HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

Embed Size (px)

Citation preview

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    1/29

    c o l e o c u l t u r a o qu ?v o l u m e v

    Cultura como Rec ursoHelosa Buarque de Hollanda

    1

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    2/29

    Cultura como RecursoHelosa Buarque de Hollanda

    c o l e o c u l t u r a o q u ?v o l u m e v

    Secretaria de Cultura do Estado da BahiaSalvador, maio de 2012

    ??

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    3/29

    COPYRIGHT : 2012, by Souza Holanda, Helosa

    Direitos desta edio cedidos Secretaria de Cultura do Estado da Bahia.

    Permitida a reproduo total ou parcial, para fins no comerciais, desde que

    citada a fonte.

    Governador do Estado da Bahia

    Jaques WagnerSecretrio de Cultura

    Antnio Albino Canelas RubimMarcio Meirelles (2007-2011)

    Chefia de Gabinete

    Rmulo Cravo AlmeidaNeuza Hafner Brito (2009-2011)

    Diretoria Geral

    Emlia GonalvesRmulo Cravo Almeida (2007-2011)

    Superintendente de Desenvolvimento

    Territorial da Cultura

    Taiane FernandesAdalberto Santos (2011-2012)

    ngela Maria Menezes de Andrade (2007-2010)Superintendente de Promoo Cultural

    Carlos Paiva

    Diretor do Instituto do Patrimnio Artstico e Cultural

    Frederico Mendona

    Diretor do Instit uto de Radiodifuso Educativa da Bahia

    Pla Ribeiro

    Diretora da Fundao Cultural do Estado da Bahia

    Nehle FrankeGisele Nussbaumer (2007-2011)

    Diretor da Fundao Pedro Calmon

    Ubiratan Castro

    Ficha Tcnica

    Coordenao Editorial: Ana Paula Vargas

    Articulao e Promoo Instit ucional: Srgio Rivero

    Edio e Reviso: Ana Maria Amorim

    Diagramao:Taiane Oliveira

    H68c Hollanda, Helosa Buarque de

    Cultura como recurso / Helosa Buarque de Hollanda. Salvador :

    Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, Fundao Pedro Calmon, 2012.

    52 p. -- (Coleo cultura o qu ?, v. 5 )

    ISBN: 978-85-61458-52-2

    1. Poltica cultural. I. Ttulo.

    CDD: 306

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    4/29

    A coleo Cultura o qu?, linha editorial lanadapela Secretaria de Cultura da Bahia, busca apresentar acada volume uma reflexo sobre algumas das inmerasquestes que atravessam o campo cultural. Os textos,sistematizados em livretos, so frutos de pesquisas ouexposies de ideias feitas por autores destacados pelaatuao na discusso crtica e participao na rea cultural.

    Os textos trazem contribuies de diversas reas filosofia,sociologia, comunicao, literatura, economia, histria eso escritos com uma linguagem simples, possibilitandoque a leitura seja feita por um amplo pblico, comopesquisadores, artistas, estudantes, agentes culturais eprofessores. Permitindo respostas e, certamente, novasperguntas, os textos buscam provocar reflexes sobrecultura e polticas culturais. Conceitos, interpretaes,idias e prticas polticas so apresentadas de formasimples, contribuindo para que a discusso sobre a culturaganhe novos olhares e interpretaes.

    Aprese nt a o

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    5/29

    Usos da Cultura

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    6/29

    10 11

    I

    Cultura vem do latim colere que, na origem, apresentaos seguintes significados: habitar, cultivar, proteger ehonrar com devoo. S por a j se pode sentir a perigosadensidade desse DNA.. . Alm do DNA, o desenvolvimentohistrico da palavra cultura razoavelmente intrincado.

    Observando, separadamente, cada desenvolvimento dossentidos de colere, podemos ver que:

    o sentido de habitar do termo desdobrou-se em colonus,

    colnia, colonizar (simultaneamente a grande atraocom o grande risco das polticas culturais...); o sentido de proteger e honrar com devoo desenvolveu-

    se em culto, no sentido religioso, e em cultuar (outro alertapara algumas polticas culturais de traos mais populistas);

    o sentido de cultivar passa por crescer no sentido de

    crescimento natural, como resultado de um cultivo (novis mais evidente das polticas culturais implementadascomo prioritariamente educativas...).

    Apesar de apresentar direes diferenciadas, a trajetriados desdobramentos de colere, alm de sempre sinalizarum processo, um movimento de transformao, mantm,potencialmente, em seu sentido moderno, todas essasintrigantes sugestes originais: colonizar e/ou dominar,cultuar e/ou canonizar, promover o crescimento e/ou educar.

    S no sculo XIX possvel perceber uma razovel fixaodo termo cultura como usado hoje. At ento, conformeos compndios de histria da humanidade, havia uma ntidasuperposio entre as noes de cultura e a de civilizao.

