88
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO INDÚSTRIA DO DANO MORAL PATRÍCIA DE JESUS DECLARAÇÃO “DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”. ITAJAÍ (SC), 15 de dezembro de 2010. ___________________________________________ Professora Orientadora: Ana Lúcia Pedroni UNIVALI – Campus Itajaí-SC

INDÚSTRIA DO DANO MORAL - siaibib01.univali.brsiaibib01.univali.br/pdf/Patrícia de Jesus.pdf · “O dano moral vem a ser lesão de interesse não patrimonial de pessoa física

  • Upload
    lyngoc

  • View
    212

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

INDÚSTRIA DO DANO MORAL

PATRÍCIA DE JESUS

DECLARAÇÃO

“DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”.

ITAJAÍ (SC), 15 de dezembro de 2010.

___________________________________________ Professora Orientadora: Ana Lúcia Pedroni

UNIVALI – Campus Itajaí-SC

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

INDÚSTRIA DO DANO MORAL

PATRÍCIA DE JESUS

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientadora: Professora MSc. Ana Lúcia Pedroni

Itajaí (SC), dezembro de 2010.

AGRADECIMENTOS

A Deus, quem me honrou com a vida, moldou meu caráter, sobretudo, guarneou em mim tristezas e

alegrias, pousando sobre meus ombros vitórias e derrotas, para que pudesse persuadir o mar de incertezas e florear sobre o oceano de glórias.

Aos meus pais, que fundamentalmente consolidaram as bases sólidas de valores morais, religiosos,

moldando pelo caráter incorruptível, com carinho e amor, souberam me ouvir, sobretudo, preparar me para as armadilhas da vida, onde depositaram em mim o vossa confiança, fazendo dos meus sonhos

os vossos, abnegando da tua felicidade para que pudesse completar a minha. Não há palavras para

expressar minha gratidão, pois se esta é uma vitória, certamente parte dela é sua, “porque parte de mim

sou eu, parte de mim são vocês”.

Aos meus ilustres patrões, como posso chamar de meus segundos pais, que me acolheram e me ensinaram nesses 13 anos como lutar e assim

vencer a cada dia de nossas convivências. Estiveram comigo nesta árdua peregrinação, porém prodigiosa, que mesmo sem saber o quão bem me fizeram ao duvidar de minha coragem, sem a qual jamais teria despontado em mim o senso de luta,

fazendo com que pudesse chegar tão longe, que me ensinaram muitas coisas, mas uma em especial:

amar e buscar o Direito.

Guardo em especial apreço a Ana Lúcia Pedroni, orientadora e professora querida, que sempre com

um olhar acolhedor, soube esclarecer as dúvidas pertinentes, jamais esmoreceu, mesmo quando as

incertezas tomaram lugar da razão, muito obrigado.

Aos meus amigos, verdadeiros tesouros que conquistei ao longo desta jornada. E em especial a

minha amiga, irmã de coração, Judit Dias que

3

sempre esteve comigo nesta caminhada da minha vida. Nada seria belo o bastante, se não houvesse

vocês para compartilhar. Voz, amigos sinceros que ao longo desta jornada souberam caminhar de mãos

dadas, meu muito obrigado, reconhecendo que “Os verdadeiros amigos são aqueles que nos tornam

melhores do que somos”, grande parte do que sou, devo ao compartilhar constante e abnegado dos

amigos, que se colocaram ao meu lado, na minha árdua e lenta ânsia de caminhar.

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais, por tudo que eles proporcionam e significam em minha vida. Por

sempre trazer alegria ao meu viver, agradeço a Deus todos os dias por saber que vocês existem e

que fazem parte da minha vida. Como não amar alguém assim que só trazem alegria ao meu viver, a

um amor simplesmente incondicional, sem limites, meu pensamento é em volta desse amor que sinto

por vocês, que até hoje me mostram o quanto tenho que lutar pelos meus objetivos, e que os obstáculos que surgiram deverão ser vencidos. Dedico a vocês

meus pais amados, esta conquista.

Amo vocês eternamente.

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), dezembro de 2010.

Patrícia de Jesus Graduanda

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Patrícia de Jesus, sob o título Indústria

do Danos Moral, foi submetida em 14 de Dezembro de 2010 à banca examinadora

composta pelas seguintes professoras: Ana Lúcia Pedroni (orientadora e presidente

da banca) e Maria Fernanda do Amaral Pereira Gugelmin Girardi (membro da

banca), e aprovada com a nota ______________(_____).

Itajaí (SC), dezembro de 2010.

Prof. MSc. Ana Lúcia Pedroni Orientador e Presidente da Banca

Prof. Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Conduta

“É a ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano,

comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do

próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause

dano a outrem gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.” 1

Culpa

“É a falta de diligência na observância da norma de conduta, isto é, o desprezo por

parte do agente, do esforço necessário para observá-la, com resultado não

objetivado, mas previsível, desde que o agente detivesse na consideração das

conseqüências eventuais de sua atitude.” 2

Dano

“Dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo,

moral ou material, ou melhor, econômico e não econômico.” 3

Dano Emergente

“Aquele que mais se realça à primeira vista, o chamado dano positivo, traduz numa

diminuição de patrimônio, uma perda por parte da vítima: aquilo que efetivamente

perdeu.” 4

1 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 7. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 40. 2 DIAS, José de Aguiar in VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 10 ed. São

Paulo: Atlas,2010.p.26. 3 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p. 39. 4 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p. 44.

8

Dano Moral

“O dano moral vem a ser lesão de interesse não patrimonial de pessoa física ou

jurídica, provocada pelo fato lesivo”. 5

Indenização

“Sanção indireta entendida como remédio sub-rogatório, de caráter pecuniário, do

interesse atingido. Tal reparação jurídica se traduz por pagamente equivalente em

dinheiro.” 6

Lucro Cessante

“É o que a vítima razoavelmente deixou de lucrar. Trata-se de uma projeção contábil

nem sempre muito fácil de ser avaliada. Nessa hipótese deve ser considerado o que

a vítima teria recebido caso não tivesse ocorrido o dano.” 7

Nexo Causal

“É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação

causal que se conclui quem foi o causador do dano.” 8

Responsabilidade Civil

“É a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou

patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por

pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples

imposição legal.” 9

5 Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil. p. 92 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 134 e 135. 7 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p. 45. 8 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p. 56. 9 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p. 35.

SUMÁRIO

RESUMO.......................................................................................... XII

INTRODUÇÃO ..................................................................................13

CAPÍTULO 1 .....................................................................................16

DA RESPONSABILIDADE CIVIL .....................................................16

1.1 A ORIGEM DA PALAVRA RESPONSABILIDADE....................................... 16

1.2 CONCEITUAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL.................................... 17

1.3 EVOLUCAO HISTORICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL ........................ 19

1.4 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL ............... 23

1.5 RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SUBJETIVA ....................................... 26

1.5.1 DISTINÇÕES ENTRE AS TEORIAS ..................................................................... 26

1.6 ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ............. 28

1.6.1 CONDUTA DO AGENTE.................................................................................... 28

1.6.2 CULPA DO AGENTE ........................................................................................ 29

1.6.3 DANO E NEXO CAUSAL .................................................................................. 31 CAPÍTULO 2 .....................................................................................36

DO DANO MORAL ...........................................................................36

x

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DANO MORAL .............................................. 36

2.2 CONCEITO DE DANO MORAL..................................................................... 43

2.3 CLASSIFICAÇÃO DO DANO MORAL.......................................................... 45

2.3.1 DANO MORAL DIRETO ..................................................................................... 45

2.3.2 DANO MORAL INDIRETO .................................................................................. 46

2.4 AÇÃO OU OMISSÃO DO AGENTE CAUSADOR DO DANO MORAL......... 47

2.5 DOLO OU CULPA DO AGENTE CAUSADOR DO DANO MORAL ............. 49

2.5.1 DEFINIÇÃO DE DOLO....................................................................................... 49

2.5.2 DEFINIÇÃO DE CULPA ..................................................................................... 50

2.6 RELAÇÃO DE CAUSALIDADE..................................................................... 52

2.7 NÃO CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL................................................. 54

2.7.1 CULPA DA VÍTIMA ........................................................................................... 55

2.7.2 FATO DE TERCEIRO ........................................................................................ 56

2.7.3 CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR ..................................................................... 58

2.7.4 CLÁUSULA DE NÃO INDENIZAR ........................................................................ 59

2.7.5 LEGÍTIMA DEFESA .......................................................................................... 60

2.7.6 ESTADO DE NECESSIDADE .............................................................................. 61

2.7.7 EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO E ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL ..... 62 CAPÍTULO 3 .....................................................................................64

DELIMITAÇÃO DO DANO MORAL..................................................64

xi

3.1 DO BEM JURÍDICO A SER PROTEGIDO..................................................... 64

3.1.1 AS DEFINIÇÕES DOUTRINÁRIAS ....................................................................... 64

3.1.2 A PESSOA HUMANA ....................................................................................... 66

3.1.3 A CONSCIÊNCIA COMO BEM JURÍDICO .............................................................. 66

3.1.4 A CONSCIÊNCIA COMO OBJETO DA RESPONSABILIDADE CIVIL ............................ 68

3.1.5 PRAZER, DESPRAZER E ESTRESSE................................................................... 69

3.2 O FATO E A PRESUNÇÃO DO DANO MORAL ........................................... 70

3.3 AVALIAÇÃO SUBJETIVA DO DANO MORAL ............................................. 72

3.4 PARTES ATINGIDAS PELO DANO MORAL................................................ 73

3.5 CRITÉRIOS PARA QUANTIFICAÇÃO DA INDENIZAÇÃO DO DANO MORAL............................................................................................................................. 74

3.5.1 ARBITRAMENTO. ............................................................................................ 76

3.5.2 INDENIZAÇÃO COM PARÂMETROS TARIFADOS ................................................... 77

3.6 RAZOABILIDADE PARA FIXAÇÃO DO DANO............................................ 77

3.7 CÁLCULO DO VALOR INDENIZATÓRIO..................................................... 80 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................84

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...........................................86

RESUMO

Esta monografia foi realizada por meio de pesquisa científica e

busca estabelecer diretrizes para um maior entendimento referente a indústria do

dano moral. O presente trabalho é composto de três capítulos, que se destacam

pelos seguintes conteúdos e objetivos específicos: no primeiro capítulo consta o

estudo do instituto da responsabilidade civil, decorrente de ato ilícito, que gera o

dever de reparação com o intuito de restabelecer o estado que as coisas

encontravam-se anteriormente ao dano, se esse estado não puder ser recomposto,

no segundo capítulo localiza-se no ordenamento jurídico brasileiro qual a forma mais

apropriada de amenizar o dano causado; pela dimensão da conduta do agente e

pela forma de afetação, sendo que alterando seu sentimento, entrar-se-á na esfera

do dano moral; e o terceiro capítulo apresenta a delimitação do dano moral, que é

intermediado pelo Poder Judiciário através de Ação de Indenização por Danos

Morais e interposto pela pessoa que foi ofendida em seu sentimento, essa

indenização de caráter pecuniário será paga pelo agente causador do dano, e o

pedido de condenação será analisada pelo juiz e se confirmado, apresentará ao

responsável pelo prejuízo um caráter repulsivo à conduta. Esse pedido de dano

moral deverá ser apreciado individualmente pelo juiz em cada caso, relevando os

pedidos formulados na petição inicial diante das provas apresentadas pela vítima e

demonstrada a dimensão do dano. E, então, o juiz, após a formulação de seu

convencimento, passará a fixar o valor da indenização decorrente do dano moral.

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto central de estudo a

indústria do dano moral.

Assim, a pesquisa, possui requisito institucional parcial e

obrigatório, para a obtenção de título de bacharel em direito. No que se refere o

objetivo investigativo, visa estudar a responsabilidade civil do dano moral, com vista

para a indenização

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, a abordagem sobre a

responsabilidade civil, sua conceituação contendo os elementos constitutivos bem

como sua ligação ao caráter reparatório no dano moral.

No Capítulo 2, apresenta-se o dano moral propriamente dito,

sua conceituação, incidência e características. Adicionalmente são trazidos o

cabimento, e pleito perante o judiciário para a obtenção de sentença condenatória

No Capítulo 3, apresenta-se o bem jurídico a ser protegido, são

discutidos os fundamentos de reparação e as formas de análise efetuadas pelo

julgador, para os critérios de fixação do valor a título de dano moral.

Por fim, o presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentadas as considerações acerca dos

problemas e hipóteses levantadas para a pesquisa, seguidos da estimulação à

continuidade dos estudos e das reflexões sobre o tema escolhido a Indústria do

Dano Moral.

14

Para o desenvolvimento temático da presente pesquisa foram

elaborados os seguintes problemas:

1. Qual o significado da responsabilidade civil?

2. Quais são os pressupostos necessários para caracterizar o

dever de reparar o dano moral?

3. Quais são os critérios utilizados para a fixação do valor a

ser indenizado em caso de comprovação da existência do

dano moral?

A partir dos problemas formulados, foram levantada as

seguintes hipóteses para o trabalho de pesquisa:

Hipótese 1: A responsabilidade civil significa que as pessoas

têm o direito de não serem injustamente invadidas em suas esferas de interesses,

por força de nossa conduta, pois caso isso aconteça têm elas o direito de serem

indenizadas na proporção do dano sofrido.

Hipótese 2: Os pressupostos necessários para caracterizar o

dever de reparar o dano moral são: a conduta do agente, a culpa, o dano e a relação

de causalidade.

Hipótese 3: Ao juiz é atribuída a competência para a fixação do

valor correspondente a reparação do dano moral.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que tanto na

Fase de Investigação quanto na Fase de Tratamento dos Dados e no Relatório dos

Resultados foi utilizado o método com base lógica Indutiva10.

10 O método indutivo consiste em pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de

modo a ter uma percepção ou conclusão geral. (PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. 9.ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2005. p. 87).

15

Nas diversas fases da Pesquisa, acionaram-se as técnicas do

referente11, da categoria12, dos conceitos operacionais13, da pesquisa bibliográfica14

e do fichamento15, em conjunto com as técnicas propostas por Colzani. 16

11 "Explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitado o alcance temático e de

abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa". (PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: ideias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p.241).

12 “Palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia". (PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: ideias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. p.229).

13 “Definição estabelecida ou proposta para uma palavra ou expressão, com o propósito de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas”. (PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: ideias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p.229).

14 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. (PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: ideias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p.240).

15 “Técnica que tem como principal utilidade otimizar a leitura na Pesquisa Científica, mediante a reunião de elementos selecionados pelo Pesquisador que registra e/ou resume e/ou reflete e/ou analisa de maneira sucinta, uma Obra, um Ensaio, uma Tese ou Dissertação, um Artigo ou uma aula, segundo Referente previamente estabelecido”. (PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: ideias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p.233).

16 COLZANI, Valdir Francisco. Guia para redação do trabalho científico. 2.ed. Curitiba: Juruá, 2005. p.95.

CAPÍTULO 1

DA RESPONSABILIDADE CIVIL

1.1 A ORIGEM DA PALAVRA RESPONSABILIDADE

De ver-se, assim, que a palavra responsabilidade é originada

do termo spondeo (prometo), fazendo ver que o obrigado, desta forma, estaria

assumindo um compromisso, uma responsabilidade.

Neste sentido a lição Henri Lalou citado por CARVALHO NETO17: Existe, aliás, na expressão responsabilidade, a palavra latina spondeo pela qual nos contratos verbais em Roma, o devedor se ligava solenemente

No direito antigo (período quiritário romano) já estavam

consagrados como princípios gerais de direito os princípios da responsabilidade civil:

viver honestamente, não ofender a outrem, dar a cada um, o que é seu18.

LISBOA19 ressalta que a vingança (vindicta) importava na

reparação de um dano com a prática de outro dano. Impossibilitava, de fato,

qualquer consideração sobre a noção jurídica de culpa leve ou lata, uma vez que

equiparava a prática de um delito a outro, fundada na lei de talião (talio).

A palavra "responsabilidade", segundo o vocabulário jurídico

origina-se do vocábulo responsável, do verbo responder, do latim respondere, que

tem o significado de responsabilizar-se, vir garantindo, assegurar, assumir o

pagamento do que se obrigou, ou do ato que praticou20.

17 LALOU, Henri in CARVALHO NETO, Inácio de Carvalho. Responsabilidade civil no direito da

família. Pensamento Jurídico. v. IX. Curitiba: Juruá, 2002. p. 21 e 22. 18 CARVALHO NETO, Inácio de Carvalho. Responsabilidade civil no direito de família. p. 22. 19 LISBOA, Roberto Senise. Manual Elementar de Direito Civil. v. 2: obrigações e responsabilidade

civil. 2. ed. Revistas dos tribunais. São Paulo. 2002. p. 179 e 180. 20 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho –

Rio de Janeiro, 2006. p. 1.222.

17

Assim expõe GONÇALVES21: “A palavra "responsabilidade" é a

evolução do vocábulo latino re-spondere, que tem como significado o conceito de

segurança, restituição ou compensação. Desta forma, teria o sentido de obrigação

de restituir ou ressarcir”.

1.2 CONCEITUAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

O termo "civil" refere-se ao cidadão, assim considerado nas

suas relações com os demais membros da sociedade, das quais resultam direitos a

exigir e obrigações a cumprir.

Diante da etimologia das duas palavras acima, bem como das

tendências atuais a respeito da responsabilidade civil, destaca-se a conceituação de

DINIZ22 para o assunto:

A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ele mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.

No início da nossa civilização, a ocorrência de um dano gerava na vítima uma idéia de vingança para com o agressor, ou seja, a justiça era feita pelas próprias mãos. Limitava-se a retribuição do mal pelo mal, olho por olho, dente por dente.

