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1 ID Nº 82 ÍNDICE DE INTEGRIDADE BIÓTICA PARA A COMUNIDADE VEGETAL EM RESERVATÓRIOS E BACIAS DE CONTRIBUIÇÃO NO ESTADO DE MINAS GERAIS Sylvia Therese Meyer 1 , Aylton Carlos Soares 1 , Helena Lúcia Menezes Ferreira 1 , Márcia Couto de Melo 1 , Mariana d’Ávila Fonseca de Paula Freitas 1 , Pedro Cordeiro Fialho 1 & Marcela David de Carvalho 2 1-Instituto SENAI de Tecnologia em Meio Ambiente - SENAI FIEMG. [email protected]. 2-Companhia Energética de Minas Gerais. RESUMO Foram estudados três reservatórios e suas bacias de contribuição: Peti - (Ecorregião Mata Atlântica Sudeste-MA), Cajuru e Rio de Pedras (Ecorregião São Francisco-SF), Minas Gerais. As comunidades vegetais consideradas foram macrófitas aquáticas e espécies das margens. O levantamento da vegetação foi realizado em áreas de 50 x 5 m. Com resultados da florística e observações de campo foram elaboradas métricas para o índice de integridade biótica (IIB). O índice de distúrbio (IDI) utilizou características ecohidromorfológicas e pressões. As métricas elaboradas somaram 70 (59 lênticos, 65 lóticos). As métricas selecionadas para as bacias de contribuição de SF foram riqueza total (%), riqueza de angiospermas (%) e riqueza de samambaias (%). O IIB variou de 0,00 a 90,30 e a correlação entre o IIB e o IDI foi R²= 0,34698280. Os maiores valores de IIB coincidiram com áreas de maior proteção por florestas ripárias e os menores com supressão quase total da vegetação. Somente cobertura nativa de espécies arbustivas (%) foi selecionada para integrar o IIB na MA. Os valores do IIB variaram de 0,0 a 100,0 e análise de regressão IIB e IDI foi R²= 0,3079. As métricas selecionadas para os reservatórios de SF foram presença de Polygonum ferrugineum e número de espécies com maiores frequências. Esses dois atributos indicam relação positiva com maior nível de degradação ambiental. O IIB variou de 0,0 a 100,0 e a análise de regressão entre IIB e IDI foi de 0,4607. Uma métrica foi selecionada para a construção do IIB para MA: presença de Urochloa sp., sua ocorrência é indicadora de perturbação. O IIB variou de 0,0 a 100,0. A análise de regressão mostrou correlação R²= 0,7108 entre IIB e IDI. O estudo demonstrou potencial para utilização de plantas para o IIB. Suas respostas podem ser aplicadas em sistemas aquáticos e seus entornos. Palavras-chave: Bioindicadores, macrófitas aquáticas, ecossistema ripário.

ID Nº 82 ÍNDICE DE INTEGRIDADE BIÓTICA PARA A …

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ID Nº 82

ÍNDICE DE INTEGRIDADE BIÓTICA PARA A COMUNIDADE VEGETAL

EM RESERVATÓRIOS E BACIAS DE CONTRIBUIÇÃO

NO ESTADO DE MINAS GERAIS

Sylvia Therese Meyer1, Aylton Carlos Soares

1, Helena Lúcia Menezes Ferreira

1, Márcia

Couto de Melo1, Mariana d’Ávila Fonseca de Paula Freitas

1, Pedro Cordeiro Fialho

1 &

Marcela David de Carvalho2

1-Instituto SENAI de Tecnologia em Meio Ambiente - SENAI FIEMG. [email protected].

2-Companhia Energética de Minas Gerais.

RESUMO

Foram estudados três reservatórios e suas bacias de contribuição: Peti - (Ecorregião

Mata Atlântica Sudeste-MA), Cajuru e Rio de Pedras (Ecorregião São Francisco-SF),

Minas Gerais. As comunidades vegetais consideradas foram macrófitas aquáticas e

espécies das margens. O levantamento da vegetação foi realizado em áreas de 50 x 5 m.

