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Ministério da Cultura INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL Departamento de Patrimônio Material LAUDO 09/2008 21 de agosto de 2008 Aproveitando trabalho que está sendo feito em conjunto com a Marinha na valoração das peças do Projeto de Arqueologia Subaquática, na Praia dos Ingleses, e o apoio do projeto Fortalezas Multimídia, visitamos hoje o forte de Santo Antônio, localizado na ilha de Ratones Grande, nas proximidades da cidade de Florianópolis, Santa Catarina e que é objeto do pro- cesso de tombamento (rerratificação) nº 155-T-38. Sobre o laudo, fazemos as seguintes ressalvas ao texto que se segue: como não temos formação em arquitetura ou engenharia, não temos condições de fazer uma análise dos fatores pertinentes à estas formações profissionais, de forma que o presente texto não pode ser consi- derado como um relato completo do estado de conservação do bem e dos eventuais objetos a ele associados. Do objeto: Observamos que nos concentramos na área imediata ao forte – que é de acesso mais fácil – apesar da idéia da rerratificação do tombamento ser a inscrição nos livros do tombo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional de toda a ilha onde a fortificação, já tombada, se encontra. E, como o forte já era tombado e está bem conservado e cuidado, não tivemos uma preocupação maior em descrever a sua situação e estado. O forte se localiza a meia encosta de uma pequena elevação (ver figura 2), na parte norte da ilha de Ratones Grande, sendo alcançado apenas de barco (figura 1). No caso, fomos conduzidos em embarcação do Projeto Fortalezas Multimídia-UFSC que saiu de um pequeno ancoradouro flutuante, situado na Rodovia Gilson da Costa Xavier, levando cerca de vinte minutos hora para alcançar a ilha. Lá se desembarca em um trapiche de madeira e nos dirigi- mos para a fortificação, após fazer um percurso da parte inferior das muralhas e das estruturas existentes no exterior.

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Ministério da Cultura

INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL Departamento de Patrimônio Material

LAUDO 09/2008

21 de agosto de 2008

Aproveitando trabalho que está sendo feito em conjunto com a Marinha na valoração

das peças do Projeto de Arqueologia Subaquática, na Praia dos Ingleses, e o apoio do projeto

Fortalezas Multimídia, visitamos hoje o forte de Santo Antônio, localizado na ilha de Ratones

Grande, nas proximidades da cidade de Florianópolis, Santa Catarina e que é objeto do pro-

cesso de tombamento (rerratificação) nº 155-T-38.

Sobre o laudo, fazemos as seguintes ressalvas ao texto que se segue: como não temos

formação em arquitetura ou engenharia, não temos condições de fazer uma análise dos fatores

pertinentes à estas formações profissionais, de forma que o presente texto não pode ser consi-

derado como um relato completo do estado de conservação do bem e dos eventuais objetos a

ele associados.

Do objeto:

Observamos que nos concentramos na área imediata ao forte – que é de acesso mais

fácil – apesar da idéia da rerratificação do tombamento ser a inscrição nos livros do tombo do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional de toda a ilha onde a fortificação, já tombada, se

encontra. E, como o forte já era tombado e está bem conservado e cuidado, não tivemos uma

preocupação maior em descrever a sua situação e estado.

O forte se localiza a meia encosta de uma pequena elevação (ver figura 2), na parte

norte da ilha de Ratones Grande, sendo alcançado apenas de barco (figura 1). No caso, fomos

conduzidos em embarcação do Projeto Fortalezas Multimídia-UFSC que saiu de um pequeno

ancoradouro flutuante, situado na Rodovia Gilson da Costa Xavier, levando cerca de vinte

minutos hora para alcançar a ilha. Lá se desembarca em um trapiche de madeira e nos dirigi-

mos para a fortificação, após fazer um percurso da parte inferior das muralhas e das estruturas

existentes no exterior.

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Descrição:

A ilha onde se encontra o forte é oblonga, correndo no sentido geral sudeste-

noroeste. Tem, segundo informações disponíveis na própria ilha, cerca de 280 metros de ex-

tensão em sua maior largura e 1.050 metros de comprimento. Há uma elevação de baixa altu-

ra que acompanha todo o desenvolvimento da ilha. A vegetação que a cobre (aparentemente

de crescimento secundário) é cerrada e vai até a beira do mar, as margens da ilha precipitando-

se diretamente na água, com apenas duas pequenas praias rochosas em suas extremidades sul

e norte (figura 1). Na parte setentrional, está um ancoradouro com píer, modernos, onde atra-

cam pequenas embarcações turísticas. Ao longo da elevação que compõe a ilha há trilhas, de-

marcadas e sinalizadas, que também são usadas em atividades turísticas.

