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INSTITUTO DE ESTUDOS SUPERIORES MILITARES
CURSO DE PROMOO A OFICIAL GENERAL
2007/2008
TII
DOCUMENTO DE TRABALHO O TEXTO CORRESPONDE A TRABALHO FEITO DURANTE A FREQUNCIA DO CURSO NO IESM SENDO DA RESPONSABILIDADE DO SEU AUTOR, NO CONSTITUINDO ASSIM DOUTRINA OFICIAL DA MARINHA PORTUGUESA
A COOPERAO DOS PASES DO MERCOSUL FRENTE O
CENRIO INTERNACIONAL.
CARL IXASCapito-de-Mar-e-Guerra OS HENRIQUE SILVA SE
INSTITUTO DE ESTUDOS SUPERIORES MILITARES
A COOPERAO DOS PASES DO MERCOSUL FRENTE O CENRIO INTERNACIONAL.
Carlos Henrique Silva SeixasCapito-de-Mar-e-Guerra
Trabalho de Investigao Individual do CPOG
Lisboa 2008
INSTITUTO DE ESTUDOS SUPERIORES MILITARES
A COOPERAO DOS PASES DO MERCOSUL FRENTE O CENRIO INTERNACIONAL.
Carlos Henrique Silva SeixasCapito-de-Mar-e-Guerra
Trabalho de Investigao Individual do CPOG
Orientador: CMG Antnio Henrique Mal Rocha de Freitas
Lisboa 2008
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
NDICE
Resumo..................................................................................................................................vi
Abstract....vii
Palavras chave.viii
Lista de abreviaturas......ix
1. Introduo...1
2. O Cenrio Internacional.....2
a. Sntese Conclusiva..................................................5
3. Regionalizao....6
a. Sntese conclusiva.............11
4. O Mercosul e os Acordos.11
a. Conceito............12
b. Acordos.........................................15
c. Sntese Conclusiva16
5. Sntese da Integrao entre Argentina e Brasil.....16
a. Principais Interesses Coincidentes.. 22
b. Principais Discrepncia....23
c. Sntese Conclusiva....26
6. Estratgias do Mercosul nos Cenrios Americano e Europeu..26
a. Pespectivas...26
b. O Mercosul na Amrica do Sul....27
c. O Mercosul e a Alca.....29
(1) Acontecimentos Mais Recentes..31
d. O Mercosul e A Unio Europia......32
e. Sntese Conclusiva34
7. Posibilidades de Integrao Militar Regional...35
a. Sntese Conclusiva..38
8. Concluses....38 BIBLIOGRAFIA........................................................................................................... 41
iv
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
LISTA DE APNDICES
Apndice I Glossrio de conceitos...I-1
Apndice II Regionalismo Latino Americano.II-1
LISTA DE ANEXOS
Anexo A rea e Populao dos Estados Integrantes do Mercosul.A-1
Anexo B Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Integrantes do Mercosul.B-1
Anexo C Relao Comercial entre o Brasil e o Mercosul...C-1
v
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
RESUMO
Este trabalho analisar sucintamente alguns aspectos importantes da cooperao
existente entre os Estados integrantes do Mercosul, dando prioridade aos dois membros de
maior valor Poltico e Estratgico, no caso Argentina e Brasil. Inicialmente ser
apresentada uma panormica do cenrio internacional, aps o que sero mostrados os
aspectos da regionalizao, para ento chegar-se ao Mercosul propriamente dito.
A questo fundamental apresentada a seguinte: vlido para os estados
integrantes manterem a cooperao no Mercosul? Para respond-la ser importante
analisar a maneira como Argentina e Brasil devem desenvolver uma estratgia conjunta
frente ao cenrio internacional. Esta estratgia dever levar em considerao aspectos
econmicos e comerciais, para que se possa atingir propsitos mais amplos no campo
poltico. Desta forma, ambos os Estados e o Bloco, como um todo, tero possibilidades de
maximizar seus interesses.
Durante o trabalho ser apresentada uma sntese da integrao existente entre
Argentina e Brasil, com um pequeno histrico dos fatos ocorridos mais significativos e,
posteriormente, seus principais interesses e discrepncias.
Ser tambm descrito as estratgias que vm sendo adotadas pelo Mercosul nos
cenrios americano e europeu. Sero identificadas as estratgias que vm sendo
empregadas pelo Mercosul para fazer frente aos demais blocos existentes no continente, e a
maneira como dever alterar esse relacionamento para se buscar um melhor
desenvolvimento interno do bloco.
Existe uma tentativa permanente dos Estados Unidos da Amrica (EUA) de adotar
a rea de Livre Comrcio das Amricas (ALCA), neste trabalho ser apresentada a
maneira como o governo brasileiro considera que isso dever ocorrer, para inclusive
fortalecer o Mercosul. Ser apresentada tambm a maneira como o Mercosul dever se
relacionar com a Unio Europia para buscar alcanar algum proveito da rivalidade
existente entre este bloco e os EUA.
Para terminar ser analisada a possibilidade de ocorrer uma integrao militar na
regio, avaliando as aes desenvolvidas na atualidade que podero contribuir para a
referida integrao.
vi
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
ABSTRACT
This work presents a succinct analysis about some important aspects of the ongoing
cooperation between Mercosul states integrants, giving priority to two members that have
more political and strategic value, Argentina and Brazil. Initially there is an overview of
the international scenario, followed by some aspects on regionalization that finally leads to
the Mercosul subject.
The main question is if it does remain valid the cooperation between the Mercosul
states? To answer it, it is important to analyse how Argentina and Brazil formulate a joint
strategy considering the world scenario, considering economic and commercial aspects, to
achieve wider aims at the political level, as a mean to maximize their mutual interests.
This work also presents a synthesis on the actual interaction between Argentina and
Brazil, along with a brief history of the most significant events and their main interests and
complaints.
In addition, there is a description about the strategies adopted by Mercosul in the
American and European scenarios, as well as the strategies currently applied to confront
other economic blocs that are present in South America, and how to modify such a
relationship in order to work get a better internal development of the bloc.
Facing the U.SA`s permanent initiative towards the American free trade area, there
is also presentation of the Brazilian governments consideration how to work this subset
out as a means to improve Mercosul itself. It is also presented a proposal on the future
relationship between Mercosul and the European Union as a means to exploit some of the
rivalry that exists between them.
To conclude will be considered a possible military integration in region, analysing
the actions going on that will be able a value for this integration.
vii
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
PALAVRAS-CHAVE
Cenrio Internacional,
Cooperao,
Regionalizao,
Integrao, e
Mercosul.
viii
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
LISTA DE ABREVIATURAS
ALADI Associao Latino-Americana de Integrao
ALALC Associao Latino-Americana de Livre Comrcio
ALCA rea de Livre Comrcio das Amricas
ALCSA rea de Livre Comrcio da Amrica do Sul
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
C&T Cincia e Tecnologia
CNC Comit de Negociaes Comerciais
CAN Comunidade Andina
CAF Cooperao Andina de Fomento
DEA Drug Enforcement Administration
EUA Estados Unidos da Amrica
FEDER Fundo Europeu de Desenvolvimento Social
FFAA Foras Armadas
FSE Fundo Social Europeu
FOCEM Fundo para Convergncia Estrutural do Mercosul
GATT General Agreement on Tariffs and Trade
MINUSTAH Misso das Naes Unidas para Estabilizao do Haiti
MCCP Mecanismo de Consulta e Concertao Poltica
MD Ministrio da Defesa
MDIC Ministrio do Desenvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior
NAFTA North America Free Trade Agreement
OMC Organizao Mundial do Comrcio
ONG Organizaes no Governamentais
ONU Organizao das Naes Unidas
OTAN Organizao do Tratado do Atlntico Norte
P&D Planeamento e Desenvolvimento
PICAB Programa de Cooperao e Integrao entre Argentina e Brasil
PNID Poltica Nacional de Indstria de Defesa
UE Unio Europia
URSS Unio das Repblicas Socialistas Soviticas
UNASUL Unio das Naes Sul Americanas
ix
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
x
UNHCHR United Nations High Commissioner for Human Rights
USD United States Dollar
USTR United States Trade Representative
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
1
1. INTRODUO
O cenrio internacional atual apresenta uma grande competio a nvel mundial,
entre as grandes potncias pela conquista de novos mercados. Tal situao se reflete nas
estratgias adotadas pelas polticas exteriores desses atores para alcanar e garantir seus
interesses, o que pode ser percebido pela crescente busca nas formaes de blocos
comerciais regionais, que conferem, obviamente, maior importncia e prestgio poltico
internacional aos principais Estados envolvidos.
Pode-se considerar em termos polticos e estratgicos Argentina e Brasil como os
principais atores integrantes do Mercosul1, sendo, desta forma, para efeitos acadmicos, os
dois Estados que sero estudados com maior profundidade neste trabalho.
Antes do comprometimento com o bloco, ambos estavam condicionados a
alinhamentos automticos com os principais atores internacionais2, resultando quase
sempre em algum tipo de prejuzo financeiro e, consequentemente, poltico. Atualmente,
percebe-se uma alterao neste modelo, devido ao estabelecimento da iniciativa de
cooperao iniciada por ambos os Estados.
Este estudo buscar, ao longo de seu desenvolvimento, responder a seguinte
questo principal: vlido para os estados integrantes manterem a cooperao no
Mercosul? Neste estudo ser levado em considerao aspectos polticos, econmicos,
comerciais e militares. Com o propsito de atingir esse objetivo, sero respondidas as
seguintes questes derivadas: qual o Cenrio internacional durante e aps a guerra fria?
Como foi o processo de criao do Mercosul? Como se desenvolveu a integrao entre
Argentina e Brasil? Quais seus interesses comuns e discrepncias? Como est o
relacionamento do Mercosul no cenrio americano e europeu? possvel uma integrao
militar entre os membros do Mercosul?
Para efeitos de desenvolvimento do presente trabalho, inicialmente ser descrito o
cenrio internacional e regional da atualidade, posteriormente como se iniciou o processo
de integrao entre os dois Estados com maior projeo no bloco: Argentina e Brasil, e os
principais acordos realizados pelos Estados durante o processo inicial.