Com resultados da florística e observações de campo foram elaboradas métricas para o

índice de integridade biótica (IIB). O índice de distúrbio (IDI) utilizou características

ecohidromorfológicas e pressões. As métricas elaboradas somaram 70 (59 lênticos, 65

lóticos). As métricas selecionadas para as bacias de contribuição de SF foram riqueza

total (%), riqueza de angiospermas (%) e riqueza de samambaias (%). O IIB variou de

0,00 a 90,30 e a correlação entre o IIB e o IDI foi R²= 0,34698280. Os maiores valores

de IIB coincidiram com áreas de maior proteção por florestas ripárias e os menores com

supressão quase total da vegetação. Somente cobertura nativa de espécies arbustivas (%)

foi selecionada para integrar o IIB na MA. Os valores do IIB variaram de 0,0 a 100,0 e

análise de regressão IIB e IDI foi R²= 0,3079. As métricas selecionadas para os

reservatórios de SF foram presença de Polygonum ferrugineum e número de espécies

com maiores frequências. Esses dois atributos indicam relação positiva com maior nível

de degradação ambiental. O IIB variou de 0,0 a 100,0 e a análise de regressão entre IIB

e IDI foi de 0,4607. Uma métrica foi selecionada para a construção do IIB para MA:

presença de Urochloa sp., sua ocorrência é indicadora de perturbação. O IIB variou de

0,0 a 100,0. A análise de regressão mostrou correlação R²= 0,7108 entre IIB e IDI. O

estudo demonstrou potencial para utilização de plantas para o IIB. Suas respostas

podem ser aplicadas em sistemas aquáticos e seus entornos.

Palavras-chave: Bioindicadores, macrófitas aquáticas, ecossistema ripário.

2

1 INTRODUÇÃO

As áreas úmidas são caracterizadas, em sua grande maioria, por estarem sujeitas a

variações sazonais da flutuação da lâmina de água, não havendo uma abrupta mudança

entre água e terra, mas uma transição gradual (SCULTHORPE, 1967). Desta forma, as

plantas associadas a estes ambientes ocorrem ao longo de um gradiente mais ou menos

contínuo, desde águas profundas até áreas sazonalmente secas, e incluem desde plantas

submersas até as espécies florestais das margens (SPENCE, 1982). Considerando o

contexto ecológico das áreas úmidas, todas as comunidades vegetais presentes, sejam

elas propriamente aquáticas, de transição (terra – água) ou as terrestres são componentes

fundamentais para o funcionamento do ecossistema ripário.

Assim, as formações florestais que acompanham os rios desempenham variadas funções

como estabilizadoras das ribanceiras dos rios pela manutenção do emaranhado

radicular, funcionam como tampão e filtro entre os terrenos mais altos e o ecossistema

aquático, participando do controle do ciclo de nutrientes da bacia hidrográfica,

dificultam o carreamento de sedimentos para o sistema aquático, contribuindo para a

manutenção da qualidade da água, proporcionam cobertura e alimentação para a fauna

aquática e interceptam a radiação solar, contribuindo para a estabilidade térmica de

pequenos cursos de água (LIMA, 1989). As plantas aquáticas exercem, por sua vez,

importante papel na estrutura e no metabolismo dos ecossistemas aquáticos

(MEERHOFF et al., 2003), influenciando os diversos compartimentos do sistema

hídrico. A vegetação aquática geralmente apresenta adaptações a diferentes

profundidades da água, traduzida em variadas formas biológicas desde a margem até as

regiões de maior profundidade, sendo a extensão de cada zona dependente do grau de

mudança da profundidade do corpo de água, do tipo de substrato e das condições

ambientais (MITCHELL, 1974).

A comunidade vegetal ocorrente em um corpo de água pode ser um efetivo indicador da

combinação integrada das pressões de estresse e distúrbio que influenciam seu habitat e

são frequentemente utilizadas como preditores de poluentes, do funcionamento do

ecossistema ou da biodiversidade (MURPHY, 2000). Segundo FERREIRA et al.

