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Institucionalização do Serviço Social

Institucionalização do Serviço Social · Revolucionário 8 de Outubro – MR8. O movimento de guerrilha urbana teve como . principal liderança, o ex-deputado Carlos Marighela,

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Institucionalização do Serviço Social

O Panorama Histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

Material Teórico

Responsável pelo Conteúdo:Profa. Dra. Maria Raimunda Chagas Vargas Rodriguez

Revisão Textual:Prof. Esp. Tiago Araújo Vieira

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Vamos adentrar o universo do Movimento de Reconceituação do Serviço Social, que teve inicio a partir do final da década de 1964, com ênfase nos anos que seguiram a Ditadura Militar, estendendo--se pela década de 1970.

Importante destacar que, nesta unidade , os estudos devem ser dirigidos para compreender como se desencadeou a Ditadura Militar no Brasil – período considerado como o regime da restrição, fundamentado na violência contra os direitos humanos e contra a Democracia Brasileira.

É a partir desse absurdo Histórico (Ditadura Militar), que o Serviço Social começou a construir sua revisão teórica, prática e ideológica, chamada de Movimento de Reconceituação do Serviço Social.

Estudar a Ditadura Militar brasileira a partir de 1964, e a interferência deste regime ditatorial no Serviço Social.

O Panorama Histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

· O panorama histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

· Golpe Militar de 1964 no Brasil

· A ditadura Militar e o agravamento da Questão Social

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Unidade: O Panorama Histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

Contextualização

Com o golpe de 1964, os debates travados na profissão foram truncados, mas, posteriormente, tiveram influência na busca pela legitimação da profissão, junto à população mais empobrecida, alvo de suas ações. A realidade que antecede o Golpe de 64 estava marcada pela politização dos setores médios e organização dos trabalhadores urbanos e rurais, por intermédio de sindicatos e ligas camponesas, respectivamente; esses segmentos pressionam os profissionais a se posicionarem frente aos questionamentos políticos da época, tendo início, a partir daí, uma intensa revisão da prática profissional.

Esse questionamento de segmentos profissionais está intrinsecamente vinculado ao contexto histórico-político e social, que vai oferecer as bases para o movimento de reconceituação na América Latina, no final da década de 60.

A deterioração das condições sanitárias; a queda do padrão de vida dos assalariados; o agravamento da desnutrição, das doenças infecciosas, e a elevação das taxas de mortalidade infantil, exigiam respostas do Estado – para garantir o controle e o consenso da classe trabalhadora –, e políticas sociais foram adotadas para minorar o agravamento das condições de vida do proletariado.

Essas políticas sociais setorizadas (saúde, educação, transportes etc.) têm por finalidade assegurar a manutenção e reprodução da força de trabalho; assegurar a contenção das tensões sociais, adotando-se uma política clientelística para demonstrar à opinião pública, a preocupação do governo com as questões sociais.

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O panorama histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

No início da década de 1960, sob o governo de Jânio Quadros, o Serviço Social estava mergulhado em um intenso debate entre tendências e posturas conservadoras, e tendências contestadoras e inovadoras para pensar o Serviço Social, a partir de uma perspectiva crítica do significado social da profissão na sociedade capitalista.

No meio profissional, ganhava espaço um debate marcado pela necessidade de modernização, objetivando superar o estigma de autoritarismo e paternalismo, e da ação voltada aos interesses das classes dominantes. Esse posicionamento contra o status quo teve seu início, no meio profissional, vinculado ao trabalho de Desenvolvimento de Comunidade (DC), implantado no governo JK, e que prosseguiu nos governos seguintes, Jânio Quadros e João Goulart.

Glossáriostatus quo: significa estado atual.

Os acontecimentos que antecederam ao Golpe militar de 1964 foram marcados por discussões, tais como: reforma agrária, projetos de desapropriação de terras improdutivas, nacionalização de refinarias particulares, reforma tributária, entre outros temas, e denotam um quadro de intensa efervescência política, com a participação ativa de sindicatos rurais e urbanos, a Igreja, jornais, as Universidades, os intelectuais etc..

