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1 Identidade e Tradição: CTG Galpão de Estância e seus legados nas Missões 1 Bibiana Melo Ramborger 2 Schirley Anita Bueno Ferrari 3 RESUMO: Ao longo dos anos ocorreram significativas transformações na sociedade e principalmente no que tange a cultura em suas mais variadas formas. As organizações sociais como os Centros de Tradições Gaúchas e demais entidades desse propósito estiveram à frente de muitas dessas. O presente trabalho tem como objetivo analisar a atuação e as ações centrais desenvolvidas pelo CTG Galpão de Estância do município de São Luiz Gonzaga. Para tanto, fundamentou-se teoricamente nas concepções e definições de cultura, nativismo, tradicionalismo, folclore bem como nas abordagens sobre os princípios e as ações desenvolvidas pela organização ao longo dos últimos anos, principalmente no que tange a cultura Missioneira e seus ícones que fizeram e fazem parte do legado histórico. A pesquisa foi realizada através de trabalho de campo, tendo por base o método dialético-crítico, trazendo detalhes e analisando os aspectos de historicidade, totalidade e contradição, respaldados na teoria marxista, com revisão referente ao tema. Constata-se que os Centros de tradições são expressões culturais com respaldos nas manifestações como forma de preservar as origens e raízes que no caso em questão deu-se início com um programa radiofônico comandado por Jayme Guilherme Caetano Braun, até o surgimento de uma entidade afim de reunir pessoas com interesse comum em vivenciar essas culturas que fazem parte de características 1 Grupo de Trabalho 02: História e Patrimônio 2 Assistente Social, Mestranda em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) - Programa de Pós Graduação em Agronegócios/ Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios (PPG Agronegócios/CEPAN). E-mail: [email protected] 3 Pesquisadora Regionalista, Licenciada em Técnicas Comerciais e Artes Práticas pela Universidade de Passo Fundo. E-mail: [email protected]

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Identidade e Tradição: CTG Galpão de Estância e seus legados nas Missões1

Bibiana Melo Ramborger2

Schirley Anita Bueno Ferrari3

RESUMO: Ao longo dos anos ocorreram significativas transformações na sociedade e

principalmente no que tange a cultura em suas mais variadas formas. As organizações sociais como

os Centros de Tradições Gaúchas e demais entidades desse propósito estiveram à frente de muitas

dessas. O presente trabalho tem como objetivo analisar a atuação e as ações centrais desenvolvidas

pelo CTG Galpão de Estância do município de São Luiz Gonzaga. Para tanto, fundamentou-se

teoricamente nas concepções e definições de cultura, nativismo, tradicionalismo, folclore bem como

nas abordagens sobre os princípios e as ações desenvolvidas pela organização ao longo dos últimos

anos, principalmente no que tange a cultura Missioneira e seus ícones que fizeram e fazem parte do

legado histórico. A pesquisa foi realizada através de trabalho de campo, tendo por base o método

dialético-crítico, trazendo detalhes e analisando os aspectos de historicidade, totalidade e

contradição, respaldados na teoria marxista, com revisão referente ao tema. Constata-se que os

Centros de tradições são expressões culturais com respaldos nas manifestações como forma de

preservar as origens e raízes que no caso em questão deu-se início com um programa radiofônico

comandado por Jayme Guilherme Caetano Braun, até o surgimento de uma entidade afim de reunir

pessoas com interesse comum em vivenciar essas culturas que fazem parte de características

1 Grupo de Trabalho 02: História e Patrimônio 2 Assistente Social, Mestranda em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

(UFRGS) - Programa de Pós Graduação em Agronegócios/ Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios

(PPG Agronegócios/CEPAN). E-mail: [email protected]

3 Pesquisadora Regionalista, Licenciada em Técnicas Comerciais e Artes Práticas pela Universidade

de Passo Fundo. E-mail: [email protected]

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regionais e sua identidade. Os movimentos e as organizações tradicionalistas que antes tinham

como principal papel o preservar e cultuar as tradições regionais, nas últimas décadas passaram a

atuar também no processo de difundir a cultura e projetar o futuro formulando ações públicas

voltadas para que sejam deixados registros e marcos históricos, bem como debates sobre a história,

música, folclore, cavalgadas, fandangos, jovens, família, valores, princípios, crenças, entre outros.

