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III JORNADA INTERAMERICANA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS E I SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE BRASILEIRA DE PESQUISA EM DIREITOS FUNDAMENTAIS | RBPDF ANAIS III JORNADA INTERAMERICANA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS E I SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE BRASILEIRA DE PESQUISA EM DIREITOS FUNDAMENTAIS | RBPDF

III JORNADA INTERAMERICANA DE DIREITOS … · Profa. Dra. Mônia Clarissa Hennig Leal (UNISC) Prof. Dr. Narciso Leandro Xavier Baez (UNOESC) Prof. Dr. Pedro Paulino Grandez Castro

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III JORNADA INTERAMERICANA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS E I

SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE BRASILEIRA DE PESQUISA EM

DIREITOS FUNDAMENTAIS | RBPDF

ANAIS III JORNADA INTERAMERICANA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS E I SEMINÁRIO

NACIONAL DA REDE BRASILEIRA DE PESQUISA EM DIREITOS FUNDAMENTAIS | RBPDF

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COMISSÃO CIENTÍFICA

Profa. Dra. Ana Cândida da Cunha Ferraz (UNIFIEO) Prof. Dr. Carlos Luiz Strapazzon (UNOESC) Prof. Dr. Cesar Landa (PUC, Lima – Peru) Prof. Dr. Cezar Bueno de Lima (PPGDH/PUCPR) Prof. Dr. Eduardo Biacchi Gomes (UNIBRASIL) Profa. Dra. Elda Coelho de Azevedo Bussinger (FDV) Profa. Dra. Gina Vidal Marcílio Pompeu (Unifor) Prof. Dr. Gonzalo Aguillar (Universidade de Talca - Chile) Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet (PUCRS) Prof. Dr. Luis Henrique Braga Madalena (ABDCONST) Prof. Dr. Lucas Gonçalves da Silva (UFS) Profa. Dra. Margareth Anne Leister (UNIFIEO) Profa. Dra. Mônia Clarissa Hennig Leal (UNISC) Prof. Dr. Narciso Leandro Xavier Baez (UNOESC) Prof. Dr. Pedro Paulino Grandez Castro (PUC, Lima – Peru) Prof. Dr. Rubens Beçak (USP-Ribeirão Preto-SP) Prof. Dr. Vladimir Oliveira da Silveira (PUCSP) UNIVERSIDADES E INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES

ABDCONST | Academia Brasileira de Direito Constitucional, Curitiba, PR CONPEDI – Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito - Brasil FDV | Faculdade de Direito de Vitória, ES, Brasil IDP | Instituto Brasiliense de Direito Público, Brasília, DF, Brasil PUCP | Universidade Católica do Perú, Lima, Perú PUCPR | Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR, Brasil PUCRS | Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil RBPDF | Rede Brasileira de Pesquisa em Direitos Fundamentais Rede Interamericana de Pesquisa em Direitos Fundamentais UEXTERNADO | Universidade Externado, Colômbia UFMS | Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, Campo Grande, MS, Brasil UFMT | Universidade Federal do Mato Grosso, Cuiabá, MT, Brasil UFS |Universidade Federal de Sergipe, Aracaju, SE, Brasil UNIBRASIL-PR |Centro Universitário Autônomo do Brasil, Curitiba, PR, Brasil UNIFIEO | Centro Universitário FIEO – São Paulo, SP, Brasil UNIFOR | Universidade de Fortaleza, Fortaleza, CE, Brasil UNISC | Universidade de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, RS, Brasil UNINOVE | Universidade Nove de Julho, SP, Brasil UNOESC | Universidade do Oeste de Santa Catarina, Chapecó, SC, Brasil UPF | Universidade de Passo Fundo, RS, Brasil USP | Universidade de São Paulo - Ribeirão Preto, SP, Brasil UTALCA | Universidade de Talca, Chile

A532

Anais III Jornada Interamericana de Direitos Fundamentais e I Seminário Nacional da Rede

Brasileira de Pesquisa em Direitos Fundamentais [Recurso eletrônico on-line] organização

Rede Brasileira de Pesquisa em Direitos Fundamentais;

Coordenadores: Carlos Luiz Strapazzon, Lucas Gonçalves da Silva, Vladimir Oliveira da

Silveira – São Paulo: RBPDF, 2017.

Inclui bibliografia

ISBN: 978-85-5505-384-9

Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações

11. Direito – Estudo e ensino (Graduação e Pós-graduação) – Brasil – Congressos

internacionais. 2. Direitos humanos. 3. Direitos fundamentais. 4. Jurisdição constitucional. 5.

Direitos Civis. 6. Direitos políticos. 7. Direitos sociais. 8. Direitos econômicos. 9. Direitos

culturais. I. III Jornada Interamericana de Direitos Fundamentais e I Seminário Nacional da

Rede Brasileira de Pesquisa em Direitos Fundamentais (1:2016 : São Paulo, SP).

CDU: 34 _______________________ _____________________________________________________________________

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III JORNADA INTERAMERICANA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS E I SEMINÁRIO NACIONAL DA REDE

BRASILEIRA DE PESQUISA EM DIREITOS FUNDAMENTAIS | RBPDF

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PESQUISA EM DIREITOS FUNDAMENTAIS | RBPDF

Apresentação

APRESENTAÇÃO

Os Anais da III Jornada Interamericana de Direitos Fundamentais e I Jornada Brasileira do

Seminário da Rede Brasileira de Pesquisa em Direitos Fundamentais, realizado entre os dias

26 a 28 de outubro do ano de 2016, na cidade de São Paulo, contou com a apresentação de

artigos científicos nos Grupos de Trabalho Temáticos que analisaram os mais relevantes

temas correlatos e conexos aos direitos fundamentais.

Os trabalhos foram avaliados pela Comissão Científica do Seminário, mediante o processo da

dupla avaliação cega por pares, de forma a atender aos critérios Qualis Eventos da CAPES.

Na presente publicação, foram selecionados os resumos dos trabalhos apresentados e que

foram criteriosamente selecionados.

Conforme pode ser verificado, os resultados disponibilizados na publicação resultam de

temais mais importantes da a Rede Brasileira da Pesquisa em Direitos Fundamentais e da

Rede Latino Americana de Pesquisa em Direitos Fundamentais. Naturalmente, como se trata

da primeira publicação, existe uma tendência de que as pesquisas venham a se consolidar e

que para o próximo Seminário, os resultados possam trazer elementos mais concretos de

análise, inclusive em relação ao aumento do fator de impacto dos trabalhos.

