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INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE EGAS MONIZ MESTRADO INTEGRADO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS INTERAÇÕES MEDICAMENTOS - ÁLCOOL COM RELEVÂNCIA CLÍNICA NO AMBULATÓRIO Trabalho submetido por Teresa Martins Nobre Lança para a obtenção do grau de Mestre em Ciências Farmacêuticas outubro de 2014

INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE EGAS MONIZ§a, Teresa... · Assim, esta monografia tem como principal objetivo descrever um conjunto de interações medicamentos-álcool

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INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE EGAS MONIZ

MESTRADO INTEGRADO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS

INTERAÇÕES MEDICAMENTOS - ÁLCOOL COM RELEVÂNCIA CLÍNICA NO AMBULATÓRIO

Trabalho submetido por

Teresa Martins Nobre Lança para a obtenção do grau de Mestre em Ciências Farmacêuticas

outubro de 2014

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INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE EGAS MONIZ

MESTRADO INTEGRADO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS

INTERAÇÕES MEDICAMENTOS - ÁLCOOL COM RELEVÂNCIA CLÍNICA NO AMBULATÓRIO

Trabalho submetido por

Teresa Martins Nobre Lança para a obtenção do grau de Mestre em Ciências Farmacêuticas

Trabalho orientado por

Professora Doutora Mara Pereira Guerreiro

outubro de 2014

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Dedicatória

Aos meus pais, com saudade,

para que se possam orgulhar de mim e do meu trabalho.

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Agradecimentos

À minha orientadora Professora Doutora Mara Pereira Guerreiro por toda a

disponibilidade e ajuda prestada nestes longos e duros meses de trabalho, porque sem

a sua orientação e apoio não teria sido possível.

Aos meus tios, Leonor e Cândido, Teresa e Zé, o meu pilar, por me terem dado a mão

e me terem acompanhado durante estes anos ensinando-me a nunca desistir.

À minha Avó Teresa e Assunção, à Tiza e ao Totó pela sua dedicação, amizade e

carinho.

Aos meus irmãos de coração, Miguel e Filipe e ao meu sobrinho Bernardo.

Ao David, meu namorado, a quem agradeço todo o amor, carinho, compreensão e

apoio, encorajando-me a nunca desistir.

À Niquinha, a família que escolhi e que me acompanhou neste percurso académico,

por acreditar em mim, pelo seu apoio, mas acima de tudo pela sua amizade.

À Catarina Duarte, à Carolina Alves e à Madalena Carnall, amigas do coração, que

me acompanharam nos bons e nos maus momentos deste curso a quem também

desejo a maior sorte do mundo nesta etapa.

À Dra. Ana Paula Mendes, do CIM, pela sua ajuda e disponibilidade no envio de

artigos e publicações para esta monografia

A todos um muito obrigado

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Resumo

Os medicamentos são ferramentas importantes em saúde, porém a sua

administração deve ser realizada com precaução, avaliando a relação beneficio/risco e

a eficácia para indicação clínica a que se destinam. Da sua associação podem resultar

situações de morbilidade acrescida, devido ao aumento do risco de manifestações

clinicas indesejáveis e de interações medicamentosas de magnitude variável, que em

muitas situações são responsáveis por visitas às urgências hospitalares, internamentos

e prolongamento do tempo de hospitalização.

O crescente padrão de consumo de álcool que se tem vindo a observar,

justifica um estudo detalhado acerca das interações deste composto com alguns

fármacos extensamente utilizados. Assim, esta monografia tem como principal

objetivo descrever um conjunto de interações medicamentos-álcool com relevância

clínica no ambulatório, alertando para uma utilização mais segura, eficaz e racional

do medicamento, destacando o papel do farmacêutico e dos profissionais de saúde na

gestão das interações e na promoção da saúde.

De acordo com a metodologia adoptada e com os compêndios selecionados:

Stockley’s Drug Interactions, Micromedex, e Drug Interactions Analysis and

Management foi possível obter uma lista de quarenta e duas interações entre

medicamentos e álcool, que permitiu estudar o seu mecanismo de ação, manifestações

clínicas, gestão e a sua relevância clínica no ambulatório.

Palavras-chave Interações medicamentos-álcool, Farmacocinética, Farmacodinâmica

Ambulatório.

