Inovação Na Perspectiva Dos Inovadores

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Inovação Na Perspectiva Dos Inovadores

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  • www.ebape.fgv.br/cadernosebape Volume I Nmero 2 Dezembro 2003

    Inovao na perspectiva dos inovadores: a experincia do Programa Gesto Pblica e Cidadania Peter Spink* Resumo Criado em 1996 por iniciativa da Fundao Ford e a Fundao Getulio Vargas com o apoio do BNDES, o Programa Gesto Pblica e Cidadania vem trabalhando de maneira ativa na identificao e disseminao de iniciativas inovadoras dos governos subnacionais brasileiros que melhoram a qualidade dos servios pblicos e contribuem para construo da cidadania. Nos oito anos do programa, mais de 6,200 experincias foram identificadas oriundas dos estados, municpios e governos prprios dos povos indgenas. Neste texto a temtica da inovao discutida a partir das respostas dos programas, projetos e atividades identificadas a esta questo, trazendo uma nova tica a discusso entre inovao e melhores prticas.

    Palavras-chave: inovaes no setor pblico, definies prticas, governos locais, Brasil Abstract The Public Management and Citizenship Program was set up in 1996 as a joint initiative of the Ford Foundation and the Getulio Vargas Foundation with the added support of the BNDES. Its objective is to identify and disseminate information about innovative practices in sub national governments in Brazil that improve the quality of public services and produce a positive impact on the construction of citizenship. In the programs eight years to date, some 6,200 different experiences have been identified coming from state and local governments and the governments of the indigenous peoples. In this paper the theme of innovation is discussed using as a basis the answers of the different programs, projects activities to the same question. The result offers a new perspective of the discussion of the differences between innovations and best practices.

    Keywords: public sector inovations, pratical definitions, local government, Brazil Criado em 1996, por iniciativa da Fundao Ford e da Fundao Getulio Vargas (FGV), com o apoio do BN-DES, o Programa Gesto Pblica e Cidadania vem trabalhando de maneira ativa na identificao e dissemina-o de iniciativas inovadoras dos governos subnacionais brasileiros que melhoram a qualidade dos servios p-blicos e contribuem para construo da cidadania. Nos oito anos do programa, algo em torno de 6.000 experi-ncias foram identificadas e mais de 200 estudos de caso publicados, alm de bancos de dados, vdeos e outras formas de disseminao, incluindo o apoio a programas de emissoras de rdio comunitrias.

    Seus mtodos de identificao e disseminao so relativamente novos no mundo acadmico. Buscando criar um mecanismo capaz de ir alm das inovaes j conhecidas e identificar os estados e municpios de maior destaque no cenrio tcnico e poltico, o programa optou por utilizar um prmio anual, aberto a todas as juris-dies subnacionais (estados, municpios e os governos prprios dos povos indgenas) e com critrios flexveis de inscrio. Essa abordagem inclusiva tambm se faz presente no processo de disseminao, onde todas as ex-perincias enviadas ao Programa Gesto Pblica e Cidadania so includas no banco de dados e recebem certi-ficados de participao.

    O processo de avaliao feito em trs etapas. Na primeira, so selecionados 100 programas, projetos ou ativi-dades semifinalistas, a partir da informao fornecida na ficha de inscrio. Na segunda, aps receber maiores detalhes dos programas semifinalistas, so selecionados 30 pr-finalistas, que recebem a visita de um tcnico ou pesquisador para verificar in loco a iniciativa. Na etapa final, 20 finalistas so selecionados para compor o conjunto de experincias exemplares do ano, apresentadas num evento de confraternizao e aprendizagem on-de cinco destaques so indicados. Ao longo do processo, pesquisadores, tcnicos, professores, gestores pblicos e ativistas participam do processo de avaliao e discusso; debatendo a importncia de cada iniciativa. * Professor Ttular FGV EAESP. Coordenador do Centro de Administrao Pblica e Governo. PhD em Psicologia Organizacional, Birkbeck College, Universidade de

    Londres. E-mail: [email protected].

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    inevitvel que inovao seja um dos temas mais presentes nessas discusses. Afinal, o que uma inova-o? Por que uma atividade deve ser considerada mais inovadora do que outra, levando-se em conta, por exem-plo, o contraste entre uma atuao local num municpio pequeno e um programa abrangente de uma rea me-tropolitana? Nas informaes circuladas na ficha de inscrio, a resposta a essa questo deixada em aberto. Fora da obrigao de ter pelo menos um ano de implantao efetiva e de ser coordenado por uma organizao pblica, os programas, projetos e atividades submetidos devem demonstrar resultados claros de inovao em organizao e/ou estratgias tcnicas para resolver necessidades sociais e comunitrias que:

    representem mudana substantiva, qualitativamente ou quantitativamente em relao a prticas anteriores;

    permitem ou apontam as maneiras como a experincia pode ser repetida por outros e transferida a outras regies e jurisdies;

    ampliam ou consolidam formas de acesso e dilogo entre a sociedade e suas agncias pblicas;

    utilizam recursos de maneira responsvel e estimulam prticas autnomas que podem vir a ser auto-sustentadas.

