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história recontada
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Sandra S. Rodrigues 1
A história que se segue é da inteira (irres)ponsabilidade da professora:
Sandra Rodrigues
Qualquer semelhança com a realidade… É pura coincidência!!!!!!
Sandra S. Rodrigues 2
A História re(des)contada
CENA I
PERSONAGENS: D. MARIA, D. JOÃO, D. CARLOTA, D. PEDRO, D.MIGUEL E
ALGUNS CRIADOS
A família Real encontra-se
realmente disposta à volta da enorme
mesa rectangular onde está a ser
servido o jantar avantajado que
qualquer membro da realeza julga
merecer ao fim de mais um santo dia
de nobre dedicação aos súbditos e aos
problemas do Reino. Nesta mesa
gigante encontram-se pratos vários
recheados com comida que dava para
alimentar o reino inteiro. Os criados são mais que aqueles que ali são servidos, tantos
que se acotovelam e estorvam na azáfama de cumprirem, como é devido e merecido, o
seu meticuloso serviço. À volta da mesa encontram-se, portanto, D. Maria I, conhecido
como a Piedosa, ostentando ainda o porte matriarcal de rainha, porém, ausente do
Trono, devido à sua debilidade física – pertencia-lhe a cabeceira da mesa que herdou
por morte de seu marido. No canto imediatamente oposto, de frente para si, encontrava-
se o seu filho, agora príncipe regente, com ar igualmente de piedoso, mas mais ainda, de
bondoso, à direita do qual estava a sua esposa, D. Carlota Joaquina alegre por estar
justamente naquela mesa que era tão só a mesa Real. À direita de D. Carlota estava D.
Pedro, porém, afastado dela alguns metros e imediatamente à frente dele o seu irmão
mais novo, D. Miguel, ambos com ar traquina.
Enquanto desfrutavam alegremente da comida, as duas crianças faziam por se
prolongarem a si mesmas, de modo a que, por debaixo da gigante mesa conseguissem
tocar um no outro, abstraindo-se assim, dos problemas quotidianos habituais dos
adultos:
D. Maria: Sabeis João!? Intriga-me essa ousadia de que me falaste por parte desse
Napoleão que me parece ter ar petulante…
D. João: Pois é, mãezinha, confesso que a mim também… Não vi nada de nobre no seu
carácter! Dizem os conselheiros que o melhor é ignorá-lo, ainda mais porque o que nos
pede colide com a ancestral aliança que temos com os britânicos que sempre nos foram
muito fiéis e prestáveis. Mas eu receio alguma tentativa de vingança…
D. Maria: Julgais possível haver tão drásticas consequências se não fizermos o que ele
pede?
Sandra S. Rodrigues 3
D. João: Não sei, mãezinha, não sei! O que não podemos é por em risco a nossa ligação
a Inglaterra, colocando-nos ao lado dessa gente tão ambiciosa.
D. Carlota que até então se encontrava
entretida a deglutir uma saborosa perna de frango,
porém, astutamente atenta ao que ia ouvindo,
limpa-se a um guardanapo e diz, com ar
intrigado:
D. Carlota: De que falais?! Porque é que nesta
casa ninguém se importa comigo? Porque é que
ninguém dá pela minha presença? Como tendes
coragem, senhor, meu marido de nem sequer
pedireis a minha opinião sobre um assunto que
me parece tão importante. Logo a mim que sabeis
sou tão sensata e sábia! Como te atreves! De que
serviram as promessas em frente ao altar, meu
João!!! Julgas que o Napoleão a quem tanto
temeis não consulta, porventura, a sua tão sagaz
Josefina!!? Julgais que não vem da mente dessa
mulher o espírito conquistador e tão bem
sucedido desse estratega!? - perguntou
encolerizada e caprichosa.
D. João interrompe-a, tentando-a acalmar, cheio de benevolência e convencido da
mágoa da esposa:
D. João: Minha cara esposa… Pois se nem parais em casa! Como e onde quereis que eu
partilhe convosco os assuntos do Reino!! Andais sempre ocupada em mil e um motivos
para não me acompanhardes a lado nenhum… (disse-o com firmeza, mas também com
mágoa ou mesmo ciúme pela ausência da amada esposa).
D. Carlota: Injúria! Calúnia! Vós é que
nem dais pela minha presença, sou
sempre tão prestável… e sempre,
sempre muito fiel…
Eis que são interrompidos por D.