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Abstract

Drugs are important tools in health care, however, the administration should

be undertaken with caution, evaluating the benefit/risk relation, and the effective

clinical indication for which they are intended. The combination of drugs can cause

adverse conditions, due to the increased risk of adverse clinical events and drug

interactions of varying magnitudes, which in many cases are responsible for visits to

hospital emergency wards, hospitalization, or long periods of hospital stay.

The increasing trend of alcohol consumption, which has been observed,

justifies an in-depth study concerning the interaction of this compound with some

widely used drugs. This thesis aims to describe a set of drug-alcohol interactions with

clinical relevance in an ambulatory environment, promoting a more secure, effective

and rational use of drugs, emphasizing the role of the pharmacist and health care

professionals in the management of interactions and promoting better health in

general.

According to the methodology adopted and the summary of the textbooks

selected: Stockley's Drug Interactions, Micromedex, and Drug Interactions Analysis

and Management, it was possible to obtain a list of forty two interactions between

drugs and alcohol, which enabled the study of the action mechanism, clinical

manifestations, management and its clinical relevance in an ambulatory environment.

Key words: Drugs-Alcohol Interactions; Pharmacokinetics; Pharmacodynamics;

Ambulatory.

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Índice geral

Dedicatória ..................................................................................................................... 3

Agradecimentos ............................................................................................................. 5

Resumo .......................................................................................................................... 7

Abstract .......................................................................................................................... 9

Índice geral................................................................................................................... 11

Índice de figuras ........................................................................................................... 13

Índice de tabelas ........................................................................................................... 15

Lista de abreviaturas .................................................................................................... 17

1. Introdução ............................................................................................................. 19

1.1. Prevalência e impacto das interações medicamentosas no ambulatório ....... 21

1.2. Mecanismo das interações entre os medicamentos e o álcool ........................ 24

1.2.1. Interações farmacocinéticas ..................................................................... 24

1.2.2. Interações farmacodinâmicas ................................................................... 25

1.3. Farmacocinética do álcool (ADME) .............................................................. 26

1.3.1. Absorção .................................................................................................. 26

1.3.2. Distribuição.............................................................................................. 26

1.3.3. Metabolismo ............................................................................................ 27

1.3.4. Excreção .................................................................................................. 28

1.4. Factores de risco das interações medicamentos-álcool .................................. 28

1.4.1. Factores de risco relacionados com o doente .......................................... 29

1.4.2. Factores de risco relacionados com medicamentos ................................. 30

1.4.3. Factores de risco relacionados com a prescrição ..................................... 31

2. Desenvolvimento .................................................................................................. 33

2.1. Metodologia .................................................................................................... 33

2.2. Resultados ...................................................................................................... 36

2.2.1. Interação entre Benzodiazepinas e Álcool ............................................... 36

2.2.2. Interação entre Bupropiom e Álcool........................................................ 39

2.2.3. Interação entre Dissulfiram e Álcool ....................................................... 40

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2.2.4. Interação entre Acitretina e Álcool .......................................................... 43

2.2.5. Interação entre Antidepressivos Tricíclicos e Álcool .............................. 44

2.2.6. Interação entre ISRS e Álcool ................................................................. 46

2.2.7. Interação entre Analgésicos estupefacientes e Álcool ............................. 47

2.2.8. Interação entre Paracetamol e Álcool ...................................................... 49

2.2.9. Interação entre Ácido Acetilsalicílico e Álcool ....................................... 51

2.2.10. Interação entre Metronidazol e Álcool .................................................. 52

2.2.11. Interação entre Eritromicina e Álcool .................................................... 54

2.2.12. Interação entre Metoclopramida e Álcool ............................................. 55

2.2.13. Interação entre Varfarina e Álcool ......................................................... 56

2.2.14. Interação entre Nitroglicerina e Álcool ................................................. 58

2.2.15. Interação entre Tadalafil e Álcool ......................................................... 59

2.2.16. Interação entre Verapamilo e Álcool ..................................................... 60

2.2.17. Interação entre Isotretinoína e Álcool .................................................... 61

2.2.18. Interação entre Ranitidina e Álcool ....................................................... 62

2.2.19. Interação entre Isoniazida e Álcool ....................................................... 64

2.2.20. Interação entre Cloropromazina e Álcool .............................................. 65

2.2.21. Interação entre Olanzapina e Álcool ...................................................... 66

2.2.22. Interação entre Quetiapina e Álcool ...................................................... 67

2.2.23. Interação entre Tizanidina e Álcool ....................................................... 69

2.2.24. Interação entre Clonazepam e Álcool .................................................... 70

2.2.25. Interação entre Tacrólimus e Álcool ...................................................... 71

2.2.26. Interação entre Codeína e Álcool ........................................................... 72

3. Conclusão .............................................................................................................. 75