    O que inovao

    O sentido amplo da palavra inovao o de tornar novo, renovar, introduzir novidade ou fazer algo como no era feito antes. Na lngua inglesa, os pesquisadores do Dicionrio Oxford encontraram, em 1597, fazendo mudanas em algo estabelecido; mais tarde, introduzir novidade; e em 1818, renovar. A importncia da citao de 1597 demonstrar que ao contrrio do que muitos imaginem, a noo de inovao no uma caracterstica exclusiva da modernidade. Alterar aquilo que estabelecido um conceito social poderoso que contribui para a noo de contradio e processo histrico. Alis, dado que os relatos histricos disponveis se caracterizam no pela permanncia dos modelos e prticas institucionais, mas pela sua mudana, pode-se deduzir que alguma noo de introduzir novidade parte central dos diversos caminhos da humanidade desde muito tempo atrs.

    Ao mesmo tempo, h de se reconhecer que a mesma modernidade que transferiu o sentido de revoluo da arena da fsica e da mecnica para a arena poltica e cultural tambm a modernidade cuja busca pela melhoria estimulou a curiosidade, elevando a humanidade a novos patamares tcnicos e sociais como nunca visto antes. Se inovar j existia, parece que na modernidade chegou a ocupar o centro das atenes at o ponto de ser o referencial para o correto, numa sutil inverso de valores em relao conservao e tradio, valorizando, por exemplo o novo em relao ao obsoleto.

    Se, como parece, tornar novo e introduzir novidade um processo humano e social de longa data, segue com propriedade a pergunta: por que discutir o que inovao? Afinal, em diversas lnguas, o sentido da pa-lavra no parece problemtico, pertencendo ao senso comum, ao cotidiano. Nesse sentido, uma resposta pode ser dada a partir da similaridade e da proximidade com a noo de mudana e de uma outra pergunta: por que resistir mudana? Ou seja, da mesma maneira que as sociedades contemporneas, em grande parte democr-ticas e abertas, resultam da luta de pessoas por mudanas, tambm so resultado e produto daquelas que, de forma sbia e herica, entendiam a importncia de resistir a outras mudanas. Mudana nunca , a priori, boa. H mudanas vistas coletivamente como positivas, mas tambm h mudanas vistas como negativas. A inova-o segue o mesmo caminho. A bomba atmica e as sementes geneticamente modificadas para escolher duas so, cada uma de sua maneira, inovaes. Mas nem todas sero aplaudidas de maneira universal. O resultado um debate moral, uma discusso sobre como a vida deve ser vivida.

    Vista por essa tica, a relao do novo com o existente e sempre ser contraditria, e as conseqncias desse processo sempre sero abertas s diferentes interpretaes. O empenho social, entendido como responsabilida-de coletiva, exige abertura para o debate e a democratizao extensa das opes, alternativas e conseqncias, e de avaliao (SPINK, 2001).

    H, sem dvida, outros caminhos. Um, o de adotar uma postura schumpeteriana, argumentando que novas formas evolvem a destruio criativa - resultado da competitividade -, assumindo uma viso evolucionista, que a de que o novo ser sempre mais adaptativo do que o velho. Um outro caminho o de entregar a discus-

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    so cincia, atravs de regras de clculo, de argumentao e da especificao dos parmetros daquilo que bom e til. No terreno dos governos subnacionais e das polticas pblicas, esta a abordagem freqentemente adotada nos programas de melhores prticas, onde certos programas e prticas so identificados como exem-plos a serem seguidos. Em ambos os casos, a questo da inovao resolvida externamente, a partir da defini-o dos parmetros de sucesso.

    A opo do Programa Gesto Pblica e Cidadania foi pelo debate aberto. Os critrios adotados buscam incluir e no excluir, cabendo indagar se de fato, houve mudana. Outras podem utilizar a experincia nas suas reas ou lugares? O programa tem impacto na construo prtica da cidadania? H possibilidade de continuidade? Por sua vez, o programa assume que se as pessoas envolvidas na atividade consideram seu trabalho como inovador, de alguma maneira, ele ser aceito e includo no banco de dados e no processo de seleo. Se h uma nfase, esta dada no nome do programa, demonstrando preocupao com as aes pblicas que tm impacto na cons-truo da cidadania. O resto resultado da discusso entre as pessoas que participam dos painis de seleo e do uso de um mecanismo simples, onde cada programa e projeto analisado por, pelo menos, dois grupos de pessoas diferentes (8 - 10, no total) em diferentes conjuntos de programas e projetos; trata-se, portanto, de pes-soas diferentes e contextos diferentes. medida que o processo de seleo avana para a fase dos semifinalistas e pr-finalistas, as informaes disponveis so maiores, ainda que o processo continue o mesmo at o final.

    Inovaes ou melhores prticas

    Ao buscar um ponto de partida mais aberto para o Programa Gesto Pblica e Cidadania, a inteno foi traar uma distino entre compartilhar e disseminar inovaes ou experincias que tenham algum xito e melho-res prticas (SPINK 2000). Naquele primeiro momento, a idia foi a de que melhores prticas tendiam a ser sempre apresentadas como solues que devem ser seguidas porque so corretas e aprovadas. O debate e a discusso sobre por que, como, em que circunstncias e quais os elementos-chave do processo parece ser dei-xado de lado. A tecnologia veiculada como se fosse uma caixa preta: faa assim, porque funciona.

    Pode-se argumentar que um grau de pragmatismo muito necessrio no mbito da ao social; entretanto h muita diferena entre a pergunta pragmtica clssica quanto precisamos saber? e uma tendncia de reduzir tudo ao mesmo nvel da aspirina cuja eficcia em resolver dor-de-cabea foi confirmada muito tempo antes de se saber como e porque teve esse efeito. Pragmaticamente, o mundo social diferente da aspirina. Ele , de al-guma maneira, aberto para a anlise; saberes so coletivos e a competncia de compartilh-los assumida co-mo algo dado (taken-for-granted) (GARFINKEL 1967; GEERTZ, 1983).

