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Imunologia Doenças Oculares

Imunologia Médica - Doenças Oculares · avascular da córnea, além da ausência de vasos linfáticos drenando a câmara anterior, o que limita o acesso do sistema imune adaptativo

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Imunologia

Doenças Oculares

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Imunoprivilégio

• Introdução ao imunoprivilégio

Certos locais anatômicos são relativamente protegidos do sistema imunológico. Chamamos ‘sitios anatômicos imunologicamente privilegiados’ os locais onde não há indução de tolerância nem ativação de linfócitos em circunstâncias nor-mais. Entretanto, se linfócitos auto-reativos ativados migrarem para sítios ana-tômicos privilegiados, pode haver desenvolvimento de autoimunidade. Um bom exemplo é o testículo. É comum que durante a puberdade haja expressão de no-vos antígenos neste órgão, nunca antes reconhecidos pelo sistema imunológico. O privilégio imunológico garante que não haja prejuízo no desenvolvimento de células germinativas durante e após a puberdade. Da mesma forma, o feto em desenvolvimento, que expressa tanto os MHC maternos quanto os antígenos pa-ternos, é protegido do sistema imunológico da mãe. O cérebro é um local imuno-logicamente privilegiado e está protegido contra a circulação de linfócitos e an-ticorpos pela barreira hematoencefálica. A proteção no olho é fornecida por um suprimento insuficiente de sangue e de linfa, além da ausência de APCs. A falta de respostas das células T aos tecidos privilegiados se dá pela anergia dessas células, mas em alguns casos, após um trauma, os antígenos podem ficar expos-tos, resultando no desenvolvimento de uma resposta autoimune que causa da-nos significativos.

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• Imunoprivilégio no olho

A visão é essencial para a sobrevivência da maioria dos mamíferos, e pode ser facilmente prejudicada por um processo inflamatório dentro do olho. Mecanis-mos evolutivos que minimizam as respostas imunes e a inflamação no olho foram mais bem descritos na câmara anterior, um espaço localizado entre a córnea (an-teriormente), a íris e o cristalino (posteriormente). A inflamação nesta câmara pode levar à opacificação da córnea, com gradativa perda de visão. As caracte-rísticas anatômicas da câmara anterior que contribuem para o privilégio imuno-lógico incluem as junções de oclusão, a barreira hemato-ocular e a natureza avascular da córnea, além da ausência de vasos linfáticos drenando a câmara anterior, o que limita o acesso do sistema imune adaptativo a antígenos no olho. Existem vários fatores solúveis com propriedades imunossupressoras/ antiinfla-matórias no humor aquoso que atuam na câmara anterior, incluindo neuropeptí-deos (peptídeo vasoativo intestinal, somatostatina), TGF-β e indolamina 2,3- dioxigenase (IDO). A IDO é uma enzima envolvida na degradação do aminoácido triptofano, que é um importante fator para a proliferação de linfócitos T.

As células que revestem a câmara anterior, incluindo o epitélio da íris e o endo-télio, expressam o FasL e a PD-L1, que podem induzir a morte ou a inativação das células T, respectivamente. O Fas é um dos receptores de morte responsá-veis pela entrega de sinais apoptóticos nas células. O FasL (Fas Ligante) é ex-presso em células T CD4 ativadas e linfócitos T citotóxicos (que eliminam células tumorais e infectadas por vírus). Quando o FasL se liga ao Fas, ativa as caspases

levando à destruição da célula.

De acordo com Janeway (2016), a tolerância é percebida por meio de uma redu-ção de células T ou da resposta de anticorpos contra o mesmo antígeno quando

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é posteriormente introduzido em sítios extra-oculares em comparação com a resposta em indivíduos que não receberam antígeno intra-ocular. O desvio imune associado à câmara anterior pode ser mediado por células Treg. Estudos em camundongos mostram que o antígeno introduzido na câmara anterior é transportado por macrófagos ou células dendríticas, através do sangue, para o baço, e apresentado pelas células B esplênicas para células T virgens, induzindo a geração de células Treg específicas para o antígeno.