    A primeira interpelao conhecida a respeito dessaambiguidade pode ser encontrada num texto clssico einacabado de Herder (Ideias sobre a Filosofia da Histriada Humanidade, datado de 1791). Nesse texto, Herderveementemente afirma:

    Nada mais indeterminado do que a palavra culturae mais enganoso do que seu uso indiscriminado para

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    7/29

    12 13

    todas as naes e perodos histricos. impor tante quecultura seja uma alternativa para civilizao, na medidaem que civilizao indica basicamente a supremaciacolonial europeia.

    E, numa inovao decisiva, sugere que no mais se digacultura, e sim culturas, no plural.

    Nessa apaixonada declarao de Herder emerge,subliminarmente, o movimento inicial de constituio deuma dinmica especfica e importantssima do processocultural do sculo XIX: ou seja, o papel da culturaenquanto principal formador e disseminador da noo detradio e identidade nacional.

    A respeito, lembro o impacto e a repercusso do clssicoensaio de Machado de Assis, Instinto de Nacionalidade,sobre nossa produo literria oitocentista. A conexocultura/identidade nacional, no sculo XIX, eraexperimentada como indiscutivelmente instintiva, naturale verdadeira.

    Sem me estender sobre esse momento nevrlgico daconstruo das histrias nacionais, registro o fato de que acultura como a essncia da identidade de regies, povos

    importante quea cultura seja umaalternativa para a

    civilizao

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    8/29

    14 15

    ou naes no se caracteriza como uma noo atemporal,eterna, natural, mas que, ao contrrio, construodiscursiva historicamente datada, que revela a demandapoltica de um contexto socioeconmico bastantedefinido - o perodo de consolidao e fortalecimento de

    uma geopoltica dos Estados-Nao.

    Vista sob essa perspectiva, a probabilidade de transformaodessa ideia a partir de novos processos ou conjunturashistricas fatalmente alta.

    Falo disso, aqui, no como uma digresso, mas para chamara ateno sobre as inmeras trans-formaes dos sentidos

    e da prpria funo social da cultura atravs dos tempos;como um alerta sobre a contingncia de seus significadose sobre a possibilidade de estarmos experimentando,neste momento, uma dessas grandes viradas, no s doprprio sentido, mas, sobretudo, da prpria funo socialda produo e do consumo cultural.

    Mas temo que o sculo XIX tenha mais alguns achadoshistricos ainda no mencionados aqui e que podem nosajudar. Por exemplo, um primeiro sinal de conflito emtorno do termo cultura, tal como vinha sendo utilizadoento, pode ser percebido no uso de Kultur, na Alemanha,

    significando o desenvolvimento da humanidade, vinda dabarbrie em direo liberdade, atravs de prticas deadestramento ou domesticao (sic).

    Esse sentido foi fartamente usado na propaganda alemdurante e aps a Primeira Guerra e comea a sinalizara construo moderna de cultura como uma prticaformadora, como associada noo de diviso de classes,como propriedade de uma elite, como produtora de umaforte distino entre a produo material e a produosimblica. Sendo, claro, esta ltima superior a toda equalquer forma de produo material.

    Seria interessante, a esta altura dessas observaes, quenos lembrssemos de que essa distino, em sua formamais radical, s se consolida no incio do sculo XX. Nose encontram sinais claros de critrios semelhantes naproduo e consumo dos produtos culturais em outrosperodos histricos, como demonstra o caso da epopeia,da tragdia e da comdia gregas, criaes no autorais ede consumo altamente popular, e que, at nossos dias, soconsideradas produtos exemplares da qualidade estticada cultura clssica ocidental. E, ainda, o caso do prestgiosocial e artstico da pera ou do folhetim oitocentistas,que, utilizando fartamente os novos canais modernos de

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    9/29

    16 17

    difuso, tinham como misso a fixao e a naturalizao daideia de uma identidade cultural nacional.

    Os modernismos da virada do sculo XIX para o XXso os grandes momentos da formalizao definitiva,sugerida por Andras Huyssens, de um grande divisorentre a cultura alta (que exige, para ser compreendida,um conhecimento superior e acessvel apenas a algunssegmentos sociais cultivados) e a cultura popular ou demassa (entretenimento), entendida como manifestaesinferiores ou de traos mercantilistas. O entendimentoda formao desse divisor de guas, to preciso quantointolerante, como marca distintiva da ideia de culturamoderna, hoje um dos debates centrais das teoriascrticas contemporneas.

    Chamo ateno para a idia de divisor. A traduo daexpresso divisor cumeeira, o ponto de encaixe naparte mais alta da estrutura dos telhados. A cumeeira,em portugus, tambm chamada de divisor de guas.O que importa na ideia aqui que a cumeeira existe paradividir o peso das guas: metade induz as guas da chuvaa seguirem uma direo, a outra metade a seguirem nadireo oposta. No h nenhuma forma de comunicaoentre estas duas (ou quatro) guas.

    Assim, Huyssens define a ideia de cultura, a noo decultura desenvolvida pela ideologia modernista, comoum grande divisor entre uma cultura alta e uma culturade massa ou popular, coisa que no havia antes, nem naGrcia, nem na Idade Mdia, perodos nos quais a prticae a produo da cultura era de feitio comunitrio, pocasnas quais a prpria ideia de cultura no era cultuadanem investida de nenhum sentido cannico comoocorre na cultura moderna. Esse divisor, bem como aconsolidao da cultura numa esfera autnoma, definem-

    se como uma das caractersticas mais marcantes damodernidade, em como comprova seu carter histricoe contextual interpelando alguns consensos residuais queainda experimenta a noo moderna de cultura como aexpresso mesma da essncia de sua natureza.