4. Bibliografia ........................................................................................................... 81

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Índice de figuras

Figura 1 - Metabolismo do álcool. Adaptado de Weathermon & Crabb (1999) ......... 28

Figura 2 - Factores de risco para interações medicamentosas. Adaptado de Monteiro

et al (2007) ........................................................................................................... 29

Figura 3 - Descrição da metodologia para inclusão de interações medicamentos -

álcool .................................................................................................................... 35

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Índice de tabelas

Tabela 1 - Consequências indesejáveis mais comuns resultantes das interações

medicamento - álcool. Adaptado de Cousins et al. (2014) .................................. 20

Tabela 2 - Classificação da gravidade das interações nos compêndios utilizados ...... 34

Tabela 4 – Benzodiazepinas e Álcool .......................................................................... 36

Tabela 5 - Bupropiom e Álcool ................................................................................... 39

Tabela 6 - Dissulfiram e Álcool ................................................................................... 40

Tabela 7 - Acitretina e Álcool ...................................................................................... 43

Tabela 8 - Antidepressivos Tricíclicos (ADT) e Álcool .............................................. 44

Tabela 9 - Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS) e Álcool .......... 46

Tabela 10 - Analgésicos Opióides e Álcool ................................................................. 47

Tabela 11 - Paracetamol e Álcool ................................................................................ 49

Tabela 12 - Ácido Acetilsalicílico e Álcool ................................................................. 51

Tabela 13 - Metronidazol e Álcool .............................................................................. 52

Tabela 14 - Eritromicina e Álcool ............................................................................... 54

Tabela 15 - Metoclopramida e Álcool ......................................................................... 55

Tabela 16 - Varfarina e Álcool .................................................................................... 56

Tabela 17 - Nitroglicerina e Álcool ............................................................................. 58

Tabela 18 - Tadalafil e Álcool ..................................................................................... 59

Tabela 19 - Verapamilo e Álcool ................................................................................. 60

Tabela 20 - Isotretinoína e Álcool ............................................................................... 61

Tabela 21 - Ranitidina e Álcool ................................................................................... 62

Tabela 22 - Isoniazida e Álcool ................................................................................... 64

Tabela 23 - Cloropromazina e Álcool .......................................................................... 65

Tabela 24 - Olanzapina e Álcool ................................................................................. 66

Tabela 25 - Quetiapina e Álcool .................................................................................. 67

Tabela 26 - Tizanidina e Álcool ................................................................................... 69

Tabela 27 - Clonazepam e Álcool ................................................................................ 70

Tabela 28 - Tacrólimus e Álcool ................................................................................. 71

Tabela 29 - Codeína e Álcool ...................................................................................... 72

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Lista de abreviaturas

5-HT: 5 - Hidroxitriptamina

AAS: ácido acetilsalicílico

ADH: álcool desidrogenase

ADME: absorção, distribuição, metabolismo e excreção

ALDH: aldeído desidrogenase

AUC: área sob a curva

ISRS: inibidores seletivos da recaptação de serotonina

NA: noradrenalina

NAD: dinucleotido de nicotinamida e adenina

RAM: reação adversa medicamento

RCM: Resumo das características do medicamento

SNC: sistema nervoso central

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1. Introdução

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1. Introdução

Os medicamentos são ferramentas importantes em saúde, porém a sua

utilização deve ser realizada com precaução, avaliando a relação beneficio/ risco e

eficácia para indicação clínica a que se destinam (Monteiro, Marques, & Ribeiro,

2007). A sua utilização e/ou associação pode resultar num aumento do risco de

manifestações clinicas indesejáveis e interações medicamentosas de gravidade

variável (Secoli, 2001).

As interações medicamentosas são comuns na prática clínica. Ocorrem quando

há uma alteração da resposta farmacológica pela administração conjunta de um

medicamento e outro medicamento, alimento, bebida, planta ou outras substâncias

químicas; a resposta farmacológica é diferente da esperada quando as substâncias que

interagem são administradas separadamente. Em termos clínicos esta alteração da

resposta farmacológica não tem obrigatoriamente que ser prejudicial, podendo ser a

chave para o sucesso terapêutico em inúmeras patologias, ou não ter efeito clínico. As

interações são prejudiciais quando a potenciação do efeito terapêutico se torna nociva,

quando existe potenciação de efeitos indesejados ou diminuição do efeito terapêutico.

