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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS Curso de Graduação em Farmácia-Bioquímica Impacto do uso de adjuntos não maltados nas propriedades reológicas do mosto de cerveja Raul Santiago Rosa Trabalho de Conclusão do Curso de Farmácia-Bioquímica da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo. Orientador(a): Prof.(a). Dr(a) Suzana Caetano da Silva Lannes São Paulo 2018

Impacto do uso de adjuntos não maltados nas propriedades ......2 RESUMO ROSA, R.S. Impacto do uso de adjuntos não maltados nas propriedades reológicas da cerveja.2018. 34 p. Trabalho

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  • UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

    FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS

    Curso de Graduação em Farmácia-Bioquímica

    Impacto do uso de adjuntos não maltados nas propriedades

    reológicas do mosto de cerveja

    Raul Santiago Rosa

    Trabalho de Conclusão do Curso de

    Farmácia-Bioquímica da Faculdade de

    Ciências Farmacêuticas da Universidade

    de São Paulo.

    Orientador(a):

    Prof.(a). Dr(a) Suzana Caetano da Silva

    Lannes

    São Paulo

    2018

  • SUMÁRIO

    Pág.

    Lista de Abreviaturas ........................................................................................... 1

    RESUMO .............................................................................................................. 2

    1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................

    1.1 A cerveja e seus insumos ...............................................................................

    1.2 Reologia ..........................................................................................................

    1.21 Reologia na tecnologia cervejeira ................................................................

    3

    3

    6

    11

    2. OBJETIVOS ....................................................................................................... 14

    3. MATERIAL E MÉTÓDOS...................................................................................

    3.1 Insumos, equipamentos e descrição de preparo das amostras ......................

    3.2 Análise reométrica ............................................................................................

    3.2 Análise estatística ............................................................................................

    14

    14

    17

    18

    4. RESULTADOS .....................................................................................................

    4.1 Ensaios rotacionais ............................................................................................

    4.2 Ensaios oscilatórios ............................................................................................

    20

    20

    25

    5. DISCUSSÃO ......................................................................................................... 28

    6. CONCLUSÕES ..................................................................................................... 30

    7. BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................... 32

  • 1

    LISTA DE ABREVIATURAS

    BJCP

    CR

    CS

    FS

    IPA

    MAPA

    PNA

    QMm

    QMr

    SS VEL

    Beer Judge Certification Program

    Controlled Rate

    Controlled Stress

    Frequency Sweep

    Indian Pale Ale

    Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

    Polissacarídeos Não Amiláceos

    Quadrado Médio do modelo

    Quadrado Médio dos resíduos

    Stress Sweep

    Viscoelásticidade linear

  • 2

    RESUMO

    ROSA, R.S. Impacto do uso de adjuntos não maltados nas propriedades reológicas da cerveja. 2018. 34 p. Trabalho de Conclusão de Curso de Farmácia-Bioquímica – Faculdade de Ciências Farmacêuticas – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. Palavras-chave: reologia, mosto cervejeiro, tecnologia cervejeira, reometria

    Reologia é a área do conhecimento que estuda o fluxo da matéria e suas deformações. O entendimento do comportamento de fluídos apresenta importante relevância em processos industriais dos mais variados tipos. Na tecnologia cervejeira, é objeto de indagação o quanto diferentes formulações na produção podem acarretar alterações na composição e quantidade de solutos, modificando suas densidades e viscosidades. Essas alterações podem ter impactos no fenômeno de transporte da matéria, importante no quesito fabril, bem como na percepção sensorial de palatabilidade e características dietéticas, no que concerne ao consumo. Alterações na viscosidade também são de interesse da indústria, visto que este parâmetro tem um papel importante na teoria da filtração. As análises foram realizadas em reômetro oscilatório e rotacional, obtendo-se medidas de três momentos do processo produtivo da cerveja. Todas as determinações foram realizadas em triplicata e submetidas à análise de variância. No presente estudo pretendeu-se analisar o impacto de diferentes insumos cervejeiros em parâmetros reológicos, usando-se como base uma mesma formulação de cerveja, sendo as variações comparadas com o controle. Os adjuntos testados foram centeio, cevada não maltada e sorgo, tendo em vista que tais adjuntos já são usados para conferir à cerveja mais “corpo”, uma descrição sensorial associada com à viscosidade. Como principais resultados destacam-se as diferenças no perfil de curva de fluxo evidenciando maior pseudoplasticidade quando se utiliza centeio, e que a formação de gel em altas taxas de cisalhamento pode ser o motivo mais frequente de problemas na cervejaria. Este trabalho pode contribuir com a criação de uma metodologia que permita maximizar teores de fibras dietéticas e compostos fenólicos sem comprometer o bom andamento do processo de produção.

  • 3

    1. INTRODUÇÃO

    1.1 A cerveja e seus insumos

    A produção de cerveja, apesar de origem objetiva incerta, acompanha a

    humanidade desde o fim do período neolítico com o sedentarismo e

    desenvolvimento da agricultura (MEUSSDOERFFER, 2009). Popularmente a

    cerveja se configura como um fermentado feito á base de infusão de lúpulo em um

    mosto de cevada, porém este é um conceito estreito que não inclui a evolução

    histórica da cerveja.

    As mais antigas evidências da produção de cerveja datam de cerca 2500

    a.C do antigo povo sumério, porém o registro escrito mais relevante é Código de

    Hamurabi que estabelecia qual era a ração diária de cerveja para cada classe

    social, leis de fabricação e comercialização bem como punição para quem

    adulterasse o produto. Desde então diversas bebidas à base de grãos se

    sucederam até que em 1516 d.C foi promulgada a Lei de Pureza da Cerveja

    Alemã (Reinheitsgebot) que definia que para ser cerveja deveria ter como insumos

    exclusivamente água, malte e lúpulo (a existência da levedura era desconhecida)

    (KUNZE, 2014).

    Tecnologicamente a cerveja é produzida a partir de três processos

    bioquímicos: a formação de enzimas na germinação do grão (malte), a quebra do

    amido em açúcar por algumas dessas enzimas e a fermentação do açúcar em

    etanol e gás carbônico (KUNZE, 2014).

    O malte é o produto da germinação controlada de cereais, sendo o malte

    mais comum e usado em todas as cervejas o de cevada (KUNZE, 2014). A

    malteação tem como principais objetivos o aumento no teor de amido do grão,

    redução de polissacarídeos não amiláceos (PNA) - como β-glucanos,

    arabinoxilanas, pentosanas entre outros - e principalmente obter o máximo teor de

    enzimas. Além do malte de cevada são usados o malte de trigo e de centeio e, em

    considerável menor proporção, milho, sorgo e aveia (LIMA, 2010;KUNZE, 2014).

    O lúpulo (Humulus lupulus) é uma trepadeira dióica da família

    Cannabaceae cuja as inflorescências da planta fêmea são usadas como

    condimento e conservante na cerveja (HIERONYMUS,2012). Seu valor comercial

  • 4

    é devido à lupulina. A lupulina tem dois principais componentes: resinas,

    compostas primordialmente de compostos denominados de α-ácidos e β ácidos,

    substâncias que são isomerizadas na decocção do mosto secundário em iso-α e

    iso-β ácidos, conferindo sabor amargo e atividade anti bactérias gram positivas;

    óleos essenciais, responsáveis por características sensoriais diversas. Entre

    outros componentes que o uso do lúpulo deixa na cerveja estão polifenóis e

    proteínas (HIERONYMUS, 2012; KUNZE, 2014)

    O último insumo tradicional da cerveja é a levedura. As leveduras são

    organismos aeróbios facultativos que, na ausência de oxigênio, convertem os

    açúcares do mosto em etanol e gás carbônico. As espécies usadas mais

    largamente na produção de cerveja são Saccharomyces cerevisiae e S.

    carsbergensis (KUNZE, 2014). Apesar de vital ela não compõe nenhum processo

    bioquímico na produção de mosto, portanto não interfere em suas características

    reológicas.