    Foi aos poucos que, nas dcadas finais do sculo XX,comeamos a assistir, inseguros, ao advento de uma ondagigante: um processo radical de desestabilizao dasgrandes narrativas e dos grandes divisores culturais damodernidade. O advento de um fenmeno batizado pelostericos da cultura como a culturalizao do espao dacidade. Ou seja, a propagao e hibridizao das formasculturais na nova densidade da textura urbana. Os museusse repensam, as cidades se tornam grandes museus

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    10/29

    18 19

    histricos, a cultura de massa se sofistica, a de elite procuranovas estratgias para acelerar o acesso e a democratizaode seu consumo. A chamada cultura popular comea aser atrada para novos mercados e demandas nacionaise internacionais. Como se no bastasse, os processos detransnacionalizao do mercado cultural da dcada de 90definem uma dinmica totalmente nova e inesperada paraa produo e circulao dos produtos culturais.

    Nesse quadro, a economia da cultura , dos mercadosemergentes, um dos apontados como dos maisimportantes e promissores do incio do sculo XXI.Alguns tericos, inclusive, j definem nossa poca comoa era do capitalismo cultural e da era do acesso. Ou seja,partem da evidncia do poder e da fora econmica nestesculo dos grandes aglomerados transnacionais como,por exemplo, a Sony, que agregam a cultura, a informaoe os meios de comunicao e que hoje detm uma parteenorme do capital global.

    Portanto, estamos diante de uma nova noo, noapenas da cultura, mas tambm de sua posio nomercado capitalista. O lugar da cultura, antes uma esferaautnoma da produo e restrita a poucos, hoje o centroda economia global e, de certa forma, acessvel seno a

    Estamos diante deuma nova noo, noapenas da cultura,

    mas tambm de suaposio no mercado

    capitalista

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    11/29

    20 21

    todos, pelo menos a uma frao bastante significativade diversos segmentos sociais. Em termos conceituais,portanto, a noo de cultura e seus usos inserem-se de

    maneira decisiva nesse novo quadro de culturalizao,economia da cultura ou melhor, economia criativa, direitoao conhecimento e ao livre acesso cultura. A antigaideia de arte e cultura para transcendncia, para um fimem-si ou para fins no instrumentais emigra para novas

    direes e funes sociais da arte e da produo culturalmais abrangente.

    Aqui, vou pensar um desses novos usos da cultura,particularmente interessante, que a noo de culturacomo recurso usada tanto pela indstria culturale aparelhos culturais, quanto pelas periferias. Naperspectiva dos aparelhos culturais bastante ingnuopensar que, por exemplo, a criao de um museu ou acompra de uma nova coleo para os museus no vai estardiretamente contribuindo para o PIB desta cidade. O novoquadro da cultura como uma potente indstria criativadefine sua insero direta na economia de uma cidade oumesmo de um pas. Entretanto, a noo de cultura comorecurso no vem sendo apenas um fator potencializadordo chamado capitalismo cultural.

    Cada vez mais vemos a cultura dinamizando a criatividadeno campo das artes e das letras para gerar uma srie deresultados culturais, sociais, polticos e econmicosbastante concretos.

    importante observar que o crescimento da pobrezaperiurbana, aglomerada em comunidades informais edesconectada da vida poltica e cultural da cidade tradicional a nova face radical da desigualdade. Neste quadro,surpreendentemente, a cultura comea a se revelar como uminstrumento eficaz de transformao social.

    Os ltimos cinco anos do sculo XX no Brasil foramsurpreendidos por um fato, aparentemente novo, queprenunciava algumas desestabilizaes inditas no quese convencionou chamar de cultura moderna. Falo daproduo cultural das periferias e favelas das grandescidades que, neste momento, comea a se afirmar e sedeslocar progressivamente em direo ao centro, ganhandovisibilidade atravs da imprensa e da indstria cultural.

    Ainda que este, como em geral todos os processosculturais que surgem com fora substantiva, j viessedando sinais esparsos de atividade desde os anos 1980,foi realmente a partir do incio dos anos 1990 que a

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    12/29

    22 23

    cultura da favela comea a se definir e, principalmente, ase auto nomear com mais clareza. A rpida expanso desseprocesso consolida as prticas do uso da cultura comorecurso, no sentido de promover a autoestima, a geraode emprego e renda e a incluso social nas periferias epopulaes de baixa renda das grandes cidades.

    Vou descrever aqui duas frentes de enfrentamento polticoatravs da cultura, extremamente bem-sucedidas: o hip-

    hop e a literatura marginal.A cultura comeaa se revelar comoinstrumento eficaz

    de transformaosocial.