3

(2005), as plantas associadas ao ambiente ripário têm sido relacionadas diretas ou

indiretamente com variados atributos indicadores, como a forma de crescimento,

localização preferida, ruderalidade e dispersão de propágulos. As espécies aquáticas e

ripárias podem reagir a perturbações e indicar a qualidade da água e as condições do rio,

refletindo os efeitos da eutrofização, poluição orgânica, ou alterações estruturais do

leito, o tipo de vale e a sua composição, interfaces laterais e integridade longitudinal.

2 OBJETIVO

Este estudo tem por objetivo utilizar atributos da vegetação para avaliar a qualidade

ecológica de reservatórios de produção de energia elétrica e de suas bacias de drenagem

em Minas Gerais, com base no desenvolvimento e adequação de um índice de

integridade ecológica.

3 MÉTODOS E MATERIAIS

A área de estudo correspondeu aos reservatórios de produção de energia elétrica de Peti,

Cajuru e Rio de Pedras, no estado de Minas Gerais (FIGURA 1). Foram demarcados 42

sítios fluviais nas bacias de contribuição dos reservatórios e 25 sítios nos reservatórios

(região litorânea). As coletas ocorreram nos períodos julho a setembro/13, fevereiro e

março/14 e junho e julho/14.

Figura 1. Mapa de localização da área de estudo

4

O levantamento florístico foi realizado amostrando-se todos os indivíduos férteis ao

longo de um transecto de 50 x 5 m (MÜLLER-DOMBOIS, ELLENBERG, 1974;

BRAUN-BLANQUET, 1979), orientado paralelamente em seu maior comprimento à

linha de margem de maneira que 5 metros se estendam perpendicularmente às margens

das áreas úmidas. Desta forma, consideram-se a vegetação ocorrente nas margens,

florestal ou não (arbórea, arbustiva e herbácea), bem como as espécies que colonizam o

meio aquático. Todo o material botânico foi herborizado, conforme técnicas usuais. As

formas biológicas das macrófitas seguiram PEDRALLI (1990). Para a identificação

taxonômica utilizou-se microscópio estereoscópico e bibliografia e sites especializados.

Ao final o material foi incorporado ao Herbário do Instituto SENAI de Tecnologia em

Meio Ambiente (HXBH).

Para o cálculo das métricas foram utilizados os resultados da composição florística, as

características levantadas sobre diferentes atributos das espécies e as observações

registradas em campo. Utilizou-se como referência os estudos de MILLER et al. (2006)

e FERREIRA et al. (2005). As métricas foram calculadas para cada um dos sítios e

adequadas conforme o ambiente amostrado: lótico (bacia de contribuição) ou lêntico

(reservatório), sendo expressas quantitativamente em número e ou percentual.

Os índices de distúrbio foram estimados em escalas local (IDL) e regional (IDR), sendo

que para o IDL foram incorporadas características ecohidromorfológicas por meio de

protocolo aplicado in loco, em uma área buffer ao redor do sítio fluvial e para o IDR,

foram consideradas as pressões resultantes do mapeamento do uso do solo e cobertura

vegetal da bacia de contribuição de cada sítio. A partir do IDR e do IDL foi calculado o

IDI (Índice de Distúrbio Integrado), como proposto por LIGEIRO et al. (2013),

aplicando o teorema de Pitágoras.

O conjunto dos dados foi separado em (i) Ecorregião São Francisco: sítios ocorrentes

nos reservatórios Cajuru e Rio de Pedras e das respectivas bacias de contribuição; e (ii)

Ecorregião Mata Atlântica Sudeste: sítios do reservatório Peti e das respectivas bacias

de contribuição. A delimitação das ecorregiões aquáticas em Minas Gerais foi baseada

na divisão estabelecida por ABELL et al. (2008).