    O processo de produção de cerveja tem, portanto, uma grande

    longevidade, e suas operações unitárias permaneceram essencialmente

    inalteradas por centenas de anos. Mesmo assim o desenvolvimento da tecnologia

    cervejeira ainda está em progresso, aprimorando a qualidade condicionadamente

    ao estudo das propriedades físicas e bioquímicas da cerveja e seus componentes

    individualmente (SEVERA, 2009)

    Hoje os ingredientes principais da cerveja ainda são usados, porém com

    intuito de reduzir custos ou obter um produto com diferentes características

    sensoriais o uso de adjuntos não maltados foi adicionado a cerca de 85-90% das

    formulações (ANNEMÜLLER, MANGER, 2013).

    Na atualidade a cerveja pode ter uma série de outras fontes de açúcar ou

    amido, chamados de adjuntos, além de aditivos que conferem características

    particulares ou mais estabilidade ao produto final.

    No Brasil a cerveja é regulamentada pela Lei n° 8918/1994 alterada pelo

    Decreto n° 6871/2009. Em sua Sessão III destacam-se os seguintes artigos e seus

    parágrafos:

  • 5

    “Art. 36. Cerveja é a bebida obtida pela fermentação alcoólica do mosto

    cervejeiro oriundo do malte de cevada e água potável, por ação da levedura, com

    adição de lúpulo. (...)

    § 4o Parte do malte de cevada poderá ser substituído por adjuntos

    cervejeiros, cujo emprego não poderá ser superior a quarenta e cinco por cento

    em relação ao extrato primitivo.

    § 5o Consideram-se adjuntos cervejeiros a cevada cervejeira e os demais

    cereais aptos para o consumo humano, maltados ou não-maltados, bem como os

    amidos e açúcares de origem vegetal.(...)“

    Os cereais, quando não maltados, possuem grandes quantidades de

    polissacarídeos não amiláceos (PNA). Os PNAs são componentes estruturais que

    garantem a integridade do tecido, barreira contra penetração de microrganismos e

    insetos e manutenção da pressão osmótica. Em alimentos eles controlam as

    propriedades reológicas, percepção de textura e são fontes de nutrientes e fibra

    alimentar. Os dois principais grupos de PNA são os β-glucanos e pentosanas,

    sendo que estas últimas auxiliam tanto na estabilidade de espuma da cerveja

    quanto pode causar efeitos indesejáveis como dificuldade na separação de mosto

    e formação de turbidez (AUTIO, 2006).

    O grão de cereais apresenta PNA nas paredes celulares dos amiloplastos e

    na camada denominada aleurona (Figura 1) (ARENDT; ZANNINI, 2013). A

    aleurona do centeio é composta por uma camada de apenas uma célula, enquanto

    da cevada é de duas ou três. Arabinoxilanas (pentosanas) esterificadas com ácido

    ferúlico estão concentrados nesta camada, sendo que a acumulação de

    compostos fenólicos confere maior força à aleurona (AUTIO, 2006). A parede

    celular das células do endosperma da cevada tem uma composição de 75% de β-

    glucanos, 20% de arabinoxilanas e 5% de proteínas (ARENDT; ZANNINI, 2013).

  • 6

    Figura 1: Grão de Centeio em corte transversal mediano

    Adaptado de Arendt; Zannini, 2013

    1.2 Reologia

    Reologia é compreendida como uma subseção da física que tem a

    deformação e transporte de fluídos como objeto (SCHRAMM, 2006). O estudo do

    comportamento de fluxo, no que diz respeito aos processos industriais, visa

    aumentar a performance dos equipamentos bem como gerenciamento de

    soluções em suas devidas operações unitárias.

    Os materiais podem apresentar comportamentos de: sólido ideal, quando a

    energia para deformação é completamente recuperada; de líquido ideal, que não

    resistem a mínima força e deformam irreversivelmente (escoam), sendo sua

    energia dissipada na forma de calor e não recuperada pela remoção da tensão;

    fluídos viscoelásticos, compreendem a maior parte dos corpos reais e são

    intermediários entre os sólidos e líquidos ideais (SCHRAMM, 2006).

    Reologicamente os fluídos são definidos como Newtonianos e não-

    Newtonianos. As diferenças levam em conta a relação da tensão de cisalhamento

    com a taxa de cisalhamento. Newton descreveu o fluxo de líquidos como um

    escoamento laminar, composto de infinitos planos paralelos que deslizam

    tangencialmente entre sí quando uma força é aplicada. (Figura 2)

    A força aplicada sobre a interface superior do líquido é definida como

    tensão de cisalhamento (τ) sendo:

    𝜏 =𝑁

    𝑚2=Pa

  • 7

    Se a força é constante, a velocidade de fluxo é controlada pela resistência

    interna do fluído, a viscosidade. A tensão de cisalhamento desencadeia o

    escoamento, sendo a maior velocidade na camada virtual mais próxima da

    interface e a mais baixa próxima a placa estacionária. Entre elas há um gradiente

    de velocidades e seu diferencial é definido como taxa de cisalhamento (γ)

    (SCHRAMM, 2006), sendo:

    γ =dL

    dh=> γ =

    msm

    =1

    s

    Figura 2- Modelo de fluxo laminar proposto por Newton.

    Adaptado de Schramm, 2006.

    Fluídos newtonianos se aproximam dos líquidos ideais e tem uma relação

    linear entre tensão e taxa de cisalhamento, na qual a viscosidade (η) é a

    constante:

    τ = ηγ, com 𝜂 =𝑁

    𝑚2. s, ou η = Pa.s

    Em fluídos não newtonianos essa relação é não-linear e a viscosidade é

    dependente da taxa de cisalhamento, podendo obedecer diferentes modelos

    matemáticos. Os líquidos não-newtonianos (Figura 3) podem ter sua viscosidade

    aumentada com aumento da taxa de cisalhamento, comportamento raro

    denominado de dilatância, ou podem ter sua viscosidade diminuída com o

  • 8

    aumento da taxa de cisalhamento, caracterizando os fluídos pseudoplásticos, que

    abarcam a maior parte dos alimentos (SCHRAMM, 2006). Um modelo matemático

    para fluídos pseudoplásticos é chamado de Lei da Potência que tem como

    equação:

    τ= 𝑘𝛾𝜂′

    Neste modelo τ representa a tensão, k o índice de consistência e η’ o índice

    de fluidez. O índice de fluidez (η’), quanto mais próximo está de 1, mais próximo

    do comportamento newtoniano o fluído está e mais próximo k está da viscosidade

    dinâmica.