GAGLIANO23, entende que:

(...) trazendo esse conceito para o âmbito de Direito Privado, e seguindo essa mesma linha de raciocínio, diríamos que a responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse eminentemente particular, sujeitando, assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação pecuniária à vítima, caso não possa repor in natura o estado anterior das coisas.

DINIZ24, conceitua a responsabilidade civil, a partir da origem

do vocábulo.

21 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 6ª Ed. atual. e ampl. São Paulo. Saraiva,

1995. p.15. 22 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 7. ed., São Paulo, 1993. p. 40. 23 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil Responsabilidade civil – 4 ed. v. 3– São

Paulo: ed. Saraiva, 2006, p. 9.

18

O vocábulo “responsabilidade” é oriundo do verbo latino respondere, designando o fato de ter alguém se constituído garantidor de algo. Tal termo contém, portanto, a raiz latina spondeo, fórmula pela qual se vinculava, no direito romano, o devedor nos contratos verbais. Deveras, na era romana a stipulatio requeria o pronunciamento das palavras dare mihi spondes?Spondeo, para estabelecer uma obrigação a quem assim respondia. Todavia, a afirmação – de que o responsável será aquele que responde e que responsabilidade é a obrigação do responsável, ou melhor, o resultado da ação pela qual a pessoa age ante esse dever – será insuficiente para solucionar o problema e para conceituar a responsabilidade. Se ele agir de conformidade com a norma ou com seu dever, seria supérfluo indagar da sua responsabilidade, pois ele continuará responsável pelo procedimento, mas não terá nenhuma obrigação traduzida em reparação de dano, como substitutivo do dever de obrigação prévia, porque a cumprir, de modo que o que nos interessa ao referirmos á responsabilidade é a circunstância da infração da norma ou obrigação do agente. A responsabilidade serviria, portanto, para traduzir a posição daquele que não executou o seu dever.

O Código Civil25, não define expressamente Responsabilidade

Civil. Quando trata sobre o tema no Título IX, Capítulo I, e prevê em seu artigo 927

que:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Sobre o assunto, dispõe SANTOS26, que:

A responsabilidade civil esta relacionada à noção de que somos responsáveis pelos fatos decorrentes da nossa conduta, isto é, que devemos nos conduzir na vida sem causar prejuízos às outras pessoas, pois se isso acontecer ficamos sujeitos a reparar os danos. E, de outra parte, significa que as pessoas têm o direito de não serem injustamente invadidas em suas esferas de interesses, por força de nossa conduta, pois caso isso aconteça têm elas direito de serem indenizadas na proporção do dano sofrido. Vemos então que

24 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, responsabilidade civil – 24 ed. v. 7 – São

Paulo: Saraiva, 2010. p. 33. 25 BRASIL, Código Civil. Lei 10.406 de 10/01/2002. p. 232. 26 SANTOS, Romualdo Baptista dos in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes, Teoria Geral da

Responsabilidade Civil editora revista dos tribunais. São Paulo. 2008. p. 27.

19

a responsabilidade civil está ligada à conduta que provoca dano às outras pessoas.

Comenta GONÇALVES27,

(...) que a responsabilidade civil é parte do direito das obrigações, pois o ato ilícito é uma das fontes das obrigações e a principal conseqüência que surge para quem pratica um ato ilícito é a obrigação de indenizar os danos. E acrescenta que as obrigações derivadas dos atos ilícitos se constituem por meio de ações ou omissões praticadas com infração a um dever de conduta, das quais resulta dano para outrem.

É possível caracterizar a responsabilidade civil como a

repercussão obrigacional da atividade humana, sendo que todo ente capaz de

adquirir direitos e exercê-los por si mesmo diretamente, responderá pelos danos

causados por meio de sua atuação no ordenamento jurídico.

1.3 EVOLUCAO HISTORICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Para a nossa cultura, toda reflexão, por mais breve que seja,

sobre as raízes históricas de um instituto, acaba encontrando seu ponto de partida

no Direito Romano.

Historicamente, nas sociedades primitivas, de um modo geral (inclusive nas tribos ameríndias), já existiam “relações de convivência” e “necessidade de respeito recíproco”, reguladas através de normas, cuja violação implicava na retribuição do mal com o mal, na forma típica do talião, como forma de “vingança regulada e comensurada”, daí afirma-se que a justiça penal precede a justiça civil28. Esse período histórico, como se sabe, constitui a denominada vingança privada, que evolui no sentido da vingança divina (ou sacral, realizada em nome de Deus), e, finalmente, cristalizou-se, na vingança pública (em nome do Estado), nos tempos modernos.

A evolução da responsabilidade civil se mostra antes de tudo

na preocupação com o equilíbrio social. Este instituto é dinâmico, pois tem de

adaptar-se-às constantes transformações que envolvem a sociedade buscando

restabelecer o equilíbrio desfeito na ocasião do dano29.

27 GONÇALVES, Carlos Roberto in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes. Teoria Geral da

Responsabilidade Civil. p. 27. 28 SOARES, Orlando. Responsabilidade Civil no Direito Brasileiro. 2ª edição. Rio de Janeiro.

1997. p. 01. 29 DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 25.

20

SOARES30 observa que:

O Código de Hamurabi, por exemplo, assim denominado em homenagem ao monarca de Babilônia, que o mandou elaborar, e que viveu, calcula-se, no período de 2003 a 1961 a.C., estabeleceu várias disposições, reparatórias do dano prejuízo causado pelo agente do fato. Assim, por exemplo, se o escravo (awilum) roubasse um boi, uma ovelha, um asno, porco ou uma barca, caso pertencesse a um deus ou palácio, deveria pagar até 30 vezes mais; se pertencesse a um cidadão livre, dentre as classes dos proprietários, soldados, pastores e outros (muskênum), restituiria até 10 vezes mais. Se o ladrão não tivesse com que restituir, seria morto.

O direito moderno continua usando, em parte a terminologia

tomada quanto á matéria de responsabilidade31, pois nossa cultura tem como ponto

de partida o direito Romano, assim como a responsabilidade civil.

Segundo DINIZ32:

(...) responsabilidade civil apresenta uma evolução pluridimensional, pois sua expansão se deu quanto à sua história, aos seus fundamentos, à sua extensão ou área de incidência (número de pessoas responsáveis e fatos que ensejam a responsabilidade) e à sua profundidade ou densidade (exatidão de reparação).

Historicamente, nos primórdios da civilização humana,

dominava a vingança coletiva, que se caracterizava pela reação conjunta do grupo

contra o agressor pela ofensa a um de seus componentes. 33

PEREIRA34, afirma que a maior revolução nos conceitos jus

romanísticos em termos de Responsabilidade Civil se deu com a Lex Aquilia, que

tem data incerta, mas é originária de um plebiscito proposto pelo tribuno Aquilio.

DINIZ35, ressalta que:

30 SOARES, Orlando. Responsabilidade Civil no Direito Brasileiro. p. 01 e 02. 31 VENOSA, Sílvio de Salvo. Responsabilidade Civil. 4. ed. São Paulo Atlas, 2004. p. 22. 32 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, responsabilidade civil. p. 10. 33 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro responsabilidade civil.p 10. 34 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990. p .

6 35 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, responsabilidade civil. p. 10 e 11.

21

(...) evolui uma reação individual, isto é, vingança privada, em que os homens faziam justiça pelas próprias mãos, sob a égide da Lei de Talião, ou seja, da reparação do mal pelo mal, sintetizada nas fórmulas “olho por olho, dente por dente”, “quem com ferro fere, com ferro será ferido”. Para coibir abusos, o poder público intervinha apenas para declarar quando e como a vítima poderia ter o direito de retaliação, produzindo na pessoa do lesante dano idêntico ao que experimentou. (...) A responsabilidade era objetiva, não dependia da culpa, apresentado-se apenas como uma reação do lesado contra a causa aparente do dano.

Todavia, a responsabilidade civil também evoluiu em relação

ao fundamento (razão por que alguém deve ser obrigado a reparar um dano),

baseando-se o dever de reparação não só na culpa, hipótese em que será subjetiva,

como também no risco, caso em que passará a ser objetiva, ampliando-se a

indenização de danos sem existência de culpa36.

Ainda nesta temática, argumenta DINIZ37,

(...) a crescente tecnização dos tempos modernos, caracterizado pela introdução de máquinas, pela produção de bens em larga escala e pela circulação de pessoas por meio de veículos automotores, aumentando assim os perigos à vida e à saúde humana, levaram a uma reformulação da teoria da responsabilidade civil dentro de um processo de humanização, sob a idéia de que todo o risco deve ser garantido e todo dano deve ter um responsável.

(...)

(...) visando à proteção jurídica à pessoa humana, em particular aos trabalhadores e às vítimas de acidentes, contra a insegurança material, e todo dano deve ter um responsável.

Reforça essas ideais CHAVES38, ao escrever:

Numa ocasião em que se contam às centenas de milhares as vítimas de acidentes de trânsito e das negligências ou imperícias profissionais, apresenta-se não sob o manto de conveniência, mas de uma necessidade imperiosa lançar mão da teoria do risco.

36 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, responsabilidade civil. p. 12. 37 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, responsabilidade civil. p. 12 38 ANTONIO, Chaves. Responsabilidade Civil. 1. Ed., São Paulo, 1972, p. 32

22

Posteriormente, evoluiu para uma reação individual, isto é a vingança privada em que os homens faziam justiça pelas próprias mãos sob a égide da lei de Talião, ou seja, da reparação do mal pelo mal, sintetizada nas fórmulas “olho por olho, dente por dente” e “quem com ferro fere, com ferro será ferido.39

Para VENOSA40:

O famoso princípio da lei de Talião, de retribuição do mal pelo mal, na verdade, é princípio da natureza humana, qual seja reagir a qualquer mal injusto perpetrado contra a pessoa, a família ou grupo social. A sociedade primitiva reagia com violência. O homem de todas as épocas também o faria, não fosse reprimido pelo ordenamento jurídico.

Nesse caso, DINIZ41 expõe que:

O poder público intervinha apenas para declarar quando e como a vítima poderia ter o direito de retaliação, produzindo na pessoa do lesante dano idêntico ao que experimentou. Na lei da XII Tábuas, aparece significativa expressão desse critério na tábua VII, lei 11ª “si membrum rupsit, ni cum eo pacit, tálio esto” (se alguém fere a outrem, que sofra a pena do Talião, salvo se existiu acordo).

PEREIRA42 afirma que:

A maior revolução em termos de responsabilidade civil se deu com a Lex Aquilia “que abre na verdade, novos horizontes a responsabilidade civil, posto não haja um princípio geral. Seu maior valor consiste em substituir as multas fixas por uma pena proporcional ao dano causado.

Para VENOSA43, a Lex Aquilia é o divisor das águas da

responsabilidade civil, uma vez que considera o ato ilícito uma figura autônoma,

sendo a moderna concepção da responsabilidade extracontratual.

Todavia, tendo em vista a insuficiência da culpa para cobrir

todos os prejuízos a responsabilidade civil também evoluiu em relação ao

fundamento, “baseando-se o dever de reparação não só na culpa, hipótese em que

39 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro. p. 11. 40 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p.18. 41 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro. p. 11. 42 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade civil. 2 ed. Rio de Janeiro. Forense, 1990 p. 8. 43 VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil:responsabilidade civil. p. 19.

23

será subjetiva, como também no risco, caso em que passará a ser objetiva,

ampliando-se a indenização de danos sem existência de culpa”.44

1.4 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL

A Responsabilidade Civil ainda pode ser contratual e

extracontratual. Alguns autores preferem não fazer tal distinção, ao argumento de

que a base da Responsabilidade Civil seria a aferição da existência de culpa ou da

possibilidade da aplicação do risco.

A propósito, BERALDO45, traz exemplos de diferenciação:

(...) a pessoa que é atropelada por um ônibus devera ser ressarcida pelo autor do fato (responsabilidade extracontratual).

(...) porém, caso a pessoa esteja dentro de um ônibus, viajando de Belo Horizonte para São Paulo, e ocorra algum acidente, no qual ela sofra danos materiais e/ou morais, estaremos diante de responsabilidade contratual (existe um contrato de transportes).

A distinção entre responsabilidade civil contratual e

extracontratual tem gerado grandes debates entre de vários autores.

Desta forma, na visão de VENOSA46 tem-se que:

(...) que nem sempre resta muito clara a existência de um contrato ou de um negócio, porque tanto a responsabilidade contratual como a extracontratual com freqüência se interpretam e ontologicamente não são distintas: quem transgride um dever de conduta, com ou sem negócio jurídico, pode ser obrigado a ressarcir o dano. O dever violado será o ponto de partida, não importando se dentro ou fora de uma relação contratual.

(...) em doutrina é feita referência singela à responsabilidade civil, devemos entender que se trata da responsabilidade extracontratual.

44 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro, volume 7. p. 12. 45 BERALDO, Leonardo de Faria in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes. Responsabilidade Civil. p.

62. 46 VENOSA. Silvio de Salvo. Direito civil. Responsabilidade Civil. 10.ed. São Paulo. Atlas. 2010.

Coleção direito civil. V. 4. p. 22.

24

MACIEL47 ensina que:

A “responsabilidade contratual” gera a inversão do ônus da prova da culpa, favorecendo a parte lesada pelo descumprimento do contrato. Para que surja o direito à indenização, normalmente basta que o contratante demonstre a "inadimplência" do outro e os "danos" que daí decorram. Assim agindo, a culpa se “presume”.

Já na “responsabilidade extracontratual”, a prova da culpa ordinariamente cabe àquele que reclama a reparação do prejuízo, exceto nas situações de responsabilidade objetiva. Além de demonstrar os demais pressupostos da responsabilidade civil (conduta, nexo causal e dano), em regra a vítima estará obrigada a provar também a “culpa do agente” em uma das suas modalidades: dolo, negligência, imprudência ou imperícia.

LISBOA48 distingue uma da outra da seguinte forma:

Responsabilidade contratual: é aquela que decorre da violação de obrigação disposta em um negócio jurídico.

Responsabilidade extracontratual: é aquela que decorre da violação da obrigação disposta em um negócio jurídico.

A responsabilidade civil é chamada de contratual quando

deriva de um descumprimento contratual. Será ela extracontratual, ou aquiliana,

quando o ato ilícito não derivar de nenhum contrato49.

A propósito, observa RODRIGUES50:

(...)”...uma pessoa pode causar prejuízo a outra tanto por descumprir uma obrigação contratual, como por praticar outra espécie de ato ilícito. De modo que, ao menos aparentemente, existe uma responsabilidade contratual, diversa da responsabilidade extracontratual, também chamada aquiliana”.

(...)

47. http://istoedireito.blogspot.com/2008/06/responsabilidade-contratual-versus.html. MACIEL. Daniel

Baggio. Responsabilidade Contratual e Responsabilidade Extracontratual. Acessado em: 03 de Abril de 2010.

48 LISBOA, Roberto Senise. Manual Elementar de Direito Civil. v. 2: obrigações e responsabilidade civil. 2. ed. Revistas dos tribunais. São Paulo. 2002. p. 194.

49CARVALHO NETO, Inácio de Carvalho. Responsabilidade civil no direito da família. p. 38. 50 RODRIGUES. Sílvio in NETO. Inácio de Carvalho. Responsabilidade civil no direito da família.

Curitiba: Juruá, 2002. p. 39. Pensamento Jurídico. v. IX.

25

A responsabilidade aquiliana está disciplinada, em suas linhas mestras, no art. 186 do Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Ainda RODRIGUES51, ressalta algumas particularidades da

Responsabilidade Civil Contratual:

Primeiramente ao ônus da prova, diz que “na responsabilidade contratual, demonstrando pelo credor que a prestação foi descumprida, o onus probandi se transfere para o devedor inadimplente, que terá que evidenciar a inexistência de culpa de sua parte, ou a presença de força maior, ou outra excludente da responsabilidade capaz de eximi-lo do dever de indenizar(...), Já no que se refere ao relativamente incapaz, salienta que “o menor púbere só se vincula contratualmente assistido por seu representante legal e, excepcionalmente sem ele, se maliciosamente declarou-se maior (CC/2009, artigo 180);portanto, só pode ser responsabilizado por seu inadimplemento nesses casos(...)52.

GAGLIANO e PAMPLONA FILHO53, colocam as diferenças

básicas entre a Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual:

Entendem que “três elementos diferenciados podem ser destacados, a saber, a necessária preexistência de uma relação jurídica entre lesionado e lesionante; o ônus da prova quando à culpa, e a diferença quanto à capacidade”.

Sendo assim, viu-se que não existe grande diferença entre

uma e outra, sem falar que o efeito de ambas as modalidades é o mesmo: a

indenização.

Enfim, tanto a Responsabilidade Civil Contratual como a

Extracontratual requerem, para a sua configuração, somente a existência do dano,

do ato ilícito e do nexo de causalidade.54 Assim, tanto uma como outra poderão estar

51 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Responsabilidade Civil. 19. ed. atual. v. 4. São Paulo. Saraiva.

2002. p. 10. 52 RODRIGUES, Silvo. Direito Civil. Responsabilidade Civil. p. 10. 53 PAMPLONA FILHO, Rodolfo in GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de Direito Civil.

Responsabilidade Civil. São Paulo. Saraiva. 2003. p. 19. v. 3. 54 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo. Saraiva, 2003. p. 26 e

27.

26

fundadas na culpa ou na teoria do risco, conforme se trate de Responsabilidade Civil

Subjetiva ou Objetiva.

1.5 RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SUBJETIVA

Conforme anunciado no item anterior para ocorrer à

responsabilidade civil, a culpa pode ou não ser pressuposto essencial para a sua

caracterização.

GAGLIANO55, fala que a responsabilidade civil, enquanto

fenômeno jurídico decorrente da convivência conflituosa do homem e m sociedade,

é, na sua essência, um conceito uno, incindível.