5

O cálculo do Índice de Integridade Biótica (IIB), baseado na metodologia de KARR et

el. (1981), seguiu uma sequência de testes para a seleção das métricas, por meio de

planilhas eletrônicas e o software STATISTICA™ 13: (i) Amplitude da métrica (range

test), (ii) Resposta da métrica (responsiveness test), (iii) Sensibilidade da métrica

(sensibility test) e (iv) Redundância (redundancy test). Selecionadas as métricas,

calculou-se o seu valor padronizado com base no "sinal" e definição de percentis de

corte (5%;95%).

No cálculo do valor padronizado da métrica foram utilizadas equações (1) métricas que

diminuem com o aumento do distúrbio e (2) métricas que aumentam com o aumento do

distúrbio

(1) (2)

O cálculo do IIBs correspondeu ao somatório dos valores padronizados (pontuações

parciais) dividido pelo número de métricas selecionadas por comunidade, sendo os

resultados expressos em gráficos de barra. Para as condições de referência fez-se a

análise de correlação entre os IIBs considerando o percentil 75.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

O total de métricas calculadas para as comunidades vegetais considerando os sítios das

bacias de contribuição e os sítios dos reservatórios somaram 70. Para os ambientes

lênticos foram elaboradas 59 métricas e para os lóticos 65. As métricas elencadas estão

incluídas em quatro categorias Riqueza, Composição, Tolerância e Funcionais

(QUADRO 1). Conforme discutido por OLIVEIRA et al. (2008), é recomendável o uso

de métricas de todas as categorias para a composição do IIB, para que diversos

processos da comunidade sejam contemplados. Métrica pode ser definida como uma

característica mensurável de um sistema biológico que altera em valor ao longo de um

gradiente de influência humana, precisa ser relevante para o grupo estudado e fornecer

uma resposta distinta da variação natural.

100

menorvalormaiorvalor

menorvalorvadovalorobser

100

menorvalormaiorvalor

observadomaiorvalor

6

Quadro 1. Métricas das comunidades vegetais e suas respostas ao grau de distúrbio para ambientes

lóticos e lênticos dos reservatórios de Cajuru, Peti e Rio de Pedras, estado de Minas Gerais (Brasil)