    Ao tentar traar essa distino, o programa buscou reconhecer tanto a importncia das possibilidades de ao presentes no dia-a-dia quanto a competncia de atores sociais em elaborar idias e estratgias que tornam os caminhos viveis. De maneira similar, buscou-se evitar uma nfase exagerada nos temas clssicos da bibliogra-fia sobre inovao, tais como replicabilidade, escala e sustentabilidade. No h dvida que um programa, projeto ou atividade precisa oferecer a possibilidade de dilogo com aes similares e sobre as possibilidades de transferncia dos conhecimentos presentes para outras reas e questes, uma vez que compartilhar o que aprendido elemento constitutivo de uma vida coletiva e democrtica. Mas ao enfatizar demais a replicabili-dade, a escala e a sustentabilidade, pode-se facilmente esquecer porque algo foi feito, suas razes endgenas. Afinal, por que as pessoas inovam? Para resolver problemas ou para ser replicado, ampliado e sustentado no longo prazo?

    Em vez de assumir, abrir a discusso sobre melhor leva a uma segunda discusso sobre melhor e para quem, discusso essa que ao tratar da interseo entre Estado e sociedade na contemporaneidade longe de ser simples. Qual , por exemplo, a cidadania ao qual o programa se refere? Ser que a cidadania liberal de Mar-shall (MARSHALL, 1967), dos direitos civis, polticos e sociais de um Estado do bem-estar, ou a cidadania tumultuosa de uma sociedade onde a democracia poltica est longe de ser uma democracia social do dia-a-dia, onde para muitos, os direitos civis bsicos ainda so um sonho (CARVALHO, 2001). Seria a cidadania coletiva dos povos indgenas? De novo, as opes oscilaro entre a especificao formal daquilo que considerado bom ou correto e o reconhecimento de que, nas sociedades modernas, essas questes esto longe de serem resolvidas (CORNWALL, 2000; OLSSON e WOHLGEMUTH, 2003).

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    Diante desse cenrio conflituoso, talvez seja compreensvel a opo metodolgica das agncias internacionais. Estas, visando produzir algo que seja aceito por todos os seus pases-membros, acumulam critrios diferentes, de tal maneira que para se inscrever no programa de best practices da UNCHS-Habitat, necessrio compre-ender nove pginas de instrues em ingls; ou no da Unaids, em que preciso responder a quase 40 perguntas-chave. Esse reducionismo tcnico talvez seja o preo a ser pago para permitir um mnimo de dilogo interna-cional. Entretanto, o resultado , inevitavelmente, um processo de excluso sutil, onde o acesso restrito que-les que conseguem se expressar na linguagem tcnica e oficial. Nesse sentido, conhecido que muitos atores sociais trabalham a partir de outras perspectivas de ao, usando as mltiplas linguagens do dia-a-dia (ESTE-VA e PRAKASH, 1998). Numa situao onde o debate pode ser mais extenso e onde o confronto entre idias possvel, h de se dar espao para um outro caminho, o de assumir que, democraticamente, no h um a priori melhor.

    Sem grandes pretenses de ter sido claro nessa distino entre as inovaes e as melhores prticas impos-svel porque as duas abordagens compartilham, em parte, a mesma fronteira das aes emergentes o Progra-ma Gesto Pblica e Cidadania buscou se posicionar dentro dos processos dirios da discusso de possibilida-des e da troca de saberes, criando meios para apoiar e estimular os contatos entre agncias pblicas, movimen-tos sociais, grupos comunitrios, polticos, acadmicos e tcnicos sobre as possibilidades de ao presentes nas experincias apresentadas. Os resultados tm sido os mais diversos, mas entre eles se destaca o reconhecimento da necessidade de assumir que saberes plural e no singular, e que para muitas pessoas, os saberes no esto separados dos fazeres. Para alguns, a teoria precede a ao; para outros, a teoria a ao; e h aqueles para quem o agir simplesmente o agir, uma responsabilidade social e moral resolver problemas e melhorar a vida coletiva, e por conseqncia, a inovao est naquilo que acontece e no na idia ou na teoria a partir da qual se pretendia agir.

    Se o programa teve xito nessa tentativa de manter aberta a discusso sobre inovao, algo a ser debatido. Pode se identificar entre os mais de 6.000 inscritos no Programa Gesto Pblica e Cidadania, desde o primeiro ciclo em 1996, uma grande variedade de estilos e de reas de atuao, variedade essa que cresce ano aps anos, trazendo constantemente novas questes, idias e prticas (FARAH, 1999, 2001; FARAH e SPINK, 2003). Se o programa teria falhado nessa busca de abertura, mais provvel que o inverso acontecesse; que as inscries fossem mais e mais similares em orientao, e que seu nmero diminusse medida que a presena de um for-mato padro com parmetros desejveis, inevitavelmente, estimulasse a auto-rejeio. Mas h tambm um ou-tro caminho disponvel para arejar a questo da inovao: os prprios inscritos no ciclo anual de premiao. A-final, o que inovao para os inovadores?