Em continuao, se efetuar uma anlise dos diversos interesses identificados como
coincidentes na relao bilateral, e em que grau esto sendo atendidos no processo de 1 Mercosul Mercado Comum do Sul, essa denominao foi definida nas revises efetuadas pelo
embaixador brasileiro Celso Amorim, para o Tratado de Assuno. Inicialmente o significado seria Mercado Comum do Cone Sul, mas ele solicitou a retirada da palavra Cone, porque a opinio pblica da regio nordeste brasileira poderia interpretar que seria um projeto voltado especificamente para a regio Sul do pas (PEA, 2006).
2 No sculo XIX esse ator era a Gr-Bretanha, no sculo XX se alinharam com os EUA.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
desenvolvimento do bloco regional. Logo aps, sero analisadas as principais
discrepncias na relao entre Argentina e Brasil, indicando possveis aes para resolver
os problemas surgidos.
Posteriormente, se delinear a estratgia bsica do bloco regional no cenrio
internacional, em especial quanto aos seguintes cenrios:
- O Mercosul na Amrica do Sul;
- O Mercosul e a Alca; e
- O Mercosul e a Unio Europia (UE)
Por ltimo, mas no menos importante, ser analisada a possibilidade de se realizar
uma integrao entre o Poder Militar dos Estados membros do bloco.
A metodologia aplicada foi de pesquisa descritiva, com uma abordagem qualitativa
por meio da explorao de uma diversificada bibliografia (livros, artigos, peridicos,
legislao disponvel e sites da Internet relacionados ao assunto). O mtodo cientfico
empregado foi o DEDUTIVO.
Naturalmente este trabalho no tem a pretenso de esgotar o tema, demasiado
amplo, complexo e cheio de alternncias. A proposta proporcionar ao leitor uma anlise
objetiva da cooperao entre os membros do bloco, enfatizando Argentina e Brasil.
2. O CENRIO INTERNACIONAL
Nosso planeta possui muitas incertezas na atualidade. No velho mundo bipolar,
duas potncias: Estados Unidos da Amrica (EUA) e a ex-Unio das Repblicas
Socialistas Soviticas (URSS) se enfrentaram pela hegemonia, valendo-se de todos os
recursos polticos e econmicos, buscando uma derrotar a outra (NYE, 2002.).
Na poca da bipolaridade, as opes disponveis para os pases mais frgeis eram
trs:
- alinhar-se automaticamente com os EUA e o mundo ocidental capitalista, receber
apoio econmico e militar, e em contrapartida comprometer-se a combater o
comunismo em toda a sua amplitude;
- alinhar-se ao comunismo, implantando-o como sistema econmico e social,
receber algumas formas de ajuda material e principalmente ajuda militar,
satelizar-se e responder aos interesses soviticos no cenrio internacional;
- integrar-se ao grupo dos no alinhados e sofrer as conseqncias do isolamento
que naturalmente ocorreria.
2
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
3
Em 1989 houve a queda do muro de Berlim e, consequentemente, a reunificao da
Alemanha. Assim como sua existncia simbolizou a diviso do mundo entre as
superpotncias, sua queda simbolizou o fim da Guerra Fria. Os EUA emergem desse
perodo como o grande vencedor da competio pela hegemonia mundial, a economia de
mercado triunfa, frente economia centralizada, e a URSS acaba se dissolvendo. O
paradigma do modelo democrtico-liberal-capitalista parece ser o que mais se assemelha
aos ideais da humanidade nos tempos atuais, e passa a ser adotado pela maioria dos
Estados.
A partir deste perodo, identifica-se um cenrio internacional multipolar sob o
ponto de vista econmico, existem diversos atores importantes, principalmente com o
surgimento dos blocos regionais, realizando a cada dia, uma busca feroz por novos
mercados. No entanto, no aspecto militar ficou estabelecido a unipolaridade dos EUA, com
um poderio militar infinitamente superior a qualquer Estado, ou mesmo perante aos blocos
regionais existentes na atualidade. O cenrio internacional passa ento a ser uni-multipolar.
Os grandes avanos tecnolgicos, principalmente no campo da informtica e das
telecomunicaes, componentes essenciais da tecnologia de informao, esto provocando
profundas transformaes nas relaes internacionais, mediante uma ampla integrao dos
sistemas financeiros, assim como na produo e no intercmbio de mercadorias e servios.
Estes avanos tecnolgicos so, tambm, capazes de transmitir quase que
instantaneamente, a diversas regies do mundo, tanto os xitos econmicos iniciais dos
pases que se converteram ao capitalismo, como tambm todas as suas deficincias, como o
aumento do desnvel social existente, produzindo uma difuso do paradigma ocidental,
mesmo nas economias mais fechadas como a da China. Deste modo, podemos chegar a
concluso que o fenmeno da globalizao3, um dos mais espetaculares fenmenos que o
final do sculo XX pode presenciar, est diretamente associado a duas causas principais:
- o relativo xito do modelo liberal-democrtico-capitalista, e
- a evoluo tecnolgica, que torna possvel a distribuio do conhecimento aos
locais mais distantes do mundo, difundindo o modelo vencedor como se fosse um vrus,
que nenhum regime poltico, por mais fechado que seja, pode tornar-se isento.
3 Globalizaco - Realidade cuja dinmica, influncia e peso, transformam sectores das sociedades atuais nas
suas dimenses, poltica, econmica e cultural. Com conseqncias (...) perda de autonomia de governos,
poderio de mercados financeiros, desenvolvimento de redes mafiosas (...) o mundo entrou numa nova era
repleta de incertezas e ameaas (RAMONET, 2004:5).
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
4
Ela virtualmente to antiga quanto histria humana. A novidade que agora as
redes so mais complexas, incluindo pessoas de diversas classes scias e regies distantes.
A antiga rota da seda, que ligava a Europa a sia, era um exemplo de globalizao
rarefeita, que envolvia pequenas quantidades de artigos de luxo para uma quantidade
restrita de clientes. No sculo XIX houve uma globalizao econmica extraordinria,
ocorreu um intercmbio grande entre as diversas regies, gerando uma interdependncia
entre os Estados.
A globalizao atual mais densa e mais rpida, ela modifica as regras do jogo
competitivo entre os Estados, boa parte dessa diferena est relacionada com a revoluo
da informao. Como argumenta Thomas Friedman, a globalizao contempornea avana
mais e mais depressa, mais barata e mais profunda 4.
O fim da Guerra Fria iniciou uma nova fase na globalizao militar, tornando-a
mais complexa. As disputas antes existentes entre as grandes potncias perderam
relevncia no equilbrio de poder. Porm, nos ltimos anos, a importncia dada
globalizao social aumentou, introduzindo novas dimenses ao globalismo militar, dando
maior nfase a interveno humanitria e ao terrorismo.
As questes humanitrias interagindo com as comunicaes globais, criaram um
ambiente de forte presso na opinio pblica mundial e, principalmente, nas das grandes
potncias, impondo, de certa forma, algum tipo de interveno militar em diversos locais
do mundo, como Somlia, Bsnia e Kosovo(NYE, 2002).
As opes nos dias atuais para a implementao do terrorismo como arma letal est
em pleno andamento, haja vista o ocorrido no territrio norte-americano no ataque as
Torres Gmeas, no dia 11 de setembro de 2001, e outros ocorridos em diversas partes do
mundo.
No podemos esquecer que todo esse processo de ataques terroristas, pelo menos
at o presente momento, tem afetado muito mais os Estados importantes no cenrio
internacional, com maior poder de influncia e deciso nos destinos da humanidade, que os
Estados subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Estes esto muito mais preocupados no
atual cenrio, com seu desenvolvimento econmico e social, que so necessidades mais
urgentes de suas sociedades.
impressionante a distribuio assimtrica dos benefcios que o processo de
globalizao est trazendo para os indivduos de cada Estado, ou mesmo entre os Estados.
4 Friedman, T. The Lexus and The Understanding Globalization. New York: Farrar, Straus and Giroux, 1999.
p-7-8.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
5
Pode-se citar como exemplo da grande desigualdade entre os indivduos de Estados
diferentes, o fato de que em 1998, os trs bilionrios mais ricos do mundo, acumulavam
uma riqueza em ativos maior do que a renda de seiscentos milhes de habitantes de
Estados menos desenvolvidos ao redor do planeta (NYE, 2002).
Nos dias atuais, os aspectos econmicos das relaes internacionais adquirem
relevncia significativa, influenciando nos aspectos polticos e militares. Este processo
possui algumas caractersticas principais, as quais sero tratadas a seguir.
A primeira delas a distribuio geogrfica dos mercados, como conseqncia da
saturao dos mercados dos pases mais ricos e o fortalecimento dos mercados dos pases
emergentes, entre os quais podemos incluir os pases do Mercosul, que pretende ser um
importante plo de consumo e produo.
Outra caracterstica importante do cenrio internacional que hoje em dia os atores
fundamentais j no so exclusivamente os governos como representantes dos Estados-
Naes, possuem um papel cada vez mais relevante as empresas transnacionais e as
Organizaes No Governamentais (ONG).
As empresas transnacionais, por sua natureza, tm exercido significativo papel no
processo de globalizao. No entanto, ainda que tenham atuao em vrias regies do
mundo, estas empresas continuam tendo sede em um determinado Estado, com o qual
jamais deixaro de ter um vnculo e estaro sempre identificadas, e seguramente tero
compromissos de ordem poltica e institucional com suas classes dirigentes.
Quanto as ONG, normalmente elaboram causas mais voltadas para rea ecolgica
ou humanitria, o que lhes garante uma capacidade de projeo e penetrao em quase
todos os Estados do mundo, com uma fluidez tal, que do a impresso de que para elas no
existe o conceito de soberania5. No chegam a ter o mesmo poder das empresas
transnacionais no cenrio internacional, mas podem influenciar nos assuntos internos, que
por seu intermdio podem ter conseqncias de carter internacional.
a) Sntese Conclusiva
Conclui-se, portanto, que vivemos em um mundo repleto de incertezas, em um
cenrio que podemos chamar de uni-multipolar. A globalizao trouxe benefcios e alguns
problemas. Atualmente, os aspectos econmicos das relaes internacionais adquiriram
grande importncia, influenciando nos aspectos polticos e militares.
