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INOVAO, MANUFATURA AVANADA E O FUTURO DA INDSTRIA
UMA CONTRIBUIO AO DEBATE SOBRE AS POLTICAS DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO
1 Edio
SIG Quadra 4, Bloco B, Ed. Capital Financial Center, Braslia - DF
+ 55 61 3962 [email protected]
mailto:[email protected]://www.abdi.com
INOVAO, MANUFATURA AVANADA E O FUTURO DA INDSTRIAUMA CONTRIBUIO AO DEBATE SOBRE AS POLTICAS DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO
BrasliaABDI2017
Agncia Brasileira de Desenvolvimento Industrial
1 Edio
Repblica Federativa do Brasil
Michel Temer
Presidente
Ministrio da Indstria,
Comrcio Exterior e Servios
Marcos Pereira
Ministro
Agncia Brasileira de Desenvolvimento
Industrial - ABDI
Luiz Augusto de Souza Ferreira
Presidente
Jos Alexandre da Costa Machado
Diretor
Miguel Antnio Cedraz Nery
Diretor
Bruno Jorge Soares
Gerente de Planejamento
Equipe Tcnica e Reviso da ABDI
Carlos Henrique de Mello Silva
Jackson De Toni
Ricardo Amorim
Roberto Pedreira
Rogrio Arajo
Simone Uderman
Ana Carolina Nogueira
(Estagiria)
Projeto grfico
Mariana Destro
Contrato n.029/2015
Servios tcnicos especializados para a reali-
zao de estudos e pesquisas acerca de polticas
industriais e aes de fomento ao desenvolvimen-
to tecnolgico e inovao.
Gestor do contrato: Roberto Pedreira
Coordenao
Carlos Torres Freire, Doutor em Sociologia pela
USP e Diretor Cientfico do Cebrap.
Glauco Arbix, Professor Titular do Departamento
de Sociologia da Universidade de So Paulo (USP).
Mrio Srgio Salerno, Professor Titular do
Departamento de Engenharia de Produo da
Escola Politcnica da USP.
Equipe de pesquisa:
Carolina Mota Mouro, Mestre em Direito
do Estado pela USP, Professora de Direito
Administrativo da Universidade Presbiteriana
Mackenzie.
Daniel Babinski, Mestre em Direito do Estado
pela USP, scio do Gomes & Navarro Advogados
Associados e pesquisador associado do Cebrap.
Felipe Massami Maruyama, mestrando em
Engenharia de Produo na Poli/USP e pesquisa-
dor associado do Cebrap.
Graziela Castello, Graduada em Cincias Sociais
pela Pontifcia Universidade Catlica de SP e
pesquisadora do Cebrap.
Guilherme Soares Gurgel do Amaral, Doutor em
Engenharia de Produo pela Escola Politcnica
da USP, pesquisador associado do Cebrap.
Leonardo Melo Lins, Mestre e Doutorando em
Sociologia pela Universidade de So Paulo (USP) e
pesquisador associado do Cebrap.
Paula Santana, mestranda em Polticas Pblicas
pela USP, pesquisadora associada do Cebrap.
Consultores e especialistas:
Andr Tortato Rauen (Ipea), Doutor em Poltica
Cientfica e Tecnolgica pela Unicamp, pesquisa-
dor do Ipea.
Andr Amaral, economista, consultor em
finanas pblicas.
Carlos Amrico Pacheco, Doutor em Economia,
Instituto de Economia da Unicamp.
Cristina Caldas, Doutora em Imunologia pela USP,
pesquisadora visitante no Center for International
Studies do Massachusetts Institute of Technology
(MIT).
Demtrio G. C. Toledo, Professor Doutor do
Bacharelado em Relaes Internacionais da
Universidade Federal do ABC.
Diogo Coutinho, Professor Associado do
Departamento de Direito Econmico, Financeiro e
Tributrio da Faculdade de Direito da USP.
Eduardo de Senzi Zancul, Professor do Departamento de
Engenharia de Produo da Escola Politcnica da USP.
Evando Mirra, Professor Titular Engenharia
Metalrgica da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG).
Fernanda De Negri, Doutora em Economia pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),
pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econmica
Aplicada (Ipea) e pesquisadora visitante no
Industrial Performance Center do Massachusetts
Institute of Technology (MIT).
Jorge de Paula Costa Avila, Doutor em Sade
Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de
Janeiro.
Joo Alberto De Negri, Doutor em Economia pela
Universidade de Braslia, pesquisador do IPEA.
Pedro Salomon Bezerra Mouallem, Mestre em
direito pela Faculdade de Direito da USP.
Roberto Vermulm, Professor Dr. da Faculdade de
Economia e Administrao da USP.
Consultoria jurdica:
Manesco, Ramires, Perez, Marques,
Sociedade de Advogados.
Sundfeld Advogados, Consultores em Direito
Pblico e Regulao.
Veirano Advogados.
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao - CIP
Uma contribuio ao debate sobre as polticas de desenvolvimento produtivo: inovao e manufatura
avanada / Organizador: Jackson De Toni - Braslia : ABDI, 2017.
v. 1 (545 p.) : il., grfs. color.
ISBN: 978-85-61323-42-4
1. Indstria 2. Indstria Brasileira 3. Poltica Industrial
4. Desenvolvimento Brasileiro 5. Inovao 6. Tecnologia;
De Toni, Jackson// I. Agncia Brasileira de Desenvolvimento Industrial.
INTRODUO
APRESENTAO
01 / PANORAMA DE POLTICAS INDUSTRIAIS E DE INOVAO NO BRASILINTRODUO
PARTE I. INTRODUO E CONTEXTO
1. PARMETROS PARA UMA NOVA GERAO DE POLTICAS DE INOVAO
PARTE II. POLTICAS INDUSTRIAIS: TRAJETRIA RECENTE NO BRASIL
1. A INOVAO COMO POLTICA DE ESTADO
2. A POLTICA INDUSTRIAL TECNOLGICA E DE COMRCIO EXTERIOR (PITCE)
3. A POLTICA DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO (PDP)
4. O PLANO BRASIL MAIOR (PBM)
5. O PLANO INOVA EMPRESA E A OVA GERAO DE POLTICAS DE INOVAO
6. PROGRAMA NACIONAL PLATAFORMAS DO CONHECIMENTO (PNPC)
PARTE III: MARCO REGULATRIO E EVOLUO DO FINANCIAMENTO A CT&I
1. A CONSTRUO DO NOVO PADRO DE FINANCIAMENTO: 1997-2001
2. CONSOLIDAO DO NOVO MODELO DE GOVERNANA: 2003-2009
3. INTEGRAO DAS POLTICAS DE CT&I COM A POLTICA INDUSTRIAL: 2011-2014
NOVOS RUMOS: REVISO DO MARCO LEGAL E PROJETOS ESTRUTURANTES
REFERNCIAS GERAIS
REFERNCIAS POR POLTICA INDUSTRIAL
02 / BENCHMARKING DE POLTICAS PARA DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL, TECNOLGICO E INOVAO DE PASES SELECIONADOSINTRODUO
1. UM NOVO CONTEXTO PARA FORMULAO DE POLTICAS
1.1. REARRANJO DA CAPACIDADE INDUSTRIAL
1.2. A INOVAO COLABORATIVA E O PAPEL CRTICO DAS EMPRESAS NASCENTES
1.3. NOVOS REQUERIMENTOS PARA GOVERNANA
2. QUADRO CONCEITUAL PARA INSTRUMENTOS DE POLTICAS
INDUSTRIAIS E DE INOVAO
3. TENDNCIAS RECENTES NO USO DE INSTRUMENTOS DE POLTICA
INDUSTRIAL PARA A INOVAO
3.1. AUMENTO DA PARTICIPAO PBLICA NA P&D EMPRESARIAL E DA
UTILIZAO DE INCENTIVOS FISCAIS
11
14
16
16
19
19
24
24
29
33
37
49
56
60
62
65
79
87
88
92
96
96
100
103
108
110
112
115
115
SUM
RIO
3.2. CRIAO DE MECANISMOS DE TRANSFERNCIA TECNOLGICA JUNTO A
INICIATIVA PRIVADA
3.3. APOIO AO EMPREENDEDORISMO
3.4. FORTALECIMENTO DO USO DA ENCOMENDA PBLICA
4. PERFIS NACIONAIS RESUMIDOS
4.1. ESTADOS UNIDOS
4.2. CHINA
4.3. ALEMANHA
CONSIDERAES FINAIS
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
03/ AVALIAO DO USO DO ARCABOUO JURDICO DE INOVAOINTRODUO
1. ESTRUTURAO DA PESQUISA EMPRICA
1.1. METODOLOGIA ADOTADA
1.2. TEMTICAS EXPLORADAS
2. AVANOS E DEMANDAS NA PERCEPO DOS USURIOS
2.1. AVANOS PERCEBIDOS NO ARCABOUO LEGAL ASSOCIADO S
PRTICAS DE INOVAO
2.2. DEMANDAS A RESPEITO DO ARCABOUO LEGAL ASSOCIADO S
PRTICAS DE INOVAO
CONSIDERAES FINAIS
ANEXO I ROTEIRO DE ENTREVISTA
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
04/ ANLISE DA LEI DE INOVAOSUMRIO DO CAPTULO
1. COMPRAS
2. FLUXO DE CONHECIMENTO
3. EMPREENDEDORISMO E INOVAO
4. FINANCIAMENTO
APRESENTAO
INTRODUO
1. CONSOLIDAO DO ARCABOUO JURDICO-INSTITUCIONAL EM INOVAO
2. COMPRAS
2.1. ELEMENTOS METODOLGICOS
119
122
129
132
132
142
154
164
169
182
182
185
185
189
194
194
198
206
207
210
212
212
216
217
219
220
223
225
228
239
240
2.2. IMPORTAO, PESQUISA E INOVAO NO BRASIL: ASPECTOS LEGAIS E
INFRALEGAIS
2.3. O PODER DE COMPRA DO GOVERNO COMO INDUTOR DA MUDANA
TCNICA NAS EMPRESAS
3. FLUXOS DE CONHECIMENTO
3.1. RECURSOS HUMANOS
3.2. COOPERAO ICT-SETOR PRIVADO
3.3. PROPRIEDADE INTELECTUAL
3.4. RECOMENDAES
4. EMPREENDEDORISMO E INOVAO
4.1. INCENTIVOS S EMPRESAS INOVADORAS EM ESTGIO INICIAL
4.2. INCENTIVOS S EMPRESAS INOVADORAS EM ESTAGIO INICIAL:
O FINANCIAMENTO VIA CAPITAL DE RISCO
4.3. INVESTIMENTO EM EMPRESAS INOVADORAS POR MEIO DE FUNDOS DE
INVESTIMENTO EM PARTICIPAO - FIP
4.4. FUNDOS DE INVESTIMENTOS EM EMPRESAS INOVADORAS COM
PARTICIPAO ESTATAL
4.5. O CAPITAL DE RISCO NA LEI DE INOVAO: PRINCIPAIS ENTRAVES E
PROPOSTAS NO PLANO JURDICO
4.6. RECOMENDAES
5. FINANCIAMENTO
5.1. SNTESE DA PROPOSTA DE FUNDO NACIONAL DE INOVAO
5.2. FOMENTO INOVAO POR FINANCIAMENTO PBLICO
5.3. FOMENTO INOVAO POR FINANCIAMENTO PRIVADO