Código ReservatórioBacia de

Contribuição

Resposta à

degradação

RiqTotal(nº) X X Diminui

RiqTotal (%) X X Diminui

Riq Fam (nº) X X Diminui

Riq Fam (%) X X Diminui

Riq Gen (nº) X X Diminui

Riq Gen (%) X X Diminui

RiqAng (nº) X X Aumenta

RiqAng (%) X X Aumenta

Riq Sam (nº) X X Diminui

Riq Sam (%) X X Diminui

Riq Bri (nº) X X Diminui

Riq Bri (%) X X Diminui

% cobertura total de vegetação na zona ripária Cob Tot Rip (%) X Diminui

% cobertura vegetação ripária nativa Cob Rip Nat (%) X X Diminui

% cobertura vegetação exótica na zona ripária Cob Rip Exo (%) X X Aumenta

% cobertura vegetação ripária nativa arbórea > 10m Cob Arb >10 (%) X Diminui

% cobertura vegetação ripária nativa arbórea < 10m Cob Arb <10 (%) X Diminui

% cobertura vegetação ripária nativa arbustiva Cob Nat Arb (%) X Diminui

% cobertura vegetação ripária nativa herbácea Cob Nat Erv (%) X Diminui

% cobertura total vegetação aquática (com anfíbias) Cob Aqua (%) X X Aumenta

% cobertura total de hidrófitas (excluindo anfíbias) Cob Hidro (%) X X Aumenta

% cobertura de submersa fixa Cob Sf (%) X X Aumenta

% cobertura de submersa livre Cob Sl (%) X X Aumenta

% cobertura de flutuante fixa Cob Ff (%) X X Aumenta

% cobertura de flutuante livre Cob Fl (%) X X Aumenta

% cobertura de emergente Cob Em (%) X X Aumenta

% cobertura de anfíbias Cob Anf (%) X X Aumenta

% cobertura de epífitas Cob Epif (%) X X Diminui

Esp Exo (nº) X X Aumenta

Esp Exo (%) X X Aumenta

Esp Nat (nº) X X Diminui

Esp Nat(%) X X Diminui

Esp End (nº) X X Diminui

Esp End (%) X X Diminui

Esp IP (nº) X X Aumenta

Esp IP (%) X X Aumenta

Presença de Hedychium coronarium Hedy X Aumenta

Presença de Melinis minutiflora Meli X Aumenta

Presença de Cenchrus purpureus Cench X Aumenta

Presença de Urochloa Uroch X Aumenta

Presença de Cyathea Cyath X Aumenta

Presença de Briófitas Brio X Aumenta

Presença de Eichhornia crassipes Ecrass X Aumenta

Presença de Salvinia auriculata Sauri X Diminui

Presença de Polygonum ferruginum Pferr X Diminui

Esp uni (nº) X X Diminui

Esp uni (%) X X Diminui

Esp Fr (nº) X X Aumenta

Esp Fr (%) X X Aumenta

CatAm (nº) X X Diminui

Cat Am (%) X X Diminui

Esp Nat Rip (nº) X Diminui

Esp Nat Rip (%) X Diminui

Hidr (nº) X X Aumenta

Hidr (%) X X Aumenta

Terr (nº) X X Diminui

Terr (%) X X Diminui

Anf (nº) X X Aumenta

Anf (%) X X Aumenta

Em (nº) X X Aumenta

Em (%) X X Aumenta

Ffix (nº) X X Aumenta

Ffix (%) X X Aumenta

Fliv (nº) X X Aumenta

Fliv (%) X X Aumenta

Sfix (nº) X X Aumenta

Sfix (%) X X Aumenta

Sliv (nº) X X Aumenta

Sliv (nº) X X Aumenta

Razão hidrófitas/anfíbias Hidr/anf (nº) X X Aumenta

Riqueza de angiospermas

Nº de gêneros

Nº de famílias

Riqueza total

Nº de plantas terrestres

Nº de Hidrófitas (emerg., flutuantes, submersas)

Co

mp

osiç

ão

To

lerâ

ncia

Riqueza de briófitas

Riqueza de samambaias

Fu

ncio

nais

Métricas

Flutuante fixa

Flutuante livre

Submersa fixa

Submersa livre

Nº espécies exóticas

Nº espécies nativas

Nº espécies endêmicas

Nº espécies indicadoras de perturbação

Nº de espécies únicas (distribuição restrita na área)

Nº de espécies de maiores frequências (ampla

distribuição na área)

Nº de espécies indicadas em alguma categoria de

ameaça

Nativas do ecossistema ripário

Anfíbias

Emergentes

Riq

ueza

7

Quanto às respostas das métricas frente ao grau de distúrbio, 31 métricas foram

consideradas decrescendo com o aumento do distúrbio. As métricas que se relacionaram

positivamente ao distúrbio, ou seja, sofrem incremento do seu valor com o aumento da

degradação somaram 39. Todas as métricas de riqueza foram consideradas diminuindo

com o aumento da degradação, com exceção de Angiospermas (nº) e (%). O argumento

para essa interpretação é fundado na proporcionalidade entre os grupos. Assim se

houver presença de Briófitas ou Samambaias e Licófitas ocupando nichos na

comunidade, o número de Angiospermas pode ser proporcionalmente menor. Em

situações onde ocorrem 100% de Angiospermas, pode significar que a ocorrência dos

distúrbios eliminou ou diminuiu em diversidade a quantidade de representantes dos

outros grupos. Essa argumentação é corroborada pelo tipo de ecossistema estudado, pois

as samambaias e os musgos ocorrem preferencialmente em locais de maior umidade e

sombreamento, características típicas da zona ripária.

Cabe ressaltar que as métricas relacionadas à riqueza são muitas vezes difíceis de

interpretação, pois não raramente os distúrbios podem provocar um aumento da riqueza,

especialmente quando há incremento de espécies colonizadoras de ambientes

degradados. No presente estudo, assumiu-se que os distúrbios diminuiriam a

composição florística local.

