importados no Brazil, muitos

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H ISTOR IA DO BBAZIL. 265

Em fins de fevreiro sahiu do Becife o com m andante ^ ^hollandez, levando uma força tão considerável, que s 7 ^ | d "

Mathias d'Albuquerque entendeu poder sorprehen-der-lhe a praça. O seu intento era atear-lhe fogo edestruir os depósitos. Havia um logar onde o Bebe-

'ribe era vadeavel na vasanle, e o melhor forte doinimigo dominava este vau, defendido também porum navio de oito peças e cincoenta homens de tripulação. Martim Soares Moreno foi enviado com quinhen tos hom ens a ten tar esta passagem á meia no ute ;ora nadando, ora vadeando effectuárão-na uns cem,e pensando que os companheiros os seguião, avançarão para o isthmo de areia que liga Olinda ao Becife.Aqui eslavão ainda por completar as obras ; derãorebate as senline las, mas os Po rtuguezes , atacando-aslogo, romperão avante. 0 premeditado intento tinhaporem sido atraiçoado por um Portuguez que, ha-vendo-o sabido d'um desertor, avizara o commandante de Ilamaracá, pelo que estava prevenido oinimigo. Apezar de tudo não causou pequena confusão o repentino do assalto. Um dos commissarios,que ficara com o commando, metleu-se no primeiroescaler que encontrou e fugiu para a i lha ; outrasfugião d'esla para a cidade. Infelizmenle os Portuguezes, embora conduzidos por um de seus melhoresofüeiaes, não sustentarão a empreza com a mesmaousadia com que a havião commcltido : os fortes eo navio vigia linhão aberto fogo sobre o va u, e em -

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2C6 H I S T O R I A H O B R A Z I L .

bora estes tiros ao acaso pouco damno podcssenicausar , aterrarão o grosso dos assaltantes. Os queestavão ja na água, retrocederão, os que ainda nãolinhão entrado ífella, preferirão não o fazer, e quatrocentos da partida abandonarão assim á sua sorte

os que tinhão sido mais valorosos do que elles. Kstcsvalentes, sentindo chegar o dia, o vendo que ninguémi s apoiava, tiverão de retirar-se pelo vau, levandoás costas os feridos. Os Portuguezes, ignorando queo seu intento linha sido atraiçoado, acreditarão quese lodo o destacamento tivesse feito o seu dever tão

bem como os cem, ter-sc-ia n'aquellc dia restauradoo Becife; e os próprios Hollandezes reconhecerão que,segundo todas as p robabilid ades , lhes lerião os assaltantes deslruido os depósitos, se o Senhor os nãohouvera livrado de tão gra nd e calam idad e, deixando- "os pela sua misericórdia, saber do que se preparava.

tiaqueconira A avtillada força, cuja ausência do Becife animaraos Portu gu eze s a este atrevido assalto, dirigira-se aParahy ba. Desde o pr inc ipio do anno tinhão os Hollandezes recebido consideráveis supprimonlos e reforços, c reputando lanlo o arraial como Nazaré thfortes de mais para serem alacados com perspectiva

de bom resultado, resolverão tentar fortuna contraa Parahyba, qwe linhão repelidas vezes recebido ordem de tom ar, e sem a qual jam ais poderião manterse na posse pacifica do norte do Brazil. lira inleuçào

11. f r e i r e .§ .-illl-ti.

.1. de l a e t3S.J-V.

\azarelli

ir," i

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 2 6 7

entrada do rio da banda do norte, e ainda não aca

bado nem bem guarnecido, pois que os Portuguesesnãoreceavão um ataque formidável conlra elle , sobreconfiarem na facilidade com que podia ser soccor-

* rido do Cabedello, que ficava defron te. Mil e qu i-nhcnlos homens embarcarão para esta jornada emduas esq ua drilh as; a prim eira chegou e principiou

a pôr as suas tropas em terra, a outra encontrouvento rijo na altura da foz do rio, nem pôde approxi-mar-se sem risco imminente. Emquanlo uma parleperdia tempo á espera da ou tra, a guarn ição do Cabedello, que ao principio entrara em duvida se seriacom cila o negocio, percebeu claramente o desígnio

do inimigo, e mandou para a outra banda reforçosque os Hollandezes não poderão interceptar, e oscommandantes, vendo então que persistir no assaltoera exporem-se a uma perda seria e sem resultado,rcembarcárão. Não poderão comludo soffrer o pensamento de que tão grandes prepatalivos havião de

dar em nada, e, suppondo que se teria tirado gentedo acampamento e do cabo de Saneio Agostinho paradefeza da Parahyba, determinarão investir aquelle

. ultimo. A conquista dVste logar, bem o conheciãoelles, era o primeiro passo que se devia dar parasubjugar Pernambuco; era alli qu/> os Brazileiros

recibião soecorros de gente e maicriaes, era alli queembarcavão os seus produclos. Sena entrarem pois

r > - p i • > ~ n 1 4 de m

no liccile para aqui velejarão. Commandava na praça i63i4 d e m a r .

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2tj8 H I S T O R I A D O B R A Z I L .

IOÕÍ. pedro Corna da Gama com trezentos e cincoenlahomens, inclusive os moradores, achando-se parledesla força eslacionada no forle de Nazarelb, a inútilobra de Bagn uolo, que po r afastada demais nem do- .minava a barra nem a villa. Os dous redueti s da foz 'forão «Tuarnecidos, e quatro companhias destacadas

para Tapoão, uma legoa ao norte, onde alias poderialer desembarcado o inimigo, marchando em direi-lura para a villa chamada do Pontal, que ficava forado alcance de tiro das fortalezas da barra. Por faliade outra força ficou este logar entregue unicamenteaos moradores, quasi todos genle do mar.

us F o i T a p o ã o , c o m o s e s o p p o z e r a , o l o g a r o n d e se

t e n t o u o d e s e m b a r q u e . A c h a n d o - o o d e m a s i a d o b em

" i ia rdado, f o r ã o o s H o l l a n d e z e s cosleando a le chega-

rem a o s i t io c h a m a d o A s P e d r a s , o n d e fizerao s e

g u n d a t e n t a t i v a . Apparccérão cem h o m e n s , que

v i n h ã o d o a c a m p a m e n t o a d e f e n d e r es te po st o im

p o r t a n t e , e q u a r e n t a d o s m a i s v e lo z es ainda o al

cançarão a t e m p o d e obslarem a o d e s e m b a r q u e .

O n z e n a v i o s d o i n i m i g o s e separarão agora do res to

d a f r o t a , e a p e z a r d e s e r e s t r e i t í s s i m a a b a r r a , c

d i f f i c i l a e n t r a d a , avenlurárão-se a p a s s a r p o r en t r e

as baterias. Im d'elles, perdido o leme, encalhou,

mas os oulros rojnpendo forão fundearem Ircnle avilla, visto o que, fugirão immcdialamenle os marinheiros que a defendião. Ainda liveião tempo depôr logo aos armazéns, em que se consumirão duas

ll(,Ilamle/«>|v.iss.rm)>e'a

lialeriiise lomâo a

e i i l a i l e .

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HIST OR IA DO RR AZ IL. 269

mil caixas de assucar, mas os Hollandezes tomarão ,63í-quinze barcos de vários tamanhos, em que haviamil e trezentas oulras afora grande quantidade depau brazil.

Caiabar ia nas lanchas, que levavão mil hom ens Calalm.de tropas de desembarque. Meia legoa ao sul havia as lanchas.pelo recife uma entrada para o porto, tão estreitaem verdade, que jam ais se pensara que a mais pequena canoa a podesse pas sa r, mas nada escapava aeste homem' ; formara elle melhor juizo,e introduzindo por alli as lanchas, foi desembarcar a genteno Pontal, onde ella principiou immediatamenle afortificar-se. Singular era agora a situação das partesbelligerantes : o porto eslava em poder dos H ollan dezes, que alli tinhão dez dos seus navios, mas sopodião communicar com o grosso da sua força pormeio de botes pelo canal descoberto por Caiabar,sendo os Portuguezes ainda senhores da barra. Mathias d'Albuquerque, seu irm ão D uarte e Bagnuolochegarão do acampamento com trezentos homens.Apenas sabido o designio do inimigo não tinhãoperdido tempo em mandar reforços a este importantíssimo logar, seguindo-os desde logo em pessoa; asua força reunida era agora considerável e passarão

1 J. de Laet confere a Schuppo o merecimento da descoberta docanal, que, segundo elle, nem era conhecido dos Portuguezes. A narrativa, que attribue este feito a Caiabar, é mais provável; não era ellecxtranho no logar, como o com man dante hollandez, c podia m uitobom ler-se até ja como contrabandista servido d'esta passagem.

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2 7 o H I S T O R I A 1) 0 R R A Z I L .

1631 a atacar os Hollandezes na villa. A poderá rã o-se d'unia

bateria, e avançarão para as trincheiras erguidaspelos invasores. Conhecião estes a insuflicicncia dassuas obras, levantadas á pressa, e lançados em confusão, fugirão muitos a nado para os navios . Exac-tantente n'oste momento appareceu uma partida dePortuguezes, que tinha recebido ordem de marchaipela floresta, e destrahir a attençào do inimigo, in-quietando-o pelo lado opposto; enlre os seus própriosconterrâneos se levantou o grito de que erão Hollandezes alli postados para lhes cortarem a retirada, edebalde ten tarão os chefes dese ngana l-os, e tornara metlel-os em forma, era forle demais o terror. Po-zeráo-se em desordenada fuga, a artilh aria dos naviosprinc ipiou a jog ar sobre elles, e n'esla desgraçadainvestida perderão "210 hom ens, quan do so o própriopavor infundado lhes podia lolher que recobrassemPontal. D'oulras vezes dislinguiáo-se os Portuguezes,como os heroes d'IIomero, pelo zelo em levarem docampo os seus m ortos, para o qu e ião sem pre munidos de cordas, mas n'csta acção1 tão depressa fugirão que nem poderão prestar este piedoso oflicio aosseus irmãos cabidos.

Apezar de assim rechaçados erão Ião fortes os Por

tuguezes que o inimigo viu que nada mais tinha a1 Yella se servirão os Hollandezes d'umas pecinhas de metal, de

nova invenção, com que, diz J. de Laet, como se fosse com mosqueteft,

lecebèràd Os PurtiiíMic/es. Serião bacamartes?

.!. r.e I

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 271

ganhar aqui contra elles. Os navios achavão-se fora 1G",i

do alcance de canhão, mas sendo tão estreita a barraque mal dava passagem a um , não havia meios desahir com tão pequena perda como a soffrida na entrada. Preparárão-se os reduc tos , e Mathias alli se foipostar com as suas tropas. Confiava este general queos Hollandezes lhe havião de cahir nas mãos, e manifestava esta confiança a Bagnuolo. Este, que conhecia melhor os inimigos, abanava a cabeça e dizia-lheque não fosse tão seguro da sua preza. Um Hollandez,contava elle, fora condemnado á morte em Flandres,e encerrado n'uma alta torre. Um dos seus amigosobservou que as ando rinha s' alli entravão e sahiâopor uma janel laaber ta; apanhou n'umalçapão umad'estas aves, amarrou-lhe á volta um fio, e deixou-avoar. Ella, como de costume, voltou á torre; o pr i -zioneiro, vendo o fio, puxou por elle uma corda, queo amigo prendera da outra extremidade, e descendopor ella, escapuliu-se. Bagnuolo vira quão inesperadam ente os Hollandezes havião feito en tra r as suaslanchas, e receava agora que se safassem com os navios por algum meio egualmente difficil de prever-se.Não se enganava. Elles alargarão o canal por ondeCaiabar metlera as lanchas; depois descarregando osnavios, e tombando-os a um lado, por não haver água

1 ~ li. Freire.

para as quilhas, assim os arrastrárão para fora. §538"9

Postos d'esta sorte a salvo os navios, e levados os M^h'u|rd'u

Aeu

despojos, deixarão os Hollandezes uma grossa força umptrLilt0.

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-272 H I S T O R I A D O B R A Z I L .

para defeza da villa, e como em prova da resoluçãoem que estavão de se manterem na perpetua possedas suas conquistas, pozeráo á ilha dentro do recifenome Walcheren, e chamando Gijsseling o forte.Nazarelb era pois perdida para os Portuguezes comoporto, mas não a esperança de rehavel-a, e em lodoo caso importava-lhes muito guardar os reductos c oforle. Conservárão-se pois alli os generaes para tirarem partido de qualqu er oppoiTunidade que se offe-recesse, e fizerão para a llesp anha instante* pedidosde soecorros efficazes. Os Hollandezes pela sua partedespachavão commissarios para a Hollanda a representarem as bi lias esperanças que lhes sorrião, can im arem a Com panh ia das índias Occidenlaes ainvidar maiores esforços para a conquista d'um império, que em tal caso ja não podia escapar-lhe. In-trelantosuppoz-se no Becife, que achando-sc assimoecupada em Nazareth a força principal dos Portuguezes, poderia o arraia l do Bom Jesus ser entrado,u dcu-se-lbc um assalto sem effeito. Da mesma formaconjecturou Mathias dAlbuquerque que a guarniçãodo Pontal teria sido desviada em parle para este ataque, e com egual má fortuna investiu a vil la ' . Entãofizerão os Po rtuguezes ou tra infeliz insinuação paracompra da paz. Sobre pretexto de que as condiçõesem que se concordara a respeito de quartel, não erão

' Equivoca-se o auetor chamando d e villa a povoarão d o Pontal.

K, P.

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H ISTOR IA DO BBAZIL. 273

assaz claras, pediu Bagnuolo uma conferência, e 1634

deputou pela sua parle o veedor geral a encontrar-secom o tenente Bijma por parte dos Hollandezes. Maso negocio real do veedor era offerecer á Companhiadas índias Occidentaes o pagamento de todas as des-pezas feitas, se quizesse evacuar o paiz. Esla proposta representou-a elle como altamente vantajosa,dizendo que jamais poderia a Companhia tirar proveito "d'estas conquistas, pois que os Portuguezespodião retirar-se para á Bahia, onde havia terra quefartasse, e d'onde a todo o tempo lhe podião pôr aferro e fogo as plantações. Preparava-se, accrescen-tou, um grande armamento para soccorrel-os, sendoculpa dos próprios Brazileiros não ter ainda chegado,pois que, encurralados os Hollandezes no Becife,havião elles mandado dizer que possuião forças suffi-cientes para a restauração d'aquella praça. Agoraporem não tardaria o armamento, e se se fazia estaproposta era em bem de todos e para evitar maisdesgraças, não por qualquer outro motivo, nem anecessidade a dictava, como Deus e o tempo mostra-rião. Se os Hollandezes não quizessem dar ouvidos aisto, fizessem o que podessem para conquistar o paiz,que os Portuguezes havião de fazer outro tanto parafrustrar-lhes os planos. A resposta foi altiva, que avender as conquistas que fizessem não erão vindos osHollandezes, mas a alargal-as e manlel-as por Suas Altezas os Estados, o principed'Orange e a Companhia J. de Lacl.

392-5.

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274 HISTORIA DO RRAZIL.163i- Ein logar dos soeeorros que com tanta confiança

rerorços°da espcravào os Portug uezes, checarão da Bahia duzentosnollanda. l . , .

homens, e insignificante como era o retorço, loi dií-ficil achar-lhe provisões, nem linhão os soldadospaga ou vestidos alem do dinheiro que o generaladeantava do seu bolsinho. Jamais houve colônias

tão cruelmente descuidadas pelo seu governo. Quasipelo mesmo tempo chegarão á Parahyba cento e trintahomens vindos de Lisboa, d'onde Irazião a noticia deque na Hollanda se aprestava outro armamentogrande, e de facto não tardou muito que não voltassem os commissarios com 0,000 homens, de modo

qtic a força que a Hollanda mandava a conquistar oBrazil excedia na razão de mais de trinta por um a

l i . K i t i i e .

S3i;u-:i que a llespanha enviava a defendel-o.A Pan.tivi» Assim reforçados, resolverão os Hollandezes tornar

atacaila

a acommetler a Parahyba. Era esta então uma for

mosa villa 1 com seus seleccntos moradores próprios,e muitos outros que vindos das partes do paiz subjugadas pelo inimigo, alli havião buscado asylo. Tinhauma casa de Misericórdia, um convento de Benedicti-nos, outro de Carmelitas, e ainda outro de Capuchinhos, e havia nas visinhanoas dezoito engenhos de

assucar. A situação fora mal escolhida, a tres legoasdo porto, rio acima, em terreno baixo e rodeado dematagaes; não era pois logar saudável e como ponto

1 Chamada ne s s e t empo Philippéa em honrado monarcha hespai ih»!que governava Por tuga l e suas cnluni. is . V. P .

oulra vez.

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HISTORIA DO BRAZIL. 275

mililar valia muito mais do que a villa o forte do 1634

Cabedello, que dominava a entrada. Ficava este dolado sul da barra, e fora melhorado depois do ultimoataque. Do outro lado estava o forte de Saneto Antônio, ainda por acabar, e a tiro de peça de ambos, no .banco d'areia d u m a ilha fluvial chamada d e S . Bento,erguia-se uma bateria de sete canhões guarnecidapor quarenta soldados. 0 n um ero da gen le estacionada n'estes postos, na villa e nos differentes reductos, elevava-se a novecentos. Bepellido o primeiroataque não perdera o capitão-mór, Antônio d'Albu-querque Maranhão, tempo em preparar-se para segundo, e enviara logo o seu irmão Mathias a expor ao

rei e aos m inistros o estado da capitania. Pouco fruetocolheu d'estas representações, e a Parahyba comoPernambuco ficou abandonada á sua sorte.

Apparecérão os Hollandezes deante do porto com 4 de dez.1 1 . l 1634.

dous mil e quatrocentos homens1, em trinta e dous

navios. Contra forças tão superiores impossível eraa defeza da praia em todos os seus pontos. Apenas amaré encheu o precizo, varou o inimigo os bateis em cerco d0

forte

terra, vindo o próprio Schuppe á frente, e assim sem d° cabedeiio.mais perda alem da de quatro botes quevirou a res

saca, desembarcarão seiscentos homens antes que selhes podesse oppôr o menor estorvo. Seguiu-se umtiroteio em que os Portuguezes levarão a peor, mas

1 Os escriptores portuguezes os elevão a mais de 5,000.

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•O" que foi de pequena conseqüência, salvo ter cabidoprizioneira uma das principaes personagens da capitania. Bento do Rego Be zerra, que não tardou a arranjar-se com os Hollandezes, contribuindo depoisgrandemente para a reducção do paiz á obediênciad'elles. Julgando que seria o Cabedello o primeirologar atacado, reforçou-o Antônio d'Albuquerque,

estabelecendo o seu quartel general em Saneto Antônio, onde recebesse e distribuísse os supprimentosque viessem da villa. Principiarão os Hollandezescomo elle previra, por cercar o forte principal, masficavão expostos ao fogo da bateria do banco de SanBento, e im portava -lhes se gura r este posto, não soporque os incommodava, mas também por que cmquanto elle estivesse em poder dos Portuguezes, passa riao a salvo os botes da villa. Uma divisão da armada ás ordens de Lichthart passou pois a barra comespesso nevoeiro, que tão felizmente a encobriu queso a virão dos fortes qua nd o estava ja en tre elles.Oitocentos homens desembarcarão na ilha. Dos quarenta que alli estavão destacados, cahirão vinte e seis;o resto demandou a nado umas lanchas, que chegarão tarde demais para soccorrcl-os, mas ainda atempo de salval-os, e ao entrarem a bateria encontrarão os Hollandezes alli so o commandante. Formarãoaqui segundo redueto contra o Cab edello, onde logono primeiro dia matarão ou ferirão Irinhi homens.

Em extremo difficil se tornou agora metter soe-

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HISTORIA DO BRAZIL. 277

corros no forte : por terra era de nove legoas a dis- 1634-

lancia, e lá estava o terrível Caiabar para mostrarao inimigo todos os torcicollos do paiz; restava apenas a água, e por essa a única esperança de passarera debaixo do fumo das baterias. Aproveitavão poisos Portuguezes a no ute, cobrindo-se com couros omelhor que podião. Antônio Perez Calháo comman-dava uma lancha, que de Saneto Antônio atravessavapara o Cabedello : uma bala, que lhe matou um dosseus camaradas e feriou dous, também lhe partiu obraço direito com que ia governando. Correu o irmão a tomar o leme, mas elle recusou entregal-o,dizendo : «Para me sueceder no posto, ainda tenho

este irmão mais chegado, » e mostrava o braço esquerdo. Logo uma bala de mosquete lhe varou opeito, e ellesahiu. Poz-se agora o irmão ao leme :também elle foi ferido na mão direita, e soecorreu-se da esquerda. Forçou a lancha a passagem e am bosos irmãos se restabelecerão dos seus ferimentos,

mas foi sua única recompensa a fama que a lcan çarã o. §'IT^OI!

Tinhão agora os sitiantes assentado quatro bale-1 Rende-se

nas contra o forte; de dia e de no ute o batião até oforte-que lhe desmontarão quasi todas as peças, matarãoou ferirão todos os artilheiros, excepto a seu capitão,

e quando este a final levou também um tiro de mosquete, não havia ja quem servisse os poucos canhõesque ainda poderião fazer fogo. N'esta conjuneturachegou Bagnuolo á villa com trezentos homens, nu-

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lfô4- mero por demais pequeno para emprehendcr couzaalguma efficaz conlra o inimigo.

Entretanto tornou-se insustentável a praça e sahi-i\ o dous capitães a prop or a cap itulação . Exigirãoque os deixassem partir-se com suas bagagens, munições, e provisões, armas carregadas, niechas ac-cezas, com bandeiras despregadas, e o estandartereal, dando-se-llies botes, em que se passassem paraa Para hyba. Os Hollandezes so queriam deixal-os sahircom honras militares para cm navios da Companhiaserem transportados ás Antilhas, aos Açores ou alhures, conforme se concordasse. Pronietléráo os Porlti-giiezes responder em cinco horas, e exigirão entãoque os deixassem sahir com o estandarte e uma pecade dezoito, e que os ofliciaes c metade da guarniçãopodessem ficar no paiz. Os Hollandezes não quizeráoexemplar do rigor das condições mais de cincoentahomens. Dos negociadores portuguezes um era velhoecomedido, o outro joven e fogoso. Este, a quem osHollandezes chamão D. Gaspar, perdeu as estribeiras, e depois de ler Schuppe assignado a convenção,arrancando o papel das mãos do seu collega, devolveu-o ao comniandanlc hollandez, que, cncolerizadoa seulurno, rasgou-o, dizendo a Gaspar que a espadao ia ja ensinar a faltar em outro lom. Um honrosos. nlimeiilo de indignação arrastara o Portuguez aeste passo irrelleclido, mas cahindo em si, com lagrimas de vergonha reconheceu a suafalta; eSi lujppc,

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HISTORIA DO BRA ZIL. 279

rcí-peitando o sentimento e compadeccndo-se da in- 1634

discrição, mandou lavrar outra vez a capitulação,permittindo em logar de cincoenta que ficassem noBrazil cem homens entre officiaes e soldados, escolhidos pela guarnição. Marcou-se para o dia seguinteum officio divino em acção de graças, segundo ocostume d'estes conquistadores, rigorosos observadores das formulas da religião, e prégarão-se sermões não so em hollandez, mas também em inglezc francez, prova de que o numero de exlrangeiros 5 de Lact

ao serviço cVclles devia ser mui considerável.

Voltava Antônio d'Albuquerqüc de suas improfi-cuas conferências com Bagnuolo, quando soube queo Cabedello capitulara. Agora queria elle sustentar ofortede Saneto Antônio, mas os Italianos de Bagnuolorecusarão destacar para alli; também o commandante protestou que era impossível a defeza, havendoapenas sete barris de pólvora, e, tendo desertado amaior parte dos artilheiros, composta de Allemãese Inglezes, e muitos dos soldados ido a traclar dosseus próprios negócios. Nomcou-se outro commandante, um dos que tinhão estado no Cahedello durante o cerco, c que se declarou prom plo a sep ulta r-se debaixo d'aquellas ruinas. Entretanto resolverãoos conquistadores marchar direitos sobre a Parahyba,pois que com esta praça nas mãos terião aberto todoo paiz para o sul até G oyana. Offerecia a em preza •suas difficuldades; a estrada do Cabedello segu ia

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»63*- encostada a uma lagoa pequena, onde era dominadapor um entrincheiramento, dentro do qual poucagente bastava para impedira marcha d'um exercito.Mas esta defeza, que podemos attribuir ao talentom ilita r de B agnuolo , foi fru strada pela traição deBezerra. Bevelou elle   aosHollandez.es, e alguns dosprizioneiros confirmarão esta informação, que entrando n'uma angra chamada Tambaja Grande, podião metler-se depois á estrada entre a trincheira ca villa. Artiszensky reconheceu o logar, e ja os Hollandezes se prepara vão para desembarcar alli nanoute seguinte, quando dous Francezes desertadosdo forte de Saneto Antônio vierão dizer-lhes como aguarnição eslava alli mui desfalcada por deserções,e mal provida de munições, sendo provável que sorendesse apenas contra ella se fizesse uma demonstração séria. Inspeitárão os invasores que fosse isto estratagema para atlrahil-os a uma emboscada, c emlogar de fazerem qualquer movimento, contentárão-se com mandar um tambor a intimar o forte. Emresposta pediu a guarnição tregoas por tres dias , paramandar recado ao governador. Hecusárão-nas osHollandezes, mais, segundo elles contão, por gracejo, do que por esperarem que a praça se rendesse.Com grande admiração dVlles porem chegarão deputados a traclar da entrega, posto que não tivessedesembarcado um so homem na margem do norle, <•o forte, mesmo no seu estado incompleto, fosse mais

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HISTORIA DO BRAZIL. 281

seguro que o do Cabedello, e tão de perto cercado de 1634

água, que sem grande difíiculdade erão impossíveisos approxes. Cessou comtudo a admiração logo quesouberâo que quasi toda a guarnição linha fugidocom receio de ser aprizionada e transportada paraas índias Occidentaes. Sete pessoas era quanto restava, provavelmente os officiaes, que pedirão que osdeixassem sahir com a bandeira real, e, para salvarem a ho nra, disparar alguns tiros por cima da cabeça dos Hollandezes, com elevação ta l, que não

.podesse resultar o menor damno. Assegurou-seSchuppe de que não se meditava traição, e assim tãofacilmente se assenhoreou do forte.

Bagnuolo previra esta perda; queixavão-se os Bra- Tomat|a

zileiros de que elle so antevia males sem saber re m e - d a rarah*)a-dial-os, mas era isto n'elle má sorte, não cu lpa . Comforças tão inferiores ás do inimigo de que lhe valeriaa experiência militar? Declarou agora aos moradores

da*Parahyba que era impossível defender-lhes a villa,pelo que lhes aconselhava que não perdessem tempoem retirar-se com suas famílias. Immediatamenteprincipiarão os soldados a saq uear; erão Hespanhoese Italianos, que o povo olhava egualmente comoestrangeiros. Pouco importava porem o seu berço,

erão mercenários que com a mesma rapacidade teriãodespojado amigo e inimigo, e aos quaes cabe a desculpa que se por suas mãos se não pagavão de seusduros serviços, outra paga não a vião. Estes desgra-

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2S2 HISTORIA RO RRAZIL.d634- çados pozerão a villa a saque. Alguns moradores

mais resolutos, incendiadas as casas, seguirão oexercito na sua retirada; mas do pouco que poderãolevar, forão despojados pelos soldados, crueldade queobrigou muitos a voltarem c subníeltercm-sc aosHollandezes. Cançados de mãos dias deixou-se ficar omaior numero, alegres de veiviu-se sol» qualqueraucloridade capaz de prolegol-os. 0 exemplo de Bezerra determinou muitos, eo d'otilroBrazileiro rico,por nome Duarte Gomez da Silveira, que depois de-gasto muilo cabedal, c perdido o único filho na de-#

léza da Parahyba con Ira os Hollandezes, passou-separa estes, serviu-os como ag en te secreto, e obteve dogeneral d'cllcs passaportes, que distribuía pelos quepodia persuadir a sujeitarem-se. Promettia-llies emnome do general o livre exercício da religião catho-lica, "(tzo pacifico tios seus bens, e mercadorias euro-

i.ust. Lus. ' n i

"íí. Freire', peas dos armazéns do Becife, que poderião receber

" a cred ito e pagar em gêneros da producção do pai/..de'sihen... x,) render-se o segundo forle rclirou-se Antônio

dAlbuquerque para a villa, não a sabendo abandonada, e pensando fazer alli finca pé : estava ja oceu-pada pelos Hollandezes, que celcluavão com salvas asua victoria. Tinhão estes achado dous armazéns na

ribeira e tres navios queimados pelos fugitivos; fume-gavão ainda ruinas e cascos e pelo rio corria o assucardei relido. Oueria Albuquerque porlar-se agora ondepodesse defender o paiz, mas perdido havião os seus

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o

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165i- instou para que sem perda de tempo se despejasselogar. Tomou o commandante este feliz conselho eSilveira deixou-se ficar atraz, para reunir-se aos Hollandezes. Mas estes, estomagados por não ter ellecumprido o que piomeltera , e suspeitosos de quequ em tentava com tão com plicada traição bu rlar osseus compatriotas, não estivesse fazendo contra ellesjogo mais encoberto aind a, prenderão -no, e cmestreito cárcere o tiverão ann os . E ntre tan to retirou-se Antônio d'Albuquerque para Pernambuco, ecomoainda quando tivesse sido possível, não fora políticocastigar todos os suspeitos de correspondência com oinimigo, affectou ter Silveira pelo único culpado.

„ , A tom ada da Parahyba tornou os Hollandezes se-Estailo •>

d a P a r a h y b a . n | ) o r e s u e ( 0 u a a capitania, que ao iiivaderem elleso paiz achava-se em estado de crescente prosperidade.Pelo lado do sertão erão indefinidos os seus limitese pela costa marcava-os um marco sobre o riacho

Taperabu, partindo com I tamaracá, c outro ao nortedo Camaralubi1 partindo com o Bio Grande. IraParahyba a única cidade*, tão dispersa a população,que nem aldeias havia ; mas na realidade pode compouca impropriedade a cada engen ho chamar-se umaaldeia, sendo de setenta a cento e ás vezes de mais

o numero de pessoas de todas as cores empregadasem qualquer dYstes eslabelccimenlos. Não erão os

' (àin arat iha é a ileiiiiiuiiiaeãii que hoje lh e i l a r u o s . F . P .1 Nessa epochajião era a Parahvha ti ladc e sim  \ i l l a . r. P.

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HISTOR IA DO BRA ZIL. 285

donos que cultivavão as terras, mas os chamados 1634-lavradores das cannas, e depois de tirado do assucaro dizimo d'el-rei, separavâo-se tres quintos para osenhor do engenho e o resto ficava ao lavrador. Acidade, chamada N. S. das Neves1, perdeu esta invocação mal applicada n'um paiz onde nunca gelava,e tomou o seu nome do rio sobre que estava assen

tada, embora a lisonja hespanhola quizesse pôr-lheo de Philippea, e os Hollandezes por egual motivo acrismassem Frederickstadt. Comparárão-na em tamanho a Gertruydenbergh, mas tão bem edificadanão era. As casas feitas de madeira e barro, e caiadaspor fora e por denlro, erão cobertas de folhas de

palmeira. Compunhão-se de dous andares, dos quaeso debaixo servia para lojas e outros misteres simi-Ihanles. Também na cidade havia algumas bellascazas de pedra, sendo de cantaria as esquinas, soleirase hombreiras de porlas e janellas. Coberta de quasiimpenetráveis matagaes que se olhavão como indicio

da riqueza do solo, se via a maior parle do paiz, epassava como provérbio no Brazil, que terra que bemse vestia a si, bem vestia o dono.

Sele aldeias de índios havia n'esta capitania. ]ndios n.esla

Pinda-una, que de todas era a perder de vista a capit'

maior, contava mil e quinhentas pessoas, das outras1 .Não foi dada similhante denominação pelo motivo que dá Southey,c sim por ser mui devota para os Portuguezes a invocação de N. s]das Neves em lembrança d'um antiguo sanctuario que no seu paiz existia. F. P. i r

ntania.

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10:4 nenhuma mais de trezentas. Ainda se apinhavão cmvastos dormitórios os moradores, ainda itsavão tiadesconfiada moda de porlas baixas, por onde de galasentravão e sabião. 0 capitão portuguez, que residiaem cada uma, recebia um tostão mensal por Índio,que alugava para fora, e este ultimo linha cinco varas

de estopa por vinte e cinco dias de serviço. Que admiração pois que elles se reputassem felizes sacudindoo jug o, e pondo-se debaixo da prolocção dos Hollandezes, que merecidamenle havião ganho cnlrc osíndios algum credito pelo modo porque se portarãopara com os que havião sido eondomnados á escra

vidão em pena de se lerem ligado com Hendrickszdurante a estada (Peste na Bahia da Traição. As suaspessoas forão declaradas livres por publico pregão,ordenamlo-se a quem tivesse alguns ao seu serviçoque em continente os pozesse cm liberdade.

Gemiam aqui escravos alg uns Tapuyas do Mara

nhão, raça pequena e fraca, inimiga do trabalho crealmente incapaz de supporlar as pezadas tarefa»que lhe impunhão; o mau traclamenlo o o desesperotornava esles infelizes propensos ao fatal costume decomer terra. Tinhão os Porlugiiczes um anexim brutalque dizia que quem quizer tirar proveito dos sons

negros ha de nianlel-os, fazel-os trabalh ar bem, csurral-os melhor; e o estado dos sentimentos populares, quesimilhante rifão indica, mostra quão duraseria a condição do escravo.

J . d e l . i e l .452, ô .

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HISTORIA DO BR AZ IL. 287

Fr. Manoel de Moraes, Jesuita, que por vezes tinha 103i

«overnado todas as aldeias d'estas capitanias do dui fjSlíita.norte, aproveitando a opportunidade que tinha naconquista dos Hollandezes, ren un ciou as ord ens, eoffereceu-lhcs os seus serviços, exem plo único de talapostasia. Segundo elle havia seis aldeias na Parahyba ', e egual numero no Bio Grande 2 ; mas tanto

havião soffrido dos Hollandezes e dos hostis Tapuyas,que não podião dar mais de oitocentos guerreiros,nem passava de tres mil toda a sua população; emquanto que Itamaracá e Pernambuco, nada tendopadecido dos Tapuyas, podião pôr em campo mais demil índios, apezar de não contar cada uma mais de

tres aldeias \

1 llopcbi e Para-wassu, ambas entre o Rio Grande eCunhau; Igapuado outro bando do Rio Grande, sete milhas ao no rte da fortaleza;Pirari, a duas milhas de Cunhau; Vnjana ou Goacano, a sete milhas deCunhau para o lado do Rio Grande; Itaipi, sete milhas ao oeste do RioGrande.

* Jaraguazu, ou Eguararaca, a tres milhas da Parahyba por terra,

mas sete pelo rio acima, que era o caminho ordinário, que se seguia;Jaknigh, uma milha alem; Yapoão, Igapuão ou Pontal, a cinco milhasdo forte do norte da Parahyba; Tapoa ou Urekutuwa, a boas dez milhas da cidade, para as cabeceiras do rio; Inocoça, a qua tro legoas cam inho de Goyana; Pinda-una, a seis milhas da Parahyba mesma direcção.

0 S. João de Caarese, a cerca de onze legoas de Itamaracá e duasde Goyana; seiscentps habitantes, entre os quaes duzentos guerreiros; S. André de Itapeterica, a nove milhas de Itamaracá, duas de

Goyana; mil e trezentos moradores, mais de quinhentos guerreiros.Tabuçurania ou N" S* da Assumpção, a sete milhas de Itamaracá, deGoyana cinco; seiscentos moradores, cento e oitenta guerreiros. Erãoestas na capitania de Itamaracá. A grande proporção de co mbatentes,mostra quão poucas crianças se criavão, ou talvez se deixavão nascer.

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288 HISTORIA DO BRAZIL.

I63i. Fez-se com os Parahybanos uma convenção as-

' E siírnada, que pagarião aos Hollandezes os dízimos,habitantes. O i I I D _

como pagavào an l e s a o r e i , e o s mesmos dire i tos

que sob o an t igo r e g i m c n , o b r i g a n d o - s e a Companhia

a n~ o l ança r , nem n a Hol landa nem n o Brazil, novos

impostos sobre os seus bens o u pessoas , nem obrigar

n i n g u é m a p e g a r e n a r m a s c m serviço d 'e l la . Deviap res t a r - se u m j u r a m e n t o d e f ide l idade , c se chegasse

u m a r m a m e n t o h c s p a n h o l assaz forte para ocetipar

de novo o paiz , dar - se - i a aos que o tivessem prestado

todo o auxi l io para s e passarem para bordo dos na vios com todos o s seus l iaveres m o v e i s . 0 vagar com

que v inhão o s m o r a d o r e s a t o m a r o j u ramen to , mos trava a pouca vontade c o m q u e se submet l i ào , m aso exemplo d a s u a submissão levou o povo do RioGrande a accei tar a s mesmas cond ições .

cerco posto S egu indo a vic tor ia , reduz iu Scbuppc Ioda a capi-aoxaz™eiiiea tania de Itamaracá, que fica entre Pernambuco c

Parahyba. Era ja fácil de ver em perigo tanto o arraial do Bom Jes us , como Nazarclh, nem faltou quemAs aldeias de Pernambuco irão Mocni^h, ou S. Miguel, a sete milhasdOlinda, onde Camarão era cacique dos Potiguares* e Kstevào Tiiiudos Tobajares; seisrentos habitantes, cento e setenta bons mosqueteiros. Caheté ou V S* de Pajuca, mil e cem almas, qualioi entos guerreiros; doze milhas d'Olinda. S. Miguel d'lg un a, vinte milhas ao sul

(TOlimla ; setecentas pessoas, duzentos combatentes " .Philippe Camarão (ou Palig, como lhe chamavam os seus) era nioçaíarn

dos Carijos, e não dos Pilaguares. V. P." Inexactos nos parecem todos estes cálculos e erradas as posições lopo-

graphicas. F. P.

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I O . J Í

H I S T O R I A DO B R A Z I L . c289

aconselhasse que, abandonado aquelle posto, se eon-

centrasse toda a força n'esle, onde tinha aberto omar e podia ser soccorrida. Mas o arr aia l tinh aja crescido, tornando as proporções de villa , nema Mathias d'Albuquerque lhe soffria o coração de struir o que elle mesmo e rguera, defendendo-o portanto tempo contra um inimigo muito superior em

forças. Nazareth era o posto mais importante, e portanto alli ficou com o irmão e Bagnuolo, deixandoAndrés Marim a defender o acampamento com cin-coenta homens, não contada a milícia da terra. Ambos os logares forão accommettidos ao m esmo tempo ,commandando Schuppe em pessoa a divisão que

avançava contra Nazareth e marchando a outra ásordens de Àrtizcnsky. Muitos combates se pelejarãodeante do campo, em quanto fazião os seus aproches ,os sitiantes. N'um d'elies encontrou um mosqueteiroportuguez o commandante dos Hollandezes : este ,vendo o arcabuz apontado á testa, enlregou-se . To

mou-lhe o aprezador as rédeas do cavallo e assim oia levando; esquecera porem, provavelmente pormal entendida confiança na honra do seu prizioneiro,de exigir d'este uma bengala grossa e comprida, quetanto lhe servia de arm a como de bastão de commando, lendo por castão um martello çom um a

ponta afiada. 0 Polaco, aproveitando .o ensejo, des- c»si. i.u*

carregou um golpe no seu aprezador, e cravando aomesmo tempo as esporas no cavallo, escapuliu-se.

n. 10

3, § 89.

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290 HISTORIA RO BRAZIL.