5.4. GOVERNANA DO FUNDO NACIONAL DE INOVAO
CONSIDERAES FINAIS
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
05/ MANUFATURA AVANADA NOS EUA US NATIONAL NETWORK OF MANUFACTURING INNOVATION: A ESTRATGIA AMERICANA PARA A INDSTRIA AVANADA
SUMRIO EXECUTIVO
INTRODUO
1. A EMERGNCIA DA REDE DE MANUFATURA AVANADA
2. POR DENTRO DO PROJETO NNMI
3. TENDNCIAS NAS POLTICAS DE INOVAO A PARTIR DO NNMI
242
265
300
303
323
337
339
343
345
354
360
366
369
374
376
376
379
398
408
412
414
427
427
431
432
435
438
3.1. A ORIGEM DO PROJETO NMI
3.2. ARCABOUO INSTITUCIONAL E GOVERNANA DO PROGRAMA
3.3. OS INSTITUTOS: CRIAO, FUNCIONAMENTO E AVALIAO
3.4. FUNCIONAMENTO INTERNO
3.5. EMPREGO E QUALIFICAO
3.6. AVALIAO
CONSIDERAES FINAIS
1. A CENTRALIDADE DO OSTP NA FORMULAO DA POLTICA DE INOVAO
2. MINISTRIOS-FIM NO FINANCIAMENTO E NAS AQUISIES DE INOVAES
3. CRIAR AMBIENTES COMPARTILHADOS PARA EXPERIMENTAR, ABSORVER,
GERAR E TESTAR TECNOLOGIAS DE LTIMA GERAO
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
OUTRAS REFERNCIAS
ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO
06/ CINCIA, TECNOLOGIA E INOVAO EM SADE NOS EUA: POLTICAS PBLICAS E INSTITUIES
INTRODUO
1. CINCIA, TECNOLOGIA E INOVAO NOS EUA: A CINCIA COM MISSO
2. METODOLOGIA DO LEVANTAMENTO DE CAMPO
3. A POLTICA DE C&T NORTE-AMERICANA NA REA DE SADE
4. TENDNCIAS RECENTES NAS POLTICAS DE CTI EM SADE
CONSIDERAES FINAIS: LIES DAS EXPERINCIAS DOS EUA E
RECOMENDAES DE POLTICAS E AES PARA O BRASIL
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO
ANEXO 2: LOCAIS VISITADOS E ENTREVISTADOS SADE NOS EUA
07/ MANUFATURA AVANADA NA ALEMANHA MODELOS INSTITUCIONAISE POLTICAS DE CINCIA, TECNOLOGIA E INOVAO EM MANUFATURA
AVANADA: O CASO DA ALEMANHA E DO PROGRAMA INDUSTRIE 4.0SUMRIO EXECUTIVO
INTRODUO
1. CINCIA, TECNOLOGIA E INOVAO EM MANUFATURA NA ALEMANHA:
UMA VISO GERAL
2. METODOLOGIA DO LEVANTAMENTO DE CAMPO
438
442
447
450
457
457
459
459
460
461
462
463
465
467
467
471
481
490
501
509
513
516
518
520
520
525
527
539
3. TENDNCIAS RECENTES NAS POLTICAS DE CTI
3.1. GOVERNANA DO PROGRAMA INDUSTRIE 4.0 E FORMAS
DE PARTICIPAO
3.2. O PAPEL DOS AMBIENTES DE TESTE E DEMONSTRAO TESTBEDS
3.3. INSTRUMENTOS ESPECFICOS DE FOMENTO E ENVOLVIMENTO DE PMES
CONSIDERAES FINAIS: LIES DAS EXPERINCIAS DA ALEMANHA E
RECOMENDAES PARA O BRASIL
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO
08/ ENERGIA E TECNOLOGIA NA ALEMANHA A POLTICA DE INOVAO PARA ENERGIAS SUSTENTVEIS NA ALEMANHA
SUMRIO EXECUTIVO
INTRODUO
1. CINCIA, TECNOLOGIA E INOVAO NO SETOR ELTRICO DA ALEMANHA:
UMA VISO GERAL
1.1. 1974 1989: FORMAO INICIAL DA DINMICA DO DESENVOLVIMENTO
TECNOLGICO NO SETOR
1.2. 1990 - 2000: GERAO DA INDSTRIA DE ENERGIAS RENOVVEIS
NA ALEMANHA
1.3. 2000 EM DIANTE: CONSOLIDAO DO PROCESSO DE DIFUSO DAS
TECNOLOGIAS DE ENERGIA RENOVVEIS NA ALEMANHA
2. METODOLOGIA DO TRABALHO DE CAMPO
2.1. ENERGIA E INDSTRIA 4.0
3. TENDNCIAS RECENTES NAS POLTICAS ENERGTICAS
CONSIDERAES FINAIS: LIES DAS EXPERINCIAS DO PAS E
RECOMENDAES PARA O BRASIL
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO
ANEXO 2: LOCAIS VISITADOS E PROFISSIONAIS ENTREVISTADOS
NA ALEMANHA
09/ MANUFATURA AVANADA NO BRASIL: DIRETRIZES E RECOMENDAES PARA A FORMULAO DE UM PROGRAMA NACIONAL
SUMRIO EXECUTIVO
INTRODUO
543
543
549
559
562
568
572
575
575
580
582
582
588
591
596
600
602
615
621
624
626
630
630
638
PRIMEIRA PARTE: INDSTRIA DO FUTURO, EUA, ALEMANHA E CHINA
1. UMA NOVA INDSTRIA
2. CONCEITOS E FUNDAMENTOS
3. ALEMANHA
4. ESTADOS UNIDOS
5. CHINA
6. TRAJETRIAS ADOTADAS NOS PASES ANALISADOS
7. PONTO DE PARTIDA NO BRASIL
SEGUNDA PARTE: DIRETRIZES PARA O BRASIL
VISO GERAL DAS DIRETRIZES E RECOMENDAES
1. GOVERNANA
2. INTEGRAO INTERNACIONAL
3. LABORATRIOS
4. TESTBEDS
ANEXO 1 DIRETRIZES PRELIMINARES PARA CHAMADAS PBLICAS DE
FOMENTO A TESTBEDS
641
641
643
648
651
657
659
662
665
665
666
675
678
681
685
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 11
INTRODUO
Em estudo recente sobre a competitividade, o Brasil ocupou o penltimo
lugar num ranking de 18 pases selecionados. 1 Entre nove fatores indicados,
apenas em quatro, disponibilidade de mo de obra, competio e escala do
mercado domstico, educao e tecnologia e inovao, o pas no ocupa o tero
inferior do ranking. Entre os fatores mais preocupantes esto o alto custo de
capital, as deficincias da infraestrutura de energia, a qualidade da educao,
o baixo investimento em P & D e, claro, a deteriorao dos indicadores ma-
croeconmicos.
Essa situao preocupante, entretanto, no deve diminuir o papel da in-
dstria na nossa trajetria de desenvolvimento nacional. O Brasil construiu
um diversificado e complexo tecido industrial desde o ps-guerra. Eletroele-
trnica, qumica, aeronutica, automobilstica, petroqumica, ..., poucos pa-
ses emergentes lograram construir em pouco tempo um parque industrial que
colocou o pas entre as dez maiores economias do mundo. A indstria trans-
formou o pas, mais urbano e escolarizado, modernizando as relaes econ-
micas e institucionais.
Entretanto, no conseguimos acompanhar a revoluo tecno-cientfica
em curso desde os anos setenta, nem modernizamos nossas instituies sufi-
cientemente para acompanhar a revoluo nas cadeias globais de valor. Como
1 Competitividade Brasil, 2016, comparao com pases selecionados, CNI, Braslia.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 12
consequncia perdemos progressivamente produtividade e agregao de va-
lor nas nossas exportaes, nos posicionamos de forma precria nas transfor-
maes da estrutura produtiva mundial.
Sabemos que a indstria, em especial a manufatura, que gera maiores
multiplicadores da atividade econmica, maiores efeitos de escala e maiores
oportunidades para a inovao. Sabemos tambm que a indstria no mundo
inteiro vive um perodo de transio que no s tecnolgica, mas dos pr-
prios modelos de negcio. Os servios, por exemplo, j adicionam mais que
60% do valor aos produtos industriais. A economia digital, baseada em novas
tecnologias de informao, avana em todos os setores. A assim chamada ma-
nufatura avanada ou indstria 4.0 passou a ser um imperativo para insti-
tuies pblicas e privadas que pensam o presente e o futuro do desenvolvi-
mento produtivo. Segundo o Boston Consulting Group, as tecnologias que es-
to transformando a estrutura produtiva so: 1. robs autnomos; 2. internet
das coisas em nvel industrial; 3. manufatura aditiva; 4. integrao de siste-
mas horizontais e verticais; 5. simulao; 6. realidade aumentada; 7. big data
e anlises; 8. processamento e armazenamento de dados em nuvem; 9. segu-
rana ciberntica. H tambm uma diluio entre os antigos setores industrial
e agrcola na medida dos avanos da bioeconomia, da agricultura de preciso
e de tecnologias hbridas envolvendo novos materiais e novas cadeias de pro-
tenas. Essas tecnologias esto na base e so potencializadas por novos mode-
los de negcios baseados na customizao em massa, na conexo instantnea,
e na servitizao de bens industriais. Estamos beira da Quarta Revoluo
Industrial.
Tornou-se imprescindvel pensar o processo de desindustrializao, no
s como o fim de um ciclo, mas o incio de novas fronteiras nas polticas p-
blicas, para isso o apoio inovao, s parcerias pblico-privada e a um novo
tipo de poltica industrial, mais horizontal, compreensiva e flexvel, feita em
camadas que combinem agendas microeconmicas com projetos mais estru-
turais fundamental.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 13
O estudo exploratrio apresentado pela ABDI ajuda a debater esse com-
plexo contexto, de profundas alteraes tecnolgicas, demogrficas, regulat-
rias e sociais para repensar as polticas tradicionais de apoio ao setor produ-
tivo e sugerir insights para polticas futuras.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 14
APRESENTAO
A presente publicao resulta da edio e compilao dos relatrios de
pesquisa realizados pelo projeto de parceria entre a ABDI e o CEBRAP2 com o
objetivo de subsidiar os debates sobre o balano das polticas de desenvolvi-
mento produtivo e as expectativas e possibilidades de novas fronteiras, em es-
pecial sobre a necessidade de aumentar a inovao no setor produtivo e disse-
minar as prticas da Industrie 4.0, como a chamam os alemes ou a Advan-
ced Manufacturing, denominao dada pelos norte-americanos.