Vale destacar que os temas ligados aos direitos fundamentais, direitos sociais, acesso à

justiça, tanto no plano interno como internacional, cada vez estão mais presentes em nossa

sociedade, principalmente quando vivemos em tempos de reduções e de limitações dos

direitos sociais e fundamentais.

Naturalmente debater os temas mais importantes que estão na pauta nacional e mundial são

de extrema relevância para que possamos buscar dialogar, cada vez mais, com os meios

acadêmicos e produtivo, englobando a própria sociedade civil.

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Portanto, os resultados aqui publicados, demonstram parte das pesquisas realizadas dentro da

Rede Brasileira de Pesquisa em Direitos Fundamentais e que pretende-se consolidar, cada

vez mais, como um espaço de referência e de debate sobre os mais importantes temas que

ocupam as agendas nacional e internacional.

São Paulo, 15 de novembro de 2016.

Prof. Dr. Carlos Luiz Strapazzon

Prof. Dr. Lucas Gonçalves da Silva

Prof. Dr. Vladimir Oliveira da Silveira

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POBREZA MULTIDIMENSIONAL: CONTORNOS CONCEITUAIS E METODOLOGIA DE AFERIÇÃO

MULTIDIMENSIONAL POVERTY : CONCEPTUAL CONTOURS AND ASSESSMENT METHODOLOGY

Clarice Mendes Dalbosco

Resumo

Este trabalho explora o conceito de pobreza multidimensional. A hipótese central é de que a

privação de bens fundamentais vai além da concepção de pobreza como privação de renda. É

uma releitura da pobreza a partir do paradigma do desenvolvimento humano, orientado pela

abordagem das capacidades humanas. O estudo destaca o atual método de aferição da

pobreza denominado Índice de Pobreza Multidimensional - IPM. É uma pesquisa conceitual

com análise crítica, guiada pela teoria do desenvolvimento como liberdade, de autoria de

Amartya Sen.

Palavras-chave: Direitos humanos, Direitos fundamentais sociais, Pobreza multidimensional, Índice de pobreza multidimensional

Abstract/Resumen/Résumé

This paper explores the concept of multidimensional poverty. The central hypothesis is that

the deprivation of basic goods goes beyond the concept of poverty as deprivation of income.

It is a reinterpretation of poverty from the human development paradigm, guided by the

approach of human capabilities. The study highlights the current poverty measurement

method named Multidimensional Poverty Index - IPM. It is a conceptual research with a

critical analysis, guided by the theory of development as freedom authored by Amartya Sen.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Human rights, Fundamental social rights, Multidimensional poverty, Multidimensional poverty index

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1. INTRODUÇÃO

A preocupação constante e crescente com as novas realidades decorrentes da

globalização, das relações econômicas e do desenvolvimento social assinalam a pauta de

muitas das discussões internacionais capitaneadas pela Organização das Nações Unidas e

outros organismos internacionais, especialmente voltadas à proteção de direitos fundamentais

e ao desenvolvimento humano. O Relatório do Conselho de Direitos Humanos das Nações

Unidas que trata dos princípios orientadores relativos a extrema pobreza e direitos humanos,

de 2012, evidencia que é uma afronta à moral o fato de existirem milhões de pessoas a

viverem em situação de pobreza num mundo caracterizado por níveis de desenvolvimento

econômico, meios tecnológicos e recursos financeiros sem precedentes na história. O referido

Relatório destaca que a erradicação da extrema pobreza, além de um dever moral, é também

uma obrigação legal decorrentes das normas internacionais de direitos humanos que estão em

vigor.

A Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social, realizada em 1995 em

Copenhague, na Dinamarca, que compreendeu as conferências da agenda social da ONU e

ficou conhecida como a “Cúpula da Pobreza”, apresenta em seu preâmbulo que este fora um

encontro de vanguarda para debater o tema do desenvolvimento social e do bem-estar humano

de todos. Como meta proposta pela Cúpula está a necessidade de se adotar métodos que

permitam medir todas as formas de pobreza, em particular da pobreza absoluta, bem como

avaliar e vigiar as circunstâncias dos que se encontram em perigo a nível nacional.

O relatório dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, documento que

acompanha o progresso regional e global rumo às metas estabelecidas pelos países-membros

das Nações Unidas, divulgado 19 de julho de 2016, destaca que 13% da população mundial

ainda vive em extrema pobreza, 800 milhões de pessoas passam fome e 2,4 bilhões não têm

acesso a saneamento básico (ONUBR, 2016).

Como assinalado por Piovesan (2004, p. 28), apontando dados da Organização

Mundial de Saúde: “a pobreza é a maior assassina do mundo. Ela impõe sua influência

destrutiva em todos os estágios da vida humana, da concepção à sepultura. Conspira com as

doenças mais mortíferas e dolorosas para desgraçar a existência de todos que dela padecem”.

As múltiplas privações, como trata Amartya Sen, em qualquer dos seus níveis, fere o

acesso aos direitos fundamentais, razão pela qual, se torna imprescindível reconhecê-las, bem

como promover políticas de enfrentamento da pobreza multidimensional, reduzindo-a em

larga medida e possibilitando o progresso social, a igualdade democrática e a proteção da

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dignidade de todas as pessoas. A Declaração de Viena reconhece a relação de

interdependência entre a democracia, o desenvolvimento e os direitos humanos.

As ações que visam a compreensão do fenômeno da pobreza, a melhor forma de

medi-la e os caminhos para seu enfrentamento visam reconhecer direitos do cidadão que sofre

múltiplas privações em decorrência de possíveis desajustes nos arranjos sociais de proteção

ou de políticas econômicas pouco ou nada distributivas. É patente a necessidade de

desencorajamento de práticas discriminatórias que obstam a igualdade de oportunidades em

total contrariedade aos princípios sociais democráticos e a égide do Direito Internacional.

Não obstante a importância de que os indivíduos tomem consciência da dimensão do

problema da pobreza, da atual concepção do que é pobreza e das consequências para a

restrição de direitos humanos que isso representa, ainda parece ser insuficiente a atenção dada

aos problemas a ela associados, especialmente no que tange ao processo de expansão das

liberdades reais de que as pessoas possam usufruir (Sen, 2010, p. 36).

Este estudo, terá por escopo apresentar balizas conceituais ao tema da pobreza,

sobretudo sob o contexto da linguagem internacional dos direitos humanos referente a teoria

da pobreza multidimensional. Saber o que é, de fato, a pobreza revela-se um conceito chave

na teoria da segurança social, mais especificamente no campo da assistência. Uma política

pública ou uma legislação que não tem a clareza acerca desse conceito, desconhece, por certo,

qual é a melhor forma de investir o dinheiro público.