Maria que se dirige aos netos que
continuam a digladiar-se por baixo
da mesa:
Sandra S. Rodrigues 4
D. Maria: Meninos comportem-se. (Depois dirigindo-se aos
adultos presentes disse, deixem-se
dessas discussões e tu, ó João, relê-
nos o que nos pede Napoleão…
D. João tirou do bolso o decreto
conhecido por Bloqueio Continental e
começou a ler…
-“Artigo 1º - As ilhas britânicas são declaradas em estado de
bloqueio.
Artigo 2º - Todo o comércio e toda a correspondência com as ilhas britânicas são
proibidos.
Artigo 4º - Todo o armazém, mercadorias e propriedade, seja de que natureza for,
pertencentes a cidadãos ingleses são confiscados.
Artigo 6º - É proibido o comércio de produtos ingleses. Todas as mercadorias
pertencentes a Inglaterra ou provenientes das suas fábricas ou colónias são confiscados.
Artigo 7º - É proibida a entrada em qualquer porto de produtos quer da Inglaterra quer
das suas colónias.”
Terminou olhando os presentes com ar sério…
D. Carlota: Eu não digo que me ignoram totalmente…Porque é que não lês o raio da
carta de modo a que eu entenda, em vez desse folheado político escrito por homens e
para homens!!!
D. João: Olha… Eu li apenas o que está aqui escrito!!!
D. Carlota: Explica-me então melhor o que isso significa!!!
D. Maria (cansada das banalidades do casal, sobretudo da paciência do filho para
suportar os caprichos da esposa): O que nos é pedido, mais do que isso, nos é exigido, é
que cortemos relações comerciais com os nossos parceiros britânicos… Que lhes
fechemos os nossos portos.
D. João: Napoleão quer bloquear este feroz inimigo, a Inglaterra! Julga desse modo
enfraquecê-la!
D. Carlota: O quê!!!! E recusamos simplesmente os seus produtos!!! Mas isso é uma
injúria!
O s restantes assentiram que sim com a cabeça e D. Carlota, enquanto repreendia mais
uma vez os filhos que aproveitavam o tema enfadonho dos crescidos para continuarem
Sandra S. Rodrigues 5
na mesma saga de se chatearem um ao outro.
D. Carlota: onde poderei eu encontrar tão belos trajes!!! (disse, apontando andrajosa e
exibicionista as suas vestes produzidas e requintadas)?
É interrompida
D. Maria: Não vais ter esse problema mulher!!!
CENA II
PERSONAGENS: NAPOLEÃO, JUNOT, ALGUNS SOLDADOS
Napoleão reúne os seus soldados, aos quais comunica:
- Sabem que o meu sonhe é fazer de França o centro de um vasto e poderoso império,
daí a minha aposta, até agora bem sucedida em várias
campanhas militares. Até à data,o grande inimigo têm sido os
ingleses, a quem não encontro outra forma de aniquilar a não ser
pelo aniquilamento comercial, o que me parece ser o seu
calcanhar de Aquiles!!!
Foi interrompido por um soldado ingénuo que perguntou:
-O calcanhar de quem!!?
Os outros riram, mas ao ver o ar sério de Napoleão, calaram-se e
escutaram atentamente a resposta:
Sandra S. Rodrigues 6
- “Calcanhar de Aquiles” é uma expressão, meu soldado, significa o “ponto fraco”, pois
segundo a lenda foi por aí que a sua mãe o segurou enquanto o mergulhava numa água
que o tornaria invulnerável, porém ao segurá-lo pelo calcanhar, essa zona não entrou em
contacto com o líquido milagroso, entendido!!! Um bom soldado tem que ter a agilidade
da arma e também a do discurso! (Todos assentem com a cabeça). Napoleão, prossegue:
. Mas… Como eu estava a dizer, o comércio é o que garante o lucro aos britânicos, por
isso, se os conseguirmos isolar comercialmente, será essa a sua fraqueza, o seu
“calcanhar de Aquiles” (e olhou de soslaio para o soldado curioso à mercê da risada dos
restantes)… Assim , como é do conhecimento de todos, foi por mim decretado um
Bloqueio aos Ingleses, ao qual era suposto todos os países envolvidos obedecerem. Era
suposto recearem-me!!! Mas… Esses portugueses… Esses russos… Mas França será
um grande Império, daqui a uns séculos Einstein dirá “se podes imaginar, podes
conseguir!” e nada me vai deter dessa missão messiânica que me foi confiada. Esses
teimosos terão o que merecem… Começaremos pelos portugueses, Junot! (chamou e
um soldado deu um passo à frente a em jeito de obediência):
- Comandarás ordeiramente um exército de 30 mil militares e invade o território!
Junot: Certo, meu superior! Até tenho um plano sagaz…
Napoleão: Eu também, entrarás pela beira Baixa, com destino à capital… Lisboa.