Em face dessa conjuntura, parcela significativa da categoria profissional, conforme já foi exposto, posiciona-se contra o status quo, entretanto, não ultrapassa o discurso humanista, situando-se no bloco político-cristão.

O Golpe militar de 1964 ocorre com o apoio da burguesia: industriais, banqueiros e latifundiários; dos técnicos que ocupavam elevadas funções em órgãos estatais; e dos militares. O modelo econômico e político adotado tem por objetivo a aceleração do crescimento econômico, tendo como base de sustentação, uma ditadura política sob o comando dos militares.

No plano econômico, a ideologia de modernização dirige as ações econômicas, no sentido de garantir o funcionamento da reprodução ampliada do capital, alicerçada na doutrina de interdependência e do desenvolvimento internacionalista.

Ainda no plano econômico são tomadas medidas para garantir um novo trabalhismo apoiado na concepção de que as classes sociais teriam interesses conciliáveis. Isso trará, como consequência, uma nova política social com a redução da interferência dos sindicatos na vida nacional, restaurando-se o confisco salarial, o controle rígido e centralizado da política salarial. O modelo econômico adotado privilegia os grupos ligados ao capital estrangeiro e o empresariado em geral, assumindo medidas para garantir sua expansão e efetivação.

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Unidade: O Panorama Histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

Tais medidas se deram no campo político, com o fechamento da sociedade brasileira, interrompendo-se todos os canais de expressão e luta de setores não envolvidos nos frutos daquele modelo que se implantou. Os sindicatos foram desarticulados, anulando-se seu poder enquanto órgão reivindicativo, e incorporando-lhes atividades assistenciais e/ou recreativas.

A repressão social e política tornou-se o mecanismo mais eficiente de controle de quaisquer tentativas de contestar o governo militar. Em nome da segurança nacional, todas as formas de organização foram atingidas, bem como os mecanismos de expressão e manifestação da sociedade civil.

Golpe Militar de 1964 no Brasil

Na sequência imediata do 1º de abril, o golpe – autointitulado Revolução, com qualificativos vários, redentora, salvadora e outros que tais – mostrou a que veio: instaurou o arbítrio e a violência. Governadores legítima, e democraticamente eleitos, foram depostos, e políticos da oposição, jogados nas cadeias. Irrompeu o terrorismo: líderes sindicais, estudantis e dirigentes de organizações nacionalistas e populares foram presos arbitrariamente e submetidos a tratamentos vexatórios; o movimento sindical passou por uma operação limpeza: de abril a dezembro, o novo regime interveio em 452 sindicatos, 43 federações e 3 confederações de trabalhadores urbanos; membros das Ligas Camponesas foram perseguidos, encarcerados; assassinatos foram cometidos; o ódio dos violadores da legalidade destruiu espaços de organizações e instituições culturais: no Rio de Janeiro, a sede da UNE (União Nacional dos Estudantes) foi incendiada, os jornais nacionalistas e democráticos (os poucos que existiam), editoras e livrarias, foram empastelados e fechados. (NETTO, 2014 p. 70).

O regime militar se impôs pela violência contra seus opositores, utilizando-se de todos os instrumentos para garantir a efetivação do modelo econômico. A ditadura militar que se instalou foi o regime político que melhor atendia aos interesses do capital (empresariado e as oligarquias).

Na sua relação com as classes sociais, o Estado se utilizava de todos os instrumentos para garantir a efetivação do modelo econômico. As torturas e mortes, prisões sem julgamentos, os banimentos, o exílio, o fim dos Sindicatos enquanto órgãos de representação e reivindicação da classe trabalhadora, os espancamentos, seguidos de fuzilamentos sumários, dos esquadrões da morte, a censura etc., denotam o caráter autoritário e repressivo que caracterizou o Estado, no período governado pelos militares.

A repressão policial, a censura á imprensa e a propaganda governamental, mantinham a opinião pública alheia à realidade. Os governos militares adotaram como estratégia para responder aos opositores, os Atos Institucionais, que nada mais eram do que decretos autoritários, dando poderes absolutos ao Presidente da República, independente das leis, da Constituição Federal e do Poder Judiciário.