5 Soberania o poder poltico, de que dispe o Estado, de exercer o comando e o controle, sem submisso
aos interesses de outro Estado (Houaiss, 1994).
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
Os governos dos Estados neste cenrio tendem a possuir uma atuao muito mais
limitada, medida que esto em jogo grandes quantidades de fatores, que se configuram
como uma complexa trama de interesses, tanto nacionais como internacionais, onde eles
tm que conduzir sua poltica interna e externa, de modo coordenado e coerente. Este, com
certeza, o grande desafio do Estado-Nao moderno.
3. REGIONALIZAO
Os processos de globalizao e regionalizao esto vinculados de forma ambgua,
j que em princpio seriam conceitualmente opostos, mas como veremos a seguir, esto de
algum modo associados.
O incio da dcada de 90 alterou profundamente o cenrio internacional, houve a
unificao alem, desmembramento da URSS, ampliao e aprofundamento da Unio
Europia, e a democratizao na Amrica latina, fatores que, de certa maneira, facilitaram
o processo de regionalizao.
Atualmente, as grandes disputas se do na competio por novos mercados, que
possam sustentar altos nveis de produo e que possam, pelo menos, manter as atuais
taxas de ocupao de trabalho. Nesta luta, as naes desenvolvidas apregoam a abertura
econmica como o melhor caminho para o desenvolvimento dos pases, mas nunca
esquecendo de se tomar as precaues necessrias preservao da atividade econmica
interna. Porm, em contra partida, fecham seus prprios mercados mediante a aplicao de
tarifas alfandegrias. Alguns produtos brasileiros ingressam ao mercado norte-americano
com tarifas de cerca de 100%, como forma de compensao s prticas subsidirias,
supostamente aplicadas pelo governo brasileiro, que desta forma estaria contrariando os
princpios do livre comrcio mundial.
O que se est a dizer no contrrio globalizao, que com certeza um
processo natural de evoluo da civilizao. No entanto, os acontecimentos demonstram
que na prtica, a globalizao no implica na eliminao das barreiras que dividem o
mundo em naes desenvolvidas, emergentes, em desenvolvimento e subdesenvolvidas.
Pode inclusive parecer ser um processo de neocolonialismo, j que tenderia a facilitar a
explorao da mo de obra mais barata disponvel nos Estados ainda no desenvolvidos da
sia, frica e Amrica Latina, como na realidade vem ocorrendo.
Em contrapartida, esse mesmo processo de globalizao o que permite a gerao
de novos postos de trabalho nos Estados ainda em desenvolvimento, em um ritmo que no
6
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
7
seria alcanado exclusivamente pelo crescimento espontneo da economia destes pases, no
caso de um hipottico cenrio de protecionismo e isolamento econmico.
A poltica externa brasileira possui um posicionamento globalizado, procura
incentivar o regionalismo, mas tambm proclamou a inteno de contribuir para a
democratizao das relaes internacionais e estimular os incipientes elementos de
multipolaridade da vida internacional contempornea (RIBAS, 2006). Para isto, procura
manter fortes vnculos bilaterais tanto com os Estados desenvolvidos como com outros
Estados em desenvolvimento de maior expresso geopoltica e econmica.
Desta forma, pode-se dizer que a postura da poltica externa brasileira se alterou,
fazendo com que deixasse de apresentar o Brasil apenas como membro ativo do grupo de
Estados em desenvolvimento, para assumir uma posio de potncia emergente6, buscando
uma posio de maior relevncia no cenrio internacional. Tambm percebeu que outra
maneira de se inserir neste cenrio, ocupando uma posio de destaque, seria incentivando
o processo de regionalizao.
Os processos de integrao regional normalmente so conduzidos de forma lenta e
gradual, para que cada Estado membro possa adaptar-se nova realidade do mercado
regionalizado, proporcionando-lhe a possibilidade de preparar-se para os desafios da
competio regional, uma oportunidade que de nenhuma maneira se daria no processo
espontneo e incontrolvel da globalizao. Inicia-se normalmente com um processo
econmico-comercial, para no futuro, chegar-se a um processo de integrao poltica mais
consistente.
Devido s diversas experincias j ocorridas ao longo do tempo, em processos de
integrao regional, eles ocorrem por meio de diversos modelos, que podem seguir ou no
as fases sucessivas para uma integrao, a saber: zona de preferncia tarifria, zona de livre
comrcio, unio aduaneira, mercado comum e unio econmica. O Mercosul, no momento,
ainda um projeto de construo de um Mercado Comum, cuja execuo encontra-se na
fase de unio aduaneira parcial7.
Outro fato relevante que, a partir da dcada de 80, o fenmeno da integrao
passou a despertar o interesse das comunidades poltica e acadmica. Isto ocorreu pelo fato
do regionalismo econmico ter-se constitudo em elemento fundamental das estratgias 6 A expresso potncia emergente usada neste trabalho para descrever a situao daqueles Estados em
desenvolvimento cuja poltica aspira no apenas ao prprio progresso econmico, mas tambm, especificamente, a uma ampliao da sua projeo externa.
7 O Tratado de Assuno previa a formao de um Mercado Comum em 1994, por meio de eliminao de barreiras e da formao de uma tarifa externa comum (o que corresponderia na prtica a uma unio aduaneira), mas teve esse prazo prorrogado (SARAIVA, 1999).
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
8
polticas e econmicas das grandes potncias, principalmente dos EUA, que abandonaram
sua posio de no participar de esquemas preferenciais de alcance regional, convertendo-
se em propositores e protagonistas de uma srie de acordos em bases regionais.
Percebendo que estava ocorrendo uma mudana no cenrio internacional, os pases
em desenvolvimento tambm passaram a direcionar suas estratgias para a insero
internacional por meio de uma integrao regional. Neste aspecto, a Amrica Latina tentou
revigorar o Mercado Comum Centro Americano, a Comunidade Andina, entre outros, at
chegar-se a criao do Mercosul. (Apndice II)
O acordo de integrao para a formao do Mercosul tinha objetivos bastante
ambiciosos, ele nasceu no meio de dois processos fundamentais:
- o surgimento do regionalismo como modo de liberao e insero internacional e,
- a alterao na modalidade de crescimento dos pases da regio em relao ao
mundo.
O Brasil surge no incio do sculo XXI, dentre os Estados emergentes, como um
dos mais slidos e promissores, devidos aos seguintes fatores: sua vasta reserva territorial
(8,5 milhes de km2), sua homogeneidade cultural veiculada por uma cultura e lngua
comum, uma populao jovem, de idade activa e a buscar qualificao profissional sendo,
desta forma, um plo centralizador e de vital importncia para uma integrao regional
exitosa (SOUZA, 2002).
Outro fator importante a ser considerado que, nos ltimos anos, a poltica externa
brasileira vem a priorizar o Continente Sul-Americano. Depois de longo tempo alinhado
aos EUA e as potncias europias, nosso Itamaraty8 vem a dar nfase ao processo de
regionalizao, a priorizar o fortalecimento dos blocos econmicos e foros polticos
regionais. Esta postura tem o propsito de unificar os discursos da regio, como tambm
dar maior peso poltico Amrica do Sul, nas decises de alcance global (RIBAS, 2006).
Importante ressaltar no processo de integrao regional, no caso especfico do
Mercosul, a relevncia dada chamada clusula democrtica, institucionalizada pelo
protocolo de Ushuaia (1998) sobre o Compromisso Democrtico do Mercosul9. O bloco,
desta forma, tornou-se garantia relevante da consolidao dos regimes democrticos na
regio. Nas crises ocorridas em 1996 e 1999 no Paraguai, a atuao conjunta dos Estados
8 rgo responsvel pela conduo da poltica externa brasileira.. 9 Art.1 - A plena vigncia das instituies democrticas condio essencial para o desenvolvimento dos
processos de integrao entre os Estados-Partes do presente Protocolo.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
9
membros do bloco foi elemento importante para assegurar a manuteno da integridade das
instituies democrticas naquele pas vizinho.
De acordo com o professor do Instituto de Relaes Internacionais da Universidade
de So Paulo, Tullo Vigevani, A constatao de que o Brasil, para exercer uma influncia
poltico-econmica regional e at global, teria de construir um sistema de alianas polticas
e pactos econmicos s viria a ganhar uma dimenso definitiva nos dois mandatos de
Fernando Henrique Cardoso e, depois, se intensificaria na gesto do presidente Lula
(RIBAS, 2006). Ele inclusive relata que considera que as duas principais aes polticas
brasileiras que ilustram esta sua frase, e que procuram consolidar a liderana nacional no
continente, so, inegavelmente, o processo de formao da Comunidade Sul-Americana
das Naes (CASA),10 que tem a chancela do Itamaraty; e a ao das Foras Armadas
(FFAA) brasileiras no Haiti.
O Brasil persegue a longo tempo, exercer uma liderana natural no continente.
Neste aspecto, o pas gostaria de tornar-se o porta voz da regio. As aes relatadas
acima, sem dvida, contribuem para que o Brasil passe a ser visto internacionalmente
como um pas atuante e com interesse no bem estar dos Estados, podendo, desta forma,
aumentar sua relevncia diplomtica no cenrio internacional.
Diversos observadores tm comentado que o Brasil est a procurar exercer sua
liderana buscando financiar projetos em diversos pases do continente, pode-se citar:
- gasoduto do Sul, obra que pretende unir os mercados consumidores e
produtores de gs natural da regio;
- rodovia Acre-Pacfico, que atravessar o Peru;
- diversas obras de empresas nacionais que esto a realizar trabalhos de infra-
estruturas nos diversos pases do continente, muitas financiadas pelo Banco Nacional de
Desenvolvimento Econmico (BNDES).