    Figura 3 – Curva de fluxo (acima) e curva de viscosidade de fluidos dilatantes (1),

    newtonianos (2) e pseudoplásticos (3)

    Em adição à relação entre tensão de cisalhamento e taxa de cisalhamento

    existem alguns líquidos que apresentam uma tensão crítica (ou limite de

    escoamento) para o escoamento iniciar (Figura 4). Estes podem ter relação tanto

    linear quanto não-linear entre tensão e taxa de cisalhamento e sua estrutura

    interna que, sem considerar a variável tempo, impedem o escoamento com

    valores de tensão abaixo da tensão crítica (SCHRAMM, 2006). Apenas quando

  • 9

    excedida esta tensão que o material passa a se comportar, de fato, como um

    líquido. Pseudoplásticos com tensão inicial são descritos como um fluído que

    segue o modelo de Herschel-Bulkley e fluídos Newtonianos com tensão inicial são

    descritos como plásticos de Bingham, mas serão neste trabalho referidos como

    fluídos Newtonianos com tensão inicial. O modelo de Herschel-Bulkley é usado

    para descrição da curva de fluxo de diversas bebidas, como sucos (AHMED,

    2007) além de maionese e mostarda (TRÁVNÍCEK, 2015) e a equação do modelo

    é:

    τ= 𝜏ₒ + 𝑘𝛾𝜂′

    O modelo de Herschel-Bulkley representa a tensão τ, a tensão inicial 𝜏ₒ, o

    índice de consistência k e o índice de fluidez η’. Portanto este modelo é

    semelhante à Lei da Potência, porém considera o parâmetro de tensão inicial.

    Figura 4 – Tensão inicial ou limite de escoamento em um fluido com

    pseudoplasticidade

    Outro teste reométrico usualmente realizado em diversos materiais são os

    ensaios oscilatórios. Estes trazem informações importantes em fluidos que tem

    propriedades viscoelásticas. Os testes oscilatórios se dividem em SS (Stress

    Sweep) e FS (Frequency Sweep), ou simplesmente varredura de tensão ou de

    amplitude e varredura de frequência.

  • 10

    Na varredura de tensão, ao invés de submeter o fluído a uma tensão

    constante, aplica-se esta como uma função senoidal no tempo, obedecendo a

    função:

    τ= 𝜏ₒ. sin (𝜔. 𝑡), sendo ω a velocidade angular

    Com a tensão oscilante é possível não perturbar mecanicamente o fluído

    viscoelástico, preservando sua estrutura interna. O fundamento teórico por traz da

    oscilação forçada é combinar a resposta viscosa, atribuídas aos fluídos, com a

    resposta elástica, atribuída aos sólidos. A resposta elástica é descrita pelo modelo

    de mola, cuja deformação acontece concomitantemente à tensão: quando a

    tensão está no máximo, a deformação também está, em 0° da fase. A resposta

    viscosa, por outro lado, é descrita pelo modelo do amortecedor, no qual a

    deformação está atrasada em relação à aplicação da tensão, estando 90° fora da

    fase (Figura 5).

    Figura 5:Deformação de diferentes materiais sob tensão

    Os fluídos viscoelásticos apresentam ângulo de fase (ou ângulo de perda)

    intermediário entre 0 e 90°, sendo o ângulo de fase dependente da frequência.

    Desta forma um fluído newtoniano não apresentará mudança no seu angulo de

    fase, visto que o material não tem estruturação elástica para absorver energia

    transmitida pela aplicação de tensão, assim como um sólido ideal também não

    teria alteração pelo fato da energia necessária para deformação ser

    completamente recuperada. Um fluído viscoelástico por ter componentes de

  • 11

    ambos terá o angulo de fase alterado com a variação de frequência (SCHRAMM,

    2006).

    A análise SS permite observar a existência de um intervalo de tensão no

    qual o fluído apresenta valores inalterados de ângulo de fase. Este intervalo é

    chamado de intervalo de viscoelasticidade linear (VEL). Nesta faixa os coeficientes

    dependentes do tempo são constantes, e as equações diferenciais são lineares,

    possibilitando a realização de um teste FS no qual as informações obtidas sejam

    realmente proporcionais à frequência, sem outros fatores de confusão. A

    realização de um teste FS fora do intervalo de VEL gera desvios não considerados

    pelos parâmetros definidos no reômetro, enfraquecendo a discussão dos

    resultados do teste (SCHRAMM, 2006).

    1.2.1 Reologia na tecnologia cervejeira

    Na tecnologia cervejeira avaliar o transporte de fluídos e suas

    características reológicas é importante para controlar diversos aspectos de

    produção, como: funcionamento das bombas, perfil de fluxo em encanamentos,

    velocidade de fluxo em trocadores de calor de placas e, principalmente, na

    filtração e separação do mosto. Hoje é comum na indústria cervejeira o uso de

    mostos com alta densidade (high-gravity) por apresentarem bom custo-benefício

    (PIDDOCKE et al., 2011). Mostos mais densos e concentrados tendem a ser mais

    viscosos. Outrossim, nos últimos anos, há um crescimento no consumo/produção

    de cervejas de categoria especial, buscando a utilização de insumos não

    convencionais, adjuntos e aditivos, bem como características primárias distintas,

    como maior “corpo” ou formação/retenção de espuma. O segmento de cervejas

    especiais que representaram em 2012, 8% do mercado cervejeiro fecharam 2014

    com 11% de participação, com projeção de que a cota suba para 20% em 2020

    (SEBRAE, 2017). Mundialmente cervejas com adjuntos correspondem a 85-90%

    da produção (ANNEMÜLLER, MANGER, 2013). O uso de adjuntos pode alterar o

    valor final do produto, tanto pelo malte ser um insumo mais caro que adjuntos não

    maltados, quanto pelo fato de que, em alguns países como Japão, a aplicação de

    impostos é proporcional ao uso de malte (BRAUN; DISHMAN, 2006)

  • 12

    Atualmente adjuntos são descritos como qualquer fonte de extrato com

    exceção do malte (ATNAFU, ABEBAW, 2015; BRIGGS et al., 2004). O uso de

    adjuntos frequentemente aumenta a viscosidade do mosto (BRIGGS et al., 2004).

    A aveia é utilizada para conferir “corpo” e auxiliar na retenção de espuma. Não se

    sabe se seu impacto na sensação de volume (fullness) está relacionado com seu

    perfil proteico ou presença de β-glucanos. Uma substituição de 20-40% do malte

    de cevada por aveia aumenta o teor de β-glucanos e diminui significativamente o

    desempenho da filtração (SCHINITZENBAUMER et al., 2012). O centeio tem uma

    descrição sensorial semelhante, e seu uso está associado a problemas de

    produção devido ao alto teor de pentosanas (GLATTHAR et al., 2006).

    Entre as mudanças de composição com impacto em processo a presença

    de β-glucanos e pentosanas é a mais significativa, podendo causar mosto viscoso,

    separação de mosto (termo referente à separação do líquido açucarado do bagaço

    a ser descartado) lenta, diminuição na recuperação de extrato, filtração lenta, risco

    de turbidez temporária ou irreversível e maior utilização de filtros (STEINER et al.,

    2010). Tais compostos consistem em polissacarídeos unidos por ligações β, e

    compõe a parede celular das células vegetais. Soluções aquosas de diferentes

    hemiceluloses (um tipo de β-glucano presente nos cereais) a 1% podem formar

    géis, e determinações reométricas obtiveram um perfil pseudoplástico com tensão

    inicial, demonstrando um comportamento de fluxo não-newtoniano (SOUSA,

    2014).