Abaixo, destacamos sinteticamente os governos militares no decorrer do período ditatorial:

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1. Governo Marechal Humberto de Alencar Castello Branco (1964-1967).

Neste período, as medidas econômicas adotadas tinham como principal objetivo controlar a inflação, que atingia dígitos próximos a 100%. As medidas implantadas foram o corte de gastos públicos e, também, aumento dos impostos e das tarifas dos serviços públicos. Promoveu ainda, um arrocho salarial que afetou as camadas mais baixas da população e aumentou a concentração de renda dos segmentos mais ricos.

Essas medidas aumentaram a impopularidade do governo, o que se expressou na eleição de 1965, para governadores de Estado. Dos onze Estados em disputa, a oposição venceu em cinco deles. Essa derrota eleitoral levou à adoção do Ato Institucional nº 2, que instituiu o bipartidarismo: Aliança Renovadora Nacional – ARENA, e Movimento Democrático Brasileiro – MDB; o primeiro representava a situação, e o segundo a oposição.

2. Governo Artur da Costa e Silva (1967-1969)

Proveniente da chamada linha dura do exército, o período de seu governo foi marcada pela intensificação da oposição, que agrupava diversos segmentos: estudantes, trabalhadores e artistas, além de alguns setores da Igreja Católica. Ocorreram diversas manifestações pelo fim da ditadura militar, sendo a maior delas a Passeata dos 100 mil, ocorrida em junho de 1968, no Rio de Janeiro. Um mês antes, o estudante Luís de Lima Santos havia sido assassinado, numa manifestação pacífica, na qual a polícia militar interveio com tiros.

Nesse clima de contestação nas ruas, o governo Costa e Silva decreta o Ato Institucional nº 5 – AI-5, em 13 de dezembro de 1968, estabelecendo plenos poderes ao Presidente da República, tais como: o fechamento do Congresso Nacional, a suspensão do

Habeas Corpus para os chamados crimes políticos, entre outras atribuições vinculadas ao endurecimento e autoritarismo do regime. A censura aos meios de comunicação se tornou mais rígida, atingindo a imprensa e os artistas em geral. Notícias, livros, filmes, músicas, peças de teatro só chegavam ao público depois de passar pelo critério dos censores militares.

Fonte: Wikimedia Commons

Fonte: Wikimedia Commons

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Unidade: O Panorama Histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

Importante

A-I5 – Ato Institucional nº 5, foi decretado em 13 de dezembro de 1968, conferindo plenos poderes ao Presidente, tais como: o fechamento do Congresso, a suspensão do Habeas Corpus para os chamados crimes políticos, entre outras atribuições vinculadas ao endurecimento e autoritarismo do regime. A censura aos meios de comunicação se tornou mais rígida, atingindo a imprensa e os artistas em geral. Notícias, livros, filmes, músicas, peças de teatro só chegavam ao público depois de passar pelo crivo dos censores.

Resumamos: o AI-5 esteve vigente por 10 anos e 18 dias (veremos sua revogação mais adiante, no fim dos anos 1970), no curso dos quais foi usado para cassar mandatos de 113 deputados federais e senadores, 190 deputados estaduais, 38 vereadores e 30 prefeitos – sem contar a punição de milhares de servidores públicos civis e militares, profissionais liberais, professores e membros do judiciário, além da censura de mais de 500 filmes, 450 peças teatrais, 200 livros e mais de 500 músicas. (NETTO, 2014, p. 134).

Foto da atual presidenta da Republica, Dilma Rousseff que, condenada pelo regime, foi presa política durante a ditadura militar.

O AI-5 significou o fechamento de praticamente todas as possibilidades políticas legais para a atividade das forças de oposição. Com o endurecimento do regime ditatorial, milhares de pessoas foram presas e torturadas; muitos seguiram para o exílio no exterior. Nesse clima de repressão, um grande número de jovens, muitos sob a liderança de dissidentes do PCB resolveram ir para a luta armada.