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    13/29

    24 25

    O Engajamento Hip-Hop

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    14/29

    26 27

    II

    fato notrio que o debate sobre raa no Brasil sempre foiprejudicado por fatores complicadores como a dificuldadeem priorizar as questes raciais diante das demandasrelativas s desigualdades de classe, ou at mesmoenfrentar as formaes discursivas identitrias nacionais,que sempre minimizaram a existncia do forte racismoque pode ser facilmente identificado na experincia socialdo nosso dia a dia.

    bem verdade que, a partir de 1988, ano do centenrio daAbolio da Escravido no Brasil, houve um crescimentoquantitativo e qualitativo desse debate e uma maiorvisibilidade das demandas especficas raciais. Assimmesmo pode-se dizer que, apesar dos avanos concretos

    que o ativismo racial no Brasil obteve, at hoje nunca

    chegamos a formar uma massa crtica e poltica compoder de presso suficiente que fizesse jus ao percentualde negros e pardos da composio da sociedade brasileira.Nossas polticas raciais, de uma forma ou de outra,sempre se mostraram polmicas ao serem encaminhadas.Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, aquesto do racial volta tona agora num vasto debateem torno da introduo ou no de uma poltica de cotasno pas. O debate esquenta e chegamos, com maiormaturidade, ao centro da questo at ento tratada apenaspassionalmente: qual a fora real do racismo no Brasil?Intelectuais dividem-se, ativistas tambm. Queremos um

    Brasil bicolor, no modelo norte americano, com todasas suas consequncias segregacionistas, ou queremosinvestir nas lgicas e estratgias de sobrevivncia racialativas e operantes desde o perodo escravocrata no pas?As opinies se dividem, ativistas, polticos e intelectuais seconfrontam, e a questo permanece em aberto.

    Entretanto, correndo por fora, as novas geraes negrasagregadas em torno do hip-hop enfrentam a questo

    racial com um novo tom e com uma atitude diferenciadados embates raciais anteriores. Elegendo novos mitos erecebendo uma forte influncia do reggae jamaicano e dohip-hop norte-americano, estes jovens ativistas mostram

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    15/29

    28 29

    uma abertura de carter mais internacional e cultural paraa questo da discriminao racial.

    O campo de operaes eleito por estes movimentosjovens a militncia nas artes, com forte compromisso detransformao social. Inovam, ainda, na ampliao desteengajamento, na direo do enfrentamento das questesda excluso e das desigualdades sociais sofridas pelaspopulaes de baixa renda, na sua maioria composta pornegros, pardos e imigrantes.

    Uma nova gerao de negros, portanto, elege atividadeou atitude artstica (como chamada) como forma deinterveno poltica e experimenta essa intervenosimultaneamente como arte e como forma detransformao do cotidiano de suas comunidades.

    O locus mais significativo de operao desta juventude o hip-hop, gnero artstico que engloba cinco formas

    de expresso: os MC, o Rap, a Break Dance, o Graffiti eo Conhecimento. Vou explicar rapidamente este ltimo,tambm chamado de o quinto elemento, porque umcomponente importante e relativamente novo no hip-

    hop brasileiro.

    Um fator estruturante da esttica hip-hop a

    questo do ativismo, da conscincia de sua histria ,da afirmao da histria de uma cultura local e desuas razes raciais, o que gera a necessidade da buscade informao e de conhecimento.

    O conhecimento orgnico seja acadmico ou no passa ento a ser valorizado e experimentado como parteintegrante da cultura hip-hop, legitimando alguns de

    seus atores como as vozes da periferia. A maioria engaja-

    se no conhecimento e na preservao de sua histria,assim como na afirmao e nas demandas raciais strictosensu. bastante frequente a insistncia na importnciaestrutural do conhecimento. Por exemplo, como registraJssica Balbino, Zulu King Nino Brown representante daZulu Nation no Brasil reitera que no h hip-hop sem

    conhecimento, sem a leitura e sem a escrita. No campoda literatura marginal, parte ativa do movimento hip-

    hop, essa premissa ainda mais central e explcita comodiscutirei mais adiante.

    Estes novos intelectuais afirmam-se cada vez mais no

    espao pblico em entrevistas para a mda, apresentandointervenes em seminrios e congressos nacionais einternacionais e mesmo produzindo trabalhos acadmicos

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    16/29

    30 31

    A nova conscincianegra no feitanecessariamente

    por lderes

    e teses universitrias. No espao pblico, afirmam-se

    vozes como o Mano Brown, MV Bill, Ferrez, Jos Junior(criador do AfroReggae), Marcos Vincius Faustini, GutiFraga, Srgio Vaz, Alessandro Buzo, DJ Marlboro, entreuma lista supreendentemente extensa.

    Entretanto, importante observar que a nova conscincianegra no feita necessariamente por lderes. Ela atuatambm em grupos, toca na emoo, vende um estilo devida, gera recursos sem depender das verbas do governo.Nesse quadro, o rap ganha a funo de um sacerdciocuja misso fundamentalmente poltica e de naturezatransformadora e conscientizadora. Mano Brown, cujaliderana indiscutvel, no poderia ser mais claro aoafirmar: O rap no arte, arma.

    Talvez para minimizar o forte potencial poltico do hip-

    hop, uma das crticas frequentes que feita a estasmanifestaes no Brasil a acusao de seu carteramericanizado, que nada teria a ver com nossa culturade raiz.