    Já foram observados os comportamentos de fluxo newtoniano e

    pseudoplástico com ou sem tensão inicial no mosto de cerveja (TRÁVNÍCEK,

    2015) (SEVERA, 2009). Essa variabilidade se dá por diferenças na técnica de

    extração do mosto bem como na sua formulação e técnicas analíticas.

    Concentração de açúcares, teor de β-glucanos e pentosanas entre outros

    compostos tem impacto no perfil de escoamento do fluído bem como em

    formações de gel (BOGDAN, 2017). Já foi apontado que a aplicação de tensão de

    cisalhamento orienta as moléculas de β-glucanos, fazendo-as se alinhar e formar

    interações intermoleculares, formando géis (VIS, 1997). O centeio apresenta

    muitos problemas de filtração e separação de mosto amplamente descritos, muito

  • 13

    possivelmente relacionados com o fato que o malte possui β-glucanases (enzimas

    que despolimerizam os β-glucanos), mas carece de enzimas especificas para as

    pentosanas, o principal PNA deste cereal (AUTIO, 2006).

    Soluções com maiores teores de β-glucanos causam redução do índice de

    fluidez, expoente do modelo da Lei da Potência, indicando que sua concentração

    é proporcional a pseudoplasticidade. Também foi observado que ocorre formação

    de gel inferior no mosto do que na cerveja, pois a presença de maltose parece

    inibir a formação do reticulado. O fato de não se fazer clarificação eficiente de

    cerveja por centrifugação é pelo fato de aplicação de tensão de cisalhamento

    induzir a formação de gel (AUTIO, 2006).

    O teor de β-glucanos no grão é proporcional ao seu teor tanto no mosto

    quanto na cerveja. A fermentação reduz de 2 a 6% a concentração, e a

    microfiltração não causa redução significativa, mesmo tendo seu tempo de

    filtração aumentado (VIS; LORENZ, 1997).

    Na abordagem nutricional os β-glucanos e pentosanas consistem em fibras

    dietéticas. O consumo de 150 mL/dia de cerveja em estudo na Espanha

    correspondeu a 1,6% do total de fibras dietéticas e 5% das fibras solúveis

    recomendadas. As fibras solúveis atrasam o esvaziamento gástrico, diminuem

    absorção de glicose, tem relação com redução dos níveis de colesterol e são

    parcialmente fermentadas pela flora intestinal. No caso da cerveja 99% das fibras

    são fermentadas por Lactobacillus e Bifidobacterium (PREEDY, 2008). Também já

    foi apontado que esses compostos podem ter potencial prebiótico, e que sua

    presença na cerveja é dificultada pela falta de interesse devido aos problemas de

    fabricação associados (BAMFORTH, 2005).

    Em comparação a outras bebidas, o teor de fibras dietéticas solúveis

    padrão da cerveja (~2 g/L) é próximo do suco de laranja (1,9 g/L) e maior que o

    vinho tinto (1,6 g/L). A ingestão de fibras dietéticas solúveis pode ser significante:

    250 mL de cerveja contribuem com 0,5 g de fibras dietéticas solúveis, equivalente

    a 125 g de tomate, 166 g de couve de Bruxelas ou 83 g de maçã (PREEDY,

    2008). Porém, é importante observar que os valores considerados são para

    cervejas claras comerciais e que cervejas feitas com diferentes cereais e técnicas

  • 14

    podem ter até 5 vezes mais fibras solúveis (AUTIO, 2006). A ingestão de PNA

    também está inversamente associada ao desenvolvimento de síndrome

    metabólica (CHEN et al., 2018) e β-glucanos solúveis já se mostraram efetivos em

    reduzir colesterol de humanos e camundongos (ANDERSON, 1990).

    A matriz de PNA é também onde está contida parte da reserva de polifenóis

    encontrados na cerveja (AUTIO, 2006). Cerca de 78 compostos fenólicos já foram

    identificados na cerveja (PREEDY, 2008). Durante o processo de malteação parte

    das enzimas hidrolisam PNA (principalmente β-glucanos) e também clivam o ácido

    ferúlico complexado à matriz, reduzindo o teor desta substância (KUNZE, 2014). A

    presença destes compostos, complexados com peptídeos e/ou PNA, foi associada

    com maior formação de turbidez temporária ou permanente – atributo que não

    altera o sabor, mas tem impacto na percepção visual (STEINER, 2010). Portanto,

    uma cerveja com determinadas composições (ainda pouco descritas) de polifenóis

    e PNA em excesso podem reduzir a estabilidade coloidal da cerveja. Em

    contrapartida os polifenóis podem causar benefícios à saúde, sendo que os

    encontrados na cerveja podem conferir um ambiente antioxidante no colón. O

    consumo de 150 mL/dia de cerveja comercial na Espanha contribuiu para a

    ingestão de 7,2% do recomendado de polifenóis, e com cervejas artesanais ou

    com outros cereais este valor pode ser ainda maior (PREEDY, 2008).

    2. OBJETIVO(S)

    A proposta deste trabalho foi realizar análises reométricas para avaliar o

    comportamento de fluxo do mosto cervejeiro, verificando o impacto no uso de

    adjuntos não maltados em relação ao controle puro malte.

    3. MATERIAL E MÉTODOS

    3.1 Insumos, equipamentos e descrição de preparo das amostras

    Os insumos cervejeiros utilizados na formulação do controle foram: 100%

    malte Pale Ale – Muntons (Reino Unido); lúpulo Citra– Barth Haas (Alemanha);

    água potável. As formulações com adjuntos foram: 80% Malte Pale Ale – Muntons

    (Reino Unido); 20% adjuntos (cevada não maltada, vendida no Brasil como

  • 15

    cevadinha, centeio e sorgo); Lúpulo Citra - Barth Haas (Alemanha); água potável.

    Os mostos foram preparados em volumes de 600 mL em caldeira de inox 304

    convencional, Tramontina (Brasil). Uma amostra da indústria também foi coletada

    por apresentar um total de 30% de adjuntos.

    Os adjuntos foram escolhidos por cruzamento de três principais critérios:

    presença de PNA, proteínas ou outros componentes que tem impactos na

    produção de cerveja descritos na literatura; motivação de uso para obter

    determinadas características organolépticas (ex: cerveja “encorpada”); interesse

    econômico.

    A base usada para preparação da cerveja foi o estilo Double IPA (BJCP,

    2015). A preparação do mosto seguiu os passos exibidos no fluxograma (Figura

    6), baseados nas técnicas descritas por Kunze (2014). Primeiramente os grãos

    foram moídos em moinho de disco. O produto moído foi infusionado em água a

    67°C na caldeira primária, onde foi mantido 60 min sob agitação. Nesta

    temperatura as enzimas (α e β-amilase) convertem o amido em açúcares,

    principalmente maltose, mas também maltotriose, glicose e dextrinas não

    fermentáveis (LIMA, 2010).

    A conversão total do amido foi verificada por teste do iodo (KUNZE, 2014),

    no qual a ausência de coloração escura acusa que o amido foi hidrolisado

    completamente. Posteriormente o mosto foi submetido a aquecimento até 78°C

    para cessar o processo enzimático e facilitar sua separação. A separação do

    mosto inicia com uma recirculação prévia de modo que as cascas dos grãos se

    acomodem de maneira a funcionar como filtro das partículas menores. Quando o

    mosto se tornou límpido a primeira amostra, com 20 °Brix, foi retirada. Esta etapa

    é onde ocorre a maior parte dos problemas associados às características

    reológicas do mosto, como redução do fluxo de filtrado e, ocasionalmente,

    entupimento.