Dentre as organizações de esquerda (27 no total), as mais conhecidas foram: Partido Comunista do Brasil – PC do B; Movimento Nacional Revolucionário – MNR; Ação Libertadora Nacional – ALN; Vanguarda Popular Revolucionária – VPR; e, Movimento Revolucionário 8 de Outubro – MR8. O movimento de guerrilha urbana teve como principal liderança, o ex-deputado Carlos Marighela, assassinado numa emboscada em São Paulo. A guerrilha rural ocorreu em três localidades: Serra de Caparaó, em Minas Gerais; no Vale do Ribeira, em São Paulo, sob comando do Capitão do Exército Carlos Lamarca – também assassinado e no Araguaia; e no interior do Pará, onde foram exterminados 80 guerrilheiros.

Foto do ex-deputado Carlos Marighela, assassinado numa emboscada em São Paulo pelos militares.

Fonte: Wikimedia Commons

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3. Governo Emilio Garrastazu Médici (1969-1974).

Esse foi o período mais duro da ditadura; no plano político, o terror de Estado foi intensificado criando-se uma rede de informação e vigilância que buscava abranger toda a sociedade. Além do Serviço Nacional de Informação – SNI, criado em 1964, passaram a compor essa rede o Departamento de Ordem Política e Social – DOPS, nos Estados, e o Departamento de Operações Internas e Centro de Operações de Defesa Interna- DOI-CODI.

Esse último órgão foi inspirado na Operação Bandeirantes – OBAN, que promoveu torturas e mortes com a ajuda financeira de grandes empresários.

No plano político este período ficou conhecido como anos de chumbo, enquanto que no plano econômico, ficou denominado como a época do milagre brasileiro, em razão dos sinais de

recuperação e de um intenso crescimento econômico.

Trocando Ideias

Anos de Chumbo, é a denominação do período da ditadura no qual, o uso da violência foi empregado pelos militares para desarticular o movimento da sociedade civil, mantendo o regime militar intacto.

Aproveitando a recuperação da economia, o governo lançou campanhas cívicas adotando slogans como ninguém segura este país, prá frente Brasil, e, um dos mais emblemáticos, Brasil: ame-o ou deixe-o. Nesse contexto a vitória da seleção de futebol na copa de 1970, contribuiu para criar uma imagem ufanista entre a população.

ExploreFilme: Prá frente Brasil, de Roberto Farias, 1983.

Fonte: Wikimedia Commons

O chamado Milagre Brasileiro

foi propagado no início

da década de 1970, e se

caracterizou pelo crescimento

acelerado da economia.

Sustentou-se por algum

tempo, principalmente, à

custa da deterioração das

condições de vida da classe

trabalhadora.

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Unidade: O Panorama Histórico do Movimento de Reconceituação do Serviço Social

4. Governo Ernesto Beckmann Geisel (1974-1978).

Este General assume o governo com o objetivo de promover uma abertura política de forma lenta, gradual e segura. Pertencia a uma linha moderada do exército, em contraposição àqueles oficiais da linha dura, que resistiam à abertura do regime.

Esses oficiais foram responsáveis pela morte do jornalista da TV Cultura, Wladimir Herzog, em outubro de 1975, nas dependências do II Exército. Tal ato, de extrema covardia, gerou protestos e manifestações públicas contra o regime. Três meses depois, morreu nas mesmas circunstâncias, durante um interrogatório sob tortura, o metalúrgico Manuel Fiel Filho. Foram esses fatos que levaram o presidente Geisel a demitir o comandante do II Exército, o General Ednardo D’Avila Melo. No último ano de seu governo (1978), sob pressão interna de setores da sociedade brasileira e

repúdio das organizações internacionais de direitos humanos, o AI-5 foi extinto.

Com a extinção do AI-5 o sistema repressivo perdeu muito do seu poder de fogo, mas continuou atuando até a entrada dos anos 1980, inclusive com o objetivo de travar e reverter o processo de crise da ditadura. (NETTO, p. 137).

Foto de Wladimir Herzog, em outubro de 1975, quando foi assassinado nas dependências do II Exército de São Paulo.