Embora um pouco mais enfraquecidos politicamente pela falta de investimentos na
regio e pela agressiva poltica externa norte-americana empregada atualmente na Guerra
do Iraque, os EUA, mesmo assim, tm procurado interceder na rea, realizando acordos
bilaterais com Estados da regio, como Chile e Uruguai, tentando justamente enfraquecer o
processo de integrao regional (entenda-se o Mercosul), com o propsito de no perder
influncia poltica no cenrio regional.
10 Grupo criado oficialmente em dezembro de 2004 com o objetivo de ampliar o dilogo poltico e promover
a integrao econmica, comercial e de infra-estrutura da regio. Passou a se chamar Unio de Naes Sul-Americanas (Unasul), em fevereiro de 2008.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
10
A integrao entre os Estados da regio vem a acontecer de forma lenta e gradual,
no dia 07 de maio de 2007, ocorreu, em Montevidu, a instalao do Parlamento do
Mercosul. Trata-se de um importante passo no sentido de se atribuir uma forma poltica ao
processo de integrao, e assim possa se chegar implementao de uma verdadeira Unio
Aduaneira, como uma etapa para concepo de um Mercosul que todos idealizam. Este
Parlamento ter inicialmente 72 membros dos Parlamentos nacionais, sendo 18 de cada
Estado. No caso do Brasil, sero 09 Senadores e 09 Deputados, isto ocorrer em 2010.
Est previsto modificao na confeco deste Parlamento em 2014, quando os
membros sero eleitos especificamente por suas respectivas populaes em eleies locais,
devendo tambm ocorrer uma adequao no nmero de parlamentares, em busca de uma
melhor proporcionalidade.
Em entrevista concedida ao Jornal O Globo, o chanceler Celso Amorim saiu em
defesa do Mercosul, segundo ele: Nem todos querem integr-lo, mas isso no conflitivo
com a integrao. Hoje quem no membro pleno do Mercosul membro associado, com
apenas duas excees: Guiana e Suriname. A divergncia quanto velocidade da
integrao. Para o presidente da Venezuela (Hugo Chavez) se deveria acelerar o processo,
para o Chile ao contrrio, se deveria retardar o processo. O Brasil encontra-se em uma
posio intermediria, desejando uma integrao lenta, gradual, mas o mais slida
possvel11. Para que se possa ter uma idia de como o processo de integrao moroso, na
Unio Europia, que iniciou um processo semelhante na dcada de 50, o Parlamento
comum s foi estabelecido em 1979.
O Mercosul j obteve diversos resultados positivos, seguem abaixo os mais
destacados:
- A criao de um ambiente apropriado para uma viso estratgica comum, centrada
no predomnio da lgica de integrao frente fragmentao nas relaes entre as
naes da regio, refletindo especialmente no conceito de Zona de Paz;
- A afirmao dos valores da democracia, o desenvolvimento econmico e a coeso
social na regio;
- Maior conectividade entre os scios, tanto no plano econmico, comercial, como
no poltico, social, cultural, educativo, acadmico e militar (maior quantidade de
exerccios e intercmbio entre as Escolas Militares);
11 Matria publicada no jornal O Globo, dia 06/05/2007, pg. 2, coluna Tereza Cruvinel. Disponvel na
internet em www.oglobo.com.br
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
Por outro lado, tambm, se podem destacar alguns pontos que ainda esto
insuficientes, necessitando de uma melhor ateno dos governantes, para que se logre obter
um melhor desempenho. Esto relacionados a seguir os principais pontos identificados:
- A ausncia de uma metodologia eficaz para harmonizar interesses nacionais entre
naes de dimenses e graus de desenvolvimentos diferenciados, e para gesto de
conflitos, originados no prprio processo de integrao;
- A elaborao de enfoques e estratgias efetivamente compartidas de integrao
econmica e poltica; e
- A efetividade das regras estabelecidas, isto , assegurar que entre em vigor o que
foi acordado, inclusive que passe a vigorar nos direitos internos de cada Estado.
Em dezembro de 2007 foi assinado a ata de fundao do Banco do Sul, entre
Argentina, Bolvia, Brasil, Equador, Paraguai, Uruguai e Venezuela. A criao deste banco
foi o marco de uma importante vontade entre os pases do Cone Sul de realmente
efetuarem uma integrao mais slida. No momento, este processo est na fase inicial, mas
ele dever ser lento e gradual, para que esta entidade venha a ter um bom lastro e uma boa
capacidade tcnica e administrativa. Outro fato relevante que todos os Estados membros
tero o mesmo peso nas decises, para que no ocorra o que hoje acontece no FMI (Fundo
Monetrio Internacional), Banco Mundial e o Banco Interamericano de Defesa, onde os
interesses dos EUA acabam prevalecendo.
a) Sntese Conclusiva
Fica evidenciada a importncia do processo de regionalizao, que est de certa
forma relacionado com a globalizao. Como no mundo moderno as grandes disputas se
do pela busca de novos mercados, a partir da dcada de 80 os Estados em
desenvolvimento passaram a direcionar suas estratgias neste sentido.
Os processos de integrao regional devem ser conduzidos de forma lenta e
gradual, para que os Estados membros possam realizar as adaptaes necessrias.
O Brasil surge no incio do sculo XXI como um dos Estados emergentes mais
promissores, busca a longo tempo exercer uma liderana no continente, e para isso
importante continuar a buscar a integrao da regio, construindo instituies regionais
fortes como a UNASUL e o Mercosul, como tambm se deve procurar fortalecer a
democracia em toda a Amrica do Sul. Desta forma, com certeza, um dia se poder chegar
a construir um processo de integrao aos moldes do interesse de cada participante.
11
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
4. MERCOSUL E OS ACORDOS
Dentro do processo de negociao que conduziu criao do Mercosul, houve todo
um arcabouo institucional, do regime de livre comrcio e da unio aduaneira, mostrando
toda a disposio dos governos de realizarem uma aproximao no campo poltico,
econmico e estratgico. Veremos neste captulo todo o processo at chegar-se ao modelo
de bloco existente nos dias atuais.
a) Conceito:
Em meados da dcada de 80, os governos da Argentina e Brasil aproveitando o
marco institucional da ALADI (Associao Latino-americana de Integrao), que tinha
como objetivo formal, constituir um mercado comum latino-americano, iniciam a etapa de
um processo de integrao bilateral, que constitui o precedente mais prximo do que viria a
ser o Mercosul. Em grande parte, este processo pode ser atribudo como resposta
inoperncia das diversas tentativas realizadas at aquela poca, no sentido de uma
integrao regional.
O Mercosul deveria nascer com um forte sentido poltico e estratgico,
visivelmente relacionado ao restabelecimento da democracia em ambos os pases e com a
necessidade de reverter certa tendncia confrontao que se havia manifestado de forma
recorrente atravs da histria. Seria tambm multidimensional, atendendo a diversos
aspectos, como poltico, comercial, social, e outros.
Este processo tem incio em 1985, na Ata de Iguau, seguido logo pelo Programa
de Cooperao e Integrao entre Argentina e Brasil (PICAB) de 1986.
Em 1988 se assina o Tratado de Cooperao e Integrao entre Argentina e Brasil,
que foi ratificado em 1989 e ainda encontra-se em vigor. O objetivo definido deste
instrumento bilateral foi integrar um espao econmico comum.
O tratado bilateral era somente um marco, que no inclua compromissos jurdicos
imediatos de abertura de mercados. Pode ser considerado como uma etapa importante do
processo de integrao que estava tendo incio. No aspecto poltico, pode-se considerar que
marcou a vontade de se ter uma orientao estratgica conjunta, que viria a ser retomada
com o Mercosul.
Em 6 de junho de 1990, Argentina e Brasil assinaram a Ata de Buenos Aires,
mediante a qual fixaram a data de 31/12/1994 para a formao de um Mercado Comum
entre os dois pases. Em setembro de 1990, Paraguai e Uruguai so convidados para se
incorporarem ao processo de integrao. Nesta mesma ocasio, foram criados diversos
subgrupos de trabalho (assuntos comerciais, assuntos aduaneiros, normas tcnicas,
12
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
13
polticas industriais, transportes martimos, transportes terrestres, polticas agrcolas e
energia), os mesmos que viriam, no futuro, a serem incorporados ao Mercosul. A partir de
ento, os quatro pases dedicaram-se preparao do texto do tratado, o que foi efetuado
ao longo de seis reunies subseqentes. Os parmetros fundamentais eram os seguintes:
- confeccionar um instrumento jurdico que contemplasse a criao de um mercado
comum;
- o acordo teria por objetivo estabelecer um mercado comum em 31 de dezembro de
1994;
- o acordo refletiria o disposto na Ata de Buenos Aires quanto harmonizao de
polticas macroeconmicas, ao cronograma de reduo tarifrio automtico e linear,
s condies para reduo das listas de exceo e fixao de regras especficas de
origem, onde Argentina e Brasil salvaguardavam os compromissos nos termos em
que haviam sido originalmente definidos e assumidos bilateralmente. (VAZ, 2002)
Como conseqncia firmado o Tratado de Assuno, assinado em 26 de maro
de 1991, que pautou as condies para dar incio ao processo rumo ao mercado comum
entre os quatro Estados, a partir do Programa de Liberao Comercial progressivo, linear e
automtico, de eliminao de barreiras no tarifrias ao comrcio, dos compromissos de
avanar na coordenao de polticas macroeconmicas e setoriais, de projetar uma tarifa
externa comum, que entraria em vigor a partir de 01 de janeiro de 1995, e da harmonizao
das legislaes nacionais em diversos tpicos ligados a facilitao dos negcios e a livre
circulao de bens e fatores produtivos (normas tcnicas, requisitos ambientais, normas
fitossanitrias etc).