Os mesmos têm atuado fortemente na inserção, social de seus associados, bem como desenvolvendo

trabalhos e projetos na comunidade local para colaboração com a sociedade. Ao longo dos anos,

intermediando as relações do Estado e sociedade, as organizações buscam traduzir e divulgar a

memória cultural do povo, principalmente missioneiro que tem em suas raízes particularidades que

caracterizam a região e que trazem arraigadas ideias, costumes, recordações, símbolos e artes

nativas, bem como a eterna vigilância cultural e nativista.

PALAVRAS-CHAVE: Tradições, Missões, Cultura gaúcha e Organizações.

INTRODUÇÃO

No ano de 1947, um grupo de jovens nascidos no campo encontrava-se desgarrados na

capital gaúcha, se de um lado Porto Alegre oferecia-lhes o estudo, de outro a saudade do pago, das

lides, dos bailes de campanha, era imensa. Naqueles anos era determinantemente proibido qualquer

manifestação regional.

Em agosto de 1947, um grupo de jovens alunos do Colégio Júlio de Castilhos,

oriundos do interior do Estado, liderados por João Carlos D’Avila Paixão Cortes, criam um

Departamento de Tradições Gaúchas em seu colégio com a finalidade de revitalizar e preservar a

cultura gaúcha. Entusiasmados, entram em contato com a Liga de Defesa Nacional, especificamente

com o Major Darcy Vignolli, responsável pela organização das festividades da “Semana da Pátria”.

Falaram da vontade de participarem dos festejos e propuseram retirar do “Fogo Simbólico” uma

centelha, para transformá-la em “Chama Crioula”, como símbolo da união indissolúvel do Rio

Grande do Sul ao Brasil.

Nessa oportunidade Paixão Cortes recebeu o convite para montar uma guarda de

gaúchos pilchados em honra ao herói farrapo David Canabarro, cujos restos mortais seriam

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transladados de Santana do Livramento para Porto Alegre. Paixão Cortes reuniu um piquete de oito

gaúchos para atender o convite e no dia 05 de setembro de 1947, prestaram a homenagem a

Canabarro. Esse piquete é conhecido como Piquete da Tradição ou Grupo dos oito. No dia o7 de

setembro, antes da extinção do “Fogo Simbólico”, Paixão Cortes, Fernando Machado Vieira, e

Cyro3 Dutra Ferreira, retiraram a centelha, que levada para o Júlio de Castilhos ardeu até a meia

noite do dia 20 de setembro data magna para os gaúchos. Assim nasceu a “Chama Crioula”.

E com este acontecimento deu prosseguimento a iniciativas em todo o estado do Rio

Grande do Sul de organizações em prol do que podemos considerar Nativismo, o qual é valorizar a

cultura local, o que até então não se podia ser realizado tendo em vista que o estrangeirismo tinha

tomado conta do povo brasileiro. Formaram-se então as organizações sociais que no decorrer das

décadas foram se tornando cada vez mais fortes e suas representatividades sendo espalhadas a nível

de Brasil e de mundo, onde o culto as tradições e costumes do povo gaúcho está a cada dia mais

preservada e cultuada.

Contudo nossa região Missioneira não é diferente pois o legado que temos oriundo

das reduções jesuíticas de alguma forma está presente em nosso cotidiano pois, as raízes deixadas

nesta terra ainda rebrotam nos corações e nas diversas expressões culturais, sendo um diferencial a

ser explorado e divulgado para que saibamos nossas origens e preservamos para passar para as

próximas gerações.