Nesse mesmo ano, no dia 12 de maio de 1978, cerca de 2 mil metalúrgicos em São Bernardo do Campo (ABC paulista) sob a liderança de Luís Inácio Lula da Silva, entraram em greve exigindo melhores salários. Foi à primeira paralisação ocorrida no Brasil desde 1968. Na sequência, operários de grandes metalúrgicas – Ford, Mercedes-Benz e Volkswagem – também entram em greve. Em 1979, a onda grevista atingiu outras categorias como professores, bancários, funcionários públicos, jornalistas, médicos, lixeiros e outros.

5. Governo João Batista de Figueiredo (1979-1985).

Como sucessor do General Ernesto Geisel, foi-lhe atribuída a missão de levar adiante a chamada abertura política, projetada não por espírito democrático, mas para manter os velhos grupos no poder. Com um mandato de seis anos, o período desse governo foi marcado por uma crise econômica (1981 a 1984), que aumentou o descontentamento popular e reduziu a popularidade do governo.

Em 1980, ocorreu a greve mais longa de trabalhadores em São Bernardo do Campo, mobilizando 300 mil metalúrgicos. Essas greves contaram com a solidariedade da população, com a doação de alimentos e dinheiro para os fundos de greve. Sindicatos sofreram intervenção e líderes sindicais, entre eles Luis Inácio Lula da Silva, foram enquadrados

Fonte: Wikimedia Commons

Fonte: Silvaldo Leung Vieira/Wikimedia Commons

Fonte: Wikimedia Commons

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na Lei de Segurança Nacional. Dessas lutas surgiu, em 1980, o Partido dos Trabalhadores e duas centrais sindicais, a Central Única dos Trabalhadores – CUT (1983), e a Confederação Geral dos Trabalhadores – CGT (1986).

Foto do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo- ao centro LULA

ExploreFilme: Lula: o filho do Brasil, de Bruno Barreto, 2012.

Nesse governo, o fenômeno mais importante foi a crise de Estado que, apesar de ter sido anunciada em governos anteriores, atinge o seu auge com baixos índices de crescimento econômico, pobreza, desemprego, enfraquecimento do setor industrial e crises em áreas como educação, saúde, transporte, energia etc.. Em 1978, a inflação fugiu ao controle e estava na ordem de 38,9% – em 1980, atingiria 110%. O país estava num período de estagnação da economia, aliado a um quadro de inflação elevada.

Esses fatores econômicos e o terrorismo do Estado, promovido pela linha dura do exército, com atos como o envio de carta-bomba a sede da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB-RJ, que matou a secretária da entidade; o sequestro e espancamento do jurista Dalmo de Abreu Dallari, membro da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo; e o fracassado atentado à bomba no Riocentro, que explodiu antes do previsto e matou dois terroristas militares; geraram um clima de insatisfação popular contra o governo, mas também levaram a uma crise interna no núcleo de poder.

Embora os responsáveis pelos atentados não tenham sido punidos, os episódios causaram grande desgaste na imagem do governo, inclusive, nos meios militares, e contribuíram para enfraquecer a ala mais radical das Forças Armadas, e acelerar o fim do regime militar.

Negociações internas entre facções do governo ajustaram a não punição dos responsáveis pelos atentados terroristas, em troca da aceitação da política de abertura que previa eleições em novembro de 1982. Essas eleições deveriam ocorrer já com os novos partidos criados com a reforma partidária, que foi aprovada anos antes, em novembro de 1979.

Os novos partidos criados foram o Partido Democrático Social – PDS, que agregava os políticos da ARENA, enquanto que o MDB deu origem a cinco novos partidos: Partido do

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Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, Partido Popular – PP, Partido dos Trabalhadores – PT, Partido Democrático Trabalhista – PDT e Partido Trabalhista Brasileiro – PTB.

Nas eleições diretas para governador, a situação venceu em 12 Estados (PDS), o PMDB venceu em 10 e o PDT em 1 Estado. Nos mais importantes, venceu a oposição. Esse resultado fortaleceu pautas oposicionistas como a luta pela formação de uma Assembleia Constituinte, e eleições diretas para Presidente.