    Um caminho de anlise

    H diversos caminhos possveis para buscar uma resposta a essa questo, cada um com seus pontos positivos e negativos. Em primeiro lugar, na porta de entrada para o ciclo anual de premiao h a ficha de inscrio onde os programas, projetos e atividades buscam informar qual o seu foco. As perguntas bsicas, alm de informa-es quanto identificao, so: descreva como funciona o programa, projeto ou atividade e suas principais ca-ractersticas; apresente os objetivos do programa, projeto e atividade; identifique o pblico beneficirio de seu programa, projeto ou atividade; o que voc considera como o ponto mais inovador do programa, projeto ou ati-vidade e por qu?; quais resultados ou indicadores (quantitativos ou qualitativos) mostram as melhorias produ-zidas pelo programa, projeto ou atividade?

    Essa a parte mais aberta do programa, onde h o maior nmero de inscritos e a maior variedade de atividades nas reas mais diversas. Entretanto, tambm o momento onde a clareza das respostas mais vulnervel. uma interao mediada pelo folheto de inscrio, e a tarefa principal para as pessoas que preparam a inscrio transmitir uma boa descrio de problema e ao. A maior preocupao , provavelmente, descrever bem o que esto fazendo, mais do que explicar o que voc considera como o ponto mais inovador de seu programa, pro-jeto e atividade e por qu?

    Na segunda fase, onde os 100 semifinalistas recebem uma lista de 18 perguntas para responder, a situao su-tilmente diferente. Primeiro, sendo um grupo que produto de um processo de seleo aberto, h uma maior

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    probabilidade de se tratar de um programa, projeto ou atividade com um diferencial a mais em termos de sua contribuio potencial. Segundo, h, mesmo que por correspondncia, um contato individual entre o Programa Gesto Pblica e Cidadania e os responsveis pela inscrio. H um parabns que por si algo que estabelece uma relao de maior igualdade e tambm um reconhecimento da competncia de seu trabalho. H, tambm, a possibilidade de usar mais espao na resposta s perguntas, e h mais perguntas a serem respondidas, assim permitindo que os responsveis entrem em maiores detalhes sobre as razes e as justificativas. As instrues dadas nessa fase so:

    responda s seguintes perguntas, lembrando que ser com base em suas respostas que o seu programa, pro-jeto ou atividade ser avaliado. Portanto, seja preciso e objetivo, atendo-se ao que est sendo perguntado em cada questo;

    nenhuma resposta dever ter mais do que uma pgina;

    no total, suas respostas no devero somar mais do que sete pginas;

    lembre-se de que todos os 30 pr-finalistas recebero visitas de campo, durante as quais sero verificadas in loco as informaes prestadas.

    Entre as perguntas formuladas, temos: em que aspectos seu programa, projeto ou atividade inovou em relao a prticas anteriores? Procure explicar bem em que consiste a inovao.

    O ponto negativo, tal como na fase anterior, o fato de que a resposta parte do responsvel, formulada dentro de uma perspectiva de premiao. No se sabe, por exemplo, quais outras verses sobre inovao esto circu-lando entre os membros das equipes de trabalho e entre os usurios dos servios ou as comunidades do local. Para isso, um outro tipo de estudo seria necessrio, detalhando mais um menor nmero de casos. Contudo, mesmo com essas restries, as respostas dos semifinalistas oferecem a possibilidade de variedade. So oriun-das de diferentes partes do pas e de jurisdies de todos os tipos. Suas organizaes variam de tamanho e nas tradies, e os responsveis so de profisses as mais diversas. Sendo semifinalistas, esto, tambm disponvel para anlise, as fichas de inscrio original, o que permiti a comparao entre os argumentos apresentados.

    A anlise que ser apresentada utilizou as fichas de inscrio e as respostas das questes complementares dos semifinalistas do ciclo 2001. Ao todo, foram 727 inscries vlidas neste ano, 84% municipais, 15% de organi-zaes estaduais e 1% das organizaes prprias dos povos indgenas. Dos 100 semifinalistas, 72 eram do m-bito municipal, 23 estaduais, trs indgenas e dois intermunicipais. Dos programas, projetos e atividades, 92 ti-veram alguma forma de parceria ou aliana com outras organizaes pblicas ou da sociedade civil, e em 72 casos, a parceria era com ambos os tipos de organizao. Por no enviarem as informaes complementares, 11 programas e projetos foram excludos: um indgena, dois de nvel estadual e oito da rea municipal. Trata-se de um fenmeno recorrente nos ciclos de premiao, podendo acontecer por vrias razes, que vo desde a preca-riedade da atividade at o reconhecimento de que no se enquadra nas regras bsicas (ser coordenado pelo setor pblico e ter um ano de efetiva implantao). Entretanto, os 89 programas, projetos e atividades resultantes re-presentam bem a diversidade de reas de atuao, as diferentes regies geogrficas do pas e tambm as reas urbanas e rurais. Incluem, naturalmente, os 30 programas pr-finalistas, bem como os destaques finais.