Por isso, uma das perspectivas principais da pesquisa conceitual está no estudo do

conceito de pobreza como privação de capacidades desenvolvida por Amartya Sen. Pela

compreensão das pesquisas e da filosofia moral desse autor, percebe-se que, muito mais do

que a reunião de um conjunto de bens que permita ao indivíduo viver de forma adequada, a

erradicação, ou redução nos níveis de pobreza dependem de compreensões alargadas do tema,

atentas aos aspectos de gênero, idade, de acesso à bens e serviços, papeis sociais e potencial

para auferir renda. É, portanto, um problema que diz respeito à eficácia dos direitos

fundamentais de segurança social e sua teoria constitucional haja vista que, a eliminação ou

redução dos níveis de pobreza, dependem diretamente do significado e da compreensão que

temos sobre esse tema, o tema da pobreza.

2. A POBREZA COMO FENÔMENO MULTIDIMENSIONAL

Neste tópico tratar-se-á de algumas interfaces históricas pelas quais passou o tema da

pobreza ao longo do século XX, descrita a partir de algumas categorias: pobreza relativa;

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pobreza absoluta; pobreza relativa/absoluta. O estudo desenvolvido por Crespo e Gurovitz

(2002, p. 3) mostra que a pobreza relativa se vincula diretamente às desigualdades na

repartição de renda e é revelada de acordo com o padrão de vida presente na sociedade

avaliada, através de um critério comparativo. Para esses autores “o conceito de pobreza

relativa é descrito como aquela situação em que o indivíduo, quando comparado a outros, tem

menos de algum atributo desejado, seja renda, sejam condições favoráveis de emprego ou

poder”. A par desse entendimento, Kageyama e Hoffmann (2006, p. 82) reforçam que o

conceito de pobreza é sempre um conceito relativo, pois sua avaliação é, permanentemente,

relativa a um conjunto de condições e não somente a condição financeira. Por certo, se existir

fome e inanição, há o que os autores chamaram de “irredutível essência absoluta” da pobreza,

pouco importando a posição relativa de um indivíduo no extrato social. Uma forma de se

caracterizar o prisma relativo da pobreza é definindo uma linha de pobreza, como por

exemplo, calculando a renda per capita de parte da população. Contudo, a fragilidade desta

categoria classificatória decorre da utilização equânime dos termos pobreza e desigualdade de

renda, quando na verdade, são conceitos distintos. Nesse sentido ROCHA (2006, p. 11)

afirma que:

O conceito de pobreza relativa define necessidades a serem satisfeitas em função do

modo de vida predominante na sociedade em questão, o que significa incorporar a

redução das desigualdades de meios entre indivíduos como objetivo social. Implica,

consequentemente, delimitar um conjunto de indivíduos “relativamente pobres” em

sociedades onde o mínimo vital é garantido a todos.

De outro norte, a pobreza absoluta decorre da fixação de padrões para o nível

mínimo de necessidades, conhecido como limite da pobreza, estabelecendo qual porcentagem

da população encontra-se aquém desse patamar. A ideia de pobreza absoluta vincula-se

estritamente com as questões de sobrevivência física, o mínimo vital. A definição desse limite

de pobreza pode ser realizada sob diferentes prismas: biológico, das necessidades básicas ou

dos salários mínimos. O que fica claro neste critério é que a pobreza absoluta é sempre

pobreza, independentemente dos padrões usados para medi-la. Robert McNamara, quando

presidiu o Banco Mundial, definiu a pobreza absoluta como:

A pobreza ao nível absoluto (...) é uma condição de vida caracterizada por subnutrição, analfabetismo, doença, ambiente degradado, elevada mortalidade

infantil e baixa esperança de vida, abaixo de qualquer definição razoável de decência

humana (...) é a vida nos limites da existência. Os pobres absolutos são seres

humanos com carências gravíssimas, que lutam pela sobrevivência num conjunto de

circunstâncias miseráveis e degradantes, quase inconcebíveis para a imaginação

sofisticada e as condições privilegiadas de que desfrutamos (...) (SINGER, 2000, p.

133).

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McNamara tocou em um importante elemento comparativo: “condições privilegiadas

de que desfrutamos”, mas como definir ou avaliar o que constitui a qualidade de vida?

Amartya Sen entende que não se mede qualidade ou um padrão de vida pela posse de um

conjunto de bens, tampouco pela utilidade que eles possam possuir, mas consiste na

capacidade dos indivíduos (capabilites) em utilizar esses bens na busca da satisfação e da

felicidade (KAGEYAMA e HOFFMANN, 2006, p. 82).

A legislação brasileira, por exemplo, parece utilizar-se do conceito de pobreza em

caráter absoluto, pois vincula as políticas onde subjaz a ideia de um salário mínimo oficial,

como se este recorte referendasse uma “boa aproximação do montante em dinheiro necessário

para o nível de vida mínimo” (CRESPO; GUROVITZ, 2002, p. 4), como é o caso do critério

de miserabilidade adotado para concessão de benefício assistencial ao idoso ou deficiente

fixada em renda não superior a ¼ do salário mínimo nacional.

Já o aspecto da pobreza relativo/absoluta representa um critério do fenômeno da

pobreza onde são considerados elementos de ambas as classificações anteriores sopesados

conjuntamente. Nota-se que, a partir das categorias conceituais apresentadas, o conceito de

pobreza possui pelo menos, três propostas: sobrevivência, necessidades básicas e privação

relativa, conforme demonstrou Crespo e Gurovitz (2002, p. 4).

Sob a ótica da sobrevivência há uma intrínseca relação entre a pobreza e a

subsistência biológica. Nesse recorte, mais utilizado nos séculos XIX e XX, cuja origem

resultou do trabalho de nutricionistas inglesas, a pobreza era definida com base no critério da

renda necessária para a sobrevivência exclusivamente física do indivíduo, tendo em vista que

a renda dos mais pobres era insuficiente para manter o rendimento físico dos mesmos. Mais

tarde, já na década de 70, auferir a pobreza passou a contar com novos elementos, que

significaram uma ampliação na concepção de sobrevivência. A partir desse momento o

fenômeno da pobreza assumiu a conotação de necessidades básicas. Nessa nova perspectiva

também eram consideradas a disponibilidade de serviços de água potável, saneamento básico,

saúde, educação e cultura. Ao passo que as estatísticas e políticas de enfrentamento à pobreza

se deparavam com as estatísticas e mapeamentos do fenômeno, também concluíam pela

fragilidade que tais recortes avaliativos expunham, razão pela qual, em 1980, a pobreza

passou a ser entendida como privação relativa. Sobre tal concepção, explica Crespo e

Gurovitz (2002, p. 5), que o conceito de pobreza passou a ter um enfoque mais rigoroso, com

vistas e observar melhor o aspecto social, "dessa forma, sair da linha de pobreza significava

obter: um regime alimentar adequado, um certo nível de conforto, o desenvolvimento de

papeis e de comportamentos socialmente adequados".