1634. D'elle contâo os Hollandezes outro facto, que lhe fazmais honra. Um tiro recebido n'um braço o prendia á cama'n'uma occasião em que os sitiados fizerão uma sorlida vigorosa e bem succcdida. Despertado ao estampido do fogo, ergueu-se da cama,montou meio vestido como estava o cavallo de Sta-chouw er, que por acaso estava aparelh ado e enfrcadoá porta, e correndo ao theatro da acção, com a suapresença e exemplo animou os Hollandezes de modoque os Portuguezes forão rechaçados d'um reduclo

'-ít;i" que ja havião tomado., ..piiuia o De dia e de noute mantinhão os sitiantes um fogo

incessante contra o acampamento. Chovião sobre ellebombas e granadas, algumas das quaes quasi enve-nenaváo os Portuguezes com o seu nocivo fumo. Amesm a impossibilidade de escapar a estes terríveisprojectis, ensinou aos sitiados como tornal-os menosdestruidores; apenas cahião deitavão-lhes por cimacouros molhados, que ou apagavão a med ia , ou que-bravão a força da explosão. Também abrirão cavas,em que punhão os feridos, e depositavào em segurança a pólvora, servindo a terra (Festas excavaçòespara levantar novas obras ao passo que ião sendodemolidas as antigas. A final principiarão a faltarmunições e mantimenlo; do apuro em que se viáo,mandarão recado a Mathias d'Albuqucrque, que nãosabia como valer-lhes, em poder do inimigo o terreno en tre N azareth o o ar ra ia l, e elle sem tropas

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H ISTOR IA DO BBA ZIL. 291

bastantes com que forçar a passagem. Forão convi- *654-dados para este serviço os m oradores mais próxim os,nem deixou de haver alguns que o emprehendossem,perigoso como era. Não havia outro meio senão con duzir as provisões ás costas de negros, e os Hollandezes tinhão comminado pena de m orte contra quemtentasse abastecer o acampamento, e promettido aliberdade a todo o escravo que denunciasse simi-lhante propósito. Ja havião suppliciado um Portuguez por assim ter cumprido o seu dever para com apátria. Marim alguma vingança tirou d'este assassinato, executando tres pessoas convictas de daremavizo ao inimigo . Em taes circumstancias impossívelera aguantar por muito tempo, e apoz tres mezes decerco entregou-se o arraial do Bom Jesus, com condição de que a guarnição sahiria com as honras militares, e teria passagem livre para as índias hespa-nholas.

Exigirão-se condições honrosas para a milícia da Nefariuterra. Schuppe, que viera assistir á capitulação, ne- ^ ^ t o s 'nhumas quiz conceder, dizendo que erão desnecessárias, tornando-se os habitantes subditos da Hollanda, cujo dever e interesse era protegel-os econcilial-os por todos os meios possíveis. Apezard'isto

commettérão os conquistadores as mais atrozescrueldades contra esta brava genle, sendo os quelinhão alguma couza de seu, martyrizados até pagarem integralmente a somma que se lhes marcou,

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292 HISTORIA DO BRAZIL.

1031 e m resgate de suas vidas, a que não sei porque argúcia de lógica marcial , se dizia haverem perdido odireito como traidores ao principe dOrange. D'estaforma * levantarão os Hollandezes a melhor de vintee oito mil coroas, e foi assim que no orien te c ocei-dente tornarão tão infame a sua historia, e detestáveis os seus nomes, como na própria pátria forãogloriosos os seus feitos, e dignos de serem recorda-

§ ooo-'-! dos pela mais remota posteridade 2 . Forão arrazadas:ast. Lus. l l

"> , § 8 0 - 9 2 . a s fortificaçòes do acampamento do Bom Jesus.

Tentativas Entretanto estava a outra divisão do exercito hol-le «oceorer

NaA.reth. ]andez postada no Engenho dos Algodões, a umalegoa do forte de Nazareth, donde podia dominar opaiz e corlar ao forle e aos reductos todo o soccorro,esperando assim reduzil-os com pequena perda. Mathias d'Albuquerque estabelecera o seu quartel general em Vilh Formosa, logar aberto a seis legoas

' Kstã visto que os llollandives de nenhuma crueldade fazem men

ção. Mas, secundo referem, devião os habitantes render-se á di.scriejo.a Alie inwoondcrs sullen hun geven in ouse macht, om mel lutcr ledoen ais hei mis sal ghelieven, » palavras que co nferem ampla licença aos vencedores. J. de Laet acerescenta, que e.sles prizioneirosforão mais de duzentos em numero, fora suas m ulheres e íilhos, eque se resgatarão a si e aos seus bons por ciumenta mil gulden *.

- Fácil é de \cr que o so o ciiiine d'um Inglez contra os seus rivaesnas índias poderia dictar a Southev taes expressões, r . P .

Com energia icpclle XeUelier as (traves ncciisa<;òes que aos seus compatriotas faz Southey e sii*le.iit.i que alguns excessos que por esla oecasiàuse coininelleram foram obra dos mercenários de todas as nai;òes da Europa.Incünauio-iios pela asserçãu do historiador hollandez, sempre tio imparcial c bem informado r . I' .

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HISTORIA BO BRAZIL. 293

para o sul, d'onde destacou Bagnuolo vinte e cincolegoas mais para o su l, a defender e fortificar Porto

. Calvo. Villa de bastante importância era esta pelasmuitas fazendas e pastos dos seus arredores, e foramui perto d'ella, em Barra Grande, que havião desembarcado os reforços vindos na a rmada de Oquendo.Tinhão os Hollandezes segurado este ultimo logarcomo primeiro passo para extenderem n'esla direcçãosuas conquistas, e os moradores de Porto Calvo, contando ja com cahirem-lhes nas mãos, estavão emsegredo arranjando-se com elles. Era necessário, setanlo fosse possivel, manter este logar; comtudo malpodia Albuquerque enfraquecer-se destacando tãogrande força como para isso era precizo. Perto estavao inimigo e era mister prover-se a si mesmo de munições e metter provisões no forte. Antes de fugiremtinhão alguns habitantes da Parahyba occultado doussaccos de munições; mandárão-se por elles algunsÍndios, mas forão apanhados e mortos pelos Hollandezes. Uma única arroba de pólvora era quantorestava ainda ao general, que para da sua própriagente esconder esta mingoa, encheu de areia algunsbarris, pondo-lhe a gu arda do costume. Da gente doscampos mais visinhos se formarão sete companhiasde emboscadas, dê quinze homens cada uma, exceptouma, que, composta de treze irmãos, do seu nomese chamava dos Baptistas. Por terra nen hum soccorropodia vir a Nazareth; por todas as vias o tentou Ma-

.1634.

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294 HISTORIA DO BRAZIL.mi- thias d'Albuquerque obter todas egualmenle balda

das. Mandou índios com farinha ás costas, ou comjunctas de bois, que mais fáceis se guiavão do que .nenhum outro animal; tomarão os mais escusos desvios, mas de nada lhes valeu, tão bem batião os Hollandezes o campo em todas as direcções. No rio Seri-n h aem, perto da Villa Formosa, havia tres barcasdesmanteladas; Albuquerque apparelhou uma parao m ar , e carregou-a de provisões, dando o comm andoa Diogo Bodrigues, que viera com noticias de Nazareth. Deu este á vela ao pôr do sol, e chegou a salvamento á meia noute, tendo audazmente passado poruma porção de cruzadores hollandezes. Sahir doporto era impossível, bem que a barra estivesse aindaem poder dos Portuguezes. Bodriguez p ois, com riscoimminente, voltou por terra a Serinhaem, melteti-sena segunda barca, que entretanto se reparara, e carreg ara . Descobrindo-o, o perseguiu o inim igo , maselle, não abandonado ainda da sua boa fortuna,varou a embarcação em terra perto da ba rr a, emlogar onde da carga nada foi perdido.

Abandonado Sabido dos Hollandezes que eslava Bagnuolo a for-'orto Calvo , * u

Bagnuolo tificar Porto Calvo, desembarcou Lichthart, que com-»s ff/goas. mandava as forças navaes, parte da sua gente, e com

um destacamento da guarnição *da Barra Grandemarchou contra elle, na esperança de tomar as obrasantes de concluídas. Avizado da vinda do inimigo,sahiu-lhe Bagnuolo ao encontro com toda a sua força

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H ISTOR IA DO BBAZIL. 295

e parte dos moradores d'aquelles em quem maispodia fiar-se, ou antes d'aquelles de quem menosdesconfiança linha, onde erão suspeitos todos. Nemera extranho que não tendo os habitantes do paiz féna protecção do general, a não podesse ter este nalealdade d'elles. Os guias o levarão errado a umasituação onde uma parte apenas da sua força podiaenlrar em acção, e immedialamente-derrotado, levede retirar-se para a Lagoa do Norte, dezanove legoasmais ao sul, tomando tão prompto esta resoluçãoque se rosnou ter elle, antes de marchar de PortoCalvo, ja assentado em abandonal-o, devendo-lhe orecontro com o inimigo servir meramente de pretexto. Não lhe picou Lichlhart a retirada, tractandoos Hollandezes primeiro de saquear o logar depoisde segural-o. Fortificarão duas das casas maiores e aegreja nova, incluindo nas linhas d'uma fortalezaregular a antiga, que ficava n'um a eminência; deixarão quinhentos homens de guarnição na sua conquista e assim se tornarão senhores d'este importante n. ndistricto.

Em seguida se fez uma tentativa de desalojar Mathias d'Albuquerque, único estorvo ao cerco de Nazareth. Accommetteu-Ihe o inimigo o posto avançado,

composto de cento e trinta homens. Avançarão elle eo irmão a soccorrel-o com outra lanta gente, que eratoda a força que lhes restava, mas esmagados pelonumero tiverão de retirar-se sobre o rio. Pcrseffuirão-

I 6 5 Í .

1035.

• e i r e .§ G41-2.

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296 HISTORIA DO RRAZIL.

16.3 nos os Hollandezes, até que os Portuguezes, nem na

fuga vendo a salvação, com a coragem do desesperode novo fizerão frente ao inimigo, e, desbaratando-o,

iierois.no recuperarão o ia perdido posto. NYsln acção cahiu.le D. Maria r J 1 1 •

<iesonza. Estevão Velho, filho de D. Maria de Souza, uma tiasmais nobres damas da família. Ja n'esla guerra per

dera ella dous filhos e o genro, e ao cliegar-lhe anoticia d'esia nova desgraça, chamando os dous queainda lhe restavão, dos quaes um de quatorze annosdeedade, e o outro um anno mais moço, disse-lbes:« Hoje foi vosso irmão Estevão morto pelos Hollandezes; a vós agora toca cumprir o dever de homens

honrado s n'um a gu erra cm que se serve a Ileus, aorei e á pátr ia . Cingi as espadas, e quando vos lembrar o triste dia em que as pondes á cincta, inspire-vos el le , não m agoa, mas desejo de vingança, quequer vingueis vossos irmãos, quer succumbaes comoelles, nem degenerareis dYdles, nem de mim. » Com

esta exbortação os enviou a Mathias d'Albuquerque,pedindo-lhe que por soldados os contasse. De taltronco não podia desdizer a prole, e de tal màe semostrarão dignos os filhos.

(Jualro vezes ten tara a terceira barca passar doTomada _ _ '

de .\:i7,n-eih. Serinhaem a .Nazareth, e outras lanlas tivera de retroceder, mas a final logrou o intento, lim navioenviado das Alagoas foi capturado. Outro meio demandar provisões não restava agora alem das jangadas, cada unia das quaes levaria quando muito dous

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1635

HIST OR IA DO BRA ZIL. 297

alqueires de arroz; vinte chegarão a salvo. A grandeapuro se via entretanto reduzida a guarnição; algunstinhão desertado, pela m aior pa rte Napolitanos, paraos quaes, sem interesse na causa que defendião, soldohollandez ou soldo hespanhol era tudo um. Os quese conservarão fieis sup portárão com heróica constância as privações, morrendo muitos de inanição noseu posto. É sem pre penoso ler taes soffrimentos,mas dobradamenle o é quando d'elles nenhum resultado se colhe. A's Alagoas chegarão vindas de Portugal duas caravelas com reforços, e esperança d o u tros muito m aiores, que ja tinhão ficado prestes alargar. Mandou Bagnuolo esta nova a Mathias d'Al-buquerque, aconselhando-o qu e, abandonado o forle,viesse reunir-se a elle, sendo aclualmente aquellaposição a m elhor para o quartel gen eral, próprios osportos e fértil o paiz . Mathias reu niu um concelhode guerra : opinarão os officiaes unanimemente quena presente conjunctura nada mais avizado podiafazer-se, e apenas sabida esta resolução, capitularãoo forte e a barra com as mesmas condições que o B . Freire.

§ 649-50.

acampamento1.

1 Rendida a constância aos pés da impossibilidade, diz Raphaelde Jesus, 5, § 95. t'm artigo da capitulação foi que os padres sahi-i ào com suas pistolas nos cinctos como soldados. / . de Laet, 4 7 1 .

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298 HIST OR IA DO RRAZ IL.

1655.

CAPITULO XVI

Emigração de Pernambuco. — Ucstauração de Torto Calvo e supplicio doCaiabar. — Envião-se reforços ao conluiando de Roxos, que é desbara

tado e morto. — Succcdc no commando Bagnuolo, que fnt r«»i felicidade uma guerra de devastação. — Chega Mauritz, conde «le Na^sau,como governador general dos Hollandezes; sabias medidas que toma;persegue os Portuguezes até ao rio de S. Francisco, e Bagnuolo, abandonando a capitania de Sergipe, retira-se para a Bahia.

„ . . Fazendo-os saber a sua resolução de evacuarKnngraçao

Pernambuco, aquella parte da capitania , offereceu Mathias d'AI-buquerque aos moradores de Pernambuco escoltaros que quizessem emigrar. Foi infinitamente maioro numero dos que preferirão ficar debaixo do domínio dos conquistadores. A' ingratidão não menos que

ao deleixo da corte de Madrid deverão isto os Hollandezes. Antônio Bibeira de Lacerda cahira no campoda batalha, e nada se havia feito pela sua família :caso vulgar era este, mas sendo Lacerda uma dasprincipaes pessoas da provincia, e uma das mais estimadas também, d'este exemplo inferirão os que

andavão em menor estimação quão pouca esperançadevião ter de recompensa. Tal foi a razão que muitos derão da sua decisão de se submetterem aosHollandezes, preferindo todo e qualquer governo ao

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500 HISTORIA DO RRAZIL.

16ÕÕ. occasião esta de servir os seus conterrâneos, e quandoMathias dWlbuquerque fez alto a curta distanciadavilla, para repellir qualquer surtida que podessefazer-se, pondo Õ60 soldados com alguns índios de •emboscada, offereceu-se aquelle para sahir a reconhecer. Picard, governador hollandez, deixou-o ir.Montou Souto a cavallo, approximou-se das sentinc-las portuguezas a ponlo de expòr-se ao seu fogo, e ávista d'ellas deixou cahir uma carta. Foi esta levadaao general, e dizia que Caiabar chegara na vésperaa Porto Calvo com um reforço de duzentos homens,mas que estivessem de sobreavizo os Portuguezes,promptos a aproveitar o ensejo de que o auetor da

g658-9. ,nissjva a todo o risco os info rm aria.nesuuração Conseguido assim o seu fim, voltou Souto a galope,Porto calvo. e disse a Pica rd que n ão era ma is do que uma mão

cheia de soldados alli postados para o impedirem deoecupar o passo, c aprezar toda a riqueza movei dePernambuco. Fácil se deixou persuadir» o commandante, e sahiu pela volla das tres horas da tarde como que se lhe figurou um troço de ge nte bastante,

12 de juiho levando Souto na sua companhia. 0 atraiçoado conselheiro abandonou-o, reuniu-se aos Portuguezesemboscados, e com tal vigor deu sobre os Hollandezes que estes fugirão , deixando cincoenla no campo.Tão de perto os perseguirào os vencedores, que d'en-volla com elles entrarão as portas da principal fortaleza, que loniáião apoz espantosa matança, ficando

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H I S T O R I A DO B B A Z I L . 5 0 1

vivos apenas quarenta e cinco homens d'uma guarnição que contava cento e dez. Entretanto chegouAlbuquerque com o reslo das suas tropas, e, pensando completar a victoria, passou a investir a EgrejaNova e as duas casas fortificadas. Crescia rápida aescuridão : exaltados com o triumpho avançarão imprudentes os Portuguezes e perdérão_cerca de oitentahomens. Não desanimarão porem, e no correr danoute segurarão Iodos os passos por onde poderia oinimigo mandar por soccorros, alias estaria alli emqualro dias força muito superior ás d'elles, e, sabendo que os Hollandezes de necessidade havião derender-se dentro em pouco por falta de água, poze-rão-lhes sitio. Sobre fortes pilares de pau estavãoedificadas as casas, provavelmente assim elevadaspara ficarem fora do alcance das inundações. Ao ap-proximarem-se assaz os Portuguezes, temerão osHollandezes não fossem aquelles fazer-lhes fogo debaixo através do soalbo, e, para conjurar o perigo,lançarão sobre o pavimento terra que amortecesse asbalas. Na sexta noute assaltarão os Portuguezes acasa mais pequena, e de dentro os que escaparão,refugiárão-se na outra, a que também Picard e Caiabar se acolherão da Egreja Nova, concentrando todoo restante da força ifesta que era a posição mais forte.Mas era impossível manter-se sem água, e Caiabarpercebeu agora chegara a sua ultima hora. Offerece-rão-se condições honrosas aos Hollandezes, insistindo

1005.

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302 HISTORIA DO BRAZIL.

1655 porem na entrega d'este desertor ; debalde lhe diziãoos companheiros que morrerião antes de n'isto consentirem, bem sabia elle que não era couza que seacreditasse nem esperasse. Bespondeu pois que erahomem perdido, mas que a misericórdia de Deus opunia agora, para o não condemnar eternamente, eaconselhou que se acceitassem os termos propostos,que erão serem os invasores remettidos para a llespanha e d'alli para a Hollanda. Sobre estas condiçõescapitularão 080 hom ens, nu m ero maior do que odos sitiantes. De boa vontade os houvera trocado Mathias dWlbuquerque , mas o general hollandez recusou, dizendo que melhor do que os Portuguezespodia prescindir de gente, nem precizava d1 esta quetão mal se comportara.

suppiitm N'esta villa tinha nascido Caiabar; alli commel-de Caiabar

terá antes alguns crimes atrozes ', e alli terminou asua carreira, sendo enforcado, e a sua cabeça e quar

tos expostos na palissada da fortaleza. Com tantapaciência recebeu a morte, dando tantos signaes desincera contrição de todos os seus malefícios, acompanhada de tão devota esperança de perdão, que osacerdote que lhe assistiu aos últimos momentosnenhuma duvida conservou sobre a salvação do pa-

decente. O con fosso r foi Fr. Manoel do Salvador,1 Os mais graves chrouistas ( nino linto Freire e Fr. José de S. The-

reza, não faliam nesses crimes atrozes attnlniiilos a Caiabar pelo Ytt-

leroso Liteideno e seu compellador o Caslrioto Lusitano. V. I'.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 50 3

que mais tarde tomou não vulgar parte n'esta longacontenda, de que nos deixou singular e interessantíssima historia. Pediu o penitente que os bens quelinha no Becife, e o soldo que lhe devião os Estados,fosse tudo, pagas as dividas, entregue a sua mãeAngela Alures, pedido que fielmente foi cumpridopelo bom do frade. Interrogado se sabia d'algumPortuguez que estivesse em traiçoeira correspondência com o inimigo, respondeu Caiabar que sobreeste capitulo muito sabia, não sendo das mais baixasas pessoas implicadas, mas que a tal respeito queriaconsultar com o seu confessor, não desejando gastaro pouco que de vida lhe restava em fazer aceusaçõese depor perante um escrivão, quando tinha de arrepender-se de seus peccados e pôr-se bem com Deus.0 que elle revelou a Fr. Manoel foi communicadoao general, que por mais prudente teve nada fazerpublico l.

A crença de que tudo isto suecedera para a salvaçãoeterna de Caiabar, foi confirmada pela lembrançad'um caso notável, a que elle uma vez devera a vida.Logo depois da sua deserção fizera-lhe Mathias d'Al-buquerque grandes offerecimentos para que abandonasse a parcialidade do inimigo; a resposta inso-

1 Julgamos conveniente prevenir o leitor contra esta historieta contada pelo próprio confessor, Fr. Manoel de Salvador, que soh o pseu-donymo de Fr. Manoel Callado foi o auetor do citado Valeroso Luci-deno. F. P.

1635.

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504 HISTORIA DO RRAZIL.

>655- lente do mulato exasperou o ge ne ral, que se abaixouentão a recorrer a meios indignos e detestáveis detirar vingança, servindo-se de Antônio Fernandez,primo de Caiabar, que, como levado pelo exemplod'este, devia passar-se para os Hollandezes, e alli espreitar occasião de assassinal-o. Em conseqüênciad'isto Fernandez, encontrando Caiabar n'uma desu as algar as, ou fossados, o convidou com a voz e comos gestos a que se detivesse, recebendo-o em suacompanhia, e correu pelo valle abaixo a dar com elleno villáo intento que trazia. Enredou-sc-lhe o cinctu-rão como corriaca,- sahiu-lhe da bainha a espada, eescorregando-lhe um pé ao mesmo tempo , cahiu como peito sobre a ponta da arma, morrendo instantaneamente. Acreditou-se então que Caiabar assim fora

bé 6667? preservado para ser o ílagello de Pernambuco, al-f,, §102.' cançando-o o castigo, apenas concluída a obra l .

Arrazadas as íbrlificações de Porto Calvo, enter-Betira-sc • « '

"buquerque1" rou Mathias d'Albuquerquc na floresta as peças queiiãgoas. alli tomara. Depois proseguiu na marcha para as

Alagoas, onde se dispersarão os emigrados, tomandocada um para onde melh or lhe parec ia, uns para oBio de Janeiro, o maior numero para a Bahia. Depressa correu Schuppe a soccorrer o posto tão ines

peradamente investido. A perda alli soffrida c a vista1 Diz-se de Caiabar que erão taes a sua forca muscular e agili

dade, que tomado pelas pontas um touro, o derribava e subjugava.; . de Laet, 4 7 8 .

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 305

da cabeça e quartos de Caiabar empalados na palis- 1635-sada, o exasperarão. Mandou encerrar estes restosn'um caixão, enterral-os na egreja com honras militares e vingar-lhes a m orte, passando á espada quantoPortuguez se encontrasse nas matas. Becorrérão osaterrados moradores a Fr. Manoel que intercedessepor elles, o que mais fácil se lhe tornava, por fallarArtiszensky, como Polaco que era, mui correntemente o latim. Pela sua intercessão foi com effeitorevogada a ordem , e o povo voltou a suas casas, su b- Valeroio ,mettendo-se aos conquistadores. De quatrocentos sol- l'l"ࣙ'

dados afora índios se compunhão agora os destroçosdas forças portuguezas reunidas nas Alagoas, e comelles se resolveu fortificar o estabelecimento do sulcomo o que por natureza era mais defensável, aguardando alli reforços. Quinze dias não erão ainda decorridos quando veio Artiszensky com um grossodestacamento a tomar posse de Peripueira, logaralto sobre a costa. Alli plantou um reducto no visoda eminência e outro sobre a praia, pensando cortarassim as communieações entre o general portugueze o povo dos cam pos, mas o único resultado foi abrir-se um caminho pelo sertão .

Entretanto tal uso faziâo do Becife os Hollande- «eceios

zes, que chegarão a sobresaltar a corte de Madrid hespanhofa.apezar da sua apalhia. Alli "linhão creado arsenaesnavaes de tal magnitude, que ja não era de mister;ipparelhar na Hollanda essas armadas destinadas a

n. 20

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300 HISTORIA DO BRAZIL.

1635. interceptarem os galeões da índ ia ; alli se podiãoconstruir e esquipar. Cornelis ,Iol, que ja adquiriragrande nomeada com os muitos cruzeiros leliz.es queemprehendera , sahindo da Hollanda n'um so navio,tornou no Becife o commando de quatorze, abastecidos para sele mezes. Com esla força de novo se

' apoderou da ilha de Fernào de Noronha, lendo apequena guarnição, alli posta pelos Portuguezes,

"' ['.'íw.'0' sustentado um cerco de doze dias. Não era sem importância esta ilha como logar para refrescar, sendoescassa no Becife a água doce. Feito isto, velejou ainterceptar a frota do México, que encontrou nocanal deBahama : alguns de seus capitães, que nãogostavão de servir debaixo d'elle, cum prirão mal oseu dever, pelo que forão despedidos cinco o declarados infames. Graças ao mao comportamento dosseus subalternos, levou Jol a peor, mas o risco im-minenle em que se havião visto estes navios carregados de ihesouros, fez sentir a sua imprudência ácorte de Madrid, de modo que o próprio rei ordenouaos seus ministros que da restauração de Pernambuco fizessem seu particular cuidado. A primeirapessoa de quem esles naturalmente se lembrar,»»,foi de D. Fadrique de Toledo, que ja restauraraS. Salvador, e conv idárão-no a tom ar o commando.Tinha D. Fadrique alguma reputação que perder,seguira attento o curso da guerra, e conhecendo oestado do paiz e a força do inimigo, respondeu que

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HISTORIA DO BRAZIL. 307

com doze mil homens bem providos de tudo se en - 1633-carregava da empreza, mas não com menos. Irritadocom o reparo que esta resposta encerrava, o mandouOlivares metter na cadeia1 onde faleceu. Becorreu-sc em seguida a D. Philipe de Silva, que respondeu,que absolutamente ignorante das couzas do ma r ,era impróprio para o commando; e esta excusa selhe acceitou, embora devesse parecer que com a nomeação d'um bom a lmiran te ficava sanado este únicodefeito. Deu-se o commando a final a Antônio d e .Ávila y Toledo, marquez de Vaiada, e em quantomaiores forças se apercebião, mandou-se D. Luiz deBoxas y Borja adeante como mestre de campo general com mil e selecentos homens, a render Mathiasd'Albuquerque. § 670-5!*

F o i u m p o d e r o s o a r m a m e n t o e s t e , c o m p o s t o d e Che ali0Eíli

trinta velas ás ordens de D. Lopo de Hozes e D. Bo- „«££,.drigo Lobo, que em S. Salvador havião de desembar

car Pedro da Sylva, novo governador general, ereceber a bordo o seu predecessor Oliveira, devendoeste assumir então o commando e expellir de Curaçoaos Hollandezes. Assim tivessem estes commandantespossuído talentos sufiicienlesou mesmo zelo bastante,que grave damno poderião haver causado aos Hollandezes, infligindo-lhes talvez até um golpe mortal!Nove navios carregados de productos do Brazil aca-

1 Ha equivocaçào do auctor quanto ao lugar da prisão de D. Fadrique, que foi encerrado n/um torre e não na cadeia. F. P.

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308 HISTORIA DO RRAZIL.

1635. Rav5o de Uar á vela para a Hollanda; estes bem

os podião elles ter cap turad o, m as p or q ue o pilotoobstinada e falsam ente lhes dizia que os seus próprios vasos demandavão águas mais fundas, desistirão da caça, fazendo-se na volta do mar, quando aterem inlrepidamente desembarcado e investido oBecife, tel-o-ião necessariamente tomado, achando-se

então como se achava a força do inimigo derramadapor cem legoas de costa, de Pe ripueira até ao Potengi.So duzentos homens tinha Schuppe comsigo na capital d'estas conquistas, e ao ver acercar-se a arma dahespanhola logo se deu por perdido. Os moradoresportuguezes, contando ja ao apparecer tão grande

frota ver desembarcar os seus conterrâneos, estavãopromptos a levantar-se contra os conquistadores,chegando alguns a tomar armas. Mas os generaes,nem sequer aguardando informações, governarãopara o cabo de Saneto Agostinho, onde receberão asprim eiras novas de terra , levadas por um homem

que se aventurou a sahir ao m ar n 'um a jang ada.Tolheu-lhes alli o tempo o desembarque, e IIozcs nãoquiz pôr as tropas em terra no rio Serinhaem, embora os seus próprios officiaes o conjurassem a fazel-o,e lh'o aconselhassem Mathias d'Albuqucrque c Bagnuolo, que mandarão a bordo Martim Soares Mo

reno a reforçar o que por escripto diziao. Obstinadona sua opinião, seguiu Iíozcs para a ba rra das Alagoas, e alli na Ponta de Jaraguá desembarcou Boxas

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1635.

T I O H I S T O R I A D O R R A Z I L .

suas conquistas. Muitas vozes havião os militaresproposto que se expellissem das Alagoas os Portuguez e s , que nunca os deixarião estar seguro por terraemquanlo fossem senhores d'aquella posição. Masexigia isto crescido numero de embarcações miúdas,que coslumavão andar empregadas alhures, commaior proveito dos particulares, e menor vantagempara o publico serviço. Com grande desgosto doexercito se havia pois dado de mão á einpreza, e soagora de tal descuido se percebião as perigosas conseqüências. Derão-se ordens para segurar melhor oForle Orange cm Itamaracá c o Cabedello, mas operigo eslava mais perto da sédc dos domínios hollandezes, e em máo tempo rebentou, quando com ademora de remessas da Hollanda estavão mal providos os depósitos, e havia mais de duzentos soldadosinválidos por causa das tliiguas.

Com a chegada d'um armamento, de que porm uito o haverem esperado ja principiavão a desesperar , cobrarão animo os Pernambucanos. Já o povoda Várzea não trazia gado e farinha de mandioca cmpagamento do tributo em espécie que d'clle se exigia.E onde havia pouco so encontravão a forçada submissão de obsequioso servilismo recebião agora os invasores respostas altivas e decididas. Muitos Hollandezes forão mortos nas casas dos Portuguezes, outrosabertamente nos campos c pelas estradas. O povo deSerinhaem assassinou os doentes que alli tinhão

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H I S T O R I A DO R R A Z I L . 311

ficado. Interceptavão-se cartas, e prendião-se padres ir>ã-

e negros, empregados como agentes da correspondência que fervia agora entre o exercito e os Po rtuguezes dentro do território hollandez. Severos casti-gosse impunhão, mas o rigo r em taes casos augmentao resenlimento da oppressão e da injustiça, e desesperando de por outros meios porem cobro a esta

correspondência, propozerão Artiszensky e Stack-houwer ao concelho assolar o paiz entre Peripueirae Porto Calvo, arrancando a mandioca, queimandoas cannas de assucar, destruindo os engenhos e habitações, removendo os moradores com seus gadose bens moveis, e eslabelecendo-os em casas con

fiscadas e terras abandonadas. Àpprovou-se a medida, e ás portas das egrejas e engenhos se afüxáràoeditoes convidando todas as pessoas a obedeceremdentro de tres semanas a esla ordem de compulsória

1 J. de laet.

transmigração. 4804'

D'esta vigorosa medida nasceu uma conseqüência |^t

c

u

ba

u££que não tinha sido mettida em conta. Vendo se pr i - p e l a s maU,s-vados dos recursos que os seus conterrâneos lhesteriào proporcionado no paiz aberto, resolverão osPortuguezes marchar através das selvas por caminhoque se reputava impracticavel e jam ais havia sido

tentado. Souto, que depois das suas proezas em PortoCalvo de continuo molestava os Hollandezes devas-tando-lhes as terras que possuião, foi agora mandadoadeante com vinte Portuguezes e alguns índios pou-

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512 HISTORIA DO BRAZIL.1G35> cos a abrir caminho e tirar informações. Selecentos

homens ficarão na Lagoa ' ás ordens de Bagnuolo, ecom dobrado numero se poz Boxas em marcha no

idejan.i636. principio do anno. Cada homem levava a um hombroo mosquete e ao outro as provisões, indo carregadosde munições os índios. Um d'estes alliados deixou asfileiras em busca de alimento e Boxas o mandou arca-

buzar: foi o primeiro caso de tal disciplina no Brazil,e assim o consignão os historiadores portuguezes

B. Freire. P '

§680-93. m a i s para horror do que para exemplo.Grandes difficuldades havia que vencer; em muitos

logares não podião passar os cava 11 os, e tinhão os

peões de marchara um de fundo. Mas era-lhes favorável a estação secca, tornando vadeaveis os panta-naes que alias ninguém teria atravessado. Não lardoua chegar recado de Soulo de haver Schuppe oceu-pado Porto Calvo com seiscentos homens. Tinha estecommandante ameaçado Fr. Manoel do Salvador de

mandar enforcal-o, quando foi a interceder pelosmoradores, e agora Une razões de desejar ter antescum prid o a ameaça. Fosse o que fosse, como cremitaPaulista era Fr. Manoel um Portuguez ás direitas.Apenas se soube que estavão a chegar reforços, pegarão em armas elle e o seu reba nho, reun indo-se

setenta e seis homens ao todo, munidos de escopetas,espadas e escudos. De dia comião e bebiào em casa

' Mias Alajoa-.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 313

do frade, de noute armavão ciladas ao inimigo, 1636-matando assim vinte da guarnição, afora seis, queaprizionárâo. Em despique lançarão os Hollandezesfogo a uma casa, em que arderão duas crianças. Nodia seguinte dizia o frade missa quando viu uma partida de sele Hollandezes descer um outeiro a algumadistancia, e concluiu o serviço por uma practica emque convidava os ouvintes a não terem misericórdiacom aquelles homens, recordando unicamente asduas crianças. Effeclivamente foi toda a partida apanhada e morta. Com proezas como estas se entreteveo frade cerca de tres semanas antes de receber auxilioalgum. Foi então que Francisco Bebello, que emmuitas occasiões se havia distinguido no correr d'esta

guerra, foi mandado adeante a deter o inimigo emPorto Calvo emquanto não chegava o corpo principaldo exercito. Andava este homem costumado a com-mandar partidas pequenas, e agora quando lhe dis-serão que levasse a força que quizesse, tomou duascompanhias apenas. Tão bem forão tomadas estasmedidas, que Schuppe, que so viera a Porto Calvopara em pessoa ver assolar o paiz, por pouco não foiapanhado. E ao chegar a quatro legoas do logar depois de seis dias de marcha pelas florestas, soubeBoxas que se Bebello houvesse trazido um destacamento mais forte, ter-lhe-ião sorprendido os Hollandezes cahido nas mãos. Immediatameníe se lhe mandou considerável reforço, mas Schuppe não esperou

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514 HISTORIA DO RRAZIL.1636. p e i a s u a chegada, retirando-se em continente para a

Barra Grande. No logar por elle evacuado acharão osPortuguezes depósitos de munições de boca e de

Marcha Roxas guerra. Logo constou que Artiszensky vinha de Peri-Aru°s"ena

sky pu eira em soccorro de Schu ppe, e Boxas, que absolu

tamente ignorante da topographia do paiz não pediaconselhos aos que a con hec ião, m archo u-lhe ao encon tro, torn and o a enfraquecer-se com deixar quinhentos homens em Porto Calvo. Ao cahir da noutechegarão as suas guardas avançadas á vista do inimigo, seguindo-se uma refrega, a que a escuridão

veio pôr termo. Começou agora o general a reconhecer a própria imprudência, pois esta pequena amostralhe mostrara quanto a guerra nas matagaes do Brazilera diversa da sciencia que elle aprendera na Europa . Chamou os seus officiaes a conse lho ; re pre-scnlárão-lbe estes que tinha elle tão pouco tempo de

estada no paiz que ainda não podia distinguir do inimigo a sua própria gente sem ver-lhe as bandeiras;que considerasse bem o risco de envolver-se n'umaacção contra forças tão superiores, pois dizia-se queArtiszensky trazia mil e qu inh en tos hom ens ; e quemandasse chamar immcdialamente as tropas de Porto

Calvo, visto ficar longe de mais a Lagoa. A isto an-nuiu o general e expediu a o rdem .

siiuaçüo 0 primeiro conflicto fora-lhe mais vantajoso doeriliea do s •,, , . i • í

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1636:

H ISTOR IA DO BR AZIL. 515

que tanto desanimou a genle de Artiszensky, ja inquieta pela sorte de Schuppe e das tropas sob o seucommando, que mostrou a maior repugnância a darbatalha. Defronte um do outro estavão agora os dousexércitos, cada um na sua eminência. Percebeu Artiszensky que jogava tudo sobre um dado, e em ird'um batalhão a outro gastou a noute, animando osseus soldados; se vacillavão um so momento, tudoera perdido, lhes dizia, nem abaixo de Deus deviãopôr a esperança senão em seus braços direitos. Impossível era escapar pela fuga a um inimigo queelles ja sabião quão veloz era quando batido, nemhavia misericórdia que esperar d'um povo arrogantee sedente de sangue, a quem tantos males tinhãocausado. So constância e valor os podião salvar seguramente, e recommendava-lhes que não desperdiçassem munições de longe, mas guardassem os tirospara quando vissem os peitos dos contrários ás bocasdas espingardas.

Baldadas não forão estas exhorlações. Erão osHol- movimento1 J i_- J e precipitado

landezes um povo que sabia encarar de frente o <ie Roxas.perigo, nem lhes faltava esforço, quando de esforço setractava. Muito osvexou de noute a sede com a gente,

que na véspera supporlara comprida marcha semver água desde o meio dia, interpostos entre ella eum arroio os Portuguezes. Ao romper d'alva fizerão-se preces publicas, e com sincera devoção, sob a im

J. de Lael.501.

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5IC HISTORIA DO RRAZIL.

1656. inimigo para ouvil-as. Feito isto tocarão as trombe-tas a alvorada e os tambores rufarão a despertar.Nenhuma resposta da parte dos Portuguezes. 0 únicocuidado de Boxas havia sido não se tivessem os Hollandezes retirado a coberto da escuridão, escapando-Ihe assim. Apenas raiou a luz destacou elle algunsmosqueteiros a oecupar um regato ao lado do ou-teiro, d'onde incommodárão o inimigo com algumeffeito; mas Artiszensky não se deixou arrastar a ummovimento imprudente, atacando os Portuguezessobre a eminência em que estavão postados. Melhorsuecedida foi uma tentativa da parte d'clle para induzir estes a abandonarem a vantagem da sua posição. Mandou fazer fogo com uma peça para o logar,onde na ala esquerda do seu exercito eslava Boxasperto d'uma arvore grande, num sitio (Ponde melhor se avistava o campo. Como um desafio parecerãotomar isto os Hespanhoes, que em vez de aguardarem as tropas de Porto Calvo, pozerão-se immediala-mente em movimento pelo outeiro abaixo a investiro inim igo . Os que romperão a acção avançarão, levando tudo adeanle de si, temerariamente talvez,mas com uma temeridade que podia dar em victoria. N'um momento infeliz, os mandou Boxas fazeralto em quanto outro corpo marchava a apoial-os;passou-se palavra, mas este modo de transníitlir ordens causou confusão, tornando-se bem depressaimpossível remediar a mal leito.

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1636.

Mortede Roxas

e derrota do

HIST.ORIA DO BRAZIL. 317

Apeou-se o general, e tomado um pique, melteu-se entre os lanceiros, que ainda não tinhão sidorotos, e procurou sustentar a batalha; mas os Portuguezes debandarão e não poude relel-os. Uma balade mosquete feriu Boxas n'uma perna; no cavallo stuexercitoque elle teria então montado, fugira covardementeum dos seus officiaes. Tinha a face voltada para oinimigo, quando recebeu nas costas outra bala, queo derribou logo. Dentre a sua própria tropa partirao pelouro. Levantou-se o general, e dizendo que nãoera nada, pediu um cavallo. Mas ao tentar metter opé no estribo, exclamou : « E impossível que isto seme fizesse entre fidalgos portuguezes, » e cahindosegunda vez, expirou. Não podia o tiro deixar de tersido accidenlal. Fr. Manoel e Henrique Telles deMello levarão o corpo de Boxas para uma monta,apenas rendido o ultimo suspiro, e cobrindo-o defolhas seccas, voltarão á batalha. Bebello e Camargo,homens assaz experimentados para terem previstouma derrota, e em tal caso ainda ganharem fama,fizerão frente aos vencedores, e tomando as melhoresposições, salvarão os fugitivos. Na ultima armadaviera o habito de Christo e o titulo de Dom para esteleal cacique Carijó, e bem merecidas havião sido taeshonras. Contente com a sua victoria, não quiz Artiszensky aventural-a, acossando o inimigo, e voltou aPeripueira.

No segundo dia depois da batalha foi Fr. Manoel

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ICCO.

518 HISTORIA DO RRAZIL.

com Henrique Telles e uma partida de negros cmbusca do cadáver de Boxas. Contarão os mortos nocampo, apanharão quantos mosquetes por alli jazião,escondendo-os nas balsas até melhor occasião, e levarão o corpo 11'uma rede. 0 frade cavou com os seusescravos uma sep ultu ra perto da própria habitaçãoao lado da floresta, e alli enterrou o cadáver mellidon'um caixão cheio de terra e barro, não sem ler primeiro tomado uma bolsa, que Boxas trazia 11'umaocculta algibeira do collele debaixo do braço. Estavão nVIla as duas chaves douradas d'uma caixinha,em que o finado guardava a sua patente e instrucçõês, as insígnias da ordem de Sancliago e um saquinho de relíquias.