    O mtodo de anlise consistiu de sete etapas:

    1. a leitura de cada conjunto de respostas (ficha de inscrio e as 18 perguntas complementares) para contex-tualizar as respostas especficas s perguntas sobre inovao;

    2. a justaposio das duas respostas (inscrio e questes complementares) para verificar diferenas;

    3. a transcrio completa da parte da resposta voltada temtica do que inovao em relao ao progra-ma, ao projeto e atividade;

    4. a leitura flutuante de todas as respostas; repetida duas vezes;

    5. a identificao dos principais temas presentes nas respostas; elaborada seqencialmente at cobrir todas as respostas;

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    6. a anlise de cada resposta e a identificao dos temas presentes;

    7. tabulao final e seleo de exemplos para ilustrar cada tema.

    importante lembrar na anlise a ser mostrada, que as respostas esto sendo dadas no contexto da descrio de um programa, projeto ou atividade e no no contexto de uma investigao sobre inovao. O que talvez se pos-sa argir, que no conjunto das 89 respostas, possvel que boa parte das verses intuitivas sobre inovao es-tejam presentes, e que os temas identificados sejam, provavelmente, aqueles encontrados ao se buscar inova-o em uso. Tambm provvel que na grande maioria de casos, a resposta acabe se transformando no produ-to de um processo de discusso ou, pelo menos, de troca de idias sobre como preencher a ficha, de como res-ponder s perguntas. uma resposta que faz sentido para as pessoas presentes, ao versar sobre aquele progra-ma, projeto ou atividade. No se sabe quais seriam as razes dadas no caso de um outro programa, projeto ou atividade. Assim sendo, se os temas podem ser considerados como representativos do universo de falas sobre a inovao no mbito das aes cotidianas, no se pode concluir que a freqncia do seu uso seria a mesma em outras circunstncias.

    Principais temas presentes nas respostas

    Foram sete os principais temas identificados. Das 89 respostas, 66 foram classificadas em somente um ou outro desses temas especficos, e em 23 casos foi necessrio juntar temas para fazer a classificao, porque a resposta tratou explicitamente de diversas noes sobre inovao. Na exposio a seguir, primeiro, sero discutidos os sete temas principais e sua distribuio. Depois, as vrias respostas mltiplas.

    a) mudana de prioridades e incluso passiva

    O primeiro tema se refere s aes em que h uma mudana de prioridades: levando servios para grupos ou setores da populao anteriormente excludos, humanizando servios existentes (tornando-os mais receptivos, cordiais e amigveis) e reconhecendo necessidades. So aes concebidas a partir da organizao prestadora de servios e sem uma incluso ativa do outro na discusso ou na direo dos servios. Alguns exemplos:

    Ao pensarmos a situao do idoso em nossa sociedade no podemos nos furtar anlise da patente condio de excluso social a que [ele] est submetido. O velho em nossa sociedade foi relegado ao papel (...) portanto ao oferecermos ouvidos s suas ansiedades e aflies (...) acreditamos estar fazendo, conjuntamente com eles, um movimento inverso...

    A principal inovao (...) o fato de que o programa entende e concebido a partir das necessidades de cada comunidade, da termos aberto o leque de modalidades para o buraco, o domin e outras prticas de lazer que foram incorporadas ao programa, pois so tradicionais nas comunidades de baixa renda...

    A maior inovao foi o aumento da segurana e a qualidade no atendimento s gestantes e recm-natos, atravs da humanizao do atendimento, vinculao das gestantes aos servios de sade e monitorao constante dos agravos sade da grvida...

    Mudar o enfoque da comunicao pblica: a informao com fluxo regular, fcil acesso, interesse direto, com fins de cidadania e linguagem objetiva; um servio prestado cidade, uma estrutura e uma energia voltados coletividade.

    A realidade do projeto vontade de ver a populao carente, da periferia, tendo acesso a projees de filmes de circuito, j que no tem condies de ter em casa um videocassete. Atrelados a esses filmes, vo-se introduzindo filmes documentais, educativos, e o vdeo-jornal, com informaes da rea cultural do municpio e questes importantes de educao e sade.

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    Esse tema foi um dos de menor freqncia nas respostas. Foi a base nica da resposta de cinco dos responsveis pelos programas, projetos e atividades, tendo sido includo como parte de uma resposta mltipla em quatro outros.

    b) aes pr-ativas na busca de novas solues para problemas existentes

    O segundo tema focaliza a discusso de solues ou abordagens para problemas existentes e conhecidos. As solues podem ser tcnicas, administrativas ou organizacionais por exemplo, envolvendo intersetorialidade e tendem a ter um tom de pr-atividade, de estar se estendendo e indo ao encontro do outro. Aqui tambm h o incio de uma discusso sobre empoderamento (empowerment), mas focalizando o sujeito individual, o cidado, e no o coletivo. Alguns exemplos:

    O programa, alm de contribuir com o aumento da produo de pescado nos audes, procurou fomentar junto s associaes, cooperativas e produtores rurais, a prtica de piscicultura intensiva e superintensiva (...) com o sistema de cultivo race-way.

    Pela primeira vez em 23 anos de existncia do Estado, o poder pblico assumiu essa nova funo em um momento em que o Estado se encontrava em grandes dificuldades econmicas. A Instituio Comunitria de Crdito (...) ao inovadora e um grande desafio especialmente pela abrangncia (...) estadual e no municipal.

    No havia agregao nenhuma no passado. Os castanheiros simplesmente colhiam e vendiam. Hoje colhem com tecnologia, pois foram construdos sistemas de paiis tipo palafita (...), tambm implantamos um sistema de secagem (...) introduzimos um sistema de choque trmico (...) tambm o sistema de embalagem hoje est inovando, com um sistema a vcuo...

    A discusso sobre as anlises dos bitos com gestor e equipe de sade constitui ponto inovador, pois acreditamos que os resultados obtidos nas anlises dos bitos representam a primeira contribuio para a reorganizao da assistncia sade...

    A inovao consiste no encontro da alternativa que possibilitou atender, com recursos energticos, as comunidades at ento privadas do uso da eletricidade pela inviabilidade econmica de fornecimento tradicional...