A fortificação do século XVIII está na extremidade norte da Ilha, sendo composta por

uma cortina curva, sem parapeito, olhando para nor-noroeste e uma frente abaluartada, com

desenvolvimento seguindo um eixo geral perpendicular à cortina anteriormente citada. Os

muros da fortificação têm sinais de terem sido rebocados e caiados, mas esse revestimento

perdeu-se na maior parte do forte, as pedras tendo sido deixadas aparentes (figura 6).

No flanco onde as duas cortinas se encontra um portão, protegido por uma cortadura

de alvenaria, com uma guarita no ângulo saliente. Este portão, feito originalmente para ter

uma ponte levadiça sobre fosso seco, é alcançado por uma rampa de alvenaria e tem na sua

lateral uma casa da guarda, com três seteiras apontando para a entrada e uma janela (moder-

na?) na cortina. A casa da guarda e o trânsito do forte são abobadados. Observa-se mais uma

guarita no extremo sul da cortina e sinais de ter havido outra, inexistente no momento, na ex-

tremidade noroeste da cortina curva. Esta tem uma plataforma de canhões, de alvenaria de

tijolo, olhando para o canal (não tem outras plataformas para o lado norte) e a frente abaluar-

tada tem plataformas, tanto nas faces como nos flancos dos baluartes. O piso do caminho de

rondas da frente abaluartada é de pedras de mão, enquanto o de outras partes da fortificação é

de terra batida ou grama.

Na parte extra-muros, estão a rampa de acesso ao forte e uma fonte, situada sobre

uma abobada e com acesso formado por uma pequena couraça, tudo de alvenaria (figura 4).

Fora do conjunto fortificado do século XVIII há uma plataforma com muros de contenção de

alvenaria, sobre a qual está um canhão Whitworth de 9 polegadas, do tipo que foi adquirido

entre 1863 e 1874 sendo, portanto, uma adição posterior à construção original do forte (figu-

ra 3).

O interior da posição é formado por um delineamento de parapeito no lado norte, mas

esse parapeito, aparentemente, nunca foi concluído contudo, as bases da escarpa, atingindo

uma altura de 65 cm sobre o cordão e uma espessura de cerca de 80 cm são visíveis. A contra

escarpa, situada a três metros e meio da face da escarpa, tem também cerca de 80 cm de es-

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pessura (figura 5). O parapeito na parte a barbeta (frente abaluartada) tem igualmente a espes-

sura de aproximadamente de 80 cm (no topo) e uma altura de 95 cm sobre o terrapleno.

O interior da fortificação tem, sobre a frente abaluartada, alguns prédios com funções

diversas: paiol de palamenta, quartel da tropa, cozinha, quartel de oficiais e paiol de pólvora.

Todos, com exceção da cozinha e do paiol de pólvora, foram restaurados, deixando-se eviden-

tes as marcas dos vestígios arqueológicos que permitiram a reconstituição dos espaços. A co-

zinha foi deixada na situação de ruína e o paiol de pólvora, situado em um plano mais alto do

que o do terrapleno, atrás e ao sul da fortificação, tinha desabado próximo da data de visita.

Canhões

No local do forte existem quatro canhões, bem como fragmentos de outros dois, sen-

do que duas peças são do século XIX, feitas de aço, enquanto as outras e os fragmentos, são

de ferro fundido, datando do século XVIII. Os dados de cada canhão seriam os seguintes:

Peça 1 – Extramuros, ao lado do píer de atracação. Canhão Withworth antecarga, fer-

ro fundido, calibre entre faces: 210 mm, calibre entre ângulos: 230 mm (9 polegadas inglesas).

Construção em fretes, com tubo alma, frete “A” e frete “B”. Comprimento do 1º Reforço: 181

cm, 2º reforço: 154 cm, parte exposta do tubo: 146 cm, comprimento do ouvido até faixa alta

da culatra: 46 cm. Diâmetros das molduras na culatra: 185 196, 196 e 210 mm (correspondem

aos fretes). Diâmetro dos munhões: 205 mm. Circunferências dos fretes: Boca: 145 cm [46,15

cm diâmetro aproximado (18 pol)]; junto ao 2º frete: 184 cm [57,5 cm diâmetro aproximado

(23 pol?)]. 2º frete perto do tubo alma: 252 cm [80 cm diâmetro aproximado diâmetro (31,5

pol?)]; 2º Frete junto ao 1º frete: 252 cm [80 cm diâmetro aproximado (31,5 pol?)]; Faixa do

munhão: 312 cm [diâmetro aproximado 99 cm (39 pol)]. Com ouvido com grão de bronze.

Montado em reparo de ferro tipo Scott, de pião dianteiro. Sem o pino de ancoramento

e sem os trilhos de conteira. Faltam diversos peças no reparo (figura 8).

Na cortina curva, se observam os seguintes objetos:

- Fragmentos de dois canhões: duas culatras (figuras 9 e 10) e uma bolada (figura

11). Esses fragmentos são de identificação complexa, mas há o que parece ser a culatra de um

canhão do padrão holandês do final do século XVIII, com calibre 150 mm (24 libras? mas

pode ser 18 libras, devido à dificuldade de medição neste caso). O segundo canhão (cuja bola-

da é visível) parece ser um de padrão francês do século XVIII. Calibre 145 cm, ou seja, 18

libras.