Grande não foi a perda dos Portuguezes, mas estaacção salvou as conquistas aos Hollandezes, que tiverão n'ella quarenta mortos, outros tantos mal feridos, c mais uns quarenta cujos ferimentos os não

impcdião de marchar sem auxilio exlranho. Lançarão-se os mortos 11'unia cova, que se cobriu de ramos, e depois atlendeu-se aos feridos. A final formarão as tropas poi batalhões, para de joelhos renderemgraças : Artiszensky agradeceu-lhes o modo por quen'aquelle dia se havião portado, e derão-sc Ires des

cargas em honra de tão assignalada victoria. Dosprizioneiros souberão os Hollandezes que Boxas desembarcara com dous mil homens e vinte peças(Partilharia, tendo o armamento custado em Porlu-

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 319

gal oitocentos mil cruzados. Tinhão elles orçado em i m

mil e oitocentos homens a força que entrara emacção da parte dos Portuguezes, mas o sargento-mórtambém aprizionado asseverou-lhes que não passarade mil e cem, contados duzentos índ ios n'esle nu mero. Bagnuolo prende u o próprio filho, por se haverconduzido mal n'esle dia, e em ferros o remelteupara a llespanha.

Tinha o tenente general Andrada avançado um a suecede• ° Bagnuolo ni

le^oa nasua marcha de Porto Calvo, quando lhe che- commando.gárão novas do desbarato e morte de Boxas. Aconse-lhárão-no alguns officiaes, que sem perda de tempo

se retirasse, abandonando a vil la : com menor desaireo faria ja, d izião, do que depois de apparece r o inimigo, sendo agora prudência o que mais tarde haviade ser fuga. Com mais bravura e acerto representa-vão oulros que os fugitivos demandarião a villa, efalhando-lhes este refugio, que seria d'el!es, chegados

de fresco da Europa e sem practica do paiz? Que allise acolhcrião era certo, se Arliszensky os perseguiria,duvidoso. A esta melhor opinião se inclinou Andrada.Betirou pois sobre Porlo Calvo, e em quanto se repa-ravão e melhoravão as fortificações, apresentou ascartas selladas de suecessão que Boxas lhe havia

deixado. Era Juan Ortiz o nomeado para o commando, m orrera porem na Lagoa : rom peu-se poiso segundo sello e appareceu o nome de Bagnuolo,visto o que quizerão soldados e m orad ores pe rsuad ir

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520 HISTORIA DO BRAZIL.

1630. Andrada a que assumisse elle próprio o commando,

declarando-se alguns até por constrangel-o a isso . Aochegara Lagoa a noticia da nomeação de Bagnuolo,também alli foi mal recebida, sendo Duarte dWlbu-querque convidado a reunir na sua mão a auctori-dade militar á civil. Ainda em bem que o respeitoque as tropas tinhão a este, e que as induzia a si-

milhanle acclamação, lhe permitliu também aquie-tal-as.

Os primeiros aclos de Bagnuolo manifestarão essamesma espécie de irresolução que ja o fizera impopular; mandou ordem de evacuar Porto Calvo, elogo depois despachou um mensageiro a rovogal-a;depois pensando sobre mais madura reflexão, queposto tão importante não devia ser abandonado, paralá marchou em pessoa. Antes de partir escreveu sobre o estado das couzas um memorial para o novogovernador general Pedro da Silva, rcpresenlando-lhe a elle e a Hozes, que se a armada hespanhola aodesaferrar da Bahia seguisse ao correr da costa, poderia provavelmente descarregar um golpe tremendosobre o inimigo, agora que linha este divididas as

H. Frei re . „

§Tã7-i4. torças.

occupãoo- Avançou Bagnuolo para Porto Calvo, onde reuniu

Por tuguezesi ' o ° r t òr a

c I i í o e 0 1 , o c e n t o s homens, c d'alli poz-se a talar asterras possuídas pelos Hollandezes. Deplorável erana verdade a condição dos habitantes (Festas províncias conquistadas. Parece ler sido desejo dosllol-

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HISTORIA DO BRAZIL. 321

landezes, como indubitavelmente teria sido a sua 1636-verdadeira política, reconciliar os colonos com ojugo que lhes impunhão, e favorecer os casamentosmixtos. Oulro systema que seguião era fazer entre opovo proselytos á religião reformada, mandandopara este effeito buscar pregadores, e pondo em gyrolivros controversistasescriptos em lingua hespanhola.Por toda a parte onde pôde fazer-se ouvir, trium-pha sempre o protestantismo, e assim tem sido também sempre o maior afan do clero catholíco evitarque suas ovelhas leiâo couza alguma em que se exponha a monstruosa corrupção do papismo *. Queixão-se os Portuguezes do bem que forão succedidos estesministros no seu empenho; não consta porem quefosse grande o resultado colhido, para isso faleceu otempo. Andavão vigilantes os padres, e se os Brazileiros odiavão como hereges os seus conquistadores,mais ainda ficarão odiando a heresia como religiãodos seus oppressores, pois que, por mais sinceramente que os Hollandezes desejassem conciliar osseus novos subditos, neutralizava-lhes a intenção umsystema de suspeitosa crueldade, a que , gerando umcrime oulro crime, se entregão quasi invariável- ,, ,, ,mente conquistadores e tyrannos. Nem tantos decre- iioiiandmstos do governo, nem o rigor todo com que erão estesexecutados, logravão impedir que muitos colonos

1 Nada ha de mais inexacto do que esla proposição de SoutheyF . P .

u 21

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5-2-2 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

1636. nãoentretivessem intelligcncia secreta com os seus

conlerraneos, trabalhando sempre por a si próprios

se libertarem; o este proceder envolvia no mesmo

perigo os que de coração se havião dado a seus novos

senhores.A pr im eir a medida foi tom ar aos m oradores todas

as armas, sendo impossível confiar n'ellcs apoz tantas provas do ódio justo e inveterado quevotavão aosinvasores. Ainda isto não pareceu sufficienlc; resolveu-se meltel-os todos dentro de limites onde po-dessem ser vigiados de perto, e, ampliando o planoseguido antes da derrota de Boxas, assolar lodo o paizfora da linha de demarcação, e deixar de permeioentre as próprias conquistas e o território portugueztrinta e duas legoas de deserto. Declarou-se pois aosBrazileiros que durante os primeiros quinze dias domez seguinte lhes era livre ir ás matas fazer farinhadas plantações que lá linhão, e trazer seus bois, carneiros e cavallos, mas que lindo esse prazo receberiãoos índios ordem de destruir as roças, queimar ascasas, cortar o gado, e matar todo o indivíduo que

1. deiaci. encontrassem alem dos limites agora prrscriplos.Assim referem os Hollandezes as couzas, mas os Portuguezes affirmào que a tyrannia foi mais longe : amenor suspeita baslava para se incorrer na pena demorte, e os ricos erão certos de serem suspeitos..Não era a morte o mais que este mísero povo linhade soffrer; recorria-se aos tractos para dcscobrii

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H ISTOR IA DO BBAZ IL. 323

onde havia thesouros, e as mulheres se vião expostas 1C56-aos excessos d'um a soldadesca bruta l e in fre ne. Se oscommandantes querião reprimir estas atrocidades,fallecia-lhcs o* poder, nem em paiz Ião selvagem sedeixava sopear o soldado, nem, onde impera a lei B. Freire.

r § 711-23.

marcial, ha horror que debaixo da sua sancção se o * ^ -

não possa perpetrar impunemente l. Açutavão-sehordas de Tapuyas e Pitagoares contra os Portuguezes, que até accusão os Hollandezes de terem en treg uecrianças a estes cannibaes que as devorassem ; maspor certo é impossivel que seja similhante accusaçãoverdadeira.

Não foi a morte de Boxas uma desgraça para o seu Guerra di,exercito. Em campos regulares e paizes cultos não epre J

era onde se aprendia a fazer a guerra do Brazil. Jatres capitanias se tinhão perdido em quan to os velhosgencracs aprendião experiência, e ainda bem quenão foi precizo repassar as mesmas licções. Havia

agora munições, cuja falta se sentia antes da chegada d'esles reforços. Mathias d'Albuquerque ter-se-ia visto sem poder a não ter sido a generosa prev idência de Lourenço G uterres, que servia de m eirinhoda correição em Pernambuco. 0 tempo em quepoderia ler salvado toda a sua fazenda movei, em-

1 Raphael de Jesus particulariza algumas crueldades dos Hollandezes. Parece que estes andarão na eschola de Alva, e horriveis comosão essas particularidades, o que em Amkrjna se fez não as torna incríveis. Expressamente accusa este escriptor os commandantes.

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52'» HISTORIA DO BRAZIL.

1656. p a r a elle deserlavão; d'ellas e dos prizioneiros soube

que no Becife se esperavão reforços formidáveis.Pouco lhe aproveitava o conhecimento d'um perigo,contra o qual nenhuns meios tinha de precawr-so.Duas caravelas enviadas com provisões demandarãopor isso a Bahia, d'onde com muita difíiculdade foilevada a carga por terra para Porto Calvo. Em quanto

este mesquinho c insufliciente soccorro era tudoquanto recebia o general dos Portuguezes, trabalhavaacliva a Companhia das índias Occidenlaes por segurar as suas conquistas. As despezas d e l t a , desde asua organização até ao presente, subiào a quarentae cinco milhões de florins. N'esle lapso de tempo to

mara cila ao inimigo quinhentos e quarenta e selenavios, indo mais de trinta milhões de florins, pro-dueto d'estas prezas, para o cofre publico; causaraaos Hespanhoes um prejuizo de cerca de duzentosmilhões, e importara da África mercadorias, no valor de quatorze milhões e seiscentos mil florins.

Agora resolveu ella mandar um general com poderesillimitados, e forças sufficientes para completar csegurar as conquistas no Brazil. Foi Jan Matirilz,conde de Nassau, o designado para este importantecommando, homem digno de ter sido o fundador demais duradouro império. Vinte e dous navios se Ilio

prometlérão, numero que' foi depois reduzido adoze, com 2 ,7 00 hom en s; e estes mesm os tão vagarosamente se esquipavão, que elle por mais avizado

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H I ST O R I A DO B R A Z I L . 527

houve ir indo adeante com sos quatro velas. Em ja- 1C3fi-

neiro de 1657, um anno depois do desbarato e morte Bar]iEUS,P 26 30.

de Roxas, aportou Nassau no Becifel.

Um so momento não perdeu Nassau á sua che- deM^a

su

gada. Era que em verdade não havia tempo que perder; tanta audácia havia a fortuna inspirado ás par

tidas dos Portuguezes, que nem a estrada entreOlinda e o Recife era ja segura, e ou se havia de pôrpromplo cobro a estas devastações, ou os estabelecimentos de fabrico de assucar, cujos dízimos erão tãoimportantes, que por 280,000 florins se arrernala-vão, tinhão de cessar. Distribuiu 2,600 homens pelas

differentes guarnições, formou um exercito de quasi5,000, e poz de parte 600 para a guerra de depredações. Depois olhou pelo estado dos seus depósitos.As assoladoras correrias de Camarão e Souto du ran tetodo o anno anterior havião produzido a escassez, emal era possível abastecer as guarnições e achar pro

visões ás tropas para uma expedição de dous mezes.Tudo supportárào Hollandezes com paciência, ex-cepto rações curta s2, costumados comoandão a trazer 'sempre repleto o estômago; prorompião em alaridos

1 Durante a viagem lançou-lhe o mar uma bagem a bordo na a ltura de üunkirk, c algumas perdizes lhe pouzárão nos mastros vindas

da costa da Inglaterra. Refere Barlaeus estas couzas como agouros deque a terra e o mar obedecerião... a Kassau.

i Nec enim, sueti ad satietatem nutriri nostrates, inediam fe-runt, quttm aliunde e confragosa et paupere terra veniens miles

jacile tolerai: São palavras de Barlasus.

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1030

528 HISTORIA DO BBAZIL.

os solda do s e toda a aucloridade e bellas pr om es s a s

dos officiaes erão poucas para a p a z i g u a l -o s . Procla

mou-se que todo o mundo poder ia t razer ao campo

hollandez comest íveis á venda; is to porem se fazia ,

não fosse o in im igo sab er do ap ur o q u e re inava e

também pa r a illudir as t ropa s com a esperan ça de

s u p p r i m e n l o s . Ao inspeccionarem-se as munições

descobr iu-se fa l ta de mechas , culpa dos que na Hol

landa havião disposto as couzas, mas na casca d 'uma

plan ta para s i ta sem folhas se acho u um su bst i tu to ,

qu e se t inh a a vantagem de ser inex t inguive l , t am-ü33-1is' bem se co nsu m ia mais dep ressa .

Marcha P r epa r ado t udo , m andou .Nassau fazer preces pu-

rontraaSTorto bl icas , e poz-se em marcha em busca do in imigo,

indo adean te por água as t ropas b isonhas , que e l le

j u l gou p r uden t e poupa r quan t o poss íve l 1 .

A' not icia da chegada d 'este exerci to mostrou Ba

gnuolo a costumada indecizão : pro hib iu qu e ninguém

removesse fam íl ia ne m cabed al e logo depo is m an

dou e l le mesmo ludo quanto era seu para as Alagoas

com uma escol ta de I ta l ianos . Ueuniu-se um con

celho de g u e r r a ; Duar te d'Albu(fucrquc e Andrada

ins is t i rão na necess idade de oecupar os passos e picar

• Barlaus dá-lhe uma forca de TOO infaulcs, SUO homens da ar»

mada, 600 Brazileiros, e um corpo de (avaliar.a. Ilnlo Freire eleva-aa 0 ,000, Itaphael de Jesus a 5000 Hollandezes e innuiueravvis índios.Kste esriiplor, metlendo Harlaus á hulha por exagerar o numerodos Portugueses, diz d'ellc : Escrev eu e pintou,... e pintou em ludo

a que escreveu. I. 5 , § l 'J7.

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HISTORIA DO BRAZIL. 529

os Hollandezes na sua marcha, mas como se o gene- W™'

ral so lhes houvesse pedido conselho pelo prazer derejeilal-o, até as tropas postadas no rio Una, queNassau tinha de atravessar, e onde se lhe podia opporvantajosa resistência, forão recolhidas, principiando-se a levantar dous reductos, que, diz Brito Freire, soaproveitarão ao inimigo. N'um d1elles, apezar denunca se concluir, assentárão-se tres peças.

Desembarcando com o seu destacamento na Barra Bagnuoloabandona

Grande, fez Artiszensky sem opposição a sua juneção r°><° caivo.com Nassau sobre o Una, e avançarão ambos até duaslegoas de Porto Calvo sem que do seu movimento ti

vessem os Portuguezes a menor noticia. A' sua vistaBagnuolo, que os deixara reunirem-se e não molestados effecluarem a sua marcha, deu ordem de ac-commcltel-os. Seguiu-se uma valente porem desordenada sortida; Camarão distinguiu-se como sempre,e sua mulher, agora conhecida pelo christão e nobre

nome de D. Clara, a cavallo lhe pelejou ao lado. A'testa dos negros ostentou Henrique Dias a costumadabrav ura. Uma bala o feriu no punho esquerdo, e,julgando-a. envenenad a l, mandou amputar a mão,dizendo que uma lhe bastava para servir o seu Deuse o seu re i ; para se vingar cada dedo lhe teria logar• . , , , Valerosode mao, e antes queria morre r d um a vez do que i-ucideno.consumir muito tempo na cura. A perda dos Portu- §-

7U8%e-

1 Por que se dizia que os Olandczes tiravam com balas ervadas

com toucinho, e que aos feridos logo lhes dav am herpes.

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HIST OR IA DO BRA ZIL. 331

do Bio das Pedras, que passando por Porto Calvo cahe 1656«no mar cinco legoas mais abaixo. Manoel de França Porto calvo.alli fora postado a guardar o rio com cento e oitentahomens, para que não entrassem as chalupas do inimigo. Quando viu que sem reforço o não consigui-ria, mandou recado a Bagnuolo, mas tendo em vãopor dous dias esperado soecorros d'um general fugido, teve de abandonar o posto, começando então avir sem interrupção artilharia e provisões da armadapara o acampamento. Quatro baterias se plantarãoguarnecidas de dezasele peças. Poucos como erão edesanimados com o abandono de Bagnuolo, fazião ossitiados de noute vigorosas sortidas, e de dia serviãobem a sua artilharia. Apoz um cerco de quinze dias1

estando ja mui arruinado o forte, intimou Nassau ocommandante que se rendesse, escrevendo-lhe umacarta tão honrosa para os nobres sentimentos que ahavião dictado, como para o valor e caracter d'aquellea quem se dirigia. Giberlon pediu vinte e cinco diaspara poder receber instrucçõês de Bagnuolo : umaresposta curta e secca concedeu-lhe apenas vinte equatro horas. De facto ja não era sustentável a praça2.Com condições honrosas capitularão os Portuguezes:havião de sahir com suas armas, bandeiras e uma

1 Os Sr;. Warnhagen e Netscher affirmam que fora o cerco detreze dias. F. P .

8 Arcem Povacaona.n a chama Barlaeus, parecendo ter tomadopalavra povonção pelo nome do logar.

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332 HISTORIA DO RRAZIL.

1630 p Ê ç a d 'ar tilh ar ia ; os soldados com suas mochilas, os

officiaes com suas bagagens; também se lhes deviaproporcionar passagem para as índias, trocando-seos prizioneiros de parle a parte. Concluido isto, entrou Nassau na fortaleza, onde assentou Giberton eos demais officiaes á sua própria meza, traclando (nodizer de Brito Freire, o melhor e mais imparcial

historiador desta guerra) os vencidos a todos osrespeitos como a si próprio se quereria ver tractadose tivesse sido sua a sorte de cahir prizioneiro. KarclNassau, sobrinho do conde 1 , e homem de merecimento real e grandes esperanças, fora morto duranteo assedio. Cerca d'um mez antes de investida a praça

linhão os ossos de Boxas sido desenterrados pelo seusobrinho, e depositados com honras militares naegreja, pendurado na parede ao lado um escudo comas armas do fallecido. Este escudo arrancárão-no ossoldados hollandezes e apresentárão-no ao seu general, que o mandou para o Becife, onde fosse collo-cado no seu próprio palácio em memória honrosad'um soldado valente.

Abandona Alem dos índios restava ainda a Bagnuolo umaAw!gôas.as força de mil e duzentos homens. De fácil defeza e

bem situada para ser soecorrida da Bahia e da Europa era a villa de Madantlla* nas Alagoas, mas

1 Diz Xetscher que Carlos de .Nassau era primo de Maurirui. F. I'.s É esta uma expressão vulgar, usada nas províncias do Norte, (pie

corresponde á palavra Magdalena. F. P.

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HISTORIA DO B R AZ IL . "33

perdida tinha o general toda a confiança nos seussoldados, que pela sua parle com melhor fundamento nenhuma punhão n'elle l. Quasi que nemaguardando que o perseguissem, abandonou estaposição, retirando se para a villa de S.Francisco aoito legoas da foz do grande rio do mesme nome, acuja margem eslava assentada5. Aqui linha tambémabertas as communicações por água; entre elle e osperseguidores ficava o rio Piagui, que não sendo va-deavel offerecia o melhor posto do mundo para formidável resistência. Apenas porem lhe constou queo vinhão os Hollandezes perseguindo, renovou Bagnuolo a fuga, e atravessando o S. Francisco foi retirando sempre, até chegar á cidade de Sergipe.

Entretanto mal deixara Porto Calvo seguro poz-seNassau com rapidez tal no encalço do exercito fugitivo, que qualquer general menos aclivo que Bagnuolo cm retirar, teria sido alcançado. Atravessouo Piagui em jangadas alli mesmo feitas de ramosligadas com cipós; lá lhe ficarão afogados algunssoldados poucos, servindo o perigo da passagem quedeveria ter sido absolutamente impracticavel á faced'um inimigo, para mostrar a importância do posto

' Como do costume é neste lugar injusto Soulhey para com o

conde de Bagnuolo. F. P. •s 0 auclor equivocou-se. Não se chamava villa de S. Francisco, osim do Penedo, nem se acha situada a oito legoas da foz de gra nd erio, mas a sete, em um terreno elevado e pedregoso, d'onde se derivao seu nome. F. P.

1636.

B. Freire§ 775-8.

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354 HISTORIA DO RRAZIL.

t o s e . q U e so abandonara. Tão de perto perseguia elle Bagnuolo, que as suas guardas avançadas ainda chegarão a S. Francisco em tempo de aprezar as bagagensdos que fugiâo adeanle; mas alcançado este rio desistiu Nassau da caça, tendo po r m elh or seg ura r oque ja gan hara do que co ntin ua r a correr atraz dequem tf o veloz fugia.

o rio Na sua foz mede o rio S. Francisco cerca de oitoS. Francisco.

milhas de largura; suas águas turvas mancháo ooceano porespaço de quatro ou cinco, sentindo-se-lheaind a a esta distancia a força da co rre n te. A barra émá, nem a podem entrar navios de mais de cincoenla

toneladas, sendo o canal de sudoesle o mais fundo.Embarcações miúdas a sobem por vinte legoas até ásprimeiras cachoeiras, acima das quaes ainda podemnavegar umas oitenta ou noventa legoas até ao chamado Sum ido uro , onde o rio sabe d'um canal subter

râneo \ pelo qual corre dez ou doze legoas 2. De

A natureza d'esle canal explica-se provavelmente pelo que osviajantes americanos da ultima expedição dos capitães l.ewis e Clailenos cuiitã.i do Rttfl (jangada) do Rio Vermelho; é, di/cin elles, umacoberta natural, ipie esconde todo o rio iftitna extensão de uY/asetclegoas, e que continuamente uugincnta com a lenh a de alluvião queoda a cheia traz coinsijjo. lista coberla, que por muito tempo não

passou de paus trazidos pela própria corrente, sustenta aj;ora uma

vegetação de tudo quanto abunda nas vizinhas florestas, sem evceptuararvores de considerável uilto, poilendo-se passar e repassar o rio, s<msequer se dar pela sua existência. Philipp's Colt. of Contemjiorary

Yoyages. Vol. o, p. 107.

- Iliz o Sr. General P. d'A. Bellegarde que o rio S. Fra-u isco M ria

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1630.

336 HISTORIA 1)0 BRAZIL.

Collocada n'um ponto onde a corrente muito se

conlrahia entre as suas margens a villa de S. Francisco, ou, como ás vezes a chamavão, o Penedo',dominava o rio. Contava Bagnuolo que o logar seaguanlasse por algum tempo, mas não era o exemplo que o general dera para infundir brios nos habitantes, e de feito nenhuma resistência se oppoz. Não

escapou a importância da situação a Nassau, que allierigiu um forle, chamando-o Maurício do seu próprio no m e. Cruzou o rio, e mandou que todos osmoradores da banda d'alem se passassem com suasfamílias á ribeira do no rte, para que fossem voluntários ou constrangidos dar auxilio aos Portuguezes,

e podesse elle assolar esla fronteira do seu própriote rri tó rio . As tribus que moravào sobre este rio falla-vão uma linguagem que ninguém do exercito deNassau comprehendia, mas este com gestose presenteslhes deu a entender o que queria, convidando-os aopporem-se aos Portuguezes que tentassem reenirar

na perdida província. Tomadas estas sabias medidassubiu o próprio conde cincocnla legoas pelo rioacima a explorar o paiz; as viçosas savanas que acorrente banha, e os muitos rebanhos, alguns de mile quinhentos, oulros de muitas mil cabeças, quen'ellas andavão pastando, e encherão de admiração

pela riqueza da terra. Assaz ressumbra isto d'uma

1 I)"onde Barlajus fabricou a palavra latina Openada l

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HISTORIA J)0 BRAZIL. ">7

caria que el le d ir ig iu ao seu pa re nt e o pr ínc ipe l636

(FOrange, ped indo- lhe qu e ins tasse com a Com pa

nhia para que remettessea este del icioso paiz quantos

colonos allemães podesse achar, e se estes não fosse

possível havei os, que se despejassem as cadeias e as

galés, t ransp or tan do os cr imino sos para aq ui , ond e

com útil e v i r tuoso t ra ba lho se pu rgas sem de seus

delidos '. Pedia mais so ldados , achando-se enfra

quecido o exerc ito com piquetes des lacados , g u a rn i

ções deixadas, e pela morte . De armas também care

cia , mechas, tambores e t rombe ta s , legumes e

conservas; vivere s frescos não faltavão, m as nã o e rão

dos qu e servião pa ra pro ver uma f ro ta . Bandei ras

egualmenle lhe havião de remetler e faxas côr de

laranja para os soldados, afim de distinguil-os e

alental-os : se fossem de satte nd ido s estes pe did os,

tudo perigaria , dizia el le , pois so o respei to que lhe

tr ibutavão, mantinha em ordem as t ropas. Bem foi a

Por tugal que ras te i ros ciúmes e baixas considerações

neut ra l izassem a influencia d 'es le g ra nd e h o m e m ;

qu e, se lhe t ivessem seg uid o os pla no s, seria hoje o

Brazil uma colônia h o l l a n d e z a s . So a falta das neces

sárias provisões lhe to lheu que t i rando vantagem do

terr or do inim ig o e da confiança das suas próprias B . Freire.

tro pa s, m a rc hass e d ir e it o so br e a B ah ia . Raria-.us.' u.

1 Triste e pernicioso systema de colonisação, de que tantos malestem resultado. F. P.

s Ter-se-hia, pelo contrario, acelerado a no*sa independência. F. P.11 oo

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358 HISTORIA DO RRAZIL.

*657. Com não menos zelo do que talento regularãoR w l ° ° entretanto os officiaes civis no Becife os negócios

internos da conquista. Todas as pessoas estabelecidasn'esta cidade e na de Olinda para fins commerciaesforão arrigimentadas por companhias, cada uma dasquaes tinha seus officiaes e bandeira, asseguradosassim os serviços d'aquelles cuja lealdade era suspeita. As leis da Hollanda relativas ao matrimônioforão coercitivamente postas em execução, quandose tornou necessário um freio. Conciliáráo-se os ju-deos, permittindo-se-lhes a guarda do seu sabbado,e os christãos tiverão ordem de sanclificar o septimodia desde lanto profanado; lomárão-se medidas paraconversão dos alliados indígenas, abrirão-se escholaspara os seus filhos, e fizerão-se catechismos paraelles. Querendo-se reedificar Olinda, peiinittirão-scalli todas as construcçòcs, prohibindo-se a lirada demateriaes das ruinas para outras parles. Mandárão-se dous (lepulados.ao serião' á cata de minas, acompanhados de guias portuguezes e naluraes : effecli-vamenteappareceu prata, mas a veia, que á primeiravista se figurava rica, enganou as esperanças quefizera conceber. Dizia-se que os A lbuq uerques linhãoextraindo muito ouro de certas minas em Pernambuco, e para achal-as se fizerão pesquizas, poremmudadas. Egualmente em não se procurarão as mi-

' Missi ia CouhfiirceiMs, sãoas palavras de liaria us.

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HISTORIA DO BRA ZIL. 339

nas de Capaoba '. O historiador hollandez é de pare- 1637

cer queosPortuguezescom falsas informações illudiãoos conquistadores, alias não teriâo as minas escapadoa buscas tão pertinazes. As minas comtudo existião,mas os que lhes sabião do segredo guardavão-no para Baria-usmelhores dias.

Começara agora a estação chuvosa e Nassau,deixando Schuppe com 1600 homens no seu novoforte, volveu ao Becife. Bem necessária era a suapresença aqui, onde de toda a sua auctoridade epopularidade se carecia para sofrear um bando deconquistadores, entre os quaes era a licença ja habitoinveterado. 0 seu próprio historiador confessa queos peculatos, impiedades, roubos, assassinios, eluxuriainfrened'esta genle a tornara infame; passava em rifão que nada era peccado d'aquelle ladoda linha, e na verdade era como se o diclado fosseartigo de fé, tão habituaes e atrozes os crimes. Umarígida justiça depressa conteve estes miseráveis. Nassau, dizBarlaeus, fez mais homens de bém do queveio achar, e todos fazião agora o seu dever, querpor que lhes volvesse a boa vontade, quer por quelhes fizessem sentir a necessidade d'isso. Até agoranenhuma regularidade se observara na dislribuiçàodos gêneros, improvidencia de que erão os desper-dicios a natural conseqüência; com risco imminenle

1 Fodinx Capaovaenses.

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340 HISTORIA DO BRAZIL.

«37. de provocar uma sedição, poz Nassau cobro a esteabuso^ fixando a ração que a cada soldado havia dedar-se. Também a receita publica passou por salutares reform as, e dos dízimos do as sucar c farinha,das pescarias, barcas de passagem, etc, se apuravaconsiderável s o mma . Grandes fraudes se havião com-metlido sob a capa da confusão em que andavão ospezos e medidas, o que porem de prompto se proveude rem édio, reduzindo todos ao pad rão d'Amslerdáo.

Apoz isto cuidou Nassau em reparar quanto pos-Sabias r

, n\ a ' s

ds a U

d c si

y el

o s estragos da guerra, para o que muito concorreu a confiança posta nos seus talentos e proba

bilidad e de que o seu nascimento e influencia lhetornariâo permanente a aucloridade. \enderão-secomo propriedade publica os engenhos de assucarabandonados, e pela somma enorma que produzirãoem tempos de tão pouca segurança, se pôde julgardo seu numero e importância . Dcrão de vinte a cem

mil florins cada um, recebendo a Companhia dasíndias Occidentaes ao lodo dous milhões. Procurou-se induzir os Portuguezes a voltarem ás suas terras,estabelecendo-se debaixo do domínio hollandez; cadacolono era olhado por Nassau como amigo, pois quecontribuía para augmentar a producçáo de que ca-

reciâo os conquistadores, e era interessada na defezados seus campos; cada fugitivo pelo contrario lhe erauni inimigo, e da mais formidável espécie, pois quea necessidade o obrigava a sa qu ea r, e o conhecim ento

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HISTORIA DO BRAZIL. 341

dopaiz'lh'o permittia fazer com vantagem. Forãoestes os termos offerecidos aos Portuguezes : inteirae plena liberdade de consciência; conservação dassuas egrejas á custa do Estado; não havião porem dereceber visitador da Bahia, nem se admittirião novosfrades em quanto houvesse bastantes para celebraçãodas ceremonias da religião. Ficarião sujeitos ás leishollandezas, pagando os mesmos impostos que osoutros subditos do Estado, e o Concelho Supremomarcaria dous dias para dispensar-lhes justiça. Tor-narião a entrar no gozo dos seus bens, e quaesquerescravos que lhes fugissem depois de prestado pelosenhor o juramento de fidelidade, lhes serião resti-tuidos; observava-se porem que entregar os que antecipadamente havião fugido para os Hollandezes eos tinhão servido, seria vil e abominável, nem se deviapensar em tal. Permiltir-se-lhes-ia trazer espadapara defeza própria contra os negros dos Palmares.Estas concessões e a generosidade com que Nassautractara os prizioneiros, diminuirão a aversão que osPortuguezes votavão aos seus conquistadores. Também para com os indigenas adoptou elle um systemade beneficência, bem que nào faltassem homens poderosos, que com toda a seccura nacional do caracterhollandez quererião ver tractar como brutos estesdesgraçados, impondo-lhes jugo ainda mais crueldo que o dos antigos déspotas nos peores dias de suatyrannia.

1637

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . 5 4 3

egreja malriz, uma Misericórdia e dous conventos. 1€3L

So a embarcações pequenas dava entrada a barra. A %

capitania, de que era esta a capital, exlendia-se quarenta e cinco legoas, separando-a da Bahia que lhedemorava ao sul, o r ioTapicuru , e de Pernambucoao norte o S. Francisco. Havia sido doada a Christo-vão de Barros, em galardão dos seus serviços na re-ducção dos selvagens. Oito engenhos havia dentro doseu distrito, onde erão da melhor qualidade o tabacoe sem numero os rebanhos.

D'aqui mandou Bagnuolo avizo á Hespanha; tam- Apela Souto

bem escreveu para S. Salvador ao governador Pedro conquíItadLda Sylva, offerecendo-se a ir com as suas tropas emsoccorro d'aquella cidade, certo de que Nassau, coma confiança do triumpho e da força, passaria a in-vestil-a. Desdenhosa foi a resposta, que melhor seriaficar onde estava, do que acarretar sobre a Bahia amá sina de Pernambuco. Apoz isto nenhuma alternativa lhe restava, e estabelecendo o seu quartelgeneral em Sergipe, d'a lli renovou esse systema deguerra de depredação com que tão bem se haviadado. No forte Mauricio tractavâo os Hollandezes detirar d'esta capitania o gado, na vã esperança decortar os supprimentos á Bahia, e sem cessar se suc-cedião as refregas. Entre tanto cruzava Souto tresvezes o S. Francisco em jangadas, o que os Hollandezes havião reputado impossivel, largo como éaqucllc rio, e cahindo sobre elles quando menos o

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314 HISTORIA DO RRAZIL.,057- pensavão, outras tantas vezes levava a destruição e a

ruina até quasi ás portas do próprio Becife. \exado por taes incursões, e vendo que o S. Francisco lhenão era fronteira segura, fez Nassau, a quem tresmezes de febre impedido de ir em pessoa, marcharGijsseliiigh, membro do Grão-Concellio, com dousmil homens, a fazer juneção com Schuppe, e ambos

§-87-9ie." cxpellirem de Sergipe o inimigo.nacnuoio Sabia Bagnuolo que novas forças tinhão chegadosergipe.a ao forte Maurício, mas importava-lhe também saber

o seu numero. Com Ires cam arada s passou Souto orio a nado, entrou n'uma casa, e apoderando-sed'um o f li ciai hollandez, trouxe-o para o acampamento. Reuniu-se então uni concelho. Alguns espíritos mais bravos forão de opinião que mais se carecia de reputação com que resistir ao inimigo, doque de gente, e que convinba fazer frente; alias quefazer, se abandonavão Sergipe, e a Bahia os nãoqueria receber? A isto retrucou-se que a Bahia agoraacceitaria goslosa os soecorros que antes rejeitaradesdenhosa, por quanto não se podia arrancar dasespadas em Sergipe, sem que de S. Salvador se lhesvisse o fuzilar. Demais era alli o verdadeiro logar deprovar brios, que gu ardando a cabeça do Estado sedefendia o lodo. A estes arg um entos se rendeu Bagnuolo, e mandando unia partida a assolar a fogo opaiz que deixava atraz, de novo se poz em retiradacom os mi^eros emigrados das conquistadas proviu-

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HISTORIA DO BRAZIL. 315

cias. Mais uma vez tiverão estes desgraçados de pas- 1637

sar pelos horrores d'uma fuga. Os Pitagoares comomastins os forão acossando por todo o caminho; eos tristes que rendidos de fadiga ou por qu alq ue raccidente ficavão atraz, erão sem dó despedaçadospor estes selvagens. Outros mais felizes cahiâo nas

mãos dos Hollandezes; muitos perecerão nas malasmordidos das cobras 1. Exhauslos de soffrimentosmuitos houve, que resolverão submetler-se ao inimigo, de quem obtiverão passaportes para regressarás abandonadas habitações. Os próprios chefes aquem se communicava esla resolução, a animavão;

melhor era, dizião, este alvitre para o serviço do r e i ;lá a todo o lempo cstarião promplos a ajudar os seusconterrâneos aberta ou secretamente, valendo maisque fossem para onde poderião coadjuvar os soldados, do que seguir o exercito e carecer do auxiliod'ellcs. Ainda assim não pôde o maior numero dos

Pernambucanos soffrer a idéia da submissão, edeses-peradamenle forão por deante, sem saberem ondenem quando teria fim a fuga. § m,e'mi

Na Torro de Garcia d'Ávila'achou Bagnuolo umo Isetira-se

mensageiro com ordem do governador general para para8anBahia.

1 Em (pianto a partida fazia alto foi uma mulher lavar roupa numregato, e depoz o filho n'uma mouta ; logo depois ouvindo-o gritar,voltou-se e viu uma onça a devoral-o. Perdidos á esta vista- os sentidos, caliiu na água com o rosto para baixo, afogando-se n'um arroio,que mal lhe dava pelo tornozelo, li. Freire.

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3 4 6 H I S T O R I A DO B R A Z I L .16n? fazer alto alli, até que se resolvesse onde se aquarle-

larião as tropas. Respondeu que depressa iria a consultar com elle a este respeito. Sahiu-lhc porem .Pedro da Sylva ao encontro, recebendo-o com honrasque devião fazel-o esquecer o du ro da p rim eira mensagem. Discutiu-se a questão; queriáo uns que astropas fossem immediatamente postadas em Villa

Velha, a meia legoa da cidade, que se levantassemfortiticações e se pozesse tudo em estado de defeza.Era esta a opinião de Bagnuolo e dos seus officiaes.Oulros, que não podião crer que tivesse Nassau forçascom que pensar em similhante empreza, enlendiãoque os soldados so servirião de estorvo, e que com re

pararem-se as forlificações nada mais era precizo.Prevaleceu este parecer.

Entretanto entravào Schuppe e Gijssclingh emSergipe, queimavão casas e engenh os, deslruião todasas arvores fruetiferas e plantações, e feito isto vollavàoao forle Maurício. Assim em logar de tomarem debaixo da sua protecção os abandonados moradores,procurando concilial-os com bom Iraclamento, enxo-tárão-nos para a Bahia, auginentando as forças dacapital com um bando de homens que o desespero ca memória de soffridas injustiças tornavão formidáveis. Em toda esta campanha fez-se na capitania deSergipe horrendo estrago entre o gado. Diz-se queBagnuolo afugentara oi to mil cabeças e inalara cinco,

para não deixal-as ao inimigo, e que os Hollandezes

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HISTORIA DO BRAZIL. 347

destruirão tres, afora o grande nu m ero, que, atra- 1657-

vessando o rio, levarão para as suas"proprias pro- "ggoTJ»?'Barteus. 63.

V i n C i a S . .\ieuhoff. 7.

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348 HISTORIA DO BRAZIL.1 Ü Õ 7 .

CAPITULO XVII

5. Jorge da Mina accommeltido e tomado pelos Hollandezes. — Tomada

do Ceará. — Põe Nassau debalde cerco a S. Salvador. — Declarào osHollandezes livre o commercio do Brazil. — Estado dassuas capitanias.— Edifica-se nova cidade perto do Recife. — Chega o conde da Torre;perde grande parle da sua gente por moléstia, e apoz quatro acções in-decizas corre com o temporal. — Retirada de Vidal e llarbalho. — Omarquez de Monte Alvão vizo-rei. — Re/oluçào em Portugal.— llepu->i rio do vizo-rei.

Ataqucconira Em quanto isto se passava no Brazil assentou Nas-S. Jorj;e . . .

.ia Mina. sau no império portuguez o golpe mais pezado, queesle havia soffrido desde a perda de Ormuz. Nicolaasvan Aperen, qu e comm andava o forte hollandez deMouree na costa do Ouro, lhe m and ara avizo como

seria fácil tomar S. Jorge da Mina, com cujos officiaes tinha elle Ypcren suas relações, sobre haver jatomado o pulso á guarn ição . Em 1ÚL2o tinhão os Hollandezes soffrido severa e vergonhosa derrota deante(1'aquelle estabelecimento, o mais importante da costa.Mil e duzentos homens havião desembarcado em

Commando ás ordens do vice almirante Jan DirckszLam. Um corpo de negros os assaltou em quantodesprevenidos e suffocados de calor; sorprehendidosc tolhidos de terror, nenhuma resistência oppozcrào

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 349

os Hollandezes, mas alirárão-sc ao mar, onde quem 1657-não sabia nada r pereceu. Forão m ortos quasi q u i - B a r i ^ st.nhentos, sendo as cabeças levadas como tropheos aos ^-gj,-

emChurchill.