    Seu ponto mais inovador encontra-se na independncia e autonomia da ouvidoria em relao aos poderes constitudos (Executivo, Legislativo e Judicirio) garantidos pela lei de constituio e pelo processo de funcionamento. A forma de eleio do ouvidor tambm outra inovao, uma vez que procura representar o pluralismo da sociedade...

    A participao da famlia na construo do projeto de vida pessoal do jovem, que permite a conquista de sua cidadania, assegura seus direitos fundamentais e acompanha, incentiva e apoia o cumprimento da medida judicial, o envolvimento da comunidade e a incluso de advogados...

    Criamos a figura do Agente de Educao (fiscal, conselheiro e principalmente educador) que veio estreitar os laos entre a famlia e a escola, to difceis em comunidades como a nossa. Os trabalhos desenvolvidos tm o acompanhamento do Conselho Tutelar, minimizando a evaso escolar e as altas taxas de repetncia.

    O tema b foi o mais encontrado entre as respostas, tendo sido a base nica da resposta de 38 dos programas, projetos e atividades, fazendo parte da resposta mltipla de mais 14. No total, as respostas dos 52 responsveis (58%) foram, total ou parcialmente, classificadas nessa categoria.

    c) transferncia de tecnologia (tcnica ou administrativa) de uma rea para outra

    Esse tema pode ser encontrado nos critrios de inscrio (repetio da experincia por outros ou transferncia para outros), mas parece ser o menos usado pelos semifinalistas ao descrever suas atividades. O tema c foi somente encontrado em trs casos; e em todos fez parte de uma resposta mltipla. Aqui esto (grifo nosso):

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    O programa inovou ao se desafiar a transpor para uma esfera mais ampla de trabalho (municpio e desenvolvimento local) uma concepo terico-metodolgica (...) capaz de gerar organizaes protagonistas, empreendimentos auto-gestionrios e cidados crticos.

    Envolvimento das comunidades na elaborao e implantao dos projetos; conservao do meio ambiente em projetos produtivos; aplicao de tecnologia de manejo de gua, de solo e de cultivo de frutos e hortalias, de forma sustentvel, entre os pequenos produtores do semi-rido do Cear.

    O projeto foi construdo com base em relaes muito mais democrticas entre servios, universidade e comunidade, ao criar uma dinmica mais horizontal entre os parceiros, possibilitando que muitos atores se tornassem participantes ativos; ao articulada entre universidade, servios e comunidade; construo de parceria, co-gesto e transferncias de tecnologias e saberes; empowerment da comunidade.

    Nos trs exemplos, a questo da transferncia de tecnologia ocupa um lugar complementar na resposta, acom-panhando outras razes vistas como mais importantes.

    d) incluso ativa e coletiva, abrangendo participao e co-gesto na busca de solues e no monitoramento de aes

    O tema d teve uma presena slida entre as respostas, sendo a base nica de nove respostas e fazendo parte de mais oito, ou seja, 17 (19%) ao todo. Alguns exemplos:

    O PAE uma alternativa inovadora na sua forma de levar s populaes carentes a questo da gerao de ocupao e renda. A metodologia utilizada (...) envolve a comunidade na discusso, no desenvolvimento e na implantao de alternativas (...) as decises nascem de baixo para cima (...) o processo rompe com o assistencialismo...

    Participao dos agricultores e entidades na construo do processo de feiras juntamente com o poder pblico.

    Gesto integrada, delimitao das reas imprprias ocupao, com o desenvolvimento da fiscalizao urbana e ambiental preventiva, em parceria com a comunidade local; definio de uso ambiental para as reas imprprias; enfrentamento e solues criativas; aprofundamento do processo de participao.

    O programa voltado para uma discusso horizontalizada das demandas de segurana, bem como para atender as demandas da comunidade apresentadas atravs das comisses locais.

    O envolvimento da comunidade com a equipe multiprofissional (integra vrios profissionais) e vrias aes in loco garantem o acesso da populao sade preventiva e curativa, promovendo o resgate da cidadania, a participao e o controle social.

    Recifes artificiais de pneus, debates com a comunidade sobre a implantao de novos pesqueiros, discutindo estratgias e a remunerao de pessoal envolvido.

    e) mudana no enfoque de como pensar a ao

    Nesse tema so includos os comentrios sobre a mudana significativa de enfoque, a ampliao de maneiras de pensar explicitamente interdisciplinar, com o envolvimento de mltiplos atores e a aplicao de temas norteadores como, por exemplo, enfoque sobre desenvolvimento integrado, ou sobre a sustentabilidade ambiental. Essa foi a segunda categoria mais encontrada, com 19 respostas (21%), sendo a base nica de 11 respostas, formando parte de mais oito respostas multitemticas.

    O plano de desenvolvimento pensado a partir do municpio (rural/urbano, empresas/cooperativas etc.) significa uma mudana, em primeiro lugar, da cultura de gesto

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    municipal (...) em segundo lugar, integra economia solidria, agricultura, indstria e mercado numa viso mais ampla.

    Apenas o governo (...) incorporou esse desafio em seu programa de governo, o recorte de gnero,

    reconhecendo os direitos das mulheres, inclusive o de ter uma vida sem violncia. A implantao de polticas pblicas com recorte de gnero, um trabalho conjunto dos movimentos autnomos,

    conselhos, prefeituras...

    medida que o projeto foi retomado e evoluiu, notou-se a necessidade de ampliar a discusso

    sobre DST/Aids e os aspectos em torno desses temas para outros atores dentro da realidade prisional

    (...) desfazendo preconceitos e desconstruindo esteretipos... O programa teve como inovao quanto s prticas anteriores, a abrangncia da clientela: atende

    desde a educao infantil at o ensino superior, assim como o municpio, envolvimento com

    parceiros, comunidade e unificao de redes de ensino.