- Junto aos fragmentos de canhões há um pequeno canhão inglês, padrão comercial,

1º reforço sem brasão. Comprimento total 193 cm, comprimento arcaico (medido da faixa alta

da culatra até a face da bocel): 181 cm, comprimento da alma 168 cm, calibre 97 mm (muito

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gasto). Letras WP marcadas no 1º Reforço. Munhão direito com inscrição ilegível. Ouvido

muito gasto. Munhões troncônicos.

- Próximo ao portão, ainda na cortina curva, está um canhão inglês do padrão Armgs-

trong, com o brasão do Rei Jorge (provavelmente Jorge II, mas a inscrição está gasta) no se-

gundo reforço. A peça se apresenta muito corroída. Comprimento total 230 cm, comprimento

arcaico: 213 cm, comprimento da alma 200 cm, calibre 105 mm (muito gasto). Inscrições nos

munhões ilegíveis.

- Uma última peça está atrás do quartel. É um Whitworth de 32 libras, Comprimento

total 243 cm, comprimento arcaico (medido da faixa alta da culatra até a face da bocel): 239

cm, comprimento da alma 212,5 cm, calibre 97 mm (entre faces). Com superfície oxidada,

sem inscrições visíveis. Sem o bloco da culatra e, naturalmente, sem o cascavel. Mas é clara-

mente peça de antecarga, do padrão adquirido entre 1863 e 1874. Com grão de bronze no ou-

vido.

Sobre o estado de conservação:

Não constatamos problemas na ilha, vegetação que a cobre, estruturas do forte ou nos

canhões, a não ser as causadas pelo tempo e abandono – ressalvando-se a queda da casa da

pólvora, já ocorrida e que, portanto, não foi analisada. Não há nada que indique que o forte

corra maiores riscos a curto e médio prazo.

Este é o laudo,

Adler Homero Fonseca de Castro Historiador - Ass. Téc. Pesquisa III.

Matr. 223.784

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Índice de figuras

Figura 1 – Ilha de Ratones. ......................................................................................................... 6

Figura 2 – Desenvolvimento da fortificação. ............................................................................. 6 Figura 3 – Canhão Whitworth de 9 polegadas na parte externa do forte. .................................. 6

Figura 4 – fonte, protegida por uma couraça. ............................................................................. 7 Figura 5 – Cortadura na entrada do forte. ................................................................................... 7 Figura 6 – Face do baluarte norte, mostrando reboco relativamente bem preservado. ............. 7

Figura 7 – Fosso seco. ................................................................................................................ 7

Figura 8 – Fotomontagem panorâmica da frente abaluartada. ................................................... 8 Figura 9 – Peça 1, canhão Whitworth de 9 polegadas, extramuros. ........................................... 8

Figura 10 – Culatra de canhão de ferro, aparentemente do padrão holandês, do século XVIII. 8

Figura 11 – Culatra (aos fundos) e bolada de canhão (primeiro plano). .................................... 9

Figura 12 – Canhão inglês, padrão comercial, provavelmente do século XVII. ........................ 9

Figura 13 – Canhão padrão inglês, padrão Armstrong. .............................................................. 9 Figura 14 – Canhão Whitworth de 32 libras. ........................................................................... 10

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Figura 1 – Ilha de Ratones. A esquerda, a ilha de Ratones pequena. Na extremidade direita da ilha grande se encontra o forte.

Figura 2 – Desenvolvimento da fortificação.

Figura 3 – Canhão Whitworth de 9 polegadas na parte externa do forte.

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Figura 4 – fonte, protegida por uma couraça. Na parte superior é possível ver a cortadura, que protege o portão de acesso ao forte.

Figura 5 – Cortadura na entrada do forte. Pode-se observar, igualmente, o cordão da cortina curva e o início do muro da escarpa do forte, acima deste.

Figura 6 – Face do baluarte norte, mostrando reboco relativamente bem preservado.

Figura 7 – Fosso seco. É possível ver-se, nessa foto, as três seteiras que protegiam o acesso ao portão, situadas na casa da guarda.

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Figura 8 – Fotomontagem panorâmica da frente abaluartada. Com quartel de praças em primeiro plano e casa do comando ao fundo. A cozinha se situava nos fundos da cons-

trução.

Figura 9 – Peça 1, canhão Whitworth de 9 polegadas, extramuros.

Figura 10 – Culatra de canhão de ferro, aparentemente do padrão holandês, do século XVIII.

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Figura 11 – Culatra (aos fundos) e bolada de canhão (primeiro plano).

Figura 12 – Canhão inglês, padrão comercial, provavelmente do século XVII.

Figura 13 – Canhão padrão inglês, padrão Armstrong.

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Figura 14 – Canhão Whitworth de 32 libras.