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Até os anos 1990 a linha oficial de pobreza oficial que vigorava nos Estados Unidos

levava em consideração o custo da cesta básica, incluindo itens como: alimentos, vestuário,

aquecimento e iluminação, dentre outros equipamentos domésticos. Depois, esses critérios

identificadores foram sendo ajustados passando a considerar variações nos preços dos

alimentos e a carga dos gastos com a alimentação no orçamento doméstico, além das

mudanças na composição das famílias (KAGEYAMA; HOFFMANN, 2006, p. 80).

Entre os principais formuladores da teoria da privação relativa encontra-se Amartya

Sen, que destacou que as privações sofridas pelas pessoas podem ocorrer em diversas esferas

da vida, não somente no aspecto material, na escassez de renda. Sen desenvolveu uma

concepção de pobreza como privação de capacidades básicas, sob um prisma

multidimensional do fenômeno, para além do recorte sintético de avaliação pautada em uma

perspectiva de renda inferior a um patamar pré-estabelecido. Vale destacar, contudo, que a

teoria de Sen não desconsiderou a condição de renda na análise da condição de pobreza, pois,

para o autor, a falta de renda pode ser uma razão primordial da privação de capacidades de

uma pessoa. Para Sen, são inegáveis as vantagens ao efetuar uma análise da pobreza sob

compreensões mais alargadas:

O que a perspectiva da capacidade faz da análise da pobreza é melhorar o

entendimento da natureza e das causas da pobreza e privação desviando a atenção

principal dos meios (e de um meio específico que geralmente recebe atenção exclusiva, ou seja, a renda) para os fins que as pessoas têm razão para buscar e,

correspondentemente, para as liberdades de poder alcançar esses fins. (...) As

privações são vistas em um nível mais fundamental – mais próximo das demandas

informacionais da justiça social. Daí a relevância da perspectiva da pobreza baseada

na capacidade (SEN, 2010, p. 123).

Rezende (2014, p. 36) indica que a noção de pobreza com a qual Amartya Sen vem

desenvolvendo desde 1990 é, por certo, multidimensional, decorrente da ideia de privação e

impotência, ao demonstrar que tal compreensão implica em maneiras de avaliar “renda,

educação, longevidade, acesso a recursos, liberdade e dignidade humanas”.

A ideia de pobreza como problema complexo e multidimensional é largamente

utilizado pelos técnicos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD

quando da elaboração dos Relatórios de Desenvolvimento Humano - RDH, produzidos desde

o ano de 1990. Rezende (2014, p. 41) destaca que a produção destes documentos aponta

caminhos que demonstram que a “privação e a impotência juntas destroem, dia após dia,

milhares de seres humanos”. A adoção da concepção multidimensional da pobreza pode ser

observada em outros importantes documentos internacionais, como a Declaração e Programa

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de Ação da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social, realizada em Copenhague,

Dinamarca, em 1995, cuja causa do fenômeno, de acordo com o texto, congrega razões que

pertencem às políticas de enfrentamento adotadas em âmbito nacional e internacional. O

documento contempla uma leitura que coteja a ausência de rendimentos e recursos aptos a

garantia de meios de vida sustentáveis (fome, subnutrição, doenças, dificuldades de acesso

aos serviços de educação, saúde, habitação, exclusão social, mortalidade, discriminação) com

a falta de participação na tomada de decisões na vida civil, social e cultural.

A pobreza manifesta-se de várias maneiras: falta de rendimentos e de recursos

produtivos suficientes para garantir meios de vida sustentáveis, fome e subnutrição,

doença, falta de acesso limitado à educação e a outros serviços básicos, aumento da

mortalidade e da mortalidade devido a doenças, carências de habitação e

discriminação e exclusão sociais. Também se caracteriza pela falta de participação

na tomada de decisões na vida civil, social e cultural. A pobreza manifesta-se em

todos os países, como pobreza generalizada em muitos países em desenvolvimento,

como focos de pobreza no meio da abundância em países desenvolvidos, como

perda de fontes de rendimento por causa de uma recessão econômica, como

consequência repentina de catástrofes ou conflitos, como pobreza dos trabalhadores de baixos rendimentos e como miséria absoluta dos que estão à margem dos

sistemas de apoio das famílias, das instituições sociais e das redes de segurança. As

mulheres suportam uma parte desproporcionada do fardo da pobreza e as crianças

que crescem nessa situação acabam por ficar em desvantagem para sempre. As

pessoas de idade, os deficientes, as populações indígenas, os refugiados e as pessoas

deslocadas dentro dos seus países, são também especialmente vulneráveis à pobreza.

Além disso, a pobreza, nas suas diversas formas, constitui uma barreira à

comunicação, dificulta o acesso aos serviços e comporta importantes riscos para a

saúde; por outro lado, as pessoas que vivem em pobreza são especialmente

vulneráveis às consequências das catástrofes e dos conflitos (Declaração e Programa

de Ação da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social, realizada em Copenhague, Dinamarca, em 1995).

Além da inovação na concepção de pobreza, a Conferência da Agenda Social da

ONU abordou no texto a impossibilidade de se encontrar uma solução uniforme aplicável a

nível mundial. Contudo, destacou que cada país deve desenvolver programas de erradicação

da pobreza de acordo com as realidades locais, contando com apoio das atividades

internacionais, a fim de que se forme um paralelo favorável a todos os esforços empreendidos.

Compreender a pobreza de forma multidimensional implica no reconhecimento mínimo de

suas multifacetadas causas, das quais a discriminação e a exclusão de grupos vulneráveis

caracterizam-se como as principais.

No que tange à perspectiva da erradicação da pobreza na Declaração de Copenhague

ficou claro que é necessário que as oportunidades econômicas sejam de acesso universal, e

que possam favorecer a existência de meios de vida sustentáveis e que contem com serviços

essenciais básicos, especialmente aos mais desfavorecidos. A Agenda Social da ONU de 2005

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apontou que é necessário oferecer oportunidades e serviços aos pobres, possibilitando que

estes participem na vida política, econômica, social e que possam contribuir para seu próprio

desenvolvimento. Como explicitado por Cecília Ugaz1, “não haverá segurança se não se

vencer a pobreza, em cujo caso o mundo talvez será mais rico, mas menos solidário e seguro”.