    A grande inovao obtida pelo programa (...) foi modificar radicalmente a maneira de avaliar e

    conduzir o processo de adequao sanitria nos estabelecimentos de sade. Adotou-se uma nova

    abordagem tcnica e profissional, com enfoque no grau de risco (ao invs de [uma abordagem]

    policialesca e de desconfiana) atravs de pacto consensado.

    f) articulao com outros e novos arranjos institucionais

    O tema das parcerias, vnculos e alianas tem sido constante nas discusses sobre os projetos e programas apre-sentados para o Programa Gesto Pblica e Cidadania, e tambm uma caracterstica muito freqente nas ins-cries. Entretanto, quando esse tpico est presente como tema de inovao, junto com as novas formas de criar e pensar sobre arranjos institucionais, quase sempre como parte de uma resposta maior, ou multitemti-ca. Isso sugere, talvez, que as articulaes e arranjos institucionais so considerados muito mais como parte de uma soluo do que a soluo em si; parte da pragmtica da ao e no a inovao em si. Aqui esto as duas nicas respostas monotemticas sobre esse tema:

    um projeto de parcerias que envolvem rgos oficiais, ONGs, empresa privada e comunidade

    indgena (...). A prtica utilizada no desenvolvimento do trabalho centrada na democracia e na

    coletividade...

    Consolidao de projetos em parceria com poder pblico e ONGs, produzindo um modelo de

    gesto em que a palavra de ordem se assenta nas parcerias; inserir a comunidade de uma forma

    plena implicava tambm responsabilidades na soluo dos problemas de manuteno,

    desenvolvimento e gesto.

    g) a primeira vez na rea, o primeiro de seu tipo, pioneiro

    Essa viso sobre inovao reflete o seu uso no cotidiano como algo novo e, portanto, de alguma forma pioneiro. Foram cinco as respostas que podem ser classificadas assim, mas em quatro casos tratou-se de parte de uma resposta multitemtica, adicionando algo a mais s outras razes apresentadas. Em somente um caso o tema foi usado como resposta singular:

    Assessoria in loco aos municpios, detectando as necessidades e esclarecendo dvidas sobre o

    processo de implantao de instrumentos de gesto. O projeto inovador justamente por no existir

    em nvel nacional nenhuma proposta semelhante realizada por esta superintendncia.

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    h) as respostas mltiplas ou multitemticas

    Considerando todas as fichas analisadas, a categoria b - aes pr-ativas na busca de novas solues para problemas existentes que emerge como sendo mais presente, com 58% das respostas. Em segundo lugar vm as categorias e - mudana no enfoque de como pensar ao e d - incluso ativa e coletiva, abrangendo participao e co-gesto na busca de solues e no monitoramento de aes, com 21% e 19%, respectivamente, seguidas por f -articulao com outros e novos arranjos institucionais e a- mudana de prioridades e incluso passiva, com 11% e 10%. Os menos freqentes foram g - a primeira vez na rea, o primeiro de seu tipo, pioneiro e c - transferncia de tecnologia (tcnica ou administrativa) de uma rea para uma outra, com 6% e 3%, respectivamente.

    Em 25% das respostas pergunta em que aspectos seu programa, projeto ou atividade inovou em relao a prticas anteriores?, a anlise identificou a presena de diversos temas e dois destes "novos arranjos e pio-neirismo j foram mencionados nesse contexto, sendo usados muito mais como parte de uma resposta do que como argumento isolado. Aqui esto alguns exemplos:

    Inovou, pois as mulheres e as crianas vitimas da violncia no sentem que esto presas. O

    abrigo, hoje, a sua casa, seu refgio, o espao que ir garantir sua formao para a vida e o

    mercado de trabalho. Trabalhamos com uma rede de apoio e temos como molas-mestras as

    parcerias.

    A interveno exigiu aprofundamento das articulaes com o Ministrio Pblico, rgos

    ambientais e comunidade. Foi implementado o Programa Bairro Ecolgico, atravs do qual os

    moradores executam caladas, preservando a permeabilidade com grama, e a arborizao com

    espcimes nativos da Mata Atlntica, e a prefeitura executa o pavimento drenante.

    Trs fatores: o protagonismo juvenil usando temas transversais (cidadania, gnero); interface mais

    intersetorialidade com as demais secretarias; parcerias com os movimentos populares.

    Ao contrrio de outras iniciativas articuladas no campo da gerao de renda, o projeto vai alm

    das condies materiais: concebe o seu pblico-alvo em situao de excluso material mas tambm

    social, cultural e poltica. Prope uma metodologia com estratgias que buscam resgatar o senso

    crtico e criativo (...), articulao de parcerias com a sociedade civil.

    A inovao vem do modelo misto governamental e sociedade civil, pioneiro no pas. As tradicionais

    agncias de desenvolvimento no envolvem a sociedade civil (...). A agncia traz a comunidade em

    sua modelagem...

    Abre novas possibilidades econmicas nas reas de preservao, ajudando a criar uma vida digna,

    utilizando conhecimento prprio; tambm inova ao conseguir a primeira licena de manejo para

    uma espcie no madeirvel da Mata Atlntica...