Neste contexto, no ano de 1954, no município de São Luiz Gonzaga, nasce o CTG

Galpão de Estância, o qual ainda permanece com suas cancelas abertas para receber turistas, ser um

patrimônio local e o lugar onde as mais diversas faixas etárias se reúnem em busca de aprimorarem

seus conhecimentos, trabalharem pela comunidade e cultuarem suas tradições regionalistas. E é

deste palco que vamos trazer um pouco de sua história, fazendo um paralelo teórico para reflexão

das mudanças causadas através dos anos e suas estruturações.

1. SURGIMENTO DO CTG GALPÃO DE ESTÂNCIA

Para iniciarmos as andanças em tempos passados e descobrir as raízes de um Centro

de Tradições Gaúchas, temos que ver como bem se refere os antropólogos e sociólogos as

influências que levaram a estruturação deste espaço.

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Para isso temos então que nos remeter aos programas de rádio dos anos 50 em que

levavam através de suas ondas informações, músicas, notícias e muitas vezes até mesmo cultura

como é o caso do programa que era realizado por Jaime Guilherme Caetano Braun, o qual com seus

versos conseguia filosofar de uma forma e de entendimento ao mais longínquo rincão, pois seu

modo de falar era regional, o qual era de entendimento da maioria dos ouvintes da rádio que fazia a

transmissão, que era a Rádio São Luiz.

O historiador Pedro Marques dos Santos discorre sobre a primeira reunião referente

ao início de um centro para que as tradições fossem cultuadas, foi realizada nas dependências do

prédio da Rádio São Luiz, no dia 09 de maio de 1954. Neste ato foi acordado uma comissão

constituída pelos Srs Elias Possap, Darcírio Dutra, e Vidal Bocacio, com a responsabilidade de

tomarem todas as providências necessárias à fundação da nova entidade. Na época havia um

programa na Rádio São Luiz que exaltava o telurismo campeiro com o nome de Galpão de Estância,

cuja criação e execução era dos Srs. Jaime Caetano Braun, Elias Possap, Walter Medeiros,

Dangermon Flores, Otacílio Rosa e Darcírio Dutra, desse programa originou-se o nome: Galpão de

Estância.

Uma nova reunião foi realizada nas dependências da Rádio São Luiz, onde se

fizeram presentes grande número de simpatizantes do movimento tradicionalista, que decidiram

concretizar a ideia de fundação do CTG Galpão de Estância e aclamaram como seu primeiro patrão

o Sr. Antônio Caetano Sobrinho.

Desde então até os dias de hoje o CTG mante-se vivo preservando o nativismo, o

telurismo ao regionalismo missioneiro, sendo uma organização social, o qual acima de tudo respeita

e preserva sua história Missioneira. E sobre esses aspectos vamos respaldar nosso referencial

teórico para então discutir sobre nuva visão dialética o que se tem feito pela cultura local e sua

identidade.

2. RAÍZES MISSIONEIRAS E O REGIONALISMO

Há construção da identidade missioneira definida e perpassada pelas disputas entre

os grupos sociais que se formaram, quando desejam impor sua supremacia, nas relações de poder

que se estabelecem, ajustando o ser humano a um sistema social, através de regras, de símbolos, de

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instrumentos de comunicação, do sentir e do pensar como membros pertencentes dessa sociedade

(BOTTESELLE, 2010).

Ainda corre vivo o sangue guarani nas lendas, na linguagem, na medicina de ervas,

nas cuias e sacas de erva mate que ganharam importância econômica em todo o Sul. E a criação de

gado introduzida pelos jesuítas tornou-se básica na economia do Rio Grande do Sul, assim como na

Argentina e Uruguai. Conforme:

O gaúcho missioneiro é o elemento cultural típico da região conhecida como Missioneira.

Entendemos que sua principal diferença em relação ao gaúcho da campanha possa ser

explicada pelo uso de referências ao passado reducional, apresentado para ser seu, e que

elabora uma relação muito peculiar com a terra.

O gaúcho missioneiro tende a se apresentar, através de cantos, contos, lendas e poesias,

como um elemento fortemente ligado à região e à defesa da terra, requerendo-a como

propriedade histórico-cultural. Um exemplo dessa relação dos grupos locais com a terra

encontra-se na repetição constante do que teria sido a figura e o grito de Sepé Tiaraju: “Esta

terra tem dono"! (POMMER, 2009, p. 62-63).