Ademais, a proposta defendida na Declaração de Copenhague é a de que as políticas

voltadas à erradicação da pobreza permitam a participação daqueles aos quais a política é

voltada. Na abordagem feita por ALVES (1997, online), a Cúpula Mundial realizada em

Copenhague "foi o primeiro grande encontro internacional havido sobre o tema do

desenvolvimento social", com vistas a reconhecer a importância do bem-estar humano de

todos e conferindo alta prioridade aos objetivos definidos no Programa de Ação sobre

Desenvolvimento Social. Essa perspectiva acerca do desenvolvimento social, capitaneada pela

ONU, demonstra que a pobreza, cada vez mais, passa a ser reconhecida como uma violação

aos direitos humanos, e como tal, precisa ser erradicada. Para o já citado Relatório do Banco

Mundial de (2001, p. 12), a pobreza é mais que renda ou desenvolvimento humano

inadequado, caracteriza-se também pela vulnerabilidade e falta de voz, poder e representação.

O Relatório de Desenvolvimento Humano de 2010, classifica de forma clara e

inconteste que “as dimensões da pobreza vão muito para além de rendimentos inadequados,

abrangendo a saúde e a nutrição deficientes, um baixo nível de educação e competências,

meios de subsistência inadequados, más condições de habitação, exclusão social e falta de

participação” (RDH, 2010, p. 98), situação que afeta pessoas no mundo inteiro, a pobreza é

multifacetada e, por isso, multidimensional. Não se pode olvidar que as medidas concernentes

ao dinheiro são demasiadamente importantes, mas é indispensável que sejam consideradas as

privações em outras dimensões e as respectivas sobreposições, especialmente porque as

famílias com várias privações se encontram, seguramente, em piores situações do que as

medidas da pobreza de rendimento insinuam. A visão multidimensional da pobreza aumenta a

complexidade das estratégias de redução do fenômeno, porque é preciso levar em conta outros

aspectos, como os fatores sociais e as forças culturais.

3. O ÍNDICE DE POBREZA MULDIMENSIONAL

Muitos autores abordam a questão da pobreza multidimensional, mas os principais

teóricos e precursores no debate do tema são, especialmente, dois: Amartya Sen e Mahbub Ul

1 Comentário da Assessora Principal em Políticas do PNUD, no âmbito do Relatório sobre o Desenvolvimento

Humano 2005.

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Haq, que buscaram encontrar novos parâmetros para entender as muitas dimensões da pobreza

que atingem os indivíduos ao redor do planeta (REZENDE, 2014, p. 27). O PIB – Produto

Interno Bruto dos Países sempre foi um importante indicador de produção de riquezas e

geração de renda das nações. Entretanto, ao longo do tempo, se pode perceber que,

principalmente, a análise do desenvolvimento humano dos países não poderia ser feito através

da leitura simplista trazida pela taxa do PIB. Tornou-se necessário implementar uma forma de

“medir melhor” o crescimento, criando indicadores que apontassem, da forma mais realística

possível, o desenvolvimento humano das nações. Essa leitura oportunizaria aos organismos

internacionais a propositura de diretrizes para políticas que assegurem direitos humanos, a

elaboração de tratados e o acompanhamento na evolução dos países no processo de instituição

dos mecanismos de proteção social e direitos humanos. Assim, nasceu o IDH, criado por

Mahbub ul Haq com a colaboração do economista indiano Amartya Sen, ganhador do Prêmio

Nobel de Economia de 1998. Desde a sua criação, o IDH já passou por vários ajustes. O

índice pretendia ser uma medida geral, sintética, do desenvolvimento humano. Os três pilares

que constituem o IDH (saúde, educação e renda) são mensurados da seguinte forma: (i) Uma

vida longa e saudável (saúde) é medida pela expectativa de vida;(ii) O acesso ao

conhecimento (educação) é medido por: i) média de anos de educação de adultos, que é o

número médio de anos de educação recebidos durante a vida por pessoas a partir de 25 anos; e

ii) a expectativa de anos de escolaridade para crianças na idade de iniciar a vida escolar, que é

o número total de anos de escolaridade que um criança na idade de iniciar a vida escolar pode

esperar receber se os padrões prevalecentes de taxas de matrículas específicas por idade

permanecerem os mesmos durante a vida da criança; (iii) E o padrão de vida (renda), medido

pela Renda Nacional Bruta (RNB) per capita expressa em poder de paridade de compra (PPP)

constante, em dólar, tendo 2005 como ano de referência (PNUD, online).

Até meados da década de 90 o PNUD utilizava largamente o IDH para fins de

comparação e monitoramento da incidência de pobreza nos diferentes países. Contudo, como

explica Rocha (2006, p. 24) a aplicação desse índice não se revelou adequada. A autora

destaca alguns motivos dentre os quais se pode citar as dificuldades de se garantir a

comparabilidade em função de especificidades culturais, uma vez que os indicadores

utilizados na composição do índice retratam médias, e, por sua vez, mascaram situações de

extrema desigualdade de bem-estar entre os indivíduos, mesmo àqueles que pertencem a

mesma classe social ou âmbito familiar. Em que pese a ampliação da perspectiva sobre o

desenvolvimento humano, o IDH não contempla os mais variados aspectos de

desenvolvimento, tampouco é uma representação da "felicidade" das pessoas ou venha a

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indicar ‘o melhor lugar no mundo para se viver’" (ROCHA, 2006, p. 24).

Os próprios autores da teoria, que fundamentaram a criação do índice, atentaram para

o fato de que democracia, participação, equidade, sustentabilidade eram outros dos muitos

aspectos do desenvolvimento humano que não estavam contemplados no IDH. Como

destacado por Sen, as vidas humanas são maltratadas e diminuídas de maneiras muito

diversas, razão pela qual a necessidade e uma visão multidimensional da pobreza e das

privações guiam a busca de um adequado indicador de pobreza humana. Entretanto, mesmo

diante desta necessidade, o IDH tem a competência de sintetizar a compreensão do tema, bem

como possibilitar e fomentar o debate (PNUD, online).