Este perodo compreendido entre o Tratado de Assuno e o de Ouro Preto foi
repleto de percalos, ocorreram diversos conflitos de interesses no mbito poltico e
econmico, tendo que haver um constante manejo de assimetrias. Os compromissos
assumidos no Tratado de Assuno em matria de coordenao de polticas
macroeconmicas e setoriais que a partir de 1992 se refletiram numa agenda bem
desmembrada e pautada, graas ao Cronograma de Las Leas12 tentaram harmonizar de
alguma forma as diferentes legislaes vigentes em matria de poltica comercial, agrcola,
tributria, alfandegria, trabalhista, macroeconmica, etc.
O Brasil procurava salvaguardar o sentido estratgico que o bloco viria a lhe
conferir, como mecanismo de reforo e consolidao de sua abertura econmica, e
12 Reunio realizada em meados de 1992, quando havia grande incerteza em relao continuidade do
presidente Collor, e num panorama regional onde havia um forte dficit comercial entre Argentina e Brasil.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
tambm, como importante plataforma de sua insero internacional. J a Argentina, tinha
um interesse imediato de resguardar sua liberdade para manejar seus instrumentos de
poltica comercial, era uma tentativa de preservar a essncia de seu plano de estabilidade
econmica, que na poca, era baseado na convertibilidade do peso ao dlar.
No incio de 1994, em Colnia no Uruguai, foi politicamente reafirmado o objetivo
de implantar a unio aduaneira, ficando a construo do mercado comum para uma etapa
futura indefinida. Foram fixados, tambm, um calendrio e uma agenda de negociao com
requisitos mnimos e novos instrumentos necessrios para dar continuidade ao
processo.
Ainda no primeiro semestre de 1994, ocorreram alguns focos de tenso em virtude
das diferentes percepes que os Estados membros tinham da agenda externa do bloco,
foram se revelando a partir da proposta brasileira da ALCSA (rea de Livre Comrcio Sul
Americana) e dos flertes da Argentina com a idia de uma possvel associao com o
North Amrica Free Trade Agreement (NAFTA).
possvel que todos esses problemas tenham de alguma forma prejudicado o
andamento do processo para a instalao do Mercosul como Unio Aduaneira, mas o
lanamento da ltima fase do Plano Real no Brasil, e seus impactos estabilizadores, com
certeza gerou entre os negociadores e empresrios condies de nimo mais propcias a um
compromisso integrador com caractersticas mais profundas na regio.
Outro fator relevante a ser assinalado que desde o incio do processo de formao
do Mercosul, a Argentina sempre mostrou particular interesse na incorporao do Chile ao
novo processo integrador regional. A motivao argentina era dupla, se por um lado suas
economias eram complementarias; no aspecto poltico o palcio de San Martn via a
incorporao do Chile num acordo comercial com o Mercosul como um aprofundamento
da inter-relao econmica e poltica entre os Estados da regio, que provavelmente se
tornaria um elemento capaz de contribuir positivamente para a resoluo pacfica de
divergncias ligadas aos problemas de fronteiras existentes entre ambos os Estados. Este
fato, tambm, iria contribuir para reforar a imagem internacional de um Cone Sul livre de
conflitos territoriais.
Embora os interesses fossem diferentes entre Argentina e Brasil, no tocante a
estrutura que deveria ter o Mercosul, eles acabaram sendo convergentes ao final, ainda que
por motivos distintos. Isto acabou sendo consubstanciado pelo Protocolo de Ouro Preto,
assinado pelos presidentes dos quatro Estados em 17 de dezembro de 1994.
14
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
b) Acordos:
O ano de 1996 foi determinante para Chile e Bolvia, que conscientes da
necessidade de formar um espao econmico ampliado e a possibilidade de atuar como
elementos de integrao econmica, protocolaram acordos de complementao econmica
entre ambas as naes e o Mercosul;
Em 25 de junho de 1996, na X reunio de Cpula do Mercosul, foi assinado na
provncia argentina de So Lus, o acordo de Complementao Econmica entre Chile e o
Mercosul, para vigorar a partir de 01 de outubro daquele mesmo ano, dando incio a um
processo de reduo tarifria e de um intercmbio maior entre o Chile e o bloco iniciante;
Nesta mesma reunio foi firmada a declarao presidencial sobre o dilogo
poltico, a qual criava um Mecanismo de Consulta e Concertao Poltica (MCCP), com o
objetivo, entre outros, de buscar coordenar posies sobre questes internacionais de
interesses comuns. A declarao presidencial assinada em Assuno, em 17 de junho de
1997, estabelece que o MCCP buscar articular (...) as aes necessrias para ampliar e
sistematizar a cooperao poltica entre as partes, entendida como aquela cooperao
relativa a todos os campos que no faam parte da agenda econmica e comercial da
integrao (VAZ, 2002). Estes entendimentos foram institucionalizados por meio da
deciso 18/98, na cpula do Rio de Janeiro, que criou o frum de Consulta e Concertao
Poltica;
Em 1996, na reunio de chefes de Estado dos pases do Mercosul realizada na
localidade de Potrero de Funes, foi assinada a chamada clusula democrtica, onde os
quatro Estados se comprometeram a adotar uma srie de medidas para o caso de surgirem,
em algum deles, ameaas estabilidade democrtica. As medidas acordadas incluam at a
possibilidade de excluso do bloco, caso isso viesse a ocorrer com algum dos membros.
Em dezembro de 1996, na cidade de Fortaleza, no Brasil, a Bolvia e o Mercosul
firmaram um Acordo de Complementao Econmica, onde era includo um programa de
liberalizao comercial paulatina e automtica, que teria incio em abril do ano seguinte;
Outro evento relevante ocorrido em 16 de abril de 1998 foi o Acordo-Marco para a
criao da Zona de Livre Comrcio Mercosul CAN (Comunidade Andina), que entrou
em vigor a partir de 01 de janeiro de 2000;
Em 24 de julho de 1998, foi assinada em Ushuaia (Argentina) a Declarao Poltica
do Mercosul, Bolvia e Chile como Zona de Paz, que registra entendimento no sentido de
fortalecer os mecanismos de consulta e cooperao sobre temas de segurana e Defesa
existentes entre seus membros, e promover sua progressiva articulao (...) (Vaz, 2002).
15
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
16
c) Sntese Conclusiva
Este captulo mostrou todo o processo de criao do Mercosul, inclusive a
importncia que teve a ALADI para o marco institucional do bloco. Outra caracterstica a
ser ressaltada eram as vises distintas entre os dois principais atores do bloco, sobre a
importncia da integrao: para a Argentina a importncia era econmica, para o Brasil
mais Poltica e Estratgica, no sentido de ganhar relevncia no cenrio internacional.
Outro fator tambm a ser destacado foi assinatura da Declarao Poltica do
Mercosul, importante para o fortalecimento na cooperao na rea de segurana e defesa.
A seguir ser descrito o processo de integrao entre Argentina e Brasil.
5 - SNTESE DA INTEGRAO ENTRE ARGENTINA E BRASIL
O processo de integrao entre Argentina e Brasil teve incio na dcada de 80,
quando se pode considerar que comeou a ocorrer uma coincidncia maior na conduo da
poltica externa de ambos os Estados, dando incio a um processo de superao de antigas
rivalidades e desconfianas mtuas. Pode-se inclusive dizer, que no campo poltico, o
Acordo Tripartite sobre Itaipu e Corpus (1979), e a derrota dos argentinos na guerra das
Malvinas, foram fatores que facilitaram este processo, inclusive porque o Brasil passou a
se encarregar dos negcios argentinos frente ao Reino Unido. Nesta poca foram tratados
assuntos importantes para a regio, como a participao conjunta em foros latino-
americanos, criao da Zona de Paz e Cooperao no Atlntico Sul13, um processo
nuclear mais autnomo e uma vontade poltica maior de integrao.
Com a plena redemocratizao dos dois maiores Estados da regio (Argentina em
1983 e Brasil em 1985) foi que as relaes bilaterais comearam realmente a entrar em um
novo perodo. importante ser destacado o empenho poltico dos governos, e
principalmente dos lderes da poca em particular, em superar a inrcia de desconfiana e
distanciamento que ocorria at ento. Era a primeira vez na histria da Amrica Latina, a
exceo de Cuba, que os Estados vivenciavam uma democracia representativa. Essa nova
realidade permitiu um maior grau de cooperao ainda no observado no continente,
abrindo caminho para processos de associao e integrao entre Argentina e Brasil.
Na dcada de 90, com o novo cenrio internacional advindo do recente trmino da
era bipolar, e da estrutura de uma nova ordem baseada no campo poltico, que seria a
defesa de valores vinculados ao pluralismo democrtico e, no econmico, a importncia da
13 A Zona de Paz e Cooperao do Atlntico Sul (ZPCAS) foi criada em 1986 com o propsito de integrar os
Estados da regio e criar um espao livre de conflitos. (SOUZA, 2002)
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
17
economia de mercado, deixou uma srie de dvidas sobre como seria essa nova ordem
mundial.
O presidente argentino anunciou sua disposio de levar adiante o programa de
integrao iniciado na administrao anterior: A partir dessa integrao marcharemos
rumo integrao de toda a Amrica Latina (...) necessrio incluir os demais pases
nesse processo mediante a execuo de projetos concretos para enfrentar o desafio
decorrente da formao de blocos econmicos (MENEN, 1989) 14.
Nas orientaes que o governo argentino tinha, para direcionar sua poltica externa,
com o propsito de compatibilizar com o processo de integrao com o Brasil, um fato
relevante foi o discurso do chanceler argentino Domingo Cavallo, que manifestou a
vontade do seu governo de prosseguir no caminho empreendido pela administrao
anterior, embora com base em motivaes claramente distintas: O que o presidente Carlos
Menem me transmitiu como instruo fundamental que, atravs da poltica exterior, a
repblica Argentina deve ser reconhecida como um pas srio e responsvel, com quem se
pode tratar e em quem se pode confiar (...). Pensamos que a deciso dos presidentes
Alfonsn e Sarney de deixar de lado a competio e rivalidade que existiam entre os dois
Estados desde tempos imemoriais foi uma deciso transcendente, que abre a possibilidade
de uma cooperao muito estreita em mbitos antes inimaginveis. (...) Em vez de
adversrios potenciais em conflito, comeamos a nos ver como scios concretos no quadro
de um processo de integrao que aspira a conformar um mercado comum (...) decidimos
que essa iniciativa deve ser continuada (discurso de Domingo Cavallo no circuito El
Omb, em 20/09/1989). Um elemento indispensvel na construo de uma aliana
estratgica o reconhecimento mtuo de diferenas.