Esta herança realimenta hoje as pesquisas científicas, a literatura e as canções, o

teatro, o cinema e as artes plásticas. É uma das raízes da cultura regional sul-rio-grandense, uma

parte da variedade de culturas que integram a identidade brasileira.

É então que percebemos que o nativismo é o que mais se adéqua as nossas

influências na identidade pois é vista como a qualidade ou característicos do lugar. É exatamente

daqui, é aquele que tem aversão ao estrangeiro. É um aspecto do regionalismo. O nativismo está

dentro de um espaço menor do que o regionalista. Pois este vive atua, reverencia uma região que

pode ter uma abrangência além do seu território nato, enquanto que o nativista tem a mesma

atuação exclusivamente dentro da área que ele delimita como sendo nativo.

Já nossas bases trazidas pelo regionalismo pode ser compreendida como o

movimento que trata dos interesses de uma região, que registra a maneira de falar, de declamar, de

cantar, de vestir , de cumprimentar, de se alimentar. São os mais diversos aspectos de procedimento

dos habitantes de uma região. O regionalismo envolve todas as particularidades econômicas,

culturais e procedimentais de uma região.

Um lado bastante interessante do regionalismo é a busca de levar adiante aspectos de

uma cultura local e não permitir que ela seja completamente submergida na padronização proposta

pela globalização econômica e cultural. Não sentir vergonha de nossas especificidades culturais e

permitir que elas floresçam é algo importante para a manutenção da riqueza cultural que reside na

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diversidade. Porém, um problema sério aparece quando, associado ao regionalismo, vem se colando

um bairrismo que é cada vez menos inocente.

Não se trata de querer acabar com as mitologias. Todos nós as temos, elas nos

ajudam a dar sentido ao mundo. Muito menos é o caso de pretender colocar o conhecimento

histórico no lugar delas. Afinal, este também não está isento de mistificações e armadilhas. Trata-se,

apenas, de oferecer à sociedade outras representações do passado e novas linhas de raciocínio que

possam exercitar a reflexão e fundamentar posicionamento.

As tradições, que podem ser inventadas ou não, se estruturam a partir de referenciais

do passado que, por sua vez, também pode ser produzido para ser aceito como o vivido de um

determinado grupo social. Hobsbawm conceitua tradição inventada como sendo “(...) o conjunto de

práticas normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas (...) de natureza ritual ou

simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que

implica, automaticamente, uma continuidade com um passado histórico apropriado”. Não com um

passado efetivamente legitimado, mas com base em um passado construído sob os efeitos de um

presente que lhe dá sentido, para parecer legítimo aos olhos do grupo social ao qual se quer

referenciar.

O CTG Galpão de Estância, foi a primeira entidade tradicionalista fundada na cidade

e teve entre seus fundadores um dos ícones da música missioneira , o payador Jaime Caetano Braun,

um dos troncos missioneiros, conforme disco “Troncos Missioneiros”. Jaime, Cenair, Noel e Pedro

Ortaça são considerados pioneiros na construção de uma identidade missioneira, através da música

onde são abordadas temáticas de um passado rural, da fronteira, das reduções guaraníticas e suas

ruínas, a integração latino-americana.

Temos também outros nomes que nesta jornada de existência também contribuem com seus

talentos para continuar o legado e difundir a cultura como por exemplo Luiz Carlos Borges, Érlon

Péricles, Ângelo Franco, Yuri Menezes, Ricardo Comassetto, Glauco Vieira, entre outros.

Baszko defende que é através dos seus imaginários sociais que os grupos designam

sua identidade, elaboram certa representação de si mesmos, estabelecem e distribuem os papéis

sociais, criam crenças comuns e regras de comportamento através da instalação de modelos, de

arquétipos que deverão nortear as ações do grupo para a manutenção de uma determinada ordem

social. Dessa forma, os imaginários sociais são operados através de um sistema simbólico, cuja

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função é estabelecer o controle da vida coletiva, legitimando o poder e sendo comunicável pelo

discurso.