A interpretação de algumas métricas deve levar em consideração o tipo de ambiente

estudado. Assim, no caso das macrófitas flutuantes ou submersas a resposta da métrica

pode variar em função de estarem colonizando ambientes lóticos ou lênticos.

4.1 ÍNDICE DE INTEGRIDADE BIÓTICA PARA AS BACIAS DE CONTRIBUIÇÃO

Ecorregião São Francisco

As métricas selecionadas para as bacias de contribuição dos reservatórios de Cajuru e

Rio de Pedras (Ecorregião São Francisco) foram Riqueza total (%), Riqueza de

angiospermas (%) e Riqueza de samambaias (%), as quais foram utilizadas no cálculo

do IIB. Os resultados do IIB de cada sítio de amostragem estão apresentados na Figura

2, sendo que seus valores variaram de 0,00 a 90,30. Oito sítios foram indicados como

referência.

8

Figura 2. Índice de Integridade Biótica da comunidade vegetal para sítios das bacias de contribuição dos

reservatórios de Cajuru e Rio de Pedras (Ecorregião São Francisco). Em destaque os sítios indicados para

referência

A correlação entre o IIB e o IDI expressou um valor relativamente fraco (R²=

0,34698280), figura 3. Apesar disso, observa-se que o IIB sinaliza uma tendência de

correlação com os distúrbios dos ambientes. Possivelmente a ampliação da área

amostral poderia identificar uma correlação mais robusta. Segundo discutem MILLER

et al. (2006), talvez a consideração mais importante para o IIB seja a sua utilidade em

explicar a gama completa de perturbações, porém cada uma das métricas representa

uma característica diferente da comunidade de plantas e, portanto, contribui com

informações discretas para o índice. Nesse sentido, as métricas de Riqueza total (%) e

Riqueza de samambaias (%) tenderam a uma relação inversa ao IDI, Figura 4.

Os IIB de maneira geral mostraram que os sítios localizados na bacia de contribuição do

reservatório de Rio de Pedras foram os melhores, inclusive abrigou todos os sítios

indicados como referência. Os piores corresponderam aos sítios da bacia de

contribuição de Cajuru.

Os maiores valores de IIB foram 90,30 e 86,03 que coincidem com áreas de maior

proteção de margens por florestas ripárias, enquanto o outro extremo indicam locais

com supressão quase total da vegetação ou grande descaraterização evidenciada pela

expressiva colonização de espécies antrópicas ou exóticas. A preservação das margens

pelas florestas ripárias constitui um atributo fundamental para integridade da

9

comunidade vegetal associada aos ambientes úmidos. Por um lado, a degradação

estimula a ocupação de espécies altamente competidoras proporcionando ambientes

mais homogêneos, por outro a preservação permite a ocorrência de espécies que

habitam áreas de maior umidade, tais como as Samambaias e Briófitas, além de

manterem a heterogeneidade ambiental característica das áreas de transição água e terra.

Figura 3. Resultado da análise de regressão entre o Índice de Integridade Biótica e o Índice de Distúrbio

Integrado para os sítios das bacias de contribuição dos reservatórios Cajuru e Rio de Pedras (Ecorregião

São Francisco)

IDI:Índice Biótico: y = 110,6835 - 185,934*x;

r = -0,5891; p = 0,0008; r2 = 0,3470

0,20 0,25 0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60

Índice de Distúrbio Integrado

-20

0

20

40

60

80

100

Índic

e B

iótico

Figura 4. Métricas de riqueza total (%) e riqueza de samambaias (%) em relação ao IDI nas bacias de

contribuição dos reservatórios Cajuru e Rio de Pedras (Ecorregião São Francisco)

10

Ecorregião Mata Atlântica

Somente uma métrica foi selecionada para integrar IIB da Ecorregião Mata Atlântica

Sudeste, que correspondeu à cobertura nativa de espécies arbustivas (%). Os valores do

IIB para cada sítio variaram de 0,0 a 100,00 (FIGURA 5). Nessa análise, quatro sítios

foram indicados como referência, sob o aspecto vegetacional. A análise de regressão

entre o IIB da comunidade vegetal e o IDI mostrou valor de R²= 0,3079, o que expressa

uma correlação relativamente fraca (FIGURA 6).