Entende RODRIGUES56, que quando se fala em

Responsabilidade Civil Subjetiva e Objetiva, não se está diante de espécies

diferentes de responsabilidade, mas sim de maneiras diferentes de encarar a

obrigação de reparar o dano.

Passa-se então às distinções entre as duas teorias:

1.5.1 Distinções Entre as Teorias

A responsabilidade é dita subjetiva quando se inspira na idéia

de culpa, e objetiva quando fundada na teoria do risco.

Para BERALDO57 destarte que:

A diferença de uma e outra reside no fato de que, enquanto a responsabilidade subjetiva é imprescindível a demonstração da culpa do causador do dano, na responsabilidade objetiva é completamente desnecessária. .

55 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 13. 56 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Responsabilidade Civil. p. 11. 57 BERALDO, Leonardo de Faria in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes. Responsabilidade Civil. p.

61.

27

Para GOMES58:

(...) diz-se subjetiva a responsabilidade em que se perquire a culpa do agente causador do dano. Para que desponte a obrigação de indenizar, devem, necessariamente, estarem presentes os seguintes requisitos: a) conduta culposa; b) dano; c) relação de causalidade entre a conduta e o dano. E na responsabilidade objetiva, a culpa é irrelevante, nenhuma influência apresentado na definição da obrigação de indenizar. Para a fixação da responsabilidade, basta que ocorram os seguintes requisitos: a) conduta; b) dano; c) relação de causalidade.

DINIZ59, ressalta que:

(...) na responsabilidade subjetiva o ilícito é o seu fator gerador, de modo que o imputado, por ter-se afastado do conceito de bonus pater familias, deverá ressarcir o prejuízo, se provar que houve dolo ou culpa na ação. (....) Na responsabilidade objetiva, a atividade que gerou o dano é lícita, mas causou perigo a outrem, de modo que aquele que a exerce, por ter a obrigação de velar para que dela não resulte prejuízo, terá o dever ressarcitório, pelo simples implemento do nexo causal.

GOMES explica que:

A teoria objetiva, para que alguém seja responsabilizado a reparar o dano causado, não é necessário que tenha agido com culpa, ou seja, não é de rigor que tenha tido consciência e vontade na realização da conduta danosa. A responsabilização dispensa a perquirição e a prova desses elementos, bastando que se patenteie o dano e a relação casual entre ele, dano, e a conduta do agente.

A Constituição Federal do Brasil também prevê com o art. 37 §

5º:

Art. 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

§ 5º. – A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.

58 GOMES, José Jairo. Direito Civil. Introdução e Parte Geral. ed. del rey ltda. Belo Horizonte.

2006. p. 496 e 497. 59 DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro. Responsabilidade Civil. v. 7. p. 55.

28

1.6 ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Para que coexista a responsabilidade civil no campo

obrigacional, essa necessariamente deverá ser composta de elementos essenciais

para sua caracterização, sendo eles: a conduta, o dano e o nexo de causalidade.

Analisando este dispositivo legal é possível identificar os

elementos fundamentais da responsabilidade civil.

No art. 927 do Código Civil, o legislador deixou claro o escopo

de que todos os que cometerem atos ilícitos a outrem são obrigados a repará-los.

Este artigo remete ao artigo 186 do Código Civil, que também especificou oque seria

ato ilícito60.

Para que coexista a responsabilidade civil no campo

obrigacional, essa necessariamente deverá ser composta de elementos essenciais

para sua caracterização, sendo eles: a conduta do agente, culpa do agente, o dano

e nexo de causal.

Passa-se então à análise de cada um dos elementos

descritos:

1.6.1 Conduta do Agente

Por conduta entende-se o conjunto de atos ativos ou omissivos

realizados por uma pessoa, sozinha ou em grupo, de modo a concretizar dano a

direito de outrem, seja este de personalidade ou patrimonial.

Conduta do agente é o primeiro elemento da responsabilidade civil. Quando se trata de responsabilidade civil, a conduta do agente é a causadora do dano, surgindo daí o dever de reparação. Para que se configure o dever de indenizar advindo da responsabilidade civil, deverá haver a conduta do agente e nexo de causalidade entre o dano sofrido pela vítima e a conduta do agente61.

60 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 39 61 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 27.

29

Existe divergência entre doutrinadores em relação aos

pressupostos da responsabilidade civil.

VENOSA62 enumera quatro pressupostos para que passe a

existir o dever de indenizar, afirmando que “(...) os requisitos para a configuração do

dever de indenizar: ação ou omissão voluntária, relação de causalidade ou nexo

causal, dano e finalmente, culpa.”

Já DINIZ63, entende que são três os pressupostos ação ou

omissão, dano e a relação de causalidade.

RODRIGUES64 apresenta como pressupostos da

responsabilidade civil a culpa do agente, ação ou omissão, relação de causalidade e

dano.

Observa CARVALHO NETO65 que:

A conduta do agente causador do dano impõe-lhe o dever de reparar não apenas quando ocorre infringência a um dever legal (ato praticado contra o direito), mas também quando seu ato, embora sem infringir a lei, foge da finalidade social a que ela se destina.

O que importa, porém, não é esta ou aquela ação ou omissão

isoladas, mas a totalidade de todas elas enfeixadas e sintetizadas na conduta do

agente.

1.6.2 Culpa do Agente

A culpa se caracteriza quando o causador do dano não tinha

intenção de provocá-lo, mas por imprudência, negligência, imperícia causa dano e

deve repará-lo.

62 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Vol.4. 3°ed. São Paulo: Atlas S.A.,

2003. p. 13. 63 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. Vol.7. 17°ed. São

Paulo: Saraiva, 2003. p. 32. 64 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil, Volume IV, Editora Saraiva, 19ª Edição, São Paulo, 2002. p. 16. 65 CARVALHO NETO, Inácio de Carvalho. Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 48.

30

Nossa legislação civil admite a existência de responsabilidade

civil com a culpa como pressuposto, no entanto pode haver sem culpa. O parágrafo

único do artigo 927 do Código Civil afirma que66:

Art. 927 § Único: Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para o direito de outrem.

PAGE67, afirma:

“É um elemento concreto, e não abstrato; real, contingente, e não jurídico. A culpa é, muito simplesmente, em erro de conduta; é o ato ou o fato que não teria praticado uma pessoa prudente, avisada, cuidadosa em observar as eventualidades infelizes que podem resultar para outrem”.

A culpa não é elemento essencial da responsabilidade civil,

essenciais são a conduta humana, o dano ou lesão e o nexo de causalidade entre a

conduta e o dano.

DIAS68, após comentar a dificuldade de conceituá-la, não

consegue fugir de definição prolixa:

“A culpa é falta de diligência na observância da norma de conduta, isto é, o desprezo, por parte do agente, do esforço necessário para observá-la, com resultado não objetivado, mas previsível, desde que o agente se detivesse na consideração das conseqüências eventuais de sua atitude.”

Conclui STOCO que69:

“a culpa, genericamente entendida, é, pois, fundo animador do ato ilícito, da injúria, ofensa ou má conduta imputável. Nessa figura encontram-se dois elementos: o objetivo, expressado na iliciedade, e o subjetivo, do mau procedimento imputável”.

66 VADE, Mecum. p. 210. 67 PAGE, Henri de, in CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no Direito de Família.

p. 50. 68 DIAS, José de Aguiar, in VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 23. 69 STOCO, Rui, in VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 26.

31

O Código de 1916 não previa a concorrência de culpas como

forma de alterar o valor da indenização. Foi o longo trabalho jurisprudencial de

muitas décadas que resultou no texto do art. 945 do Código Civil70:

Art. 945: “Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada, tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.”

Assim, por exemplo, se dois motoristas ingressam, ao mesmo

tempo, em velocidade incompatível em um cruzamento, acarretando um embate de

veículos, conclui-se pela culpa de ambos, cada um indenizando a metade dos danos

ocasionados ao outro71.

1.6.3 Dano e Nexo Causal

O dano é, possivelmente, o pressuposto da Responsabilidade

Civil sobre o qual mais há o que se falar.

O dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil,

contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de indenização sem

a existência de um prejuízo.

Para SANTOS72, o dano, com certeza, o pressuposto mais evidente da responsabilidade civil, visto que não se pode falar em dever de indenizar sem a sua ocorrência. A definição de dano esta estreitamente relacionada à de patrimônio, uma vez que o dano significa uma lesão ou diminuição do patrimônio de determinada pessoa ou, por outra, a diferença entre o estado atual do patrimônio que o sofre e o que teria se o fato danoso não se tivesse produzido.

Para a reparabilidade proveniente de uma obrigação,

independentemente de qual seja a espécie da responsabilidade em foco,

imprescindível faz-se subsistir dano ou prejuízo.

70 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 39. 71 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 39 72 SANTOS, Romualdo Baptista dos in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes. Responsabilidade Civil.

p. 43.

32

Para CAVALIERI FILHO73:

O dano é, sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haverá que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano.

E ainda, nas palavras de COELHO74:

A existência do dano é condição essencial para a responsabilidade civil, subjetiva ou objetiva. Se quem pleiteia a responsabilização não sofreu dano de nenhuma espécie, mas meros desconfortos ou riscos não tem direito a nenhuma indenização.

Em regra, todos os danos devem ser ressarcíveis, mesmo que

não exista a oportunidade de retornar ao status quo ante coexiste a possibilidade da

fixação, em determinação judicial, de valor a título compensatório ao dano causado.

Porém, para que o dano seja indenizável, deve este preencher a alguns requisitos

indispensáveis, sendo eles: a) violação de interesse jurídico; b) certeza do dano e c)

subsistência do dano.

Somente haverá possibilidade de indenização se o ato ilícito

ocasionar dano. A materialização do dano ocorre com a definição do efetivo prejuízo

suportado pela vítima.

Nexo de causalidade é o elo que liga o dano ao sei fato

gerador.

Para o entendimento de VENOSA75:

O conceito de nexo causal, nexo etiológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame de relação causal que se conclui quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida.

73 CAVALIERI FILHO. Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2 ed., São Paulo: Malheiros,

2000, p. 70. 74 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. p. 259. 75 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. p. 56.

33

Portanto, não basta apenas que a vítima sofra dano, é preciso

que esta lesão passe a existir a partir do ato do agressor para que haja o dever de

compensação. É necessária relação entre o ato omissivo ou comissivo do agente e

o dano e tal forma que o ato do agente seja considerado como causa do dano.

A relação de causalidade entre a conduta humana (ação ou omissão do agente) e o dano verificado é evidenciada pelo verbo "causar", contido no art. 186 do Código Civil. Sem o nexo causal, não existe a obrigação de indenizar. A despeito da existência do dano, se sua causa não estiver relacionada com o comportamento do agente, não haverá que se falar em relação de causalidade e, via de conseqüência, em obrigação de indenizar. Nexo de causalidade é, pois, o liame entre a conduta e o dano76.

Para VENOSA77,:

verifica duas questões a serem analisadas na identificação do nexo causal. Primeiramente, existe a dificuldade em sua prova; a seguir, apresenta-se a problemática da identificação do fato que constitui a verdadeira causa do dano, principalmente quando este decorre de causas múltiplas. Nem sempre há condições de estabelecer a causa direta do fato, sua causa eficiente. Avulta a importância da definição do nexo causal em face da preponderância atual da responsabilidade objetiva. A ausência de nexo causal é, na verdade, nesse campo, a única defesa eficaz que tem o indigitado pela indenização.

O nexo de causalidade consiste nos elementos objetivos,

externos, da atividade ou da ausência de atividade do agente, que impele direito

alheio, e que, por conseqüência ocasiona um dano, seja ele de ordem material,

moral, ou ambas conjugadas.

1.6.4 Regra Geral da Responsabilidade Civil

A responsabilidade civil, regra geral está relacionada à

atividade de alguém que agride o interesse particular de outrem, causando-lhe

algum dano, ficando sujeito à reposição das coisas ao estado anterior, ao

pagamento de uma compensação à vítima.

76 http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5159. BRITTO, Marcelo Silva. Alguns Aspectos

polêmicos da responsabilidade civil, objetiva no novo código civil. Acessado dia 12 de Setembro de 2010.

77 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. p. 57.

34

A regra geral da responsabilidade civil, em nosso ordenamento

jurídico, está contida no art. 186 do Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Observa RODRIGUES78 que:

(...) seria preferível que o nosso preceito não usasse a expressão violar direito, e seguisse desse modo, mais de perto, a regra geral do art. 1.382 do Código Civil francês, dispõe que “Todo e qualquer fato de um homem, que cause a outro um dano, obriga-o a reparar a falta por ele cometida”.

No Brasil, que aceita a cláusula de não - indenizar, a posição privatista tende a prevalecer, tendo em vista o art. 186 do Código Civil, que deixa ao arbítrio do lesado buscar seus direitos, provocando a jurisdição, postulando ressarcimentos, caso queira, bem como buscando uma composição com o ofensor, judicialmente ou não. A conceituação da responsabilidade civil, sem caráter de ordem públicam predomina na dogmática brasileira e reflete-se positivamente na jurisprudência79.

PEREIRA80 afirma que:

(...) a reparação do dano é um direito do lesado, que pode exercê-lo ou deixar de fazê-lo, como pode, ainda, eximir o agente mediante cláusula expressa, ou transferir para um terceiro o dever ressarcitório mediante contrato de seguro.

Muitos dos autores clássicos salientam que a noção de culpa é,

inegavelmente, um dos fundamentos básicos da responsabilidade, mas que, então,

podem surgir casos em que se dê o seu afastamento, e, assim, a responsabilidade

surja com todos os seus característicos e efeitos81.

78 RODRIGUES, Sílvio, in CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no Direito da

Família. p. 45. 79 PEREIRA, Cáio Mário da Silva, in CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no

Direito da Família. p. 47. 80 PEREIRA, Cáio Mário da Silva, in CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no

Direito da Família. p. 47. 81 CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no Direito da Família. p. 47.

35

Da responsabilidade civil decorrem obrigações indenizatórias,

em face aos danos causados. Entre as espécies de danos, encontra-se o de ordem

moral, que será o tema do próximo capítulo.

CAPÍTULO 2

DO DANO MORAL

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DANO MORAL

Embora a aceitação da ampla reparabilidade dos danos morais

seja tese que só há pouco tempo se tornou razoavelmente pacífica na maioria das

legislações contemporâneas, a história das nações nos demonstra, de forma clara,

que sempre houve preceitos normativos que amparavam algumas dessas

pretensões82.

GAGLIANO83 demonstra no Código de Hamurabi, que:

(...) foi o primeiro na história em que predominam idéias claras sobre direito e economia. Trata-se de um sistema codificado de leis, surgindo na Mesopotâmia, através do rei da Babilônia, Hamurabi (1792-1750 a.C). (...) Tal código contém 282 dispositivos legais. (...) Seu princípio geral era a idéia de que “o forte não prejudicará o fraco”, pelo que sua interpretação nos demonstra que havia uma preocupação constante de conferir ao lesado uma reparação equivalente, o que ficou mais conhecido através do seu célebre axioma primitivo “olho por olho, dente por dente” (a lei do Talião).

Como observa REIS84 que a:

(...) “noção de reparação de dano encontra-se claramente definida no Código de Hamurabi. As ofensas pessoais eram reparadas na mesma classe social, à causa de ofensas idênticas. Todavia o Código incluía ainda a reparação do dano á custa de pagamento de um valor pecuniário”.

Um hipótese de lesão extrapatrimonial pode ser encontrada no

§ 127, que tratava da “injuria e difamação da família”85:

82 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.56.

83 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.57.

84 REIS, Clayton in GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.58.

85 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 58.

37

§ 127. Se um homem livre estendeu o dedo contra uma sacerdotisa, ou contra a esposa de um outro e não comprovou, arrastarão ele diante do juiz e raspar-lhe-ão a metade do seu cabelo”.

Sobre este dispositivo, comenta ZENUN86 que se trata de:

Uma pena de reparação do dano moral, que se não refere a dinheiro ou a qualquer outra coisa econômica, donde se conclui, de maneira clara e insofismável, que àquela época já se reconhecia o dano moral, cuja reparação nada tinha de pecuniária.

Sendo assim, GAGLIANO87 verifica que:

(...) o Código de Hamurabi buscava, indubitavelmente, a reparação das lesões ocorridas, materiais ou morais, condenando o agente lesante a sofrer ofensas idênticas (aplicação da “Lei de Talião) ou pagar a importância em prata (moeda vigente à época).

As Leis de Manu, GAGLIANO88 fala que:

(...) confronta com o Código de Hamurabi, não há como negar que, do ponto de vista da civilização moderna, o Código de Manu significou um avanço, eis que, enquanto no primeiro, a prioridade era o ressarcimento da vítima através de uma outra lesão ao lesionador original (dano que deveria ser da mesma natureza), o segundo determinava a sanção através do pagamento de um certo valor pecuniário.

Assim, aponta REIS89, “suprimiu-se a violência física que estimulava nova reprimenda igualmente física, gerando daí um ciclo vicioso, por um valor pecuniário. Ora, a alusão jocosa, mas que retrata uma realidade na história do homem, onde o bolso é a parte mais sensível do corpo humano, produz o efeito de obstar eficazmente o animus do delinqüente”.

O Alcorão também nos traz exemplos de repressão histórica às

lesões na esfera extrapatrimonial, conforme se verifica de seu item V, nos seguintes

termos90:

“V. O adúltero não poderá casar-se senão com uma adúltera ou uma idólatra. Tais uniões estão vedadas aos crentes”.

86 ZENUN, Augusto in GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 58

87 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.58

88 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.59

89 REIS, Clayton in GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.59.

90 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.59.