Para Woodward o processo de globalização tem levado os grupos sociais a se

posicionar de forma ambivalente frente à questão das identidades. Ao mesmo tempo em que a

uniformidade cultural imposta pelas relações econômicas mundializadas pode distanciar a cultura

local dos seus elementos de origem, é capaz de provocar “(...) uma resistência que pode fortalecer e

reafirmar algumas identidades nacionais e locais, ou levar ao surgimento de novas posições de

identidades”.

3. ORGANIZAÇÕES SOCIAIS

O conceito de sociedade civil já passou por várias concepções e significados no

Brasil e na América Latina. De uma forma geral, ele surge no período denominado trajetória, das

transições democráticas. O final dos anos 70 destaca-se nesta trajetória porque o termo foi

definitivamente introduzido no vocabulário político corrente e passou a ser objeto de elaboração

teórica. Um dos principais eixos articuladores da sociedade civil, foi dado pela noção de autonomia:

tratava-se de organizar- se independentemente do Estado. Na realidade, a autonomia também era um discurso estratégico para evitar alianças

consideradas espúrias para que o perfil de certos grupos da sociedade civil fosse configurado

segundo alguns princípios para que não houvesse reprodução de práticas autoritárias estatais e nem

práticas consideradas como superadas, como baseadas no centralismo democrático das correntes de

esquerda mais radicais ou tradicionais.

Houve uma ampliação e uma pluralização dos grupos organizados, que redundaram

na criação de movimentos, associações, instituições e ONGs. Nos anos 70 a expressão sociedade

civil tornou-se sinônimo de algo bom e positivo e contrapunha-se ao Estado; este sendo identificado

como poder militar, ou seja, era ao contrário de militar. O paradigma vigente nos trabalhos com os

movimentos populares nos anos 70-80 estruturava-se segundo fundamentos semelhantes ao da

Educação Popular, quais sejam: a valorização da cultura popular, a centralidade atribuída ao

diálogo, a ética e a democracia no processo de construção de relações sociais mais justas; a

necessidade de ter como referências constante, ao longo de qualquer processo pedagógico ou de

mudanças sociais a realidade de vida dos educandos e a forma como eles encaram a realidade.

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Ao longo dos anos 90 campo da sociedade civil ampliou-se na prática e nos

discursos, conferiu um outro conceito de cidadania: a mesma relevância que tinha o conceito de

autonomia nos anos 80. A cidadania nos anos 90 foi incorporada nos discursos oficiais e

ressignificada na direção próxima a ideia de participação civil de exercício da civilidade de

responsabilidade social dos cidadãos como um todo ela trata não apenas dos direitos mas também

dos deveres.

No novo cenário, a sociedade civil se amplia para entrelaçar com a sociedade

política, colaborando para o caráter contraditório e fragmentado que o Estado passa a ter nos anos

90. Desenvolve-se o novo espaço público denominado público não-estatal, onde irão situar-se os

conselhos, fóruns, rede e articulações entre a sociedade civil e representantes do poder público para

a gestão de parcelas da coisa pública que dizem respeito ao atendimento das demandas sociais.

Presume-se que os movimentos sociais são tentativas coletivas e organizadas que têm a

finalidade de buscar determinadas mudanças ou até mesmo estipular a possibilidade de construção

de uma nova ordem social.

Como propôs Oliven, uma região somente pode ser pensada na sua articulação com o

todo, fortalecendo as suas especificidades nas diferenças culturais relativas às demais partes da

totalidade. Assim, entende-se que as especificidades regionais, dentre elas os caracteres identitários,

acabam se fortalecendo nas situações particularizadas que seus espaços assumem, nas suas

individualizações em relação à totalidade. Elas expressam-se através de determinadas paisagens

enquanto símbolos de uma cultura específica, pois, “(...) a cultura resulta da capacidade de os seres

humanos se comunicarem entre si por meio de símbolos.”