Portuguezes. t65-A lembrança d'este caso tornara mais cautelosos

os Hollandezes, e por ventura menos vigilantes os

Portuguezes. Durante a estação chuvosa, em que pelamaior parte se interrompião no Brazil as hostilidades, embarcou Nassau 800 soldados em nove navioscujo commando deu a Jan Koin, um dos do Concelho Supremo. Atravessou este para a África com prós- &**£"•

pera viagem , avistou-se com Van Yperen , e fez um

tractado com alguns regulos do paiz, que assazfranca c judiciosamente lhe declararão que, mantendo-se ncutraes durante a contenda, farião depois causacommum com o vencedor. Dividiu Koin a sua forçacm Ires batalhões, dando o prim eiro a Willem Latan,o segundo a Jan Godlaat e reservando para o seu

commando immediato a retaguarda. N'esta ordem° i'. d'ag.

avançou para o castello : de repente rebentão dasselvas mil alliados pretos dos Portuguezes e na confiança da sua primeira victoria sobre os Hollandezes,pouco faltou que não ganhassem segunda. Do destacamento da vanguarda cahirão oitenta, com muitosofficiaes, entre os quaes o próprio Latan, mas os negros, em logar de seguirem a fortuna, parárão acortar as cabeças aos mortos, expondo-se assim aofogo do segundo batalhão. A mortandade que sof-

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350 HISTORIA DO BRAZIL.

1637. frérão os aterrou , e dura n te o resto do assedio mais

solícitos se mostrarão em guardar-se a si, do queem molestar os invasores.

nende-se Koin cortou um caminho pela lloresla até ao viso' d'um ouleiro, d'on de, levantando baterias , princi

piou a lançar contra o castello granadas que Ia nãoclicgavào. Alguns negros, que elle ganhara á suaparcialidade, deráo um assalto á villa, e forão rechaçados; não obstante tão bem estava o commandantehollandez inteirado do hu m or da g ua rniç ão , e co-bardia ou traição do governador, que o intimou arender-se, se não querião ser Iodos passados á espada. E sem mais tirle nem guarle, quatro dias depois da chegada do inim igo , an tes de ter soffrido omenor damno e de lhe ler cabido um so soldado, entregou o miserável que alli commandava, o logarmais importante e forte que possuião na África Occidental os Portuguezes. Tão infames como o aclo darendimento forão as condições, a saber que a genleseria desembarcada na ilha de S. Thomé com a roupa

tfid-ag do corpo e nada mais. No castello assim vilmentcentregue havia trinta boas peças de bronze, novemil arrateis de pólvora, oitocentas balas grandes deferro, trezentas de pedra, e outras mais pequenas

em abundância; as armas de mão jazião ferrugenlasno arsenal. Posta guarnição cm S. Jorge da Mina,mandarão os Hollandezes uma chalupa a in tim ar oforte de Alzyn, mas aqui acha rão um governador

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HISTORIA DO BRAZIL. 351

d'outra tempera, que lhes declarou que até á ultima 1657-havia de defender o seu posto. Contentando-se com

1 Barlaeus.

a brilhante conquista que fizera, voltou pois Koin D , " ; . 8 0 * » .„ . . Barbot.' 167."

ao Recue.Entretanto dera-se a Lichthart a commissão de ir Tomada

do Ceará.

fazer o mal que podesse nas visinhanças da Bahia,que tinha Nassau olhos fitos na capital do Brazil, esperando aplanar o caminho da sua conquista compol-a em apuro de mantimento. Tendo feito grandesestragos na bahia de Camamú, correu o almirantecom o vento até aos Ilheos, que atacou, sendo porem

repellido pelos moradores

1

. Forão agora convidadosos Hollandezes a voltar a outras pa rtes as suas a rm as :as tribus indígenas do Ceará recorrerão a elles queas libertassem, tendo qualque r jugo por preferívelao que supportavâo, agora que Martim Soares, cujoprudente proceder antigamente as havia conciliado,

milhava na guerra de Pernambuco. Pouco se aventurava em invadir esta c apitania, onde tinhão os Portuguezes apenas um fortim, defendido por trintasoldados, e duas peças de ferro, e os selvagens fizerão ver que a despeza da conquista depressa seriarcsarcida com a producçâo do paiz, algodão, pedras

1

Os Hollandezes dizem, que elle entrou a villa, mas nào julgouque valesse a pena destru il-a. Ora de stru ir era o so e único fim d'esta

jornada, e por tanto sigo sem hes itar a na rração de Brito F re ir e,lanto mais que nunca tive razão de pòr em duvida a veracidade d'este

bem informado e sincero historiador.

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352 HISTORIA DO BRAZIL.,{í37 preciosas, sal de num erosas salinas ao longo da costa,

âmbar, que cada tormcnta lançava á pra ia, o madeira,especialmente uma formosissima cõr de violeta. Pordemais tentadora era a occasião para ser desprezada,posto que Nassau nunca antes tivesse pensado em ex-tender as suas conquistas para o lado da linha. Enviou-se Joris Garstman, e rendeu-se o forte, que

iiariaius.66. coroava um oulciro juncto d'um ribeirão, em queB. F r e i r e .

% 810-U. embarcações pequenas podem achar porto.itqupscfazia Novos edictos c regulamentos se promulgar.'o

agora no Becife. Decrelárão-se penas severas contraquem de qu alque r m odo defraudasse a renda publica,

e eslabelecerão-se patrulhas para segurança do paiz,que bandos de salteadores devastavão com incança-vel actividade. Como havia escassez.de farinha a Iodosos que empregavão negros se impoz a obrigação deplantarem mandioca nos mezes costumados de janeiro e agosto, o (pie provavelmente não fazia o pelas

m uitas incursões dos Portuguezes. Prohibindo todosos processos frivolos se procurou mitigar o furor li-tigioso, e fazer desapparecer a freqüência do assassinato por meio de leis rigorosas.- As ordenações relativas á religião indicavão um espirito de intolerância,que principiava a manifestar-se ao passo que os con

quistadores se ião tendo por mais seguros. Bestrictosos Judeos na celebração publica das suas ceremonias,ordenou-se também aos calholicos da Parahyba quedentro do recinto de suas egrejas encerrassem as

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 353

procissões. Nenhum templo mais se havia de erguer l637

sem permissão do senado, nenhum casamento celebrar-se sem se lançarem os pregões á moda dos H ollandezes ; e aquelles que ao formarem um novo engenho de assucar o quizessem mandar benzer, haviãode recorrer para isso a um padre "reformado, não aum papisla1. Os hom ens da governança no Reciferemettérão amostras de ouro das minas para a Hollanda, onde fossem ensaiadas; era que elles ja sephantasiavão seguros senhores do paiz, em quantoestas medidas, a que a previa affectação de iIlim itada tolerância dava seus laivos de traiç ão , tornando-os merecidamente mais odiosos, lhes solapavão oúnico fundamento sobre que poderião ter assentadoo seu poder.

Aguardava Nassau soccorros, ao restabelecer-sede sua longa enfermidade. Insoffrido de repouzo,aproveitou elle este meio tempo para pe rco rre r acapitania da Parahyba e o Potengi, reparando oslogares que lhe parecerão bons para se conservareme dando-lhes novos nomes. A' villa da Parahybaantes chamada do nome de Philippe, deu agora o deFrederico, príncipe d'0range; ao forte do Cabedello,antes de Sancta Catharina, deu o de Margarida, em

1 Lastima Netscher que o conde de Nassau, cedendo ás impor tu -nações dos ministros protestantes, revogasse os edictos que em porolda liberdade de consciência, e tolerância religiosa, tão sabiamente promulgara. F. P.

1638.

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554 HISTORIA DO BRAZIL.

1638. honra de sua própria irmã, e o de Ceu len, que otomara, ao do Bio Grande. Aqui lhe enviarão os Tapuyas presentes, recebendo oulros em troca, comopenhores de amizade e alliança. Succedeu ser capturado um navio de Lisboa com muitas cartas a bordo.N'eslas se dizia que se ficava apparelbando poderosaarm ada para o Braz il; dos que as escrevião uns repu-tavão isto mero pretexto para levantar dinheiro,andando a corte de Madrid tão occupada com couzasque mais de perto a tocavão, e especialmente com ostumultos de Évora, que mal poderia attender aos seusremotos dominios; outros pelo contrario affirmavàoque o levante estava abafado, que Oquendo havia jasido nomeado para o commando da expedição, e queesta sem duvida alguma daria á vela. Nenhum cuidado deu isto a Nassau; durante o inverno não podiavir a armada, alem de que inclinava-se elle mais adar credito a outras cartas, que pinlavão o rei d l l e s -panba como por demais entregue aos seus divertim ento s, para que houvesse de dar um so pensamentoao Brazil. Em todo o caso escreveu á Companhia dasíndiasOccidentaes que era indispensável mandar-lhereforços com que podesse resistir aos Hespanhoes, seviessem, ou tira r partido do seu descuido, se ficassem ; e pediu navios que servissem para o duplo fim

^09*^' u e ; i r r o s lar a frota inimiga elevar para casa assucar.Na sua volta da Parahyba achou Nassau une linhão

Prepa ra t ivo s •' 1

aTailia. chegado provisões de boca e de guer ra , porem so-

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H I S T O RI A DO B R A Z I L . 5 5 5

mente duzentos soldados. A estação das operaçõesmilitares iâ correndo, e apezar da decepção que tãoparco reforço lhe causou, resolveu elle atacarS. Salvador sem mais perda de tempo. A sua gente, queas passadas victorias havião tornado confiada, o instigava a fazel-o, e até tra idores houve na capital doBrazil que o convidarão a commetter aempreza, assc-verando-lhe que por falta de soldo estavão promptasa amotinar-se as tropas; qu e Bagnuolo e o governador andavão desavindos; e que o povo se inclinava afavor dos Hollandezes pela generosidade com quetinhão sido tractados os que se havião submettido.Era na verdade um inimigo generoso o conde Maurício. Bagnuolo escreveu-lhe, pedindo a entrega d'al

gumas mulheres e crianças, cujos, maridos e pãesandavão no exercito portuguez, offerecendo por ellasconsiderável resgate; a resposta foi que antes queriaque lhe agradecessem do que lhe pagassem o beneficio, e aprestou üm navio de propósito para levaresta genle á Bahia. 0 povo, cuja pr im eira explosãode sentimentos é sempre justa até certo ponlo, sejãoquaes forem as suas opiniões, applaudiu altamenteesta acção; algumas cabeças mais atiladas, como aschamào, rebaixárão-lhe o merecimento, observandoque o navio vinha a espionar o estado da cidade. Écerto que os marinheiros hollandezes havião de tomarnota do que podessem, mas culpa era dos Portuguezes se aquelles alguma couza vião em detrimento

163».

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356 HISTORIA DO BRAZIL.

1638. d'estes. A Nassau não lhe fallavão inlelligencias tanto

no Recôncavo como na cidade1, e dYsses que em todaa acção generosa suspeitão sempre um motivo baixo,

é que mais devemos desconfiar.

Marclia Na mais descuidada segurança vivia o povo da""to"? Bahia em geral. Longa e desastrosa experiência pelo

S. Salvador. . ° ° m i n

contrario tornara Bagnuolo cauteloso, lambem elletinha suas espias : estas o informarão de que os últimos despachos d'Am sterdáo representavão a llespanha occupada demais para pen sar no B razil, e queNassau reunia no Becife toda a sua força naval.D'aqui inferiu Bagnuolo immcdiatamente que a

Bahia ia ser investida, e partindo sem demora daTorre de Garcia, foi postar-se cm Villa Velha, ásportas da cidade. Isto o fiz sem consultar o governador, e até contra os desejos d'elle e dos cidadãos,mas tão convencido estava da exaclidão das suas noticias que nada pôde dissuadil-o. Collocárào-se postos

avançados, e concordou-se em que'um dia seria Bagnuolo e oulro o governador, que havia de dar asordens, conchavo, de que nenhum mal podia provir

B§s,iíiT' em quan to estava longe o pe r ig o 2 .1 Se dermos credito ao que nus refere llarleo (lies, gest. sub

comitê )lauritw in Brasília, p . 164) , o denodado guerrilheiro D. Antônio Philippe Camarão entrou em negociações com .Nassau para aban

donar a causa portii^ueza. I". P.1 Lemo> nos melhores chronislas e historiadores que o governador

«reral do Brazil Pedro da Nelwi, que se mostrara a principio hostil aoconde de Bagnuolo, levara depois o seu e. ivalheirisino em renunciar cmsuas mãos toda a auetoridade militar. F. P.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 357

Entretanto mandou-se Souto com João de Maga- 1638

lhães e sessenta tiomens a Pernambuco, d'onde desoutitrouxesse noticias mais certas. Ao chegarem ao SanFrancisco, atravessou-o Magalhães acima do forteMaurício com quarenta e cinco dos da parlida, tendoSouto marcado tempo e logar para todos se encontrarem nas Alagoas. Este seguiu com os restantes

quinze homens pela ribeira até á barra, onde sedispoz a atravessar o rio em jangadas. Estava alli poracaso fundeada uma pinaça hollandeza, cuja tripo-lação composta de dez pessoas veio a terra. Cahiu-lheSouto em cima, matou seis, mandou Ires dos seuscom os outros quatro prizioneiros para a Bahia, e

passou o rio na embarcação assim aprezada. Umcolono da margem opposta, a quem se dirigiu paraobter informações, lhe disse que dous navios doRecife acabavão de chegar a Cururuipe, dez legoasd'alli, onde os Hollandezes tinhão levantado trincheiras á volta d'uma egreja abandonada, perto da

praia, guarnecendo-as com vinte e cinco homens.Souto tinha apenas doze; sem embargo arremetteucontra estas trincheiras ao romper do dia, matoudezoito Hollandezes, e fez um prizioneiro, fugindo-lhe os outros seis. Na ignorância do que havia suc-cedido desembarcarão os capitães dos dous navios

antes do meio dia e forão mortos ambos, encontrando-se na algibeira d'um uma carta, com a noticia deter Nassau communicado ao Concelho a sua intenção

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Ilollandeze:i

dSanctos.

3 58 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

1658 de atacar S. Salvador, desígnio que foi app rovado .

Eutrão os Chegada á capital esta nova, não pode m ais o povolollandezes o i

ê-Todísos fechar os olhos ao perigo . Jam ais se achou cidademenos preparada . Com uma indolência que mal sepode cre r, linha elle visto anno apoz a nn o os progressos do inimigo sem cu ida r na própria defeza.

Não se crigião obras novas nos logarcs onde erão evidentemente necessário, e sem reparos se deixavàoas an tigas . Desmontada a artilharia, nem as carretasestavão pro m ptas nem as balas á mão : havia poracaso algum a farinha nos arm azé ns, m as tudo o maisfaltava. Tal era o eslado de S. Salvador, quando cinco

dias apenas depois que se começou a acreditar nasua vinda, apparccérão os Hollandezes á vista. Extraordinariamente rápida havia sido a viagem do Becife,tendo durado seis dias n'uma estação cm que secostumavão gastar quatro a seis sem anas Segundo osPortuguezes traziào elles 7,SOO homens, contando

m arinh eiros e índios, em quarenta na vio s'. Simularão um desembarque cm Tapoão, a unia legoa daentrada da babia, mas logo a entrarão, deitando ferroem Tapagipe, defronte das capellas de Nossa Senhorada Escada e de San Braz. Impossível fora guardartodos os ponlos da costa e este havia sido um dos que

por necessidade se deixarão ab ertos . Aqui saltou o

1 Seg u n d o o ca lculo de   \elsclier  levara omisigo T>, SOO so ldados C

m a r i n h e i r o s ; a l e m d e 1,(!()() i n d íg en as . F . P .

11 .1 'a l j l .1l3X.

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HISTORIA DO RRAZIL. 559

inimigo em terra de tarde, avançando na manhã se- I638-. . B. F r e i t e .

guinte para os m uro s. § 855 6.Mil e quinhentos homens contava a guarnição de Tumultos

nâ CHIí)f l^

S. Salvador e as tropas de Pernambuco pouco passa-vão de mil ; por felizes se davão agora o governadore o povo com terem estas forças, que outr 'o ra com

tanta insolencia havião rejeitado', e ultimamente detãomá vontade recebido. Nassau fez alto sobre umaeminência: de differenles postos marcharão tres brigadas, formando.em linha para fazer-lhe frente, eda cidade sahirão o governador, Bagnuolo e Duarted'Albuquerque com as tropas para apo ial-as. Algum

tempo cstiverão os dous exércitos a tiro de canhãoum do outro, sem que nenh um avançasse ao ata qu e.Disse então Bagnuolo ao governador que não lhesficava bem abandonar o abrigo dos muros, sahindod'aquella forma ao encontro de forças superiores emcampo aberto; o que lhes cumpria fazer era defender

a cidade, que , se passavão a no ute all i, podia demanhã ser investida pelo inimigo. Isto o disse assazalto para ser ouvido de quantos estavão perto; muitos houve que na sua vã bravura desapprovárão oconselho, mas todos o seguirão, retirando-se paradentro de portas. Ao ver esta retirada enraiveceu-se

a gentalha, que não p ensa , levantando um alaridocomo se a cidade tivesse sido t rabida. Tocou-se o sinoda Câmara, so tangido quando havia que deliberarsobre negócios da maior importância para o publico,

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3 6 0 H I S T O R I A DO B R A Z I L .

1 6 5 8 . e espalhou-se um grito, que se os aetuaes comman

dantes não combatião e defendião o povo, poria esteoutros que o fizessem. Pouco faltou que o descontentamento não prorompesse em motim declarado. In-tervierão o bispo e Duarte d'Albuquerque, cujasubmissão mais do que aucloridade aquietou o povo,a quem se prometleu fazer a vontade. Em conse

qüência d'islo marchou Bagnuolo na manhã seguinteuma legoa com todas as tropas a dar batalha aos Hollandezes, que procurou no logar da véspera, devendo-se crer para honra d'elle, que sabia não os encontraria alli. Havia o inimigo tomado outra posição, ese cahisse sobre a cidade, agora que Ioda a força

regular estava fora, poderia tel-a entrado quasi semresistência. Mas é que os H ollandezes sabião tãopouco dos movimentos de Bagnuolo, como este dosd'elle s, e o genera l recolheu -se a salvo, tendo satisfeito o vulgacho com esta arriscada condescendência.

No qu arto dia do seu de sem barqu e tomou NassauHendem-se '

uatrofortes. p 0 s S e d'um alto, fora de tiro de canhão da cidade, ea bala de mosquete da capei Ia de Saneto Antônio.Passava este edifício por ser poslo importante; al l ilevantara o ultimo governador O liveira trincheiras,que o desmazelo havia deixado cahir em ruinas, e

agora qu e erão precizas é que se trabalhava índ ias .Da posição que oecupavão balião os Hollandezes acavalleiro o Forte do Rosário, e o reduclo da Água deMenimos que protegia a p ra ia ; desde logo forão to-

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B. freire.

s>i : -s .

prizioneiros

."tl-2 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

I,i:,s a única couza de que o governador se descartava,cedendo a auetoridade, era da responsabilidade daperda da cidade, se se verificasse. Mas o proceder dePedro da Sjlva é digno d'allos encomios : sabia queBagnuolo era melhor soldado, e ao bem publico sacrificava a própria hicrar* hia '.

Troca de Como general andara Bagnuolo muitas vezes errado, c sempre infeliz. Conhecia a sua própria im popularidade, e este acto de não esperada confiançaparece quasi lel-o regenerado; o zelo, aetividade eintrepidez, que desenvolveu agora, tornárf o-no tantoobjecto de admiração, como antes o havia sido deódio e desprezo. Deixou Sylva a com m andar na cidade e foi portar-se na capclla de Saneio Antônio,onde dia e noute se trabalhava nas trincheiras. Chegou um corneta do campo inimigo; trazia cartaspara ambos os commandantes, dizendo que de Pernambuco viera na armada um Franciscano descalço,a fallar ao custodio sobre negócios da ordem. Simi-Ihante mensagem em tal occasião, e vinda de Hollandezes hereges, foi recebida com bem cabida suspeita, pelo que se lhe deu uma evasiva respostanegativa. No dia seguinte voltou o mesmo homem aver se os Portuguezes quereriáo dar os seus prizioneiros pelos que havião sido feitos nos fortes. Os

1 Com estas nobres expiessões repara Southej as injustiças que porm a s d'uma vez irrogáiVao distinrtu "eneral italiano, conde de Üa-" I IUIIJ . K. P.

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HISTORIA DO RRAZIL. - 363

prizioneiros, que os Portuguezes linhão em seu po- 165f?

der, erão apenas dezoito, e com uma cortezia, que osacontecimentos posteriores provarão ter sido effeitodo medo, não da generosidade, forão vestidos e postos em libe rdad e 1 .

0 fim principal por que duas vezes se mandara consternaçoum mensageiro com recados de Ião pequena monta, Ja cidad*,

era provavelmente observar o estado das trincheiras.Bagnuolo lhe mandara vendar os olhos antes de ad-millil-o á sua presença, mas era evidente que asobras não estavão Completas, pois que n'ellas se trabalhava ainda, c Nassau mandou J ,500 homens a 21 a>br.

1608.

assallal-as. Forão repellidos com perda de 2 0 0 , vantagem que aos Portuguezes cuslou a vida d'algunsvalentes. Mandasse Maurício dobrado numero, queleria tomado trincheiras e cidade : tão pouco estavaesta preparada ainda, que quando ao dar-se agora orebate se forão a fechar as portas, viu-se que uma

não trancava. D'um extremo tinhão passado ao outroos moradores de S. Salvador; os que não acreditavãona existência do perigo antes de visto o inimigo,julgavão agora impossível a resistência, começandonão so a pensar em capitulação, mas até a fatiar emtal, e suspirar por uma passagem para a pátria cm

transportes hollandezes. Havia porem quem tivesse

1 Porque desvirtua Soulliey esta tão louvável e cavalheiresca acçãodo general italiano? F. P.

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5 6 4 H I S T O R I A DO R R A Z I L .

1o:,s melhores sentimentos. Um official, que com entra-

nbavel magoa vira a facilidade, com que havião sidotomados os fortes, e a pusillanimidade do povo, foi _um dia ao paiol antes de amanhecer para distribuirpólvora e achou debaixo da poria uma mecha acceza;o ho rro r e a indigna ção ao desco brir assim que haviatraidores dentro dos muros, forão taes, que perdidos

"§ 851-5!' logo os sentidos, morreu doudo furioso.Aba ec- Nem tinha Nassau um exercito sufficiente com que,i™c?da°ic. cercar a cidade, nem conhecia assaz o paiz para

occupar os postos mais im portantes. Dos seus erro stiravão partido os Portuguezes, que sempre alertalhe picavão os quartéis, abastecendo de continuo a

cidade. N este serviço se dislinguirão par t icularmenteSouto e Bebello, mettendo o segundo na pra ça, deduas expedições, mais de mil rezes bovinas e um rebanho de carneiros. Até o mar era mal guardado dosHollandezes, e emquanto no campo dos sitiantes sesentia escassez, recebião os sitiados provisões em

abundância.,\br,,no- Completas estavão agora as obras em Saneto An-«11 1 * u

tonio, e Bagnuolo, cuja presença se não fazia maispreciza, recolheu -se á cidade, dirigindo logo paraoutro logar a sua atlenção. Os prizioneiros o infor

marão de que Nassau meditava occupar outra posiçãomais próxima, donde com mais vantagem batesse acidade. Sabido isto, julgou o commandante portuguez necessário segurar as Palmas, posto d'onde

llollaiiilcza s sua>

l e l t c n a *

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366 HISTORIA DO RRAZIL.

1638. poucas para defender a llespanha, nem o thesourotinha com qu e su ppr ir as despezas. Estas cartas mandou-as elle a Bagnuolo, pensando que nada o desa-coroçoaria tanto. Pouco depois forão descobertos eenforcados Ires espiões dos Hollandezes.

Outra vez poz a própria precipitação e insubordi

nação em perigo os Portuguezes. Constrangidos tiverão os commandantes de prometter que fariáo umasortida a atacar o inimigo nas suas trincheiras. Bem

• sabíão elles que seria isto ruína certa, mas oulromeio não tinhão de evitar uma calaslrophe immi-nente, sendo precizo inculcar assentime nto, e fixar

hora para a empreza : pouco antes de raiar o dia, q ueera o mom ento designado, mandarão secretamenteda r um rebate falso, e o povo, persuad ido que os

vieyra Hollandezes havião descoberto o desígnio, deu-se perSermõeí.

s. ne satisfeito.

Batalha nas Alguns prizioneiros trazidos por Souto á cidade,declararão todos que reinava no acampamento aescassez, couza tão pouco provável, que não queriãoacredital-a os sitiados, embora estes homens cadaum separadamente a aflirmassem. Não contara Nassau com a resistência que encontrava, e pensou que

as poucas provisões que levava chegarião até se tomara cidade; enganou-se e os seus forrageadores, poucopracticos do paiz, mal podião compelir com homenscomo Souto, Camarão e Henrique Dias. A final resolveu sal tear as trincheiras de Saneio Antônio e pio-

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HISTORIA DO BRAZIL. 367

vocar o desfecho do cerco. A's sele horas da tarde do 1638'T i c • • • f i - l i ~ 18 de maio

dia to principiarão o assalto tres mil homens. Ca- •nhárão o fosso e alli se entrincheirarão, depois arre-mettérão ás po rtas. Aqui se torno u sang uino lento ocombate. Era tão estreito o logar, que nenhum tirose perdia; as balas ardentes e granadas dos assal

tantes produzião inteiro effeito, e as traves e pedrasdos sitiados cahião sobre as cabeças dos de fora. Porextranha imprevidencia deixarão os Hollandezes dedar rebate em outros postos, pelo que poderão osPortuguezes concentrar aqui todas as suas forças.Uns atacavão no fosso os assaltantes, outros os recha-

çavão das portas. Todas as tropas das obras exterioresacudirão á acção; Nassau levou o resto das suas forçasao assalto e este tornou-se batalha general, de quedevia depender a sorte do assedio. Os Hollandezescederão, pois pelejavão com desvantagem . Mauríciodeu ordem de matar quem fugisse, e desesperados

voltarão elles á carga, mas nada lhes valeu. Os Portuguezes, conhecendo o terreno que pizavão, linhão naescuridão uma confiança que os seus contrários nãopodião sentir; tinhão também para a defeza umestimulo que lhes dobrava o esforço, e repellirão oinimigo.

De manhã propoz Nassau uma tregoa, que foi ac- Morteceita, para e nte rrar os m ortos. Os Hollandezes tinhã odeixado cerca de quinhentos no campo, e cincoentaprizioneiros, os Portuguezes perdido uns duzentos

B. Freire.§ 870-9.

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368 HISTO RIA DO RR AZ IL .1638 entre mortos e feridos1; mas tão pouco peritos erão

os cirurgiães d'estes, e tão falhos estavão das couzasmais necessárias, que matarão mais gente do queimmolara o inimigo. Mais do que um bravo cahiun'aquella noute; e aqui concluiu a sua carreira Sebastião de Souto, cujos inexhauriveis recursos, incan-çavel actividade e impávida coragem nos fazem

lastimar a maneira traiçoeira por que principiou aservir o seu paiz, e a brutal rapacidade com que indiscriminadamente roubava nas suas correrias amigoe inimigo. Custou-lhe a vida uma bravata no ardorda peleja. Cães, bradou aos Hollandezes, a todos vosheide arrancar as almas, que sou eu o capitão Souto,

deante de quem tantas vezes fugistes em Pernambuco! Logo uma fila inteira do inimigo o tomou por

Vai. Luc.Pi5- alvo.

crueldade C°m vergonhosa crueldade se vingarão da suaHollandezes. derrota os Hollandezes. Nas suas ligeiras embarca

ções explorarão o Beconcavo, e onde quer que desco-brião uma casa desguardada passavão tudo á espada.Uma das victimas d'estc baixo resentiinento foi Joãode Matos Cardoso, o mesmo que tão brilhantem entedefendera o forte do Cabedello na Parahyba; agoracom mais de oitenta annos de edade foi assassinado

1 Achamos mais razoável o calculo de P. Varnagcn que orça aperda dos Hollandezes em trezentos e vinte septe mortos e cincoenla edois prisioneiros: e da nossa parte em cento c tantos mortos e feridos. F. P.

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HISTORIA DO RRAZIL. 369

no seu retiro. Mais uma semana continuarão os sitiantes a fazer fogo contra a cidade, onde poucodamno e. nenhum receio causavão, sendo pelo contrario elles próprios que soffriâo muito, pois comextranha imprudência fora Nassau assentar o seucampo a tiro de canhão da praça, e n'uma posiçãoonde pântanos impossíveis de se passarem o impediãode ir atacar as baterias que o incommodavão. Dia enoute mantinhão os Portuguezes a sua canhonada,pensando que a chuva reteria nos quartéis os soldados ; muitos buscarão nos bosques abrigo a este risco,e o resultado foi principiar a doença a devorar tantagente como a guer ra 1 . No fim d'oilo dias d'esta loucaperseverança renunciarão á empreza, abandonandoparte das suas provisões e quatro peças de bronze,afora quanto havif.o tomado nos fortes. Quarenta dias 20 de maio.durou o cerco, sendo a perda do inimigo avaliada cmdous mil pelos Po rtug uez es 2 . Belirárão-se os Hollandezes ainda em boa occasião, quando ja se haviãodisposto as couzas para atacal-os pela retaguarda,principiando-se a fazer movimentos que bem podiãoobrigal-os a renderem -se. Effectuado o em ba rqu e, ' e

0va

c"l:' <'

mandou Nassau todos os prizioneiros para terra,pedindo em Iroca os que lhe havião feito : recusou-se.

1 Piso descreve este contagio. L. 1, c. 1 5 . De fluxii a!vi l.epa-

tico.8 Segundo o testemunho de Netscher perderam os Hollandezes mil e

cem homens neste commettiinento. F. P.

ir . 2 4

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5T0 HISTORIA DO RRAZIL.

1638. Os estragos commettidos no Bcconcavo servirão derazão á recu sa, m as com o Bagn uo lo, accedendo aproposla análoga, soltara prizioneiros no principiodo assedio, vestindo-os de mais a mais, inipulou-se

B . Freire, a medo a acquiescencia d'então, a arrogância a excusa§888-92." , ,

Barlrcus. 84. d a g o r a .

O grande erro de Nassau nas suas operações contraa Bahia, foi expellir de Sergipe os restos do exercitopernambucano, reforçando assim a guarnição commil e duzentos soldados veteranos, que, na phrase deVieyra, erão os ossos da guerra, e pelo seu valor e

sormões. experiência dignos de serem venerados como reli-1 * 8( p. 108. *

quias. Nas circumstancias do cerco acharão os moradores curiosos motivos de practicas devotas. Eslavao mar aberto ao inimigo e durante todos os quarentadias que os Hollandezes ficarão deante da cidadejamais se tinhão fechado as portas nem de noute nemde dia. L< nibrárão-se pois de que com razão se cha

mara de cidade do Salvador aquella povoação, poisque ninguém sen.V» o Senhor seu salvador e patrono,podia ter fechado ao inimigo todas as entradas,

w. i'. nu. o s i a nd 0 abertos o maré a terra. Os sitiantes tinhãoassentado os seus quarleis e plan tado suas bateriasdefronte da egreja de Saneto A ntôn io, e fora no dia

d'este saneto que havião levantado o cerco com desbarato, perda e vergonha. E aqui estava outra provada intervenção divina a favor dos Portuguezes. Dis.se-se-lhes n'um sermão de graças que da cadeira de

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Sermões.112, 117.

HI STORI A DO BRAZI L. 371

S. Pedro fora saneto Antônio chamado a arca do Tes- 1658-tamento, por que no seu espirito se coníinhao osmais profundos mysterios da divindade. A própriainfallibiüdade havia declarado que este saneto era aArca : que typo mais verdadeiro se poderia imaginardos Hollandezes do que esse ídolo dos Philisteos meiohomem meio peixe?... e vede, Dagão cahiu de rostopara o chão deante da Arca!

Ingrato ás tropas pernambucanas não foi o povode S. Salvador; reconhecendo que a ellas se deviaa salvação, presenteou-as o senado da câmara dacidade com um donativo de mil e seiscentos cruzados.

Da Hespanha vierão honras e recompensas para muitos que durante o assedio se havião distinguido. Bagnuolo obteve segundo titulo italiano4 e Pedro daSylva foi feito conde de San Lourenço. Os militareslhe aferirão o proceder por um falso padrão de honra,por demais geralmente reconhecido, e, mofando

d'elle, dizião que tanta humildade melhor assentavan'um frade da Arrabida do que n'um commandante.A corte pelo contrario o applaudiu, decbrando quepozera elle um exemplo digno de imitar-se. Altamente louvável foi em verdade este comportamento;so um sábio assim podia pensar, so um valente assim

proceder.Com a lembrança de que o conhecimento que1 Uni principado no reino de Nápoles, sugeito nessa epocha a H e s

panha, e encorporado hoje na monarchia italiana. F. P.

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BarteusP . 8 5 .

372 HISTORIA DO RRxZIL.I638- d'esta fôrma obtivera da cidade, lhe permittiria con-

quistal-a, mal podesse dispor de forças adequadas,se consolou Nassau do seu mallogro. O panegyrisla,seu his toria do r, observa que esta jorn ada pouco custouá Companhia, dando quasi que para as despezas osdespojos, entre os quaes quatrocentos negros. Bemsabia Barlaeus a quem escrevia, nem a outrem quenão a similhante corporação offereceria tal consolo,ou fallaria de ganhos e perdas n'uma occasião em queas armas hollandezes tinhão sido não so rebatidas,mas até cobertas de infâmia '. San Salvador teria necessariamente cabido se maiores que os desatinosdos sitiados não tivessem sido os dos sitian tes . Isto oconfessarão os Portuguezes, altribuindo a sua salvação, abaixo de Deus, á ausência de Schuppe e Artiszensky, homens que pela sua experiência erão maispara lenier-se do que o próprio Nassau.

Nas suas cartas á Companhia, Nassau clamava altopor soccorros. Guerra, dizia, enfermidade e trabalhosas marchas n'um paiz como o Brazil dia por dialhe ião con sum indo o exe rcito; grilavào os soldadosque os rendessem em tão duro e improficuo serviço,e toda a sua arte tanto de conciliação como de severidade, era pouca para mantel-os na ordem, (juatromil hom ens erão necessários para as differentes guarnições; e se toda a sua força nem a isto chegava,

1 Onde está a infâmia no mallogro d'um feito (Turmas? I•'. P.

ileinescnla-çõe- de

>as^.iu áCompanhia

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 375

como havia de avançar para o inimigo? Como resistir- 1638-lhe se este avançasse sobre elle? Como guardar o paizcontra incursões1? Pedia e requeria pois 3,600 homens; ficaria então com sete mil, e assim não soesperava, mas sabia de positivo que alguma couzase faria digna da Companhia. Tinha esta commettidoemprezas que fazião honra ao século e á nação ho llandeza, cumpria poisleval-asa cabo; o dado estavalançado, e passado, não o Bubicão, mas o Oceano;agora ou se havião de pôr os meios para se conseguirem os fins, ou iria tudo pela água abaixo. Descendo depois ao tom mercantil, disse que o assucard'aquelle anno, não falhando a colheita, devia renderá Companhia 600,000 florins. Mas faltavão marinheiros, tanto assim qiie oitocentos soldados tinhãode servir a bordo dos' navios. Que mandassem poisuma armada a fazer face ao inimigo, se este se mos-Irasse^e a levar para a pátria os produetos.

Agitou-se por este tempo na Hollanda entre a A rompanhiaCompanhia das índias Occidentaes a questão de saber íme 0 c o m -

1 x mircio do

se lhe conviria continuar com o seu monopólio ou lirazil-franquear o commercio do Brazil. Contra a propostainnovação dizia-se que a Companhia perderia os seusgrandes lucros actuaes, abarrotar-se-ia o mercado,

depreciando-se consequentemente os gêneros euro-1 Eis o verdadeiro motivo do mão êxito da expedição á Bahia, e não

á falta de talentos militares, que mais do que Schkoppe e Artischofskypossuia Mauricio de Nassau. F . P .

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374 HISTORIA DO BRAZIL.

163?. peos, e que aquella deliciosa região affluirião colo

nos que, augmenlando e multipHcando-se alli , etornando-se a final mais fortes do que a mãe pátria,sacudiriáo a dependência. Quiz-se sobre isto ouvirNassau. Bcspondeu este que o que havião sido ja nãoerão os lucros da Companhia. A principio fazião ludoos dircctores, agora concedião-se contraclos : a p rin

cipio regorgilavão de assucar os armazéns dos Portuguezes, c cscasseando os gêneros europcos pedidosem escambo, vendião-se com enorme proveito, an-ciosos os da terra por se verem livres de produclosconstantemente em risco de serem preza do inimigo.Mais seguro agora o paiz, crescera a propriedade

hollandeza. Melhor era, declarando livre o comnier-

cio, exim ir-se á carga do m onopólio. Não podia aCompanhia comprar gêneros bastantes com queabastecer o mercado, a tanto lhe não alcançavào osfundos; e que faria das mercadorias particulares quehouvessem deixado en tr ar no pa iz? Não podia com-

pral-as sem prejuízo d'ella, comprando-as pelopreço que alias obterião dos donos, querendotomal-as por menos. E n'este ultimo caso conlraban-dearião os particulares a sua fazenda.

Depois, fallando como estadista, ponderou a neces

sidade de colonizar o Brazil; assim , d isse, se roluis-teceria o paiz, podendo-se diminuir as guarnições,sem que o Estado deixasse de sen tir-se sejMirn. W»raso pelo medo se conlinhão os Po rtugu ezes ; tira-se-

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163 8 .

HISTORIA DO BRAZIL. 375

se-lhes porem a esperança de verem restabelecido oseu próprio governo, e tornar-se-ão bons subditos.Mas não atravessarião colonos os mares para morrerem de fome em paiz extrànho, e em quanto mantivesse a Companhia o seu monopólio, cortaria todasessas espectativas de fortuna que sos podião attrahiraventureiros. Ja os Brazileiros se queixavão das res-tricções que lhes im punh ão ; com representações diárias o acabrunhavão, dizendo, que cornos Hollandezes havião tractado viverem debaixo do governo d'ellcs

como debaixo do portuguez, podendo vender o pro-duclo de seus moinhos a seu próprio gosto, e não ávontade de oulros; se lhes tiravão esta liberdade,preferirião antes passar;se a outra parte, e correr osazares da fortuna, do que soffrer similhante escravidão. Soltae vossos enxames, disse el le , sobre estesnovos paizes e dae terras aos soldados licenciados;sejão colônias vossos postos avançados e guarnições,que foi assim que Boma subjugou o mundo '. Adop-tado este parecer, declarou-se livre o commercio,reservando-se a Companhia o trafico d'escravos, ar tigos de guerra e pau brazil. Mas a todos os altosfuncionários seprohibiu absolutamente o commerciopara que pelo amor do ganho não abusassem dopoder.

Segurados todos os postos que lhe parecerão em reediçãode Joí.

1 Honra ao illustre varão que no decimo-septimo século sustentavalacs princípios! F. P.

Barlseus.8"-90.

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376 HISTORIA DO BRAZIL.

ica«. risco de serem accommettidos, preparava Nassau um aexpedição que fosse queimar no Bcconcavo os engenhos de assucar, quando chegou Jol com poderosaarmada. Com inveja recordava ainda a Companhia arica victoria deH ey ne, e na esp erança de ench er osseus cofres com despojos eguaes, despachara estevelho e excellente m ar in hei ro . A força que elle levoudo Becife, suspendeu os projectos de Maurício. Cheiode esperanças em proveitosos triumphos, deu Jol ávela e encontrou effectivamenle a armada mexicananas alturas de Cuba : mas os seus capitães o aban donarão. Quatro vezes travou o velho marujo resolutamente a acção, e outras tantas se deixarão estestraidores ficar cobardemente aó largo, ou virárão debordo no momento do perigo, ale que a final escaparão os Hespanhoes. Em altos brados clamou Jol porvingança em nome da pátria e no seu próprio. Osculpados forão remetlidos para a Hollanda, mas havendo em todos os paizes meios de illudir em casostaes a justiça, com tanto que os delinqüentes tenhãoamigos poderosos que os protejão, ficarão impunes.

Lison^eira perspectiva se offercccu a Nassau ago ra.< amarão com Mensageiros de Camarão vierão dizer-lhe que offen-

iiaiuiLve.. (J J (J 0 p 0 r J 5 a g n u 0 ] 0 desejava aquelle cacique assentarpazes com os Hollandezes, e volver ás suas própriasterras. Com prazer comprarião estes a amizade detão audaz e terrivel in im igo, e assim com presentese favorável resposta despedirão os emissários: mas

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378 HISTORIA DO RRAZIL.