38

Tal proibição demonstra que o adultério se caracteriza, para os

muçulmanos, como uma autêntica lesão ao patrimônio moral dos indivíduos,

correspondendo a restrição supra indiscutivelmente a uma forma de condenação91.

GAGLIANO92 em sua obra, salienta que:

Vê-se, também, que há preceitos, no Alcorão, explicitamente inspirados no Código de Hamurabi, como, por exemplo, o versículo 127 do capítulo XVI, que reza: “Se vos vingardes, que a vossa vingança não ultrapasse a afronta recebida. Porém, aqueles que sofrerem com paciência farão uma ação mais meritória”.

No livro sagrado dos cristãos, mais precisamente em seu

Antigo Testamento, encontramos algumas passagens que tratam, sem sombra de

dúvida, da reparação de danos morais93.

“Se um homem tomar uma mulher por esposa e, tendo coabitado com ela, vier a desprezá-la, e lhe imputar falsamente coisas escandalosas e contra ela divulgar má fama, dizendo: ‘Tomei esta mulher e, quando me cheguei a ela, não achei nela os sinais de virgindade’, então o pai e a mãe da jovem tomarão os sinais da virgindade da moça, e os levarão aos anciãos da cidade, à porta; e o pai da jovem dirá aos anciãos: “Eu dei minha filha para esposa a este homem, e agora ele a despreza, e eis que lhe atribui coisas escandalosas, dizendo: - Não achei na tua filha os sinais da virgindade; porém eis aqui os sinais da virgindade de minha filha’. E eles estenderão a roupa diante dos anciãos da cidade. Então os anciãos daquela cidade, tomando o homem, o castigarão, e, multando-o em cem mil prata, os darão ao pai da moça, porquanto divulgou má fama sobre uma virgem de Israel. Ela ficará sendo sua mulher, e ele por todos os seus dias não poderá repudiá-la” (Deuteronômio, 22:13-19).

GAGLIANO94 vê que: a honra era amplamente tutelada no Velho Testamento, pois o motivo para a aplicação do castigo corporal, indenização pecuniária e proibição de jamais se divorciar era a divulgação de “má fama sobre uma virgem de Israel”.

Ainda lembra GAGLIANO95 de um outro trecho específico de

reparação pecuniária de dano moral sofrido em Deuteronômio , 22:28-29:

91 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.59.

92 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.59.

93 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.59.

94 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.60.

95 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p.60.

39

“Se um homem encontrar uma moça virgem não desposada e, pegando nela, deitar-se com ela, e forem apanhados, o homem que dela abusou dará ao pai da jovem cinqüenta ciclos de prata, e, porquanto a humilhou, ela ficará sendo sua mulher; não a poderá repudiar por todos os seus dias”.

GAGLIANO96 neste trecho verifica a indenização (nota-se que não se trata tecnicamente de multa, pois reverte ao pai da moça) como forma de reparação do dano moral, aliada a condenação na proibição de divórcio.

Já a civilização grega assumiu um papel importantíssimo na

história do homem e, graças aos seus pensadores, seu sistema jurídico atingiu

pontos bastante elevados, com reflexos, inclusive, na vigente Teoria Geral do

Estado.

GAGLIANO97 observa que:

As leis gregas outorgam ao cidadão e aos seus respectivos bens a necessária proteção jurídica, além de fixarem que a reparação dos danos a eles causados assumiria sempre um caráter pecuniário, afastando a vingança física e pessoal como forma de satisfação ao lesado.

Já o próprio Homero, na Odisséia (rapsódia oitava, versos de 266 a 367), refere-se a uma assembléia de deuses pagãos, pela qual se decidia sobre a reparação de dano moral, decorrente de adultério. Hefesto, o marido traído, surpreendeu, em flagrante, no seu próprio leito, a infiel Afrodite, com o formoso Ares. Tendo o ferreiro Hefesto reclamado aos deuses uma providência, estes condenaram Ares a pagar pesada multa, informação esta que, mesmo mitológica, já demonstra o hábito da compensação econômica pelos danos extrapatrimoniais98.

Sem qualquer dúvida GAGLIANO99 relata que “a influência cultural dessa civilização foi marcante, na medida em que propiciaram o surgimento de legislações de grande conteúdo político-filosófico, como aconteceu na antiga Roma”.

Entretanto GAGLIANO100 exalta que:

96 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 60.

97 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 61.

98 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 61.

99 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 61.

100 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 61.

40

No Direito Romano superada a época da vingança privada, a noção de reparação pecuniária de danos era algo extremamente presente entre os romanos, pelo que todo ato considerado lesivo ao patrimônio ou à honra de alguém deveria implicar uma conseqüente reparação.

Os cidadãos romanos, que eventualmente fossem vítima de

injúria, poderiam valer-se da ação pretoriana a que se denominava injuriarum

aestimatoria. Nesta, reclamavam uma reparação do dano através de uma soma em

dinheiro, prudentemente arbitrada pelo Juiz, que analisaria, cautelosamente, todas

as circunstâncias do caso101.

Para GAGLIANO102 o objetivo desta ação era reparar e

proteger os interesses do vitimado, o que pode ser verificado da leitura dos

seguintes trechos da Tábua VII (De delictis) da Lei das XII Tábuas:

“§ 1.º Se um quadrúpede causa dano, que o seu proprietário indenize o valor desses danos ou abandone o animal ao prejudicado”.

§ 2.º Se alguém causa um dano premeditamente que o repare”.

§ 5.º Se o autor do dano é impúbere, que seja fustigado a critério do pretor e indenize o prejuízo em dobro”.

§ 8.º Mas, se assim agiu por imprudência, que repare o dano; se não tem recursos para isso, que seja punido menos severamente do que se tivesse intencionalmente”.

§ 9.º Aquele que causar dano leve indenizará 25 asses”.

§ 12.º Aquele que arrancar ou quebrar um osso a outrem deve ser condenado a uma multa de 300 asses, se o ofendido é homem livre; e de 150 asses, se o ofendido é um escravo”.

§ 13.º Se o tutor administra com dolo, que seja destituído como suspeito e com infâmia; se causou algum prejuízo ao tutelado, que seja condenado a pagar em dobro ao fim da gestão”.

A melhor interpretação dos §§ 2.º e 9.º supratranscritos é a que

reconhece a possibilidade, ainda primária, de reparação dos danos morais pelos

101 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 62.

102 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 62.

41

romanos, eis que estes questionavam a que título o dano era intentado, mas

somente se este efetivamente ocorreu, o que geraria automaticamente a

obrigatoriedade de reparar103.

Entretanto no Direito Canônico podemos encontrar diversas

passagens em que se constatam regras típicas de tutela da honra.

GAGLIANO104 refere-se que: (...) havia preocupação específica de se determinar reparação pelos danos morais e materiais, consignando dispositivos que as legislações seculares, sob a influência constante da Igreja Católica, acabaram adotando.

Previa-se também a possibilidade de lesões decorrentes da

calúnia e da injúria, em que se determinava a reparação de forma dúplice, com

sanções de ordem material e moral no Direito Canônico105.

Para GAGLIANO106: o Código da Igreja determinava, inclusive, a aplicação de sanções, tanto para religiosos quanto para leigos, podendo ser destacada, como exemplo de pena canônica, a “infâmia” (perda ou diminuição da boa reputação, por causa do mau comportamento ou prática de um delito).

Com o advento do primeiro Código Civil brasileiro (Lei n. 3.071,

de 1.º de janeiro de 1916, com vigor a partir de 1.º de janeiro de 1917), a redação

dos arts. 76 (e parágrafo único), 79 e 159 levou às primeiras defesas da tese da

reparabilidade do dano moral107.

Art. 76. Para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico, ou moral.

Parágrafo único. O interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao autor, ou à sua família.

(...)

Art. 79. Se a coisa parecer por fato alheio à vontade do dono, terá este ação, pelos prejuízos contra o culpado.

103 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 62.

104 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 63.

105 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 63.

106 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 63.

107 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 64.

42

(...)

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

Neste sentido BEVILÁQUA108, autor do projeto de Código Civil

de 1916, prelecionava:

“Em meu sentir, o sistema do Código Civil, nas suas linhas gerais, relativamente ao ponto questionado, é o seguinte: a) todo damno seja patrimonial ou não, deve ser ressarcido, por quem o causou, salvante a excusa de força maior que, aliás, algumas vezes não aproveita, por vir precedida de culpa. É regra geral sujeita a excepção; b) com razão mais forte, deve ser reparado o damno proveniente de ato ilícito (artigos 159 e 1.518); c) para a reparação do dano moral, aquele que se sente lesado dispõe de acção adequada (artigo 76, parágrafo único); d) mas o dano moral, nem sempre, é ressarcível, não somente por não se poder dar-lhe valor econômico, por não se poder apreçá-lo em dinheiro, como ainda, porque essa insuficiência dos nossos recursos abre a porta a especulações deshonestas, acobertadas pelo manto (...) de sentimentos afectivos. Por isso o Código Civil afastou as considerações de ordem exclusivamente moral, nos casos de morte e de lesões corpóreas não deformantes (artigos 1.537 e 1.538); e) Attendeu, porém, a essas considerações, no caso de ferimentos, que produzem aleijões ou deformidades (artigo 1538, parágrafo 1.º e 2.º); tomou em consideração o valor da affeição, providenciando, entretanto, para impedir o arbítrio, o desvirtuamento (artigo 1.543); as offensas à honra, à dignidade e à liberdade são outras tantas formas de damno moral, cuja indemnização o Código disciplina; f) além dos casos especialmente capitulados no Código Civil, como de damno moral ressarcível outros existem que elle remette para o arbitramento, no artigo 1.553, que se refere, irrecusavelmente, a qualquer modalidade de damno, seja patrimonial ou meramente pessoal. (...). Ao contrário, a irreparabilidade do damno moral apparece no Código como excepão, imposta por considerações de ordem ethica e mental. A reparação é a regra para o Damno, seja moral, seja material. A irreparabilidade é excepção”.

Somente, de fato, com a promulgação da vigente Constituição

Federal, em 5 de outubro de 1988, é que se pode falar, indubitavelmente, da ampla

reparabilidade do dano moral no direito pátrio, pois a matéria foi elevada ao status

dos “Direitos e Garantias Fundamentais”109 (Título II da CF/88).

108 BEVILÁQUA, Clóvis in GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 64 e 65. 109 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 66.

43

Sobre a questão acima, ensina PEREIRA110 que a:

“Constituição Federal de 1988 veio pôr uma pá e cal na resistência à reparação do dano moral. (...) Destarte, o argumento baseado na ausência de um princípio geral desaparece. E assim, a reparação do dano moral integra-se definitivamente em nosso direito positivo. (...) É de se acrescer que a enumeração é meramente exemplificativa, sendo lícito à jurisprudência e à lei ordinária aditar outros casos. (...) Com as duas disposições contidas na Constituição de 1988 o princípio da reparação do dano moral encontrou o batismo que a inseriu em a canonicidade de nosso direito positivo. Agora, pela palavra mais firme e mais alta da norma constitucional, tornou-se princípio de natureza cogente o que estabelece a reparação por dano moral em nosso direito. Obrigatório para o legislador e para o juiz”.

O novo Código Civil brasileiro (Lei n. 10.406, de 10-1-2002),

adequando, de forma expressa, a legislação civil ao novo perfil constitucional,

reconhece expressamente, em seu art. 186, o instituto do dano moral e,

conseqüentemente, por força do art. 927, a sua reparabilidade, supra citados111.

2.2 CONCEITO DE DANO MORAL

O dano moral é um instituto importantíssimo na esfera dos

direitos da personalidade, estando no mesmo patamar da teoria geral da

responsabilidade civil, estudada anteriormente.

Inicialmente, GAGLIANO112 constitui o dano moral:

O dano moral consiste na lesão de direito cujo conteúdo não é pecuniário, nem comercialmente redutível a dinheiro. Em outras palavras, podemos afirmar que o dano moral é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa (seus direitos da personalidade), violando, por exemplo, sua intimidade, vida privada, honra e imagem, bens jurídicos tutelados constitucionalmente.

Voltado à reparação da ofensa causada, deve-se o dano moral

estar interligado aos direitos de personalidade, onde a ofensa injustificada gerada

pelo agente agressor acarretará direito a reparação, e sendo ofensa justificável,

110 PEREIRA, Caio Mário da Silva in GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 66.

111 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 66.

112 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 67.

44

deverá o lesionado comprovar o que ocasionou referido o dano moral, bem como

quantificá-lo para análise de seu cabimento.

Como o dano moral se classifica como direito subjetivo, deve

ele, ser analisado em cada caso, individualmente, pesquisando-se o ofendido, e qual

a mensuração que o fato repercutiu na vida da pessoa lesada.

Assim, DINIZ113 define ad rem o dano moral:

Qualquer lesão que alguém sofra no objeto de seu direito, repercutirá, necessariamente, em seu interesse; por isso, quando se distingue o dano patrimonial do moral, o critério de distinção não poderá ater-se à natureza ou índole do direito subjetivo atingido, mas ao interesse, que é pressuposto desse direito, ou ao efeito da lesão jurídica, isto é, o caráter e sua repercussão sobre o lesado, pois, somente desse modo se poderia falar em dano moral, oriundo de uma ofensa a um bem material, ou em dano patrimonial indireto, que decorre de evento que lesa direito extrapatrimonial, como, p. ex., direito à vida, à saúde, provocando também um prejuízo patrimonial, como incapacidade para o trabalho, despesas com o tratamento.

O dano é essencial a existência da violação do direito, porém,

para subsistir, há de ofender objetivamente um direito tutelado. Não é propriamente

o bem envolvido ou sua natureza patrimonial ou extrapatrimonial que identifica o

dano moral. A identificação de sua existência far-se-á diretamente pela natureza da

repercussão do bem afetado, ou seja, pelos efeitos do prejuízo causado.

O dano moral ensina ZANNONI114:

(...) não é a dor, a angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois estes estados de espírito constituem o conteúdo, ou melhor, a conseqüência do dano. A dor que experimentam os pais pela morte violenta do filho, o padecimento ou complexo de quem suporta um dano estético, a humilhação de quem foi publicamente injuriado são estados de espírito contingentes e variáveis em cada caso, pois cada pessoa sente ao seu modo.

E prossegue nesse mesmo sentido ZANNONI115:

113 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p. 91.

114ZANNONI, Eduardo A. in DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: Responsabilidade Civil. p. 92.

115 ZANNONI, Eduardo A. in DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro:

45

O direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição, mas aqueles que forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vítima teria interesse reconhecido juridicamente. P. ex.: se vemos alguém atropelar outrem, não estamos legitimados para reclamar indenização, mesmo quando este fato nos provoque grande dor. Mas, se houver relação de parentesco próximo entre nós e a vítima, seremos lesados indiretos. Logo, os lesados indiretos e a vítima poderão reclamar a reparação pecuniária em razão de dano moral, embora não peçam um preço para a dor que sentem ou sentiram, mas, tão-somente, que se lhes outorgue um meio de atenuar, em parte, as conseqüências da lesão jurídica por eles sofrida.

Inicialmente, cumpre-se salientar que o direito à indenização,

causado em decorrência do dano moral não se constitui como substituto da

reparação dos sentimentos, seu escopo é, somente, amenizar os impactos

decorrentes das privações sofridas pela pessoa lesada.

2.3 CLASSIFICAÇÃO DO DANO MORAL

Necessário se faz distinguir os tipos de dano moral existentes

no ordenamento jurídico brasileiro, oriundos do requisito de “causalidade entre dano

e o fato”, indispensável à composição do dano passível de indenização,

classificando-os em suas espécies: a) dano moral direto e b) dano moral indireto,

que assim faz-se apresentar116.

2.3.1 Dano moral direto

Específico dano ocorre quando coexiste agressão direta aos

direitos da pessoa humana.

Encontra-se embasamento em GAGLIANO117, que assim

profere sentido ao dano moral sendo “(...) uma lesão específica de um direito

extrapatrimonial, como os direitos da personalidade”.

Distingue DINIZ118 a sutil diferença entre as classificações de

dano:

Responsabilidade Civil. p. 92.

116 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. p. 67. 117 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. Responsabilidade Civil. p. 67.

46

O dano moral direto consiste na lesão a um interesse que visa a satisfação ou o gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade (como a vida, a integridade corporal e psíquica, a liberdade, a honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem) ou nos atributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família). Abrange, ainda, a lesão à dignidade da pessoa humana (CF/88, art. 1º, III).

Acima citado por DINIZ119, o art. 1º, inciso III da Constituição da

República Federativa do Brasil – CF/88, assim garante:

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III- a dignidade da pessoa humana;

Neste sentido o dano direto tem-se uma violação a um direito

da personalidade de um sujeito, em função de um dano material por ele mesmo

sofrido.

2.3.2 Dano moral indireto

Localiza-se em outra percepção o dano moral indireto, que se

conceitua nas palavras de ZANNONI120 que o:

O dano moral indireto consiste na lesão a um interesse tendente à satisfação ou gozo de bens jurídicos patrimoniais, que produz um menoscabo a um bem extrapatrimonial, ou melhor, é aquele que provoca prejuízo a qualquer interesse não patrimonial, devido a uma lesão a um bem patrimonial da vítima. Deriva, portanto, do fato lesivo a um interesse patrimonial. Ex: perda de coisa com valor afetivo, ou seja, de um anel de noivado.

Assim também preleciona GAGLIANO121:

118 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. p. 93. 119 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. responsabilidade civil. p. 93. 120 ZANNONI, Eduardo A. in DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. p. 94. 121 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. Responsabilidade civil. p. 67.

47

(...) quando há uma lesão específica a um bem ou interesse jurídico de natureza patrimonial, mas que, de modo reflexo, produz um prejuízo na esfera extrapatrimonial, como é o caso, por exemplo, do furto de um bem com valor afetivo ou, no âmbito do direito do trabalho, o rebaixamento funcional ilícito do empregado, que, além do prejuízo financeiro, traz efeitos morais lesivos ao trabalhador.