    No resisto em abrir aqui um parnteses sobre oparentesco desta acusao com aquela que se fazia aomovimento negro nos anos 1960/1970, igualmente

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    17/29

    32 33

    O rap ganha a funode um sacerdciocuja misso

    fundamentalmentepoltica.

    acusado de no ter nada a ver com o Brasil e de ser umaimportao norte-americana.

    Fecho o parnteses e prossigo com duas observaessobre o carter dito no brasileiro do hip-hop local. Uma

    sobre a interpelao feita por estes movimentos prprianoo de cultura nacional. A raiva e a fora poltica quemarcam a dico hip-hop parece vir no de um suposto

    modismo importado, mas da conscincia de ser umgnero que congrega e articula um frum supranacionalde jovens negros e pobres que empunham a bandeira daresistncia. Digamos que o hip-hop poderia ser visto como

    uma espcie de esperanto musical dos excludos em buscade formas alternativas de organizao supranacionais ouglobalizadas. Visto por este ponto de vista, o hip-hop ecoa

    um pouco o tom e a lgica mais elitizada dos novos FrunsSociais Mundiais.

    A segunda observao vem do carter ecltico da formarap no Brasil. Do ponto de vista rtmico, o rap nacional a fuso do gnero nascido na Jamaica e criado nos guetosde Nova Iorque com o som dos subrbios e morrosbrasileiros, sem privilegiar especificamente nenhumadestas batidas ou levadas.

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    18/29

    34 35

    Do ponto de vista de uma maior ou menor nfase poltica,algumas adaptaes tambm foram produzidas. Porexemplo, existe uma variao bastante eloquente nosentido da sigla rap. Em ingls, rap significa a abreviaode Rhythm & Poetry. Na traduo para o portugus, rappassou a ser a abreviao de Ritmo, Atitude e Poltica.(outra sigla, a MPB, usada para definir o novo status daMsica Popular Brasileira a partir dos anos 1960, agora usada como a Msica Preta Brasileira).

    Entre seus praticantes, a atitude hip-hop chamada de

    revoluo gangsta, cuja meta construir algum sentidode comunidade no quadro de violncia e misria davida na periferia urbana. Um dos eixos deste projeto detransformao social a priorizao da ao eficaz epedaggica, em lugar do confronto agressivo.

    Um dos recursos tticos mais utilizados pela polticahip-hop a divulgao intensiva da informao, seja ela

    sobre as demandas raciais e sociais de seus integrantes,seja simplesmente para contar ao mundo como a vidados negros na favela, como declarou recentemente NegaGizza, a militante rapper e uma das coordenadoras daCUFA (Central nica de Favelas).

    Como exemplo, podemos pensar no caso MV Bill quepromoveu uma exibio impactante, no programaFantstico, da Rede Globo, horrio nobre dos domingos nateleviso brasileira. Esse clipe, Soldados do Morro, partede um projeto mais extenso de MV Bill e Celso Athayde,revelou, em rede nacional, atravs de imagens chocantes,o drama de adolescentes, armados de metralhadoras,trabalhando nas bocas de fumo. Denncia importante,na medida em que 90% do trabalho no trfico feito pormenores a partir dos 9 anos. Esta exibio, que provocouuma comoo nacional, colocou o problema da altaincidncia de menores no trfico na agenda cultural epoltica do pas, e comprovou a importncia do trfico deinformao como chamada a disseminao de notcias edados sobre a vida nas comunidades de baixa renda.

    Hoje, so milhares de grupos espalhados pelo pas,dando o tom deste novo perfil poltico da negritudeque conseguiu dar condies de visibilidade real sreivindicaes raciais no Brasil.

    Por outro lado, praticamente todos os projetos sociaisdesenvolvidos pelo hip-hop reivindicam o direito ao

    conhecimento, identificado como uma das grandescarncias das populaes pobres e fator estratgico

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    19/29

    36 37

    para qualquer projeto de transformao social e aviabilizao do acesso cultura, vista, sobretudo, comoum direito cidado.

    importante observar que a militncia poltica aqui passade uma lgica reativa, tradicionalmente de resistncia eoposio, para uma lgica predominantemente proativade ao imediata, ainda que demais localizado emterritrios especficos, o que certamente no comprometeseu alcance geopoltico.

    Alguns exemplos bem-sucedidos podem ser citados como

    o AfroReggae ou como os irmos MV Bill e Nega Giza,militantes da CUFA, onde lutam e praticam o rap comomeio de divulgao das condies precrias da vida dosnegros nas favelas. Nega Gizza tem dois programas derdio bastante agressivos e foi a primeira mulher a ter umprograma desse tipo em rdio FM.

    No quero fechar o assunto hip-hop sem mencionar

    um fenmeno dentro do fenmeno, que a atuaofortssima das mulheres nessa rea. So muitas TatiQuebra Barraco, Nega Gizza, Ana Cristina, Mnica,

    Kelly, Danielle e outras. Elas se dividem em rappers,de dico extremamente politizada, e as funkeiras, de

    atitude rebelde. Entre estas ltimas ressalta-se a pioneira

    Tati Quebra Barraco, a primeira mulher a despontar no

    batido antes dominado pelo marmanjos.