Fonte: Wikimedia Commons

Nesse contexto, foi apresentada no Congresso Nacional a emenda do Deputado Federal Dante de Oliveira, que previa a aprovação de eleições diretas para Presidente da República. Ocorreram várias manifestações em prol das eleições diretas no Brasil, e pelo fim do regime militar. Apesar da ampla mobilização da sociedade, promovendo comícios em diferentes Estados pela aprovação das diretas-já, a emenda foi derrotada no Congresso Nacional, sendo mantida a eleição indireta por parte do Congresso.

Nessas eleições o governo militar indicou para sucessão do Gal. Figueiredo, Paulo Salim Maluf, que perdeu as eleições no Colégio Eleitoral para o candidato do bloco de oposição – denominado Frente Liberal –, o parlamentar Tancredo Neves.

Atenção

A posse do presidente que deveria ocorrer em 15 de março de 1985, não aconteceu devido à hospitalização, no dia anterior, do presidente eleito, que veio a falecer no dia 21 de abril de 1985. A presidência foi ocupada pelo vice-presidente, José Sarney, ex-parlamentar da antiga Arena e que integrava o bloco de oposição, Frente Liberal, que, juntamente com o PMDB, formou um bloco denominado Aliança Democrática.

Com a posse de um político historicamente associado ao partido que deu sustentação à ditadura militar, chegou ao fim o regime, iniciando-se uma nova fase na história do Brasil.

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A ditadura Militar e o agravamento da Questão Social

O Serviço SocialCom o golpe de 1964, os debates travados na profissão foram truncados, mas, posteriormente,

tiveram influência na busca pela legitimação da profissão, junto à população mais empobrecida, alvo de suas ações. A realidade que antecede o Golpe de 64 estava marcada pela politização dos setores médios e organização dos trabalhadores urbanos e rurais, por intermédio de sindicatos e ligas camponesas, respectivamente; esses segmentos pressionam os profissionais a se posicionarem frente aos questionamentos políticos da época, tendo início, a partir daí, uma intensa revisão da prática profissional.

Esse questionamento de segmentos profissionais está intrinsecamente vinculado ao contexto histórico-político e social, que vai oferecer as bases para o movimento de reconceituação na América Latina, no final da década de 60.

Retomando o cenário social do país, na década de 1970, merece destaque o fato de que em 1974, cerca de 60% dos brasileiros viviam nas cidades, principalmente, contingentes que migraram para a Grande São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte. Às vésperas do Golpe, menos de 45% da população vivia nas cidades.

Essas novas populações, em sua maioria, vão compor as periferias das metrópoles, enfrentando graves problemas de transporte, amontoando-se em favelas ou habitações coletivas, construídas em regime de mutirão, e, extremamente, precárias.

Esse inchamento das cidades levou ao colapso dos serviços públicos, provocando revoltas da população usuária, principalmente em relação ao transporte público (ônibus e trens urbanos).

A deterioração das condições sanitárias; a queda do padrão de vida dos assalariados; o agravamento da desnutrição, das doenças infecciosas, e a elevação das taxas de mortalidade infantil, exigiam respostas do Estado – para garantir o controle e o consenso da classe trabalhadora –, e políticas sociais foram adotadas para minorar o agravamento das condições de vida do proletariado.

Essas políticas sociais setorizadas (saúde, educação, transportes etc.) têm por finalidade assegurar a manutenção e reprodução da força de trabalho; assegurar a contenção das tensões sociais, adotando-se uma política clientelística para demonstrar à opinião pública, a preocupação do governo com as questões sociais.

Assim, observa-se que o crescimento da demanda e exigências que essa conjuntura coloca para o meio profissional, nada mais é que um aspecto da resposta institucional ao agravamento das condições de vida do proletariado. (IAMAMOTO,2012, p. 370).

Nesse sentido, para atender às demandas, a profissão passa a adotar padrões e técnicas modernas, preocupando-se com o aperfeiçoamento do instrumental técnico, de metodologia etc. – o que se evidenciou nos Seminários de Araxá e Teresópolis. O debate pós 64 se acentua numa perspectiva modernizante, substituindo-se a ideologia desenvolvimentista por uma perspectiva pragmático-tecnocrática.