638 suspeitas de conspiração. Averiguado o caso, uns

forão encarcerados, outros deportados para a Bahia,e ainda outros sentenciad os, a m ais long ínquo degredo. Mais minuciosas investigações nenhuma provaofferccérào da supposla conjuração, comtudo, correndo o boato de esperar-se u m a arm ada hespan hola,nem se absolverão nem condemnárão os prczos, masdeixárào-nos ficar na cadeia.

voiu Logo em princípios do anno seguinte voltou Ar-aoBrazii, tiszenskv ao Brazil com um retorço pequeno, c m-

masdesgos- J

tosovac-sf struecões para vigiar em segredo o proceder de .\as-outra vez " I ~ o i

.embora. ^ . ^ ^ J ^ r ^ v m q , , 0 c o m p o u C O tillO SC l lOUVe.

Lavrava-lhe no coração inveterado ódio, quiçá provocado pela nomeação do conde Maurício para ogoverno, cargo a que elle próprio se julgava comdireito; e tão arrogante se lhe foi tornando a linguagem, que não tardou que a não podesse tolerar ogovernador general. Depressa proporcionou o pró

prio Artiszensky famoso ensejo para decidir de qualdos dous devia predominar a auetoridade : dirigiuaos direclores da Companhia na Hollanda uma cartade queixumes c deixou-a ler publicamente antes deenviada. Nawiu appellou para o Senado, respondendo cheio de indignação, mas satisfactorianienle

á aceusações que lhe faziào, e que por frivolas, nãomerecem aqui menção, referindo-se quasi todas apontos de ceienionial e etiqueta militares, desprezados pela fona da necessidade . Todo o Senado lhe deu

1039.

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380 HISTORIA DO RRAZIL.

H'Ct». tavão pois as cap itanias hollandezas todas junctas

cento c vinte engenhos a trabalhar e quarenta e seisextinclos. Os dízimos do seu prod ucto andavão arren dados assim : os de Pe rnam buco po r J iS,500 florins;(s de Itamaracá e Goyana por 19,000; os da Parahyba por ò4,000. Um imposto chamado a Pensãosobre os engenhos de Pernambuco arrematara-o por

'20,000 florins João Eernandez Vieira, cujo nome jappareceu, nem tardará a tornar-se conspicuo nahistoria do Brazil. Os pequenos dízimos, como os

rariius.101. chamavão, fazião monlar o total a "280,900 florins.Muito havia soffrido o paiz com a invasão liollan-

l a l l a l

de (oionos. jgyj,. regiões inteiras jazião assoladas, lendo morridomais gente do que o vagaroso curso da natureza podiasupprir em muitos e compridos annos. A cidade doBecife prosperava na verdade : era a sede do governo,principal posto militar e naval, e o grande mercadocomniercial em que se apinbavão as casas onde quer

que apparecia espaço. Hollandezes havia que esperançosos previào ja o dia em que a sua capital setornaria outra Tyro, e se estes homens tivessem podido inspirar aos conterrâneos os seus próprios espíritos generosos e empn hendedores, realizada veria-mos a prophecia. Clamavão elles por colonos;

mandae-nos, dizião, os vossos menesleriaes, que malaclião na pátria com que supprir as vilães necessidades, e aqu i depressa se torn arão ricos. Tre s, quatroe seis florins por dia era o jo rnal de pe dre iros e car-

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HI STORI A DO BRAZI L. 381

pinteiros; e os officios mechanicos, de que carecião 16JJ'os engenhos de assucar, ainda erão mais bem pagos.Tres classes de homens, se dizia, fazião falta no Brazil : capitalistas, que especulassem em engenhos d'as-sucar; artezãos e operários que depois de junetoalgum pecúlio se entregassem á agricultura , fixando-se no solo adoptivo como no natal o terião feito. Comtal gente depressa se tornaria a ver o paiz tão flo- Bariajus.rescente como o havião encontrado os Hollandezes.

So o terror podia manter sujeitos os Portuguezes, osjudeos.mas muitos judeos da mesma nação tinhão vindo daHollanda a habitar um paiz onde podião fallar a sualíngua e seguir a sua religião. Excellentes subditosexercíÃo elles a característica industria da sua raça,seguros de gozarem-lhe os fruetos debaixo d'um governo livre. Também alguns Brazileiros-Portuguezestirando alegres a mascara que por tanto tempo haviãotrazido confrangidos, unirão-se aos seus irmãos dasynagoga.O ruidoso júbilo , com que se pozerão agoraa celebrar as suas ceremonias, allrahiu demasiado aattenção; nos catholicos excitou horror, e os própriosHollandezes, menos liberaes do que as suas leis, pretenderão que não se extendia ao Brazil a tolerânciada H ollanda; annuiu o senado, por ventura compar-

lindo os sentimentos do vulgo, e d'aqui nasceu oedicto, ordenando aos judeos que celebrassem maisparticularmente os seus ritos

Pouca razão de alegrarem-se com a mudança de 0s S - W a s e n s

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582 HISTORIA DO BRAZIL.

1639. senhores tinhão os selvagens ind ígen as, cujo num erodas Alagoas ao Potengi, ja se avaliava agora emmenos de dous mil combatentes. A única couza queos podia indu zir a trab alh ar um pou co, erão os gêneros europeos, agora mais fáceis de se conseguirem '; mas apezar disto exigia-se maior serviço dosíndios, mais escassos e caros os negros, lendo algunsacom panhado ao exilio os seus bons senh ores, oulrospassado-se para os Hollandezes para obterem a liberdade, e ainda oulros mais avizados ido reunir-se aosseus irmãos dos Palmares. Nada podia persuadir osselvagens a conlractar os seus serviços por maisde vinte dias; em cada aldeia residia uni inspectorhollandez para obrigal-os a dar conta do seu trabalho, e fazer lambem que fossem devidamente pagospor quem os empregava. Antes de findo o prazo doserviço costumavão elles ped ir o seu salário com umadesconfiança para que provavelmente lhes não falta-rião motivos; e uma vez pagos não raro fugião,deixando por acabar a tarefa. Muitos serviços antesfeitos pelos negros se exigião agora dos índios, do

Missionários que erão freqüentes fugas o resultado. Alguns mis-hollaiulezcs. . . 1 11 1

sionanos hollandezes trabalhavão por ensinar-lhesem vez d'uma crença papisla oulra calvinisla, mas

faltavão instrumentos de conversão, nem a theologia1 0 panno de linlio de Osnahurgo era o ai ti»o que elles mais esti-

mavão, fartos ja do fabricado em R uão e Steinfurt. í\ curiosa esta modaentre selvagens. Barlieus, 121).

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HISTORIA DO BBAZIL. 383

de Calvino tinha com que supprir á falta de sanctos 163!>-e imagens, rosários, cruzes, cirios e água benta,bonecada e pompa theatral d'um systema em quefora difficil dizer qual das duas couzas, experteza ouperversidade, leva as lampas á outra ' .

A força militar dos Hollandezes no Brazil não pas- Força dosHollandezes.

sava de 6,180 homens, a que , segundo se cria , poderião accrescer uns mil índios. Toda esta gente erapreciza para as guarnições, sendo impossível dispord'alguma para proseguir nas conquistas, nem mesmopara defender o paiz contra as depredações das partidas portuguezas. Debaixo d'outro qualquer ministro

que não fosse Olivares, bastaria á Hespanha umacampanha para extirpar estes invasores. No seu memorial confessou effectivamen te o senador hollandez, que mais ao deleixo do inimigo do que á própriaforça era devida a segurança. Poucos como erão andavão meio nús e esfomeados os soldados: era que as

conquistas carecião que da Hollanda lhes mandassemmantimento, expulsos os lavradores, cujo logar malo podem supprir soldados e mercadores. Tão escassasas provisões que sobre pena de morte se impoz aosnaturaes a obrigação de abastecerem o Becife, decreto que inevitavelmente havia de aggravar o mal

que se propunha palliar. Todos os que possuião terrasforão obrigados por lei, sob pezadas penas, a plantar

1 É singular que possam os preconceitos religiosos levar um homemcomo Southey a escrever similhantes couzas! F. P.

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38-i H I S T O R I A D O R R A Z I L .

1059 de mandioca uma certa porção; confeccionárão-seregistros dos proprietários territoriaes, c nomeárão-seofficiaes que andassem vendo se se cum pr ia o edicto. 'Cada lavrador havia de apresentar quatro vezes porann o a qu an tida de fixada, cujo preço era marcado

Bi5w.s' Pe '° senado duas vezes por semana.Edifica Tal e r a a condição das conquistas hollandezas noraTacio""1 Brazil, quando o conde Mauricio de Nassau, como se

1639 trabalhasse para uma nação cujas idéias fossem tãovaslas e atrevidas como as d'elle, principiou a edifi-car uma cidade e uni palácio. Ficava entre os riosCapivar ibi ' e Biberibi uma ilha estéril, chamada deSaneto Antônio !d'um convento de Capuchinhos quealli havia : quiz elle que o senado a fortificasse, comoposição im porta nt e, se jam ais o Becife chegasse a sersitiado, mas a despeza era immcdiata , o perigo remoto, e rejeitou-se o conselho. Besolveu-se entãoplantal-a, por que as arvores offerecerião algumabrigo á cidade se o inimigo se postasse no terrenoque se eleva alem do Capivaribi. Depressa se ampliouo designio, e o conde fez alli um jardim para si.Assaz chata e próxima da água era a posição paraencantar um Hollandez, mas o methodo por que elledispoz os seus bosques arrem edava a magnificênciados reis bárbaros. Com pasmo de quantos vião trans-

' Alias Capiharibe. F . P .1 É mai* conhecida esta ilha pela denominação da d'Antônio Vaz.

F . P .

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386 HISTORIA DO RRAZIL.

1639. donar Olinda c edificar aqui : acabou-se agora dedeslruir aquella cidade, deinolindo-se os edifíciosque restavão ainda, e empregando-se os maleriaesna nova, a que em honra do fundador se deu o nomede Mauricia. Bestava ainda unil-a por uma ponte aoBecife, e por 210,000 florins se contraclou a obra.Foi o architeclo construindo pillares de pedra atechegar ao ponto mas fundo, que era de onze pésgeom étricos, e desesperado aban donou a empreza.Cem mil fiorins estavão ja gastos. Muita genle houveque exultou com o mallogro d'um a obra que lhe iaprejud icar os seus m esquinhos interesses pa rticu lares, e levantou-se um clamor contra Maurício, o auc-lord'um projecto impracticavel. Encarregou-se entãoelle mesmo da execução : o que não de pedra, podiafazer-se de madeira, e no Brazil a havia, que cmdureza e duração pouco cedia ao granito. Concluídaem dous nozes, abriu-se a ponte : obra ja digna de

virM.i memória por si, e muito mais por ser a primeirap'"ü-k d'esta natureza na America porlugueza. O senado,

que havia feito coro com a multidão, motejando daempreza em quanto incerta, reconheceu agora o seumerecimento, e pagou a obra por conta da Companhia, certo de breve reembolso pelo produeto dalaxa da passagem.

Lançou então Nassau outra ponte sobre o Capivaribi, abrindo assim communicação entre o Becife eo lado opposto do paiz através Mauricia. Perto dYsla

SfimnrbT

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HISTORIA DO BRAZIL. 387

ponte edificou na ilha para si outra casa, que, como 1630

Friburgo, servisse não menos de recreio que de defeza, e a que derão os Portuguezes o nome de BoaVista1. A todos os respeitos erão úteis estas obras,mas sobre tudo por que mostrando a resolução emque estavão os Hollandezes de manter suas conquistas, e a fé que tinhão nos meios de o poderem fazer,tiravão a esperança aos Portuguezes, concorrendopara que resignados soffressem um jugo que tãopouca probabilidade tinhão de jamais sacudir. Conferindo-lhe o titulo honorário depatronus, mostrouo senado quando reconhecia o mérito do conde, e

approvava as suas medidas.Entretanto se preparavão poderosos esforços para clieoa

expellir do Brazil estes conquistadores. Não lhe sof- ° Torre.*1

frendo mais a paciência ver como erão tractadas de 1659.resto e quasi que abandonadas ao inimigo estas importantes colônias, obteve um dos ministros portu

guezes audiência d'el-rei, e tão energicamente lherepresentou as fataes conseqüências de similhantesystema, que Olivares viu que para manter-se*nasboas graças do monarcha era precizo um grande esforço. Esquipou-se armada mais poderosa do que jamais dera outra vez á vela para a America, confiando-

se o commando ao conde da Torre, D. Fernando Mas-carenhas, conjunclamente nomeado governadorgene-

1 Schoonzigl em hollandez. F. P.

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 589

que a expedição podesse tornar a sahir ao mar'. 1639

Alguns dias antes de dar outra vez á vela, fez o Quatroacçõet

novo governador sahir André Vidal de Negreiros a navaes'assolar as províncias do inimigo á frente das tropasque melhor conhecião o paiz. Devião dividir-se empartidas pequenas de modo que melhor se sustentassem e illudissem o inimigo, fazendo ao mesmo tempomaiores depredações, e*em tempo ajustado deviãoreunir-se á vista do mar, e fazer juncção com as forças de desembarque. Pontuaes seguirão estes homensas suas instrucçõês, pondo a ferro e fogo ludo poronde passavão, e no momento convencionado acha-vão-se no seu posto : appareceu effectivamente a armada á vista, e elles incendiarão as plantações eengenhos nos arredores do Becife, com o que d istra-hissem a attenção do inimigo. Mas a longa demoradera a Nassau tempo de preparar se contra o perigo, .e Vidal passou pelo desgosto de ver em logar d'umdesembarque uma acção naval. Deu-se o primeirocombate a 12 de janeiro de 164 0 entre Itamaracá e 1640Goyana. Foi morto o almirante hollandez, e de parte

1 I)u Tertre refere um boato, a que dá credito, de que n'este annose fizera enlre os reis da llespanha e da Inglaterra um tractadopelo qual se obrigara este a mandar dezoito navios tripolados por Ir-

andezes para ajudarem a exp ellir do Brazil os Hollandezes, sob con dição de que, feito isto, ajudariào também os Hespanhoes a deitar osFrancezes fora de S. Kitts, e estabelecer alli em logar d'elle€ estesmesmos Irlandezes. A historia parece ter também achado credito entreos Francezes. Hist. des Antilles, 1, p. 1 5 5 .

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390 HISTORIA DO BRAZIL.1Gi0 a parte nem se ganhou gran de ventagem, nem se

soffreu grande perda. Seguiu-se nova acção no oulrodia entre Goyana eCabo Branco; terceira no dia im -mediato ao mar da Parahyba, e quarta á foz do Potengi no dia 17, arrastando ventos e correntes osPortuguezes assim cada vez para mais longe do seudest ino 1 . Assim pôde uma força muito inferior evitarque uma armada de oitenta e sete velas e duas mil equatrocen tos peças de ar ti lh ar ia fizesse couza alguma:levou esta em todas as acções a melhor pelo (pie tocaá mera peleja, mas vencida pelo inimigo qu an to ám a n o b r a 8 , viu mallograr-se-llie completamente o

1 Ficou a ahniranta com o damnodas quatro refrezas e Saneia Barbara com a honra. «Ponde vos,» diz Yirvrano seu sermão dYsta saneia,o no galcam S. Domingos, capitania real de nessa armada nas quatrobatalhas navaes de Pernambuco, sustentando a balaria de trinta ecinco nãos olandezas; c que lie o que se via dentro e fora em todaaquella formosa e temerosa fortaleza nos quatro dias dYsles conflitos.'

' Jogava o galeam sessenla ineyos canhões de bronze cm duas cubertas;tinha guarnecidos por buin e oulro bordo o convez, os caslellos de popae proa, as duas varandas e as gáveas com seiscentos mosqueteiros. K

sendo um Ethna, que lentamente se movia vomitando labaredas erayos de ferro e chumbo por tantas bocas maiores o menores; dandotodos c recebendo pólvora, carregando e descarregando pólvora, otendo nas mesmas mãos os murrões com duas médias acesas, ou csbotafogos fincados junto aos cartuchos; e que bastando qualquer faíscapara excitar um total incêndio, e voar em liuni momento toda aquellamaquina; que entre tanta confusam, e wsiiihanea do pólvora e lupi,estivesse o galeam trcmolaiido as suas bandeiras Iam seguro <; senhor

•do campo, como huina roca batida so das ondas, <• nani das balas;•luriii negará que supria alli a vigilância e p atrocínio de saneia liar-

liara, »> que nenhuma providencia humana poderá evitar? n Tom. 7,i». 5 0 1 .

- Mão o adniittc comtudo Yieyra, nam provavelmente a suspeitou

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 591

intento. Tornou-se o tempo agora tal, que re nun

ciando a toda a esperança de ga nh ar ou tra vez a Bahian'aquella estação, abandonou o governador uma empreza para que tão grandes preparativos se haviãofeito. Bagnuolo tentou e levou avante a sua volla pormar; mas por tão diflicil era tido o commettimento,que mais acertado pareceu desembarcar quatorze

legoas ao norte do Potangi o grosso da força militarcomposto de 1,500 homens ás ordens de Barbalho,ejunctamente Camarão e Henrique Dias com a suagenle, deixando-os effectuar uma retirada de trezentas legoas por paiz inimigo, e paiz como o Drazil,sem mais provisões para a marcha do que as que cada

homem podia levar comsigo. Tendo-os desembarcadosingrou o conde da Torre com vento em popa paraas índias Occidenlaes, d'onde passou a Europa. Apenas chegado a Lisboa, foi mettido na torre de S. Ju-

sequer. Refere elle o successo com essa valentia sua particular e ani

mação, que lhe caracterizão a inimitável linguagem : « Oh, juízos econselhos oceultos da Providencia, oh, ira divina ! Vitoriosas sempresem controvérsia as duas armadas em quatro combates suecesivos naparte superior das ondas; furtadas porem as mesmas ondas pela parteinferior, e como minadas as nãos pelo fundo, e pelas quilhas, de talsorte as arrancou do sitio ja ganhado a fúria das correntes, que pormais que forcejaram pelo recobrar, nunca lhe foi possível. Assim vencido da sua própria vitoria aquelle grande poder, e fugindo seu fugir

(por que fugia o mar, em que navegava), podendo mais a desgraçaque o valor, a natureza que arte, e o forçado destino que o dos braços,perderam os derrotados e tristes conquistadores o m ar, perderam aterra, perderam a empresa, per leram a esperança; e nós que n'elles

a tínhamos fundada, também a perdemos. » Sermões, t . 5, p. 4 '22.

1040.

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3 ! > ' 2 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

íüio liào, onde jazeu sem processo, posto que não sem

pena, até que a acclamação de D. João IV lhe deuCi. (ou- ppe .

21 j . occasião de servir o seu paiz e libertar-se a si.

AbatimcnloNão tinhão vencido os Hollandezes, mas logrando

Portuguezes. com o favor do tempo afastar das suas costas forçasmuito superiores, linhão colhido Iodas as vantagensda victoria. Instituiu Nassau regosijos por um suc

cesso que poderá ser mais glorioso, mais proveitosonão. e mettendo alguns dos seus capilães em processopor máo comportamento, castigou vários e suppli-ciou u m 1 . Tão ruinoso e inesperado mallogro abateuos espíritos aos Portuguezes mais do que as múltiplas derrotas e perdas até então soffridas. Principia

rão a com parar com a do inim igo a própria condiçãoe recursos. Fallavão desanimados da quantidade daanilharia do Hollandez, tanto de bronze como deferro; das suas fortalezas tão bem guardadas; dosseus navios tão numerosos, tão abundantemente providos, tão perfeitamente esquipados; das armas dos

seus soldados tão limpas, tão polidas, tão brilhantes,que mais parecião prata do que ferro ao lado das dosPortuguezes. Até os ânimos mais fortes reconhecerãoo desesperado da situação. Do púlpito lhes diziào quedispersas e arrebatadas ninguém sabia para onde asarmas reaes c as armadas, so nas armas e exércitos

1 I Jnt o foião d e g r a d a d o s , passando-se-llies unia espada por c ima da

cabeça . Espa lhou-se lóra do paiz um boato exagerado de lerem os

Hes p an h o es p e rd id o sessenta navios . Du Tertee, I, p. 15ti.

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H ISTOR IA DO R R AZIL. 593

do ceo devião pôr toda a sua esperança, e na prolec- 1C4(K

ção e poder da sanctissima Virgem. « Tornemostodos! » dizia o pregador, devotamente o seu rosárionas mãos, « demos volta a esta funda todos os diasires vezes, e todas tres ao redor da cabeça, não sorezando, mas meditando seus sagrados mysterios; naprimeira volta os gozosos do primeiro terço, na segunda os dolorosos do segundo, na terceira os gloriosos do ultimo. E se assim o fizermos Iodos com aunião, continuação e perseverança (que é a que dáforça e efficacia ás orações humanas), eu prometto áBahia, em nome da mesma Senhora do Bosario, que

não so se conservará livre e segura de todo o poderdos inimigos que por mar a infeslão e por terra aameação; mas que este será um certo e presentissimosoccorrer, ainda que faltem todos os oulros, paraque todo o Brazil fazendo o mesmo se recupere e j ^restaure. » T - 5 ' m

*

Bazão tinha o pregador, que havia o Brazil de Retirada

dever a sua restauração aos indomáveis brios do seu Barbaiho.povo, sustentados e exasperados pela crença religiosa. Do que podem homens assim determinados viuentão o mundo um exemplo. A Vidal, que ao longoda costa acompanhara a armada, até ver o desesperado rumo que levava, nenhum alvitre restava naescolha das suas medidas; que fazer, senão tornar adividir as tropas, e seguir regressando o mesmocurso de devastações? Não tardou Barbalbo a vir

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ôíH HISTORIA DO BBAZ1L.

1640. encorporar-se a estes homens, e abi foi o exercitoassolador, levando a destruição aonde chegava, fi

zerão prizioneiro o governador áo Bio Grande, passarão á espada toda a guarnição da Goyana, eao sahirdo Becife uma força grande contra elles, embrenhá-rão-se no serião, qu e m uito m elhor conheciào do que

o inimigo. Muitos Pernambucanos, cançados (Puniasujeição que armava contra elles os seus própriosconterrâneos, sem que deixassem de ser suspeitadose opprimidos pelos Hollandezes aproveitarão o ensejode sahir do paiz. Muitos padecimenlos os aguardavàona marcha ; o* alforges, que alguns dos que licavãoatraz, arroja vão de si, quando perseguidos, aehavào-se cheios de assucar por falta de outro alimento.Barballio porem chegou a salvo á Bahia com poucaperda alem da oceasionada pelas fadigas e trabalhosdo c a m inho ' .

.•vssoiaçãodo -'as antes disso ja Nassau começara a sanguinosaobra das represálias. Dous mil Tapuyas tinhão ulti-mamenle descido do interior ao Bio Grande o offere-cido alliança aos Hollandezes; mal esla havia sidoacceila, quando elles, como amostra do que da sua

fidelidade se devia esperar, cahirão sobre doze po

bres colonos portuguezes, trucidando-os Iodos. As

1 Barheus (p. lS.7.) diz que eil<- inalava o, seus próprios dm-iilcs,

o que é tão falso quão incrível, embora o Hollandez des- ulpo o caso

dura necessitutis ac mililitc. lege. D que é verdade c que (piem cabia

abi i icava, e se o i n im ig o o e n c o n t r a v a , não lhe dava quar te l .

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HISTORIA DO BRAZIL. 393

mulheres e crianças d'estes selvagens forão por pre- 16 4 °-

caução política aquarteladas como reféns na ilha deItamaracá, em quanto se soltavão os homens contraa Bahia. A seguinte medida de Nassau foi expulsardas províncias conquistadas todos os religiosos, edepois despachou Jol a pôr o Beconcavo a ferro efogo, em quanlo, ause nte o grosso da força, nen hum a

resistência se podia alli oppôr. Cumprirão-se á riscaas instrucçõês, e n'aquella vasta bahia, então a maisprospera de toda a America, não escapou um so engenho. Com isto esperava elle pôr em apuros derenda e mantimento a cidade, aplanando o caminhopara a futura conquista.

N'esle misero estado veio o marquez de Monte Chega1 o marquez de

Alvão, D. Jorge Mascarenhas, achar o Beconcavo, ao MonteAMochegar ao Brazil com o titulo de viso-rei. 0 desgra- ™°-rei-

çado desgoverno, que tantas calamidades acarretarasobre o paiz, pintou-lhe Vieyra n'um memorável

sermão, pregado á sua chegada, com a força e intre-pidez que caracterizâo os discu rsos d'este eloqüentíssimo orador e homem extraordinário. « Muitas occa-siòes ha tido o Brazil de se restaurar, disse elle,muitas vezes tivemos o remédio quasi entre as mãos,mas nunca o alcançamos, p orqu e chegamos sem pre

um dia depois. Como havia de aproveitar a occasiãoa quem a tomou pela calva sempre? E como estamostão lastimados das tardanças, o primeiro bom an-nuncio que temos, senhor, é sabermos que nos vem

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Í040.

0 ' t ' H I S T O R I A D O B R A Z I L .

a saúde nas azas, e que voando mais que correndo,partiu Vossa Excellencia a restaurar este Estado semreparar nos novos inconvenientes que da ultima fortuna sobrevierão, nem em quão descabido está oBrazil das forças, e do poder com que Vossa Excellencia acceilou a restauração d'elle. Aconteceu-lhc aNossa Excellencia com o Brazil o que a Chrislo comLázaro. Chamárão-no para curar um enfermo : Ecce

i/nem amas infirmalur, e quando chegou foi-lhe necessário resuscitar um morto. Morlo está o Brazil, eainda mal por que tão morto e sepu ltado, fumegandoestão ainda e coberlas de cinzas essas campanhas. Éverdade que nunca se viu esta província tão auclori-zada como agora, mas podem-lhe servir os títulos deopilaphios, que poisa vemos levantada a vice-reinoentre as m ortalh as, bem se pode dizer por ella lambem : Que depois de morta foi rainha. »

Passou a expor como qua tro geiieraes1 havião eom-

mandado em chefe desde que o inimigo invadiraPernambuco, entregando cada um ao seu suecessora guina em peor estado do que a recebera, e propoz-se explicar a condição do Brazil e as causas da suaenfermidade, que Iodas achou simbolizadas no seutexto. Era este, segundo o costume da Egreja catho-

hca , tirado do evangelho do dia, nem na apparenciapodia haver nada menos applicavel ao proposto as-

« Grande con jec tu ra de ser a enleni.í 'a.l. . i,:„rlal, mudarmos lantnv(•/<•« de cabece i ra .

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H ISTOR IA DO R R AZIL. 397

sumpto do seu discurso : Ut fada est v ox salulationis

tux in auribus méis exultavit in gáudio infans. Massabia Vieyra com phantastica ingenuidade, t irar detoda a palavra todo o sen tido ; e citando o texto daVulgata, achou o ponto da applicação na palavrainfans.

« Bem sabem os que sabem a língua latina (exclamou o pregador), que esta palav ra infans, infante,quer dizer o que não falia. N 'este estado estava o m enino Baptisla quando a Senhora o visitou, e n'esteesteve o Brazil muitos annos, que foi a meu ver amaior occasião de seus males. Como o doente nãopôde fallar, toda a outra conjectura difficulta muitoa medicina. Por isso Chrislo nenhum enfermo curoucom mais difíiculdade, e em nenhu m m ilagre gastoumais tempo, que em curar um endemoninhadomudo. 0 peor accidente que teve o Brazil em suaenfermidade, foi o tolher-se-llie a falia; muitas vezesse quiz queixar jus tam ente, m uita s vezes quiz pediro remédio de seus males, mas sempre lhe afogou aspalavras na garganta, ou o respeito, ou a violência,e se alguma vez chegou alg um gem ido aos ouvidosde quem o devera rem ed iar, chegarão também asvozes do poder, e vencerão os clamores da razão. Poresta causa serei eu hoje o in terp rete do nosso en fermo, ja que a mim me coube em sorte, que lambem são João fatiou por si, senão por boca de sanctaIsabel. Na primeira infoçmação da enfermidade con-

1610.

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308 HISTORIA DO BBAZIL.,wo- siste o acerto do remédio; c assim procurarei que

seja muito verdadeira, e muito desinteressada; falharemos, ja nos é licito, para que se não diga do Brazilo que se disse da cidade de Amidas, que a perdeu osilencio : Silentiinn Amidas perdidit. E como a causa

é geral, fallarei também geralmente, que não é razãonem condição minha que se procure o bem universalcom offensas particulares.

« A enfermidade do Brazil, sen ho r, é como a domenino Baptista, peccado original. S. Thomas e ostheologos definem o peccado original com aquellas

palavras tomadas de S. Anselmo : Est privatio justi-íi;r debilw. Que o peccado original é uma privação,uma falta da devida justiça. Bem sei de que justiçafallão os theologos, e o sentido em que entendem aspalavras; mas a nós que so buscamos a s imilhança,servem-nos assim como soão. K pois a doença do

Bfazil : 1'rivtUio jusliliie debita', falta da devida justiça, assim da justiça punitiva, que castiga máos,como da justiça distributiva, que premia bons. Prêmio e castigo são os dous pólos em que se revolve esustenta a conservação de qualquer monarebia ; epor que ambos estes faltarão sempre ao Brazil, por

isso se arruinou e cahiu . Sem justiça não ha reino,nem província, nem cidade, nem ainda companhiade ladrões que possa conservar-se. Assim o provaS. Agostinho com a aucloridade de Scipião Africano,eo ensinão conformemenlcTulIio, Aristóteles, Platão

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4 0 0 H I S T O R I A DO R R A Z I L .

164

°- como poderíamos nós conservar o nosso, ou como opoderemos restaurar depois de perdido, senão fazendo justiça? O contrario seria resistir a Deus, eporfiar contra a mesma fé.

« Sem justiça se começou esta guerra, sem justiçase continuou, e por falta de justiça chegou ao mise

rável estado em que a vemos. Houve roubos, houvehomicidios, houve desobediência, houve outros delidos muilos, e tão e no rm es, que não sei se chegarãoa tocar na religião; mas nunca houve castigo, nuncahouve um rigor, que fizesse exemplo. Muilos bandosse lançarão muito justos, muilas ordens se derão

muito acertadas; mas, como disse Aristóteles, as leisnão são boas por que bem se mandão, senão porque bem se guardão. Que importa que fossem justosos bandos, se não se guardavão mais que se se mandasse o que se prohibia? Que importa que fossemacertadas as ordens, se nunca foi castigado quem as

quebrou, e pode ser que nem rcprehendido? Bastepor lodo encarecimento n'esta maioria, que em onzeannos de guerra continua e infelice, onde houvetantas rotas, tantas retiradas, tantas praças perdidas,nunca vimos um capitão, nem ainda um soldado,que com a vida o pagasse. Oh ! aprendamos, apren

damos sequer de nossos inimigos, que n'esta ultimafortuna tão grande que tiverão, quando com um poder tão desegual nos derrotarão a maior armada quepassou a linha; a dous capitães sabemos que degol-

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 401

lárão no Recife, e a outros inhabilitárão com sup- 1640

plicios menos honrosos, so por que andarão remissosem acodir ásua obrigação. Pois se o inimigo quandoganha dá mortes de barato, se quando consegue ointento, se quando se ve victorioso sabe cortar cabeças, nós que sempre perdemos, e nem sempre porfalta de poder, por que não atalharemos a novas perdas com castigo exemplar de quem fôr a causa? Porque ha de ser conseqüência na guerra do Brazil, seme renderem passarei a Hespanha, e despachar-me-ei? Ha razão mais indigna de catholicos?

« Toda esta falta de castigo, toda esta remissão deculpas nasceu de uma razão d'estado, que ca se prac-ticou quasi sempre : que se não hão de matar oshomens em tempo que os havemos tanto mister :que não é bem que se perca em uma hora um soldado, que se não faz senão em muitos annos : que •justiçar um homem por que matou outro, é curaruma chaga com outra chaga, e que se não remedeiãobem as perdas, accrescenlando-as : que a primeiramáxima do governo é saber permittir, e que se ha dedissimular um damno, por não o evitar com outromaior : como se não fora maior damno a destruiçãode toda a republica, que a morte d'um particular,como se não fora grande expediente resgatar comuma vida as vidas de todos : Expedit ut unus mo-riatur homo, ne tota gens pereat. Ah! triste e miserável Brazil, que por que esta razão d'eslado se

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40'2 HISTORIA DO RRAZIL.

praclicou em li, por isso es triste e miserável. »Era do púlpito que no Brazil se fazia ouvir a opi

nião publica, como succcdia também na Inglaterraantes das gazetas e periódicos. Dava Vieyra voz aossentimentos dos mais illustrados dos seus conterrâneos, representando assim os males do paiz, c osabusos que o havião posto á beira do abysmo; masnos casos que referiu como exemplos da utilidade docastigo em grande escala, deixou-se desnorlear pelocalor da sua imaginação vivida : « A conquistar dila-tadissimas províncias (exclamou) caminhava Moysés,general dos Israelitas, e não duvidou degollar de umavez vinte e quatro mil homens, como se té na Escrip-lu ra , por que entendia como expcrimenlado capitão,que mais lhe importava no seu exercito a observânciada justiça que o numero dos soldados. Quem pelejoununca no mundo com numero mais dcscgual queJudas Macabeo? E com tudo nem os exércitos deApollonio, nem os ardis de Serão, nem os elcpliantcsde Antiocho o poderão jam ais vencer, antes elle sahiusempre carregado de despojos e de victorias : porqu e? Por qu e p rim eiro tirava a espada contra os seu s,e depois contra os inimigos. Pelejava com poucossoldados, e mais vencia, por que poucos com justiçaé grande exercito. Alagou Deus o m un do com o dilúvio universal, e para restauração d'clle não guardoumais que Noé com tres filhos seus em uma arca. Pois,senhor, parece que poderamos replicar, quercis res-

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taurar o mundo, quereil-o restituir a seu antigo es- 1040

tado, e para uma facção tão grande não guardaesmais que quatro homens em um navio? Sim ; quedepois d'um castigo tão grande, depois d'uma justiçatão exemplar, quatro homens e um so navio bastãopara restaurar um mundo inteiro. Vede se nos sobejarão sempre soldados para restaurar o Brazil, se nosnão faltara a justiça. »

Passou depois a fallar da justiça distributiva, cujafalta não era menos fatal ao Estado : « Quando Davidquiz sahir a pelejar com o gigante, perguntou primeiro : Quiddabitiirviro, qui percasserü Philistxum

hunc? Que se ha de dar ao homem que matar estePhilisteo? Ja n'aquelle tempo se não arriscava avida senão por seu justo preço, ja então não haviano mundo quem quizesse ser valente de graça. Necessário é logo que haja prêmios para que haja soldados ; e que aos prêmios se entre pela porta do merecimento : dem-se ao sangue derramado, e não aoherdado somente : dem-se ao valor e não á valia;que depois que no mundo se introduziu venderem-seas honras militares, converteu-se a milícia em lalro-cinio, e vão os soldados á guerra a tirar dinheiro comque comprar, e não a obrar façanhas com que requerer. Se se guardar esta egualdade, entrará emosperanças o mosqueteiro, e soldado de fortuna, quetambém para elle se fizerão os grandes postos, se osmerecer; e animados com este pensamento, os de que

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404 HISTORIA DO BRA ZIL.1610 hoje se não faz caso, serão leões e farão maravilhas;

que muitas vezes debaixo da espada ferrugenla e>láescondido o valor, como talvez debaixo dos talizesbordados anda dourada a cobardia. Nenhuns serviçospaga Sua Magestade hoje com mais liberal mão que osdo Brazil, e comtudo a gu erra enfraqu ece, c a reputação das armas cada vez cm peor estado, por queacontece nos despachos o de que ordinariamente sequeixa o mundo, que os valorosos levão as feridas, éos venturosos os prêmios. D'esta desegualdade se segue , que o effeito dos prêmios militares vem a sercontrario a si mesmo, por que cm vez de com ellesse animarem os soldados, antes se desanimão e ilesa-lenlão. Como se animará o soldado a buscar a honrapor meio das bombardas e dos mosquelcs, se ve emum peito o sangue das balas, c n'oitro a purpura dascruzes?

« Mas (proseguiu o orado r) m uita s graças sejãodadas a Deus, qu e para remédio d'esle grande malnão so lemos justiça na terra, se não justiça de sol.Sol para allumiar , para conhecer, para dist inguir :

justiça para prem iar com egualdade Quandoaqui (na Bahia) estivemos sitiados no anno de trintae oito, tirava o inimigo muitas balas ao baluarte de

Saneio Antônio; os pcloums, que acerlavão, ficavãoenterrados na trincheira, os que erravão, voavão porcima, vinhão rompendo os ares com grande ruido, eos que andavão por estas ruas, aqui se abaixava um,

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 405

acolá se abaixava outro, e muita genle lhes fazia cor- m0-

tezias demasiadas. De sorte que o pelouro, que errou,esse fazia estrondos, a esse se fazião as reverências :e o oulro, que acertou, o outro, que fez sua obrigação, esse ficava enterrado. Oh! quantos exemplosd'estes se acharão na guerra do Brazil! Quantos forãomais venturosos com seus erros, que outros com seusacertos! Algum, que sempre errou, que nunca fezcouza boa, nomeado, applaudido, premiado, e o queacertou, o que trabalhou, o que subiu a trincheira,o que derramou o sangue, enterrado, esquecido,posto a um canto. Importa pois que não roube a negociação o que se deve ao merecimento; que se desenterrem os talentos escondidos, que sepultou a fortuna, ou a sem razão; que não haja benemerilo quenão seja bem afortunado; que se corte a lingua áfama, se for injusta; que se qualifiquem papeis, quese examinem certidões, que nem todas são verdadeiras. Se forão verdadeiras todas as certidões dossoldados do Brazil, se aquellas rum as de façanhas empapel forão conformes a seus originaes, que maisqueríamos nós? Ja não houvera Hollanda, nemFrança, nem Turquia, todo o mundo fora nosso.

« Não pretendo dizer com isto que não merecem

muito os soldados d'esta guerra, por que antes tenhopara mim, como é opinião de todos, que não ha soldados no mundo, nem que mais valentes sejão, nemque mais sirvão, nem que mais trabalhem, nem que

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406 HISTORIA DO BRAZIL.