    A performance de Tati cujo Quebra Barraco uma

    gria da periferia que significa o ato da relao sexual , seduz e incomoda. Ela entra no palco, grita o bordoJesuuuuuuus, e, como numa metralhadora giratria,dispara frases de alto teor sexual, rompe preconceitos,pede igualdade entre homens e mulheres e leva,invariavelmente, o pblico do baile funk ao delrio. Tati,vista como uma feminista sem cartilha, pertence aomundo das cachorras, tchutchucas e popozudas.Fala de sexo sem romance e pede igualdade entre homense mulheres.

    Na vida privada, Tati, residente na Cidade de Deus, nuncaaparece em entrevistas, casada, me de 3 filhos entreeles uma recm-nascida conhecida como Mila (Cristina)

    Quebra Berrio e, segundo ela mesma, esposa e dona

    de casa dedicada. No palco, se transfigura na mulherfuraco que emite gritos de guerra. Tati, modelo dasdemais funkeiras, faz o gnero cachorra com atitude,que grita o que no pode e se vangloria de seu poder.

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    20/29

    38 39

    fcil prever as polmicas geradas pela atitude eapresentaes das funkeiras entre as feministas.Principalmente pela retrica indiscutivelmente machistade suas letras e performances. Um movimento paulista,o Geleds, promoveu um trabalho com estas mulheressobre o machismo e o reacionarismo de suas letras elinguagem corporal. Isso promoveu um debate importanteentre as mulheres do funk, centrado numa agenda dequestes feministas. Esta iniciativa, certamente, deu aelas mais conscincia sobre o que cantavam, mas noconseguiu mudar a direo de seus trabalhos. Convictasde que no estariam apenas invertendo a situao doethos machista, Tati e suas seguidoras prosseguiram como que sentem como sendo um apoderamento crtico damisria e da brutalidade sexual do entorno de suas vidas.A estas se opem as rappers, lideradas por Nega Gizza,de igual impacto comunicativo e sucesso de pblico,cujo rap no lana mo de palavres nem dos recursos dodiscurso sexualizado para atrair o pblico. Gizza rejeita ofunk que considera machista, bem como o rap americano,que chama de babinha music, em contraste com o rapnacional, que seria um rap de compromisso poltico esocial. Gizza se define como uma militante hip-hop 24

    horas por dia, bem como feminista que luta contra o papelde mulher objeto e a favor da mulher negra revolucionria.

    Seja Tati, manipulando o sistema, seja Giza, guerreira,empunhando a bandeira da mudana, seus gritos deguerra e seus desabafos, o certo que ambas sinalizamque algo de importante est no ar e comea a promoverdebates e aberturas polticas decisivas para as mulheres debaixa renda.

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    21/29

    A Literatura ma rg inal

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    22/29

    42 43

    A literatura tambm no ficou imune aos novosinputs. da tradio da srie literria brasileira, umaateno significativa aos temas da misria, da fome, dasdesigualdades sociais e, ultimamente, da violncia urbana.So tambm da nossa tradio cultural o engajamentopoltico e o compromisso social do intelectual, neste caso,do escritor. Um detalhe interessante no conjunto de nossaproduo literria o fato de que, ao contrrio de nossosirmos latinoamericanos, nunca tivemos o testemniocomo gnero literrio. O que quer dizer que o escritorsempre foi o sujeito do discurso sobre o pobre e o excludona literatura brasileira.

    Em 1997, entretanto, nosso Mundo das Letras foisurpreendido pela publicao de uma obra de fico que,

    III em pouco tempo, se tornaria um dos maiores best sellersbrasileiros dos ltimos tempos. Falo de Cidade de Deus,de Paulo Lins, hoje com 18 edies de alta tiragem etraduzido em inmeros pases.

    Paulo Lins trouxe uma varivel totalmente imprevistanos nossos crculos literrios: o pobre tem voz e pode atescrever; e mais ainda: escrever um livro de sucesso depblico e de crtica.

    Em 2000, surge um novo livro de igual importncia, ainda

    que de repercusso distinta da de Cidade de Deus. Trata-se

    de Capo Pecado, de Ferrz (nome de guerra de ReginaldoFerreira da Silva). Capo Pecado traz um refinado retratode Capo Redondo, um dos bairros de maior ndice deviolncia, trfico de drogas e criminalidade de So Paulo,onde Ferrz cresceu e mora at hoje. Seus mais de 200

    mil moradores no contam com redes de esgoto, nemhospitais, nem assistncia de nenhuma espcie. Caporegistra a marca sangrenta de 86.39 assassinatos a cadagrupo de 100 mil habitantes, muito mais que a mdianacional que j estratosfrica para os padres europeus.

    Este livro mostra uma integrao bem maior com ouniverso hip-hop do que seu antecessor, Cidade de Deus.