Ainda sob o aspecto histórico vale lembrar que nos Relatórios de Desenvolvimento

Humano publicados entre 1997 e 2009, o PNUD apresentou um novo índice sintético,

chamado de Índice de Pobreza Humana (IPH). O IPH utilizava médias nacionais para refletir

as carências agregadas em saúde, educação e qualidade de vida. Contudo, não poderia

determinar se os indivíduos, as famílias e os grandes grupos sofriam carências específicas. Por

tais razões um outro índice substituiu o IPH, apresentado em 2010 pelo PNUD foi chamado

de Índice de Pobreza Multidimensional – IPM, que nada mais é do que um indicador

complementar de acompanhamento do desenvolvimento humano que tem como principal

objetivo medir a pobreza para além da perspectiva da pobreza de renda. Uma das principais

concepções que norteiam o aprimoramento na maneira como se mede a pobreza é a de que a

renda monetária, por si só, não explica os múltiplos aspectos da pobreza, sendo necessário

analisar, em separado, as diferentes dimensões com seus respectivos indicadores. Uma pessoa

que é pobre está sujeita à várias privações ao mesmo tempo, como por exemplo: ter saúde

precária ou desnutrição, falta de água ou eletricidade limpa, má qualidade de trabalho ou

baixa escolaridade. Está claro que medir a pobreza através de um fator isolado, como renda,

não é suficiente para captar a verdadeira realidade da pobreza.

Nesta senda, o IPM é uma medida internacional da pobreza aguda que abrange mais

de cem (100) países em desenvolvimento. O índice complementa as medidas tradicionais da

pobreza baseadas na renda, capturando as privações que cada pessoa enfrenta ao mesmo

tempo, no que diz respeito ao nível de educação, de saúde e de vida (OPHI, online). As bases

teóricas e filosóficas para a criação do índice pertencem à Amartya Sen, contudo o

desenvolvimento matemático das variáveis e indicadores que compõem o IPM foram

desenvolvidos pelo Oxford Poverty & Human Development Initiative – OPHI, que é um

centro de investigação no âmbito do Departamento de Oxford para o Desenvolvimento

Internacional, da Universidade de Oxford, na Inglaterra. Este centro de investigação é

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liderado por Sabina Alkire, cujo trabalho se propõe a construir e promover uma metodologia

mais sistemática para a medição da pobreza multidimensional, além de fomentar a análise da

economia de bem-estar e do desenvolvimento humano.

O OPHI desenvolveu uma metodologia para medir a pobreza multidimensional

conhecido como o método de Alkire Foster – AF, que leva o nome dos seus formuladores

(Sabina Alkire e James Foster), que propicia a contagem dos diferentes tipos de privação de

que os indivíduos estão expostos, ao mesmo tempo, como falta de educação ou de emprego,

ou de má saúde ou padrões de vida. Esses perfis de privação são analisados para identificar

quem é pobre e, depois, usado para construir o índice de pobreza multidimensional (IPM).

Assim, é o OPHI que calcula o IPM global, publicado desde 2010 no Relatório de

Desenvolvimento Humano do PNUD, oportunizando uma medida internacionalmente

comparável da pobreza aguda. O IPM é atualizado duas vezes por ano e construído através do

método AF.

Consoante esta nova metodologia, é possível medir e diagnosticar quais os

problemas enfrentados pelas famílias a partir de três dimensões: Saúde, Educação e Padrão de

Vida. Neste sentido, o IPM procura computar tanto o número quanto as pessoas que são

multidimensionalmente pobres especialmente no que tange a intensidade e a diversidade da

sua pobreza (RDH, 2010, p.28). O método AF possibilita a inclusão de outras dimensões na

composição dos índices de pobreza, além das três principais acima indicadas, razão pela qual

além de uma medida internacional é possível reajustar a fórmula para melhor adequar a leitura

do fenômeno em cada país, gerando índices nacionais de pobreza. É o que já ocorre no Chile,

México, Colômbia, Butão e Filipinas. Na Colômbia, por exemplo, além dos indicadores de

saúde, educação e padrão de vida, estão incluídas condições de trabalho (desemprego de alta

duração ou emprego formal) e situação de crianças e adolescentes no seio familiar (existência

de trabalho infantil, acesso à creche, dentre outros) (OPHI, online).

O IPM indica uma solução para o ponto mais nevrálgico do antigo IPH, ao passo que

possibilita refletir quantas carências simultâneas sofrem as pessoas, e qual a intensidade

dessas carências. A rigor, o IPM pode ser dividido por indicadores para mostrar como as

mudanças de pobreza multidimensional, dependendo da região, ou grupo étnico a que

pertence o indivíduo, ocorrem. Ele também fornece uma significativa contribuição para a

elaboração de políticas sociais, mapeando de forma minuciosa elementos necessários ao

desenvolvimento humano.

No IPM, dentro das dimensões de saúde, educação e padrão de vida, são avaliados

outros 10 indicadores como: anos de escolaridade e crianças matriculadas (Educação);

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nutrição e mortalidade infantil (Saúde); combustível para cozinhar, sanitários, acesso a água

potável, acesso a eletricidade, acesso a uma casa com pavimento de terra e bens domésticos -

não sendo veículo, a propriedade no máximo, de dois dos seguintes bens: bicicleta, moto,

rádio, geladeira, telefone e televisão (Padrão de Vida). Cada indicador do IPM pode ser

monitorado individualmente.

DAMÁSIO (2011, online) explica que metodologicamente, o IPM é o resultado do

sopesamento de duas medidas - a taxa multidimensional da contagem de pessoas e a

intensidade/amplitude da pobreza. No cálculo do IPM cada uma das três dimensões (saúde,

educação e padrão de vida) concorre com uma ponderação de 1/3. Ademais, no caso da saúde

e da educação, com dois indicadores cada, esses indicadores valem 1/6 e, no que se refere ao

padrão de vida digno, cada um dos seus seis indicadores concorre com 1/18 (OPHI, online).

No momento de análise de cada família, efetua-se a soma das respectivas privações

multiplicadas pelo seu peso, isto é, a pontuação de privação ponderada. Quanto maior o IPM,

maior é o nível de pobreza multidimensional. Em resumo, uma pessoa é

multidimensionalmente pobre se é privada em 33% (trinta e três por cento) ou mais dos

indicadores ponderados (OPHI, online).

Se pode observar que uma importante vantagem da metodologia aplicada ao IPM

considera os passos da identificação e agregação que Amartya Sen conjectura para a

mensuração da pobreza. A leitura dos dados é relativamente de fácil interpretação, identifica

privações conjuntas e permite várias formas de apresentar as privações por meio da

mensuração da intensidade. Ela não só identifica quem, mas como o indivíduo (família,

grupo) é pobre. É uma metodologia flexível que permite ao pesquisador definir os cortes e

pesos de suas dimensões e indicadores (FERES, 2013). Se ficar identificado que a carência

em termos de habitação é mais grave do que a de educação, por exemplo, as políticas de

enfrentamento devem se ater à essa singularidade na definição e priorização das ações.