A maioria dos fármacos não interagem por um só mecanismo, habitualmente

compreendem dois ou mais que atuam em conjunto (Baxter, 2010). Acresce que as

interações podem ser unidirecionais, tradicionalmente descritas em termos de fármaco

objeto e fármaco precipitante, ou bidirecionais, isto é, o álcool pode afetar a

farmacocinética e farmacodinâmica dos medicamentos, ou podem ser os

medicamentos a afectar o metabolismo do álcool e a potenciar os seus efeitos (Anon,

1998).

Conforme referido por vezes as interações não decorrem unicamente da

administração simultânea de dois medicamentos, mas da associação com outras

substâncias químicas. O álcool é exemplo de uma destas substâncias.

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

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Atualmente tem-se vindo a observar um padrão de crescimento na ingestão de

bebidas alcoólicas, doravante simplesmente referida por ingestão de álcool. Segundo

o relatório World Health Statistics divulgado recentemente pela WHO (2014),

Portugal encontra-se entre os países do mundo com maior consumo de álcool por

pessoa, cerca de 13 litros/ano. O seu consumo moderado a excessivo pode estar

associado a consequências nefastas, que se podem traduzir num agravamento de

certas patologias crónicas (Hulse, 2002; Viveiro, 2006; Cousins et al., 2014).

O consumo de bebidas alcoólicas pode aumentar em 24% o risco de reações

adversas por administração concomitante de medicamentos, sendo que estas podem ir

de cefaleias a situações mais graves, como complicações metabólicas e endócrinas

(Donarelli, 2004; Immonen, Valvanne, & Pitkälä, 2013). As consequências

indesejáveis mais comuns resultantes das interações entre medicamentos e álcool

encontram-se descritas na Tabela 1.

Tabela 1 - Consequências indesejáveis mais comuns resultantes das interações medicamentos - álcool. Adaptado de Cousins et al. (2014)

Reações adversas mais comuns resultantes das interações medicamentos-álcool

• Alteração do metabolismo dos fármacos;

• Aumento dos níveis de álcool no sangue;

• Exacerbação de efeitos adversos;

• Hemorragia e inflamação gastrointestinais;

• Hepatoxicidade;

• Reações tipo dissulfiram;

• Redução da efetividade e segurança do medicamento;

•Sedação.

É então imprescindível que os farmacêuticos e outros profissionais de saúde,

conheçam os mecanismos de ação dos medicamentos e sejam capazes de prever e

avaliar possíveis interações medicamentosas com o álcool, atuando de forma eficaz e

reduzindo a morbilidade associada à sua ocorrência. Para além disso, devem ser

capazes de relacionar manifestações clínicas com eventuais interações

medicamentosas, uma vez que a sua ocorrência é razão de inúmeras RAM (reações

adversas a medicamentos). Apesar de nem sempre estar bem estabelecida, a gestão

clínica da interação é um dos fatores mais importantes a ter em conta. As medidas a

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1. Introdução

21

tomar para reduzir o risco de efeitos adversos incluem diminuir a dose de uma ou de

ambas as substâncias implicadas, suspender uma das substâncias, considerar

alternativas e monitorizar os doentes (Monteiro et al., 2007; Ibáñez, Alcalá, Garcia, &

Puche, 2008; Olivença & Simón, 2009).

Uma estratégia para reduzir o impacto negativo das interações entre os

medicamentos e o álcool é dar a conhecer aos profissionais de saúde, como

farmacêuticos, médicos e enfermeiros, aquelas com maior relevância clínica.

Devido às inúmeras interações descritas entre o álcool e medicamentos optou-

se neste trabalho por focar apenas os que são utilizados em ambulatório. A terapêutica

em ambulatório, não pressupondo internamento, confere ao doente maior

responsabilidade na adesão à terapêutica medicamentosa e autonomia sobre a adoção

do estilo de vida, nomeadamente consumo de álcool.

Assim, esta monografia tem como objetivo descrever interações

medicamentos-álcool com relevância clínica no ambulatório. Especificamente,

pretende-se discutir o seu mecanismo de ação destas interações, a sua gravidade e a

gestão proposta.