O dano moral indireto atinge um bem jurídico patrimonial,

sendo ele decorrente de um bem valorativo e seu afeto para com ele, ou mesmo, um

bem não valorativo, mas que incorre no aspecto econômico, e gera conseqüência

danosa sentimental à vítima.

Entretanto para GABURRI122 exemplifica o dano moral indireto

como:

(...) o furto de coisa que representa ao seu titular algum valor de afeição, fazendo-lhe amargar disabores sentimentais, como, por exemplo, se a vítima emprestar a outrem jóia que vem sendo passada aos membros de sua família, de geração em geração, vindo o comodatário a perdê-la. Aqui haverá, além da perda material, danos morais indiretos, pelo valor de afeição que a jóia representava.

Tem-se, assim que, aquele que atinge a pessoa de forma

reflexa, como no caso de morte de uma pessoa da família. Em casos tais, terão

legitimidade para promover a ação indenizatória os lesados indiretos.

2.4 AÇÃO OU OMISSÃO DO AGENTE CAUSADOR DO DANO MORAL

Tem-se que a conduta é a ação ou omissão do agente que

agride um bem jurídico de outrem, sendo que no caso de dano moral, SANTOS123

expõe que é:

(...) ato que cause dor, angústia, aflição física ou espiritual ou qualquer padecimento infligido à vítima em razão de algum evento danoso. É o menoscabo a qualquer direito inerente à pessoa, como a

122 GABURRI, Fernando in ARAÚJO, Vaneska Donato de. Responsabilidade Civil. p. 95.

123 SANTOS, Antônio Jeová. Dano Moral Indenizável. 3ª. edição. Editora Método. 2001 . p. 116.

48

vida, a integridade física, a liberdade, a honra, a vida privada e a vida de relação.

Entretanto para SANTOS124:

A conduta humana exigida em sede de responsabilidade civil pode se referir tanto à prática de algum ato no sentido de atender ao valor jurídico protegido, quanto à abstenção de algum ato que contrarie a referida proteção. (...) Portanto, tanto a conduta comissiva quanto a omissiva integram o conceito legal de ato ilícito, gerador de responsabilidade civil.

Conforme CARVALHO NETO125:

A conduta do agente causador do dano impõe-lhe o dever de reparar não apenas quando ocorre infringência a um dever legal (ato praticado contra direto), mas também quando seu ato, embora sem infringir a lei, foge da finalidade social a que ela se destina.

Comenta ainda CARVALHO NETO126

Mas a obrigação de o agente reparar o dano pode ser ocasionada também por ato de terceiro que esteja sob a sua responsabilidade, bem como por danos causados por coisas que estejam sob a sua guarda. No primeiro caso temos, como exemplo, o pai que responde pelos atos dos filhos menores que estiverem em seu poder ou em sua companhia (art. 1.521, I, do Código Civil). Exemplo do segundo caso se encontra no art. 1.529 do Código Civil:

“Art. 1.529. Aquele que habitar uma casa, ou parte dela, responde pelo dano proveniente das coisas que dela caírem ou forem lançadas em lugar indevido”.

Em virtude de ação ou omissão de outrem, necessitará de uma

compensação pecuniária, não para devolver aquilo que foi perdido, pois a dor não

tem preço, mas para tentar amenizar a lesão sofrida, diminuir o desgosto causado, e

também impedir ou diminuir o aparecimento de possíveis situações semelhantes no

futuro.

124 SANTOS, Romualdo Baptista dos, Responsabilidade Civil. p. 34.

125 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 48.

126 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 48.

49

2.5 DOLO OU CULPA DO AGENTE CAUSADOR DO DANO MORAL

Pelo já citado art. 159 do Código Civil, todo aquele que, por

ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar

prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. Fica, assim, instituída a regra

geral de que a obrigação de reparar depende de dolo ou culpa do agente, ou seja,

de culpa em sentido amplo, abrangendo uma e outra hipótese127.

PEREIRA128 cita que:

(...) pontifica que o Código Civil tem em vista o descumprimento “objetivamente considerado, a transgressão do dever, para estabelecer que o agente responde pelas conseqüências sem indagar se o resultado danoso entrou nas cogitações do infrator ou se a violação foi especialmente querida”. Aduz, todavia, que essa circunstância não significa que o Direito pátrio desconheça a diferença entre dolo e culpa. Ressalta o civilista que, “em certas circunstâncias, distingue-se entre o inadimplemento doloso e o culposo, para definir a responsabilidade em casos especiais”.

2.5.1 Definição de dolo

O dolo pode ocorrer em decorrência de apenas um ato ou uma

série de, que caracterizaria uma conduta ilícita.

Salienta-se GOMES129 que:

Há dolo quando o agente tem consciência tanto da conduta que realiza quanto do resultado que seu comportamento pode provocar. O dolo, em suma, é a consciência aliada à vontade d realizar a conduta para que determinada conseqüência se concretize.

O sujeito tem consciência da ação que desenvolve, figura-a mentalmente e quer o resultado par ao qual ela será ordenada. Primeiro antevê todo o quadro, desenha em sua mente a ação e o resultado possível. Em seguida, age para lográ-lo. Quer realizar a ambos, isto é, a ação e o resultado. Nesse querer, consiste à vontade, compreendida como energia psíquica impulsionadora da ação130.

127 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 49. 128 PEREIRA, Caio Mário da Silva in GOMES, José Jairo. Direito Civil. p. 504. 129 GOMES, José Jairo. Direito Civil. p. 505. 130 GOMES, José Jairo. Direito Civil. p. 505.

50

Para VENOSA131 acrescenta, que o dolo induz o declarante a

erro, mas erro provocado pela conduta do declarante. O erro participa do conceito

de dolo, mas é por ele absorvido.

BEVILAQUA132 assim definiu dolo: “Dolo é artifício ou

expediente astucioso, empregado para induzir alguém à prática de um ato jurídico,

que o prejudica, aproveitando ao autor do dolo ou a terceiro”.

Ainda VENOSA133 assevera que:

(...) a existência do dolo tem em vista o proveito ao declarante ou a terceiro. Não integra a noção de dolo o prejuízo que possa ter o declarante, muito embora, geralmente ele exista, daí por que a ação de anulação do ato jurídico, via de regra, é acompanhada do pedido de indenização de perdas e danos. A prática do dolo é ato ilícito, nos termos do art. 186 do Código Civil.

Dolo é o meio malicioso tendente a viciar a vontade do agente,

a fim de desviar a sua vontade, ou querer.

2.5.2 Definição de culpa

É a falta cometida contra um dever, por ação ou omissão, pela

inobservância de diligência que deveria ser observada quando da prática de um ato,

a que se esta obrigada.

Para VENOSA134, culpa é a inobservância de um dever que o

agente devia conhecer e observar. Não podemos afastar a noção de culpa do

conceito de dever.

Após DIAS135 comentar a dificuldade de conceituá-la, não

consegue fugir de definição prolixa:

131 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 421. 132 BEVILÁQUA, Clóvis.Teoria geral do direito civil. 2. ed. (Edição histórica). Rio de Janeiro: Editora

Rio, 1980. p. 219. 133 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p.422. 134 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 26. 135 DIAS, José de Aguiar in VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 26.

51

“A culpa é falta de diligência na observância da norma de conduta, isto é, o desprezo, por parte do agente, do esforço necessário para observá-la, com resultado não objetivando, mas previsível, desde que o agente se detivesse na consideração das conseqüências eventuais de sua atitude.”

Conclui STOCO136 que:

“a culpa, genericamente entendida, é, pois, fundo animador do ato ilícito, da injúria, ofensa ou má conduta imputável. Nessa figura encontram-se dois elementos: o objetivo, expressado na iliciedade, e o subjetivo, do mau procedimento imputável”.

Já PAGE137, afirma:

“É um elemento concreto, e não abstrato; real, contingente, e não jurídico. A culpa é, muito simplesmente, um erro de conduta; é o ato ou o fato que não teria praticado uma pessoa prudente, avisada, cuidadosa em observar as eventualidades infelizes que podem resultar para outrem”.

No entendimento o ordenamento jurídico vigora a regra geral

de que o dever ressarcitório pela prática de atos ilícitos decorre da culpa, ou seja, da

reprovabilidade ou censurabilidade da conduta do agente.

Acrescenta DINIZ138 que:

O comportamento do agente será reprovado ou censurado quando, ante circunstância concretas do caso, s entende que ele poderia ou deveria ter agido de modo diferente. Portanto, o ato ilícito qualifica-se pela culpa. Não havendo culpa, não haverá, em regra, qualquer responsabilidade. (...). Estabelece esse diploma legal ilícito como fonte da obrigação de indenizar danos causados à vítima.

Desta forma o art. 159 do Código de 1916 e o art. 186 do

Código em vigor elegeram a culpa como o centro da responsabilidade subjetiva que

norteia a responsabilidade civil no direito brasileiro, com a nova perspectiva já

enfatizada, descrita no art. 927, parágrafo único, supracitados139.

136 STOCO, Rui in VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. p. 26. 137 PAGE, Henri in CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no Direito de Família. p.

50. 138 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p. 44 e 45. 139 VENOSA, Silvio de Salvo, Direito Civil. p. 27.

52

2.6 RELAÇÃO DE CAUSALIDADE

A relação de causalidade é o liame entre o ato lesivo do agente

e o dano ou prejuízo sofrido pela vítima. Se o dano sofrido não for ocasionado por

ato do agente, inexiste a relação de causalidade.

VENOSA140 ao definir nexo de causalidade como ensina que: “O conceito de nexo causal, nexo etimológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida”.

A extensão do valor encontra sua medida na relação causal.

Precisar a relação de causalidade implica fixar o alcance da obrigação e como

conseqüência a reparação exata, visando à restituição integral do estado anterior à

lesão141.

A relação de causalidade se põe entre a ação ou omissão do

agente e o resultado (dano). Ou seja, para que este seja imputado ao agente, é

necessário que seja decorrente de sua ação ou omissão. (...) a propósito, é a

expressão de DEMOGUE142:

“Não pode mesmo haver uma relação necessária entre o fato incriminado e o dano. É preciso que esteja certo que, sem este fato, o dano não teria ocorrido. Logo, não basta que uma pessoa tenha transgredido certas regras, é preciso que sem esta contravenção o dano não teria ocorrido”.

Sobre o assunto, dispõe VALSSILIEFF143:

Constata-se que o nexo causal ocorre pelo agir, atitude comissiva, e que também pode ocorrer pelo não agir, pela omissão. Quanto ao

140 VENOSA, Silvio de Salvo, Direito Civil. p. 39. 141 PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. ed. 4º. São

Paulo. 2007. p. 90. 142 DEMOGUE, René in CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no Direito de

Família. p. 60. 143 VALSSILIEFF, Silvia. A Responsabilidade Civil do Advogado. Editora Del Rey Ltda. Belo

Horizonte. 2006. p. 72.

53

nexo causal pela omissão, é importante esclarecer-se que este apenas se verifica a pessoa que poderia impedir o dano e que, cumulativamente, era incumbida, pela lei ou pelo contrato, de agir não o fez.

DIAS144 acentua que: “causalidade é o que se exige e não

mera coincidência entre o dano e o procedimento do imputado responsável”.

No que trata o assunto RONCONI145 destaca que:

Em relação de causalidade entre o mal efetivamente causado e a injuridicidade da ação ou omissão necessita ser estabelecida. Isso porque se deve ter certeza que, sem o fato, não teria ocorrido o dano, não bastando que alguém tenha contravindo certas regras, mas que, sem a contravenção, não teria ocorrido o dano.

Segundo CASO146:

A causalidade consiste em um tema pertencente à filosofia e às ciências, aplicando-se com características próprias para dar soluções práticas, de modo que o estudo da causalidade jurídica é próprio das ciências culturais, tendo como fator imprescindível a atuação da conduta humana. Para o mesmo autor a relação tem como objetivo indicar se o sujeito demandado é, ou não, o autor do fato, estabelecendo a extensão da indenização conforma as conseqüências atribuíveis ao autor do dano.

Ainda argumenta RONCONI147:

A relação de causalidade implica uma objetiva imputação fática do resultado, enquanto que a culpabilidade possui um sentido subjetivo, um julgamento do tipo moral, ou seja, apontando a consciência da pessoa (agente do comportamento). Também, deve ser analisada a relação de causalidade sempre com anterioridade à culpabilidade, pois antecede uma etapa posterior que deve julgar se houve, ou não, a culpabilidade.

Assim, CARVALHO NETO148 exemplifica:

144 DIAS, Aguiar in VALSSILIEFF, Silvia. A Responsabilidade Civil do Advogado. p. 72. 145 RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária

em Garantia. Florianópolis. Editora OAB/SC. 2006. p. 237. 146 CASO, Compagnucci de in RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos

de Alienação Fiduciária em Garantia. p. 237. 147 RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária

em Garantia. p. 237 e 238. 148 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 60.

54

(...) se um motorista dirige imprudentemente e uma pessoa é atropelada, está aí demonstrada a ação do agente, sua culpa e o resultado danoso. Mas isto não basta. É necessário que este resultado tenha sido causado por aquela ação do agente. É óbvio que, se a vítima foi atropelada por outro veículo que não o daquele motorista impudente, sem qualquer participação sua, direta ou indireta, não há nexo de causalidade entre aquela ação e o resultado, pelo que tal motorista não poderá ser obrigado a reparar o dano.

Na expressão de KFOURI NETO149, o “laço causal deve ser

demonstrado às claras, atando as duas pontas que conduzem a responsabilidade”.

2.7 NÃO CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL

As chamadas excludentes de responsabilidade atuam sobre o

nexo causal, tornando o agente não responsável pelo ato danoso.

A rigor, não é correto falar-se em excludentes de

responsabilidade, já que não há sequer responsabilidade a ser excluída. Como

afirma SERRANO JÚNIOR150:

“(...) na presença de tais situações, não é que se exima o agente de responsabilidade. Não. Ao contrário, sua responsabilidade não se configura por não ter contribuído, de forma alguma para o eventus damni. O dano não lhe pode ser atribuído nem a uma ação ou omissão sua ou de seu agente, nem como decorrência da atividade de risco por ele desenvolvida”.

Assim, resta analisar hipóteses em que não haverá a

necessária obrigação de indenizar ainda que sobreviva o dano, e diante das quais o

agente não poderá ser compelido a reparar o dano.

São causa de excludente de Responsabilidade Civil,

classificadas pelos autores como excludentes de nexo causal, pode-se indicar a

culpa da vítima, o fato de terceiro, o caso fortuito ou força maior e a cláusula de não

indenizar, e as propostas como excludentes de ilicitude ou antijuricidade, a legítima

149 KFOURI NETO. Miguel in CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de

Família. p. 60. 150 SERRANO JÚNIOR, Odoné in CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito

de Família. p. 64.

55

defesa, o estado de necessidade, exercício regular de direito e o estrito cumprimento

de um dever legal, que a seguir passa-se a explanar cada uma delas151.

2.7.1 Culpa da vítima

A culpa da vítima verifica-se quando ela contribui para

ocorrência do evento que causou o dano. Tal contribuição pode se verificar de modo

concorrente, quando se dá juntamente com a do agente, caso em que a

responsabilidade não será eximida, mas atenuada, previsto no artigo 945 do Código

Civil de 2002152:

Art. 945. Se a vítima concorrido culposamente par ao evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

(...) ou exclusivo, não prevista na legislação brasileira, mas

solidificada pela doutrina e jurisprudência, tal como aponta VENOSA153:

[...] a culpa exclusiva da vítima elide o dever de indenizar, porque impede o nexo causal. A hipótese não consta expressamente do Código Civil de 1916, mas doutrina e jurisprudência, em consonância com a legislação extravagante, consolidaram essa excludente.

Destarte CARVALHO NETO 154que:

(...) a culpa exclusiva da vitima atua sobre o nexo de causalidade, e não sobre a culpa do agente. Isto é importante, já que, se afirmasse a exclusão da culpa do agente, continuaria ele na obrigação de indenizar quanto tal obrigação não dependesse de culpa (responsabilidade objetiva), o que implicaria a adoção da teoria do risco integral.

GAGLIANO155 afirma que “a exclusiva atuação da vítima tem

também o condão de quebrar o nexo de causalidade eximindo o agente da

responsabilidade civil”.

151 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 64. 152 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p. 58. 153 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil:responsabilidade civil. p. 58. 154 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 70. 155 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil. responsabilidade civi. p. 114.

56

E exemplifica:

(...) sujeito que, guiando seu veículo segundo as regras de trânsito, depara-se com alguém que, visando suicidar-se, arremessa-se sob suas rodas. Nesse caso, o evento fatídico, obviamente, não poderá ser atribuído ao motorista, mas sim, tão somente ao suicida.

Assim, ocorrendo dano onde a culpa é concorrente entre o

agente e a vítima, não desaparece o liame causal, havendo apenas uma atenuação

da responsabilidade, subsistindo a obrigação de indenizar, devendo ser

demonstrada a intensidade de culpa de cada um para que se possa determinar a

quota de responsabilidade e, conseqüentemente, o montante indenizatório de cada

uma das partes, conforme coloca DINIZ156 “haverá uma bipartição dos prejuízos, e a

vítima, sob uma forma negativa, deixará de receber a indenização na parte relativa à

sua responsabilidade.

2.7.2 Fato de terceiro

O fato de terceiro é também causa de não configuração da

responsabilidade. Havendo culpa exclusiva de terceiro, só este responde pelo dano

da vítima157.

Um exemplo clássico e de uma fácil compreensão dessa

excludente é o engavetamento em acidentes com veículos.