O relatório do PNUD 2010 demonstra que, geralmente, nos países em que o IDH é

mais baixo, os índices de pobreza multidimensional costumam ser mais elevados, o que

demonstra que, embora usem elementos diversos e pormenorizados em sua análise, tendem a

apontar resultados equivalentes. Assevera ainda, estatisticamente, que a maior concentração

de pobres multidimensionais está nas zonas rurais. Já, o Relatório do PNUD 2014 apresenta

um importante recorte acerca do tema da pobreza e da vulnerabilidade, com salutar destaque

para as suas diferenças. Destaca-se que, as pessoas pobres possuem um maior grau de

vulnerabilidade social, razão pela qual os riscos de choques adversos recaem de forma mais

agressiva sobre estes. “As pessoas pobres são vulneráveis, pois regra geral não tem acesso a

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poupanças, empréstimos ou outros ativos com que possam contar para dar respostas às

contingências imprevistas” (RDH, 2014, p. 74). Os dados estatísticos deste Relatório apontam

para certas singularidades onde a pobreza multidimensional transparece de forma

significativa. Citam-se os núcleos em que as mulheres são chefes de família, famílias que

incluem pessoas com mais de 60 anos de idade, ou mesmo crianças com menos de 5 anos de

idade, membros potencialmente mais sujeitos a alguma das condições de pobreza.

No texto que apresentou a atualização, as notas metodológicas e resultados do IPM,

de junho de 2016, Alkire et al (2016) explica que o IPM cobre atualmente 102 países, o que

corresponde a 75% da concentração demográfica da população mundial, cerca de 5,2 bilhões

de pessoas. Para Alkire, 30% das pessoas (1,6 bilhões) são identificados como

multidimensionalmente pobres. Relata ainda que o número de pobres caiu em apenas 12

países e, que em 18 países, embora o IPM tenha diminuído, o crescimento da população levou

a um aumento global do número de pessoas pobres.

Conforme destacado por Kageyama e Hoffmann (2006, p. 83), muitos autores

aconselham a utilização de diferentes medidas de pobreza, desde que a prioridade das

políticas sociais estejam voltados aos grupos considerados pobres em mais de um critério

simultaneamente.

Na esteira do pensamento de Amartya Sen, a realização de direitos fundamentais de

segurança social depende da melhor e mais completa compreensão acerca do fenômeno da

pobreza, e da escolha consciente das ações por parte dos governos e dos organismos

internacionais preocupados com a formação de um piso básico de proteção social. Os direitos

de segurança social são meios, para atingir os fins do desenvolvimento humano com a plena

fruição das liberdades individuais. Não é justificável o esforço do Estado na garantia dos

direitos de liberdade se não possibilitar ao cidadão gozar de prestações materiais mínimas

capazes de garantir a este uma existência digna.

4. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS MÉTODOS DE AFERIÇÃO DA POBREZA

No parecer de Sen2 (1999, p. 24) a primeira exigência para a elaboração de um

conceito de pobreza é a existência de um critério quanto a quem deveria ser o centro das

preocupações, sendo necessário a qualquer método de medição da pobreza atentar para duas

situações distintas, sendo a primeira delas a identificação dos pobres e a segunda o

2 A primeira publicação da obra de Amartya Sen – Pobreza e Fomes, em português, foi realizada em setembro de

1999, data da obra citada neste trabalho, pela Editora Terramar de Portugal. Entretanto, a primeira publicação,

cuja edição original foi feita pela Clarendon Press/Oxford University Press, é do ano de 1981.

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reconhecimento, chamado de agregação, das características de pobreza num indicador global

(Sen, 1999, p. 43).

O Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG), do

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento3, situado no Brasil, aponta que o

debate sobre a medição da pobreza, tanto a nacional quanto a internacional, continuam

evoluindo (GENTILINI e SUMMER, 2012, online). Segundo estudos deste Centro, em 15

dos países mais pobres e em todos os países em desenvolvimento são utilizadas as mesmas

linhas de pobreza internacional de USD4 1,25 e USD 2 por dia. Essa Linha de Pobreza

permite a comparação a nível internacional, em termos monetários, entretanto, no âmbito

nacional os países acabam usando diversos outros critérios e abordagens para medir a

pobreza, o que acarreta distorções na análise do fenômeno. Gentilini e Summer (2012, online)

trazem a discussão acerca das implicações que haveriam se, o número de pessoas pobres

existentes no mundo, fosse definida com base em como a pobreza é caracterizada nos países

onde essas pessoas vivem. Citam como exemplo os casos do México e da Bolívia, cujas taxas

de pobreza, se avaliadas sob uma linha nacional, ultrapassam 40% a medida internacional de

USD 1,25/dia. Exatamente o contrário do que ocorre em países africanos como a Tanzânia,

Uganda e Nigéria, cujas taxas de pobreza baseadas em linhas internacionais são muito

superiores daquelas resultantes das medidas nacionais. A grosso modo, é como se esses países

não considerassem como pobres uma grande parte da população que, para padrões monetários

internacionais, estariam sob condições de pobreza e privação. Na Tanzânia, país já citado,

cerca de 35% da população se encontra abaixo da linha da pobreza internacionalmente

3 O Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG, na sigla em inglês, International

Policy Centre For Inclusive Growth) é um fórum global para o diálogo sobre políticas de desenvolvimento inovadoras. O centro é fruto de um acordo de parceria entre o Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (PNUD) e o Governo do Brasil, representado pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e

Gestão (MPOG). O mandato IPC-IG é promover a produção e divulgação de estudos e recomendações políticas,

o intercâmbio de melhores práticas em iniciativas de desenvolvimento e a expansão da Cooperação Sul-Sul.

(Disponível em:< http://www.ipc-undp.org/pt-br/sobre-o-ipc> Acesso em 03 de agosto de 2016). A ideia do

fórum nasceu com a implantação do Centro Internacional de Pobreza, em Brasília, em 29 de agosto de 2005,

tornando-se o único centro dessa natureza no mundo, visando produzir estudos mundiais e criar uma rede de

pesquisadores focados na questão da pobreza. O centro foi instalado na sede do Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada (Ipea), em Brasília. Destaca-se que o Brasil foi escolhido, entre Índia, México e Chile, e se trata de um

centro único. De acordo com a ministra da época - Nilcéa Freira, da Secretaria Especial de Políticas para as

Mulheres, as discussões ajudariam a enfrentar o desafio do combate à fome e a redefinir os padrões de extrema pobreza no Brasil, ainda contribuiriam para redefinir a abrangência dos programas e, sobretudo, tratar a “pobreza

não só como uma questão de salário ou rendimentos econômicos mensais, mas como situação que envolve

muitas dimensões, como a saúde e o bem estar, à luz dos direitos humanos e da efetivação deles". (Disponível

em: < http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2005-08-29/brasil-sedia-unico-centro-internacional-de-

pobreza-do-mundo> Acesso em 03 de agosto de 2016). 4 USD é a sigla para United States Dollar. O ISO 4217 estabelece o código internacional de três letras para as

diversas moedas correntes. A sigla USD refere-se ao dólar americano, escrita antes do valor numérico, para

demonstrar que aquela quantia é em dólar. O Fundo Monetário Internacional refere-se ao dólar com a sigla US$,

uma abreviação que é usada fora dos Estados Unidos.