Para contextualizar o trabalho apresentam-se seguidamente secções sobre

prevalência e impacto das interações medicamentosas, bem como o mecanismo das

interações entre os medicamentos e o álcool, factores de risco das interações

medicamentosas, farmacocinética do álcool e factores que a influenciam.

1.1. Prevalência e impacto das interações medicamentosas no ambulatório

Vários estudos têm investigado a prevalência de interações medicamentosas

no geral (Smith, Seidl, & Cluff, 1966; Delafuente, 2003). Embora existam

discrepâncias nos resultados, possivelmente relacionadas com a própria definição de

interação medicamentosa adotada pelos autores, entre outros fatores, concluindo que

as interações medicamentosas são relativamente frequentes. A frequência com que

ocorrem interações entre medicamentos e o álcool também tem sido alvo de estudo,

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

22

embora muitos autores tenham focado a redução do consumo de álcool em indivíduos

sujeitos a terapêutica que potencialmente interage com esta substância.

Um estudo acerca da abstinência de álcool durante a terapêutica, concluiu que

os doentes que tomavam benzodiazepinas (47,7%) e antidepressivos (36,1%)

manifestavam uma maior abstinência de álcool. Os medicamentos anticoagulantes,

antidiabéticos, os que atuam no SNC e cardiovascular são outras classes terapêuticas

associadas a uma diminuição do consumo de álcool (Jalbert, Quilliam, & Lapane,

2008; Cousins et al., 2014).

A avaliação da exposição de medicamentos que interagem com álcool e a

prevalência do consumo de álcool por classe terapêutica foi demonstrado por Pringle

et al. (2005). Estes investigadores revelaram que 20,2% dos indivíduos que bebiam

álcool tomavam concomitantemente anti-inflamatórios não esteróides, 20,1% anti-

histamínicos e 19,9% anti-hipertensivos. Este estudo concluiu ainda que os doentes

que tomam medicação que interage com o álcool têm menor propensão para o seu

consumo que doentes que tomem medicação que não interfira com o álcool.

Outro estudo conduzido, por Aira, Hartikainen & Sulkava (2005), revelou que

fármacos utilizados no tratamento da diabetes (46%), hipertensão (43%) e depressão

(39%) estavam associados a um consumo moderado de álcool, destacando também os

anticoagulantes orais, sedativos e alguns analgésicos.

De salientar que a literatura indica que 46% a 59% de indivíduos sujeitos a

tratamento com AINE ingerem álcool (Aira et al., 2005; Saitz, Horton, & Samet

2003), respetivamente. Trata-se de uma proporção considerável de indivíduos com

um comportamento que aumenta o risco de eventos adversos, nomeadamente

hemorragia.

Os dados disponíveis revelam que o consumo álcool vai diminuindo com a

idade, facto que pode estar relacionado com uma maior consciencialização por parte

dos idosos de possíveis interações medicamentos-álcool, minimizando

comportamentos de risco (Jalbert et al., 2008; Immonen et al., 2013; Cousins et al.,

2014).

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1. Introdução

23

Não se encontraram estudos que quantificassem especificamente o impacto

das interações medicamento-álcool. Contudo, diversos autores relatam que o álcool,

devido aos seus efeitos depressores no SNC, quando tomado concomitantemente com

certos medicamentos, nomeadamente benzodiazepinas, alguns anti-histamínicos,

antidepressivos e relaxantes musculares vai potenciar a ação sedativa destes, o que

pode comprometer a condução de veículos, conduzir a desequilíbrios, perigo de

quedas ou até mesmo à morte (Anon, 1998; Aira et al., 2005; Pringle et al., 2005;

Jalbert et al., 2008; Immonen et al., 2013)

Seguidamente apresentam-se duas revisões sobre o impacto negativo das

interações medicamentosas; embora estas não versem especificamente sobre

interações medicamento-álcool optou-se pela sua inclusão face à pertinência e

atualidade de um dos trabalhos.

Dechanont e colaboradores (2014), através de uma revisão sistemática da

literatura, estudaram a prevalência das hospitalizações e visitas à urgência hospitalar

causadas por interações medicamentosas. Foram incluídos 13 estudos; sete

conduzidos na Europa, cinco nos EUA e um na Austrália. Para as hospitalizações

relacionadas com interações medicamentosas foi encontrada uma prevalência

mediana de 1.1% (367 DDI casos/ 47 976 doentes); a prevalência mediana de visitas

à urgência causadas por interações medicamentosas foi 0.1% (20 DDI casos/23 607

doentes). Os medicamentos mais frequentemente envolvidos nas hospitalizações por

interações medicamentosas foram os AINE.