  • 16

    Figura 6- Fluxograma de preparação do mosto

    Para garantir a maior recuperação de extrato, enquanto o mosto era

    recolhido por baixo da caldeira, água a 78°C foi adicionada aos poucos na parte

    superior de modo a “lavar”, ou seja, retirar açúcares adsorvidos no bagaço. Neste

    momento foi feita a diluição para 16 °Brix e recolhimento da segunda amostra.

    O líquido açucarado já sem os bagaços dos grãos, denominado de mosto

    secundário, foi submetido à fervura com adição de 1 g/L de lúpulo para sofrer

    decocção por 60 min onde serão isomerizados os α e β-ácidos, conferindo

    amargor. Ao final da fervura foi adicionado 2 g/L de lúpulo com intuito de

    solubilizar óleos essenciais. Por fim, o mosto foi submetido ao resfriamento com

    subsequente decantação dos sólidos. O sobrenadante foi recolhido como a

    terceira amostra, com 20 °Brix.

    A primeira e a terceira amostras têm a mesma densidade de açúcares,

    aferidos por refratômetro. Desta forma é possível avaliar o impacto da adição de

    lúpulo e da fervura na reologia dos mostos. A segunda amostra tem uma diluição

    de 20% em relação às outras, que por sua vez é interessante para analisar a

    influência de maiores ou menores concentrações de açúcar.

  • 17

    3.2 Análise reométrica

    As características reológicas do mosto foram determinadas em reômetro

    MARS Haake II com programa RheoWin3 para análise de dados (Thermo Electron

    Corporation, Alemanha), às temperaturas controladas por um banho refrigerado, e

    o sensor usado foi tipo placa - placa (PP60 Ti).

    Cada formulação possui três amostras, sendo duas do mosto primário com

    20 °Brix e 16 °Brix de concentração, e uma do mosto secundário a 20 °Brix. Cada

    uma dessas amostras foi submetida à análises reométricas rotacional e oscilatória

    em, no mínimo, triplicata. Todos os testes foram repetidos nas temperaturas de

    5°C e 15 °C, exceto o sorgo que foi apenas testado a 5 °C.

    O ensaio rotacional foi realizado no modo Controlled Stress (CS), de 0 a 0,5

    Pa. Neste modo de trabalho é definida uma faixa de tensão de cisalhamento que

    será aplicada pelo reômetro e o resultado é a taxa de cisalhamento medida para

    cada tensão. Ele foi escolhido pela capacidade de analisar uma faixa com

    menores valores de taxa de cisalhamento. Também o modo CS, em comparação

    com Controlled Rate (CR), diferenciam melhor fluidos não-newtonianos. A escolha

    do sensor placa-placa (Figura 7) foi definida pela presença de material particulado

    que causa problemas em medições usando sensor cone-placa, além de poderem

    ser usados para medições em baixas taxas de cisalhamento de fluídos que

    possuem tensão inicial. O diâmetro mais elevado comparado com alguns sensores

    permite uma resolução maior de líquidos pouco viscosos (SCHRAMM, 2006). O

    gap, espaço entre as placas paralelas, foi de 0,105 mm, ajustado sempre antes de

    cada análise. Como a região entre as placas pode ser definida como um cilindro

    de volume V=Hπ.r² sendo H=gap e r= raio da placa do sensor (30 mm) temos um

    volume de ~0,30 mL de amostra usada em cada corrida reométrica.

  • 18

    Figura 7: Esquema do sensor placa-placa.

    As análises oscilatórias usaram o mesmo sensor também no modo CS.

    Primeiramente os mostos foram submetidos a uma análise de varredura de

    amplitude de 0 a 1 Pa e com frequência fixada em 1 Hz. Neste ensaio é possível

    identificar se o fluído possui uma região de viscoelasticidade linear (VEL) e qual a

    amplitude limite para que G’ e G’’ invertam sua posição. Caso o mosto possuísse

    um intervalo de VEL um teste de varredura de frequência de 0 a 100 Hz com

    amplitude fixada em 0,02 Pa foi realizado para obter informações sobre a

    microestrutura da formulação.

    3.3. Análise estatística

    O tratamento de dados e análise estatística foi realizada no software Origin

    8.

    Os testes CS têm como saída um gráfico tensão de cisalhamento por taxa

    de cisalhamento, denominado de “curva de fluxo”. Os resultados são submetidos à

    regressão linear e regressão não linear usando o método da minimização da soma

    de quadrados dos resíduos. As regressões não lineares tiveram como modelo de

    partida a Lei da Potência, com e sem coeficiente linear, visto que o modelo de

    Herschel-Bulkley prevê o coeficiente por considerar a tensão inicial. Caso o

    modelo que mais se ajustar aos resultados for linear o mosto pode ser descrito

    como fluído newtoniano, caso se ajuste mais à regressão não-linear pode ser

    descrito como pseudoplástico. A presença de um coeficiente linear positivo,

  • 19

    cortando o eixo das ordenadas, indica que o fluído possui uma tensão inicial

    abaixo da qual ele não flui.

    A variância entre os resultados e o modelo foi analisada utilizando o

    parâmetro F-valor por análise de variância. Apesar das regressões lineares

    utilizarem normalmente o coeficiente de determinação R² este muitas vezes pode

    fornecer um dado estatisticamente fraco para regressões não lineares, com

    discussões atuais de que não tem significado nenhum fora do contexto linear.

    Outra razão para não usar o coeficiente de determinação R² é a tendência de este

    aumentar quando se muda o número de preditores (MEYERS et al., 2012), e o

    modelo de Herschel-Bulkley tem um preditor a mais que os outros. Desta maneira

    optou-se por utilizar o maior valor de F, calculado a partir da divisão entre

    Quadrados Médios do modelo e os Quadrados Médios do resíduo ou

    simplesmente F = QMm / QMr. O p-valor, ou nível descritivo, é utilizado para

    aceitar ou rejeitar se o modelo se adequa aos resultados, sendo que foi aceita a

    adequação se Fcalculado > Ftabelado no nível de significância de 1%. Para

    comparar os valores de F, cada conjunto foi submetido ao teste-t pareado no nível

    de significância de 5%.

    Mesmo altos valores de F podem ser ambíguos para definir se o modelo se

    adequa aos dados experimentais, portanto foi usada a análise de resíduos como

    critério de exclusão da validez do modelo. Os métodos usados foram a análise de

    resíduos padronizados e a análise do “gráfico de resíduos x ordem dos dados”.

    Os resíduos (ei) são padronizados (di) pelo cálculo:

    𝑑𝑖 =𝑒𝑖

    √𝑄𝑀𝑟

    Se o resíduo padronizado de alguma regressão tiver um valor não contido

    no intervalo [-3,3] ele indica a presença de um outlier. A primeira ação ao

    identificar um outlier é a investigação do porquê ele ocorreu, depois verificar se o

    modelo precisa ser revisto ou retirado esse outlier (MEYERS et al., 2012).

    O gráfico “resíduos x ordem dos dados” tem utilidade para visualizar a

    tendência dos resíduos. Caso eles tenham um alto grau de aleatoriedade pode-se

    pressupor que há independência nos resíduos e o modelo está bem ajustado. Se

    algum comportamento sistemático for observado temos indícios de que alguma

  • 20

    outra variável influenciou os resultados do experimento, o que viola premissas da

    análise de variância e compromete nossas conclusões.