1640. m a j s mereção. » Dcmorando-se depois nos trabalhos

por que havião passado, e referindo-se á ultimaexpedição commandada por Vidal Barbalho, « n'estajornada ultima e milagrosa (disse o pregador), ondese não deu q ua rte l, o mesmo foi ser ferido que m orto,deixando os amigos aos amigos, e os irmãos aosirmãos, por mais não poderem, ficando os miseráveis

feridos n'esses m atos, n'essas estrad as, sem cu ra, semremédio, sem companhia, para serem mortos a sangue frio, e crue lm ente despedaçados dos alfanges hollandezes, pelo rei, pela pátria, pela religião, pela fé.Oh! valorosos soldados, que de boa vontade me deli-vera eu agora com vosco, pregando vossas gloriosas

exéquias! »

Em seguida fez notar o máo tractamento da tropa,cc Não ha infantaria no mundo, nem mais mal paga,nem mais mal assistida; é possível que hão de andardescalços e despidos uns corpos tão ricos de valor?Descalços e despidos os soldados do rei das llespa-nhas, do mais poderoso monarcha do mundo? Bemsabemos a qu anta cstreileza está reduzida a fazendareal no tempo presente, mas quando el-rei n'esleestado não tivera outra couza, a camiza, como dizem,

• havia de tira r para vestir taes soldados. Nenhummonarcha do mundo chegou nunca a tanta pobreza,como Christo, Bedemplor nosso, na cruz, c com ludotanto que se viu com titulo de rei sobre a cabeça : Rei

Judieorum, moso os vestidos exteriores, senão a túnica

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HISTORIA DO BRAZIL. 107

interior deu aos soldados, e não a soldados que de-fendião a fé, senão aos soldados que o crucificavão.E que fizerão esses soldados logo? Tomarão os vestidos do Senhor, e pozerão-se a jogal-os. Pois se o verdadeiro rei se despe, para que os soldados tenhão quejogar, quanto mais se deve despir, para que tenhãoque vestir? E mais quando elles são tão valentes, è tãobriosos, que andando tão rolos, e tão despidos, quepoderão ter esquecido o vestir, nem por isso se esquecem do investir. E certo, senhores, não haveriamuito de que nos espantar, quando assim o fizerão.Quando Deus perg untou a Adão po r que se esconderano bosque do paraizo, respondeu e l le : Timui,'eo quod

imdus essem, et abscondi me : Senhor, olhei paramim, vi-me despido, por isso temi e me escondi. Omesmo poderão fazer os soldados d'csla guerra, temerem e esconderem-se na occasião, e quando lhesperguntassem por que, responder: Timv i eo quodnudus essem, et abscondi me : Escondi-me em ummato, temi a morte, não quiz pelejar com os Hollandezes, por que quando olho para mim, vejo-me despido, e não quero dar o sangue por quem me não dáde vestir. Isto poderão dizer os nossos soldados comofilhos de Adão, mas como filhos e descendentes d'a-quclles Portuguezes famosos, ^pelejão, traba lhão ,cansão, morrem, e quando olhão pa ra si como an-dão despidos, veem-se a si e fazem como quem são.E se sem vestir e sem comer obrarão até aqui Ião

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1640

4 0 8 H I S T O R I A D O R R A Z I L .

valorosamente, agora que a cuidadosa providenciado marquez viso-rei, que Deus guarde, de nenhumacouza mais tractou, que de trazer com que vestire sustentar esta infantaria, que farão ou que nãofarão? »

Entrou depois o pregador n'uma veia salyrica,tanto mais pu ng en te, q uanto mais jocosa. « Mas comoa experiência ensina, que para a saúde ser segura efirme, não basta sobrcsarar a enfermidade, se não searrancão as raizes, e se cortão as causas d'ella; énecessário vermos ultimamente, quaes são e quaesforão as causas d'esta enfermidade do Brazil. A causada enfermidade do Brazil, bem exam inada, é a mesmaque a do peccado original. Poz Deus no paraizo ter-real a nosso pae Adão, mandando-lheque o guardassee trabalhasse; elle parecendo-lhe melhor o guardarque o trabalhar, lançou mão á arvore vedada, tomouo pomo, que não era seu, c perdeu a justiça, em quevivia, para si e para o gênero humano. Esta foi aorigem do peccado original, e esta é a causa originaldas doenças do Brazil, tomar o alheio, cúbicas, interesses, ganh os e conveniências particu lares, por ondea justiça se não guarda e o estado se perd e. Perde-seo Brazil, senhor, digamol-o em uma palavra, porque alguns ministros d e S . M. não vêem ca buscarnosso bem, vêem ca buscar nossos bens. Assim comodissemos que se perdeu o mundo, por que Adão fezso a metade do que Deus lhe mandou em sentido

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 409

averso, guardar sim, trabalhar não : assim podemosdizer que se perde também o Brazil, por que algunsde seus ministros não fazem mais que a metade doque el-rei lhes manda. El-rei manda-os tomar Pernambuco, e elles contentão-se com o tomar. Se umso homem, que tomou, perdeu o mundo, tantos homens a tomar, como não hão de perder um Estado?Este tomar o alheio, ou seja o do rei, ou o dos povos,é a origem da doença : e as varias artes e modos, einstrumentos de tomar são os symplomas, que, sendode sua natureza mui perigosos, a fazem por momentos mais mortal. E, se não, pergunto, para que ascausas dos symplomas se conheção melhor. Toman'esta terra o ministro da justiça? Sim, loma. Tomao ministro da fazenda? Sim, toma. Toma o ministroda republica? Sim, toma. Toma o ministro damilicia?Sim, toma. Toma o ministro do Estado? Sim, toma.E como tantos symplomas lhe sobreveem ao pobreenfermo, e todos acommeltem a cabeça, e o coração,que são as partes mais vitaes, e todos são atlractivose conlractivos do dinheiro, que é o nervo dos exércitose das republicas, fica tomado todo o corpo, e tolhidode pés e mãos, sem haver mão esquerda, que castigue, nem mão direita, que premie, e faltando a ju stiça punitiva, para expelliros humores nocivos, e adistributiva, para alentar, e alimentar o sujeito, san-grando-o por outra parte os tributos em todas asveias, milagre é que não tenha expirado.

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4 1 0 H I S T O R I A DO R R A Z I L .1040 « Como se havia de restaurar o Brazil (não fallo de

hoje, nem de hontem, que a enfermidade é muitoantiga, ainda mal), como se havia de restaurar oBrazil, se ia o capitão levantar uma companhia peloslogares de fora, e por lhe não fugirem os soldados,trazia-as na algibeira? E como apoz esle ia logo oulrodo mesmo humor, que os trazia egualmcnlc arrecadados, houve pobre homem n'estes arredores, quesem sahir da Bahia, como se quatro vezes fora a Argel, quatro vezes se resgatou com o seu dinheiro.Como se havia de restaurar o Brazil, se os manli-mentos se abarcavão com mão d'el-rei, e talvez osvendião seus ministros, ou os ministros de seus ministros (que não ha Adão que não tenha sua Eva),pondo os preços ás couzas a cubiça de quem vendia,e a necessidade de quem comprava? Como se haviade restaurar o Brazil, se os navios, que suslentão ocommercio e enriquecem a terra, havião de compraro descarregar, c o dar qucrena, e o carregar, c opartir, e não sei se também os venlos? Como se haviade restau rar o Brazil, se o capitão de infantaria, porcomer as praças aos soldados, os absolvia das guardase das outras obrigações militares, envilccendo-se emofficios mechanicos os ânimos que hão de ser nobrese generosos? Como se havia de restaurar o Brazil, seo capilào de mar e guerra fazia cruel guerra ao seunavio, vendendo os manlimenlos, as munições, asenxarcias, as velas, as enlenas, c, se não vendeu o

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HISTORIA DO BBAZIL. 411

casco do galeão, foi por que não achou quem lh'ocomprasse? E como mais ou menos, por nossos pec-cados, sempre houve no Brazil alguns ministrosd'estas qualidades, que im portava que os g eneraesillustrissimos fossem tão puros como o sol, e tão incorruptíveis como os orbes celestes? Digo isto, porque sei que o vulgo é monstro de muitas cabeças,que não se governa por verdade, nem por razão, e seatreve a pôr a boca no mesmo ceo, sem perdoar nemguardar decoro ainda ao maior planeta. O certo éque muitas couzas se dizem, que não são, e ha suc-

. cessores de Pilatos no mundo, que por se lavarem asmãos a si, lanção as culpas á cabeça. Que havião ascabeças de executar, meneando-se com taes mãos, eobrando com taes instrumentos? Desíazia-se o povoem tributos e mais tributos, em imposições e maisimposições, em donativos e mais donativos, emesmolas e-mais esmolas (que até á humildade d'estenome se sujeitava a necessidade, ou se abatia a cúbica), e no cabo nada aproveitava, nada luzia, nadaapparecia. Por que? Por que o dinheiro não passavadas mãos por onde passava. Muito deu em seu tempoPernambuco: muito deu e dá hoje a Bahia, e nadase logra; por que o que se tira do Brazil, tira-se doBrazil, o Brazil o dá, Portugal o leva.

« Com terem lâo pouco do ceo os m inistro s qu eisto fazem, temol-os retratados nas nuvens. Àppareceuma nuvem no meio d'aquella bahia, lança uma

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1640.

412 HISTORIA DO RRAZIL.

manga ao mar, vae sorvendo por occulto segredo danatureza grande quantidade de água, e depois queestá bem cheia, depois que eslá bem carregada, da-lhe o vento, e vae chover d'aqui a trinta, d'aqui acincoenta legoas. Pois, nuvem ingrata, nuvem injusta, se na Bahia tomaste essa água, se na Bahia lecncheste, por que não choves também na B ahia? Se atiraste de nós, porque a não dispondes comnosco? Sea roubaste a nossos mares, porque a não restilues anossos campos? Taes como isto são muitas vezes osministros que vêem ao Brazil, e é fortuna ge ral daspar les ul t ramarinas. Partem de Portugal eslas nuvens, passão as calmas da linha, onde dizem quelambem refervem as consciências, e em chegando,vcrbi gratia, a esta Bahia, não fazem mais que chupar, adquirir, ajunctar, encher-se (por meios occul-tos, mas sabidos), e ao cabo de Ires ou quatro annos,em vez de fertilizarem a nossa terr a com a água (pieera nossa, abrem as azas ao vento, e vão chover aLisboa, esperdiçar a Madrid. Por isso nada lhe luao Brazil, por mais que dê, nada lhe monta c nadalhe aproveita, por mais que faça, por mais que sedesfaça. E o mal mais para sentir de todos é que aágua que por lá chovem c espcrdição as nuven s, nãoé tirada da abundância do m ar, como nVl ro tempo,senão das lagrimas do miserável e dos suores dopobre : que não sei como atura ja lanlo a constânciae fidelidade d'esles vassallos.

/.

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HISTORIA DO BRAZIL. 413

« Muitos Irances d'estes tens padecido, desgraçado 16í0

Brazil, muitos te desfizerão para se fazerem, m uitosedificão palácios com os pedaços de lua sru ina s, m u ilos comem o seu pão, ou o pão não seu, com o suordo teu rosto : elles ricos, tu pobre : elles salvos, tuem perigo : elles por ti vivendo cm prosperidade, tupor elles a risco de expirar. Mas agora alegra-te,

anima-te, torna em ti, e dá graças a Deus, que japor mercê sua estamos em tempo, que, se concorrerm os com o nosso suor, ha de ser para nossa saúde .Tudo o que der a Bahia para a Bahia ha de ser: tudoo que se tirar do Brazil, com o Brazil se ha de gas- sermões.lar. » P - 'í^-'m-

Da chegada do viso-rei agourava Vieyra os mais convençãofelizes resultados, e a boa vontade com que olhava oVÍSMSCOS

, . H o l l a n d e z e s .

aquelle um pregador, que tao ousado e fielmentepintava a má administração geral dos negócios, parecia implicar o desejo, se não a intenção, de pôr

cobro a taes abusos. Mas faltou-lhe o tempo pararealizar ou desmentir estas esperanças. O seu primeiro cuidado foi fazer cessar o modo bárbaro dehostilidades em que degenerara a guerra. Cançadasestavão ambas as parcialidades de similhante modode guerrear ', e entabulárão-se negociações para

1 D'elle nos traça Vieyra uma espantosa pintura : « O mar infestado, os portos impedidos, as costas com perpétuos rebates ameaçadas, as campanhas talada?, as lavouras abrazad as, as casas desp ovo adas e destruídas, as cidades e villas arruin ada s, os temp los e os alt are

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414 HISTORIA DO BRAZIL.

1640. m utuam en te acaba r com elle , sendo incerto qual dasduas deu o prim eiro passo qu e cada uma im pu ta á outra . Não houve po rem d'am bos os lados egual sinceridad e. Fru strada a ultima g rande expedição, nen hum arazão tinha o viso-rei para esperar que oulro esforçose fizesse em pro da restaura ção do Brazil, sabendoalias muito bem que os Hollandezes avaliavão a importância d'estas conquistas pelo ultimo saldo dassuas contas do anno. Valia pois mais do que balei-os,estragar-lhes o commercio. Convencido d'isto, recorreu, a deshonroso artificio, e cmquanto com os

Proceder Hollandezes negociava para prevenir toda a guerratraiçoeiro do

vi-o-rei. de depredações, despachava secretamente Paulo daCunha c Henrique Dias a talar-lhes os domínios.Depois d irigiu -se officialmcnte a Nassau c ao Concelho Supremo, dizendo que alguns dos seus soldados

profanados, as pessoas de todo estado c condicain, de todo sexo eidade, desacaladas, e por mil modos opprimidas : as prisoens, cs des

terr os, as pobiezas, as fomes, as sede s, huns mortos nos bosques,outros mirrados nos desertos, fugindo dos homens para ser pasto dasaves e das feras; as molheres e meninos innocentes entregues á fúriae voracidade dos bárbaros, e os mesmos cadáveres com horror da na-tuic/a inceslamente afrontados ; as mortes deshumanas a sangue frio,as traiçoens, as crueldades, as sevicias, os martuios, e tantos outrosgêneros da herética h r a n i a , contrários a toda a fc e direito das gentese de nenhum modo comprehendidos debaixo do nome de guerra : esla

he a guerra que padecemos. » Serm., t. .">, p. 4 1 2 .Sobrecarregado como este quadro poderá parecer, devia haver no

todo d'elle demasiada verd ade, alias se não teria arriscado a des-cripção ao próprio tempo e no próprio thcalro da guerra : sobre tudoo não faria tal homem.

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HISTORIA DO RRAZIL. 415

desertados com medo do castigo, procurarião prova- 1640

velmente com o favor de Sua Excellencia passar-separa a Europa; era também muito de recear-se queelles commettessem alguns excessos na sua marcha,pelo que pedia que, succedendo assim, fossem severamente punidos. Aventurou o viso-rei esta mentira,fiado em que era a sua gente por demais practica dopaiz, e experta no seu officio, para deixar-se agarrarou atraiçoal-o a elle. Nem n'islo se enganou, e acommissão foi plenamente executada; dividiu-se atropa em partidas pequenas, com seus dislriclos dedevastação traçados e logares de reunião aprazados,e mais uma vez foi Ioda Pernambuco posta a ferro e

fogo.Cast. Lus.§ 154-6.

Entretanto recuperava o duque de Bragança o RevoluçãoIhrono, sua legitima herança, havia tanlo usurpada Portugal.pela casa d'Âustria. Mandou-se uma caravela comordens para a Bahia, c desembarcando so, foi o ca

pitão communicar ao viso-rei a importante nova quetrazia. Immediatamenle se tomarão medidas paraimpedir que fosse pessoa alguma a bordo; e convocados os superiores das ordens religiosas e os prin-cipaes da cidade, leu-lhes o viso-rei os seus despachos, pedindo a cada um o seu parecer. Votou a

maioria por adiar-se até ao dia seguinte a decizão :era quê temião o poder da Hespanha e duvidavão daestabilidade do novo governo. Mas ja o marquez tinhatomado o seu partido, e declarou que ninguém lhe

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Ü6 HISTORIA DO RRAZIL.

,64 °- sahia d'alli antes de se assentar em alguma couza.Ouvido o que, o mestre de campo, João Mendes deVasconcellos, levando a mão á espada, exclamou :

Acciamação «Temos um rei do nosso próprio sangue portuguez,de D. Joao-IV l l ,

noBraiii. rj j 0 g 0 ) dUqUe de Bragança, a quem de direito per

tence o reino, como sabe lodo o mundo. Que nos dotemos pois em ouvir pareceres? Beal, real por dom

João, quarto do nome, rei de Por tugal ! » 0 viso-rei,

vaieroso que so esperava por um voto d'estes, repetiu : « VivaLucideno. . . , , , ,

i*. los. ei rei D. João IV e que ninguém se lhe opponha ! »Beunirão-se dous regim entos para desarmar a parle

hespanhola da guarnição, e tomadas todas as devidasprecauções, sahiu o viso-rei com o estandarte de Portugal, o senado da câmara de S. Salvador, e os prin-cipaes moradores, e proclamou rei D. João IV. Como mesmo enthusiasmo que nas provineias do reino,foi a noticia recebida no Brazil, e por todas as capitanias se repetiu a acciamação sem que contra ellase erguesse uma única voz. Communicada a Nassaua nova d'uma revolução que, tornando Portugal inimigo da l lespanha, devia por conseguinte ser seguidad'um tractado com a Hollanda, mandou o viso-reiseu filho D. Fernando a Lisboa a prestar obediência.

É o viso-rei Infelizmente para a familia Mascarenhas, dousremcltido

prezo para o outros filhos, que estavão em Portugal, preferindoao patriotismo a lealdade, tinhão fugido para Madrid,

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H ISTOR IA DO R R AZIL. 417

que seguia as mesmas partes, e nomear Barbalho, ,Gi()

Lourenço de Brito Corrêa e o bispo governadoresconjunctos. Apezar de ter achado que o viso-rei procedera como tocava a um Portuguez, communicouVilhena indesculpavelmente as suas instrucçõês aosdous interessados, a quem faltou a virtude para resistir á tentação da auctoridade. Nem lhes bastou queD. Jorge, ao notificarem-lhe a deposição, deixassecom prompta obediência o palácio, retirando-se parao collegio dos Jesuítas : alli foi posto em custodia, ecom elle dous amigos, que afora a dedicação á suapessoa, nenhuma outra culpa tinhão.*Dous officiaes,

que elle tinha mandado prender por um assassinatocommettido com dia claro, forão saltos. Depois met-

terão-no a bordo d'uina caravela, em que o queriãomandar prezo para o reino. Antes que ella desse ávela entrou no porto um navio com bandeira hespanhola; immediatamenle capturado, achárão-se-lhe a

bordo carlas para o marquez, umas d'4el-rei dHespa-nha, outras dos filhos fugitivos, e todas conjurando oque persistisse no que chamavão o seu preito e lealdade. Como se fossem provas de traiçãb remetterão-se estas cartas para Portugal com o prezo : e o viso-rei alem da ignomínia e injustiça com que fora

tractado, teve ainda de chorar o proceder dos filhose prizão conseqüente de esposa, de que tudo teve Ereceyra

conhecimento durante uma miserável viagem. P. 154-7.

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U HISTORIA DO BRAZIL.

0 3 0 .

C A P I T U L O X V I I I

Negócios do Maranhão. — Alguns missionários d e Quilo, fugindo pelo

Jlapo abaixo, entregão-se ao r io , e cliegão a Bc lem. — Sobe Teixeira oAmazonas. — Regressa com elle Acima, que explora o curso do rio. ,

os inglezes Emquanto meio Brazil mudava de senhores, ficarano f a r á .

o Maranhão até agora illeso d'esla guerra. Conlinua-

vão porem differenles aventureiros a procurar firmarpc n'estas parles, e cada vez mais formidáveis sehavião tornado suas tentativas desde a perda d'01in da .Outra vez se esforçarão os Inglezes por formar umestabelecimento na ilha dos Tocujos1; duzentos se fortificarão sobre o Bio de Philippe, e ja se dizia que

um reforço de quinhentos homens se achava a ca-minho para unir-se a elles. Desde logo se alliárãocom estes recemchcgados o s Tapuyas, sempre promp-tos a entrega rem -se a quem lhes offcrcccsse protec-ção, certos de que nenhum jugo haveria mais intolerável do que o dos Portuguezes. Muitas tribus, que se

tinhão submellido a estes insaciáveis tyrannos, quetaes erão elles por este tempo no Maranhão c Pará,

1 Tucujúse não Tocujos. F. 1'.

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HISTORIA DO BRAZIL. 419

ávidas aproveitarão o ensejo da revolta , ne m havia 1630.

ja que duvidar que as que ainda se conserva vãoobedientes principiavão a vacillar. Coelho, o governador general d'este novo Estado, não perdeu tempoem fazer sah ir con tra estes com petidores um a forçaconsiderável commandada por Jacome Baimundo deNoronha, ultimamente nomeado capitão do Pará. Ocommandante inglez era um tal Thomas, soldadovelho, que servira com gloria nos Paizes Baixos;aqui porem teve de suecumbir, tentou fugir de nouten'um a lancha, e foi ag arra do e feito em postas, se- .gundo a habitual barb aridad e com que todas as nações egualm ente se faziâo a guerra no novo mundo.Entregou-se então o forte, que os vencedores arrazá- „

o ' i Berredo.

rãosem deixar pedra sobre ped ra . §t98-6os.A seguinte tentativa dos Inglezes ainda teve logar

entre os Tocujos. Foi n'ella por capitão Boger F r ay ' .Mandou o governador seu próprio filho Feliciano

Coelho contra este aventureiro, que também foi vencido e morto, deslruindo-se egualmente o forteCumaú2, ediíicado pelo Inglez. Não tardou que chegasse de Londres um navio com quinhentos emigrantes para esta infeliz colônia, que elles provavelmente teriâo salvado, se mais cedo cheg assem . Quatro

1 Frycr talvez, ou Frerc, ou qualquer outro nome similhante.Quem o historiador portug uez quiz indicar pelo titulo de cond e deBrcchier, não tive a felicidade de adivinhar.

* Camaú escrevem Baena e Accioli. F. P.

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1030.

Ürrrctl.i

Mortede Coelho

420 HISTORIA DO BRAZIL.

d'estes homens forãoaprizionados ao desembarcareme remetlidos para a cidade de S. Luiz. O que d'elles

se pôde tirar foi que havia a colônia sido fundada ácusta de Thomas, conde de Rrcchier, e que em Flu-shing ficava o navios com forças hollandezas e inglezasa bordo para a conquista do Am azonas. Talvez estagente tivesse lambem ella sido enganada com simi-lhante noticia. Inquietou-se Coelho, e tomou as precauções que pôde contra o esperado ataque . Especialmente tinha elle a peito removera capital do Pará,para logar mais commodo e sobre tudo mais defensável, que não era Belém tão grande, que tornassemui difficil a medida para a qual obteve a finalauctorizaçào de Madrid. Taes estorvos porem lhepozerão por deante homens cgoislas e interessados,que , frustrado o plano, ainda hoje se vè a cidade nomesmo mal escolhido sitio. Mesquinhas disputas entre o povo do Pará co seu capitão Luiz do Bego, euma tentativa de Coelho, para constituir ao filho umacapitania, primeiro no Curtipy, que lhe foi tirada edada a Álvaro de Souza, e depois em C amu la 1 , consum irão o resto da vida d 'cste governado r. Perdidoo arrimo, abandonou o filho o paiz, voltando a Por-

s (i-io-üií!. tugal.

A no curso regular das couzas, não apparecendo cartas1C30. A m o r t e d e C o e l h o d e i x o u v a g o o g o v e r n o . Segundo

' Alias C a me la . F. I ' .

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H ISTOR IA DO BR AZIL. 421

dè successão, devia Antônio Cavalcante de Albuquer- 1636

que, que o fallecido deixara a commandar no Maranhão durante a sua ausência (pois finara-se em Belém) continuar no governo, até ser o logar providona Europa. Um habitante da ilha do Maranhão, malo governador fechou os olhos, partiu de Belém paraS. Luiz n'uma canoa, obrigando os Índios a arrancara voga de maneira que viagem, que costuma levarvinte e cinco dias, fel-a elle em quatorze. Esperavaeste homem favor e protecção de Jacomo Baimundo,pelo que lhe communicou a nova, antes que ninguémd'ella soubesse. Tinha Baimundo muitos amigos, eapezar da opposição de Cavalcante, de tal modo soubefazer valer a sua influencia, que o senado da câmarao elegeu governador. Egualmente inefficaz foi a opposição em Belém. Formou-se uma conspiração paradepol-o e reintegrar Cavalcante no poder de queillegalmente fora privado; foi porem descoberta eBaimundo usou d'uma moderação talvez sem exemplo em casos taes. Plenamente convictos os conspira-dores, não os molestou elle nem na vida, nem nosmembros, nem na fazenda, nem sequer na libertade,contentando-se com separar os que lhe parecia perigoso deixar unidos. Medidas de maior rigor não teriãosido mais efficazes; ganhou o amor do povo com estaclemência, e prendeu pela gratidão os que talvez não ...1 1 j

J § 613-57.

lograra reprimir pelo medo.Não lhe tardou opportunidade de tornar memora- Missão

1637.

Berredo.

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42t! HISTORIA DO BBAZIL.

1037. v e ] n a historia do Maranhão e da America do Sul o

seu governo. Dous annos antes tinha sido enviada deQuilo aos índios do rio Ahuarico um a missão fran-ciscana. Um capitão por nome Juan de Palácios offe-receu-se com alguns soldados poucos para escoltal-a,compartindo os perigos e a gloria da expedição, quechegou á província dos Encabcllados, onde o Ahua

rico faz juncção com oNapo, demorando se alli alguns mezes a tentar sem resultado a obra da conver

são. De cançados retirárão-se alguns missionários,mas o maior numero persistiu na empreza, até quePalácios foi assassinado pelos selvage ns; então fugirãopossuidos de te rro r. Dous irmãos leigos e seis solda

dos perd erão porem o animo ao pensarem na tremenda jornada de regresso ao Pcrú, e, desesperandode vencel-a, entregarao-se ao rio , como ja antes fizeraO rellana. Domingos de Brieba e André de Toledoerão os nomes dos frades; os dos soldados não osguardou a historia. Todos chegarão a Belém sãos e

salvos.

Assim foi segunda vez navegado o Amazonas deQuito até ao m a r, e com tudo pouco ou n ada se ficousabendo do seu curso. Tão desfigurada com as fábulas do descobridor e adulterada com as mentiras doDom inicano que o acom panh ara, havia sido a historia da primeira viagem, que o mais para que serviaera para ind uz ir aventureiros em erro s. Orsuacnlrarano rio-m ar pelo Ucayali e pelo Guallaga, m as o diário

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Acuíiu.Traducç.loingl. C. 13.

Man. Bodri-

até Quito.

HISTORIA DO BBAZIL. 425

que d'esta exlranha expedição se escrevera, somente 1677

se occupava com as atrocidades de Aguirrc, poucasinformações dando a respeito da extensa tira de paizpor elle percorrida . Quanto a estes últimos viajantes,vinhão todos tranzidos de terro r, e ao tornarem a ver- L. |"ec.' 5.se entre christãos, so poderão dar uma vaga relaçãode nações anthropophagas, a que havião escapado.A única couza que resullava clara, era que nadaobstruía a navegação d'este poderoso rio por um Berredo.

9. § 658-63.

curso de mais de tres mil milhas.Fácil é de imaginar com oue espanto não serião Teixeira

•3 1 1 mandado a

vistos estes homens em Belém, e quão cordialmente 0exmazoL^

recebidos. Forão remettidos para S. Luiz, onde ogovernador os interrogasse em pessoa. Conscio dausurpada auetoridade, anhelava Baimundo cobrircom o brilho d'algum serviço relevante o feio docrime, e nada para isso lhe pareceu mais próprio doque explorar a navegação interna entre o Brazil e o

Peru, e tal alliança cimentar com os naluraes, quejamais se atrevessem os Hollandezes a attentar poiesta via contra o Potosi. Serviço era este que a corteespecialmente recomm endara a Maciel, quando capitão do Pará, e depois a Coelho, nenhum dos quaesachara lazer para tão difficil empreza. Também sediz que por este tempo revolvia o governo hespanholum projecto de trazer os thesouros do Peru, Quito,Popayan e.até do Novo Reino pelo rio giganle a Belém,d'onde acharião para a Europa mais curto e seguro

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424 HISTORIA DO RRAZIL.1637. caminho. De tão feliz e inesperada opportunidade de

Gomberville. . l

m destma- l e v a r a v a n l e este importantíssimo objectojançou Rai-i)isse°rtep.52. m u n do ávida mão.

Declararão se os viajantes promptos a volver bemacompanhados ao Quito pelo mesmo caminho quehavião trazido, e consequentemente preparou-se uma

expedição, de que Teixeira havia de ser o chefe. Receando sempre uma invasão dos Hollandezes, n~o

queria o povo do Pará separar-se d'uma porção tãoconsiderável da sua força, qual a que tinha sidofixada para este-serviço, e sobreesteve-se na partida,emquanto contra ella se mandava uma representação

a S. Luiz; mas peremptória foi a resposta de Baim und o, e a 28 d'oulubro de 1637 partiu Teixeira deBelém' com setenta soldados e mil e duzentos fre-cheiros e remadores indígenas, prcfazendo com mulheres e escravos um total de dous mil pessoas, quese embarcarão.em qu arenta e cinco canoas.

chegada ^a

's a 0 í

Iu e e r a 0 c a

Paz e

s de prestar havião tomadoao Quito. s o b r e s i o s gUia s . a c o r r e n t e o s trouxera-para baixo,

e emquanto ella os arrastava, estavão seguros de seacharem na verdadeira estrada; mas encontrar passagem pelos intrincados canaes d'este prodigioso rioacima, era obra de muita paciência e gran de difíicul

dade. Muitos dos índios desertarão, e lodo o esforço,

1 Não foi de Belém e sim "de Cametá que partiu a expedição dePedro Teixeira. F. P.

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HISTORIA DO BBAZ IL. 4 25

toda a influencia, toda a arte de Teixeira foi preciza 1037

para impedir que o resto os seguisse. O estratagemaque melhor effeito surtia, era asseverar-lhes queestavão a chegar ao termo da viagem, e mandouBento Rodrigues de Oliveira com oito canoas adeante,como para preparar quartéis. Era este Brazileiro denascimento, costumado a similhanle modo de viajar,

e senhor da lingua tupi, que fallava como a materna; criara-se entre os naturaes, e, homem degrande penetração, entendia-lhes a natureza e osolhares como a linguagem, de sorte que muito orespeitavão os índios, crendo d'elle que lhes sabia lerno pensamento. Foi elle reconhecendo o caminho e

deixando signaes e instrucçõês em todos os pontos eestâncias do rio, o que aos outros servia de não pequena excitação para que proseguissem a ver dia pordia as novas que n'estas estações encontravão; eTeixeira sempre a levantar-lhes os espíritos abatidoscom protestações de que mais um bocado de perseve

rança chegaria- ao termo da viagem. Assim forãoavançando até que a 3 de julho do anno seguinte chegarão ao logar onde Palácios tinha sido morto, eaqui, tendo por necessário assegurar-se a retirada,postou o commandante a maior parte do seu pequenoexercito sobre as margens de formoso rio, onde cahiana grande corrente, e o commando deu-o a Pedroda Costa Favella e Pedro Bayão de Abreu. Com o t ^ a g .resto seguiu para Payamino, primeiro estabeleci-

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426 HISTORIA DO BRAZIL.

1058. 'jnenlo dos Castelhanos n'esta direcção 1 , e que fica

na província de Quixos,'a cerca de oitenta legoas deQuito. Aqui deixara Bento Bodrigues suas canoas erecado que partia por terra para Quito. Seguiu-oTeixeira por paiz montanhoso e agreste até alcançarBaeza, loga r então cham ado cidade, m as hoje umdese rto. Ja então se sabia da sua vinda, e ordens erãodados para suppril-o de todo o necessário a elle e ásua gente. Ao approximar-se de Quito, o clero, acâmara , eos moradores lhe sahirão ao encontro emprocissão; corridas de touros se derão em memória

Acuiia.c i m a . i • ,ci5-i7. da sua viagem, e em quanto com as honras que m e-W. Itoilr. . . . . .

L 2, c. 6. recia o festeiavão, rcmettião ao viso-rei do Pcrú oBerredo . » '

§ 679 8-. u j a r j 0 e niappa do rio por elle preparados.Manda o Ao conde de Chinchon, enlão viso-rei, de tão g ran de

viso-rei do

Peru levantar conseqüência pareceu esta expedição no estado emno- que se achavão os negócios, que deu ordem a Teixeira

para voltar pelo mesmo caminho, a verificar e aperfeiçoar a sua planta, levando comsigo duas pessoas,que , seguindo para Madrid, apresentassem a el-reias informações co lhidas. Algum a difficuldade houveem achar estas pessoas. Juan Vasquez de Acuíía, cor-

1 No logar onde o rio Payamino entra no Amazonas. Ha pertod'este logar um porto, chamado do nome do rio, e onde os Hespanhoes

se havião fortificado, erguendo uma villa para manter sujeitos osQuixos (Acuiia, Trad. Ingl., c. !.">). .Win rio, nem lo^ar d'este nomese encontrão no mappa grande de D. Juan de Ia Cruz. Do ponto diffe-rente escolhido por Teixeira para o reemharque se ve porem que deveo Pavamino te r sido um dos affluentes do Coca.

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HISTO RIA DO B RAZ IL . 427

regedor de Quito, offereceu sua pessoa e fazenda para 1C38-este serviço, requerendo que se lhe permittisse fornecer á sua custa tudo o necessário; não se acceitoua offerta, quiçá por ser indispensável alli a sua presença; outros aventureiros qualificados para o cargonão apparecião, até que recorrendo-se ao provincialdos Jesuítas, nomeou este Fr. Christoval de Acuna,irmão do corregedor, e então reitor do collegio deCuenca, e Fr. André de Arlieda, professor de theolo-gia nas escholas de Quitol. Levarão ordem de levantar a planta do rio, notando quanto houvesse quenolar.Acompanhárão-nos quatro religiosos da ordemde Nossa Senhora das Mercês, um dos quaes, pornome Fr. Pedro de Ia Rua Cirne, fundou mais tardeconventos da sua regra em Belém e S . Luiz.

Ao emprehender-se esta descida pelo maior rio do Nascentes <k. . . . . . , Amazonas.

mundo, muitas e diversas erão as opiniões sobre aorigem d'este. Em Lima se lhe dava por nascente o

lago de Lauricocha, entre as montanhas visinhas deHuanuco de los Cavalleros, que fica a cerca de setentalegoas da capital do Peru. Na província de Popayanreclamava-se a mesma honra para o Caqueta ou Ju-purá, posto que sem razoável fundamento, sendoeste rio, apoz um curso de setecentas legoas, tragado

por outro muito maior do que elle Outros derivavãoo Amazonas do Guamaná e do Pulca, que nascem

1 Ja uma vez dissemos que os Jesuítas não eram frades e simclérigos regulares. F . P.

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428 HISTORIA DO BBAZIL.1638. a c e r c a Q e 0-llQ j e g 0 a s u e Q u j t 0 e s.-,0 a s fontes do

Coca. Com uma parcialidade fácil de explicar-se preferiu Acuna esta opinião. Fritz, o missionário, pelocontrario mantém a pr imei ra , e Berredo o segue.Teem elles razão quando affirmão qu e é o Ucayali acorrente principal, e não o Novo Maranhão, ou Lau-ricocha, como com mais propriedade tem sido chamado; mas é da mais remota nascente que devemostraçar este potente rio, e essa é um lago perto deArequipa, d'onde rebenta o Apurimac.

i6 deie». Tão difficil ach ara Teixeira o cam inho de Pava-1639. . _ J

Beembarca m ino , que na volta preferiu em bar car perto d'u mTeixeira. r l

estabelecimento cham ado A rchidona, sobre um adas correntes que formâo o Napo, e onde aindahoje os missionários das bandas de Quito costumão

Condamine. f„_„l _ • r i ~ •

p. i7. iazei-o para ir as poucas reducçoes que teem sobreeste rio. Não pequena alegria causou a sua chegada

a Ped ro da Costa e ao destacam ento que com elleestava. Por muito tempo não se havião conservadoem termos amigáveis os Encabellados : temião os selvagens, que n'elles se vingasse a morte de Palácios,e os Portuguezes não ião longe de aproveitar a occasião para a desforra. Rebentara a guerra, muitos dos

naturaes havião sido mortos, e mais de setecentosfeitos prizioneiros. O nome vernáculo d'esta naçãoninguém o refere; os Hespanhoes lhe pozerão nomedo costume singular de deixar crescer os cabellos até

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1639.

Berredo.

HIST OR IA DO B R AZ IL . 4 29

joelho, moda commum a ambos os sexos. Vivião emcontinua guerra com cinco tribus limitrophes damesma banda do rio 1. Por arma tinhão o dardo, eerão anthropophagos; cobrião de folhas de palmeirasuas casas, arte em que revelavão bastante engenho.

Aqui se deteve Teixeira alguns mezes, tirando vingança d'esta gente2, e construindo novas canoas,por lerem sido destruídas com a guerra a maior partedas que alli deixara. E aqui, segundo os Portuguezes5,tomou elle posse das suas descobertas para a coroa §To££

r x Aijufía. 5 0 .

de Portugal em nome de Philippe IV, tomando mãos M ,od1'

uez

' Os Senos, Becabas, Ta m as, Chufias e Ram os .4 Pagarão, diz Acuiia, as vidas dos nossos índios, que tinhão morte

com mais do triplo das d'elles; módico castigo, comparado com osmorosos que ein taes casos soem impor os Portu gue zes! M. Rodri-guez, p . 1 2 5 .

3 Negão os Hespanhoes que fosse este o logar ; e Fritz, no interessed'elles, sustenta que foi perto do Chuchivara, umas cem legoas maisabaixo. Condamine com mais probabilidade o fixa á foz do Yu pu ra;mas o auto original, a que se refere, como tendo-o visto em Belém,

não é datado do G uayaris, ne m faz menção da chapada elevada q ueelle adduz como um dos signae s pelos q uae s se pôde determinar asituação (P. 94-98). Impossivel é averiguar a verdade, nem, que sepodesse, fora de importância. N'aquella epocha nenhuma significaçãopodia ter um limite entre conquistas portuguezas e hespanholas n'a-

quellas partes; e do próprio auto (que Berredo imprimiu) se ve, quenenhuma intenção sirnilhante tinha Teixeira, escolhendo somenteeste logar, seguindo suas instrucçõês, como o melhor que encontrara

para assentar um estabelecimento. Condamine com pouco desculpavelnegligencia raciocina d'uma interpretação forçada de Acuiia contra asua linguagem explicita, quando este auctor diz expressamente queo Ahuaricu se chamava rio do Ouro, e é da foz d'este que está datadoo auto.

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150 HISTORIA DO- B B A Z I L .1659 cheias de terra, e atirando-as ao ar, emquanto pro

clamava que se alguém soubesse de causa justa ouimpedimento, que a este posse se oppozcsse, appare-cesse e o declarasse ao escrivão. Não se apresentandocontradictor algum, apanhou o escrivão terra, quepoz nas mãos de Teixeira, fazendo assim entrega eapprehensáo para a coroa de Portugal.

os omaguas. O paiz fronteiro, entre o Napo e o Curara y, queconfluem quarenta legoas abaixo da terra dos Enca-bellados, possuião-no quatro tribus, das quaes aforao nome * nada mais se refere. Oitenta legoas abaixoda sua juncção cabem estes rios no Ucayali, entãochamado Ttinguragua, e sessenta legoas m ais adeantecolloca Acuiia a tribu dos Omaguas. D'este povo alguma couza ouvira Orellana, pois que falia d'umcacique chamado Aomagua, e fácil era o equivocoentre o nome do chefe e o da tribu. Provavelmentenão estavão estes índ ios ainda então assentados sobrea margem do rio. Não se diz que elles os visse, que ,se o fizesse, mal lhe podia haver escapado a singulardeformidade artificial com que das outras nações sedist inguião. Conseguião-na, apertando a testa e otoutiço ás crianças entre duas taboas, com que lor-

navão perfeitamente chatas as cabeças, operação cujofim era procurar a maior similhança possível com a

condamine. lua ch eia , para e lles o ideal da belleza d 'u m rosto

1 Os Ahigiras, Jurussunez, Zapatás, e Vguitas.

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H IS T O R IA DO R R A Z IL . 451

humano. O craneo por conseguinte desenvolve-se I6'í)

para os lados, similbando mais uma malfeita mitrado que cabeça humana. Actualmenteteem cahido emdesuso estas taboas de compressão, contentando-seaquelles selvagens com moldar "a cabeça á força deexpremel-a entre as mãos1 . D'esta practica se cha- Rihe>r°-5'5-mão elles a si próprios Umanas, que quer dizer cabeças chatas, palavra que os Hespanhoes escreverãoOmaguas, e pela mesma razão os Portuguezes oschamarão Cambebas na lingua tupi. Ainda mais singular se tornava esta moda por trazerem as mulheres Acufia

tanto cabello, que lhes occultava a deformidade. Comrazão se poderia suppôr que praclica tão desnaturalos tornaria estúpidos; tão longe porem estavão de tercom esta distorção soffrido desarranjo algum inlel-lectual, que tanto as relações mais antigas como asmais modernas concordão em represental-os a tribumais civilizada, racional e dócil de toda a margemdo rio. Não muitos annos depois da viagem do Orel-lana, alguns d'estes índios, que transplantados para

1 Os May.pcV.Htça).a dos antigos passão por terem propagado esteachatamento artificial. (Hipp ocrates, citado p or sir T. Brow ne, nosErros vulgares, B. 6, c. 10.) É isto porem errôneo segundo todasas probabilidades, pois que de certo não o propagão os Om aguas. Hippocrates parece ter fallado theoricamente, que era por demais remotoofacto, para lhe ter chegado ao conhecimento. Berredo (§ 719) men

ciona a opinião de que os Omaguas adoptárão esta moda, como irrecusável distinctivo das outras nações, para que jamais fossem escravizadossobre pretexto de serem anthropophagos. Mas o costume ja entreelles prevalecia antes que nenhum caçador d'escravos tivesse alcançado esta parte do sertão.

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432 HISTORIA DO RRAZIL.