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reconhecida, mas nem o governo daquele país, tampouco os demais atores que atuam no

combate do fenômeno em âmbito nacional, estão atentos para isso. Diante destas inegáveis

distorções na avalição do fenômeno Gentilini e Summer (2012, online) justificam a

necessidade de promover mudanças na reflexão sobre a pobreza, de forma que ela passe a ser

enquadrada como uma questão universal e relevante em todos os países.

No estudo desenvolvido por Kageyama e Hoffmann (2006, p. 81) com a contribuição

das análises de Hagenaars e De Vos (1988, p. 211-21), qualquer que seja a definição de

pobreza, elas pertencem a uma das três categorias: (i) Pobreza absoluta: ter menos do que um

mínimo objetivamente definido. (ii) Pobreza relativa: ter menos que outros na sociedade; (iii)

Pobreza subjetiva: sentir que não se tem o suficiente para seguir adiante. Trata-se de uma

espécie de comparativo entre aquilo que a pessoa entende como necessidade básica e o efetivo

valor de sua renda disponível. Considerando essas três categorias, os autores afirmam que

podem haver pelo menos oito novos desdobramentos na leitura do fenômeno da pobreza.

Destacar-se-á aqui somente três, vistos sob a ótica da pobreza absoluta que considera pobre:

(a) A família que gasta mais de um terço da renda com alimentação (Lei de Engel, utiliza a

proporção dos gastos com alimentos na renda total da família); (b) quando a razão entre os

custos fixos (aqui considerados energia, transporte, educação, aluguel, dentre outros) supera e

a renda total; (c) o indivíduo que recorre constantemente a empréstimos para sobreviver, ou

seja, o gasto corrente supera a renda. Certamente, a despeito dos desdobramentos feitos pelos

autores, é de fácil identificação a falha em alguns dos critérios utilizados, pois no caso do

corolário ‘b’ a família/pessoa pode ter seu custo fixo superior a renda mas não houve menção

à questão de capital imobilizado que possa existir por alguma razão que seja, e que por si,

descaracterizaria a situação de pobreza.

Se considerarmos a premissa proposta por Amartya Sen, de que deveríamos partir da

identificação dos pobres (atenção para a data da primeira edição da obra: 1981), a sociedade

atual aparenta estar distante desta equalização. Essa afirmação encontra abrigo decorrente das

teorias acima suscitadas bem como pelas informações apresentadas pelos estudos do Centro

Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo – IPC-IG, do ano de 2012, mesmo

ano da publicação dos Princípios Orientadores relativos à Extrema Pobreza e Direitos

Humanos, da ONU, cujo relatório atenta para a necessidade dos Estados assegurarem a

coerência de suas políticas e da leitura que é realizada do fenômeno da pobreza. Assim, ao

adotarem algum acordo internacional, ou antes de haver a implementação de qualquer medida

política, deveriam os Estados avaliarem se tais ações guardam estrita relação com as

obrigações internacionais que versem matéria de direitos humanos. Desta forma, os

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compromissos relativos a questão da redução da pobreza assumidos pela comunidade

internacional, não podem ser encarados isoladamente das políticas e das decisões

internacionais. É relativamente fácil concluir porque é tão importante se definir uma

metodologia para identificar quem são os pobres, bem como aferir os níveis de privação a que

estão submetidos. Esta é a base indispensável para a promoção de ações que visem assegurar

direitos humanos de segurança de renda.

5. CONCLUSÕES

Encarar a medição da pobreza é mais que qualquer exercício ético, mas sim um

exercício descritivo, com inúmeras associações de elementos objetivos e subjetivos. A

ausência de clareza nesses conceitos faz com que a definição de políticas de pobreza estejam,

não raras vezes, viciadas, produzindo resultados distantes do esperado. Assim, a escolha entre

os procedimentos adotados, admissíveis e as interpretações possíveis acerca de padrões que

prevalecem, exige reconhecimento e tratamento adequado, como proposto por Sen.

Através dos Relatórios de Desenvolvimento Humano, produzidos pelo PNUD,

encampados pela ONU, verifica-se a necessidade de adequação e justeza na aplicação de

métodos e sistemas de avaliação social que sejam capazes de ler às privações que a pobreza

impõe ao desenvolvimento humano e social, sob aspectos tão pormenorizados como nunca

antes foram registrados na história da humanidade.

O tratamento desuniforme dado à questão da pobreza, especialmente sedimentado

sob a novel concepção multidimensional e, diante de um ordenamento jurídico que adota

critérios tão distintos para balizar o direito de segurança de renda e proteção social, como no

caso brasileiro, aponta para a necessidade de uma esforço conjunto e impactante dos atores

sociais para aprimorar e dar efetividade a esse direito fundamental, colocando o ser humano

no centro do ordenamento jurídico e dos interesses políticos. Os RDH produzidos desde 1990,

e que por muitas vezes trouxeram o tema da pobreza como temática principal do estudo,

fazem referência a um tratamento necessário do fenômeno através do ampliação das

habilidades e capacidades necessárias a formação de uma subjetividade (atitudes, disposições

para agir, perspectivas, expectativas, sinergia, dentre outras) capaz de impulsionar os mais

pobres a acreditarem que suas ações darão resultados positivos tanto para si próprios quanto

para a coletividade, não só no que se refere a renda, mas também a outras melhorias, como

destacado por autores como Rezende.

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Conforme premissa adotada por Amartya Sen nos estudos que tratam da pobreza, a

eliminação ou redução dos níveis de pobreza, depende, diretamente, do significado e da

compreensão que há sobre o tema, razão compreender a pobreza como fenômeno

multidimensional é imprescindível para o redesenho de ações e políticas sociais capazes de

enfrentá-la de forma adequada e coerente, cuja abordagem deve promover o desenvolvimento

humano como um caminho para a fruição de direitos sociais. A pobreza precisa ser

compreendida e enfrentada porque ela afeta a capacidade da sociedade de se desenvolver na

medida que ela impede o autodesenvolvimento humano, a autoproteção.

6. REFERÊNCIAS

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