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Enquanto isso, a diversidade de tendências no interior da profissão busca imprimir a modernização no ofício, numa perspectiva questionadora da própria legitimidade frente às camadas populares, que demandavam seus serviços, assumindo compromissos políticos que estavam subjacentes ao próprio exercício profissional.

Diálogo com o Autor

É no decorrer desse debate que ganham relevo as tentativas de formulação de uma estratégia teórico-prática, a serviço do fortalecimento do processo organizativo dos setores populares (IAMAMOTO, 2012, p. 367).

Dentre os principais temas em discussão, situava-se a recusa da ação profissional tutelar e normativa, junto à população cliente, e a busca de maior proximidade com o cotidiano vivenciado pelas camadas populares, com o objetivo de estabelecer novas bases de legitimação da profissão.

É nesse panorama histórico que se inscreve o Movimento de Reconceituação no Brasil, primeiramente, na tarefa de adequar a profissão às exigências institucionalizadas do Estado autoritário e da grande empresa. O questionamento que ocorrerá antes do Golpe de 64, retornará com expressividade no seio da categoria profissional, no final da década de 70, quando se verificam mudanças na ordem econômica e política.

Com a falência do chamado milagre brasileiro, o Estado autoritário foi obrigado a rever a orientação política adotada, iniciando-se no governo militar do Presidente Geisel, o processo de distensão política, que teve continuidade com a chamada abertura política, na medida em que não era mais possível conter as insatisfações geradas pós 1964, apenas com a repressão.

A rearticulação do movimento operário, as oposições sindicais empenhadas em retirar as diretorias pelegas que o regime lhes havia legado, o pensamento e a prática de uma parcela da Igreja Católica, que se posiciona em favor dos oprimidos, a organização dos movimentos sociais (movimentos contra a carestia, movimento de luta por creches etc.), como instrumentos de luta da população, levam significativas parcelas da categoria profissional a questionar o conteúdo de sua prática.

Outro elemento presente nesse questionamento é a questão da prática enquanto cidadão, a qual não se desvincula de sua prática profissional, e que está referenciada por sua condição objetiva de trabalhador assalariado, que sofre o mesmo sistema de exploração a que esta submetida a classe trabalhadora em geral.

Essa nova condição do profissional, extrapolando sua prática estritamente profissional, leva segmentos da categoria a reconhecer a necessidade de desenvolver atividades ligadas a entidades sindicais, visando o fortalecimento da categoria na luta por direitos.

O questionamento da prática profissional dos Assistentes Sociais e a busca de outras fontes de legitimação, além de estarem midiatizados pela conjuntura sócio-política-econômica do país, sofrem influência da literatura produzida pelo movimento de reconceituação, que possibilitou avançar também no debate político-ideológico, na América Latina.

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Material Complementar

Explore

· MACARINI, José Pedro. A política econômica do governo Costa e Silva 1967-1969. Rev. econ. contemp., dez. 2006, vol.10, nº3, p.453-489. ISSN 1415-9848. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/rec/v10n3/01.pdf

· MACARINI, José Pedro. A política econômica do governo Médici: 1970-1973. Nova econ., dez. 2005, vol.15, nº3, p.53-92. ISSN 0103-6351. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/neco/v15n3/v15n3a03

· MACARINI, José Pedro. Um aspecto da política econômica do “milagre brasileiro”: a política de mercado de capitais e a bolha especulativa 1969-1971. Estud. Econ., mar. 2008, vol.38, nº1, p.151-172. ISSN 0101-4161. Disponível em http://ref.scielo.org/yhx5j4

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Referências

NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social. São Paulo: Cortez, 2014.

IAMAMAOTO, Marilda Vilela. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica – 33ª ed. São Paulo: Cortez, 2011.

COIMBRA, Cecília Maria Bouças.Tortura ontem e hoje: resgatando uma certa história. Psic. estud., dez. 2001, vol.6, nº 2, p. 11-19. ISSN 1413-7372. Disponível em http://www.scielo.org.

MACARINI, José Pedro. A política econômica do governo Médici: 1970-1973. Nova econ., dez. 2005, vol.15, nº 3, p. 53-92. ISSN 0103-635. Disponível em http://www.scielo.org.

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Anotações