Os relatrios de pesquisa foram organizados em oito captulos. O pri-
meiro captulo trata de um panorama das polticas industriais executadas na
ltima dcada. A viso crtica e procura identificar os principais gargalos das
polticas industriais colocadas em prtica no perodo, com nfase para o tema
de inovao. O segundo captulo aborda um estudo de benchmarking de pol-
ticas industriais em pases selecionados: Estados Unidos, China e Alemanha.
O terceiro captulo aprofunda o debate sobre os desafios do marco regulatrio
de inovao. Os temas so segmentados em compras pblicas, conhecimento
e financiamento. O quarto captulo debate as alteraes na Lei de Inovao,
incluindo o debate sobre os dispositivos da Lei 13.243/2016. J os captulos de
cinco a oito apresentam relatrios de estudos de caso que envolveram visitas
de campo. Os estudos so sobre a manufatura avanada nos Estados Unidos
(Captulo 5), os setores de sade, tecnologia e inovao nos Estados Unidos (Ca-
2 CEBRAP a sigla do Centro Brasileiro de Anlise e Planejamento, tradicional instituto de
pesquisa econmica e social, sediado em So Paulo, foi fundado em 1969.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 15
ptulo 6), o setor de manufatura avanada na Alemanha (Captulo 7) e final-
mente os estudos de inovao e energias sustentveis na Alemanha (Captulo
8). O ltimo Captulo, nove, apresenta, em carter exploratrio e reflexivo, su-
gestes e recomendaes sobre uma eventual poltica de manufatura avan-
ada para o Brasil.
Cabe registrar que as ideias, reflexes e sobretudo as recomendaes de
polticas aqui contidas tem natureza unicamente reflexiva e exploratria, no
representando necessariamente a agenda oficial da agncia e/ou seu posicio-
namento institucional, ou do Ministrio da Indstria, Comrcio e Servios
(MDIC), ao qual a instituio vinculada.
Boa leitura!
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 16
01 /PANORAMA DE POLTICAS INDUSTRIAIS E DE INOVAO NO BRASIL
INTRODUO
Este captulo apresenta uma anlise de programas e aes de poltica
industrial, tecnolgica e de inovao formuladas e implementadas pelo go-
verno federal nos ltimos 10 anos.
O objetivo bsico deste documento, alm de uma periodizao analtica,
com descrio dos alvos, instrumentos e metas previstos, reconstruir a tra-
jetria das polticas de modo a identificar as modalidades de apoio e de finan-
ciamento pblicos ao desenvolvimento tecnolgico e inovao.
No se pretende aqui refazer minuciosamente a histria das polticas
pblicas voltadas para a indstria. Tampouco se debruar sobre uma anlise
especializada dos resultados alcanados, o que exigiria outra metodologia e,
fundamentalmente, sries histricas de dados de maior durao, capazes de
fornecer informaes precisas e comparveis.
Neste documento sero definidos os vetores principais que devem ori-
entar a construo de uma nova gerao de poltica de desenvolvimento tec-
nolgico e de inovao. Para isso, partiremos da reconstruo da evoluo das
diretrizes, escopo e dos objetivos que nortearam as polticas aprovadas desde
2004, com todas suas virtudes, mas tambm com as oscilaes, imprecises e
equvocos mais importantes que marcaram suas trajetrias.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 17
Como base para esse esforo, foram analisadas as seguintes aes: Pol-
tica Industrial, Tecnolgica e de Comrcio Exterior (PITCE); Poltica de Desen-
volvimento Produtivo (PDP); Plano Brasil Maior (PBM); Plano Inova Empresa
(PIE); Programa Nacional Plataformas do Conhecimento (PNPC). Alm destes,
foram abordados de forma pontual o Programa de Sustentao do Investi-
mento (PSI), o Inovar Auto e contribuies da Estratgia Nacional de Cincia e
Tecnologia (ENCTI), definidas pelo Ministrio da Cincia Tecnologia e Inovao
(MCTI) em 2012.
Foram analisadas as proposies e carncias das polticas aps 2004
pelo prisma do que consideramos ser o eixo estruturante de toda poltica in-
dustrial contempornea: a necessidade urgente de aes voltadas para a dimi-
nuio da distncia que separa a economia brasileira dos pases desenvolvidos
e das prticas industriais mais avanadas.
Nessa chave, o principal desafio que agentes pblicos e privados enfren-
tam o de formular polticas que levem alterao do patamar de competiti-
vidade do sistema produtivo, em geral, de baixo desempenho e sem condies
de acompanhar a rpida evoluo da indstria nos pases avanados. Por isso
mesmo, a preocupao bsica que deve permear as polticas industriais mo-
dernas a de avanar rumo a alteraes estruturais, que possibilitem a supe-
rao do gap tecnolgico e a acomodao inercial da indstria, tpica das eco-
nomias de concorrncia limitada, fruto de dcadas de protecionismo e tutela
estatal. Assim, os esforos para a elevao da baixa produtividade da economia
e o ainda baixo grau de desenvolvimento tecnolgico e de inovao das nossas
empresas, mesmo das mais dinmicas, indicam a qualidade das polticas in-
dustriais, assim como sua eficincia para o desenvolvimento sustentvel e de
longa durao.
O captulo est dividido em trs partes. Na primeira, fazemos uma in-
troduo discusso sobre poltica industrial, apontando brevemente a im-
portncia de cincia, tecnologia e inovao, assim como fornecemos algumas
referncias para se analisar as polticas no Brasil. Na segunda parte, traare-
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 18
mos a trajetria e faremos uma leitura das polticas industriais a partir da pre-
ocupao central com a inovao. Por fim, a terceira parte retoma o histrico
de mudanas no modelo de financiamento e no marco legal para C&TI no Bra-
sil nos ltimos anos.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 19
PARTE I. INTRODUO E CONTEXTO
1. Parmetros para uma nova gerao de polticas de inovao
Desde o final do sculo XX, avanos sem precedentes nas tecnologias da
informao e comunicao (TICs), favoreceram uma convergncia tecnol-
gica indita, a partir da interconexo entre reas, disciplinas e tcnicas do co-
nhecimento, e passaram a patrocinar mudanas radicais na indstria de
transformao que, reestruturada, continuar sendo base e motor para inova-
es sociais e econmicas. Setores industriais inteiros, como o qumico, ener-
gtico, de minerao, de petrleo e gs, de sade e toda a matriz manufatu-
reira, vivem mudanas profundas, a partir de novos materiais, imagens, rob-
tica, impresso em 3D e, fundamentalmente, de sistemas integradores e ana-
lticos que geram ou reutilizam dados em escala e qualidade impensveis h
poucos anos. Com isso, tecnologias digitais ganharam fora indita e deflagra-
ram processos inovadores que permitem ganhos em custo, produtividade e
eficincia.
Os impactos dessa grande transformao j se anunciam profundos,
tanto nos pases desenvolvidos como nos emergentes. A comear pelas pers-
pectivas de uma nova geografia da produo e dos sistemas de fornecimento;
ou por conta dos desafios que os materiais avanados como a fibra de car-
bono, o grafeno e outros colocam para os complexos do alumnio e do ao; ou
pela diminuio das barreiras de entrada viabilizada pela computao e inter-
net; ou ainda, pelo consistente entrelaamento da manufatura e servios.
Por mais que esse panorama ainda seja restrito a algumas indstrias,
fundamental compreender que o mundo fabril j mudou e vai mudar ainda
mais. A criao de emprego ser mais difcil e, certamente, estar concentrada
em trabalhadores mais qualificados engenheiros, designers, tcnicos de TI,
logstica, marketing que operam em centros e escritrios muitas vezes longe
da produo. O perfil do emprego ser muito distinto do que predominou no
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 20
sculo XX, com imensas consequncias sociais, que nenhum ator relacionado
formulao de polticas industriais pode ignorar.
A elaborao de polticas avanadas, com uma compreenso de con-
junto e com base em linhas de longa durao, est longe de ser trivial. As pre-
ocupaes dos governos pautam-se, em geral, pelo curto prazo. Mais do que
isso, governos so muito suscetveis a ceder diante de presses protecionistas
ou a se mostrarem generosos com empresas e indstrias que se enraizaram no
passado e no tm condies de competir no futuro.
Foi por isso que, desde 2004, o governo brasileiro retomou a formulao
de polticas industriais, s que agora, com o foco em inovao. As polticas in-
dustriais implementadas na poca de substituio de importaes, tiveram
como objetivo industrializao do pas, como meio de superao do atraso de
uma sociedade agrria com uma economia baseada em produtos intensivos
em recursos naturais e insumos de baixo valor agregado. Com uma infraestru-
tura rudimentar e mo-de-obra despreparada, as polticas industriais dos
anos 50, 60 e 70 desenvolveram-se em uma sociedade no plenamente demo-
crtica, com uma concorrncia controlada e forte presena do Estado, princi-
pal avalista, patrocinador do investimento de peso e tutor da industrializao.
No se trata aqui de reescrever exaustivamente essa histria. Mas ape-
nas de enfatizar alguns traos para deixar claro que o Brasil se transformou
em uma sociedade muito mais aberta, democrtica e descentralizada, com
uma indstria heterognea, relativamente integrada e, em muitas reas, ca-
paz de competir inclusive mundialmente. Precisamente por isso, as polticas
industriais de hoje, se quiserem alcanar os resultados que anunciam, preci-
sam ter uma qualidade diferente das anteriores.
Para no ficar prisioneiro do passado, o Brasil precisa aproximar rapi-
damente sua indstria das melhores prticas internacionais, criar marcos re-
gulatrios propcios ao desenvolvimento tecnolgico, de modo que suas em-
presas consigam endogeneizar os avanos e desenvolver inovaes para mu-
dar o patamar de seus sistemas de produo.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 21
Como enfatizou Stiglitz, structural transformation is always taking
place because of changes in technology, in comparative advantage, and in the
global economy. Essas dimenses marcam o desenvolvimento industrial mo-
derno como um processo contnuo de inovao tecnolgica e de diversificao
econmica. Ainda assim, para que esse processo tenha xito, os pases preci-
sam migrar seu capital humano e recursos financeiros escassos dos setores de
baixo desempenho para as reas e complexos de alta produtividade. Para isso,
so necessrias polticas pblicas com foco em inovao, articuladas com a
iniciativa privada, uma vez que the process to be efficient, coordination is-
sues and externalities issues must be addressed. Markets typically do not man-
age such structural transformations on their own well (Stiglitz et alli, 2013,
p.10).