O desvio imunológico associado à câmara anterior é um fenômeno no qual a in-trodução de antígenos proteicos estranhos, na parte anterior do olho, induz ati-vamente uma tolerância sistêmica a esse antígeno. Esse fenômeno presumivel-mente reduz a chance de que respostas imunes adaptativas sejam montadas contra antígenos estranhos que estão localizados no olho. Em contraste com a tolerância induzida a antígenos estranhos introduzidos na câmara anterior do olho, auto-antígenos do olho não induzem tolerância sistêmica. Essa falta de to-lerância se torna um problema apenas quando o trauma do olho expõe estes antígenos ao sistema imunológico. Um exemplo disso é a oftalmia simpática, em que o trauma em um dos olhos causa a exposição de antígenos oculares que levam à doença autoimune, tanto no olho ferido quanto no olho não lesionado. A imunossupressão, e raramente a remoção do olho danificado, é necessária para

preservar a visão no olho não danificado.

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(1) (2) (3)

(1)

O trauma em um dos olhos resulta na libera-

ção dos antígenos intra-oculares sequestrados.

(2) O antígeno liberado é carregado para os linfo-nodos e ativa as células T.

(3) A célula T efetora ati-vada reconhece o antí-geno em ambos os olhos, deflagrando uma resposta autoimune.

Oftalmia simpática: Resposta auto-imune que ocorre no outro olho após um olho ter sido danificado. Outro exemplo são os auto-antígenos do cérebro e da me-dula espinhal. A proteína básica da mielina é o antígeno alvo da esclerose múlti-

pla, uma doença desmielinizante inflamatória crônica do sistema nervoso central.

• Características do imunoprivilégio

A comunicação entre o local privilegiado e o corpo é atípica, uma vez que o fluido extracelular não passa pelos vasos linfáticos convencionais, embora as proteínas introduzidas nesses locais realmente saiam e possam ter efeitos imunológicos. Locais imunoprivilegiados são geralmente cercados por barreiras teciduais que excluem os linfócitos virgens. O cérebro, por exemplo, é protegido pela barreira hematoencefálica.

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Fatores solúveis que afetam o curso de uma resposta imune são produzidos em locais privilegiados. O fator transformador do crescimento (TGF-β), parece ser particularmente importante nesse aspecto. Em condições homeostáticas, os an-tígenos reconhecidos em conjunto com o TGF-β tendem a induzir respostas de Linfócitos Treg, em vez de respostas pró-inflamatórias de TH17, induzidas pelo

TGF-β na presença de IL-6.

A expressão do FasL em locais imunologicamente privilegiados pode fornecer um nível adicional de proteção ao induzir a apoptose de linfócitos efetores que entram nesses locais.

• Tolerância a transplantes

Enxertos de tecidos estranhos colocados em alguns locais do corpo não provo-cam respostas imunes. Por exemplo, enxertos colocados no cérebro e na câmara anterior do olho não induzem a rejeição. Acreditava-se originalmente que o pri-vilégio imunológico se devia a incapacidade dos antígenos serem liberados des-tes locais e induzir respostas imunes. Estudos subseqüentes mostraram que os antígenos deixam esses locais e interagem com as células T. No entanto, em vez de provocar uma resposta imune efetora, induzem uma resposta tolerogênica que não prejudica o tecido. Como local privilegiado, o olho geralmente aceita transplantes de córnea. Na maior parte, os transplantes são bem-sucedidos sem a necessidade de compatibilidade de tecidos ou imunossupressão sistêmica. É também um local útil para o transplante experimental, para estudar mecanismos de tolerância, supressão e evitação imunológica. Curiosamente, foi demonstrado que um aloenxerto transplantado para tal local não só não é rejeitado, como tam-bém induz um estado de tolerância sistêmica e específica.