4. METODOLOGIA

O trabalho foi realizado através de coleta de dados em pesquisa de campo, tendo por

base o método dialético crítico, trazendo detalhes e analisando os aspectos de historicidade,

totalidade e contradição, respaldados na teoria marxista, com revisão bibliográfica, abordando

livros, artigos e teses referentes ao tema.

O método dialético é aplicado no tratamento dos problemas da produção, consumo,

distribuição e troca, em uma determinada época histórica, em um momento dado do processo

histórico total, ou seja, a época da sociedade atual.

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Para trabalhar com os fenômenos sócios-históricos, tem-se de levar em conta as

relações entre as partes, isto é, tem-se de relacionar o fenômeno em tela, que constitui a parte, com

o todo da existência social, entendendo-se a sociedade como composto de complexos e a totalidade

ordenado de relações em processo.

Um processo sócio-histórico não constitui algo acabado, pronto, imutável, mas algo

dinâmico, mutável. Além disso, um complexo não existe isoladamente, separado e independente

dos demais complexos, porém numa ação recíproca com o todo. Desse modo, a categoria da

totalidade assume uma posição central na metodologia dialética marxiana para o conhecimento da

totalidade do processo histórico.

4.1 Tipo de Pesquisa

A pesquisa teve seus princípios baseados no tipo qualitativa, utilizando as técnicas de

entrevista semiestruturada e observação assistemática para a coleta de informações e análise de

conteúdo (BARDIN, 1977) para o processo analítico.

4.2 Coleta de Informações

A apreensão constitui-se como um modo de desvendar a realidade a partir das

categorias centrais do método dialético crítico, que são a historicidade, a totalidade e a contradição.

Existem diferentes níveis de apreensão e de intervenção que explicitam as interações entre as

situações particulares e as mais amplas (BAPTISTA, 2002).

A apreensão requer fundamentos teóricos que orientam a leitura da realidade. Faz

parte da instrumentalidade, pois esta abarca tanto os procedimentos técnicos (entrevistas, visitas

domiciliares, etc.) como as estratégias articuladas e as mediações teóricas (GUERRA, 2002).

A questão teórico-metodológica diz respeito ao modo de ler, de explicar a sociedade,

e a proposta de formação, que não separa história, teoria e método, é própria da matriz crítico-

dialética (SIMIONATTO, 2004).

Pastorini (2004) reforça que a realidade precisa ser apreendida a partir de uma

perspectiva de totalidade, que está em movimento. Somente a partir de cortes históricos é possível

entender esse movimento, mas não pensando linearmente no passado e no futuro, no novo e no

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velho e sim apreendendo a história a partir de uma relação dialética composta por continuidades e

rupturas.

4.3 ANÁLISE DE CONTEÚDO

Buscando alguns autores para o embasamento científico dos dados coletados

encontramos Bardin (1979), o qual nos apresenta várias técnicas de análise de conteúdo e

Minayo(1992), faz uma proposta para análise de conteúdo em dois níveis:

- No primeiro, apresentar a conjuntura socioeconômica e política da qual faz parte o grupo de

entrevistados, sua história e inserção no contexto sócio-histórico mais geral;

- No segundo, apresentar as observações de condutas, costumes, o teor das comunicações de cada

indivíduo.

A análise é um processo de descrição dos dados coletados e a interpretação é um

processo de reflexão sobre o que foi descrito, à luz de conhecimentos mais amplos para finalizar o

relatório dos dados constando de um paralelo entre as organizações para que assim seja constatado

suas peculiaridades e seus dados qualitativos.

5. AUTORES E ATORES DA HISTÓRIA

Conseguimos através de diálogos com as mais diferentes faixas etárias que fizeram e

fazem parte desta entidade e por também ter participado de fatos históricos e mudanças

contemporâneas que passaram por esta casa.

Sabemos que muito se tem batalhado para que o acesso a cultura chegue as mais

diferentes escalas da sociedade e que para isso conta-se com projetos onde os integrantes de todos

os departamentos se mobilizem para que isso seja possível.