Para DINIZ158 é:

(...), de qualquer pessoa além da vítima ou do agente, de modo que, se alguém for demandado para indenizar um prejuízo que lhe foi imputado pelo autor, poderá pedir a exclusão de sua responsabilidade se a ação que provocou o dano foi devida exclusivamente a terceiro. É o que ocorrerá, p. ex., se o abalroamento, que causou dano ao autor, foi causado por um veículo dirigido por terceiro; se pedestre é atropelado pelo motorista de táxi em razão de caminhão desgovernado, que lança o automóvel sobre o transeunte. Assim sendo, se a ação de terceiro causou o dano, esse terceiro será o único responsável pela composição do prejuízo.

156 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro. p. 115. 157 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 75. 158 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro. p.114 e 115.

57

Segundo RONCONI159, fato de terceiro também é conhecido

como:

(...) “culpa exclusiva de terceiro”, significa a “(...) violação do dever jurídico de terceiro que proporciona dano à vítima, durante o exercício da atividade perigosa, pelo agente ou seu subordinado”. Assim, não haverá Responsabilidade Civil por parte do explorador da atividade perigosa, pois a violação foi realizada por pessoa desvinculada do causador do prejuízo.

Entende DIAS160 que:

(...) terceiro é qualquer pessoa além da vítima e do responsável. Ressalvam-se as pessoas por quem o agente responde, tanto no regime delitual (filhos, tutelados, prepostos, aprendizes etc.) como no campo contratual (encarregados da execução do contrato em geral), porque essas não são terceiros, no sentido de estranhos à relação que aqui nos interessa”.

Neste sentido VENOSA161 observa que: A propensão dos

julgados é não admitir a responsabilidade de terceiro como excludente. O assunto

vem regulado de forma indireta pelos artigos 929 e 930 do Código Civil.

Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.

Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.

(...) estabelecendo este último dispositivo à ação regressiva contra o terceiro que criou a situação de perigo, para haver a importância despendida no ressarcimento ao dono do bem. Esses artigos não se referem expressamente a culpa exclusiva de terceiro, mas, indiretamente, admitem a possibilidade de reconhecimento da culpa e responsabilidade de terceiro.162

159 RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária

em Garantia. p. 280 e 281. 160 DIAS, José de Aguiar in RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de

Alienação Fiduciária em Garantia. p. 281. 161 VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil:responsabilidade civil . p. 70. 162 VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil:responsabilidade civil . p. 70.

58

Nota-se que, a princípio, desde que haja a atuação causal de

um terceiro, sem que se possa imputar participação do autor do dano, o elo de

causalidade restaria rompido.

2.7.3 Caso fortuito e força maior

O caso fortuito e a força maior também são causas de não

configuração de responsabilidade.

Esclarece DINIZ163 que: “o caso fortuito e a força maior se

caracterizam pela presença de dois requisitos: o objetivo, que se configura pela

inevitabilidade do evento, e o subjetivo que é a ausência de culpa na produção do

acontecimento.”

No entendimento de CARVALHO NETO164 são requisitos para

a configuração do caso fortuito e da força maior: a) que o acontecimento seja

natural; b) que seja imprevisível; c) que seja inevitável; d) que seja irresistível; e) que

não haja culpa do agente.

Destarte para RONCONI165 que: Caso fortuito consiste em “(...)

todo evento imprevisível e, por vezes, inevitável, que prejudica os interesses

patrimoniais ou morais da vítima.”, tratando-se de ato relacionado com a intervenção

humana.

Contrariamente entende AZEVEDO166 que: caso fortuito “(...) é

o acontecimento provindo da natureza, sem qualquer intervenção da vontade

humana, (...)”, exonerando o devedor da responsabilidade de indenizar.

Para RONCONI167 a força maior: “(...) é todo evento inevitável e, por vezes, imprevisível, que prejudica os interesses patrimoniais ou

163 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro. p. 116. 164 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 75. 165 RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária

em Garantia. p. 281. 166 AZEVEDO, Álvaro Villaça in RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos

de Alienação Fiduciária em Garantia. p. 281 e 282. 167 RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária

em Garantia. p. 282.

59

morais da vítima.”, tratando-se de ato natural que acontece independentemente da intervenção direta do ser humano.

Em entendimento contrário, AZEVEDO168 entende que:

(...) se trata do “(...) fato de terceiro, ou do credor; é a atuação humana, não do devedor, que impossibilita o cumprimento obrigacional. (...)”, havendo, também, ausência de culpabilidade do devedor, isentando-o do dever de indenizar.

Encontra-se, ainda, na lição de AZEVEDO169 que:

(...) não há distinção entre caso fortuito e força maior, entendendo-se que o uso de ambas as expressões são tidas como sinônimas. É o que se pode depreender também da leitura do artigo 393 e parágrafo único, do Código Civil.:

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

2.7.4 Cláusula de não indenizar

Essa excludente diz respeito precipuamente à esfera

contratual. A cláusula de não indenizar, nas palavras de RODRIGUES170,

(...) vem a ser a estipulação pela qual uma das partes contratantes declara, com a concordância da outra, que não será responsável pelo dano por esta experimentado, resultante da inexecução inadequada de um contrato, dano este que, sem a cláusula deveria ser ressarcido pelo estipulante.

RODRIGUES171 exemplifica uma cláusula de não indenizar:

Ex: se o garagista, com anuência do proprietário do automóvel, proclama que não se responsabiliza pela perda de objetos no

168 AZEVEDO, Álvaro Villaça in RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos

de Alienação Fiduciária em Garantia. p. 282. 169 AZEVEDO, Álvaro Villaça in RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos

de Alienação Fiduciária em Garantia. p. 282. 170 RODRIGES, Silvio in DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro. p. 117. 171 RODRIGES, Silvio in DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro. p. 118.

60

veículo. Essa cláusula de exoneração da responsabilidade só é admitida no âmbito contratual, logo está afastada em matéria delitual.

Assim DINIZ entende que:

(...) se no contrato houver estipulação de que o prejuízo causado a um dos contraentes não deverá ser reparado pelo outro, que a ele deu causa, excluída estará a responsabilidade do agente, não por desaparecer o liame de causa e efeito, mas em razão da própria convenção. Percebe-se que o risco é transferido para a vítima.

VENOSA172 ainda destaca, “que essa cláusula não pode

pretender nulificar a obrigação essencial do contrato, mas apenas elementos de

cumprimento das obrigações em geral, que podem ser entendidas como

acessórias.” Sendo que “a cláusula excludente de responsabilidade não exime o

devedor de cumprir o contrato173.”

2.7.5 Legítima defesa

O artigo 188, inciso I, do Código Civil de 2002, é expresso ao

estabelecer que174:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I – os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido.

O Código Civil não define a legítima defesa; devemos,

portanto, nos socorrer da lei penal. O artigo 25 do Código Penal nos dá a perfeita

compreensão do que se deve ter por legítima defesa175:

Art. 25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

172 VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil: responsabilidade civil . p. 74. 173 VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil: responsabilidade civil . p. 75. 174 BRASIL, Código Civil. Lei 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. 175 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 67.

61

(...) já se inferem os requisitos para a configuração do instituto

excludente: é necessário que o agente use moderadamente dos meios necessários,

e que a agressão seja injusta, atual ou iminente176.

Nas palavras de PEREIRA177 são extremos da legítima defesa:

A iniciativa da agressão por parte de outrem, isto é, que do agente não tenha partido provocação; que a ameaça de dano seja atual ou iminente; que a reação não seja desproporcional à agressão – moderamen inculpatae tutelae”.

Segundo LISBOA178: a legítima defesa consiste na repulsa a

algum mal grave, injusto, atual ou iminente a uma das partes (legítima defesa

própria) ou pessoa diversa das partes (legítima defesa de terceiro), em certa relação

jurídica, ou contra os bens de qualquer uma delas.

Para VENOSA179 (...) Na legítima defesa, há reação do

ofendido, por meio de contra-ataque; o perigo surge de uma agressão injusta.

O conceito de legítima defesa, não estão abrangidos

unicamente os bens materiais, mas também valores da personalidade como a honra

e boa fama.

2.7.6 Estado de necessidade

Segundo GAGLIANO180, “diferentemente do que ocorre na

legitima defesa, o agente não reage a uma situação injusta, mas atua para subtrair

um direito seu ou de outrem de uma situação de perigo concreto.”

176 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 67. 177 PEREIRA, Caio Mário da Silva in CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no

Direito de Família. p. 67. 178 LISBOA, Roberto Senise in RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos

de Alienação Fiduciária em Garantia. p. 277. 179 VENOSA, Silvio in RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de

Alienação Fiduciária em Garantia. p. 278. 180 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil. responsabilidade civil. p.102.

62

O estado de necessidade como excludente da

responsabilidade civil, encontra suporte leal no artigo 188, inciso II do Código Civil

de 2002. Conforme GAGLIANO181:

“(...) consiste na situação de agressão a um direito alheio, de valor jurídico igual ou inferior àquele que se pretende proteger, para remover perigo iminente, quando as circunstâncias do fato não autorizem outra forma de atuação.”

Percebe-se que o parágrafo único do referido artigo de lei prevê que o estado de necessidade “somente será considerado legítimo quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.

Na escusativa fundada no estado de necessidade existe um

ato que seria ordinariamente ilícito. No entanto, a lei o justifica eximindo o agente do

dever de indenizar, tendo em vista a preservação dos bens mediante a remoção de

perigo eminente182.

No dizer de PEREIRA183, “o estado de necessidade é,

ontologicamente, semelhante à legítima defesa”.

Entretanto, destaca GAGLIANO184 “se o terceiro atingido não

for o causador da situação de perigo, poderá exigir indenização do agente que

houver atuado em estado de necessidade, cabendo a este ação regressiva contra o

verdadeiro culpado.

2.7.7 Exercício regular de direito e estrito cumprimento do dever legal

O artigo 188, inciso I do Código Civil de 2002 também faz

referência ao exercício regular de direito reconhecido como causa excludente de

ilicitude. Então de acordo com DINIZ185:

181 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil. responsabilidade civil. p.102. 182 CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no Direito de Família. p. 66. 183 PEREIRA, Caio Mário da Silva in CARVALHO NETO, Inácio de, Responsabilidade Civil no

Direito de Família. p. 65. 184 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, responsabilidade civil. p.103. 185 DINIZ, Maria Helena.Curso de direito civil brasileiro. p. 50.

63

(...) se houver lesão a um direito alheio causado por um ato perpetrado no exercício regular de um direito reconhecido, não haverá imputabilidade, excluindo qualquer responsabilidade pelo prejuízo, por não ser procedimento contrário ao Direito.

Para o entendimento de RONCONI186:

O exercício regular de direito (também chamado “exercício regular de um direito reconhecido”) consiste na excludente segundo a qual a atividade humana é desenvolvida de acordo com o ordenamento jurídico, deixando de ser considerada aquela em que se apresentar excesso desta atividade (abuso de direito).

Portanto este direito deve ser reconhecido pelo ordenamento

jurídico.

Destarte RONCONI187 que:

No entanto, se o titular do referido direito extrapolar os limites do mesmo, atuará com “abuso de direito”, ou seja, usando “(...) de um poder, de uma faculdade, de um direito ou mesmo de uma coisa, além do que razoavelmente o Direito e a sociedade permitem”, tratado este abuso como ato ilícito. Dessa forma, nesta excludente, “(...) o exercício de um direito elimina a ilicitude. Quem exerce um direito não provoca o dano (...)”.

Embora não haja previsão em relação ao estrito cumprimento

do dever legal, pode-se afirmar que o mesmo está contido implicitamente no

dispositivo legal, porque conforme Venosa188 “atua no exercido regular de um direito

reconhecido quem pratica ato no estrito cumprimento de um dever legal.”

Assim finaliza-se o segundo capítulo, o qual tratou dos Danos

Morais, passando-se então para o terceiro e último capítulo que tratará sobre a

Delimitação do Dano Moral.

186 RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária

em Garantia. p. 279. 187 RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária

em Garantia. p. 279. 188 VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil. responsabilidade civil . p. 67.

CAPÍTULO 3

DELIMITAÇÃO DO DANO MORAL

3.1 DO BEM JURÍDICO A SER PROTEGIDO

3.1.1 As definições doutrinárias

Toda lesão pressupõe a existência de um bem. Se

considerarmos que no dano moral há um rompimento de equilíbrio entre o ofensor e

o ofendido, sujeito à reparação é preciso examinar qual foi o bem atingido189.

Para PORTO190: Não se provoca dano a algo sem relevância,

mesmo que seu conceito seja abstrato. Sua identificação é essencial para evitar-se

a generalidade. A precisão técnica está associada ao ressarcimento justo.

A ofensa ao nome comercial é diferente do dano a intimidade. A reparação a um trabalhador que sofreu lesão irrecuperável na face é diferente daquela provocada em alguém que teve seu crédito abalado em virtude de um protesto de título, por exemplo191.

DIAS192 lembra a lição de CARNELUTTI, que define o dano como “lesão de interesse”, e de FICHER que considera o dano em duas acepções, a vulgar, relativa a prejuízo que alguém sofre na alma, no corpo ou nos bens e a jurídica que se relaciona com os prejuízos sofridos pelo sujeito de direitos em conseqüência da violação destes por fato alheio.

Observa BITTAR193 que:

Na reparação por danos morais, realiza-se a proteção da personalidade. A ordem jurídica reconhece às pessoas direitos de

189 PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p. 101. 190 PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p. 101. 191 PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p. 101. 192 DIAS, José de Aguiar in PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da

Personalidade. p. 102. 193 BITTAR, Carlos Alberto in PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da

Personalidade. p. 102.

65

personalidade, destaca, os quais incidem sobre elementos materiais e imateriais, a fim de possibilitar-lhes a individualização e a identificação no meio social, permitindo-lhes o conseqüente alcance das metas visadas. Sustenta que “a preocupação central é a defesa de valores morais da personalidade”.

SILVA194 afirma que: o elemento essencial dos danos morais é

a dor. “Os danos morais compreendem toda sorte de dores: morais e físicas”.

Reconhece que os direitos protegidos decorrem da própria personalidade humana.

THEODORO JUNIOR195 destaca que: “a vida em sociedade

sujeita o indivíduo a conflitos e aborrecimentos com “reflexos psicológicos” que

podem provocar abalos e danos, os quais podem configurar o dever de indenizar”.

Também CHAVES196 sugere que: “o elemento característico

das indenizações é a dor, em sentido amplo, e pode ser proveniente de sofrimentos

físicos ou morais”.

BREBBIA197 sustenta que:

O que caracteriza juridicamente a noção de dano não é a lesão a um bem, mas a transgressão da tutela outorgada pela norma ao sujeito possuidor do bem ofendido. Opõe-se à idéia de dor íntima como fundamento do dano moral. Critica a tese que atribui aos danos morais uma natureza imaterial ou psíquica, entendendo que a repercussão física ou psíquica produzida por um fato ilícito no sujeito passivo do agravo não pode ser tida em conta no Direito para caracterizar uma determinada espécie de prejuízo.

A doutrina jurídica, em geral, concentra a orientação no sentido

de que o bem jurídico protegido na reparação dos danos morais é a personalidade

humana, referindo-se também à dor, ao espírito, à alma, à dignidade humana, à

pessoa.

194 SILVA, Wilson Melo da in PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da

Personalidade. p. 102. 195 THEODORO JUNIOR, Humberto in PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e

da Personalidade. p. 102 e 103. 196 CHAVES, Antônio in PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da

Personalidade. p. 103. 197 BREBBIA, Roberto H. in PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da

Personalidade. p. 103.

66

3.1.2 A pessoa Humana

A pessoa humana é o centro do direito na responsabilidade

civil por danos morais, há que se discriminar as áreas de atuação do homem. (...).

Sua definição sempre esteve associada à idéia de supressão, diminuição,

desvantagem. E a pessoa humana não tem diminuição, no sentido estrito da

palavra, quando se fala em danos morais198.

Para PORTO199, honra, moral, identidade e intimidades são

conceitos abstratos e dependem dos valores específicos consagrados em

determinado grupo social.

Observa PORTO200 que:

Existem danos que afetam a pessoa no plano social, alguns restringem-se à sua individualidade e outros que atingem a parte psíquica. Em todas as hipóteses, a consciência é objeto lesado. Essa é a razão pela qual o bem jurídico protegido na responsabilidade civil por danos morais é sempre a consciência.

PORTO201 ainda destaca que: Mesmo quando é atingida

apenas a imagem no plano social, como num protesto de título, por exemplo, e

conseqüente abalo no crédito da pessoa, é a consciência que sofre as

conseqüências da lesão.

3.1.3 A consciência como bem jurídico

Como bem jurídico protegido, a consciência deve ser

conceituada e delimitada, dentro do que se concebe por ela, de acordo com os

conhecimentos que constituem os paradigmas orientadores da ciência da mente,

estudos com ela relacionados202.

198 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p. 103 e 104. 199 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.104. 200 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.104. 201 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.104. 202 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.104.

67

Destarte PORTO203 que:

Os aspectos transitórios e definitivos, da lesão, por exemplo, são importantes na delimitação do ressarcimento e eles se operam no interior da consciência. Embora não haja uniformidade de conclusões a respeito da relação entre o cérebro e a consciência, no sentido da ligação fisiológica entre um e outro, o fato é que existem constatações que possibilitam o estabelecimento da extensão dos danos.

PORTO204 faz exemplifica e explica sobre a consciência como

bem jurídico:

Uma pessoa que teve toda a perna amputada, por exemplo, pode continuar a sentir dor em seu dedo esquerdo mesmo após a cirurgia. Além de eventual indenização por dano estético, essa dor pode ser avaliada para efeito de estabelecimento da reparação moral. Como há uma suposição de que a consciência se processa no cérebro, sua estrutura física deve ser compreendida por todos aqueles que lidam com o direito. Essa compreensão é o mínimo que se exige para a reparação mais integral possível do dano, apesar da complexidade do tema e da inexistência de conclusões exatas sobre a relação entre cérebro e consciência e mesmo da inexistência de teorias unificadas sobre o funcionamento do cérebro.