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    23/29

    44 45

    Mesmo que no contasse com uma estrutura rtmica emusical organizada como a que encontram os rappers,Ferrz tomou como referncia as letras dos raps, com seumisto de crnica do gueto e convocao dos manos paraa ao. Um ponto de partida bastante diverso do cnoneletrado. No livro, temos a presena de Mano Brown (lderdo grupo de rap Racionais MCs, tambm residente deCapo Redondo), que comanda as epgrafes de cadacaptulo do livro. Os dois, juntos, tornaram-se, da em

    diante, grandes lderes comunitrios e forte refernciapara jovens sem perspectiva.

    O segundo livro de Ferrz, Manual Prtico do dio, maisagressivo do que o primeiro, descreve o impasse de umagerao que no mede consequncias para buscar o queno teve (sic). Uma gerao marcada pelas sequelas deixadaspelo Estado e pela intensidade do impacto da mdia.

    O que surpreende na leitura dos livros de Ferrz a inversodo lugar da violncia. Em vez de ser tema da narrativa, aviolncia apenas a condio de vida de personagenscomuns que, como ns, tm emoes, prezam a famlia,amam, tm cimes, fazem sexo e sonham com um futuromais tranquilo. Isso um choque para o leitor que novive nos cenrios do crime, e termina promovendo uma

    O que surpreendena leitura de Ferrz

    a inverso dolugar da violncia.

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    24/29

    46 47

    forma de identificao ou, pelo menos, entendimento, dopersonagem agressor, ainda no conhecida na nossa literatura.

    Estou fazendo essas observaes, aparentemente de naturezapuramente literria para reforar a funo do uso da escrita edo texto ficcional como instrumento fundamental para, emprimeiro lugar, produzir uma literatura orgnica que por si sgera o interesse e se torna uma espcie de agente de leituranas comunidades, e ainda como um canal expressivo para darvisibilidade vida social das comunidades de baixa renda, umdos propsitos das polticas de uso da cultura como recursonas prticas hip-hop.

    A misso poltica da literatura marginal traduzum empenho radical dos autores em termos docompromisso com a transformao social. Comoexemplo, cito um caso sintomtico.

    Com o sucesso e repercusso de sua literatura, Ferrzrecebeu convite de bolsa para estudar literatura numauniversidade americana. Para surpresa geral, no aceitao convite. Esta recusa se estende para a oferta de umprodutor norte-americano que tenta comprar os direitos

    de Capo Pecado para o cinema. Ferrz, em entrevistapara os jornais, esclarece: Escrevo para ser lido pela minhacomunidade. Meu lugar aqui. Minha guerra essa.

    Comprometido com essa guerra, Ferrz cria, ainda comMano Brown, o movimento 1 DASUL, uma usina culturalque, entre outras atividades, tem um selo musical prprioe uma grife de moda chamada Irmandade. Hoje, sua grifej ocupa um galpo de 200 m2, alm de mais duas oficinas,produzindo uma mdia de 300 peas por dia. A grife, quese caracteriza por ilustraes que denunciam o sistema,tem uma loja no centro de SP e sua produo distribudapara sete estados brasileiros, alm de deter os direitosde distribuio das marcas de seis grupos de rap. A grifeIrmandade confecciona tambm cartilhas mensais paraum programa contra drogas e pretende abrir uma clnicapara tratamento de dependentes. No mesmo embalo,Ferrz organizou dois nmeros especiais da Revista CarosAmigos chamados Literatura Marginal que renem edivulgam escritores da periferia, abrindo espao paranovos talentos locais.

    Outras lideranas se firmam nesse quadro. O fenmenoCooperifa (Cooperativa Cultural da Perifer ia) exemplar.A Cooperifa promove aes culturais de artistas daperiferia para a periferia. Criada e coordenada pelopoeta Srgio Vaz, a Cooperifa rene, todas as quartasfeiras, no Bar do Z Batido, na Chcara Santana, cercade 400 pessoas de comunidades da periferia em torno

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    25/29

    48 49

    A Cooperifa aboca de livro das

    quebradas.

    da poesia. So os j histricos saraus da Cooperifa. L seapresentam poetas e so realizadas leituras de poemasconvivendo em plena harmonia com as declamaesda poesia rimada, nome literrio dos raps falados,sem interveno do ritmo e da msica de suas versesoriginais. So ainda organizados inmeros eventoscomo Poesia no Ar, quando todos enviam poesias,mensagens e protestos em bales de gs, inundandoos cus de So Paulo ou a Chuva de Livros, distribuioperidica de 500 livros para o pblico que comparecevido ao evento. Outros eventos, como o Cinema naLage, que, quizenalmente, promove a exibio defilmes; o Poesia contra violncia, que percorreuescolas de So Paulo, ou a Antropofagia Perifrica,mais conhecida como a Semana de Arte Moderna daPeriferia, marcam a atuao de sucesso da Cooperifa.Como define Sergio Vaz, a Cooperifa a boca de livrodas quebradas.

    A partir dos encontros, foi publicado o livro Rastilho dePlvora, com 43 autores, e o CD Sarau da Cooperifa, entre

    outros desdobramentos.