Com a posse em maro de 1990, no Brasil, do presidente eleito Fernando Collor de
Mello, que era fruto de uma coalizo liberal-conservadora, abria-se caminho para um
aprofundamento do processo de integrao, devido ao novo mandatrio ser adepto a uma
estratgia de abertura econmica, o que abriria novos horizontes para ambos os Estados.
No Brasil, o governo de Collor de Mello estabeleceu o que se chamou de crise de
paradigma em sua poltica externa. O paradigma globalista, que havia orientado durante
muito tempo a poltica externa brasileira foi questionado; as premissas vinculadas ao
nacional-desenvovimentismo, que j vinham perdendo sua dinmica durante a dcada de
14 Entrevista publicada no jornal argentino mbito Financeiro, em 21/09/ 1989, p.23. Disponvel na internet
em: www.ambitoweb.edicionesanteriores.asp.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
18
80, foram definitivamente superadas, dando incio a uma nova percepo de que abrindo
mo das reclamaes em relao economia internacional e aproximando-se do principal
lder mundial, no caso, os EUA, o pas poderia colocar-se como interlocutor relevante no
cenrio internacional.
Esta crise de paradigma cedeu espao para o surgimento de duas correntes, com
diferentes vises, sobre a melhor maneira do pas se inserir no cenrio internacional:
- a primeira de carter mais autonomista, mantinha mais fortemente elementos do
paradigma globalista, que vinha sendo seguido at ento. Defendia uma projeo mais
autnoma do Brasil na poltica internacional; possua preocupaes de carter poltico-
estratgico com relao aos problemas Norte-Sul; dava maior destaque perspectiva
brasileira de participar do Conselho de Segurana das Naes Unidas; e buscava alcanar
para o Brasil um papel de maior liderana na Amrica do Sul. Esta corrente conhecida na
literatura sobre o tema como corrente nacionalista.
- A outra, sem abrir mo da primeira, procurava dar maior importncia ao apoio do
Brasil aos regimes internacionais em vigncia. Defendia a idia de uma insero
internacional do pas a partir de uma soberania compartilhada, desta forma, buscando uma
liderana mais discreta na Amrica do Sul. Como dava maior apoio aos valores da ordem
internacional, de carter liberal, essa corrente conhecida pelos analistas de poltica
externa como liberal (SARAIVA, 2007).
O governo de Collor, desta forma, procurou alterar o perfil internacional do pas,
discutindo novos temas, construindo uma relao mais saudvel com os EUA e buscando
descaracterizar o perfil terceiro-mundista vigente. Porm, o Brasil procurou manter uma
poltica exterior que valorizava a autonomia e a independncia de critrio nas questes
internacionais. J a Argentina comeou a privilegiar os objetivos de eliminar os pontos de
atrito em sua agenda poltica com os EUA15, entendendo que essa era a melhor estratgia
para obter credibilidade internacional, podendo, desta forma, favorecer sua estabilidade
poltica e econmica no campo interno.
Em novembro de 1990, aps um perodo de intensas negociaes em nvel tcnico,
Argentina e Brasil firmaram um acordo de Complementao Econmica n 14 (ACE 14)
no quadro da ALADI, lanando as bases instrumentais sobre as quais se efetuaria o Tratado
de Assuno. Com esse acordo encerrava-se formalmente toda a etapa de integrao
gradual e setorial, passando-se para um programa mais detalhado de reduo progressiva,
15 Houve grandes alteraes na poltica externa da Argentina sada do movimento dos pases no
alinhados, envio de tropas ao Golfo, adeso aos tratados internacionais sobre temas nucleares, etc.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
19
linear e automtico, para todo um conjunto de universo tarifrio. Em suma, de alguma
forma estava realmente tendo incio um verdadeiro processo de integrao entre Argentina
e Brasil, e tambm tendo incio um novo modelo de poltica externa e econmica que seria
determinante para a construo do Mercosul, a partir de 1991.
J no governo de Itamar Franco, presidente que sucedeu a Collor, deu-se maior
prioridade vertente desenvolvimentista da poltica externa, sendo mais nacionalista, um
pouco distinta da poltica externa Argentina de alinhamento incondicional aos EUA. O
Brasil passou a atuar mais ativamente nos foros multilaterais; procurou tambm aprofundar
a integrao regional, com destaque para o Mercosul. Alterou suas relaes com os EUA,
evitando alianas incondicionais, como tambm enfrentamentos, e buscou novos parceiros
externos como a ndia e a China.
O governo de Fernando Henrique Cardoso foi marcado em sua poltica externa por
um perfil que buscava assimilar e empregar um pouco do perfil nacionalista, de Itamar
Franco, e um pouco do liberal, de Fernando Collor de Mello.
Neste perodo, tambm, foi incrementado um maior relacionamento entre os
Estados-Maiores conjuntos de Argentina e Brasil, com diversos seminrios e exerccios
militares binacionais, suscitando interesse e a aumentar a participao de outros Estados da
regio. O crescente intercmbio entre as FFAA dos Estados do Mercosul criou uma
situao de fato, que permitiu um avano para a anulao da hiptese de conflito entre os
dois principais Estados da regio.
Em outubro de 1996 o presidente Fernando Henrique anunciava outra Poltica de
Defesa para o Brasil16, e o presidente Carlos Menen aprovava a diretriz para um novo
planejamento militar, em que a tradicional hiptese de conflito com origem no rio da Prata
era abandonada como ameaa principal. No caso brasileiro, o ento presidente comentou
que apesar do pas conviver harmonicamente na comunidade internacional, poderia vir a
ser obrigado a se envolver em conflitos gerados externamente, como conseqncia a
ameaas ao seu patrimnio e aos seus interesses vitais.
Estes fatos foram significativos e de grande importncia poltica, porque
demonstravam em ambos os Estados vontade de integrao sem riscos de conflitos. Desta
forma, o processo de integrao poderia caminhar em um ambiente de maior cooperao e
confiana mtua.
16 J existe uma nova Poltica de Defesa Nacional brasileira editada em 2005.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
A poltica externa adotada, atualmente, pelo presidente Lus Incio Lula da Silva,
est mais voltada para a corrente vinculada aos padres tradicionais da poltica externa de
cunho mais autonomista, com nfase na integrao regional.
Neste perodo, podia se perceber que as relaes econmicas internacionais
(comerciais, financeiras e de investimentos) teriam durante aquela dcada um forte
componente de relaes interblocos e intrablocos, enfraquecendo-se, portanto, o tradicional
vnculo Estado-Estado. A entrada em vigor em 1989 do Acordo de Livre Comrcio entre
Canad e EUA, ao qual mais tarde se incorporaria o Mxico, somada a criao informal
de um plo regional de desenvolvimento no Leste Asitico, liderado pelo Japo, foram
configurando um cenrio global em que a integrao regional aparecia quase como uma
necessidade para os Estados em qualquer parte do planeta.
Argentina e Brasil perceberam a necessidade de redefinir sua estratgia de insero
internacional e regional, frente a um panorama que existia de crescente isolamento
econmico, poltico e estratgico, causado pelas dificuldades de acesso a tecnologias de
ponta, e fundamentalmente pela mudana na estrutura e no funcionamento do sistema
econmico mundial. Dentro desta nova estratgia, e de acordo com o cenrio internacional
que estavam visualizando naquele momento, a integrao regional passava a ter um papel
importante na criao do comrcio, na obteno de maior eficincia, com o objetivo de
competir no mercado internacional e na prpria transformao dos sistemas produtivos
nacionais.
O processo de integrao surge ento sob a necessidade de apresentar-se uma frente
unida, melhorar as condies econmicas, consolidar os processos democrticos e terminar
os riscos de conflito entre os Estados vizinhos. O fortalecimento dessa integrao na
regio pode ser atribudo, em grande parte, ao Mercosul.
Devido a ele, as novas tendncias da relao entre ambos os Estados, passaram a
ser progressivamente amistosas, com uma aproximao e integrao cada vez maior. H
um sentimento generalizado da necessidade mtua de cooperao, aproveitando que j
existe certa complementaridade econmica e interdependncia, reconhecida por ambos os
Estados. O Brasil hoje mais desenvolvido industrialmente que Argentina, fato que pode
comprovar-se por meio do Produto Interno Bruto (PIB) do estado de So Paulo, que
maior que o PIB de toda a Argentina.
Os objetivos de Argentina e Brasil com o implemento do Mercosul parece bastante
claro: para o Brasil serve como um instrumento para sua insero internacional, marcando
uma poltica de abertura econmica, iniciada desde o governo Collor e continuada pelos
20
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
21
governos que se seguiram, cujo grande desafio era passar de uma economia fechada para
outra mais aberta e competitiva internacionalmente, aumentando seu poder de negociao e
a extenso dos mercados por via da integrao econmica.
A formao de uma ampla zona geoeconmica no cone sul serviria de plataforma
de negociao frente aos mega-blocos j existentes no cenrio internacional. O Mercosul
formava parte de uma estratgia de posicionamento poltico: outorgava ao Brasil prestgio
e uma certa liderana na regio para fazer frente aos EUA em sua iniciativas hemisfricas
de criao de um bloco econmico que se denominaria rea de Livre Comrcio das
Amricas (ALCA). Outro fator significativo que tambm teria maior probabilidade de ser
reconhecido como uma potncia regional, no momento que o bloco passasse a ter sucesso.
J para a Argentina, sob a gesto de Carlos Menem, com sua poltica de abertura
econmica, vislumbrou o Mercosul com um enfoque principalmente comercial de
integrao, alm do poltico, econmico e militar e, tambm, como sendo uma instncia
para a formulao da ALCA.