PORTO205 ressalta que:

A tradição que tem orientado o direito na responsabilidade civil em geral é ainda a certeza da separação entre corpo e mente, estabelecendo-se que a lesão ao corpo significa dano patrimonial. Essa divisão de orientação cartesiana encontra-se superada na ciência, especialmente com os estudos da neurociência, da biologia e da física subatômica do século XX. Há uma autêntica interação entre corpo, mente e consciência.

Entretanto para PORTO206:

Não há uma definição exata se a dor se processa no cérebro, como componente do corpo, ou na mente, entendida esta como estado de consciência. Sabe-se apenas que as dores são sensações desagradáveis, ou ainda, experienciais desagradáveis, internas, qualitativas e subjetivas. Se ela ocorre no corpo físico, no cérebro, o fato ainda é uma incógnita para a ciência. Afirmar genericamente que a indenização por danos morais repara s dor, sem um mínimo de

203 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.104 e 105. 204 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.105. 205 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.105. 206 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.105 e 106.

68

definição de como ocorre à dor física ou moral na pessoa humana, pode levar ao risco de imprecisão.

Por esse motivo, a responsabilidade civil é examinada em

conjunto com os estudos da consciência, sem perder a objetividade jurídica do

tema207.

3.1.4 A consciência como objeto da responsabilidade civil

Quando o direito trata da responsabilidade civil refere-se à

necessidade de reparação de um dano provocado por culpa ou dolo. Ou ainda a

reparação por responsabilidade objetiva, sem questionamento de culpa208.

Para PORTO209, em todas as hipóteses, está envolvida a lesão de um bem material, os órgãos do próprio corpo, um veículo, a propriedade imóvel ou qualquer outro objeto. A indenização se restringe ao prejuízo calculado com base no valor econômico da perda material.

Contudo, os bens em si não têm direitos morais porque não

são conscientes. Se alguém atropela o meu cavalo, serei indenizado em quantia

equivalente ao seu valor econômico. O mesmo ocorre se que ocorre se alguém

quebra o meu computador210.

Nem meu cavalo, nem meu computador têm consciência.

Portanto, não têm direitos morais. Além de perder algum objeto eu posso ter

determinada sensação de desprazer e é essa sensação que justifica a

indenização211.

PORTO212 sustenta que:

O homem é o único ser consciente, o único que tem sentimentos subjetivos, a percepção ou a sensação de prazer e desprazer, razão pela qual é possuidor de direitos morais. Os direitos morais se

207 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.106. 208 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.106. 209 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.106. 210 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.106. 211 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.106. 212 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.106 e 107.

69

distinguem dos direitos materiais exatamente porque existe algo que chamamos de consciência. Algo que se processa no córtex sensorial do cérebro do homem, o único ser vivo capaz de afirmar que é consciente.

A consciência é de todos os direitos de personalidade, o mais

importante. Ela se confunde com a própria personalidade humana e todos os demais

direitos são dela decorrentes, como o direito à vida, à saúde, à intimidade e ao

próprio corpo213.

3.1.5 Prazer, desprazer e estresse

PORTO214 explica que:

Quando tratamos da indenização por danos morais, temos sempre como objetivo a reparação ou compensação de algo imaterial. O objeto dessa reparação é a consciência humana. E o critério mais objetivo para a identificação do dano deve levar em consideração os conceitos de prazer, desprazer e os efeitos que essas sensações causam ao corpo humano.

Para PORTO215:

Com a evolução dos estudos da neurociência sabemos que substâncias químicas chamadas neurotransmissores e hormônios interagem permanentemente nessas sensações. Os resultados dessa interação podem ser satisfatórios ou danos ao corpo, com conseqüências transitórias ou permanentes. A consciência e a mente processam as sensações mediante mecanismos internos e externos, com base em todos os fatos comuns e também nas lesões morais.

E neste sentido PORTO explica como é se dá o

processamento:

(...) você, está caminhando e, de repente, depara-se com uma cobra. Seu medo, já concebido no cérebro, faz com que seu corpo aumente a produção de adrenalina, a constrição dos vasos sanguíneos e a liberação de determinados hormônios. Você se prepara para a luta ou fuga. Uma cadeia de cédulas passam a trabalhar no sentido de preparar o seu corpo para a corrida, a defesa ou o ataque. Se essa situação se prolongar por muito tempo, seu organismo começa a produzir um hormônio denominado cortisol, uma substância química

213 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.107. 214 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.108. 215 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.108.

70

que destrói as células e leva ao estresse vários órgãos do corpo humano. Repentinamente, você verifica que aquela cobra é de borracha e que alguém está fazendo uma brincadeira. Sua consciência modifica o comando e determina o relaxamento dos órgãos internos. Cessa a produção de adrenalina e cortisol. Seus vasos sanguíneos voltam ao normal. Acaba a situação de estresse. Eventualmente alguma lesão pode ser verificada no sistema endócrino ou outra parte do corpo, mesmo depois do novo comando.

Essa situação de estresse é verificada em todas as ofensas

morais. O grau da lesão depende da forma como a pessoa ofendida lida com o tipo

de agressão na consciência e como o seu organismo reage em situações de

estresse216.

Observa PORTO217 que:

Os danos morais, compreendidos como danos à consciência, atingem, na verdade, a parte física do indivíduo, (...). Todo dano moral provoca, em certa medida, um aborrecimento e, em conseqüência, as reações químicas do organismo que conduzem ao estresse e todas as suas conseqüências danosas ao organismo.

Vale dizer, o dano moral atinge a consciência que provoca uma

reação química no organismo, esse processo químico pode levar ao estresse rápido

ou prolongado, gerando sintomas emocionais, comportamentais e cognitivos e

danos irreversíveis à saúde física218.

3.2 O FATO E A PRESUNÇÃO DO DANO MORAL

A prova dos danos morais tem duas unidades distintas. A

primeira delas é aquela em que se produz a demonstração do fato. A segunda

envolve a avaliação subjetiva dos danos morais219.

Observa PORTO220 que:

216 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.109. 217 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.111. 218 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.111. 219 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.133. 220 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.133.

71

A interpretação é dada pelo juiz que aplica a presunção em favor da vítima. Tem-se observado também que a hipótese é de presunção “júris tantum”, admitindo-se prova em contrário. Em outras palavras, vem se reconhecendo que a ofensa moral não exige prova de sua existência, apenas do fato que lhe deu origem.

Entende PORTO221 que:

(...) o dano moral, pode–se adotar o pressuposto de que a lesão corporal resulta razoável admitir eu houve dano moral. Devido à angústia gerada pelo fato, da necessidade de tratamento, dos deslocamentos conseqüentes se pressupõe que tenham provocado uma lógica afecção de ordem sentimental.

A finalidade da prova é a formação da convicção do juiz quanto

à existência dos fatos da causa. Objetivo é verificar se os fatos afirmados são certos,

ou seja, criar a certeza quanto à sua existência. A certeza inabalável faz a convicção

do juiz, seu destinatário222.

Como ainda PORTO223 explica que :

Os meio devem ser juridicamente idôneos e se efetivam pela narração de testemunhas, declaração constitutiva de atos constantes de documentos, exame da coisa por peritos ou pelo próprio juiz, ou qualquer outro meio idôneo para atestar sua existência.

Segundo PORTO224:

A orientação doutrinária predominante, toda prova tem um sentido objetivo e subjetivo. No sentido subjetivo são todos os meios destinados a fornecer ao juiz o conhecimento da verdade dos fatos deduzidos em juízo. No sentido subjetivo é a prova que se forma no espírito do juiz, do conhecimento e da ponderação das provas no sentido objetivo. Vale dizer, consiste na convicção que as provas geram no espírito do magistrado a existência ou inexistência do fato.

A demonstração dos danos morais faz pressupor a existência

da prova objetiva e a convicção do juiz da existência do fato. Na etapa que avalia a

existência dos danos morais, o critério é, em regra, subjetivo225.

221 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.133. 222 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.133. 223 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.134. 224 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.134. 225 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.134.

72

3.3 AVALIAÇÃO SUBJETIVA DO DANO MORAL

Na avaliação do dano moral, o órgão judicante deverá

estabelecer uma reparação eqüitativa, baseada na culpa do agente, na extensão do

prejuízo causado e na capacidade econômica do responsável.

Para PORTO226, se o dano ofende apenas a imagem da pessoa, ou seja, se verifica apenas no nível do ego, a avaliação é mais simples.(...) podem ser enumerados todos os danos a imagem social da pessoa, a honra, boa fama, etc.

Nesse caso, aplica-se a presunção de dano à consciência,

invertendo-se o ônus da prova, em favor de quem alega o dano, e contra aquele que

o nega. Caberá ao réu o ônus de prova a inexistência do dano moral227.

Entretanto para PORTO228:

A ofensa à imagem é aferível de maneira simples. Basta verificar se a imagem da pessoa foi abalada com a agressão, no meio social em que vive. O abalo ao crédito, por exemplo, se dá nos casos em que o credor, inadvertidamente, coloca em protesto título já pago, em nome do devedor, casos em que o nome do devedor é colocado em órgãos de proteção ao crédito.

PORTO229 define ainda que:

A proteção da consciência individual se dá no nível do ego, constituído pelos papéis sociais desempenhados pelo indivíduo. Como o homem ocidental é, particularmente, devotado ao conteúdo egóico de sua personalidade, toda ofensa à imagem deve ser considerada. O questionamento da existência de distúrbios psicológicos decorrentes do excessivo apego ao ego, e eventual quadro psicótico em virtude disso, não pode ser avaliado pelo juiz.

PORTO230 relata que:

A avaliação da prova apenas restringe o apego. O ego de uma pessoa famosa, por exemplo, não pode ser melhor do que o de um poeta desconhecido ou de um miserável que vive numa favela. Provada a ofensa ao ego, a indenização se limita à reparação da

226 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.134. 227 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.134. 228 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.135. 229 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.135. 230 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.135.

73

ofensa à imagem, sendo dispensável a prova da fama maior ou menor do ego ofendido. Apenas a dimensão da ofensa e as circunstâncias devem ser demonstradas para se fixar a indenização. Evita-se, desta forma, a avaliação subjetiva do valor da fama de uma pessoa, por exemplo, que explora o erotismo na televisão em comparação com um político famoso.

3.4 PARTES ATINGIDAS PELO DANO MORAL

O mundo deixou de ser visto como algo construído em blocos

distintos e separados uns dos outros, para ser concebido como inserido numa

complexa rede interdependente231.

Observa PORTO232 que:

O corpo humano não é mais concebido como uma máquina, mas sim como um complexo sistema de trilhões de cédulas, interligadas por junções em permanente mutação. A realidade da matéria não pode ser vista como um átomo isolado, mas sim por partículas constituídas de energia, que somente existem em função de outras, também ligadas por conexões, em constante movimento.

Segundo PORTO233:

Isso ensejou a percepção da necessidade de uma nova ética, em que a interdependência e interligação de todos os seres vivos da terra são fatores preponderantes para que haja condições de vida. Também essa ética se aplica ao direito, na medida em que o homem é visto em toda sua integralidade biológica e psicológica, além da redução materialista dominante até então. A interconexão gera a necessidade de equilíbrio são enaltecidas outras características humanas, não apenas patrimoniais. Também em nome desse equilíbrio, surge o dever de reparar os danos morais.

Entretanto Porto explica que:

Na verdade, o melhor enquadramento jurídico para o tema seria denominar essas reparações de “reparações à pessoa humana”, compreendidas as indenizações por danos físicos e por danos à consciência. De certa forma, embora não resolvesse as inúmeras questões que surgem na aplicação do direito, relacionado com a matéria, reduziria a ambigüidade existente, evitando-se discussão de

231 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.112. 232 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.112. 233 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.112.

74

ordem moral, uma vez que a moral nem sempre é concebida de maneira uniforme.

Os critérios para a fixação da indenização não são modificados

substancialmente, definindo-se apenas o bem lesado pela conduta antijurídica, o

que facilitaria a identificação do dano.

3.5 CRITÉRIOS PARA QUANTIFICAÇÃO DA INDENIZAÇÃO DO DANO MORAL

Necessário frisar que a fixação de indenização por danos

morais tem o condão efetivamente de reparação quer seja da dor, sofrimento ou

exposição indevida sofrida pela vítima em razão da situação constrangedora.

Observa PORTO234 que:

No dano moral, não há uma perda material que possa ser dimensionada objetivamente em dinheiro, a não ser que a lei fixe certos valores para cada lesão específica, como, por exemplo, tantos reais por lesão estética, tantos pela perda de pai, outro valor pela calúnia e assim por diante. (...). Diante da infinidade de casos, as circunstâncias específicas devem ser avaliadas.

Torna-se difícil a mensuração do valor de uma dor sofrida,

porém, necessário se faz estabelecer critérios para sua quantificação. Como

COELHO235 apresenta:

De início, convém assentar que não há critério de mensuração objetivo. A dor não se mede por variáveis controladas quantitativamente. Desse modo, embora fosse desejável eliminar as diferenças entre os valores das condenações em casos semelhantes, estas têm sido significativas. Do exame da jurisprudência, de qualquer modo, pode-se concluir um padrão geral, a alguns fatores de redução, aqueles e estes sempre subjetivos, isto é, atentos às peculiaridades dos sujeitos envolvidos.

Cada ser humano possui uma forma de sofrer. O valor de uma

perda ou de uma violação de direito é sentido diferentemente em cada pessoa.

Como avalia REIS236:

234 PORTO. Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. p.113. 235 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. 2 ed. São Paulo. Saraiva, 2009. v. 2. p. 428. 236 REIS, Clayton. Avaliação no dano moral. p. 153.

75

O binômio dano-reparação é requisito básico na equanimidade do direito. Assim, imbuído fundamentalmente na idéia matemática da absoluta equivalência entre o dano e a restauração do bem lesionado, os operadores do direito esbarram com uma dificuldade intransponível: a de avaliar com precisão aritmética o dano moral, para se estabelecer em contrapartida a reparação justa e adequada ao caso concreto.

Para GABURRI237

Ao fixar-se o quantum indenizatório, o julgador deve ter em mente o grau de compreensão do ofendido acerca de seus direitos e obrigações, pois o quantum indenizatório variará de maneira diretamente proporcional àquele grau de compreensão. Com a indenização, o lesado deve ser integralmente satisfeito, de tal forma que a indenização fixada seja capaz de compensar aquele direito violado com a ação ofensiva.

Na reparação do dano moral, o juiz fixa o quantum debeatur

por equidade, levando em conta as circunstâncias do caso concreto, observando os

critérios da razoabilidade e proporcionalidade.

GABURRI238 propõe algumas regras a serem observadas pelo

magistrado para uma justa e homogênea fixação de indenizações por danos morais,

que podem ser sintetizadas da seguinte forma:

a) Evitar indenização simbólica e enriquecimento ilícito da vítima, averiguando-se, para tanto, não somente os benefícios auferidos pelo ofensor com a prática do ato ilícito, ma também sua atitudes ulteriores e sua situação econômica.

b) Não aceitação de regras de tarifação, pois estas implicam em despersonalização e desumanização, evitando-se, outrossim, fixar os danos morais, tomando-se por base percentuais da quantia fixada a título de danos materiais;

c) Diferenciar o montante a indenizatório de acordo com a gravidade, extensão e natureza da lesão, atentando-se para as peculiaridades do caso concreto, ao caráter anti-social da conduta danosa, ao grau de culpa ou dolo do lesante, averiguando-se o real valor do prejuízo sofrido pela vítima bem como sua situação sócio-econômica;

237 GABURRI, Fernando in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes. Responsabilidade Civil. p. 98. 238 GABURRI, Fernando in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes. Responsabilidade Civil. p. 98.

76

d) Verificar a repercussão pública ocasionada pelo fato lesivo, suas circunstâncias fáticas, levando-se em conta o contexto econômico do país.

3.5.1 Arbitramento.

Quanto ao ressarcimento dos danos morais, ensina REALE239

que: Se trata de um domínio em que não se pode deixar de conferir ampla

discricionariedade ao magistrado que examina os fatos em sua concretitude.

GAGLIANO240 observa que: os critérios a serem aplicados, no

arbitramento, devem resultar da natureza jurídica do dano moral, ou melhor, da

finalidade que se tem em vista satisfazer mediante a indenização.

GAGLIANO241 considera que: Em verdade, o arbitramento é o procedimento natural da liquidação do dano moral, até mesmo por aplicação direta do art. 475-C do Código de Processo Civil brasileiro (notadamente seu inciso II), que dispõe, expressamente:

Art. 475 –C. Far-se-á a liquidação por arbitramento quando:

I – determinado pela sentença ou convencionado pelas partes.

II – o exigir a natureza do objeto da liquidação.

Lembra GALGIANO242 que:

O objeto da liquidação da reparação pecuniária do dano moral é uma importância que compensa a lesão extrapatrimonial sofrida. Não há como evitar a idéia de que, efetivamente, a natureza do objeto da liquidação exige o arbitramento, uma vez que os simples caçulos ou os artigos são inviáveis, na espécie.

Dessa forma, GAGLIANO243 propugna pela:

Ampla liberdade do juiz para fixar o quantum condenatório já na decisão cognitiva que reconheceu o dano moral. Salienta-se, inclusive, que se o valor arbitrado for considerado insatisfatório ou excessivo, as partes poderão expor sua irresignação a uma instância

239 REALE, Miguel in GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 352. 240 GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 352. 241 GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 353. 242 GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 353. 243 GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 355.