Figura 5. Índice de Integridade Biótica da comunidade vegetal para os sítios da bacia de contribuição do

reservatório Peti (Ecorregião Mata Atlântica Sudeste). Em destaque os sítios indicados para referência

Figura 6. Resultado da análise de regressão entre o Índice de Integridade Biótica e o Índice de Distúrbio

Integrado dos sítios da bacia de contribuição do reservatório Peti (Ecorregião Mata Atlântica Sudeste)

Índice de Distúrbio Integrado:Índice Biótico: y = 203,722 - 451,0539*x;

r = -0,5549; p = 0,0491; r2 = 0,3079

0,26 0,28 0,30 0,32 0,34 0,36 0,38 0,40 0,42 0,44 0,46

Índice de Distúrbio Integrado

-20

0

20

40

60

80

100

120

Índic

e B

iótico

11

Deve-se ter cautela ao discutir o resultado para o índice nesta Ecorregião, uma vez que

apenas uma métrica foi selecionada para o cálculo, ou seja, a única métrica que se

correlacionou significativamente com o IDI. Dessa forma, o percentual de arbustos

nativos pode não responder em outras situações na qual a floresta ripária é preservada e

a estratificação não representativa. A utilização dessa métrica é interessante, mas faz-se

necessária a incorporação de outros atributos (métricas) para que o IIB seja mais

robusto e possa responder melhor o estado de preservação dos locais.

4.2 ÍNDICE DE INTEGRIDADE BIÓTICA PARA OS RESERVATÓRIOS

Foram selecionadas duas métricas para compor o IIB da comunidade vegetal dos

reservatórios da Ecorregião São Francisco e apenas uma métrica para a Ecorregião da

Mata Atlântica.

Ecorregião São Francisco

As métricas selecionadas para os reservatórios foram a presença de Polygonum

ferrugineum e número de espécies de maior frequência de ocorrência. Esses dois

atributos indicam relação positiva com maior nível de degradação ambiental. Os

resultados do IIB de cada sítio de amostragem estão apresentados na Figura 7, sendo

que seus valores variaram de 0,0 a 100,0. Nessa análise, seis sítios foram indicados

como referência, considerando apenas a comunidade vegetal.

Figura 7. Índice de Integridade Biótica da comunidade vegetal para os reservatórios Cajuru e Rio de

Pedras (Ecorregião São Francisco). Em destaque os sítios indicados para referência

12

Observa-se que os resultados do IIB indicam que o sítio U16-E mostrou melhor

potencial ecológico, seguidos por todos os sítios do reservatório de Rio de Pedras. No

reservatório de Cajuru posicionaram-se os sítios com os menores valores para o IIB.

A análise de regressão entre o IIB e o IDI para os ambientes estudados mostrou valor de

R²= 0,4607, o que expressa uma correlação satisfatória (FIGURA 8).

Figura 8. Resultado da análise de regressão entre o Índice de Integridade Biótica e o Índice de Distúrbio

Integrado para os sítios dos reservatórios de Cajuru e Rio de Pedras (Ecorregião São Francisco)

Índice de Distúrbio Integrado:Índice Biótico: y = 130,6522 - 108,9841*x;

r = -0,6788; p = 0,0076; r2 = 0,4607

0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0

Índice de Distúrbio Integrado

-20

0

20

40

60

80

100

120

Índic

e B

iótico

Observa-se que a presença da espécie Polygonum ferrugineum esteve associada a um

maior grau de distúrbio, bem como as espécies mais frequentes (FIGURA 9).