Transformaes dessa qualidade exigem investimento constante em
Educao, Cincia e Tecnologia (C&T), assim como em canais institucionaliza-
dos de comunicao permanente entre as estruturas produtivas e os centros
geradores de conhecimento e formadores de mo de obra qualificada, sem os
quais dificilmente os avanos obtidos sero traduzidos em produtos reais, com
insero na economia.
Assim, as polticas pblicas podem e devem ser concebidas para aumen-
tar a produtividade geral da sociedade e, em especial, de cientistas, tcnicos e
engenheiros que atuam nas empresas e em centros de pesquisa, abandonando
de vez as prticas dirigistas e centralizadoras que marcaram o nosso passado.
Isso significa que a definio de objetivos e metas deve envolver responsabili-
dades compartilhadas entre o setor pblico e o privado, a comear pelo esforo
conjunto de construo de uma verdadeira cultura da inovao, que rejeite a
acomodao e a tutela do Estado como nico caminho para se evitar o desper-
dcio de recursos e a preservao de prticas empresariais ineficientes.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 22
No quadro a seguir apresentamos um resumo das mudanas que envol-
veram as polticas industriais no pas nos ltimos 60 anos:
Quadro 1: Contexto, Vetores e Viso das Polticas Industriais no Brasil
Perodo 1950-1980 1990-1999 2001-2010
Contexto Substituio de im-portaes
Dirigismo estatal
Proteo comercial
Regime autoritrio
Democracia restrita
Tecnologias da In-formao
Estado regulador
Economia mais aberta
Regime democr-tico
Estabilidade e diminuio das desigualdades
Crescimento econmico
Estado indutor da transfor-mao industrial
Vetores Industrializao Eficincia e quali-dade
Inovao
Viso so-bre Tec-
nologia e Inovao
Industrializao pro-moveria concorrncia, gerao de tecnologia e elevao da competi-
tividade
Competio e aber-tura econmica ge-
rariam empresas mais competitivas
e inovadoras
Tecnologia e inovao nas empresas dependem de pol-
ticas pblicas de incentivo
Fonte: Adaptado de Miranda e Mirra, 2012.
At 2004, apesar das diferenas de polticas e regimes econmicos ao
longo do tempo, tecnologia e inovao foram concebidas muito mais como
subproduto da atividade econmica ou do funcionamento regular dos merca-
dos. A competio empresarial, no mercado domstico ou internacional, seria
o motor do desenvolvimento de inovaes tecnolgicas. Concepes desse tipo
e porte, certamente ajudam a entender parte do atraso tecnolgico brasileiro
e o ainda baixo desempenho da nossa indstria.
A inflexo nessa trajetria comearia a ocorrer a partir de 2004, com a
retomada das iniciativas pblicas relacionadas s polticas industriais e, em
especial, com o foco explcito na inovao e desenvolvimento tecnolgico. Mas
essa trajetria no seguiu uma linha ascendente nem ocorreu de modo linear.
O foco na inovao e desenvolvimento tecnolgico, essencial para alterao do
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 23
patamar do sistema produtivo, nem sempre obedeceu aos enunciados e obje-
tivos fixados pelas polticas que, impreterivelmente, declararam o foco na ino-
vao e tecnologia.
As perspectivas reais, porm, mostraram realidade distinta. No so-
mente por falhas de execuo, mas a natureza mesma das polticas industri-
ais, que envolveram seus objetos, metas, prioridades e alocao de recursos,
foram objeto de longas e ainda inconclusivas polmicas; e isso dentro do go-
verno, nas agncias pblicas, nas representaes de classe e movimentos em-
presariais. importante registrar que a polmica sobre o desenho das polticas
est diretamente relacionada ao diagnstico sobre o estgio da atividade in-
dustrial, do lugar que a indstria pode (e precisa) ocupar no cenrio da econo-
mia nacional e internacional e sobre a atuao e competncia institucional
que devem ter agncias especializadas, como Banco Nacional do Desenvolvi-
mento Econmico e Social (BNDES), Financiadora de Estudos e Projetos (Fi-
nep), Agncia Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Instituto Naci-
onal de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), Instituto Nacional da
Propriedade Industrial (INPI), Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (An-
visa), Agncia Brasileira de Promoo das Exportaes (Apex), na implemen-
tao dos programas de governo. o que veremos a seguir.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 24
PARTE II. POLTICAS INDUSTRIAIS: TRAJETRIA RECENTE NO BRASIL
1. A inovao como poltica de Estado
Assim como ocorreu com a cincia brasileira, a preocupao de se estru-
turar um sistema de inovao recente. Foi somente nos ltimos 20 anos que
o Brasil construiu uma arquitetura relativamente robusta de inovao, que se
beneficiou do impulso coordenado pelo Ministrio da Educao (MEC) para a
formao de tcnicos e engenheiros especializados, ganhou fora com a cria-
o dos fundos setoriais coordenados pelo MCTI e executados legalmente
pela Finep , voltados para o financiamento da pesquisa e desenvolvimento
tecnolgico, e adquiriu maior maturidade com a implantao de uma rede de
instrumentos, estmulos e incentivos econmicos para desenvolvimento tec-
nolgico.
Assim, na segunda metade dos anos 1990, ainda no governo Fernando
Henrique Cardoso, foi registrado um grande avano com a engenharia insti-
tucional dos Fundos Setoriais (com destaque para o Fundo Verde-Amarelo, de-
dicado inovao) e a criao do Fundo Nacional de Desenvolvimento Cient-
fico e Tecnolgico (FNDCT), que seria regulamentado em lei especial de 2007,
que ser apresentado na Parte III.
A partir de 2003, o Brasil deu passos mais rpidos para a articulao de
um sistema mais integrado e coerente para a induo da inovao nas empre-
sas nacionais, com destaque para a aprovao da Lei da Inovao (Lei n
10.973/2004) e da Lei do Bem (Lei n 11.196/2005), que viabilizaram incentivos
P&D semelhantes aos utilizados pelos pases avanados. As mudanas no
marco legal e regulatrio abriram a possibilidade de se estruturar programas
pblicos de subveno econmica (operada pela Finep), voltada para apoiar,
via FNDCT, projetos de alto risco tecnolgico; mais ainda, viabilizaram uma
rede de subsdios para a fixao de pesquisadores nas empresas (Conselho Na-
cional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico CNPq e Finep), a disse-
minao de programas de financiamento inovao de capital empreendedor
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 25
(Finep, BNDES e CNPq), assim como um arcabouo mais propcio interao
universidade-empresa. Nesse perodo, as alteraes do marco legal ocorreram
em paralelo a um crescimento acentuado dos recursos e do investimento em
inovao e tecnologia. Por exemplo, o dispndio em P&D no pas apresentou
crescimento de 1,01% do PIB em 2003 para 1,24% do PIB em 2013 (MCTI, 2015).
O pas deu passos no rumo certo quando resolveu retomar as polticas
industriais em 2003-2004. Mas escorregou ao perder o foco da inovao, gene-
ralizar subsdios e aumentar a proteo para setores que no contribuem para
o pas se aproximar da fronteira mundial do desenvolvido produtivo com base
em tecnologia.
A retomada das polticas industriais ativas deu-se com a Poltica Indus-
trial Tecnolgica e de Comrcio Exterior (PITCE) em 2004, cujo foco estava ori-
entado para a inovao tecnolgica e em diretrizes para dar suporte s estra-
tgias de diferenciao de produtos e servios nas empresas. No entanto, for-
oso registrar, a PITCE no conseguiu efetividade no seu desempenho e seus
desdobramentos tiveram soluo de continuidade. Frgil do ponto de vista de
sua dotao oramentria e dos instrumentos para a implementao de seus
planos, a PITCE teve o mrito maior de colocar a inovao no centro dos desa-
fios da indstria brasileira. Ainda que tardiamente em relao ao mundo, o
Brasil ensaiava os primeiros passos para sintonizar a indstria com as novas
tendncias tecnolgicas mundiais.
Nos anos 90, a desconstruo do Estado desenvolvimentista no havia
encontrado desenlace positivo na traduo de um novo modelo de desenvolvi-
mento. Com exceo dos programas de qualidade, a indstria seria exposta
competio interna e externa sem instrumentos de apoio, preparo e mo de
obra qualificada. De fato, a PITCE surgiu como uma via de sada, ainda que pe-
quena, para a crise da nossa indstria, cujos sinais de atraso contrastavam
com o avano da microeletrnica, da computao e das TICS nos pases avan-
ados e mesmo em outros, que at a dcada de 1970 mostravam-se mais atra-
sados que o Brasil, como a Coria do Sul e Taiwan.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 26
Em 2008, uma nova poltica industrial seria anunciada, a Poltica de De-
senvolvimento Produtivo (PDP), com foco principal no aumento do investi-
mento agregado. Correta do ponto de vista da economia, a PDP ofuscou a sina-
lizao aberta pela PITCE e deu poltica industrial contornos tradicionais,
com o uso intensivo de subsdios e de mecanismos de proteo contra a con-
corrncia internacional. A PDP, executada basicamente pelo BNDES, no es-
tava estruturada para diversificar o investimento, nem para aumentar a P&D
nas empresas. O foco genrico da PDP levaria o BNDES a priorizar nada menos
do que 24 setores da economia praticamente todos sem conexo com as di-
nmicas internacionais.
Dos esforos da PDP, porm, nasceria o Programa de Sustentao do In-
vestimento (PSI, 2009), estruturado diretamente pelo Tesouro Nacional, que
foi essencial para combater os efeitos da crise econmica originada nos Esta-
dos Unidos em 2007-2008, pelo menos at 2011.
O Plano Brasil Maior (PBM), de agosto de 2011, deu continuidade ten-
dncia de retomada de prticas tradicionais, j prenunciada pela PDP. Mais do
que isso, o PBM nasceu com o PSI em seus limites de efetividade. Mesmo assim,
o PSI foi o principal suporte para um programa de desoneraes generalizadas
para o setor produtivo, apresentado como a poltica industrial do primeiro go-
verno Dilma. Apesar de aes relevantes, como a concesso de crdito subven-
cionado e isenes fiscais para empresas inovadoras, essas iniciativas ocupa-
ram espao marginal na dotao da PBM. Seu foco no era definitivamente a
inovao, nem a priorizao de reas de futuro ou mesmo reas de maior di-
namismo do ponto de vista tecnolgico. Sua formulao, coordenada direta-
mente pelo Ministrio da Fazenda, foi marcada por uma preocupao de hori-
zontalidade em uma generosa poltica de subsdios que, alm das questes fis-
cais, pouco contribuiu para superar a ineficiente capacidade instalada. A ex-
ceo seria o Inovar Auto que, apesar dos problemas mais estratgicos, surpre-
endeu positivamente, como veremos adiante.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 27
A partir de 2011, as novas iniciativas implementadas representaram
com todas as suas fragilidades uma nova fronteira para as polticas indus-
triais modernas. Com recursos volumosos, comparativamente com o passado
ainda que modestos se tomados pelo prisma da necessidade as iniciativas
pblicas voltadas para inovao se esforaram para sintonizar nossa indstria
com as tendncias mundiais.