    4. RESULTADOS

    O delineamento do trabalho possibilitou comparações entre um mosto de

    controle feito só com malte e mostos feitos com 20% de adjuntos. Também a

    influência de alguns parâmetros nas características reológicas pôde ser avaliada,

    como: temperatura, concentração do mosto e adição de lúpulo/fervura.

    4.1. Ensaios rotacionais

    O resultado dos ensaios rotacionais é a curva de fluxo de cada um dos

    mostos. As regressões para ajustar os dados experimentais aos modelos

    matemáticos foram os primeiros passos para a análise dos dados.

    A análise visual dos gráficos da curva de fluxo (Figura 8) mostra que, para

    uma mesma concentração e temperatura, a taxa de cisalhamento máxima dos

    mostos com adjuntos é inferior ao do controle com aplicação de uma tensão igual.

    Também em alguns ensaios foi possível observar uma perturbação em altas taxas

    de cisalhamento. As curvas de fluxo de ambas amostras a 20 °Brix apresentaram

    perfil semelhante ao da figura 8.

    Figura 8 –Curvas de fluxo dos mostos (controle 100% malte, com centeio, com

    cevadinha) 16 °Brix a 5°C

  • 21

    A proximidade entre os dados experimentais e os do modelo estão

    apresentados na Tabela 1, expressos em F-valor, sendo que todas as regressões

    tiveram um bom ajuste no nível de significância de 1% (p=0,01). Quanto maior F,

    mais ajustado aos dados experimentais está o modelo. O modelo newtoniano,

    mesmo com o coeficiente linear para considerar o parâmetro de limite de

    escoamento, não apresentou em nenhuma amostra o melhor ajuste, contudo a

    análise visual do mosto com cevadinha (cevada não maltada) mostra um

    comportamento bastante linear no intervalo de 0 a 100 1/s. Os modelos da Lei da

    Potência e Herschel-Bulkley dividiram os melhores ajustes no intervalo das taxas

    de cisalhamento trabalhado. A diferença global entre as médias dos ajustes dos

    mostos, calculados a partir do teste-t, mostrou que a 5°C a Lei da Potência e

    Herschel-Bulkley não tiveram diferenças significativas de ajuste no nível de

    significância ɑ = 5% e ambos significativamente diferentes da regressão

    Newtoniana no mesmo nível de significância. A 15°C a Lei da Potência foi

    estatisticamente mais bem ajustada que Herschel-Bulkley e este, por sua vez,

    significativamente mais ajustado que o Newtoniano.

    Tabela 1 - F-Valor (calculado) da análise de variância entre o modelo e os dados

    experimentais.

    F 5°C F 15°C F 5°C F 15°C F 5°C F 15°C

    Controle 20° brix 544 136 1138 790 1417 499

    16° brix 359 139 711 570 544 359

    20° brix lupulado 1006 690 2400 1324 2563 1132

    Centeio 20° brix 330 405 1221 1665 1198 1461

    16° brix 284 2257 609 3679 635 2874

    20° brix lupulado 294 1535 646 2199 611 2398

    Cevadinha 20° brix 486 2575 813 3494 674 3213

    16° brix 268 875 463 1827 500 1211

    20° brix lupulado 571 986 1286 2929 992 1903

    Sorgo 20° brix 684 1258 1165

    20°brix lupulado 1463 957 1896

    Teste-t 5°C Herschel = Lei da Potência > Newtoniano

    α < 0,05 15°C Lei da Potência > Herschel > Newtoniano

    Herschel-BulkleyNewtoniano Lei da Potência

  • 22

    Considerando que os modelos da Lei da Potência e Herschel-Bulkley

    apresentaram maiores ajustes em relação aos dados experimentais, a Tabela 2

    contém os valores do expoente, denominado de índice de fluidez (η’), obtido nas

    regressões. Quanto mais próximo de 1, menor a concavidade da curva e mais

    próximo da reta (entenda-se mais próximo do modelo newtoniano) a curva de fluxo

    se aproxima.

    Na temperatura de 5°C o controle tem um índice de fluidez diferente de 1,

    mostrando algum grau de comportamento não newtoniano tanto no modelo da Lei

    da Potência quanto em Heschel-Bulkley. Os mostos com centeio tiveram η’ ainda

    menor, e a cevadinha e o sorgo bastante semelhante ao controle no modelo da Lei

    da Potência. Considerando os índices de fluidez obtidos na regressão Herschel-

    Bulkley, o mosto de centeio se mantem com η’ inferior enquanto a cevadinha e

    sorgo tem valores maiores que o controle, sendo assim mais próximas do

    comportamento de fluxo newtoniano. Comparando os mostos de centeio e

    cevadinha entre as temperaturas de 5°C e 15°C o valor de η’ aumentou. Nas

    amostras 20 °Brix e 16 °Brix do controle a 15°C, em altas taxas de cisalhamento, o

    ruído obtido na curva (possível formação de um gel) como pode ser visto na

    Figura 9, o que impossibilitou a realização de regressões adequadas segundo a

    análise de resíduos.

    Tabela 2. Valores de índice de fluidez (η’) nas temperaturas de 5 e 15°C

    obtidos nas regressões não lineares.

    η' 5°C η' 15°C η' 5°C η' 15°C

    Controle 20° Brix 0,50491 0,34205* 0,69255 0,32648*

    16° Brix 0,52268 0,38894* 0,71027 0,39015*

    20° Brix lupulado 0,64938 0,62048 0,78331 0,78135

    Centeio 20° Brix 0,4189 0,48629 0,56355 0,65425

    16° Brix 0,34775 0,85939 0,59033 0,96249

    20° Brix lupulado 0,35995 0,68966 0,58994 0,86095

    Cevada 20° Brix 0,68252 0,86557 0,86097 1,00546

    16° Brix 0,30941 0,79105 0,63441 0,86917

    20° Brix lupulado 0,65536 0,73964 0,77922 0,78093

    Sorgo 20° Brix 0,5882 0,7654

    20° Brix lupulado 0,7451 0,9525

    * Modelo mal ajustado por análise de resíduos

    Lei da Potência Herschel-Bulkley

  • 23

    Considerando o modelo newtoniano (considerando a tensão inicial, como

    um plástico de Bingham) para comparação, os parâmetros de cada mosto são

    descritos na Tabela 3 abaixo.

    Tabela 3: Valores dos parâmetros obtidos na regressão linear (γ para taxa

    de cisalhamento, τₒ para tensão inicial e η’ para viscosidade)

    Em todas as amostras é possível inferir que a viscosidade é proporcional à

    concentração do mosto. Os mostos com centeio e cevada apresentaram mais

    resistência ao fluxo que o controle, com exceção do mosto de cevadinha 20 °Brix

    a 5°C no qual a taxa de cisalhamento foi maior.