Através de eventos como o Natal Galponeiro, crianças e adolescentes participam das

comemorações natalinas missioneiras onde além de poderem degustar de pratos típicos também

aprendem noções de como em nosso pago é registrado esse momento e culturalmente difundido.

Com projetos levando as tradições as escolas, diversas prendas e peões puderam

adentrar no ensino de crianças e adolescentes e demonstrar um pouco das nossas raízes históricas,

com isso também trabalhando a questão de inclusão, pois foi um dos pioneiros em trabalhar com

classes especiais e conseguir construir grupos de danças gaúchas fazendo com que a integração e

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valorização desses alunos tivesse uma característica especial com reconhecimento dos demais

membros escolares.

Sem contar que nas comemorações farroupilhas, as quais depois de muitos anos se

conquistou, leva-se as diversas faixas etárias para uma aventura histórica e cultural para que os

valores preservados possam ser discutidos, aprendidos e aprofundados e tenham noção de como

realmente funciona um Centro de Tradições Gaúchas e conquistar possíveis novos simpatizantes da

causa que queiram participar de invernadas de danças, serem prendas e peões, participarem de

invernadas campeiras e de esportes.

Os integrantes dos departamentos tem o dever como cidadãos de saberem e

auxiliarem a sociedade nos seus mais variados problemas, bem como criarem mecanismos de se

fazerem presentes para que tenham participação e demonstrar que juntos são capazes para que a

realização e amenização das desigualdades sociais.

Também pode-se dizer que muitas vezes, ocorre neste município os mutirões entre as

entidades culturais para que os ícones locais possam ter o devido reconhecimento e espaço para que

as novas gerações conheçam o seu legado, como foi com um dos patronos do CTG, Jayme Caetano

Braun, o qual depois de muito debate e a comunidade se mobilizar tem tanto na entidade quanto em

um dos acessos a cidade um pouco de sua história, pois este grande mestre levou através de seus

versos a cidade na qual nasceu e cantou ao mundo inteiro.

E com todo esse percurso nas mais variadas atividades em que a integração entre

todas as idades e fazendo com que todos sejam incluídos e participem, o que para como ser humano

é um extraordinário crescimento tanto social quanto intelectual, pois todos tem direito a seus

espaços e conseguem aprimorar seus talentos e descobri-los.

6. CONSIDERAÇÕES

A identidade cultural é um conjunto vivo de relações sociais e patrimônios

simbólicos historicamente compartilhados que estabelece a comunhão de determinados valores

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entre os membros de uma sociedade. Sendo um conceito de trânsito intenso e tamanha

complexidade, podemos compreender a constituição de uma identidade em manifestações que

podem envolver um amplo número de situações que vão desde a fala até a participação em certos

eventos.

De acordo com Bordenave (1983), a participação incita a organização e esta promove

e conduz à participação, de modo que a medida que a participação é promovida, pode ocorrer uma

transformação das pessoas. Isso quer dizer que pessoas que antes eram passivas e resignadas, depois

de um processo participativo, muitas vezes podem se tornar ativas e críticas.

A partir da representatividade que determinados monumentos assumem, enquanto

documentos, para o estabelecimento do núcleo mnemônico da comunidade idealizada, é possível

descobrir os significados teóricos de que estão investidos, para podermos entender a articulação, na

memória coletiva, dos elementos históricos selecionados para serem lembrados como constituintes

de um passado próprio. Este passado será a base imaginária para o estabelecimento de uma

identidade singularmente diferenciada de seu entorno.

A globalização é uma nova e intensa configuração do globo, a resultante do novo

ciclo de expansão do capitalismo não apenas como modo de produção mas como processo

civilizatório de alcance mundial, abrangendo a totalidade do planeta de forma complexa e

contraditória. O Estado-nação, símbolo da modernidade, entra em declínio. Como consequência, os

mapas culturais já não coincidem com as fronteiras nacionais, fato acelerado pela intensificação das

redes de comunicação que atingem os sujeitos de forma direta ou indireta.