O Programa Cincia Sem Fronteiras (Coordenao de Aperfeioamento
de Pessoal de Nvel Superior Capes e CNPq, MEC e MCTI) e o Programa Nacio-
nal de Acesso Escola Tcnica (Pronatec, Capes-MEC) enfatizaram a necess-
ria formao de recursos humanos qualificados para a inovao nas empre-
sas. Como forma de diversificar ainda mais o sistema de inovao, o Governo
Federal criaria em 2013 a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovao Industrial
(Embrapii), uma Organizao Social (OS) voltada para apoiar servios tecnol-
gicos para as empresas industriais.
Essas trs iniciativas merecem ser aperfeioadas, pois, alm de enrique-
cerem o sistema de inovao, representaram, com o Plano Inova Empresa
(2013), o que de melhor e mais relevante o Brasil construiu para alm do arca-
bouo dos tradicionais instrumentos de polticas pblicas de formao de re-
cursos humanos e desenvolvimento tecnolgico.
O Programa Inova Empresa (PIE), lanado pelo governo em maro de
2013, foi o primeiro na histria do pas inteiramente voltado para o apoio
inovao tecnolgica. Representou enorme avano do ponto de vista do vo-
lume de investimento destinado inovao (R$ 32,9 bilhes), da articulao
interministerial (12 ministrios foram diretamente envolvidos, alm da Finep
e BNDES, as duas principais agncias envolvidas com sua execuo) e da qua-
lidade dos instrumentos utilizados e que, de modo indito, foram parcial-
mente integrados com destaque para o crdito, a subveno econmica, re-
cursos no-reembolsveis para Institutos de Cincia e Tecnologia (ICTs) e in-
vestimento em empresas de forma direta ou por meio de fundos.
O xito do Inova Empresa pavimentou o caminho para a elaborao do
Programa Nacional de Plataformas do Conhecimento, lanado por decreto
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 28
pela Presidente da Repblica em junho de 2014. Apesar de ainda no ter sido
implantado, foi criado nos moldes das melhores prticas internacionais e es-
truturado para viabilizar no Brasil o uso das encomendas tecnolgicas3 a partir
de demandas do Governo Federal para encontrar solues de problemas soci-
ais e econmicos de alto risco e alta complexidade cientfica e tecnolgica.
A seguir, detalharemos as propostas e as aes efetuadas por esses pro-
gramas, com o objetivo de salientar xitos e apontar carncias do apoio pblico
inovao e competitividade, de modo a identificar os principais desafios e o
lugar do Estado como financiador e articulador social.
3 A figura das encomendas tecnolgicas, prevista na Lei de Inovao, raramente utilizada,
dados questionamentos legais para sua aplicao.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 29
2. A Poltica Industrial Tecnolgica e de Comrcio Exterior(PITCE)
A PITCE foi anunciada em novembro de 2003 e lanada oficialmente
pelo Presidente da Repblica, em maro de 2004, com trs pontos de inflexo
na trajetria brasileira. Primeiro, a PITCE marcou a volta das polticas indus-
triais no pas, aps um hiato de mais de 25 anos. Em segundo lugar, uma arti-
culao rara entre vrios atores do governo, a comear pelo forte envolvi-
mento do Ministrio da Fazenda e do Ncleo de Assuntos Estratgicos da Pre-
sidncia da Repblica (NAE). A PITCE, no interior do governo, foi discutida e
O que : Primeira poltica industrial depois de um longo perodo de des-
crena no papel da ao do Estado para elevao da competitividade da
indstria. A PITCE caracterizou-se como poltica distinta das implemen-
tadas durante o desenvolvimentismo. Com foco em setores dinmicos,
dotou-se de uma viso de longo prazo para a criao de setores industri-
ais de alta tecnologia.
Perodo: 2004-2006.
Objetivos Principais: Colocar a inovao como foco da ao do Estado;
melhoria das exportaes e aumento da participao brasileira no co-
mrcio internacional via produtos de alta tecnologia; internacionaliza-
o das empresas industriais; aumento do investimento privado em
P&D; atrao de centros de internacionais de P&D.
Principais Instituies Participantes: Casa Civil (CC); Ministrio do De-
senvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior (MDIC); Ministrio da Fa-
zenda (MF); Ncleo de Assuntos Estratgicos da Presidncia da Repblica
(NAE); Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA); Banco Nacional
de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES); Agncia de Promoo
das Exportaes (APEX); Conselho Nacional de Desenvolvimento Indus-
trial (CNDI) e Agncia Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI),
os dois ltimos criados com a PITCE.
Fontes de financiamento e instrumentos: FNDCT, Tesouro Nacional,
FAT, BNDES, Finep.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 30
aprovada pela Cmara de Poltica Econmica, coordenada pelo Ministro da Fa-
zenda. E, por fim, a inovao como eixo da poltica industrial, diferenciando-
se do desenvolvimentismo e da inao do Estado nos anos 90.
A PITCE descortinou novas modalidades de poltica industrial, com base
na rejeio do protecionismo e diferenciando-se das medidas ocasionais e fra-
gmentadas da dcada de 1990. Na base de seu diagnstico residia a perda de
competitividade da indstria e a necessidade de acelerar os processos de ino-
vao, via a diferenciao de produtos e processos, bem como a internaciona-
lizao das empresas brasileiras.
Na sua exposio de motivos, pode-se ler que:
O desenvolvimento de novos produtos e usos possibilita a dis-
puta e a conquista de novos mercados, acentuando o lugar cada
vez mais importante que ocupa a capacitao para inovao in-
dustrial. necessria uma alocao crescente de recursos p-
blicos e privados para esse campo, para Pesquisa e Desenvolvi-
mento (P&D), para a alta qualificao do trabalho e do trabalha-
dor e para a articulao de redes de conhecimento. Essa intera-
o de diferentes reas do saber, de mtodos e alvos constitui
uma das marcas fundamentais da Poltica Industrial, Tecnol-
gica e de Comrcio Exterior. (PITCE, 2003, p. 4).
No incio do governo Lula, havia praticamente um consenso sobre a es-
tagnao da indstria e que formas novas de se pensar a poltica industrial
eram necessrias. Durante a dcada de 1990, no houve esforos sistemticos
para se formalizar uma robusta poltica industrial. O Governo Federal, a partir
de 2003, considerou fundamental que as instituies de Estado fossem reequi-
padas e capacitadas para elaborar e implementar polticas pblicas de quali-
dade. O foco em inovao colocava desafios enormes, j que o aparato institu-
cional brasileiro para polticas industriais, ainda que inativo por anos, ainda
se encontrava permeado por conceitos e prticas de outras pocas. No por
acaso, a integrao e coordenao de diversos rgos pblicos e a ampliao
do dilogo com o setor privado eram grandes desafios colocados para a PITCE.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 31
Ao mesmo tempo, era inegvel que o Brasil possua uma base industrial
consolidada, ainda mais se comparada com outros pases emergentes; alm
disso, estavam em funcionamento vrias modalidades de financiamento que
poderiam ser direcionados para a inovao, a comear dos Fundos Setoriais,
instituies especializadas como o Inmetro e INPI, alm de agncias como o
BNDES e a Finep.
Trs pilares sustentavam a estrutura da PITCE:
1. Linhas de ao horizontais: a) inovao e desenvolvimento tecno-
lgico; b) insero externa; c) modernizao industrial; d) melho-
ria do ambiente institucional e ampliao da capacidade e escala
produtiva;
2. Setores estratgicos: a) semicondutores; b) software; c) bens de ca-
pital; d) frmacos e medicamentos;
3. Atividades portadoras de futuro: a) biotecnologia; b) nanotecnolo-
gia; c) biomassa e energias renovveis.
Os setores estratgicos englobavam as reas mais preparadas tecnologi-
camente e com capacidade de oferecer retornos rpidos para as cadeias nas
quais estavam inseridas. Essas reas se diferenciavam do conjunto da inds-
tria porque investiam mais em P&D, eram mais dinmicas e contavam com
uma densa cadeia de fornecedores.
As atividades portadoras de futuro identificavam e recomendavam in-
vestimentos de longa durao, j que envolviam aprendizagem e maior tempo
de maturao. A referncia era para setores de alta tecnologia com capacidade
de competir internacionalmente. A escolha desses setores se deu com base em
estudos internacionais (executados pelo Centro de Gesto e Estudos Estratgi-
cos CGEE, e pelo NAE) prevendo a aproximao com a fronteira do conheci-
mento e das prticas industriais mais avanadas.
O debate pblico sobre a PITCE trouxe luz do dia a inadequao das
instituies responsveis pelo desenvolvimento tecnolgico, assim como as
imprecises e lacunas do marco regulatrio-legal, criados para outra era,
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 32
quando a industrializao estava no centro das preocupaes. A mudana de
foco e a necessria transformao da base produtiva deparavam-se com um
forte despreparo institucional. Essa realidade tornava-se flagrante quando o
debate tocava em dimenses, disciplinas e aspectos intangveis como softwa-
res, dados, marcas, internacionalizao de ativos, propriedade intelectual,
dentre outros ou reas transversais principalmente a biotecnologia e a na-
notecnologia campos frteis para a inovao, e que no podiam prescindir
de regramento adequado para se desenvolver. Desse ponto de vista, impor-
tante registrar que na esteira das aes da PITCE, o Congresso Nacional apro-
varia a Lei de Inovao e a Lei do Bem, que deram impulso ainda maior ao es-
foro pela inovao, marcando o incio da modernizao do sistema regulat-
rio- legal brasileiro.
Em que pese o moderno aparato conceitual e da indita integrao da
Poltica Industrial com Tecnologia e Poltica Exterior, a PITCE no alcanou
efetividade. Estudos do IPEA acentuaram as virtudes da poltica (cf. De Negri
e Salerno, 2005), dentre as quais o estabelecimento de relaes dinmicas en-
tre inovao e desenvolvimento econmico. Evidncias reveladas pelo IPEA
mostraram que as estratgias de inovao e a diferenciao de produto e pro-
cesso eram centrais para o desenvolvimento do pas, pois as firmas mais pro-
dutivas, mais competitivas e que melhor se inseriam internacionalmente
eram as que inovavam e diferenciavam produto. Por isso mesmo, as polticas
pblicas mais adequadas eram as que apoiavam fortemente a inovao e dife-
renciao de produto, o que se identificava com os objetivos centrais da PITCE.