1639. a província de Quixos debaixo do dom ínio hespanhol ,

fugirão nesta direcção por acharem intolerável ojugo, havião achado aqui o grosso da sua nação, ecommunicado-lhe as artes aprendidas de seus antigossenhores. Cultivão e preparão o algodr.o, de que tecem panno de tão variegadas cores, que outras tribuscobiçando-o pela sua bellcza, se cntregão a activo

trafico com elles pa ra ob tel-o . Andão ambos ossexos decentemente vestidos; rude mas não inconvenientemente feitas são suas vestes um sacco comaberturas para os braços. Armas lhes são a seita e opau de arremesso. Matão o mais valente dos seusprizioneiros, não para devoral-o, mas para se livra

rem d'um inimigo perigoso; os cadáveres atirão-nosaos rios guardando por trophcos as cabeças. Aos outros, que poupã o , tomão extraordinário affecto, e sealguém lhes propõe vender um captivo, offende-os aproposta como couza monstruosa que não podem ou-

M. liodriffuez. • i . i • 1 r>, ~ . . . .

r.125. vir : de tudo o mais se deslarao, mas nada pode ín-duzil-osa vender uma c r ea tu r ah u man a . Embriagão-secom duas hervas, uma chamada floripondio pelosHespanhoes, outro curupá na própria lingua d'elles;vinte e quatro horas du ra a em briagu ez, e visto dizer-se que produz extranhas visões, deve assimilhar-

se á do ópio. Da curupá fazem uma espécie de rape,que lomão por meio d'um jun co bifurcado, inserind oos dous braços nas duas ventas, e sorvendo depois o

Condamine. . . . ,

r. 7o. p o com ridículas visagens.

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i m i n e .7 7 .

H I S T O R I A D O B R A Z I L . 4 5 5

F o i d o s O m a g u a s q u e n o s v e i o o c a o u t c h o u c , o u 1659

gomma elástica. Forão os Portuguezes do Pará osprimeiros que lhe aprenderão a serventia; d'ella

fazião sapatos, botas e até vestidos, tornando-a a suaimpenetrabilidade da maior utilidade n'um paiz,onde tão a miúdo se viaja por pantanaes. Servião aosOmaguas de syringas garrafas d'esta gomma, usoque so n'estes últimos annos foi conhecido na Inglaterra. E é costume entre elles apresentar uma a cada condhospede no principio d'um festim '. R i b e i r o , M » .

Q u a n d o T e i x e i r a f e z a s u a v i a g e m p o s s u i ã o o s O m a

g u a s a s i l h a s d o r i o p o r m a i s d e d u z e n t a s l e g o a s d e

e x t e n s ã o , s e n d o t a n t a s a s s u a s a l d e i a s q u e m a l s ep e r d i a u m a d e v i s t a e i s q u e j a a p p a r e c i a o u t r a . M e

d e m a l g u n a s d ' e s t a s i l h a s u m a á r e a c o n s i d e r á v e l , ee r a n ' a q u e l l e t e m p o n u m e r o s í s s i m a a n a ç ã o , p o s t o

q u e e m n e n h u m a d a s m a r g e n s p o s s u i s s e t e r r a s . A n

d a v a e l l a e m g u e r r a c o m o s U r i n a s a o su l e c o m o s

T u c u n a s a o n o r t e , t r i b u s q u e a i n d a s ã o s u a s i n i m i - O i T u c u u a sg a s . A c r e d i t a a u l t i m a n a m e t e m p s y c h o s e , p r a c t i c a

a c i r c u m c i s ã o e e x c i s ã o , e a d o r a u m i d o ! o c a s e i r o

c h a m a d o I t a - h o ; m a i s p e r t i n a z m e n t e d o q u e o u t r o s

n e n h u n s s e l v a g e n s a m e r i c a n o s se m o s l r ã o a f e r r a d o s

1 Servem-lhes talvez estas garrafas para ostentar dextreza no beber,esguichando o licor para dentro da boca, como os Tupinambás atirãoa farinha de man dioca. Também os Hespanhoes das classes baixas usãomuito erguer a borracha, ou garrafa de couro acima da cabeça, edeixar sahir d'ella um jorro ao bebercm.

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434 HISTORIA DO BRAZIL.

'639. aos seus erros supersticiosos. Aldearão os Por tuguezes alguns d'estcs índios, porem jamais foi possívelfazel-os renunciar á crença na divinidade d'estashediondas figuras. Quasi todas as tribus que povoãoeste rio, usf.o d'um signal dislinctivo: o dos Tucunasé uma linha preta estreita traçada das orelhas ao nariz. Os homens cingem os rins com um tecido dacasca d'uma arvore, que chamão Aichama; as mulheres andão nuas. São insignes na arte de empalharaves, que malão com o sarbacan ou canna de soprar;mui tos d'estcsbellissimos pássaros, cxlorquidosd'ellescomo tributo, são remettidos para a Europa. Os Urinas, de quem faz menção Acuna, são chamados

Ribeiro. M s. ' 1 ,

immas Mayurunas pelos Portuguezes, e habitão sobre o noYanari ou Javari. Trazem calva a coroa da cabeça,o resto coberto de cabello, e as faces c nariz comm uitos bura cos , por onde passão esp inh os ; lambemusão de pennas de arara nos cantos da boca, e fios

de conchas pendentes das orelhas, ventas e lábio in ferior. Tão bárbaros como a presença são os seus costumes ; devorão os inim igos e os seus próprios.doentes e inválidos compartem a mesma sorte, sem que,segundo se diz, o filho poupe o pae, nem o pae o

Kibjiro. Ms. filho.

Tres dias se detiverão os aventureiros n'uma ilha,que ficava no meio do paiz dos Omaguas, e aqui,apezar de acharem -se a 5" de lat. su l , acharão otempo Ião frio, que tiverão de vestir mais roupa,

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HIST OR IA DO RRAZ IL . 4 35

sendo esta, segundo lhes disserão, a temperatura or- 1059

dinaria nos mezes de junho a agosto, em que o ventodominante passa por sobre a serra do sul coberta deneve. O importante rio Pulumayo cahe no Amazonasdo lado do norte dezaseis legoas abaixo d'esta estação. Tendo as cabeceiras en tre as m on tan ha s, queficão perto da cidade do Pasto, vem durante todo oseu extenso curso recebendo as águas de não menosde trinta rios consideráveis, entre os quaes se contaum braço do Jupurá, que assim liga as duas grandescorrentes do Popay an. Annos antes da viagem deTeixeira tinhão alguns Hespanhoes tentado descel-o,partindo d;aquella província, engodados por historiasde ouro achado n'elle : mas acharão as ribeiras habitadas de numerosas e guerreiras tr ibus' , que comalguma perda os obrigarão a retroceder. Nas riquezas do rio ainda se con tinua a fallar, mas a ferocidaded'estas nações intim ido u de tal forma os aventureiros

que nenhum tentou mais ja não a conquista, masnem mesmo a descoberta. Cincoenla legoas maisabaixo e do lado do sul fica a foz do Yetan ou Yutan,que vindo das b and as de Cuzco, segun do as informa ções que poderão obter os missiqnarios, atravessa a

1 Erão os Yurunas (de quem ja se fallou), os Guataycus, os Yaca-liguaras, os Parianas, os Zigús, os Aucais, os Cimas, e outros maispara cima, cujos nomes Acuha não ouviu, chegando so a saber queerão muitas hordas d'um povo, que os Omaguas insulanos chamavãoOmaguas-yete, isto éos verdadeiros, os originaes Omaguas.

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1039.

4 3 6 H I S T O R I A DO R R A Z I L .

parte menos conhecida da America do Sul, emborapasse por ser de fácil navegação, correndo mansamente e com bastante fundo '. Situada a quatorzelegoas abaixo do Yelan, era grande e forte a ultimaaldeia dos Omaguas, como logar fronteiro. Erão estesselvagens os senhores do rio, e tal a sua superioridade, que por uma extensão de cincoenla legoasnenhum estabelecimento d'outra nação se assentava ávista das duas m arg en s. Os Curis e Guayrabas ao nortec os Cachiguaras e Tucuris ao sul tinhào no interiorsuas aldeias, descendo pelos braços menores ou ca-naes marginaes do rio, quando sobre este tinhão deaventurar-se. Nenhum d'estes aldeamentos se avistouem quanto Teixeira não chegou ao Yurua2 , a vinte e

1 Os nomes dos I abitantes são, como os re'ere Acuiia, Tepunas,Guanurus, Ozuanas, Mornas, Naunas, Conomonus, Marianas, emais perto do Peru, uma nação i'Omaguas que nas orelhas e nariztrazião ornalos de ouro. Suppôe Acuiia a infeliz expedição de Orsuaemprehendida em busca.do paiz d'estes últimos índios, que nãoachou, por ter tomado o braço oriental em legar do occidental, en

trando assim pelo Yurua no Amazonas. Também Ribeiro o faz descero Yurua. Xisto porem certamente se illudem. Nenhuma duvida podehaver sobre ter Orsua vindo pelos Guallaga e Ucayali abaixo, como seve da obra de Pedro Simoii, que segundo todas as probabilidades tinhaá vista o diário a que allude Acosta.

iVeste logar da narrativa de Acuiia interpola Fr. Manoel Rodri^uezuma opinião sua de serem as trib us de Yetan descendentes d'esses

Pertivianos fugidos com o ultimo Inca, e dignas de que os missionários

saião a buscal-as.- Acuiia bem quizera que a este rio se pozesse o nome de rio deiCuzco, por ter visto uma carta ou roteiro de Orellana, que o faziacorrer ao norte e ao sul d'aquella cidade.

Sobre o Yurua teve Ribeiro noticia do duas tribus extraordinárias

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H I S T O R I A DO R R A Z I L . 457

quatro legoas da ilha fronteira dos Omaguas, e trinta 10"°e oito do Yetan. Segundo o que Acuna ouviu aos In -

M.Rodriçuoz.dios, vinhão estes dous rios d'uma so nascente, for- °m.1 1 1 . , . Berredo.

mando um delta com o Am azonas, em que se pe rd ião . §72--3

Vinte legoas mais abaixo principiava o território o-Ciirieirari>,

dos Curiciraris na ribeira do sul en'um paiz montanhoso : extendia-se por oitenta legoas. Era umatribu populosa esta, cujas aldeias quando muitonunca distavão m ais de qu atro ho ras de viagem en tresi, succedendo ás vezes marchar-se meio dia a sahird'uma e entrar em outra contiguamente. Poucos

moradores se deixavão ver; quasi todos linhão fugidopara as serras por haver-se espalhado o falso boatode que vinhão os Portuguezes m atand o e escravizando por onde passavão. Era a raça mais tímida detodo o rio , mas também a mais adeanlada em artes,embora andasse inteiramente nua. Tinhão bem providas as casas e erão excellentes oleiros estes índios,excedendo n'isto os próprios Tupinambás, pois queem cuja existência ainda em 1774 se acreditava... erão os Carcanas,raça de anões, cuja estatura não passava de cinco palmos, e os Ugi-nas, que tinhão caudas de tres ou quatro palmos de comprimento, ap-pendice que explica a sua origem, pois também os chamão Coalata-puya, filhos de macacos. Ribeiro (homem de letras e pouco crédulo)

nenhuma opinião emitte sobre os Pigmeos, mas-a respeito dos filhosde macacos tinha visto um depoimento jurado em 1768 pelo Carmelita Fr. José de S. Thereza R ib ei ro , vigário de Castro d1Avelãs, queelle conheceu. N'este depoimento declarava o bom do Carmelita havervisto um índio d'esta nação despir-se para metter-se na água,tinha um rabinho macio da g rossura do dedo pollega r, e de meio

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4 3 8 H I S T O R I A 1) 0 R R A Z IL .

1030 não so fazião puc aros, pralos e outros utensílios pa rausos similhantes, mas até fornos e frigideiras, e detodas eslas couzas tinhão sorlimenlo para o traficocom outras tribus. Quando Teixeira subia o rio procurou na primeira aldeia d'esle povo uns ornalos deou ro, que se trazião n as orelhas en ar iz ; não tardarãoos selvagens a perceber com quanta soffreguidão erãobuscados estes dixes, e como nunca mais appareces-sem com elles, suppoz que os teriào prudentementeescond ido. Ensa iado o ouro em Qu ito, achou-se serde vinte e um quilates. Não pôde então Teixeira porfalta de interpretes saber d'onde viera este melai;provido porem d'elles na volta, aprendeu esla historia : Um pouco mais acima, do lado do norte, ficavaa foz do Yurupau; tomava-se por este rio, c depoispela terra de ntro , jornad a de tres dias, até ao Jup urá ,e deste passava-se ao rio do Ouro, chamado Yquiari,e alli nas fraldas d'uma serra, se achava o ouro emgrãos, que balidos lomavão a forma que se lhesqueria dar. Os que os apanhavão chamavão-se yuma-guaris, apanhadores de melai, que a palavra yuma

seapplicava indiscriminadamente ao ouro e ao ferrodos exlrangeiros. A nação que fornecia este ouro eraa dos Amanagus. Foi consignada em mappas estainformação, para ser causa de muita mallogradaexpedição emprehendida pelos Portugu ezes.

Quatorze legoas mais abaixo chegou Teixeira á foz

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HIS TO RIA DO RRAZ IL . 4 39

de Grão Caqueta, mas que os Portuguezes chamão 165°-

Jupurá ou Yupurá, como Acuiia o, ouviu denominarno próprio logar. Vem-lhe este nome da tribu yupurá, que a seu turno o toma d'uma fructa de quefaz um pastel prelo e mal cheiroso que lhe serve dealimento. E este o rio que no Popayan passa por sera fonte principal do Amazonas; afora o rio Negro éo maior confluente, e a não lhe quebrarem num erosas ilhas o immenso volume das águas, seria absolutamente innavegavel. O seu curso, como os do rioNegro e Amazonas, vem de leste para o oeste, tomando para o sul na latitude de 5o e alguns m inutos,antes de perder-se n'este ultimo. A um mez de viagemac/hia da foz ha corredeiras e cachoeiras. Entre aembocadura e estas cataraclas, recebe em si diffe-rentes rios consideráveis; pelo sul, ou margem esquerda, o Acunani, Manarapi, Yuamiani, Auame-merim e o Purui densamente povoado; e os Cunacua

e Arapi, dos quaes por um curto sangradouro se passapara o Iça. Acima das cachoeiras, até onde os Portuguezes o teem navegado, encontrão-se do mesmo ladoo Caninari e o Meta, que pelo Perida communica como Iça. Pela margem direita recebe o riacho Maraá1,o lago Cumapi, outro riacho chamado Menáa, que

por um sangradouro entre as cabeceiras communicacom o Urubaxi, e por meio d'este com o Negro, o

1 Erroneamente chamado um lago por Condamine, que torna aerrar quando diz que elle communica com o Urubaxi. Ribeiro, Ms.

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mm

410 HISTORIA DO RRAZIL.

Uacapu-paraná1

, oYacarapi e o Apuaperi, que ébeinpovoado, e por meio do Uaopes tem communicaçàocom o Negro. Acima das cachoeiras ficão o Muruti-paraná, o Uania, I ra-paraná, e o Yari, alem do q u a l í

nenhum explorador passou.

Diz Condamine que o Jupurá deságua no Amazo

nas por oito bocas, e assim se traçou no map p a ; m asRibeiro, que em 1775 visitou officialmente os estabelecimentos portuguezes n'aquellas partes, verificou não ter elle mais do que uma. Os Ires canaesmais acima são outros tantos braços, que correm doAmazonas para o Jupurá, chamados o Auate-paraná,

ou rio do Milho, o Manhama, que communica comelle, e o Uaranapú. Estes canaes, que misturando-secom ellas lurvão as águas puras do Jupurá, facililãograndemente a navegação; não ha aqui nem perigonem difíiculdade; em perfeita segurança vão as canoas deslizando-se ao som da co rren te, ou vencem-na

ao menor impulso do remo. Em mil voltas vão eslaságuas serpejando por entre bosques cheios de aves,e veigas cobertas d'inn um erav eis ovos dê tar taruga.As quatro correntes mais abaixo 3 vêem dos lagosAmana eCudayas.

1 Mostrão estes paraníts que anda por aqui a raça tupi, salvo seorão esles nomes, o que não é tão provável, impostos pelos índios

dos Portuguezes, ou pelos próprios 1'ortuguezes na lingua tupi.- Teem sido os caçadores de escravos, que tão longe hão explorado

este rio.5 Duas d'ellas chama-as Acuiia braços do rio Araganatuba. São ha-

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Acitt ii oura.

H I ST O R I A DO B R A Z I L . 4 4 1

'QuaJ.ro legoas abaixo do Jupurá entra do lado sul 1039-o Tefé1, que os Paguanas senhoreião mais acima,num paiz accidentado, em que abundão os pastos.Vinte legoas ainda mais abaixo fica o Acaricoara2,que forma uma bahia de gr an de extensão, antes demisturar com a turva corrente suas águas l ímpidas.Principiava o território do Jur imanas s duas legoasabaixo da fronteira dos Curicir aris , tribu esta ultim aque possuía a porção mais escolhida do rio lodo,aquella porem era a nação mais guerreira que lhehabitava as margens. Ficava do lado do sul, assenho-reando as ilha s por m ais de sessenta legoa s, e eraexcessivamente numerosa; raça mais alentada doque os outros selvagens, bem feita e de stem ida . Cincodias se detiverão os Portuguezes n'uma de suas cidades, como com razão podião chamar-se, exten-dendo-se por uma legoa as casas, em cada uma dasquaes vivião quatro e cinco famílias, ás vezes mais.

bitados, diz elle, por vinte e uma nações; as dosYaguanais, Mucunes,Mapianas, Aguainaus, Huirunas, Mariruas, Yamoruas, Terranus, Si-guiyas, Guanapuris, Piras, Mopitynus, Yguaranis, Aturiaris, Macaguas,Musipias, Guayacaris, Anduras, Caguarans, Mariamumas e Guanibis.Segundo as noticias colhidas no Novo Reino, acerescenta elle, fica oLago Dourado no paiz que possuião estas tri bu s. M. Rodriguez, p . 129.

1 O Tapi de Acuiia.2 O Catua de Acuiia; ambos estão consignados no mappa, mas a

relação de Acuiia confirma a auetoridade dos escriptores portuguezesque os identificão, por quanto falia expressamente d'este lago ou bahia, que elle forma na embocadura.

3 Yorimau escreve Manoel Rodriguez. Acuiia provavelmente es

creveu Yorimau.

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442 HISTORIA DO BRAZIL.

ií>30. ^qUj a ] c a r i ç O U Teixeira cerca de oitocentos alqueires

de farinha de mandioca, que, com os que traziaainda, podir.o chegar para o resto da viagem. Ogrosso d 'esla tribu habitava trin ta legoas m ais abaixo,n'uma ilha grande formada por um braço do rio,que partia a encontrar um dos aflluentes; aqui esobre esía ultima corrente erão bastissimos os seus

estabelecimentos, e todas as outras tribus os temiãoe respeitavão. Num erosos e valentes po rem como erão,desapparecérão ja inteiramente, sendo o resto danação levado em 1709 por algu ns Jesuítas hespanhoes

iubeiro. Ms. para uma reducção.

o rio Perus. O primeiro rio considerável em seguida c o Yana-pu ary , agora cham ado Pe rus ' pelos Po rtugueze s,tendo, como m uitos ou tros, tomado o nom e da tribumais poderosa das suas margens. Cabe no Amazonasdo lado do sul por quatro canaes, e apezar de pedregoso, é navegável o seu leito. Aqui se ouviu fallarn 'uma tribu chamada dos Curigueres, que mora vãoa dous mezes de viagem por esle rio acima, e que,lendo dezaseis palmos de altura, erão tão bravos noanimo como gigantescos no corpo. Alguns índios ap-parecérão, que pretendendo tel-os visto ja, offerece-

1

O Cuchiguara de Acuiia, indubitavelmente a "mesma palavra queCochinvara, que ainda hoje designa um dos seus canaes. làa este onome d'um a das suas tr ib us ; as outras erão as dos Cumavaris, üuaquia-ris, Cuyaciyayanes, Curucuruz, Qualansis, Mnluanis e Curigueres, quesão os lilhos de Anak, de quem falia o lexto.

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HISTORIA DO RRAZIL. 4 4 5

rf o-se a servir de guias aos Portuguezes para aquelle 1(j3°-

paiz, dizendo, como que para tentai-os, que traziãoesles gigantes nus nas orelhas e nariz pcnduricalhosde ouro de tamanho, devemos presumil-o, convinha-vel a taes orelhas e taes narizes. Tornão-se notáveisos Pe rus, q ue derâo nom e ao rio, pelos seus obslina- 0sPerus

dos jejuns expiatórios, durante os quaes nenhumestado de doença ou fraqueza vale como excusa paraquebral-os, m orre nd o effeclivãmente m uitos de absti-nencias. Os que teem sido aldeados pelos Po rtugu ezesé precizo á força obrigal-cs a comer por cslas occa-siões, que não poderão ainda os missionários tirar-

lhes o costume. De todos os affluenles do Am azonasé esleo que mais cacao produz, salsaparrilha e óleode copaiba, mas ja não é p op uloso , que lhe teemrareado as tribus as continuas incursões dos Muras,selvagens que são o flagello d'este rio, e provavelmente os mesmos que os Aymorés, dos quaes tanto

em outros tempos havião soffrido as cap itanias do suldo Brazil.Abaixo da foz d'este rio era a margem austral ha- o» caripunas

bitada pelos Caripunas e Zurinas, tribus que prima-vào na arte de entalhar. Erão suas cadeiras ordinárias cortadas da forma de qualquer animal, não

admirando os Portuguezes menos o engenh o e a bel-lezacom que erão talhados, do que o commodo doassento que offerecião. Tão naturalmente feitos sãoseus Ídolos, diz Acuiia, que muilos lerião ainda que

e Znrini:s.

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4 4 i HISTORIA DO BRAZIL.

1639 aprender os nossos esculplores, se quizessem imital-os; verdade é que so fallava elle d'esses esculptores,cujo officio era fazer sanctos e crucifixos, mas istomesmo implica um grau de habilidade, raras vezesencontrado entre selvagens. Servia-lhes de arma opau de arrem esso, com tanto prim or fabricado, qu ede todas as tribus era mui anciosamcnte procurado.

d rio Neia-o. Sessenta legoas abaixo do Perus, deságua do norteo rio Negro. Adeante, quando tractarmos dos estabelecimentos portuguezes n'aquellas partes, descreveremos o curso d'eslerio, o ma ior affluenle do Am azonas, e a immensa região que elle abre. Acunacalcula-lhe legoa emeia de largura na sua foz, erroextraordinár io , pois que não mede ella mais do queuma m ilha , embo ra em outras parles se espraie acorrente pela prodigiosa largura desele e oito legoas.É Guiari o nome indigena d'esle rio, e mais acimaUeneya. Chamão-no Negro1 os Portuguezes, da corde suas águas, que pela sua profundidade e clarezaparecem pretas ao misturarem-se com as do turbidoAm azonas. Trem endo é o conflicto d'estas duas poderosas torrentes. Arremessa-se o Negro através da corrente do outro, e por muitas legoas se lhe distinguemainda as límpidas águas.

Por este rio acima e por oulro que n'ellc vem mor-1 C.nrana, como segundo Acuha o chamavão alguns in d ia n as , si

gnifica o mesmo. Outro nome, por que, diz elle, o conhecido eraGuaranaquazanas.

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HISTORIA DO BRAZIL. 445

rer, chamado Paraná-mer i , ou o rio pequeno, ouviu 1639-Acuna dizer que havia muitas nações 1, das quaes a om£di™íd0

o Amazonas

mais remota trajava vestidos e chapeos, do que c o n - e ° orinoco.cluiu que teria esta aprendido esta moda d'algumacidade hespanhola, que devia ficar perto. Um dosbraços do.rio Negro, lhe disserão, communicava com

oulro rio im m enso, que desaguava no Atlântico, esobre o qual estavão estabelecidos os Hollandezes: esteconcluiu elle que devia ser o rio de Philippe, cujafoz se chamava o Mar d'Agua Doce, sendo a primeiracorrente d'alguma m agnitude pe rto do Cabo do Norte,e pela qual, segundo elle também, sahira Aguirre ao

Oceano. N'esta opinião de que não podia haver com-municação en tre o Amazonas e o Orinoco, pe rsistirãopor muito tempo pertinazmente os ge og raph os; massobre o facto ja não resta duvida, sendo mais umaprova das relações extraordinárias que entre si man-tinhão estas tribus, e do alcance dos seus conheci

mentos geographicos, o tel-o Acuna sabido da bocad'ellas a tão grande distancia d'este ultimo r io 2 . A'

1 Os Caniciures, Aguayras, Yacuncaraes, Cah uaya piris, M anacurus,Jammas, Guanamas, Curapanagris, Guarianas, Caguas, Acerabaris eCurupatabas. Sobre o Rio Branco apenas refere os Guaranaqua-zanas.

2 Queixa-se Gumilla (c. 24) de que tivessem os Portuguezes do Ma -

ranhão em 1737 achados caminho para o Orinoco, d'onde pnncipia-vão a levar os moradores, para reduzil-os á escravidão. D'uma cartade P. Bento da Fonseca (então Procurador Geral do Maranhão) e queanda juncta aos Annaes de Berredo, se ve que os missionários descobrirão esta communicação dous annos mais tarde.

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1039.

416 H I S T O R I A DO B R A Z I L .

1639 barra do rio Negro notou elle algumas boas posições,onde se podião plantar fortes, não faltando para issopedras á mão : mas recommendou que antes se fortificasse a embocadura do Bran co, com o que lheparecia que se fecharia aos Hollandezes este canal,fruslrando-se-lhes n'esta direcçro efficazmçnle os desígnios de engrandecimento 1 .

n d'out. Aqui se considerarão os Portuguezes quasi em casa,prova de que as suas excursões se extendiao as vezesaté tão longe. E com que se havião de recolher agoraapoz tantos Irabalhos? Dous annos havião gasto jan'esla jorn ada , e nen hum ouro linhão en con trado ,nenhuma conquista feito; e quanto ao mérito da descoberta, queixavão-se não sem razão, que era couzade pouca valia na corte de Madrid, tendo muiloscorrido eguaes perigos, c prodigalizado o seu sanguepara alargar os domínios da llespanha, morrido

1 >io memorial que dirigiu á coroa, recommendou elle que das

bandas de Quito se formassem estabelecimentos sobre os rios, quemais prompta communicação offcrecem com a corrente grande, listamedida, dizia elle, evitaria que os Hespanhoes do Peru mandassempor contrabando as suas riquezas para casa, aproveitando esta via, oque alias farião indu bitav elm ente , não so para fugir aos direitos deCartagena, mas também por minorarem o risco dos piratas. Esperavaporem que se tomassem medidas taes, que se tornasse esta a estradaordinária. Outra razão, que allegava, era q ue estes postos avançados frus-

trarião quaesquer planos de conquista que podessem forjar os Hollan-ezes contra o Peru, de accordo com os Portuguezes, que hav ião faltado á lealdade para com S. M . A" margem do exemplar que tenhoá vista, se lê a resposta que ao texto deu algum Portuguez : Mente oPadre.

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H I S T O R I A DO B R A Z I L . \\1

n'uma csterqueira, sem acharem quem lhes valesse. 1659-Com eslas queixas se dirigirão a Teixeira, pedindo-lhe, que pois era propicio o vento, os deixasse entrarno rio Negro, onde tomassem escravos com que pagar-se dos seus trabalhos. Vendo a sua gente prestesa levantar-se, se recusasse, permilliu-o Teixeira. Masintervierão os dous Jesuítas, como lhes cumpria. Celebrarão primeiro missa e depois protestarão contratão flagrante injustiça. O commandante, que so comreceio de que não podesse evital-o, annuira ao quedesapprovava, folgou com ver a sua inclinação apoiadapela áucloridade d'estes padres, cuja influencia eragrande tanto pela hierarchia como pelo caracter. Mandou proclamar pela esquadrilha o protesto, ordenandoconjunctamente aos que ja tinhão entrado no rioNegro, que retrocedessem, ordem a que, posto que c.re£"67

de má vontade, obedecerão. m-

0 rio immediato, vindo do sul, chamavão-no o™n 1 r r • • 11 M adeira .

Cuyari os naturaes; mas quando leixeira lhe trans-pozera a foz na ida para cima. pozera-lhe nome Madeira, pela quantitade de lenha q*ue via vir por elleabaixo. A descripção do curso do Madeira, que entre

1 Fr. Manoel Rodriguez (p. 153) aventura uma curiosa etymologiad'esta palavra. « Prova (diz elle) vir o rio do Pcrú, pois que é Cuyari

uma palavra da lingua dos Incas, derivada do verbo cuyani, amar,queé o amo, amas d'aque]le idioma, e tem os seus elegantes modosde conjugação. Cuyari, o nome do rio, significa ama-me, sendo tãoboa a corre nte, que os índios lhe exprimião a belleza, asseverandoque ella mesma lhes eslá dizendo que a amem. »

Acuna.6 7 .tuirz.

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U S H I S T O R I A D O B R A Z I L .

1 0 3 9 . o s Y\0b secundários da America m eridion al é dos maisimportantes, achará logar mais adeante. Das informações colhidas d'alguns Tupinambás, que a haviãodescido, concluiu Acuna, que por esta corrente devia de ser a communicaçào mais curta entre a Hes-panh a e o Polosi.

o rio sara.». Abaixo do Madeira, porem do lado do norte, entrao Saraca, depois de recebido o Urubu. Communicacom um labyrintho de lagos e canaes, mas sendo elevado o terr en o, nem na m aior altura das águas searreceia de inundações. Estavão aqui os naturaes l

providos de utensílios de ferro, que recebião de tri

bus mas visinhas do mar, as quaes a seu turno oshavião, segundo dizião, de homens brancos como osPortuguezes, e que usavão das mesmas armas, dis-tinguindo-se porem em terem vermelhos os cabellos.N'esta descripçào facilmente se reconhecerão os Hollandezes2. Viviãoeslas tribus em paiz farto de milho,

mandioca e varias fructas, e no qual abun davão acaça e a pesca; erão numerosíssimas e crcscião rapidamente em população.

1 Acuiia diz que se chamavão elles collectivamente Carabuyanas,posto que divididos em dezaseis tri bu s, a sabe r : C aragua nas, Po-

toanas, Urayaris, Masaearuanas, Quererus, Cotocarianas, Moaearanas,Oiorupianas, Quinarapianas, Tuynamalnas, Araguanaynas, Marigiuna-uas, Yaribarus, Varucaguacus, Cumaruruayanas, e Ycuruanaris.

- Tinhão-se elles por este tempo, segundo Acuiia, apoderado da fezdalgum rio Dulce, que chamavão, diz elle, Philip-IIodias. iXão sei (|uerio seja. Berredo entende que erão os Hollandezes do Surinam. § 730.

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HISTORIA DO BRAZIL. «9

Vinte c oito legoas abaixo da foz do Madeira fica 1639'uma ilha grande, que pelos aventureiros foi compu- TuPinaSmbá5

1 1 ' d o

tada em sessenta legoas : era possuída dos Tupinam - Amazonas

bás, de cujo nome se chamava. Fallava este povo 1

uma língua familiar a todos os Brazileiros portuguezes; pelo que vierão immediatamente d'elles as in

formações que se colherão, não podendo nenhumamá comprehensão, nem má reproducção da parted'um interprete allerar a substancia d'ellas. Seusavós, disserão, tinhão emigrado de Pernambuco ecercanias a fugir dos Portuguezes. Formarão e levarão avante esta resolução os habitantes de oitenta e

quatro aldeias. Seguirão as fraldas d'uma grandecordilheira, que lhes ficava á esquerda, atravessandonas cabeceiras os rios que vão morrer no mar doNorte. Não podia pela difíiculdade da alimentaçãoconservar-se unida tão grande multidão; forão estesficando n'um logar, aquelles em outro, e os pães dos

da ilha seguirão sempre avante até chegarem aosHespanhoes do Peru, nas vertentes do Madeira (deveser o Beni, ou antes talvez o Mamoré), onde perm anecerão por algum tempo. Succedeu porem que umdos seus fosse açoutado por um Hespanhol por haver

1 Zomba Berredo da simplicidade de Acuiia, que foi acreditar noque ouviu, e nega que podessem estes índios ser Tupinambás, que einparte nen hum a, diz elle, existiâo então encorpora los, senão sobre oTocantins e pelos arredo res do Pa rá . Parece esquecer q ue com o Jesuítavinha Teixeira, qu e devia sabe r se erão T upinam bás ou nã o.

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450 HISTORIA DO BRAZIL.

1639. m o r l o u m a vacea, e indignados por tal affronta, outra vez levantarão campo, c descendo o Amazonas,alli vierão estabelecer-se. Posto que em numero inferiores a qualquer outra tribu do rio, tão insigncsfrecheiros erão, que ja havião exterminado umas,posto em fuga outras, e submettido nas suas visi-nhanças quantas a sujeição não preferirão as fadigase os perigos da emigração.

Fabubs Entre os seus visinhos do sul, contarão elles, haviacontadas por .-, »

<*<* duas raças notáveis : os Guayacis, que erao pygmeosTupinambás. s ,

do tamanho de criancinhas, e os Mulayces, cujos pes

estavão voltados para traz, de modo que quem, ignorando esta particularidade, lhes seguisse o rasto, cadavez mais se afastaria d'elles. Ha não sei que encantoem acreditar couzas extraordinárias, e se os Tupinambás tivessem ouvido fallar d'estes povos, nadamais natural do que referirem as maravilhas que se

lhes figuravão faclos; mas devião saber que estavãocontando falsidades, pois que accrescentavão que estas nações lhes erão tribu tarias, pagando o seu tributo em machados de pedra, que faziâo com muilaarte, sendo este o seu único emprego. Sobre a ribeirado norte, disserâo mais, havia sete províncias bem

povoadas, cujos moradores, sustentando-se de fructose animaes bravios, erão tão pusillanimcs, que jamaisse fazião entre si a guerra, nem lh'a fazião as outrastribus de tanto que os desprezavão. É isto uma fábula

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HISTORIA DO BRAZIL. 451

deante; jamais será populosa a tribu que confia do 1639-

acaso a sua subsistência, nem houve nunca selvagensque existissem sem guerra. Nenhuma nação d'ellatem vivido exempta. Uma única communidade dechristãos ha no mundo, e essa infelizmente das maispequenas, assaz simples para tomar no seu sentidoobvio, literal e claro a prohibição que nos fez da

guerra o nosso divino Salvador, e assaz conscienciosapara observal-a á risca, vencendo os próprios estímulos d a natureza. Havia outra tribu , d a qual, quandoestavão em paz, obtinhâo sal, vindo de outras, queficavão alem. Esta noticia de tão necessário artigo deconsumo pareceu a Acuna de grande importância

para a conquista e colonização do rio; mas se poresta via se não podesse obter sal, poderia achar-se,disse elle, em grande abundância sobre um dos af-fluentes na direcção do Peru, onde dous aventureirostinhão descoberto ultimamente uma pedreira inteirade sal de rocha, com o que entretinhão os naturaes

um prospero trafico.As historias dos Tupinambás ainda vierão confir- As A m a z o n a s .

m a r A c u n a m a i s n a c r e n ç a , e m q u e e s t a v a , á c e r c a

d a e x i s t ê n c i a d a s A m a z o n a s ; j a a e s l e r e s p e i t o h a v i ã o

sido inqueridos em Quito certos índios, que outr'oratinhão habitado sobre o grande rio, e eguaes informações se havião tirado na cidade de Pasto no Po-payan, especialmente d'uma índia, que dizia terestado nopaiz d'aquellas mulheres. Durante toda a

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452 HISTORIA DO BRAZIL.

1639. viagem veio Acuna repelindo as suas perguntas:ninguém ignorava a existência de similhanle naçãoe todos erão accordcs nas noticias que delia da vão.Não é crivei, diz elle, que a mesma mentira, tão parecida com a verdade , se espalhasse entr e tan tas tribus , fallando tão diversas línguas, e derramadas portão grande extensão de paiz. Foi aqui que elle obtevea final as mais plenas e satisfactorias individuações.Trinta e seis legoas abaixo da ultima aldeia dos Tupinam bás, e pelo lado do no rte, fica a boca do Cu nu ris,assim chamado da primeira tribu que sobre as suasm argens se encontra. Alem d e li a moravào os Apan-tos, depois os Taguans, e depois os Guacarasj.eraeste ultimo o povo com que trafica vão as Amazonas,enlretendo essas relações sem as quaes se ex tinguiriadepressa esla nação feminina. Iào os Guacaras umavez por anno ao paiz d'ellas, que era cheio de montanhas, por sobre as quaes se erguia um cabeço calvochamado Yacamiaba. Apenas os vião su bi r o riosahiào-ihes as Amazonas ao encontro, empunhandoas armas, mas apenas se desenganavão que erão osseus amigos, mettião se-lhes nas canoas, e tomandocada uma a primeira rede que encontrava, levava-apara casa, onde a armava, e o Guacara, a quem ellapertencia, era seu companheiro durante a estação.Um ín dio , que dizia ler na sua infância acompanhadoo pae n'uma d'estas excursões, affirmou que na voltatrazião os homens todos os rapazinhos do anno ante-

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de mulheres.

HISTORIA DO BBAZIL. 453

rior, mas geralmenle asseverava-se que erão mortos 1639>

logo ao nascer. Era isto o que Acuna acreditava, e seem toda a historia ha alguma verdade, é esta ultimaversão a mais crivei, alias não tardaria a dar-se inconveniente desproporção entre machos e fêmeas natribu paterna.

0 testimunho de Orellana e do seu dominicano Testimunhossobre

acerca das Amazonas pode ser suspeito, mas nenhuma ucmiften

nac^a

0

razão ha para duvidar da veracidade de Acunha :o que refere por certo o ouviu narrar. É curioso oassumpto e bem digno de todas as investigações possíveis na historia d'este paiz. Ao descer o rio em 1743

não perdeu Condamine occasião de liral-o a limpo.De todas as differentes tribus que lhe povoão as m argens, ouviu elle a mesma historia, concordando todasem terem-se estas mulheres retirado terra adentropelo rio Negro ou algum dos outros que correm namesma direcção. Um índio de S. Joaquim dos Oma

guas disse-lhe que talvez em Coari encontrasse umvelho que havia visto as Amazonas. N'este logar soubeque era morto o velho, mas viu o filho Punilha, desetenta annos de edade, que era o capitão dos índiosd'aquella reducção. 0 avô, contou este, achava-se noaldeamento de Cochinvara, uma das fozes do Perus,

quando passarão as Amazonas, vindas doCaiami, quedeságua entre o Tefé e o Coari: fallara com quatrod'ellas, uma das quaes trazia uma criança ao peito,e de todas recordava os nomes. Atravessarão o grande

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454 HISTORIA DO BRAZIL.

1639. r j 0 e tomarão na direcção do Negro. CondamineCondamine. . . , . , , • 1 1

p.ioo. omitle muitas particularidades por julgal-as poucoprováveis. Fora para desejar que elle as tivesse repetido : nem sempre o improvável é falso, e muitasvezes a ficção nos dá a chave da verdade, sobre seremcuriosas na Europa ainda as mesmas fábulas inventadas pelos índios no coração da America do Sul.Ribeiro perguntou por Pumilha ' em 1774, mas,como era de esperar, tinha morrido; descobriu porem um homem de setenta annos, que se lembravabem do fallecido, de cuja boca ouvira muitas vezes amesma historia contada a Condamine; e esta narrativa ainda o velho a corroborava, sendo elle naturalde Cochinvara, onde affirmava ser tradição correntehaverem na indicada epocha passado por alli as Amazonas a caminho para o norte pelo rio Negro2.

Um índio de Morligura, perto de Belém, offcreceua Condamine mostrar-lhe um rio que levava ao paizdas Amazonas : era o Irijó, por cuja foz passou depois o viajante francez entre Macapá e o cabo doNorte. No dizer d'aquelle indígena devia navegar-seo rio até certas cachoeiras, depois do que restavauma jornada de alguns dias pelas matas da margem

• Diz Ribeiro que o nome d'este índio era José da Costa Punilha eque tinha o posto de sargento-mór da ordenança.

2 Depois da leitura da luminosa Memória do Sr. Dr. A. GonsalvesDias, inserta no tomo 18 da Rev. trim. do Inst. Hist. e Geogr. Br.,não é mais licito crer na existência das Amazonas. F. P.