    Ainda analisando a Tabela 3, em 5°C a média da viscosidade dos mostos

    com 20 °Brix (primário e secundário) foi semelhante, sendo que a viscosidade do

    centeio foi 4% maior que a viscosidade do controle e a cevadinha foi até 5%

    menor. Já com os mostos 16 °Brix os adjuntos apresentaram maior viscosidade,

    sendo o centeio foi 116% maior que o controle e a cevadinha 93% maior. Em

    15°C também se mostraram contribuindo mais para a viscosidade, sendo que na

    média dos mostos com 20 °Brix a viscosidade do centeio foi 85% maior do

    controle, a da cevadinha 63% maior. Nas amostras com 16 °Brix a 15°C o centeio

    5°C 15°C 5°C 15°C 5°C 15°c

    Controle 20° Brix 4,05 1,28 82,01 145,93* 102,2593 254,517349

    16° Brix 1,77 1,13 74,65 105,95* 214,5753 337,026632

    20° Brix lupulado 4,65 2,6 61,19 63,71 95,33874 161,836019

    Centeio 20° Brix 4,57 3,52 95,52 85,85 84,63718 122,028755

    16° Brix 3,83 3,08 99,34 27,39 110,8717 148,853612

    20° Brix lupulado 4,52 3,66 96,89 54,22 83,81635 120,485631

    Cevadinha 20° Brix 3,81 3,38 55,94 27,67 121,5234 140,705867

    16° Brix 3,14 2,28 14,02 37,19 149,6992 204,980169

    20° Brix lupulado 4,48 2,96 60,56 45,62 103,3762 151,327281

    Sorgo 20° Brix 2,26 68,21 192,8303

    20° Brix lupulado 2,17 56,38 208,4706

    * Modelo mal ajustado por análise de resíduos

    γ para 0,5Pa (1/s)η (mPa.s) τ ₒ mPa

  • 24

    foi 172% maior e a cevadinha 101% maior que o controle. O sorgo apresentou

    uma viscosidade 50% menor que o controle.

    O efeito da temperatura no limite de escoamento (τₒ) atuou diminuindo-o

    nos mostos com adjuntos. No controle este valor foi maior para a temperatura de

    15°C, porém isso se deve a um mau ajuste dos primeiros pontos da regressão,

    verificado por uma tendência linear no começo do gráfico “resíduos x ordem de

    coleta dos dados”. Entretanto o dado mais relevante é que os valores de limite de

    escoamento são sempre muito baixos. A título de comparação o limite de

    escoamento do Ketchup é próximo de 15 Pa (SCHRAMM, 2006), mais de 150

    vezes a média dos valores aferidos neste trabalho.

    Figura 9: Curva de fluxo para a amostra controle 20 °Brix, 15°C, com

    formação de gel em altas taxas de cisalhamento.

    Na curva de fluxo da Figura 9 é possível também ver uma perturbação na

    região com maior taxa de cisalhamento (em torno de 200 1/s), devido à possível

    formação de gel por aplicação de tensão como já descrito por SOUSA(2014), para

    soluções com hemiceluloses. A porção inicial (0 a 150 1/s) apresenta bom ajuste

    ao modelo da Lei da Potência com curvatura característica de pseudoplástico.

    Comparando o mosto primário com o secundário, cujas concentrações são

    20 °Brix, os valores de viscosidade não apresentam diferenças significativas (ɑ =

  • 25

    0,05). Entretanto a taxa de cisalhamento máxima é menor no mosto secundário,

    provável efeito da concavidade da curva que o modelo Newtoniano não considera.

    4.1. Ensaios oscilatórios

    As análises SS, ou varredura de tensão tem como saída um gráfico que

    apresenta os módulos de armazenamento e perda (G’ e G’’) bem como o ângulo

    de perda, definido como tgα=G’’/G’, dado em graus.

    Em todas as amostras foi possível observar a inversão de módulos (Figura

    10). Em baixas tensões o módulo de armazenamento é maior que o módulo de

    perda, indicando um caráter de comportamento elástico maior que o viscoso. Com

    o aumento da tensão os módulos se invertem, e o ângulo de perda começa a ter

    seu valor aumentado.

    Figura 10: Varredura de amplitude da amostra controle 20 °Brix a 5°C

    Também na Figura 10 é possível observar o intervalo de VEL, no qual o

    ângulo de perda não se altera com o aumento da amplitude (tensão). Este

    fenômeno ocorreu nas amostras em pequena escala, com intervalo de VEL

  • 26

    pequeno. Entretanto o intervalo de VEL da amostra da indústria coletada (Figura

    11) apresentou uma curva clássica de VEL com uma inversão de módulos

    ocorrendo a maior tensão. Esta amostra continha 30% de adjuntos, 50% a mais

    que as formuladas no laboratório. Em altas tensões as amostras apresentaram

    pequenas diferenças entre o módulo viscoso e o elástico, com inversão do

    comportamento inicial (predominantemente elástico). O intervalo de VEL da

    amostra da indústria ocorre em 20° de ângulo de fase, cerca de 10° a menos que

    a apresentada na figura 10, mostrando que o aumento de adjuntos resultou em um

    mosto com um componente elástico maior (mais próximo de um sólido ideal).

    Outra grande diferença entre os resultados dos mostos produzidos com o da

    indústria é a diferença entre os valores dos módulos no primeiro platô de VEL com

    o segundo: na Figura 10 é possível ver que G’ vai de aproximadamente 0,1 Pa

    para 0,005 Pa (20 vezes menor) e o G’’ começa em aproximadamente 0,08 Pa e

    reduz para cerca de 0,025 Pa (3,2 vezes menor). A escala de diferença na Figura

    8 é extremamente maior, indo de cerca de 9000 Pa para 0,05 Pa (180 mil vezes

    menor) para G’ e de 3000 Pa para cerca de 0,15 Pa (20 mil vezes menor) em G’’.

    Isso indica que a transformação mais profunda de caráter predominantemente

    elástico para predominantemente viscoso que ocorre quando se aumenta o teor

    de adjuntos na formulação e que o uso de adjuntos nesta amostra desencadeou

    em um fluído com maior estruturação. Não foi possível colocar os gráficos na

    mesma escala sem prejudicar a observação dos dados.

  • 27

    Figura 11: Varredura de tensão - Amostra da indústria (30% de adjuntos) a

    5°C

    Na última análise foram os ensaios FS, ou de varredura de frequência. A

    viscosidade complexa apresentada na Figura 12, vai decaindo com aumento da

    frequência, evidenciando a pseudoplasticidade de todas as formulações de mosto

    até aproximadamente 10 Hz. Entretanto em frequências ainda maiores que 10 Hz

    há uma inversão e a viscosidade complexa volta a subir de maneira abrupta,

    indicando a ocorrência de uma possível formação de gel por cisalhamento.

    Também é possível reparar que a taxa de variação da viscosidade complexa no

    controle foi inferior, indicando que os adjuntos influenciam no comportamento não-

    newtoniano do mosto. Os módulos de armazenamento têm sempre maiores

    valores que os módulos de perda (exceto em um ponto do controle), e a inclinação

    mais pronunciada do controle puro malte indica menor força de estruturação do

    fluído.

  • 28

    Figura 12: Viscosidade complexa (η*) e módulos de armazenamento e

    perda obtidos no ensaio de Varredura de frequência de amostras com 20 °Brix de

    mosto secundário a 5°C

    5. DISCUSSÃO

    Apesar da geração de modelos matemáticos para visualizar e analisar os

    comportamentos de fluxo de formulações contendo diferentes adjuntos, uma

    considerável limitação do estudo é a falta de dados sobre a composição destes

    cereais. Os cultivares tem diferenças em sua composição de acordo com variáveis

    como solo, época de colheita, chuvas etc que podem fazer com que um mesmo

    adjunto apresente resultados diferentes de acordo com produtor/região/variedade

    (LIMA, 2010).