77

superior, revisora da decisão prolatada, por força do duplo (quiçá triplo ou quádruplo, se contarmos a instância extraordinária) grau de jurisdição.

3.5.2 Indenização com parâmetros tarifados

O constante receio de excessos na fixação das reparações

civis por danos morais tem preocupado os legisladores brasileiros244.

Nesse sentido GAGLIANO245 explica que:

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, por exemplo, aprovou parâmetros para a fixação de valores arbitrados em casos de indenização por danos morais. De acordo com o substitutivo, os valores deverão variar de R$ 20 mil a R$ 180 mil. Para o que denomina danos de natureza leve, o máximo cobrado será R$ 20 mil. Para os danos de natureza média, os valores podem variar entre R$ 20 mil e R$ 90 mil. E para os danos de natureza grave, o ofendido poderá receber de R$ 90 mil a R$ 180 mil.

3.6 RAZOABILIDADE PARA FIXAÇÃO DO DANO.

Todos os sistemas jurídicos desde os mais rígidos até os mais

flexíveis utilizam o critério da razoabilidade na interpretação dos fatos e das leis. A

razoabilidade implica o reconhecimento de fatos históricos, sociológicos, políticos,

culturais, psicológicos, etc., no ato de aplicar a norma ao caso concreto246.

Para PORTO247 na indenização por danos morais a

razoabilidade é o conceito que mais se destaca no momento de se estabelecer o

“quantum” indenizatório.

Destaca ainda PORTO248 que:

O principal defeito do sistema jurídico romano-germânico adotado no Brasil é o apelo exacerbado á lógica formal. A função legislativa retirada do rei e entregue ao povo por meio de seus representantes nos Estados Modernos trouxe também a idéia de racionalidade na construção do direito.

244 GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 355. 245 GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 355. 246 PORTO, Marcius. Dano Moral. p.115. 247 PORTO, Marcius. Dano Moral. p.115. 248 PORTO, Marcius. Dano Moral. p.115.

78

PORTO249 define que:

O estabelecimento do valor indenizatório pela utilização do critério da razoabilidade amplamente adotado pelos juízes e tribunais vem demonstrar a necessidade de revisão de conceitos e do próprio sistema romano-germânico adotado no país. O culto à lógica formal que conduz à lógica abstrata na interpretação da lei choca-se permanentemente com a realidade e os conteúdos culturais, sociológicos, históricos, econômicos, etc., do local onde a norma é aplicada.

No entendimento de REIS250 que:

É inquestionável que o padrão moral das pessoas é formado por elementos variáveis, em decorrência dos múltiplos fatores de ordem pessoal. É certo que o nível intelectual, social e econômico de um indivíduo estabelece padrões de comportamento que influem na construção das suas regras de moralidade pessoal e social.

Porém, não se deve avaliar os padrões morais de uma pessoa

mediana pelos seus parâmetros elevados ou inferiores, isto porque virtus in

medio251.

“Para avaliar o dano moral”, ressalta MONTENEGRO252:

(...) com percuciência, “haver-se-á de levar em consideração, em primeiro lugar, a posição social e cultural do ofensor e do ofendido. Para isso deve-se ter em vista o homo medius, de sensibilidade ético-social normal.” É preciso, portanto, idear o homem médio para que, conhecendo o seu perfil, tenhamos condições e elementos para a fixação dos fatores que concorrerão para o arbitramento do quantum indenizatório.

É necessário ainda conhecer-se o comportamento do ofensor,

antes e após na fixação de normas para definir o valor da indenização

compensatória.

249 PORTO, Marcius. Dano Moral. p.116. 250 REIS, Clayton. Dano Moral. 4ºed. Rio de Janeiro. Forense. 1998. p. 91. 251 REIS, Clayton. Dano Moral. p. 92. 252 MONTENEGRO, Antonio in REIS, Clayton. Dano Moral. 4ºed. Rio de Janeiro. Forense. 1998. p.

92.

79

No entanto, com maior profundidade e acerto, a Lei nº. 5.250,

de 09 de fevereiro de 1967, que regula a liberdade de pensamento e informação, no

seu art. 53 e incisos, dispôs, com acentuada clareza253:

Art. 53. No arbitramento da indenização em reparação de dano moral, o juiz terá em conta, notadamente:

I – A intensidade do sofrimento do ofendido, a gravidade, a natureza e repercussão da ofensa e a posição social do ofendido;

II – A intensidade do dolo ou grau de culpa do responsável, sua situação econômica e a sua condenação anterior em ação criminal ou civil fundada em abuso do exercício da liberdade de manifestação do pensamento ou informação.

III – A retratação espontânea e cabal, antes da propositura da ação penal e civil, a publicação ou transmissão da resposta ou pedido de retificação, nos prazos previstos em lei e independentemente de intervenção judicial, e a extensão da reparação por esse meio obtida pelo ofendido.

Os critérios adotados pela legislação esparsa brasileira são

extremamente ricos e profundos em critérios para a fixação do valor indenizatório254.

MONTENEGRO destaca255: “predomina o entendimento de que a fixação da reparação do dano moral deve ficar ao prudente arbítrio dos juízes. (...) “o ideal, ou pelo menos mais seguro e democrático, seria a indenização tarifada de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, tendo em vista as peculiaridades de cada caso concreto.

O arbitramento do dano moral será apreciado livremente pelo

juiz atendendo à repercussão econômica, à prova da dor e o grau de dolo ou culpa

do ofensor256.

No entanto REIS257, a idéia prevalente do livre arbítrio do Magistrado ganha corpo na doutrina e jurisprudência, na medida em que transfere para o juiz o poder de aferir, com seu livre convencimento e tirocínio, a extensão da lesão e o valor da reparação correspondente. Afinal, é o juiz quem, usando os parâmetros subjetivos, fixa a pena condenatória de réus processados criminalmente e ou estabelece o

253 REIS, Clayton. Dano Moral. 4ºed. Rio de Janeiro. Forense. 1998. p. 92 e 93. 254 REIS, Clayton. Dano Moral. p. 93. 255 MONTENEGRO, Antonio in REIS, Clayton. Dano Moral. p. 93. 256 REIS, Clayton. Dano Moral. p. 94. 257 REIS, Clayton. Dano Moral. p. 94.

80

quantum indenizatório, em condenação de danos ressarcitórios, de natureza patrimonial.

DINIZ258 nesse sentido, destaca que:

Essa posição importante, defendendo a sua tese a respeito da equidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão, e não ser equivalente, por ser impossível tal equivalência.

E adiante conclui DINIZ259:

“Grande é o papel do Magistrado na reparação do dano moral, competindo, a seu prudente arbítrio, examinar cada caso, ponderando os elementos probatórios e medindo as circunstâncias, preferindo o desagravo direto ou compensação não-econômica à pecuniária, sempre que possível, ou se não houver risco de novos danos”.

Assim sendo, quaisquer que sejam os critérios adotados, a

nível de reparação pecuniária ou obrigação de fazer ou deixar de fazer, o que

importa é que os danos morais sejam reparados260.

3.7 CÁLCULO DO VALOR INDENIZATÓRIO

O dano moral pode ser decorrente de um dano material, como

nos casos de acidente de veículo, por exemplo, ou proveniente de uma ofensa moral

típica261.

A lesão moral pode atingir o patrimônio, a pessoa no seu

âmbito social ou a sua parte psíquica. Também pode ter efeitos transitórios ou

permanentes262.

Desta forma PORTO estabelece uma divisão genérica:

258 DINIZ, Maria Helena in REIS, Clayton. Dano Moral. p. 94. 259 DINIZ, Maria Helena in REIS, Clayton. Dano Moral. p. 94. 260 REIS, Clayton. Dano Moral. p. 94. 261 PORTO, Marcius. Dano Moral. p. 116. 262 PORTO, Marcius. Dano Moral. p. 116.

81

a) Lesão ao patrimônio material objetivo;

b) Lesão à consciência;

b.1. Lesão à persona, ou ego, aos aspectos sociais;

b.2. Lesão à parte, psíquica, que pode gerar depressão,

ansiedade, estresse, angústia, fobias, apatia, danos no

sistema imunológico, transtornos sexuais, transtornos

dissociativos, do sono, etc.;

b.2.1. Lesão de efeitos permanentes;

b.2.2. Lesão de efeitos transitórios.

Na fixação do valor indenizatório, a primeira providência a ser

tomada pelo juiz é a identificação das partes atingidas pela ofensa. Quanto mais

ampla maior será a indenização263.

Por sua vez, PORTO264 destaca que:

O prudente arbítrio do juiz, ou a razoabilidade são conceitos que orientam o estabelecimento do valor indenizatório. Valendo-se desses conceitos e procurando racionalizar o critério de fixação do valor, parece razoável iniciar o cálculo com dez salários mínimos.

PORTO265 dá continuidade ao seu destaque que:

Se apenas uma pessoa é afetada e a lesão é mínima, a indenização pode ser fixada na quantia equivalente a dez salários mínimos. Se a ofensa atinge a parte social, os aspectos psíquicos gera estresse, a indenização pode ser aumentada em cinco vezes, ou seja, em até cinqüenta salários mínimos.

No entanto PORTO266, nesse aspecto complementa que:

Os efeitos permanentes da lesão como a provocação de traumas e estresse de longo prazo implicam o aumento em até dez vezes a

263 PORTO, Marcius. Dano Moral. p. 117. 264 PORTO, Marcius. Dano Moral. p. 117. 265 PORTO, Marcius. Dano Moral. p. 117. 266 PORTO, Marcius. Dano Moral. p. 117.

82

quantia anteriormente estabelecida. Significa dizer que para a lesão que atinge os aspectos sociais, a parte psíquica, envolvendo o processamento do raciocínio e emoções, de efeitos permanentes a indenização pode atingir até quinhentas vezes o valor do salário mínimo. Essa quantia pode ser ainda elevada em casos de lesões morais irreversíveis que atingem vários aspectos da personalidade.

O salário mínimo como base de cálculo parece ser a medida

ideal para o estabelecimento do valor indenizatório porque é sempre atualizado e

tem vista o poder de compra do brasileiro de baixa renda, que compõe mais de 50%

da população267.

Conforme observa TEIXEIRA FILHO268

(...) não há como negar que a compensação pecuniária domina nas condenações judiciais, seja por influxos do cenário econômico, antes instável e agora em fase de estabilização, seja pela maior liberdade do juiz em fixar o ‘quantum debeatur’. Deve fazê-lo embanhado em prudência e norteado por algumas premissas, tais como: a extensão do fato inquinado (número de pessoas atingidas, de assistentes ou de conhecedoras por efeito de repercussão); permanência temporal (o sofrimento é efêmero, pode ser atenuado ou tende a se prolongar no tempo por razão plausível); intensidade (o ato ilícito foi venial ou grave, doloso ou culposo); antecedentes do agente (a reincidência do infrator deve agravar a reparação a ser prestada pelo ofendido); situação econômica do ofensor e razoabilidade do valor.

Nesse sentido afirma REIS269 que: Mesmo o juiz em seu livre e

prudente arbítrio, necessita de indicativos objetivos e subjetivos para a fixação de

um valor, que se aproxime da realidade fática de cada caso.

E destaca ainda que:

A captação pelo juiz desses elementos que são componentes da personalidade das pessoas, a que ser aferida pelos indicativos e provas dos autos. De posse desses requisitos o magistrado poderá formar uma idéia exata dos valores da vítima e do lesionador, para, conjugando-os com os demais elementos do processo elaborar quantitativamente o valor da indenização270

267 PORTO, Marcius. Dano Moral. p. 117. 268 GAGLIANO, Pablo SATOLZE. Novo Curso de Direito Civil. p. 351. 269 REIS, Clayton. Dano Moral. p. 95. 270 REIS, Clayton. Dano Moral. p. 99.

83

O parâmetro de fixação pelo juiz deve atender sempre e

veemente os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, visto que a fixação do

quantum não deve ser extensiva de modo que se converta em fonte enriquecimento,

e não muito pequena a ponto de tornar-se inexpressiva.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve por delimitação temática o estudo da

Indústria do Dano Moral. Para tratar dos parâmetros utilizados para a fixação do

quantum indenizatório, foram elaborados os problemas que levaram a sua

observação com base na lógica indutiva, a saber:

1. Qual o significado da responsabilidade civil?

2. Quais são os pressupostos necessários para caracterizar

o dever de reparar o dano moral?

3. Quais são os critérios utilizados para a fixação do valor a

ser indenizado em caso de comprovação da existência do

dano moral?

Tendo em vista que, a responsabilidade civil deriva da

agressão a um interesse eminentemente particular, sujeitando, assim, o infrator, ao

pagamento de uma compensação pecuniária à vítima, caso não possa repor in

natura o estado anterior das coisas.

O estudo do capítulo 1 confirmou a hipótese 1 ao dispor que: a

responsabilidade civil significa que as pessoas têm o direito de não serem

injustamente invadidas em suas esferas de interesses, por força de nossa conduta,

pois caso isso aconteça têm elas o direito de serem indenizadas na proporção do

dano sofrido.

Quando comprovado os pressupostos, o agente que cometeu o

dano, causando o abalo moral à vítima, será imputado uma indenização amenizando

a dor sofrida pela vítima, e possuirá um caráter didático, a repreender a conduta

gerada pelo agente.

Assim o estudo do capítulo 2 confirmou a hipótese 2 que: os

pressupostos necessários para caracterizar o dever de reparar o dano moral são: a

conduta do agente, a culpa, o dano e a relação de causalidade.

85

O juiz possui o arbítrio para a fixação do valor correspondente

ao pedido de indenização por dano moral, ficando a seu prudente arbítrio, diante do

fato ocorrido e das provas apresentadas, a estipulação do valor mais adequado a

amenizar a dor sofrida pela vítima.

O estudo do capítulo 3 também confirmou a hipótese 3 que: ao

juiz é atribuída a competência para a fixação do valor correspondente a reparação

do dano moral.

Ressalta-se, por fim, que a presente pesquisa não tem intuito

exauriente, mas apenas se constitui como um estímulo a realização de novos

estudos e reflexões que possam aprofundá-la de forma a contribuir com um sistema

jurídico mais justo e eficiente.

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

ANTONIO, Chaves, Responsabilidade Civil. 1. Ed., São Paulo, 1972. BEVILÁQUA, Clóvis.Teoria geral do direito civil. 2. ed. (Edição histórica). Rio de Janeiro: Editora Rio, 1980. BRASIL, Código Civil. Lei 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. CAVALIERI FILHO. Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2 ed., São Paulo:

Malheiros, 2000.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. 2 ed. São Paulo. Saraiva, 2009. v. 2.

DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 11 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 7. ed., São Paulo, 1993. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, responsabilidade civil – 24 ed. v. 7 – São Paulo: Saraiva, 2010. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. Vol.7. 17°ed. São Paulo: Saraiva, 2003. GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil, Responsabilidade civil – 4 ed. v. 3– São Paulo: ed. Saraiva, 2006. GOMES, José Jairo. Direito Civil. Introdução e Parte Geral. ed. del rey ltda. Belo Horizonte. 2006. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 6ª Ed. atual. e ampl. São Paulo. Saraiva, 1995. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo. Saraiva, 2003. Inácio de Carvalho. Responsabilidade civil no direito da família./ Curitiba: Juruá, 2002. Pensamento Jurídico. v. IX. LALOU, Henri in CARVALHO NETO, Inácio de Carvalho. Responsabilidade civil no direito da família. Pensamento Jurídico. v. IX. Curitiba: Juruá, 2002. LISBOA, Roberto Senise. Manual Elementar de Direito Civil. v. 2: obrigações e responsabilidade civil. 2. ed. Revistas dos tribunais. São Paulo. 2002. MONTENEGRO, Antonio in REIS, Clayton. Dano Moral. 4ºed. Rio de Janeiro. Forense. 1998.

87

PORTO, Marcius. Dano Moral. Proteção da Consciência e da Personalidade. ed. 4º. São Paulo. 2007. PAGE, Henri de, in CARVALHO NETO, Inácio de. Responsabilidade Civil no Direito de Família. PAMPLONA FILHO, Rodolfo in GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de Direito Civil. Responsabilidade Civil. v. 3. São Paulo. Saraiva. 2003. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990. REIS, Clayton. Dano Moral. 4ºed. Rio de Janeiro. Forense. 1998. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Responsabilidade Civil. 19. ed. atual. v. 4. São Paulo. Saraiva. 2002. RONCONI, Diego Richard. A Responsabilidade Civil nos Contratos de Alienação Fiduciária em Garantia. Florianópolis. Editora OAB/SC. 2006.

SANTOS, Antônio Jeová. Dano Moral Indenizável. 3ª. edição. Editora Método. 2001.

SANTOS, Romualdo Baptista dos in HIRONAKA, Giselda M. F. Novaes, Teoria Geral da Responsabilidade Civil. editora revista dos tribunais. São Paulo. 2008. SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho – Rio de Janeiro, 2006. SOARES, Orlando. Responsabilidade Civil no Direito Brasileiro. 2ª edição. Rio de Janeiro. 1997. VENOSA, Sílvio de Salvo. Responsabilidade Civil. 4. ed. São Paulo Atlas, 2004. VENOSA. Silvio de Salvo. Direito civil. Responsabilidade Civil. 10.ed. São Paulo. Atlas. 2010. Coleção direito civil. v 4. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Vol.4. 3°ed. São Paulo: Atlas S.A., 2003. http://istoedireito.blogspot.com/2008/06/responsabilidade-contratual-versus.html. MACIEL. Daniel Baggio. Responsabilidade Contratual e Responsabilidade Extracontratual. Acessado em: 03 de Abril de 2010 http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5159. BRITTO, Marcelo Silva. Alguns Aspectos polêmicos da responsabilidade civil, objetiva no novo código civil. Acessado dia 12 de Setembro de 2010.