Mesmo assim, sem a criao de programas na escala e na intensidade
que o Brasil precisava, a PITCE ajudou a consolidar um diagnstico sobre a in-
dstria brasileira, tanto nos rgos de governo quanto entre empresrios, e os
rumos que seriam retomados com maior intensidade dez anos depois, com ini-
ciativas mais consistentes, em especial com o Plano Inova Empresa.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 33
3. A Poltica de Desenvolvimento Produtivo (PDP)
A crise iniciada no sistema financeiro dos EUA ofereceria timas opor-
tunidades para o Brasil, em especial no que se refere absoro de tecnologia
(via compra de ativos ou joint ventures) ou seu desenvolvimento domstico
(com recursos e instrumentos para P&D empresarial). O Brasil, no entanto, op-
tou por dar passos de perfil menos ousados e retomar aes mais tradicionais
de poltica industrial, como a generalizao de subsdios, medidas defensivas
da indstria e isenes fiscais. O foco na inovao foi o elo que se perdeu, ainda
que mantido no discurso de apresentao da PDP.
Lanada em maio de 2008, como mais uma medida implementada pelo
Governo Federal para minimizar os efeitos da crise econmica, a PDP seguiu
O que : Poltica industrial que buscou o aumento do investimento
na economia, classificou suas atividades centrais em trs grandes
aes es-tratgicas e priorizou 24 setores para melhorar sua
competitividade. A PDP reuniu um conjunto de incentivos voltados
para dinamizar setores no mercado interno e aproveitar
oportunidades do comrcio internacional.
Perodo: 2008-2010.
Objetivos Principais: Sustentar o crescimento econmico iniciado em
2004. Elevar a capacidade de inovao. Fortalecer as micro, pequenas e
mdias empresas (MPE). Apoiar a integrao Brasil-frica e consolidar o
Mercosul. Conquistar novos mercados. Melhorar o posicionamento das
marcas brasileiras. Ampliar o acesso da populao a servios bsicos.
Principais Instituies Participantes: MDIC, MF, BNDES, ABDI.
Fontes de financiamento e instrumentos: Reduo do prazo de
apropriao de crditos PIS e COFINS. Eliminao do IOF nas operaes
de crdito do BNDES, FINAME e FINEP. Reduo do IPI em setores seleci-
onados. Financiamentos via crdito, subveno econmica e incentivos
fiscais. Certificao de metrologia, promoo comercial e propriedade
intelectual.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 34
apenas formalmente as trilhas abertas pela PITCE. Seu foco, instrumentos e
forma de atuao divergiam das propostas avanadas pela PITCE. Houve dife-
rena grande na priorizao de setores: a PITCE havia selecionado poucos se-
tores prioritrios, todos com potencial de retorno em termos de competitivi-
dade internacional e de capacitao tecnolgica das empresas; na PDP, foram
muitos os setores escolhidos como prioridade, o que dilua ainda mais a atua-
o das agncias pblicas; e ainda, a base de sustentao da PDP estava nas
linhas de renncia fiscal que atendiam praticamente o conjunto da indstria
nacional.
Crticas pontuais PITCE ressaltaram o carter de carta de princpios da
poltica industrial, pois no havia uma manifesta determinao de aes con-
cretas e metas a serem atingidas. Sendo assim, um plano de aes com objeti-
vos de curto prazo foi desenvolvido pelo BNDES, de modo a dar maior visibili-
dade e efetividade s propostas. Assim, as aes se dividiram em:
1. Nvel Sistmico: Medidas que afetavam diretamente o desempe-
nho da estrutura produtiva, priorizando aes nos planos fiscal e
tributrio.
2. Destaques Estratgicos: Fortalecimento das micro e pequenas
empresas. Expanso das exportaes; integrao produtiva com a
Amrica Latina e Caribe, com foco inicial no Mercosul; integrao
com a frica; descentralizao espacial da produo do Pas; e pro-
duo ambientalmente sustentvel.
3. Programas Estruturantes: a PDP se contraps eleio de setores
como realizado pela PITCE. As aes voltaram-se para equacionar
necessidades de cada setor, no dilogo entre governo e empres-
rios. Nesse ponto, a PDP anunciou trs frentes de atuao: Progra-
mas mobilizadores de reas estratgicas, Programas para consoli-
dar e expandir a liderana e Programas para fortalecer a competi-
tividade. (PDP, 2008, p.15-16)
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 35
O documento oficial da PDP registrava que havia um ambiente econ-
mico favorvel, com altas reservas em dlar, reduo da inflao e aumento
do nmero de empregos gerados, mas que era preciso estimular o aumento da
taxa de investimento privado, de modo a gerar um efeito em cascata por toda
a estrutura produtiva. Por isso, cada um dos setores contou com uma enge-
nharia fiscal para equacionar a reduo de tributos e as desoneraes dos se-
tores que aumentassem o investimento.
Com essas diretrizes, a PDP estabeleceu Quatro Metas-Pas, para 2010:
1. Aumentar a taxa de investimento da economia para 21% do PIB.
2. Ampliar os investimentos privados em P&D para 0,65% do PIB.
3. Ampliar para 1,25% a participao brasileira nas exportaes
mundiais.
4. Aumentar em 10% o nmero de MPE exportadoras.
A caracterstica marcante da PDP foi a multiplicidade de aes e objeti-
vos, o que diminuiu sua identidade poltica e aumentou as dificuldades de go-
vernana, j presentes na PITCE.
Formulada para dar sustentabilidade ao ciclo de expanso da economia
a PDP distanciou-se das concepes modernas de poltica pblica, preocupa-
das em levar a indstria a buscar a diminuio da distncia com a indstria
avanada. Com isso, a PDP deixou passar a oportunidade histrica de interna-
cionalizar as empresas brasileiras por conta da conjuntura de crise global, que
disponibilizava empresas relativamente baratas para serem adquiridas no ex-
terior.
O lanamento do PSI em 2009 apenas confirmaria tendncia de colocar
a inovao no mesmo nvel de outros gargalos da economia. De fato, toda a
carteira do BNDES passou a ser financiada indistintamente por recursos sub-
vencionados pelo Tesouro Nacional. Na prtica, as linhas do PSI foram formu-
ladas para atender a carteira do BNDES e, em particular, para a expanso do
Finame. O foco na formao bruta de capital fixo esteve na raiz da formulao
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 36
de uma poltica industrial que acreditava, como nos anos 50 e 60, que o cres-
cimento do investimento geraria naturalmente a inovao e o desenvolvi-
mento tecnolgico.
O PSI foi o maior programa de suporte ao investimento privado na his-
tria do Brasil. No entanto, mesmo com fortes incentivos, a meta de elevao
do investimento para 21% do PIB jamais foi atingida. O mesmo se deu com a
meta de elevao do P&D empresarial de cerca de 0,5% para 0,65% do PIB. Ape-
sar de constar como uma linha do PSI em 2010, nenhuma contratao nesta
linha seria feita at 2011, quando ocorreu a entrada da FINEP como operadora
do PSI.
O PSI e a PDP marcaram a consolidao do predomnio do BNDES na exe-
cuo da poltica industrial. Os dados sobre os desembolsos diretos e indiretos
do banco4 no deixam dvidas: em 2007, o banco movimentou cerca de R$ 65
bilhes; em 2008, este nmero subiu para R$ 91 bilhes e atingiu em 2014
cerca de R$ 188 bilhes. O ano de maior aporte de recursos foi 2013, com cerca
de R$ 190 bilhes em desembolsos. Percebemos um crescimento considervel
nas movimentaes do BNDES, o que consistente com sua maior proeminn-
cia na execuo e coordenao da poltica industrial.
Por seu carter abrangente, com tratamento marginal da inovao, a
PDP foi uma variante de ativismo estatal que, em larga medida, baseou suas
propostas em desoneraes, contando que a reduo da carga tributria e au-
mento de incentivos fiscais levaria a um aumento do investimento por parte
do empresariado. Nesse sentido, ainda que contenha avanos em relao
PITCE, principalmente quanto sua efetividade e volume de recursos, a PDP
mostrou-se alheia ao esforo de construo de novas formas de ao para se
alterar o patamar competitivo da economia.
4 Valores referentes ao: Finem, Finame, Carto BNDES, Finame Agrcola, Exim, Mercado de Capitais, No-reembolsvel, Finame Leasing e BNDES Microcrdito. Fonte: www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.html
http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.htmlhttp://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.htmlhttp://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.html
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 37
4. O Plano Brasil Maior (PBM)
O Plano Brasil Maior foi anunciado em agosto de 2011, com muita conti-
nuidade em relao PDP e com os efeitos da crise econmica em pleno anda-
mento. Seu objetivo era o de sustentar o crescimento em contexto econmico
adverso e sair da crise internacional com a economia melhor posicionada do
que em 2008. Sua expectativa era que as mudanas estruturais na indstria
melhorariam a insero do pas na economia mundial. Assim, ainda que o PBM
anunciasse a inovao e a elevao da competitividade como solues para
acelerar o crescimento da economia, as medidas tomadas assemelharam-se
O que : Tal como a PDP, o PBM tinha como intuito o aumento da capacidade
de investimento das empresas por meio de instrumentos como o subsdio e a
renncia fiscal. Em termos prticos, o PBM tinha como objetivo a manuteno
do funcionamento da economia, visando a manuteno do emprego;
Perodo: 2011-2014;
Objetivos Principais: Reduo do custo dos fatores de produo; desenvol-
vimento das cadeias produtivas; induo do desenvolvimento tecnolgico e
qualificao profissional. Promoo de exportaes; defesa do mercado in-
terno; reduo dos efeitos da Crise de 2008; fortalecimento de cadeias produ-
tivas; ampliao e criao de novas competncias tecnolgicas e de negcios;
desenvolvimento das cadeias de suprimento de energias; diversificao das
exportaes; consolidao de competncias na economia do conhecimento
natural.
Principais Instituies Participantes: CC, MDIC, MF, MCTI, MPOG, BNDES,
ABDI
Fontes de financiamento e instrumentos: Financiamentos via crdito,
subveno econmica e incentivos fiscais; desonerao da folha de pagamen-
tos; ampliao do Simples Nacional e do Microempreendedor individual; Pro-
grama de Sustentao do Investimento (PSI); Programas setoriais do BNDES.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 38
mais s polticas anticclicas do que a uma efetiva poltica industrial, como se
pode ver em suas justificativas oficiais:
O Plano adotar medidas importantes de desonerao
dos investimentos e das exportaes para iniciar o enfren-
tamento da apreciao cambial, de avano do crdito e
aperfeioamento do marco regulatrio da inovao, de
fortalecimento da defesa comercial e ampliao de incen-
tivos fiscais e facilitao de financiamentos para agrega-
o de valor nacional e competitividade das cadeias pro-
dutivas.