    Além disso, sabe-se que o aumento no índice de fluidez e perfil de fluxo

    tem relação com componentes específicos dos cereais, como PNA e proteínas

    (AUTIO, 2006). Desta forma, para uma compreensão mais profunda sobre a

    natureza do motivo que altera o fluxo, relações quantitativas entre os

    componentes centesimais e viscosidade trariam informações mais precisas.

    Com base nas curvas de fluxo dos ensaios rotacionais é possível afirmar

    que em baixas taxas de cisalhamentos o comportamento dos mostos pode ser

    descrito como não newtoniano, como já observado em mostos de cerveja puro

    malte por Trávnícek(2015) e Severa(2009). Os adjuntos influenciaram na

    viscosidade aumentando-a, resultando em menor taxa de cisalhamento para a

  • 29

    mesma tensão. O centeio teve efeito de aumentar a concavidade da curva,

    expresso em valores de η’, distanciando ainda mais do comportamento

    newtoniano. A cevada não maltada não teve efeito significativo sobre η’, somente

    na viscosidade dinâmica (η). O mosto com sorgo apresentou menor viscosidade e

    índice de fluidez η’ maior, indicando que suas características reológicas favorecem

    o transporte de matéria e a processabilidade.

    O resultado dos ensaios oscilatórios ofereceu uma compreensão melhor de

    observações decorrentes dos ensaios rotacionais. O aumento do ângulo de fase

    na totalidade das amostras forneceu um dado inovador que permite afirmar que

    existe pseudoplasticidade no mosto da cerveja. O mosto da indústria, que teve

    maior porcentagem de adjuntos, apresentou um intervalo de VEL maior em

    comparação com as outras amostras. Na varredura de frequência foi possível

    observar uma tendência das características viscosas superarem as elásticas com

    o aumento da frequência de 0 à 10 Hz, porém a partir de 10 Hz ocorre inversão

    com aumento abrupto da viscosidade complexa, indicando reticulação da estrutura

    e possível formação de gel.

    Os resultados ajudam em um melhor entendimento da natureza de diversos

    problemas que ocorrem na cervejaria. Na etapa de elaboração do projeto deste

    trabalho a hipótese era de que talvez o limite de escoamento causava fluxo

    interrompido na separação de mosto, porém após a realização dos testes

    reométricos verificou-se que os mostos possuem valores de limite de escoamento

    muito baixos. O aumento de viscosidade complexa obtido nos ensaios FS em

    frequências maiores que 10 Hz indica que ocorre formação de gel, fator que pode

    causar fluxo reduzido ou entupimento nos procedimentos de separação e

    transporte de mosto. Isso é corroborado pelo o ruído em taxas de cisalhamento de

    cerca 200 1/s nos ensaios rotacionais, justamente uma taxa encontrada no

    escoamento em tubulações industriais.

    A reometria pode ser uma ferramenta importante tanto no desenvolvimento

    de novas cervejas quanto no controle de qualidade. Devido ao interesse em se

    produzir cervejas com adjuntos (ANNEMÜLLER, MANGER, 2013), seja por

    motivação de obter um sabor diferente ou para conferir fibras dietéticas solúveis e

  • 30

    compostos fenólicos, pode-se testar a formação de gel em pequena escala para

    saber o máximo teor de adjuntos sem causar comprometimento do processo.

    Como os grãos apresentam diferentes teores de PNA de acordo com safra,

    cultivar, região entre outros parâmetros, uma indústria que mudou de fornecedor

    pode aferir a qualidade dos grãos e planejar a produção a partir de ferramentas

    reométricas. Os testes podem dar informações sobre a estrutura do mosto em

    pequena escala, facilitando um scale-up consciente e planificado que irá evitar

    problemas em grandes dimensões, que costumam ser onerosos.

    O sorgo não possui grandes quantidades de PNA (AUTIO, 2006) e os

    testes rotacionais mostraram que o uso deste adjunto no teor de 20% resultou

    num mosto de alta processabilidade (pouco viscoso, baixa pseudoplasticidade e

    sem formação de gel observada em testes rotacionais) e que seu uso, hoje

    praticamente restrito ao continente africano, pode ser mais explorado.

    O crescente aumento do mercado de cervejas especiais no Brasil,

    protagonizado por pequenos produtores, está tensionando as grandes indústrias à

    também oferecerem produtos da categoria (SEBRAE, 2017) ou adquirir as

    pequenas companhias. É uma oportunidade para se desenvolver tecnologias para

    a produção de cervejas com maiores teores de fibras e compostos fenólicos,

    oferecendo benefícios e complementando a dieta se consumidos com moderação

    (PREEDY, 2008), de maneira análoga ao papel do vinho na dieta mediterrânea.

    6. CONCLUSÕES

    Foi possível estabelecer que há diferenças mensuráveis entre mostos

    elaborados com diferentes formulações, contendo ou não adjuntos. A

    pseudoplasticidade do mosto elaborado com centeio foi maior que o controle,

    enquanto o mosto com sorgo apresentou comportamento mais próximo do

    newtoniano que o controle, ambos avaliados pelo índice de fluidez (η’). A

    quantidade de adjuntos quando comparada entre amostra controle e a da indústria

    se mostrou importante, aumentando a elasticidade e o intervalo de VEL.

    Os parâmetros obtidos na reometria podem ser usados como controle de

    qualidade do mosto. A processabilidade, ou seja, rápida separação, clarificação e

  • 31

    filtração do mosto e sem entupimentos, é inversamente proporcional à

    viscosidade, tamanho do intervalo de VLE, pseudoplasticidade (de acordo com o

    índice de fluidez η’, expoente no modelo da Lei da Potencia) e à viscosidade

    complexa, justificados nas diferenças encontradas nos mostos avaliados. A

    formação de gel observada em alguns resultados deste trabalho é uma

    característica que precisa ter seu impacto ainda melhor elucidado, principalmente

    na produção.

    Em análises de rotina de controle de qualidade de maltes e adjuntos

    cervejeiros, na indústria, a única medida reológica que é realizada é a viscosidade

    cinemática do mosto primário, um dado pontual obtido em viscosímetro capilar,

    sendo insuficiente para compreensões mais completas sobre o comportamento

    estrutural. Neste trabalho foi possível observar maiores ajustes ao modelo da Lei

    da Potência, indicando que a viscosidade do mosto de cerveja é dependente de

    sua taxa de cisalhamento. O mosto, durante sua produção, é submetido a

    diferentes taxa de cisalhamento (escoamento em tubulações, bombas, filtros,

    repouso, etc), portanto medidas de viscosidade dinâmica são mais indicadas que

    de viscosidade cinemática, para compreender o que ocorre em diferentes faixas

    de taxa de cisalhamento. A estruturação e formação de géis - principalmente

    quando se tratam de formulações com adjuntos ou ingredientes não convencionais

    - como aqui mostrado, é bem trabalhada através da reologia oscilatória.

    A compreensão do impacto do uso de cereais não maltados na reologia do

    mosto possibilita o planejamento tecnológico. Se aliar os dados obtidos na

    reometria com futuros testes de tempo de separação de mosto ou tempo de

    filtração abre-se caminho para criação de uma tabela de valores críticos de

    processo. As ferramentas reométricas podem auxiliar na obtenção do maior teor

    possível de fibras ou compostos fenólicos sem causar problemas de fabricação.

  • 32

    7. BIBLIOGRAFIA

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