    Sobre os saraus, diz o poeta: os saraus tm uma caractersticasingular, so feitos nos bares da periferia, ou seja, por mais

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    26/29

    50 51

    conhecido que fique, por conta da mdia, ainda assim seusprotagonistas continuam morando na comunidade, fincandoe ficando referncia para os moradores.

    Srgio Vaz tem vrios livros publicados, entre eles Subindo aLadeira Mora a Noite, A margem do Vento, Pensamentos Vadios,A poesia dos Deuses Inferiores, e Colecionador de Pedras .

    Outra importante liderana o escritor Alessandro Buzo,autor dos livros Suburbano Convict, O Cotidiano doItaim Paulista, O TREM - Contestando a Verso Oficial;

    Guerreira; e organizador dos trs volumes da coletneaPelas Periferias do Brasil.

    Buzo criou e coordena o evento peridico Favela TomaConta, composto de saraus e shows de rap, dirige o episdionibus do Buzo, do programa Manos e Minas que vai aoar pela TV Educativa, alm de coordenar atividades emtorno de sua livraria, Suburbano Convicto, onde vendelivros, CDs, e acessrios como bons e camisetas, e ondeocorrem encontros com autores, lanamentos de livros edebates sobre a literatura da periferia.

    O recente e impactante fenmeno da literatura marginal,que vem potencializando o fazer literrio e a prtica da

    leitura como um recurso eficaz para a incluso social, assim definida pelo poeta Srgio Vaz: A literaturaperifrica um movimento novo que surge na periferiaque no prope s um novo escritor, mas tambm umnovo leitor. Uma literatura mais prxima da realidade quevivemos. Uma literatura com menos crase, menos pontoe vrgula, mais ainda assim literatura. A literatura comoaprendizado. Um poeta que sai do casulo e se alia suacomunidade, sem municpio, e ao seu pas. Um artista-

    cidado. Ao que eu acrescentaria: a literatura marginalou perifrica a real descoberta dos infinitos recursosda palavra enquanto poder e mesmo enquanto arma. Aaplicao potica e poltica desta descoberta.

    O que procurei mostrar aqui foi como, bem longe dapoca em que cultura significava cultuar ou cultivar,vemos em diversos setores da cultura o desenvolvimentode estratgias e diferentes usos das prticas culturais quecomprovam que a arte apenas a ponta do iceberg doque se pode entender como cultura. Salta aos olhos que averdadeira cultura , sobretudo, o alavancar da criatividadecoletiva. A questo que comea a ser respondida ,como tentei apontar neste texto, o como dinamizaressa criatividade para conter o avano da produo dedesigualdades no panorama da globalizao.

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    27/29

    52 53

    Professora Titular de Teoria Crtica da Cultura da Escolade Comunicao e Coordenadora do Programa Avanadode Cultura Contempornea do Forum de Cincia eCultura, ambos da Universidade Federal do Rio deJaneiro. diretora da Editora Aeroplano e consultoradO Instituto de Projetos e Pesquisa. Sua atividade de

    pesquisa privilegia a relao entre cultura e poltica,trabalhando especialmente nos campos tericos da teorialiterria e dos estudos culturais. Sua pesquisa dedica-ses reas de poesia, relaes de gnero, relaes tnicas,culturas marginalizadas e as questes colocadas pelonovo quadro econmico, poltico e cultural dos processosde globalizao e desenvolvimento tecnolgico. autorade muitos livros, entre eles Macunama, da literaturaao cinema, 26 Poetas Hoje e O Feminismo comoCrtica da Cultura. Possui graduao em Letras Clssicaspela Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro(1961), mestrado em Letras (Cincia da Literatura)pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1974)e doutorado em Letras (Cincia da Literatura) pela

    Universidade Federal do Rio de Janeiro (1979).

    Perfil

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    28/29

    O projeto grfico dste livro foi composto no Estdio

    Quimera por Ians & Inara Negro para a Secretaria deCultura do Estado da Bahia, em Salvador. Sua impresso foi

    feita pela Grfica Esperana em papel reciclato, capa 120 g/

    m2, e miolo 90 g/m2.

    Possui o formato 11x15 cm. A fonte de texto DTL

    Documenta Sans. Os ttulos e apoios foram compostos

    em DTL Documenta, famlia tipogrfica projetada por

    Frank Blokland.

    ??

    COLEO CULTURA O QU?

    Vol. I - Cultura e Democracia - 2009

    marilena chau

    Vol. II - Cultura e desenvolvimento em umquadro de desigualdades - 2009

    Marta Porto

    Vol. III - Cult ura e Municipaliz ao- 2009

    Cludia Leito

    Vol. IV - Cultura como R ecurso -2012

    Helosa Buarque de Hollanda

    Vol. V - Linguage m, educao e cultura: leituras - 2012

    Eliana Yunes

    Vol. VI - Panorama das Polticas Cult uraisno Brasil: Prticas e Anlises - 2012

    Antonio Albino Canelas Rubim

  • 8/12/2019 HOLANDA, Heloisa Buarque de - Cultura Como Recurso

    29/29

    Linha editorial da Secretaria de

    Cultura da Bahia voltada para

    apoiar processos de capacitao

    e disseminar ideias e conceitos

    contemporneas de cultura.