Ou seja, o PBM ampliou e aprofundou as medidas de desonerao inici-
adas pela PDP, em meio a um cenrio econmico menos favorvel.
O plano contemplou 19 setores industriais e apresentou um conjunto de
instrumentos diferenciados entre fiscais-tarifrios (isenes tributrias e ad-
ministrao das tarifas de comrcio exterior), financeiros (condies favor-
veis de financiamento corporativo, via BNDES e FINEP) e institucionais (defi-
nio de marco regulatrio, constituio de carreiras pblicas e criao de no-
vas condies de ao para o Estado).
No que se refere s aes, o PBM definiu duas dimenses: uma setorial e
outra sistmica. Na primeira, o Governo Federal e o setor privado se encarre-
gariam de desenvolver projetos chamados Diretrizes Estruturantes, quais se-
jam: fortalecimento de cadeias produtivas, ampliao e criao de novas
competncias tecnolgicas e de negcios, desenvolvimento das cadeias de
suprimentos de energias, diversificao das exportaes (mercados e produ-
tos) e internacionalizao corporativa e consolidao de competncias na
economia do conhecimento natural.
Cada uma dessas diretrizes abarcava uma gama de setores especficos
da economia variando os objetivos por grau de consolidao e capacidade de
avano tecnolgico. Na sua concepo original, o plano definiu cinco diretri-
zes. A primeira, de vis protecionista, voltava-se para setores industriais com
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 39
baixssima capacidade de inovao tecnolgica e mais intensamente atingido
pela concorrncia das importaes. Coibir prticas desleais de competio era
objetivo explcito. Esta diretriz orientava aes para setores tradicionais, como
Plsticos, Calados e Artefatos, Txtil e Confeces, Mveis, Brinquedos, Higi-
ene Pessoal, Perfumaria e Cosmticos e Servios de apoio produo.
A segunda, terceira e quarta diretrizes poderiam ser agregadas, do
ponto de vista tecnolgico, em torno de uma mesma finalidade. Essas diretri-
zes voltavam-se para setores mais intensivos em tecnologia com o objetivo de
criar novas competncias em: Bens de Capital, TICs, Qumica-Petroqumica,
Aeronutica e Espacial, Defesa, Sade e Energias (Petrleo e Gs; Bioetanol e
Energias Renovveis). A quarta diretriz tambm tinha foco nas exportaes e
internacionalizao corporativa, e estmulo instalao de centros de P&D no
pas.
A quinta diretriz estava voltada para o comrcio atacadista e varejista,
logstica e servios pessoais direcionados ao consumo das famlias e servios
de apoio produo. Tal como a PDP, a abrangncia desmesurada deu lugar
diluio da ao governamental.
A segunda dimenso do programa, a sistmica, possua dois objetivos: 1.
reduzir custos, acelerar o aumento da produtividade e promover bases mni-
mas de isonomia para as empresas brasileiras em relao a seus concorrentes
internacionais e 2. consolidar o sistema nacional de inovao por meio da
ampliao das competncias cientficas e tecnolgicas e sua insero nas em-
presas. Na prtica, porm, a PBM tambm no priorizou a inovao tecnol-
gica, apesar de ter estabelecido como mote a ideia de inovar para competir,
competir para crescer.
Mesmo com essas deficincias, h um avano em relao s polticas
passadas: no PBM, buscou-se algum tipo de articulao entre a poltica indus-
trial e a poltica de formao como meio da qualificao da mo de obra. Nesse
sentido, o PBM integrou nas suas propostas o Cincia Sem Fronteiras e o Pro-
natec, assim como recomendou a implementao de um programa de fortale-
cimento da engenharia nacional que, infelizmente, no foi levado adiante. Foi
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 40
a primeira vez que a qualificao da mo de obra fazia parte do debate sobre
poltica industrial. Esse um fator decisivo em qualquer economia em busca
da elevao de sua competitividade, ainda mais em pases como o Brasil no
qual a produtividade do trabalho baixa e no cresce desde os anos 1980, como
mostram inclusive estudos realizados pelo IPEA em parceria com a ABDI (DE
NEGRI e CAVALCANTI, 2014; DE NEGRI et. al., 2011).
A qualidade da mo de obra, no entanto, era uma dentre vrias medidas
da dimenso sistmica da PBM. Reproduzindo a falta de foco da PDP, o PBM
previa dez metas para serem cumpridas at 2014:
1. Ampliar o investimento para 22,4% do PIB.
2. Elevar o dispndio de P&D privado para 0,9% do PIB.
3. Aumentar para 65% a participao de trabalhadores com pelo me-
nos o Ensino Mdio.
4. Ampliar o valor agregado nacional para 45,3%.
5. Elevar a indstria intensiva em conhecimento para 31,5% de partici-
pao no total da indstria.
6. Aumentar em 50% o nmero de micro e pequenas empresas inova-
doras.
7. Diminuir o consumo de energia por unidade de PIB industrial (137
toneladas equivalente de petrleo - tep/R$ milho).
8. Diversificar as exportaes brasileiras, representando 1,6% do co-
mrcio mundial.
9. Elevar para 66% a participao nacional nos mercados de tecnolo-
gias, bens e servios para energias.
10. Ampliar o nmero de domiclios urbanos com acesso banda larga
(40 milhes de domiclios).
Algumas dessas metas estavam presentes na PDP e apenas tiveram seus
valores alterados, mesmo com o no cumprimento das metas previstas para
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 41
2010. Essa mesma profuso de objetivos gerou uma lista enorme de aes atri-
budas ao PBM, apresentada pelo governo no seu relatrio final (nos relatos
oficiais so 69 medidas). Na prtica, a recorrente falta de foco e a pulverizao
de aes se fizeram presentes.
O PBM, importante registrar, inovou no desenho do arranjo poltico-
institucional. Criado pelo Decreto n 7.540/2011, o plano contava com coorde-
naes setoriais e sistmicas vinculadas aos eixos da poltica e que respondiam
pela articulao com o setor privado e pela formulao das agendas. Para ge-
renciamento e deliberaes do PBM havia um grupo executivo, um comit ges-
tor e um conselho superior. O grupo executivo era coordenado pelo MDIC e
contava com representantes dos seguintes rgos e agncias: Casa Civil, Mi-
nistrio Pblico (MP), MF, MCT, ABDI, BNDES e FINEP.
O comit gestor era formado pelos titulares dos seguintes rgos: MDIC,
Casa Civil, MF, MPOG e MCT. Alm disso, contava ainda com o CNDI, rgo de
aconselhamento superior da poltica industrial, composto por catorze mem-
bros da sociedade civil, indicados pela presidente da Repblica, alm de treze
ministros de Estado e pelo presidente.
Esse aparato pode ter tornado as atividades de gesto complexas, conse-
quentemente, dificultando a formulao e mesmo o acompanhamento das
aes realizadas. No caso do PBM, tal aparato fragmentou decises e deu es-
pao para ateno excessiva a detalhes pouco significativos de diversas fren-
tes e interesses, por exemplo. O PBM sofreu de outros problemas, como uma
estratgia de incentivos sem contrapartidas dos beneficirios dos subsdios e
o aceite demasiado de lobbies empresariais de diferentes setores, o que difi-
cultou o estabelecimento de prioridades poltica.
Por fim, h trs instrumentos que devem ser ressaltados e que merecem
uma ateno especial: i) polticas creditcias, em particular a continuidade do
PSI, com ampliao e aumento de seus incentivos; ii) o Inovar Auto; e iii) as
isenes tributrias generalizadas. A seguir, discutimos brevemente as duas
primeiras: o PSI e o Inovar Auto.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 42
4.1. O Programa de Sustentao do Investimento (PSI)
Uma parcela importante das medidas tomadas a partir de 2008 foi uma
resposta desacelerao da economia global. Muitos governos se viram diante
da necessidade de intervir em suas economias, justamente para evitar que os
impactos econmicos da crise se tornassem ainda mais desastrosos. No Brasil,
o PSI ocupou lugar especial.
Como programa, concedeu subveno econmica a empresas, na moda-
lidade de equalizao da taxa de juros, para operaes de financiamento do
BNDES e, a partir de 2011, tambm da FINEP, neste caso, somente para projetos
de inovao tecnolgica (MP 465, junho de 2009, convertida na Lei 12.096 do
mesmo ano).
Apesar de o governo ter identificado corretamente a necessidade de ser
mais ativo na reao crise internacional, a extenso do regime de incentivos
do PSI para setores que no corriam risco tecnolgico no se refletiu no au-
mento do investimento privado, conforme o desejado. Ou seja, o investimento
pblico, neste caso, pode ter sido um substituto e no uma alavanca para o in-
vestimento privado.
No seu lanamento, o PSI possua diversas linhas de financiamento com
taxas de juros subsidiadas e cada uma dessas linhas contava com taxas pr-
prias de juros, que variavam de acordo com as caractersticas do objeto a ser
apoiado. Chama ateno a ausncia de uma linha especfica para inovao tec-
nolgica desde o incio, apesar do discurso pr-inovao.
O PSI vigorou a partir de 2009 e, ao longo do tempo, sofreu diversas ca-
libraes em suas linhas e taxas. Ou seja, o tipo e a intensidade do fomento
adotado pelo programa foram ajustados de acordo com a conjuntura e as difi-
culdades de cada setor, provocando sistemtica busca das empresas pelas li-
nhas mais atraentes.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 43
Ser que as alteraes realizadas foram apropriadas? A variao do sub-
sdio se deu na intensidade adequada? Do ponto de vista da inovao, a pri-
meira resposta negativa. O roteiro abaixo mostra os motivos:
1. O programa foi lanado sem uma linha especfica de inovao;
2. Quando criada, a linha de inovao ficou inativa at 2011;
3. A FINEP foi includa como agente operador do PSI somente em
2011, quando ento a linha de financiamento inovao comeou
a operar (em 2010 a Finep era considerada agente financeiro do
BNDES. E mesmo assim, no conseguiu realizar nenhum desem-
bolso por conta dos trmites burocrticos impostos pelo Banco);
4. Em 2012, o financiamento pelo PSI de mquinas, mquinas agr-
colas, caminhes e nibus e outros equipamentos de transporte
passou a operar com taxa fixa de 2,5% a.a, mais baixa que a linha
de inovao, que operava com 3,5%, com os mesmos prazos de ca-
rncia e de amortizao;
5. Na sequncia, as linhas para a compra de silos foram disponibili-
zadas a 2,5% a.a., com 4 anos de carncia e 12 anos para amortiza-
o, em contraste com a linha para inovao, que permaneceu a
3,5% a.a, 3 anos de carncia e 10 para amortizao.
Ou seja, era mais vantajoso financiar caminho do que fazer inovao.