Neste contexto, podemos apontar circunstncias de natureza poltica, econmica,
comercial, tecnolgica e militar, originadas em grandes transformaes de ordem
econmica internacional, que exerceram um papel relevante na consolidao da integrao
Argentina-Brasil:
- o fenmeno da globalizao da economia, com o surgimento de uma nova
estrutura de produo e o surgimento de um novo padro industrial e tecnolgico;
- a formao dos mega-blocos econmicos e a tendncia regionalizao do
comrcio, com influncia no destino dos fluxos de capital, bens e servios;
- o protecionismo e a recesso em muitas das economias desenvolvidas,
responsveis pela absoro de cerca de 65% das exportaes latino-americanas;
- a tomada de conscincia da necessidade de aprofundar o processo de integrao,
como forma de aproveitar o entorno geogrfico;
- A Argentina, no ano de 2006, foi o segundo Estado em transaes comerciais com
o Brasil, os valores foram superiores a 20 bilhes de dlares em produtos manufaturados, o
que carrega um elevado valor agregado. A Argentina hoje s superada pelos EUA em
transaes comerciais com o Brasil. O Brasil possui um supervit na balana comercial
com a Argentina de cerca de 3 bilhes de dlares17;
17 Dados fornecidos em palestra realizada na Escola de Guerra Naval (EGN), em abril de 2007, pelo
secretrio do Ministrio de Comrcio Exterior, Sr.Marcos Otvio Bezerra Prates.
A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
- Um constante relacionamento militar entre os dois Estados, com exerccios
combinados realizados anualmente. Pode-se dizer que no se sabe na histria, um Estado
que no possua Porta-Avies (Argentina) e realize exerccios com aeronaves em Porta-
Avies de outro Estado, no caso o Brasil.
O fato de se estar em pleno processo de integrao, com uma grande aproximao,
no significa a inexistncia de dificuldades e problemas, que a princpio geram algumas
crises. Estas crises so naturais em qualquer processo de integrao, onde atores com
interesses e vontades diferentes, muitas vezes conflitivas, necessitam manter sua dialtica.
a) Principais Interesses Coincidentes:
Os principais interesses nacionais coincidentes entre Argentina e Brasil so, de
maneira geral, lanar e consolidar polticas internas de reformas, para poder obter um
desenvolvimento econmico sustentado, e de melhorar a capacidade de negociao
internacional, para conseguir atingir a to desejada insero no primeiro mundo. Para
atingir essas metas, ambos os Estados necessitam:
- manter um elevado ritmo de crescimento, que possa reverter-se em maior bem
estar de sua populao;
- lograr uma insero com xito no sistema poltico-econmico internacional, que
se traduza em poder e prestgio a nveis regionais e mundiais;
- atrair investimentos estrangeiros para seu Estado;
Um dos principais indicadores de crescimento de um Estado a taxa de
crescimento de seu PIB, que traduz um maior bem estar de sua populao com maior valor
de renda disponvel, e na ampliao da oferta de empregos. O Mercosul um espao
econmico para seus integrantes que concentra mais de 260 milhes de consumidores,
formado em sua grande maioria pelas populaes de Argentina, Brasil e Venezuela (anexo
A).
Pode afirmar-se que a aliana estabelecida pelos dois Estados dentro do Mercosul,
fez com que ambos obtivessem uma insero com maior xito na economia internacional,
o que se pode verificar com os seguintes fatos: maiores fluxos de investimentos
estrangeiros nos dois Estados; tentativa de integrao econmica tanto pelos EUA, por
meio da criao da ALCA, para constituir uma zona de livre comrcio continental, como
pela prpria UE, mediante o Acordo Marco de Cooperao estabelecido com o Mercosul, o
que deu incio as expectativas de criar-se no futuro um processo que culmine com uma
Zona de Livre Comrcio entre os dois blocos.
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O poder resultante dessa coalizo tende a ser a soma das caractersticas de cada
Estado, tal fato indica a necessidade de harmonizarem-se os interesses de natureza
econmica que ainda encontram-se divergentes entre Argentina e Brasil, agregando-se na
conduo dessa coalizo uma melhor cooperao. H que se considerar a importncia de se
harmonizar os interesses de natureza poltico e estratgico, por parte de ambos os
governos, para que se possa lograr maior eficcia na insero do sistema poltico-
econmico internacional.
Quanto atrao de uma maior quantidade de investimentos estrangeiros nos seus
respectivos territrios, o resultado obtido por ambos os Estados at o momento tm sido
excelentes.
Outro fato significativo a ser destacado, que se pode agregar ao poder de atrao
do Mercosul seu potencial de crescimento horizontal dentro da prpria Amrica do Sul,
mediante a incorporao de novos membros, como j ocorreu com diversos Estados da
regio aderindo como membros associados e, recentemente, a Venezuela como membro
permanente, resultando em um maior mercado consumidor, o que ir facilitar, tambm, um
maior intercambio comercial regional. Tal fato, com certeza, ir maximizar o interesse de
investimentos estrangeiros, por conta das oportunidades de negcios que um mercado
regional crescente pode propiciar.
No podemos esquecer que so Estados ainda jovens, com um elevado potencial de
crescimento em diversas reas como a econmica, tecnolgica, educacional e outras.
Quanto maior for o nvel de aprofundamento do processo de integrao no mbito
do Mercosul e, o conseqente aumento da interdependncia entre seus membros, isso dar
mais credibilidade a todos, fazendo com que o nvel de investimentos no bloco seja sempre
crescente, podendo chegar a valores mais significativos, em um prazo no muito distante.
b) Principais Discrepncias
natural que o processo de integrao regional entre Argentina e Brasil dentro do
Mercosul sofra constantes tormentas, como se pode verificar, eventualmente, na mdia
internacional, naturalmente como conseqncia de divergncias que no foram
devidamente harmonizadas.
Pode-se, inclusive, afirmar que conforme a integrao exige cada vez mais
interdependncia dos pases, maiores sero as discrepncias envolvidas no conflito, em
virtude da quantidade de interesses compartilhados que sero afetados. Porm importante
observar que a interdependncia tem caractersticas ambivalentes: por um lado exarceba a
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competio e, portanto, as fontes de discrepncias e, por outro lado, aumenta
substancialmente os custos do conflito, incitando a certa moderao.
Desta forma, podem-se agrupar as divergncias entre Argentina e Brasil em dois
mbitos principais: Econmico e Poltico-Estratgico.
No mbito econmico, a grande interdependncia gerada por todo o processo de
integrao vivido por ambos os Estados dentro do Mercosul apresenta o maior potencial de
instabilidade para a relao de cooperao. Os seguintes aspectos so mais significativos:
- o protecionismo econmico praticado pelos dois Estados;
- falta de regulamentao para a distribuio dos investimentos estrangeiros e extra-
regionais, como tambm divergncias quanto ao tratamento especfico de alguns assuntos
econmicos;
- ausncia de ajustes de natureza macroeconmica regional que podem vir a gerar
efeitos negativos sobre a economia de cada pas;
Para a Argentina, o Mercosul e a relao com o Brasil tinham uma dimenso
preponderantemente econmica e comercial, mais do que estratgica. A poltica de manter
uma aliana com os EUA no aspecto de segurana internacional e outra com o Brasil no
aspecto econmico, mostrava bem este aspecto de sua poltica externa; diferentemente do
Brasil, que j tem uma percepo mais estratgica em relao ao Mercosul, onde busca
uma nova forma de se relacionar com a comunidade internacional;
No campo poltico-estratgico ser mostrada a correspondente diferena de
percepo das ameaas externas e da diferena entre os dois Estados no que diz respeito a
suas vises estratgicas globais:
- Para o Brasil existe no mbito poltico-militar uma justificada desconfiana em
relao ao conflito de interesses existentes com os EUA. As dificuldades impostas por este
Estado, para que o Brasil desenvolva tecnologias importantes, como a da propulso nuclear
e a de lanadores espaciais, somadas a poltica de combate ao narcotrfico em diversos
Estados vizinhos ao territrio brasileiro e, tambm, defendido por diversos norte-
americanos que tambm fosse realizado em territrio nacional;
- O interesse norte-americano no emprego das FFAA brasileiras no combate ao
narcotrfico, demonstra uma clara interferncia em assuntos internos brasileiros. Os EUA
em associao com diversas organizaes ecolgicas, que em sua maioria so norte-
americanas, fazem constantemente diversas contestaes em fruns internacionais, a dizer
sempre que o Brasil no realiza o controle adequado do desmatamento da floresta, e que
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esta seria patrimnio comum da humanidade, devendo ser preservada para o bem de
todos;
- a divergncia em relao aspirao do Brasil de ser includo como membro
permanente no Conselho de Segurana da ONU (Organizao das Naes Unidas). O
Brasil lanou sua candidatura desde a dcada de 90, logo aps o Mxico tambm
manifestou interesse, caso fosse atribudo um assento para algum Estado latino americano.
A Argentina nessa poca no manifestou interesse, mas props outra soluo que talvez
interessasse mais aos EUA, a alternncia entre os Estados da regio.
- a solicitao de ingresso da Argentina na OTAN (Organizao do Tratado do
Atlntico Norte) no foi bem recebida pelo governo brasileiro (acabou no sendo aceita).
- devido Argentina no sentir interferncia dos EUA em seus assuntos internos, o
que em conjunto com outros interesses, levou-a a uma poltica de alinhamento automtico
com as posies poltico-estratgicas defendidas pelos EUA.
At o presente momento, estas vises distintas por parte de Argentina e Brasil,
apesar das diferenas das posturas individuais em relao aos EUA, no tem prejudicado a
cooperao entre ambos os Estados, e muito menos dentro do Bloco.
A participao brasileira no Comando das Foras de Paz no Haiti tem sido uma das
manobras polticas do governo para aumentar sua importncia no cenrio internacional,
fortalecendo de certa maneira a proposta de incluso do Brasil, como membro permanente
do Conselho de Segurana.