Para construir uma forma unificada de identificação a partir das tantas diferenças

existentes no interior da “nação”, homogeneizando os traços constitutivos da identidade nacional, já

que como afirma Bauman (2003, p.84) “dentro das fronteiras do Estado só havia lugar para uma

língua, uma cultura, uma memória histórica e um sentimento patriótico”, o projeto de construção do

Estado-nação necessitava, portanto, erradicar as diferenças e/ou os diferentes, fosse por meio da

“assimilação” ou por meio da “eliminação/exclusão”.

A identidade cultural é vista como uma forma de identidade coletiva característica de

um grupo social que partilha as mesmas atitudes. Está apoiada num passado com um ideal coletivo

projetado e se fixa como uma construção social estabelecida e faz os indivíduos se sentirem mais

próximos e semelhantes. É ela responsável pela identificação e diferenciação dos diversos

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indivíduos de uma sociedade, sendo está comparada em diversas escalas. A identidade cultural de

determinado povo está intimamente ligada à memória deste, mas não pode ser vista como sendo um

conjunto de valores fixos e imutáveis que definem o indivíduo e a coletividade a qual ele faz parte.

Faz parte do processo de sobrevivência das sociedades a incorporação de elementos novos e isso é o

que as mantêm ao longo do tempo.

Grandes conceitos que informavam a construção das identidades culturais, como

nação, território, povo, comunidade, entre outros, e que lhe davam substância, perderam vigor em

favor de conceitos mais flexíveis, relacionais. Segundo Teixeira Coelho, as identidades, que eram

achadas ou outorgadas, passaram a ser construídas. As identidades, que eram definitivas, tornaram-

se temporárias. A diversidade cultural que o mundo apresenta hoje, as múltiplas e flutuantes

identidades em processo contínuo de construção, a defesa do fragmentário, das parcialidades e das

diferenças, trouxeram, como corolário, uma volatilidade das identidades que se inscrevem em uma

outra lógica: da lógica da identidade para a lógica da identificação.

Acredita-se que, não se deve pregar o isolamento cultural, se fechando em guetos. O

individuo deve estar aberto e receptível ao novo. Deve-se conhecer e experimentar as outras

culturas como forma de valorizar a diversidade cultural dos povos e como enriquecimento cultural.

Supõe-se que, para conhecer e assimilar a história da construção da cultura de outros

povos, deve-se primeiro conhecer a história da própria cultura, saber como se deu essa construção e

como foi o processo de evolução e desenvolvimento da mesma. Só assim, pode-se conhecer e

entender outras culturas. Conhecendo a própria cultura, o individuo compreenderá a importância de

mantê-la viva na memória, protegê-la e valorizar a cultura como forma de preservar o que somos,

nossas características, nossa identidade. Segundo Barros (2008). “proteger não significa defender o

isolamento ou o fechamento ao diálogo com outras culturas, mas sim encontrar meios de promover

a sua própria cultura”.

Então para finalizar é pertinente citar Pedroso (1999) que afirma um com altives e

fica de reflexão: “Um povo que não tem raízes acaba se perdendo no meio da multidão. São

exatamente nossas raízes culturais, familiares, sociais, que nos distinguem dos demais e nos dão

uma identidade de povo, de nação”. Percebe-se a importância de se conhecer as raízes da própria

cultura para que haja a formação de identidade, no propósito de se definir enquanto cidadão

sabendo situar-se na sociedade.

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REFERÊNCIAS

BAPTISTA, M. V. Planejamento social: intencionalidade e instrumentação. São Paulo: Veras,

2002.

BAUMAN, Zygmunt.Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Tradução Plínio

Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.,2003.

COELHO, Teixeira. Dicionário crítico de política cultural. SP: Iluminuras, 1997.

BORDENAVE, Juan E. Díaz. O que é participação. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1983.

BOTTESELLE, Renato Ponte. A história missioneira nos currículos escolares em São Luiz

Gonzaga: contribuição na formação discente e na construção da cidadania. Disponível em:

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