Entre renovar a frota de caminhes com crdito mais barato do que realizar
projetos de inovao com maior risco tecnolgico, as empresas optaram pelo
crdito mais barato e no fizeram as inovaes que precisavam fazer. O resul-
tado dessa variao sem critrio foi um imenso efeito deslocamento.
O PSI alcanou a cifra de R$ 472 bilhes em 2014. Ou seja, em seis anos o
programa cresceu dez vezes. No comeo, o PSI abrangia sete linhas distintas,
com taxas de juros que variavam entre 3,5% a 7,5% para o beneficirio final do
financiamento, com prazos de at 180 meses para retorno do crdito, em que
at 36 meses podia ser concedido a ttulo de carncia.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 44
As linhas que possuam maiores recursos eram as voltadas para a pro-
duo e aquisio de caminhes, nibus, chassis, reboques e similares, que re-
presentaram 44% do montante total (linha 1) e a linha voltada para aquisio
dos demais bens de capital no associados e capital de giro associados a esses
bens (linha 2), que representavam 28% do montante de recursos. Para a inova-
o, ficaram disponveis apenas 5% dos recursos, mediante duas linhas. As de-
mais linhas eram voltadas para o comrcio exterior e outra equivalente linha
1, mas voltada s pessoas fsicas e empresas individuais ou de pequeno porte.
Nas linhas de inovao, a primeira apresentava taxa ao beneficirio fi-
nal de 4,5%, enquanto a segunda oferecia taxa mais baixa dentre todas as de-
mais linhas do programa, ou seja, de 3,5% a.a. Isto , a taxa mdia ponderada
pelo valor disponibilizado para as taxas de inovao era de 4%, inferior a qual-
quer outra taxa ponderada das demais linhas e, ainda assim, muito prxima
das demais linhas do PSI.
O crescimento dos recursos do PSI foi de 375% entre 2009 e 2011, mas o
valor destinado aos projetos de inovao cresceu apenas 50%. Mesmo com esse
crescimento, a participao relativa das linhas de inovao caiu consideravel-
mente, passando de 5% para 1,4% do montante total.
A partir da entrada da FINEP como operadora do PSI, o enquadramento
de projetos nas linhas de inovao passou a crescer consistentemente. Assim
a disponibilidade das linhas de inovao precisou ser ampliada em 2011, pas-
sando de R$ 3 bilhes no total para R$ 6,2 bilhes. Ainda assim, a participao
relativa das linhas de inovao permaneceu mais baixa que no incio do pro-
grama foi de 1,4% para 3% do montante total passvel de equalizao.
J em 2012, algumas linhas do PSI foram desdobradas e outras conden-
sadas. As taxas de inovao, por sua vez, sofreram um revs e passaram a per-
der o diferencial de atrao em relao s outras linhas. Em 2012, o volume de
recursos do PSI passou para R$ 227 bilhes, mas o total disponibilizado para
inovao permaneceu o mesmo. As taxas de juros das linhas de inovao em
2013 tiveram uma reduo, mas no o suficiente para tornar as taxas atrativas
em relao a outras linhas de bens de capital.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 45
Em 2014, o PSI saltou para R$ 372 bilhes, ou seja, uma ampliao de R$
60 bilhes. Desta ampliao, apenas R$ 2 bi foram concedidos para as linhas
de inovao, que passa a totalizar um estoque (considerando os exerccios an-
teriores) de R$ 9,2 bilhes concedidos para apoio a projetos de inovao desde
o incio do PSI. Esse montante representou apenas 2,4% de todo o recurso pas-
svel de equalizao autorizado pelo governo desde o lanamento do pro-
grama.
Essas alteraes seguidas apenas evidenciam que os projetos com risco
tecnolgico no eram considerados aes especiais e diferenciadas. Isso signi-
fica que as empresas no contavam com estmulos adequados para a inovao,
o que levou muitas a optarem pelos caminhos de menor risco e incerteza.
H um debate forte sobre o PSI e os efeitos de crowding out, mas ainda
faltam estudos bem fundamentados utilizando os dados oficiais para tornar
essa questo mais clara. Ou seja, h uma polmica para identificar at que
ponto as atividades financiadas pelo PSI seriam de todo modo conduzidas pe-
los empresrios, mas com seus prprios recursos. O dilema seria saber se di-
ante da oportunidade de obteno de capital barato e em condies extrema-
mente vantajosas em relao ao mercado, as empresas manteriam seus recur-
sos reservados ou aplicados no mercado financeiro, ao invs de aplicar seus
prprios recursos na produo.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria
46
4.2. Inovar Auto: um foco novo para um cliente conhecido
No mbito do conjunto de incentivos fiscais feitos pelo governo a partir
de 2011, cabe destacar o Programa de Incentivo Inovao Tecnolgica e Aden-
samento da Cadeia Produtiva de Veculos Automotores (Inovar Auto) como um
exemplo a ser discutido. Este programa um avano em relao s polticas
feitas para o setor automotivo nos ltimos anos. Isoladamente, insuficiente
para inovaes mais radicais, mas positivo o fato de vincular os incentivos
fiscais para a indstria inovao tecnolgica.
O objetivo principal do programa foi melhorar a tecnologia e a segu-
rana para os carros produzidos e vendidos no Brasil, mediante a permisso
para as empresas habilitadas usufruir de crdito presumido de Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI). O programa foi voltado para as empresas que
produziam ou comercializavam veculos no Brasil ou que vieram a apresentar
projetos de investimento no setor automotivo.
O Inovar Auto tambm teve o objetivo de fomentar o desenvolvimento
tecnolgico e buscar mais eficincia energtica. Para tanto, o crdito presu-
mido de IPI pode incidir sobre os dispndios com P&D.
Para o Inovar Auto, foi institudo no MDIC um mecanismo complexo de
gerenciamento que trouxe mais burocracia na anlise de projetos de P&D que
carregam, geralmente, a incerteza como norma. Se os critrios nem sempre
so claros, as punies, por outro lado, so rigorosas. A no observao total
ou parcial das normas pelos fornecedores diretos pode acarretar em: i) multa
de 2% sobre o valor das operaes de venda, na hiptese de omisso na presta-
o das informaes; ii) multa de 1% sobre a diferena entre o valor informado
e o valor devido, na hiptese de incorrees no cumprimento da obrigao; iii)
perda da habilitao ao Inovar Auto por parte da empresa, na hiptese de uti-
lizao de valor a maior de crdito presumido por empresa habilitada em ra-
zo de incorrees nas informaes. H no interior das instituies pblicas
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 47
expertise suficiente para facilitar processos desse tipo que, no caso da inova-
o, funcionam apenas como uma barreira de entrada para as empresas que
querem inovar.
Em que pesem tais barreiras e o fato de que os instrumentos fiscais,
quando usados isoladamente, no serem os mais eficientes para compartilhar
risco tecnolgico entre o setor pblico e privado, h razes para reconhecer
que o programa Inovar Auto tem virtudes. E a ABDI teve participao na cons-
truo desse mecanismo, com alocao de recursos tcnicos e financeiros para
sua elaborao.
Primeiramente, a elevada participao da indstria automotiva brasi-
leira no PIB industrial motivou o governo federal a criar o Inovar Auto, bus-
cando fazer com que o novo regime automotivo brasileiro elevasse o nvel tec-
nolgico associado aos produtos e processos da indstria automotiva nacional
por meio de incentivos P&D. O foco estaria, assim, alinhado com tendncias
internacionais de produo de veculos mais modernos, seguros e eficientes.
Outro ponto positivo a busca por novos materiais para a produo de
veculos eficientes. A aplicabilidade desses materiais prioridade para mon-
tadoras que buscam veculos mais leves, menos poluentes e mais econmicos.
A utilizao de compsitos como materiais estruturantes no lugar do ao a
base para a reduo da emisso de poluentes.
As polticas de eficincia energtica, que constituem o foco do Inovar
Auto, tambm podem levar reduo da emisso de poluentes. positivo,
nesse sentido, o fato de que, para se habilitar ao programa, a empresa deve se
comprometer a cumprir a exigncia de consumo energtico mximo, em
MJ/km, calculado em funo da massa dos veculos vendidos no Brasil. Em
combinao com as exigncias do Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicu-
lar (PBEV), coordenado pelo Inmetro, a expectativa que o programa gere bons
resultados, mesmo que no se atinja os ganhos de eficincia anunciados nos
novos veculos licenciados entre 2014 a 2017.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 48
Se, por um lado, os desafios do Inovar Auto esto alinhados com os prin-
cipais avanos das tecnologias de segurana veicular mundial, por outro, a na-
cionalizao das tecnologias para a fabricao local dos dispositivos de segu-
rana veicular ainda um desafio. Na cadeia produtiva, o desenvolvimento de
fornecedores de matrias-primas e insumos estratgicos e a fabricao local
dos componentes dos dispositivos de segurana veicular ainda so gargalos.
H necessidade de implantao de laboratrios e pista de testes e parce-
ria com instituies de pesquisa. Sendo assim, os percentuais mnimos dos
dispndios em P&D, engenharia, tecnologia industrial bsica e capacitao de
fornecedores exigidos pelo Inovar Auto podem no ser suficientes para os ob-
jetivos a serem atingidos pelo programa, principalmente no caso da segurana
veicular.
Inovao, Manufatura Avanada e o futuro da indstria 49
5. O Plano Inova Empresa e a nova gerao depolticas de inovao
Algumas aes realizadas pelo Governo Federal a partir de 2011 retoma-
ram ideias originais presentes na PITCE (2004). Estas aes esto em conso-
nncia com as experincias mais avanadas realizadas pelas polticas de ino-
vao nos pases desenvolvidos. Em especial as que derivam de anlises sobre
as estratgias empresariais e particularmente com as orientaes tericas e
metodolgicas que ficaram conhecidas como viso baseada em recursos. O
termo surge porque a empresa tomada nesta abordagem como um conjunto
de recursos, que orientam algumas perguntas-chave: Quais so os recursos
mais relevantes que a empresa domina? desejvel construir novas compe-
tncias nas reas de domnio tecnolgico da empresa? Como ampliar as com-
petncias da empresa?
Uma nova gerao de polticas foi executada de 2011 a 2014. Estas pol-
ticas foram formuladas e nucleadas no Ministrio de Cincia Tecnologia e Ino-
vao e na FINEP com o apoio de diversos outras instituies, em particular do
O que : O Plano Inova Empresa marcou uma retomada das polticas pblicas
voltadas para aumento da competitividade com foco em inovao. Teve foco,
prioridades, novos instrumentos, recursos e conseguiu diminuir a burocracia
pblica para facilitar as atividades de inovao.
Perodo: 2013-2015
Objetivos Principais: Aumento do investimento privado em P&D. Defini-
o de reas estratgicas: Sade, Defesa, Petrleo, Energia, Sustentabilidade.
Apoio a projetos de alto risco tecnolgico. Fortalecimento da relao Emp