Mostra-lhes a nossa força.
CENA III
D. MARIA, D. JOÃO, D. CARLITA, D. PEDRO, D.MIGUEL E ALGUNS CRIADOS
D. Carlota entra em casa atrapalhada,
parecendo esconder algo do seu marido que ia
passando no aconchego do lar uma tarde
quente de fins de Agosto. Fumava o seu
cachimbo, folheava o seu jornal e, de vez em
quando, não resistia a uma leve e breve
incursão pelo sono. Ao entrar, sua esposa
tenta discretamente sentar-se sem chamar a
atenção do marido, retomando o seu delicado
bordado que vai fazendo que faz sem
qualquer pressa de o ver terminado. O
marido, parece ter-se apercebido de mais uma
ausência sorrateira da esposa, mas não tem o que dizer, por isso, prefere fingir não se ter
apercebido de nada. Os filhos ao fundo da sala jogavam xadrez em incontido ruído.
Pedro: Batoteiro! Batoteiro! Era a minha vez de jogar!
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Miguel: Não, não era… Tu não sabes é perder!!!
Pedro: Eu!!!! Tu é que não suportas que eu te ganhe e, se não fosses batoteiro eu
ganhava-te sempre!!!
Miguel: Estou farto deste jogo!!!
São interrompidos pela avó que, entretanto entra na sala:
- Meninos! Que vem a ser isto!!!? Uma guerra fratricida ou quê!? Portem-se como deve
de ser… Lembrem-se de que são irmãos, não quero esse tipo de comportamento, muito
menos essa linguagem aqui na minha sala!
D. João: (dirigindo-se à mãe) Receio uma invasão por parte dos franceses! Ouvem-se
boatos de que não aceitam desobediências…Julgo que a invasão está para breve! É claro
que entrando no país, virão direitinhos para a capital procurar-nos a nós. Nem a ajuda
dos ingleses nos valerá de nada.
D. Maria: Ainda temos uma solução, meu flho!
D. João fez-lhe um olhar cúmplice:
- Está a pensar o mesmo que eu!!!?
D. Carlota que estava atenta à conversa, intromete-se
e em coro, dizem:
- Brasil…
D. João: Partiremos para o Brasil…
Pedro e Miguel: Vamos para o Brasil!?
Pedro: Mas porquê?
Miguel: Ao menos posso levar todos os meus pertences e os criados que já sabem como
me servir?
D. Carlota: Calma, meninos! Nós somos a Família Real! Levaremos tudo e todos
aqueles de que precisamos. O mais importante é colocar-nos a salvo dos franceses, sem
perdermos as comodidades que merecemos por ordem natural da divina providência.
Pedro: E os portugueses? Ficam aqui sem lei nem rei!!!? O meu mestre de “artes de bem
Reinar” está sempre a dizer que um bom rei tem que ter como principal preocupação os
seus síbditos!
D. Carlota: Não te preocupes! Não penses agora muito nas palavras do teu mestre, digo-
te eu que um bom rei tem que lutar pela sua sobrevivência porque da sua sobrevivência
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depende a sobrevivência do seu povo, por isso, tens que ter consciência das prioridades!
Impede o filho de dizer mais o que quer que seja.
Fazem as malas com a ajuda dos muitos criados.
Juntamente com eles partem para o Brasil.
D. João: Agora que está tudo a postos, vamos
rumo ao Brasil, a esses terras de “vera cruz”!
Aguarda-nos uma frota de quinze navios e de
dez mil pessoas…
D. Carlota: Claro… Lá não nos poderá faltar
nada!
Pedro: A quem fica entregue Portugal durante a nossa ausência?
D. João: Para essa missão encarreguei uma Junta de Regência com plenos poderes.
Assim que lá chegarmos a sede e capital do Reino passará a ser o Rio de Janeiro.
Pedro: Isso não faz de Portugal uma mera colónia…
A mãe converte-o ao silêncio com um safanão e apressam-se…
CENA IV
PERSONAGENS: NAPOLEÃO, SOULT, MASSENA, ALGUNS SOLDADOS
Napoleão encontra-se reunido com os seus
soldados, homens da sua inteira confiança.
Napoleão: Soult! Espero que tenhas um óptimo
plano para entrar nas
fronteiras lusas sem lhes
darmos hipótese de
resistência?
Soult: Tenho pois… Planeio
uma entrada pela zona Norte, pela cidade de Chaves, passando por
Braga e, lá para o fim do mês Março que agora se inicia, tenciono
tomar a cidade do Porto!
Napoleão: Pois bem, mas não penses que será fácil! Conta com o
melhor, mas prepara-te para o pior! Receio bem que cheguem
reforços ingleses para auxiliar os portugueses!