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HISTORIA DO BRAZIL. 4 55

occidenlal, e uma serrania que era mister atravessar. lG39-

Entre os Topayosi

achou Condamine umas pedrasverdes, cortadas todas e algumas imitando figuras deanimaes, embora fosse inexplicável de que meio sepoderião ter servido os índios para conseguil-o, poisque ellas resistião á lima. Grandes virtudes imaginárias se teem altribuido a estas pedras2, pelo que

erão mui prezadas dos insulanos de Caribs

, alem deterem muitas d'ellas até chegado á Europa. Diziãoos Topayos que lhes vinhão ellas de seus pães, tendo-as estes obtido das Cougnantainsecouina, as mulheres sem marido. Um soldado velho contou em Cayena

• Segundo elle erão os Topayos os resquícios dos Tupinambás doAmazonas. São provavelmente os Topajós dos Portuguezes.2 Condamine diz que ellas nem em forma nem em rigidez differião

da Jade Orienlale, e que sobre ellas se escrevera um tractado com otitulo de Pierre divine. Refere-se a uma das cartas de Voiture a ma-demoiselle Paulet, agradecendo o presente d algumas d'estas pedras.0 modo por que o Francez exprime a sua gratidão é assaz característico : — Si les pierres que v ous mavez donnécs ne peuvent rom-pre les miennes, elles rrCen feront au moins por ter Ia douleur avec

patience: et il me semble quejene me dois jamais plaindre de macolique, puisqiCelle m'a procure ce bonheur. (Cart. 23.)"Da dissertação juncta á traducção da viagem de Acuna por Gomberville, ve-seque estas pedras vogavão em Pariz como medicina. Mas melhor seráremetter o leitor para a Narrativa Pessoal de Ilumboldt (Vol. 5,p. 380-387), onde se acha o assumpto tractado com uma vastidão de•conhecimentos e uma força de combinação peculiares ao mais completo de todos os viajantes.

3 Elles portent aussi des colliers, m ais de gros grains de crystalet de pierres vertes qui viennenl de terre ferme, vers Ia rivièredes Amazones et qui ont Ia verlu de guèrir du haut mal; c"est leurplus précieux bijoiti Le Sieur de Ia Borde. C. G.

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456 HISTORIA DO BRAZIL.

IÜ59. a Condamine que havia ido n'uma partida de desco

berta que em 1726 penetrara até aos Amiconanes,nação longo-orelhuda que habitava o paiz acima dasnascentes do Oyapoc e perto da cabeceira d'outro rio,que vae desag uar no Am azonas. As m ulh eres d'a-quella tribu trazião d'cstas pedras verdes ao pescoço,e quando se lhes perguntava d'onde lhes havião

vindo, respondião que das mulheres que não tinhãomarido, e cujo paiz ficava a sele ou oito dias de jornada para o oeste.

Todas estas noticias e muitas outras, que Condamine não julgou necessário recordar, concordão,d'onde quer que viessem, em colloear as Amazonas

no coração da Guyana, única parte da America meridional que os Europeos jamais explorarão. Outrasinformações, colhidas mais tarde por dous dos governadores de Venezuela, aponlão para o mesmo centro.As relações que os Hespanhoes ouvirão no Paraguayassignavão a esta nação de mulheres mui diversa

situação, mas cumpre não esquecer, que se ella emigrou d'este logar p ara o paiz que m ais tarde se lhesdeu por sede, fica Cochinvara, onde tão positivamente se affirma terem ellas passado, na linha rectaque devião ter seguido. Condamine, embora julgassenão assaz provada a existência presente das Amazo

nas, não pôde impugnar os testimunhos da passada.Ribeiro confirma e corrobora estes testim un hos, cconiludo olha ludo como uma fábula. 1'ódc ser ver-

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HISTORIA DO RRAZIL. 457

dadeira a sua opinião, mas a razão em que a funda 1639

é por certo fallaz. Mantém elle que em tal climanenhum ajunctamenlo de mulheres se podia resolvera viver separado do outro sexo. Com pouco proveitoporem deve ter lido a historia e observado a humanidade quem não aprendeu que instituições políticas,seja qual fora sua força para exaltar a natureza hu

mana, são sempre capazes de amoldar-lhe, preverter-lhe e até extinguir-lhe os instinctos. É o argumentoalem d'isto vergonhoso para o auctor e inapplicavelá matéria; se fora verdadeiro (o que absolutamentenego) colheria a respeito das communidades de freiras da nação do escriptor, e não das Amazonas, que,

como as aves, tinhão todos os annos o seu tempo decio. A existência d'uma tal tribu, a ser possivel ave-rigual-a, seria honrosa para a nossa espécie, debaixodo ponto de vista da sua origem, que não podia sersenão a resistência á oppressão. A sorte das m ulheresé ordinariamente terrível entre selvagens; bem podião as d'uma horda ter perpetrado o que das Danaidesse diz, cedendo porem a mais atroz provocação; e se,como succede, estavão ellas costumadas a seguir aoscombates os maridos, nada ha que possa parecer improvável em estabelecerem-se ellas como tribu independente, assegurando com similhante systema de

vida ás suas filhas a mesma liberdade que para sitinhão sabido conquistar1. Se nunca jamais tivesse-

' Humboldt no seu ultimo tomo [Narrativa Pessoal, vol. 5, p. 387-

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453 HISTORIA DO BRAZIL.

1639 m o s ouvido fal lar nas Amazonas da a n t i g ü i d a d e ,acred i t a r i a eu sem hes i t a r nas da Amer ica , mas nem

por i sso se torna menos provável a existência d ' e s t a s :

e comtudo forçoso é admiltir que a verdade poss ível

se antolha suspei ta pe la sua s imi lhança com a fábula

conhec ida .

RÍO das Trinta e seis legoas abaixo do Cunuris , e do lado doTrombetas. . , , , . . .

norte, colloca Acuiia o l l i x i me n a , hoje dicto no das

Trombetas . Aqui se con t rahe t an to o Amazonas que

p or qu at ro legoas não passa d 'um a m i lha a sua lar

g u r a 1 . Tão favorável posição para assegurar a nave

gação do r io não podia passar desape rceb ida , e de

facto observa o Jesuí ta que uma fortaleza de cada ladoa dom i na r i a efficazmente , podendo ao mesmo lempo

servir de a l fândegas , onde se r eg i s t r asse quan to pas

sasse para c ima ou para ba ixo. Os Por tuguezes teemB8nT32°' u m rorte n a r ' ü e i r a do nor t e , cham ado de Saneto A n

tôn io , q u e calculão f icar a setenta legoas do Madeira.

Cresce aqui em abundância o pau cravo , bem comosobre todos os r ios d ' es tas pa r te s . N'este logar , a mais

de 5G0 legoas do mar , se sent i rão distinclamenle as

m a r é s .

o Tapajós. Q uar en ta leg oa s m a is ab aix o en tr a do su l o Tapajós ,

r io immenso , a s s im chamado da t r ibu que lhe asse -

394) exprime uma opinião similhante, e é com a maior satisfacçãoque, quando nos encontramos sobre o mesmo terreno, vejo as minhasexposições e deducções confirmadas por tão alta auetoridade.

4 0 conde Pagan chama isto o Bosphoro do rio.

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HISTORIA DOIRRAZIL. 459

nhorea a embocadura. Bem conhecida era esta nação 1639

dos Portuguezes, que a temião muito, por serem her-vadas as suas settas com tão subtil veneno, que amais pequena picada dava inevitavelmente morte.Tentativas se tinhão feito para reduzir por meiospacíficos estes selvagens, e persuadil-os a irem aldear-se com os índios mansos. Para cahirem em talerão elles finos e prudentes de mais, comtudo mostra-vão-se dispostos a tractar com os Portuguezes emtermos amigáveis, compartindo com elles o proveitoque do livre trafico podia tirar-se. Fez a flotilhaaltodeante d'uma das aldeias d'estes Tapajós, que conteria suas quinhentas famílias; apresentárâo-se redes,aves, peixe, farinha e fruetas para escambo, manifestando os indígenas a maior confiança e boa vontade em lodo este commercio. Offerecérão agasalhoaos Portuguezes, se quizessem vir eslabelecer-se nassuas terras, mas emigrarem e renunciarem elles ásua liberdade era couza em que se não devia pensar.Com magoa achou Acuna os Portuguezes n'um forteque pelo seu nome do Desterro devia ser um postoavançado, preparando-se para uma correria contraeste povo inoffensivo e amigo. Procurou ainda dis-suadil-os, e do commandante da partida obteve apromessa de sobreestar na expedição até segundaordem do governador. Era este commandante o jovenBento Maciel, digno filho de seu sanguinário pae,que sendo agora governador, para desgraça do Pará,

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460 HISTORIA DO BBAZIL.

1659. 0 fizera sargento-mór. O moço malvado empenhou asua palabra que suspenderia a expedição, e apenasAcuna deu costas, partiu para ella. Não tendo intenções hostis, e tomados assim desorpreza , acceilárãoos Tapajós a paz qu e esles desalmados lhes offerecião.Maciel exigiu a entrega das flechas, quando elles ja

não estavão em estado de recusal-a. Apenas apanhadas estas armas, cercou os homens, quaes ovelhasn'um curral, como Acuna se exprime indignado,soltando.os alliados contra a aldeia. Taes forão osexcessos que estes commetlérão, e tal o tractamenloque derão ás mulheres, que um Portuguez que em

má hora consen tira em ser da partida, protestou aAcuna que se era assim que se havião de obter escravos, jam ais os queria possu ir, que rendo antes m ilvezes largar os que ja tinha, do que teslimunhar sc-

Aeufra. <:. -4. gunda vez tão horrendas scenas.

Não era bastante a gente que cahira cm poder de

Maciel e da sua partida, pelo que a ameaçarão comnovas e inauditas crueldades, se não arranjasse maisescravos em troco dos quaes por outro lado se lheprometteu a liberdade. Fixou-se o resgate em milescravos, e os Tapajós mandarão a buscal-os. Duzentos apenas se poderão achar, tendo o resto fugido ao

ver prizioneiros os senhores, e entregue ao saque aaldeia. Ja islo porem não foi pequena preza, e osPortuguezes pozerão em liberdad e os donos, confiando tanto na palavra desles pobres selvagens, que

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Acuiia. C. 75.

H I S T O R I A D O B R A Z I L . 461

contarão receber como devidos os restantes oitocen- 163s-tos. Embarcarão então as suas victimas para Belém eSan Luiz, servindo esta fortuna de lenlar outros malvados a prepararem nova e maior expedição da mesmanatureza'. Conseqüência de tão intolerável deshuma-nidade foi tornarem-se inimigas figadaes dos seusoppressores todas as tribus que povoavão este rio, eposto que na sua foz lbe houvessem os Portuguezeserguido um forte, ainda até ao tempo que escreviaBerredo, que foi pelos annos de 1 745, o não tinhãopodido explorar alem das primeiras cachoeiras. Muitas tentativas se tinhão feito na crença de que ricasminas havia por descobrir nos montes que lhe bor-davão o curso. Algumas pedras se encontrarão quepelo pezo devião.conter ouro , mas o metal, se é queo era, evaporava-se ao fogo. Duas vezes tinhão tentado os Inglezes, mas de balde, eslabelecer-sc sobreeste rio. Da primeira toda a partida succumbira, dasegunda forão tantos os mortos que o navio teve deretroceder. Quando Acuna alli esteve ainda viu guardadas como tropheos de victoria as armas europeasganhas n'estas pelejas.

1 M. Rodriguez om ittiu esta historia, pro vave lme nte por alheia doseu principal assumpto. Berredo passou-a por alto por outro motivo :

julgava necessários os escravos, e sem se embaraçar com o modo porqua erão obtidos, esforçava-se sem pre por arre da r da vista as atr oc idades do trafico. Por conseguinte todas as vezes que falia na opposição

forte d^aquelle gentilismo, jamais faz a menor allusão á vilania comque se provocava tal resistência.

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HISTORIA DO BRAZIL. 465

Effectivamente encontrão-se n'aquelles logares bellos 1639*crystaes, octogonos e triangulares. N'esfct direcção se

feitio e tamanho d'um coração de boi, cheia de jóias de differentescores, umas brancas como crystal transparente, as outras d'um formoso vermelho, e algumas entre vermelhas e brancas, imperfeitas,ao que parecia, e ainda não completamente formadas pela natureza.Todas estavão postas por sua ordem, como os grãos d'uma romã den

tro de uma casa ou casca, mais rija que o mesmo ferro, e que, oufosse com a força da explosão, ou de bater contra os penedos, ondecahiu, fez-se em pedaços, descobrindo assim a sua riqueza. A philo—sophia d'estas couzas bem se deixa perceber. Pois quando as operações do sol e da natureza estão formando o mais polido nascimentode tão finas jóias nas entranhas d'um penedo duro, necessariamenteuma quantidade maior do contendo d'esse penedo deve reduzir-se auma quantidade similhante d'estas pedrinhas, que devem ser produ

zidas, pois quanto mais finas são, mais duras; e quanto mais duras,mais partes componentes devem encerrar em mais breve espaço. Oraa natureza não admitte o vácuo, nem ao ar é possivel penetrar a grossapedra, e evitar que elle se forme. No mesmo momento pois que aforça do sol é tão grande, que está a ponto de formar um vácuo naformação da obra, que tem em mãos, oppôe-se a natureza e n'eslalueta rebenta o penedo, e fica a producçâo imperfeita. L. 1, p. 612.

Também Azara menciona a crença n'estas romãs mineraes : o //y a dans quclqiies emlroüs des pierres que Von appelle cocos, et

qui renferment des cristaux à faceites groupés comme des grains degrenade. Leurs couleurs varient, mais les plus granais et les plusbcaux se trouvent dans lesmonlicules de Maldonado. Les gens dupays supposent que le sac qui forme ces cristaux penetre dansrintérieur de lapierre, et qtien le remplissant, ils font crever Iacroüte pierreuse, avec un bruit plus fort quecelui d'une bombe.

Nas Noticias do Brazil (1. 2, c. 75) se diz que a esmeralda seforma dentro de crystaes, até que rebenta. Quando os naturaes achão

um pedaço de crystal, que lhes parece conter uma d'eslas esmeraldas,põem-no as rogo, fazendo-o assim estourar; com o que porem muitoperdem a cor e o brilho da pedra.

Todos os naturaes da Bahia e S. Vicente affirmavâo que no sertãod'estas capitanias se achavão debaixo da terra grandes pedras redondas,

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•it'.4 H I S T O R I A D O B R A Z I L .

1C59- extendem terras alagadiças, computadas em oitentalegoas de comprimento, produzindo todo este terreno, diz Berredo, arroz tão excellente como o de

Berredo.

§ "oi- Veneza.o rio Mapau. Sessenta legoas mais abaixo, e lambem do lado do

norte, nola Acuiia o Ginipapc

1

, que Berredo chamaMapau. Produzem suas margens cacao c salsaparri-lha que farle, e maravilhas se conlão das riquezasd'este rio, a ponlo de observar aquelle escriptor, que,a ser tudo verdade, não ha oulro tão rico nem noPeru , nem no Novo Reino. Seis legoas acima da sua

embocadura ficava o forte do Desterro, cuja guarnição constava de tres soldados, força que de pouco

que alli rebentavão com o estampido d'uma espingarda. Quando ou-viâo a explosão cavavão no logar, e encontravão esta pedra redondaestourada em quartos como uma romã, e estes quartos cheios de pe-drinhas de crystal regular oitovado d'um lado, mas ásperas do lado,que adherião á madre. Aprescnlando-se algumas d'cslas pedi inhas ao

governador Luiz de Brito, reputou-as elle brillantes, mas o diamaiiled'um annel facilmente as cortou. Noticias, p. 2 , 75.

Também ás vezes se achão á margem do Paraná pedras brutas redondas ou ovaes do tamanh o d'um a romã ou até da cabeça d'uni

homem, e que estourão como canhões. Chamão-se cocos de mina.Dobrizhoffer, que o refere (t. 1, p. 229), lastima nunca ter encontradonenhuma em todas as suas viagens.

Mas a historia m ais ridícula sobre pedras preciosas é a que conta

Gumilla (c. 25) de eng olirem as aves no Novo Reino esm eraldas brutas,retendo-as no papo até ficarem polidas, de modo que nada mais vulgardo que comprar um homem uma gallinha, e ao ahril-a, achar-lhe dentro uma ou duas esmeraldas de grande luvco.

' Lo Lruhucuara, que vem desafiar do mesmo lado, nenhumamenção faz Acuna, ape/ai de ser rio de egual grande/a.

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HISTORIA DO RRAZIL . 405

podia servir contra os Hollandezes desde muito cubi- ,036-çosos da posse d'um paiz tão favoravelmente situadopara o cultivo do tabaco. Para estabelecer este, abandonara-se um posto avançado trinta e seis legoas maisabaixo. Pareceu a Acuna mui preferível a antiga posição, e provavelmente de facto o era, mas governavaagora o Maranhão Maciel, infinitamente mais atlenloaos modos como escravizar os naturaes, do que comoprecaver-se d'ura inimigo perigoso.

Aqui, derramando-se por paiz plano, e inchado ciicsso^ , , / , a Belém.

com as águas de trinta e seis caudalosos rios, trazadosdurante o seu curso, mostra-se o Amazonas como um

mar que innumeraveis ilhas dividem em canaes infinitos'.Habilavão-nas muitas tribus, fallando diffe-rentes línguas, mas entendendo quasi todas o tupi.Por entre estes labyrinthos vae rolando a portentosacorrente, até ao Oceano, adoçando-lhe as águas atéquarenta legoas de distancia, de modo que podem os

navios fazer aguada depois de perdida desde muito aterra de visla. Aqui deixou Teixeira o Amazonas, singrando para o sul, através da foz do Xingu2, quemede duas legoas de largura. D'aqui passou peloestreito de Tanajepuru ao Paraitu, e depois por outro

1 Ilerder affirma que o Amazonas não desce dous quintos de pol-

legada por mil pés, e que n'esta parte do Brazil pode um homemviajar por um espaço egual á maior largura da Allemanha sem erguer-se um so pé acima do nivel do Oceano. Philosophia da Historia,tomo 1.

- O Parnahyba de Acuna.

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466 HISTORIA DO RRAZIL.1639- estreito chamado aclualmente Limoeiro, por lembrar

a sua eslreiteza a idéia da prizão para a embocadurado rio dos Tocantins. Costumavão, segundo se diz,os Francezes carregar navios com terra das margensrPesle rio, e extrahir-lhe na Europa o o u r o ; mas tinhão sido expulsos d'alli, sem que até então houvessem os Portug uezes aufe rido da sua victoria ou lroproveito que não fosse o descartarem-se de taes visi-nhos . Alguns aventureiros de Pernambuco, tendouma vez vindos do sertão com um padre á sua frentealcançado as cabeceiras d'este rio, linhão tentado ex-ploral-o até á sua foz, mas mortos todos pelos Tocant ins, havia o calix do padre sido encontrado entreestes índ ios pouco antes da viagem de Teixeira. D'aqui

metteu-se a esquadra por outro estreito, chamadoIgarapemerim, que quer dizer canal estreito paracanoas, peneirando por elle no Moju, um dos tresrios que formão a bahia de Belém. A 1 '2 de dezembro

M . i t o . i r i f M L . z . u e |(359 entrou Teixeira n'aquclla cidade, onde foirecebido com as merecidas honras.

Mil e oitocenlas legoas dera Orellana ao curso doAmazonas; Acuna compulou-o em P27G contadas dafoz do Napo, e 1550 ao tudo, tomado das suas nascentes. D'estas a mais remota fica porem a muitom aior distancia do que elle ca lculou. Como senhorabsoluto de todos os outros, diz elle, extende este riobraços a recolher dos seus vassallos o devido tributode águas, Irazendo-as para o canal principal ; e qual

B e r r e d o ."> 5C- ' J .

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HISTORIA DO BRAZIL. 467

o hospede, tal o official, que sabe a recebel-o; para 1639

correntes menores um menor, e maior para as maiores, e quando vem um de quasi egual poder, vae ogrande Amazonas em pessoa a agasalhal-o. Desde omar até ao rio Negro nunca a profundidade na veiaprincipal é menor de trinta braças, variando de vintea doze mais para cima, sem descer de oito, asseveraAcuna, mesmo perto das cabeceiras. As ilhas queforma são por demais numerosas para serem contadas, e de todos os tamanhos, havendo muitas dequatro e cinco legoas de circumferencia, não poucasde dez e de vinte, e passando de cem a ilha grandedos Tupinambás. Muitas das mais pequenas erão cultivadas pelos que habitavão as maiores mais próximas, e sendo ás vezes inundadas, era extraordinária ^a sua uberdade. 105-

Milho e mandioca erão o principal sustento vege- Alimento. _ . . , . das tribu s

tal dos moradores, que punhao a ultim a ao abrigo ouviaes.

das inundações regulares, mettendo-a em poços fundos hermeticamente tapados á prova de água. Amesma raiz lhes fornecia o licor de que fazião uso,e da farinha fazião biscoutos delgados que conser-vavão na parte mais alta de suas casas, o mais longeque podião da humidade, e fervendo-os em água, e

deixando-os fermentar, preparavão uma beberagemque servia para todas as occasiões. Havia uma festade beber no tempo da sementeira ou plantio, e outrapela colheita; chegava um hospede assim se lhe fazião

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4 6 8 H I S T O R I A D O R R A Z I L .10"''" as honras; embriagavão-sc quando alegres, embi ia -

gavão-se quando tristes. Outros licores fermentadosse fazião de varias fructas, e guardavão-se em cântaros de barro de grande capacidade, ou em madeirosocados en fôrma de vasos, ou em enormes cestos, detão apertado entrançado, c tão bem calafelados comgomma que nada deixavão vasar.

Entreassuasraízes alimentieiasliguravào lambema batata, e uma espécie de tubera 1 , que chamavãopapas. Comião a banana, o pinhão, o cacao, a Rimara, e uma espécie do avelã, a que Acuna dá eslenome pela casca espinhosa que tem, masque no Peiaise chama amêndoa da terra, como mais similhanlea esta frueta. É porem da água que tirão estas tribuso seu prin cipal sustento, tanto de carne como depeixe. 0 nianatee acha-se por toda a parte no Amazonas, segundo Acuna, desde a sua origem ale á suafoz. Chamão-no os Portuguezes peixe boi, como osbuecaneiros o chamavão vacca m ar in ha, pela configuração da cabeça, posto que não lenha chifres, epor orelhas dous orifícios apenas : está no lodo dafôrma e na boca a sim ilha nç a. Maiores do que umgrão de ervilha não são os olhos, sendo do tamanhod'um cavallo o animal; amphibio não pôde dizer-se,que nunca deixa a água, tendo apenas em logar depernas duas barbatanas grandes, uma década lado

: Criadillas de tkrra.

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HISTORIA DO BBAZ1L. 469

da barriga, perto das espaduas, onde e mais grossoo corpo, começando a adelgaçar-se gradualmentedous pés mais para traz, até terminar na cauda, queé chata. As telas da fêmea ficão debaixo d'estas bar

batana s. Um pello cu rto , como cerdas bran da s, nasce *da pelle grossa e ri ja , de que os natu rae s fazem escudos, difficeis de furar com uma bala de mosquele.Ha outra espécie aqui chamada boi de azeite, porser quasi todo go rdu ra, chegando um so a dar pertode cem canadas de azeite. O alimento favorito dopeixe boi n'este rio é a canna brava, planta quefluetua sobre a água, balouçando-se em compridase pczadas raizes e erguendo-se cerca de seis palmosacima da tona : em alguns dos canaes do Amazonascresce basta a ponto de obstruir com pletame nte anavegação. Também nas ribeiras pasta este animal,lirando para isso a cabeça fora da água. Posto queincapaz de mover-se em terra ve-se elle obrigado avir freqüentemente acima para respirar como sefora amphibio, o que é causa da sua morte, sendoentão que os índios, postos á espreita, lhe lanção oharpeo. Seccavão-lhe estes a carne, não tendo outromeio de preserval-a na falta de sal, que substituiãopela cinza d'uma espécie de palmeira, boa para dargosto á comida, mas incapaz de cural-a.

Tinhão comtudo os naturae s um meio fácil de conservar provisões frescas para o inverno. Quando astarta rug as vinhão a terra pôr seus ovos, ião elles

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470 HISTORIA DO BRAZIL.I6°9 apanhal-as, e virando-asde costas, seguravão quanlas

querião. Depois, perfurando a concha, é passando-Iheuma corda, amarradas umas ás outras em molhos aslançavão ao rio, prezas a uma canoa. Preparava-seuma espécie de repreza ou tanque com espeques Iãobem revestidos de terra ou barro da parte de denlro,que como n'uma cisterna ficava retida a água da chuva.Aqui se soltavão as tarta ruga s, susten tadas, diz Acuna,

§ioT. com ram os de ar vore .

O modo usual de matar o peixe era com seitas oupau s de arremes so, servindo a seita de boia depois deferido o alvo. Quando estavão baixas as águas , c seccasas communicaçôes entre o rio e as suas lagoas, trilu-ravão os índios uma de suas plantas rasteiras, c lan-çando-a n'estes lagos logo viào vir o peixe á lonarapidamente envenenado. Yeslas paragens se encontra o peixe electrico, que os naturaes chamão pn-

ruquv.

Era freqüente a anta e o moschus moschiferus',nem faltava a paca, espécie de lhama mais pequena.Menciona Acuna o veado, e o yg ua nh a, yagoli, e ococia como bom alimento. Perdizes erão numerosíssimas. As aves domesticas linhão vindo do Peru,passando de tribu em tribu por todo o curso do rio ,tão depressa se pro pa ga , mesmo en tre selvagens, todoo beneficio gra nd e e obvio. Aves aquáticas abunda vão

1 Espécie d e cal ra monteza, d e q u e se tira o aliniscai .

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1637.

HI STORI A DO B RAZIL . *7l

alem de toda a expressão. Se Orellana careceu demantimenlo na sua v iagem , foi somente por faltarem-lhe os meios de obtel-o. Teixeira, que não tinha inimigos que recear, nem outra couza que fazer, senãoexplorar com vagar o rio, todas as tardes dava fundo,indo dormir em t e r r a : o primeiro cuidado era levantar cabanas de ramo s entrança dos , para o queservião muitas vezes os da arvore do cacao, tão bastacrescia ella. Depois partião os índios da armada, unscom cães para as florestas, outros com arcos e settas .para o rio , nem tardava que voltassem carrega dosde pesca e caça em profusão tal que Acuna diz quelhe irazia isto á memória os pães e peixes m ilagroso s.

Deliciosa foi na verdade a viagem de Acuiia, pre- rng^d.

viamente conciliados os indígenas por todo o caminho, e sufficiente a força que o acompanhava paratira r todo o receio . Se um batelão soffria avariaou se virava, não faltarão outros q ue lhe dessem soccorro. Também navegava ao som d'ag ua .Se escrevera a viagem rio acima, teria tido defallar de labyrinthos de canaes, correntes violentas, e d'uma praga de insectos, que não dão tregoasnem de noute nem de dia \ D 'entrc estes é o

i Des mouches, diz Lescarbot, fatiando do Canadá, qui sontfort

importunes non-seulement là oii nous estions, mais aussi par toutce nouveau monde, et au Brésil man e, si bien que ce nest pasmerveille si Beelzebub pritice des mouches tient Ia un grand em-

^ Vuma das terríveis marchas de Stedman erãotaes e tantas as nu-

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472 HISTORIA DO BRAZIL.u,ú!l- pium ' o mais terrível; insecto excessivamente pe

queno, faz a sua peçonhenta picada uma feridado tam anh o da cabeça d'u m alfinete acom panhadode dôr cruc iante ; no decurso d'um dia lição mãose cara coberlas d'cslas feridas, e muilos Item morrido da inflammaçào que ellas produzem. So nashoras do dia comttido perseguem estes inimigos,e a mais leve cobertura basta para guardar d'elles.A mutuça é um moscardo que também so atormenta

vens de mosquitos, qúe com as baionetas cavavão os soldados na terraburacos, em que mcttião a cabeça, tapando a entrada, cobrindo opescoço com as suas redes, e jazendo de barriga para baixo : dormirem qualquer outra posição era absolutamente impossivel. Elle mesmo,por conselhos d'um ne gro , trepo u ao cimo da arv ore mais alta que

acliou, e armando alli a sua rede entre os ramos, dormiu quasi cempés acima dos seus companheiros, que nem podia ver pelos milhõesde mosquitos que lhe licavão por bai\o, nem ouvir pelo incessantezumbir d'esles incoininodos insectos. T. 2, p. 93.

Ha no paiz do Orinoco formada por uma espécie de abelha umacerta substancia, que as tribus fixas queimão incessantemente nas suashabitações, e que eflicazmente as protege contra todos os insectosalados. Chamão-na comejou, c Gumilla diz que nem é terra, nem cera.

T. 1, c. 9.As sementes da arnotla maceradas em sumo de limão, e mistura

das com água e a resina, que tressua d'uma arvore chamada morona,ou com óleo de castor, compõem um a tineta escarlate, com que todosos índios se pintão o corpo, e até o cabello, o que lhes dá á pelle seusvisos com uma lagosta cozida : também untão os corpos nus com cu -raba ou oleo de carangueijo. Serve esta unlura não so para evitar ademasiada-transpiração em climas ardentes, mas também paia livrar

dos mosquitos.1 Diz Ribeiro que o pium pasta nas flores do macaçu, arvore venenosa, que mata instantaneamente homens e brutos. Com ella costuma"os Índios empeçonhar as águas, para matarem o peixe. Onde maisabunda esta arvore, tanto maior a praga do pium.

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H ISTOR IA DO BBAZIL. 473

de d ia . Mas quando estes perseguidores se retirão, 1039-succedem-lhes os marinins, que, sendo quasi microscópicos, enxerem uma ferreloada aguda e dolorosa : a sua hora de martyrizar é ao pôr do sol. Acarapana e a muroçoca andão por fora dia e noutee ferrão através das dobras de qu alq ue r rou pa ,excepto seda forte : são estes os insectos mais im -portunos, por não deixarem repouzo, mas o piumé bem mais terrível. Os emplastros e unturas dosíndios os defendem contra estes inimigos. Ao descero rio evita-se a praga, seguindo o meio da corrente,que até lá se não aventurão laes insectos.

Ao Jesu íta, qu e nada soffreu d'esta pra ga , a m aisvexatória a que pôde expôr-se um homem, figurou-se a te rra um pa raizo , e como tal a desc reve. Nasimmediações das serras do Quilo queixa-se, é ver- _dade, de intenso calor, porem mais para baixo vêemas brizas do mar refrescar a atmosphera. A riquezada producção vegetal motivou mais justa admiração;erão savanas cobertas das mais lindas flores, e arvores, como nen hu m a apresenta a Eu rop a, q ue comellas se com pa re em belleza, grossu ra e elevação. Eaqui, diz Acuna, teem os naturaes o maior armazémde simplices contra moléstias, que jamais se descobriu. Produz aqui a terra canna-fislula como nenhu-resse encontra, a melhor salsaparrilha, as m ais escolhidas gommas e resinas; mel silvestre por toda aparte, tanto para sustento como para medic ina; o-

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4 7 i H I S T O R I A DO B R A Z I L .

1,9 cera , que em bora p reta , arde tão bem como qualquei

outra. Tabaco da melhor qualidade crescia espontâneo. O óleo de andiropa é inestimável para feridas,e a copaiba excede o m elho r balsam o. Finalm ente,concluo o padre, ha aqui tantos milhares de hervase arvores que a Dioscorides e Plinio não faltaria quefazer so para classifical-as. Em parle nenhuma, in

formou elle á corte de Hespanha, se podem maisfacilmente construir navios, faltando apenas o ferro;cordame da casca de certas arvores se fazia como domelhor canamo; alcalrão, no mesmo logar se preparava; para amarras abi estava a embira , para velascrescia o algodão, e para trabalhadores lambem não

faltavão homens.de^íbu" O numero de tribus que então povoavão o rio,

orçou-o Acuna em mais de cento e cincoenta, Paliando todas differentcs línguas. Não faz menção delongos intervallos ermos como no tempo deOrcl lana,antes diz que confinavão tão de perto entre si estas

nações, que m uitas vezes ouvia um a os golpes demachados nas aldeias da outra. Com tudo em dçspeilod'esta intima visinhança vivião cm estado deperpeluaguerra, alias, por mais extenso que fosse o paiz, nãopoderia sustental-as todas, entendeu o.Jesuíta, esquecido de que em quanto erão freqüentadas as margen s

dos rios por amor do peixe, ficava deserto o sertão.Muitas d'estas tribus fugirão á vista da flotilha porlu-

-gueza, nenhuma offereceu hostilidades. Fácil e se-

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1030.

H ISTOR IA DO BR AZIL. 475

gura era a fuga; apenas chegados a terra tomavão osíndios suas leves canoas, e correndo com ellas parao lago ou lagoa mais próxima, de novo embarcadoszombavão de toda a perseguição.

A arma usual era o pau de arremesso, chamado 0pau1 arremesso.

estática, de que se servião os Peruvianos. Arco e Ire-

chas porem erão bem mais formidáveis. Algunsíndios usavão de escudos de canna entrançada, quenão erão tão bons como os feitos de pelle de peixeboi. Erão de cedro as canoas, e o trabalho de cortarmadeira para ellas, poupava-o o rio. Arrancadas pelascheias, vinhão estas altas arvores boiando pela cor

rente abaixo, não tendo o índio mais do que lançaro gancho a uma, eprendel-a á sua choça, até que aságuas descendo a deixassem em secco. Machados erãoconchas de tartaruga, servindo de corte a parte maisdura, que é a que se pôde dizer que fica entre asespadoas. Um osso da queixada d'um peixe boi fazia

as vezes de cabo, e com instrumentos como estesfazião mezas, assentos c outros trastes, tão bem, postoque não lâo facilmente como se se servissem do melhor ferro. Algumas tribus tinhão machados de pedra,que fazião mais depressa o serviço. De cinzeis, plainase verrumas lhes servião os dentes e prezas de ani-

maes.Tinhão idolos de sua própria fabrica, distinguindo- WoU».se cada um por qualquer attributo apropriado, comoo deus do rio pelo peixe na mão; outro presidia ás

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476 HISTORIA DO RRAZIL.

if>39. sêmen lei ras e colheitas; e um terceiro era o dispen-sador da victoria. Nenhumas ceremonias de cullo sepracticavão, e esquecidos jazião os idolos n'um canto,até que se carecia d'elles para a semeadura, pescaou guerra. Estão os idolatras sempre dispostos a engrossar o numero de suas divindades. Sobre um cacique que hospedou Teixeira, /ez grande impressãoo poder dos deuses po rtuguezes, por terem preservado a flollilha em.tão dilalada viagem, c assim pediuao commandanle que lhe deixasse um que a elle e aoseu povo os protegesse, soecorrendo-os em suas necessidades. Oulro índio, que confessando o desprezoem que linha os idolos, a si próprio se arvorara emobjecto de adoração, foi convidado pelos Portuguezesa reconhecer o Deus verdadeiro. Acudiu elle ao chamado para se deixar doutrinar, mas ao dizereni-lheestes que o seu Dens era invisível, foi-se não convencido, continuando, fosse por insania ou fraude, apretender que o adorassem.

conjura- Por toda a parte tinhão os selvagens os seus conjuradores, nem ha estado social em que não appareçàoalguns indivíduos assaz arleiros e sagazes para viverem á custa da credulidade alheia. Em tão grandeveneração erão lidos estes imposlorcs, que guardadosos seus ossos na rede em que dormião quando vivos,armava-se esta n'uma cabaça para esse fim reservada.Algumas tribus queimavão os morlos nas suas hab itações; outras queimando-os egualm ente, lançavão na

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HISTORIA DO BBAZIL. 477

fogueira quanto havia pertencido ao finado, mas de 163y-qualquer fôrma que se celebrassem osfuneraes, du-ravão por muitos dias, invariavelmente acompanhados da indefectível bebedeira.

Em geral tinhão as tribus do Amazonas a pellemenos escura do que as demais nações brazileiras.Erão bem feitos aquelles índios e de boa estatura,fácil comprehensão, dóceis e dispostos a receber dosseus hospedes instrucç~o, dando-lhes em troca auxilio. Os alliados dos Portuguezes, que dos seus senhores so havião aprendido insolencia, novos vicios enovos modos de m alda de , freqüentemente maltracta-vão este povo inoffensivo sem que elle buscasse vingança, o que mais se deve attribuir á sua prudênciado que á exempçâo de sentimentos vingativos. Comjusta indignação falia Acuna do systema seguido pelosPortuguezes contra este gen tio. Que as suas rep resentações podessem chegar a fazer impressão efficazsobre o governo, não é muito provável, mas antes deelle chegar a Madrid estava feita a revolução que aseu legitimo dono resliluiu a coroa de Portugal. Ja anavegação do Amazonas não era de conseqüênciapara os Hespanhoes, e para d'clla ti rar pa rtido faltavalazer aos Portuguezes : vierão porem melhores tempos em que d'algum p 'estimo forão as noticias obtidas com a viagem de Te:xeira.

F IM DO TOM O SEG UNDO.

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ÍNDICE

DO TOMO SEGUNDO

CAI'IHLO XII. — Os Francezes expulsos do P arahy ba. — Os Pitagoa res.— Os Inglezes no Brazil. — Expedição de Fenton. — Principio de hostilidades. — Withrington assola o Recôncavo. — Morte de B ar ret o. —D. Francisco de Souza governa dor. — Exploração de minas de pra ta.— Jornada de Cavendish. — Toma Sanctos, queima S. V icente, é r e -pellido do Espirito Saneto, e morre de pezares. — Lancaster toma oRecife. — Raleigh desvia os aventureiros, dirigindo-os para a Guiana.— El Dorado I

CAP. X II I . — Expedições partidas do Maranhão. — Os Tapuyas. — Van

tage ns obtidas pelos Jesu ítas e diminuição dos indigena s.— Pacificaçãodus Aym orés. — Estabelecimento no Ceará. — Expedição dos F r a n cezes á ilha do Maranhão. — Espnlsa-os Jeronymo de Albuquerque. —Fundação da capitania do Pará, c cidade de Belém. — Destruição dosestab elec im ento s hollande zes na foz do Amazonas 3C

CAr XIV — Formação d 'uma companhia das índias Occidentaes na Hollanda. — S. Salvador tomada pelos Hollandezes e restaurada pelos Hespanhoes e Portuguezes connnandados por D. Fadrique de Toledo. —Negócios do Maranhão. — Fazem os Hollandezes sahir nova expedição

e apoderão-se de Olinda e do Recife 14')

Cu>. XV. — Acampamento do Bom Jesus. — Caiabar deserta para osHollandezes e faz m ud ar a fortuna da guerra . — Negros dos palmares.— Reducção da ilha de i tamaracá , Rio Grande, Parahyba, acampamentoc N azareth . ' . * . . . . 208

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480 ÍNDICE.

CAP. XVI. — Emigração de Per nam buco . — Restauração de Porto Calvo

e supplicio de Caiabar. — Envião-sc reforços ao conmmiido de Roxos,q u e é desbaratado e morto . — Sueco le no commando Bagnuolo, quefaz com felicidade uma guerra de devastação.— Chega Maurilz, conde deNassau. como governador general dos Hollandezes; sabias medidas qnçtoma; persegue os Portuguezes ali- ao rio de S. Francisco, o Bagminlo,abandonando a capitania de Sergipe, re tir a- se para a Bahia. . . -!>S

CAP. XVII. — S. Jorge da Mina accommettido e tomado pelos Hollandezes. — Tomada do Ceará.— Põe Nassau dcbalde cerco a S. Salvador

• — Declarão os Hollandezes livre o commercio do Braz i l .— Estado das

suas capitanias. — Edifica-sc nova cidade pe rto do Recife. — Chega o •conde da Torre; perde grande parte da sua gente por molést ia , e apozquatro acções indecizas corre com o temporal. — Retirada de Vidal e 'Barhalho.— 0 marquez de Monte Alvão viso-rei . — Revolução em Por-

• tugal . — Deposição do viso-rei ."ÍS

CAP. XVIII. — Negócios de Maranhão. -*. Algums misionarios de Quito,fugindo pel* Napu abaixo, enlregão-se ao rio, c chegão a Bclem.— Sobelexcira o Am azonas. — Regressa com elle Acuna'. que explora o cursodo rio j IX

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