Figura 9. Métricas número de espécies mais frequentes e presença de Polygonum ferrugineum em relação

ao IDI nos sítios do reservatório Cajuru e Rio de Pedras (Ecorregião São Francisco)

13

Polygonum ferrugineum é uma espécie que coloniza ambientes aquáticos alterados, de

acordo com Meyer e Francechinelli (2011) tende a ocorrer em ambientes de maior

concentração de nitrogênio total e fósforo. Já as espécies de maior frequência

geralmente são aquelas com grande capacidade de explorar novos ambientes, são

caracterizadas por rápida expansão de sua população, acelerado crescimento e altas

taxas reprodutivas.

Ecorregião Mata Atlântica

Somente uma métrica foi selecionada para a construção do IIB que correspondeu à

presença de Urochloa sp. Os resultados do IIB de cada sítio de amostragem variaram de

0,00 a 100,0. Nessa análise, oito sítios foram indicados como referência, considerando

apenas a comunidade vegetal. O resultado do IIB indicou dois valores de classificação

para os sítios: zero ou 100, uma vez que foi baseado em uma única métrica: ocorrência

de Urochloa sp., assim a presença ou não da planta foi determinante. Os sítios T13G,

T13H e T13I foram os que apresentaram os índices equivalentes a zero. Claramente a

ocorrência de Urochloa sp. é um indicador de perturbação, pois além de exótica,

espécies desse gênero invadem frequentemente áreas úmidas (LORENZI, 2000). Apesar

de apenas uma métrica ser considerada, a análise de regressão mostrou que o IIB da

comunidade vegetal e o IDI tiveram boa correlação R²= 0,7108 (FIGURA 10).

Figura 10. Resultado da análise de regressão entre o Índice de Integridade Biótica e o Índice de Distúrbio

Integrado dos ambientes lóticos da Ecorregião Mata Atlântica

IDI:IB: y = 186,6186 - 207,7072*x;

r = -0,8431; p = 0,0011; r2 = 0,7108

0,30 0,35 0,40 0,45 0,50 0,55 0,60 0,65 0,70 0,75 0,80 0,85

IDI

-20

0

20

40

60

80

100

120

IB

14

Entretanto, o uso de uma única métrica para o índice deve ser analisado com cautela,

sendo recomendável o esforço para incrementar dados no sentido de elaborar um índice

de maior qualidade de resposta aos distúrbios.

Tradicionalmente as plantas são utilizadas como indicadores de variáveis geológicas

edáficas, composição das rochas, minerais e limites de áreas úmidas, entretanto pouca

atenção tem sido dada para a indicação das condições biológicas de um ecossistema

(MILLER et al., 2006). Segundo Ferreira et al. (2005), como as plantas exibem uma

grande variedade de formas de crescimento, incluindo desde as aquáticas (submersas,

flutuantes) até a vegetação lenhosa das zonas ripárias apresentam uma complexidade

natural em termos de escalas espaciais e diferentes regimes de fluxo e habitats fluviais,

aumentando a dificuldade de interpretar essa diversidade.

Mesmo assim são variados os motivos para utilizar a comunidade vegetal, conforme são

apontadas por Miller et al. (2006): (i) plantas são típicas de áreas úmidas e podem ser

identificadas até o nível de espécies; (ii) é uma comunidade imóvel, portanto sujeitas as

mudanças químicas e físicas dos ambientes; (iii) possuem atributos facilmente

mensuráveis; (iv) muitos atributos são sensíveis aos distúrbios antropogênicos, assim

como espécies em particular.

5 CONCLUSÕES

O presente estudo demonstrou que a utilização de plantas para a composição de um

índice biológico consiste em ferramenta de grande potencial, uma vez que suas

respostas incluem a comunidade de macrófitas aquáticas e vegetação ripária. Devem ser

exploradas em índices multimétricos para expressar a qualidade de um ecossistema

podendo ser aplicadas em sistemas aquáticos e seus entornos.

Agradecimentos: Os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado

de Minas Gerais (FAPEMIG); a Companhia Energética de Minas Gerais - Geração e

Transmissão (CEMIG GT); e a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) pelo

financiamento da pesquisa.

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