No caso de se adotar uma viso de longo prazo, e por ventura o Brasil viesse a ter
direito a esse assento na ONU, seria importante para todos os Estados da regio,
principalmente para a prpria Argentina, que tem uma estreita relao econmica com o
Brasil. No Conselho, todas as deliberaes que viessem a ser adotadas e que por ventura
pudessem prejudicar os interesses poltico-estratgicos da regio, ou mesmo econmicos,
seriam contestadas pelo Brasil, que desta forma iria tornar-se a voz dos Estados da regio
dentro do Conselho de Segurana.
evidente que a construo de uma aliana estratgica uma tarefa que requer um
esforo contnuo de ambos os Estados, e que no seu desenrolar iro ocorrer diversos
contratempos. Esse processo de aproximao por definio bastante complexo, como j
foi evidenciado acima, por exemplo, nas vises distintas em questes relevantes no cenrio
internacional, como a prpria reforma do Conselho de Segurana da ONU, a vontade do
Brasil de integr-lo e a posio contrria da Argentina.
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c) Sntese Conclusiva
Ficou evidenciado que o processo de democratizao foi um fator determinante na
aproximao dos dois principais membros do bloco. As vises distintas da melhor maneira
de se inserir no cenrio internacional, no foi um fator restritivo para o desenvolvimento do
processo de integrao.
Podemos apontar circunstncias de diversas naturezas como: poltica, econmica,
comercial, tecnolgica e militar, originadas em grandes transformaes de ordem
econmica internacional, que exerceram um papel relevante na consolidao da integrao
entre os dois principais atores do bloco, como vimos acima.
O aumento da interdependncia entre Argentina e Brasil dar mais credibilidade a
todos, fazendo com que o nvel de investimentos no bloco seja crescente, melhorando as
condies de competio do bloco.
No estgio atual da integrao entre Argentina e Brasil, est na hora em que se deve
alm do econmico, buscar-se uma maior convergncia nos aspectos polticos e
estratgicos, de forma a fortalecer a cooperao atual e parecer mais coeso e forte perante o
cenrio internacional.
6- ESTRATGIAS DO MERCOSUL NOS CENRIOS AMERICANO E EUROPEU
O cenrio internacional atual de grande integrao entre blocos econmicos, mas
tambm de grande competio entre eles. Desta forma, o Mercosul necessita elaborar
estratgias para obter as maiores vantagens possveis nas relaes com os diversos blocos
existentes, isso que se analisar no transcorrer deste captulo.
a) Perspectivas
Quando se cria um bloco econmico evidente que um dos grandes propsitos
ampliar o bem estar dos povos ali integrados. Os Estados membros do Mercosul tm que
atuar de forma coordenada e conjunta, para que possa demonstrar ao mundo que o bloco
regional possui a credibilidade e rentabilidade necessria para atrair e manter grandes
investimentos estrangeiros por parte de outros atores internacionais e, possivelmente, em
um futuro prximo, seus Estados tenham uma estatura poltico-estratgica mais relevante
para poder garantir no cenrio internacional a prevalncia de seus interesses.
Um projeto de integrao regional nasce normalmente com objetivos econmicos,
pode-se citar: aumentar a produo em escala dos membros integrantes, inserindo o
produto final no mercado internacional com um preo mais vantajoso, aumentar sua
eficincia, reestruturar seu mercado; alm de propsitos mais significativos, como no
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futuro alcanar uma integrao poltico-estratgica e militar, como o caso atual da
prpria Unio Europia.
O Mercosul deve procurar tirar o mximo proveito da competio existente no
cenrio internacional entre os EUA e a UE, buscando obter vantagens econmicas e
sociais, de forma a conseguir acordos para investimentos internos, cooperao tecnolgica
e militar, assistncia social e, tambm, em diversos outros campos. Necessita beneficiar-se
da multipolaridade existente, para demonstrar claramente as principais potncias
econmicas, que o que rege o cenrio internacional nos dias atuais so os aspectos prticos
das relaes entre os diversos atores e no eventuais simpatias ideolgicas de carter
retrico.
Sero apresentadas a seguir estratgias especficas, que deveriam ser perseguidas
pelos lderes dos Estados Membros do Mercosul, nos cenrios americano e europeu, com o
propsito de maximizar seus objetivos.
b) O Mercosul na Amrica do Sul
O Mercosul transformou-se em um plo de influncia e atrao para outros Estados
sul-americanos, oportunizou adeses de quase todos os Estados da regio como membros
associados, e o recente ingresso da Venezuela como membro permanente, mostrando, que
existem condies para ampliao do bloco no mbito do prprio continente.
Os acordos assinados bilateralmente entre o Mercosul e cada um dos Estados
associados so literalmente iguais, tendo como objetivo a formao de uma zona de livre
comrcio. Pode-se verificar, no entanto, que estes Estados associados no adquiriram desta
forma, pelo menos por enquanto, a totalidade dos direitos e deveres que so aplicados aos
membros permanentes do bloco.
A ampliao gradual do Mercosul no mbito regional, atende a uma muito bem
orquestrada estratgia brasileira, baseada em um projeto nacional de 1993 de constituir
uma ALCSA, tendo como embrio a integrao econmica existente entre Argentina e
Brasil. Esta iniciativa conta com pleno apoio do governo argentino. Este mercado ampliado
seria a base de uma Zona de Livre Comrcio, incluindo os Estados partes do Mercosul por
um lado e os restantes dos Estados sul-americanos da ALADI pelo outro, o que, com
certeza, iria fortalecer o mercado regional, fazendo frente a um mundo cada vez mais
agressivo nos aspectos comerciais.
Dentro do projeto de integrao da Amrica do Sul, est includa a aproximao do
Mercosul com os pases da Comunidade Andina. Existem estudos no sentido de viabilizar
as condies de infra-estrutura para que se possa intensificar os intercmbios entre os dois
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A Cooperao dos Pases do Mercosul Frente o Cenrio Internacional
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grupos. Para isto, tenta-se junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a
Corporao Andina de Fomento (CAF) conseguir os devidos aportes financeiros. Dentre os
diversos setores envolvidos nessa integrao esto includos setores fundamentais, tais
como os energticos, de transportes e telecomunicaes.
A expanso do Mercosul teve incio com o ingresso do Chile. O comrcio deste
pas com o restante do mercado regional tem crescido substancialmente nos ltimos anos,
representando no ano de 2006, cerca de 17% do seu comrcio exterior global18. A
assinatura do acordo de livre comrcio entre o Mercosul e a Bolvia, conseguido no
segundo semestre de 1996, gerou uma grande expectativa daquele pas atingir uma maior
integrao fsico-econmica com os demais Estados da regio, alm de auferir uma espcie
de efeito demonstrao positivo sobre os demais Estados, apresentando, tambm, ao
mundo, o Mercosul como um bloco dinmico e pujante. O grande potencial que tem
Bolvia na venda de gs outorga, a este pas, um importante papel no Cone Sul em matria
energtica.
Com a incluso da Venezuela como membro permanente do Mercosul (j deu
entrada em sua postulao, no momento, est aguardando aprovao), passam a ser cinco
os Estados que ostentam essa condio: Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela.
Existem outros cinco pases que so membros associados, condio que o Mxico
solicitou, embora venha, politicamente, dando maior preferncia consolidao da ALCA,
juntamente com os EUA e o Canad.
A solicitao de incorporao da Venezuela ao Mercosul em julho de 2006 est
gerando polmica. O atual presidente da Venezuela, Sr. Hugo Chvez, pode apresentar ao
bloco um componente poltico ideolgico prejudicial s boas relaes do bloco com os
EUA, Mxico, a UE e o lado asitico.
importante reconhecer que a incluso da Venezuela soma ao bloco um PIB de R$
176 bilhes de dlares e grandes reservas de petrleo e gs natural ao poderio econmico
do bloco. As projees indicam que isso aumenta a participao do Mercosul no PIB da
Amrica Latina de algo em torno de 65% para cerca de 72% (anexo B). Sem a Venezuela o
PIB do Mercosul cerca de US 2,28 trilhes e 240 milhes de habitantes. Com a
Venezuela este nmero aumentaria para cerca de US 2,46 trilhes e 265 milhes de
pessoas (anexo A)19.
18 Dados fornecidos em palestra realizada na Escola de Guerra Naval (EGN), em abril de 2007, pelo
secretrio do Ministrio de Comrcio Exterior, Sr.Marcos Otvio Bezerra Prates. 19 Tabelas e grficos obtidos em www.global21.com.br.
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Os quadros apresentados no anexo A mostram a importncia que o Mercosul tem
nos dias atuais para o Brasil, com o constante crescimento dos fluxos internos de
exportaes e importaes (anexo C). Outro dado de profunda relevncia que quando se
faz uma anlise do tipo de material exportado dentro do bloco pelo Brasil, pode se verificar
a grande quantidade de produtos manufaturados, obtendo desta forma maior valor
agregado.
O Brasil um assduo comprador de derivados de petrleo da Venezuela, adquire
querosene de aviao, nafta, leo lubrificante, vidro, enxofre, carvo e plstico, enquanto
exporta para l diversos produtos manufaturados, como equipamentos agrcolas, telefones
celulares, automveis, peas para veculos, pneus, laminados de ferro e ao, carne
industrializada e outros elementos. (www.mdic.gov.br)
O estabelecimento de uma zona de livre comrcio na regio, absorvendo um
mercado consumidor de cerca de 320 milhes de pessoas, teria um potencial para
transformar a Amrica do Sul em um vigoroso bloco econmico, que capitaneado pelo
mercado dos pases do Mercosul, lhe daria maior poder e prestgio no mbito internacional.
Caso se consiga alcanar a criao da Unio das Naes Sul-Americanas
(UNASUL), isso colocar o Mercosul em uma posio privilegiada na ordem continental,
atribundo-lhe maior poder de negociao. Esta uma meta que deve continuar sendo
perseguida pelo bloco.
c) O Mercosul e a ALCA
Na conferncia das Amricas realizada em Miami no final de 1994, por meio do
convite efetuado pelo ento presidente norte-americano Bill Clinton, reu