Tempos depois…
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Napoleão: Como sabem e, tal como eu previa, de Inglaterra chegaram reforços para
auxílio dos portugueses. Assim, o nosso camarada Soult vendo-se cercado pelos dois
exércitos e, de modo a salvar a sua vida e a dos seus súbditos, viu-se obrigado a retirar-
se para a Galiza. Confesso-vos que já não sinto a mesma força que antes me inspirava…
O armamento vai escasseando, mas não posso deixar de louvar e de agradecer
diariamente a Deus (agarrando-se a um crucifixo que trazia ao peito), eu e a minha
amada Josefina, a vossa eterna lealdade!
Dirigiu-se a Massena…
- Vamos investir numa terceira invasão da qual terás o comando!
Massena: Pois sim, meu respeitado superior! Entrarei em Portugal pela Beira Alta,
dirigindo-me para o Porto, passando pela cidade de Coimbra que dizem ser muito bela e
romântica…
Napoleão: (Interrompe o seu suspiro que despoleta as gargalhadas dos outros) Chega!
Chega! Esse linguajar não é próprio de um militar de minha confiança, nem tão pouco é
bom presságio para a nossa conquista!
O outro deixou os olhos ao chão, envergonhado…
CENA IV
D. MARIA, D. JOÃO, D. CARLITA, D. PEDRO, D.MIGUEL E ALGUNS CRIADOS
No Brasil: Num
ambiente que imita
delicada e nobremente a
mesma opulência de
Portugal, enquanto a
família passa mais um
tarde quente no
aconchego do seu
requintado lar,
envolvido nas tarefas do
costume, um criado
aproxima-se de D. João
entregando-lhe uma missiva, dizendo:
- De Portugal, Vossa Majestade!
Enquando D. João abre o invólucro, devidamente lacrado, os presentes olham-no em
silenciosa curiosidade.
D. Carlota: O que diz a carta, homem!
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D. João: Diz
que no
passado dia 24
de Agosto, na
cidade do
Porto, se deu
uma revolução
apoiada por
toda a
população do
Norte e que se
houvera
estendido,
mais tarde, a
Lisboa…
Todos ficaram estupefactos…
D. João: (Continuou) A Junta Governativa que lá deixamos foi então substituída por
uma Junta Provisória, a qual é suposto eu… Nós apoiarmos! Trata-se de uma junta de
homens partidários de ideias liberais.
D. Carlota: (interrompe-o) Mas nem pensar! Eu… Liberal?! Não é possível que aproves
tão grande barbaridade, João! Nós tivemos uma sólida e requintada educação
conservadora! Não te podes agora vender ao inimigo!!!!
D. João: (olhando para a folha na tentativa de que a esposa lhe permitisse continuar)
Pretendem… (foi novamente interrompido)
D. Carlota: Além de que voltar para Portugal está fora de questão! Agora que nos
afeiçoamos a este quente e acolhedor país, tão generoso em bens…
Pedro: É… Eu, pessoalmente gosto de aqui estar. Fiz muitas amizades!
D. João: (Ignorando o filho pela imaturidade e a mulher por extrema bondade de
carácter) Como eu ia a dizer… Pretendem convocar Cortes, a fim de que estas criem
uma Constituição! Portanto, é urgente que regressemos…
D. Carlota: E tu aceitas isso, nem questionas, homem! Nem ofereces resistência! A
nossa opinião não conta!? Permites que te roubem o poder que é teu por direito! Sempre
foi competência do Rei fazer as Leis, como permites que to roubem!?
D. João: (categórico) É urgente que voltemos!
Pedro: Eu fico! Diz-lhe que fico! Ficarei no Brasil como regente do Rei, afinal sou o
filho mais velho.
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D. João assentiu com a cabeça e prepararam o regresso…
D. Pedro: Tive um sonho em que este povo hospitaleiro me haveria de chamar
Imperador e Defensor perpétuo do Brasil. Algo me diz que receberei um título, o de D.
Pedro I. D. Pedro I soa bem!!!! (Disse vaidoso)
D. Miguel: Quem não quer continuar aqui sou eu! Alheio ao rumo indecente que
Portugal está a tomar. Não partilho nada, nada desses ideais liberais!
D. Carlota: Claro que não, meu filho (afagando-lhe a cabeça), nem poderias! É
indecente aquilo a que nos submetem! Dizes bem, vamos a Portugal acabar com essa
brincadeira de muito mau gosto que se está a impor no Reino! Vamos e estou certa de
que lá não faltará gente de muito bom senso para concordar
connosco e nos apoiar!
Preparam a viagem de regresso…