    O plano de manejo no est sendo feito em gabinete (...) os grupos de interessados podem

    realmente interferir no processo de gesto, decises so tomadas por consenso (...) o manejo

    participativo pioneiro no Brasil.

    Um outro grupo de respostas mltiplas juntou temas presentes na categoria a mudana de prioridades e incluso passiva, e na categoria b aes pr-ativas na busca de novas solues para problemas existentes:

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    Criao de um sistema (usando o telefone) que responde prontamente a uma vasta demanda dos

    idosos, permitindo ao poder publico uma leitura dinmica dessa demanda, contribuiu para dar

    visibilidade questo do idoso na cidade, tornou-se uma referncia cidad considerado pelos

    idosos como um pronto-socorro sigiloso. O programa (...) inovou o conceito de produo de eventos culturais, porque viabiliza realmente o

    acesso para todas as camadas sociais, em especial os carentes (usando transporte e gratuidade) ao

    mesmo tempo em que associa essa oferta de produo e acesso aos bens culturais com experincia

    de solidariedade.

    Priorizao da populao de baixa renda, integralidade e multissetorialidade constituem o fator

    inovador; aes de infra-estrutura fsica, comunitria, de gerao de emprego e renda e educativa

    concentradas numa mesma rea de atuao.

    A proposta de fortalecimento da unidade familiar, envolvendo os diversos servios ofertados pelas polticas bsicas setoriais, proporcionando-lhes o resgate de sua auto-estima. A garantia de direitos

    que a sociedade presta, por meio do Estado, a essas famlias socialmente excludas, evita sua

    excluso social futura. Essa a inovao.

    Outras, ainda, incluram temas presentes em trs categorias. Por exemplo:

    Envolvimento das comunidades na elaborao e implantao dos projetos; conservao do meio

    ambiente em projetos produtivos; aplicao de tecnologia de manejo de gua, de solo e de cultivos

    de frutos e hortalias de forma sustentvel entre os pequenos produtores.

    A principal inovao deve ser atribuda ao processo de criao da proposta, que se deu de forma

    endgena, o que propiciou uma gesto democrtica com a participao ampla e irrestrita de seus

    usurios, atravs de uma parceria tambm inovadora que envolve o poder pblico, ONGs e

    sociedade civil. Outro aspecto foi a inovao na forma de gerenciamento de carteira e na metodologia de concesso e acompanhamento do crdito rural, possibilitando um acesso gil e

    descomplicado.

    O projeto foi construdo com base em relaes muito mais democrticas entre servios,

    universidade e comunidade. Ao criar uma dinmica mais horizontal entre os parceiros possibilitou

    que muitos atores se tornassem participantes ativos; ao articulada entre universidade, servios e a

    comunidade; construo de parceria, co-gesto e transferncias de tecnologias e saberes;

    empowerment da comunidade.

    Experincias inovadoras versus melhores prticas

    Se inovao, voltando ao seu uso dirio e cotidiano, normalmente entendida como algo novo em relao ao anterior, nas respostas parece que as pessoas responsveis pelos programas, projetos e atividades inscritos no ciclo de premiao do Programa Gesto Pblica e Cidadania tm muito pouca dificuldade em reconhecer onde as mudanas esto. As respostas so claras e variadas; as razes apresentadas mudam de um contexto para o outro - s vezes, mais extensas e mais complexas; s vezes, mais diretas e mais simples -, mas sempre altura

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    da pergunta. A pergunta, por sua vez, compreendida e respondida dentro de uma postura dialgica. Por isso, a variedade de respostas importante.

    Parece que, diferente de uma pergunta que sugere uma resposta correta, a pergunta em que aspectos seu programa, projeto ou atividade inovou em relao a prticas anteriores?" no leva descrio de uma inovao nota 10, mas daquilo que inovador no programa, projeto ou prtica. O resultado no somente a variedade de respostas apresentadas e as diferentes categorias encontradas, mas a quase ausncia de uma resposta construda para fazer bonito. Os responsveis pelas inscries esto preparados para ter suas aes avaliadas em relao quilo que so prticas que inovam em relao s anteriores , e no buscam descrever seus trabalhos numa linguagem de melhores prticas.

    Quais seriam os resultados e respostas a uma questo do tipo: justifique por que seu programa, projeto ou prtica deve ser considerado uma das melhores prticas? Sem dvida, cada um buscaria mostrar seu programa ou projeto s melhores luzes dos temas do momento, no desenvolvimento e na gesto local, usando, por exemplo, termos como empreendedorismo, parcerias, participao popular e transferncia de tecnologia. Afinal, melhor quer dizer em relao ao outro e em relao a algum padro de excelncia.

    Ao contrrio, parece que no Programa Gesto Pblica e Cidadania, a briga no com o outro uma certa riva-lidade, talvez mas com o anterior: o importante alterar aquilo que l est. Ainda estamos, se a distribuio de respostas pode ser considerada como representativa do pragmatismo subnacional, numa situao onde o pro-tagonismo mais coletivo, a construo de novos desenhos institucionais, o repensar de abordagens e a co-gesto da esfera pblica ainda no encontraram tanto espao quanto a simples inverso de prioridades, a incluso indi-vidual e a resoluo tcnica e prtica de problemas. Dar ateno aos que precisam, reorientar o oramento p-blico e utilizar as competncias presentes pode no ser uma melhor prtica... mas no nada mal para a cons-truo da democracia.

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