Outra revisão anterior sobre este tópico concluiu que 0,054% das visitas às

urgências, 0,57% dos internamentos e 0,12% das re-hospitalizações eram devidas a

interações medicamentosas (Becker et al., 2007). Contudo, a prevalência de

hospitalizações relacionadas com interações medicamentosas aumentava

marcadamente quando se consideravam apenas os idosos (4,8% dos internamentos).

Tal como no trabalho de Dechanont et al. (2014) os AINE foram os fármacos mais

frequentemente envolvidos nas interações medicamentosas.

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

24

1.2. Mecanismo das interações entre os medicamentos e o álcool

Encontram-se descritos dois tipos de interações entre medicamentos e álcool:

interações farmacocinéticas e interações farmacodinâmicas.

1.2.1. Interações farmacocinéticas

Compreendem a alteração da cinética de um medicamento pelo álcool, isto é,

alterações ao nível da absorção, distribuição, metabolismo (por indução ou inibição

dos sistemas enzimáticos) ou excreção (Anon, 1998). Não podem ser generalizadas

para fármacos da mesma classe terapêutica e são comummente designadas por

interações ADME (Baxter, 2010). Este tipo de interações são as mais observadas,

destacando :

• Alteração da taxa de esvaziamento gástrico

Existem fármacos que podem aumentar ou diminuir a taxa de esvaziamento

gástrico e por conseguinte a velocidade com que o álcool ou o medicamento são

absorvidos. Medicamentos que aceleram a taxa de esvaziamento gástrico, como a

metoclopramida, cisaprida, eritromicina e ácido acetilsalicílico, vão provocar uma

aumento da velocidade de absorção do álcool, provocando um aumento mais rápido

da sua concentração sanguínea. Pelo contrário, medicamentos que retardem o

esvaziamento gástrico, como os simpaticomiméticos, anticolinérgicos e opióides,

provocam uma diminuição da velocidade de absorção. Ademais, o próprio álcool e a

presença de alimentos vão retardar o esvaziamento gástrico (Anon, 1998; Viveiro,

2006).

• Alteração do metabolismo por alteração da atividade enzimática

Muitas das interações farmacocinéticas entre o álcool e os medicamentos

resultam de uma alteração da atividade das enzimas hepáticas responsáveis pela

biotransformação de inúmeros fármacos, mais concretamente a alteração da atividade

da isoenzima CYP2E1 do citocromo P450 (Inês, 2007). Esta e outras isoenzimas do

citocromo P450 podem ser induzidas ou inibidas por medicamentos; o efeito do

álcool na atividade enzimática depende do padrão de consumo desta substância. A

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1. Introdução

25

ingestão aguda de álcool condiciona inibição enzimática e consequentemente

diminuição do metabolismo dos medicamentos, resultando num aumento da sua

concentração, podendo mesmo ocorrer sobredosagem. Contrapondo, em casos de

ingestão crónica de álcool assiste-se a indução enzimática e consequentemente

aumento do metabolismo, resultando em níveis plasmáticos mais baixos do

medicamento afetado (Viveiro, 2006; Inês, 2007).

Por outro lado, existem medicamentos que inibem a atividade da álcool

desidrogenase (ADH) hepática, como os antagonistas H2; como consequência esta

metaboliza o álcool em menor extensão, provocando um aumento das suas

concentrações plasmáticas que vão desencadear mal-estar e reações adversas típicas

desta substância (Anon, 1998; Viveiro, 2006).

Outra interação farmacocinética muito comum prende-se com o facto de

alguns fármacos, como a isoniazida, o metronidazol e algumas cefalosporinas, quando

tomados em simultâneo com álcool, terem a capacidade de inibir a aldeído

desidrogenase (ALDH), provocando uma reação denominada de tipo dissulfiram. Esta

resulta da acumulação de acetaldeído no organismo e conduz a um severo mal estar e

manifestações como náuseas, vómitos, rubor facial, suores, hipotensão, taquicardia,

palpitações e cefaleias. Este efeito é também comummente associado à substância

ativa dissulfiram no tratamento da dependência do álcool, que por provocar estes

sintomas conduz à abstinência (Anon, 1998; Viveiro, 2006; Inês, 2007).

1.2.2. Interações farmacodinâmicas

Ocorrem quando um medicamento e álcool atuam ao nível dos mesmos

receptores, locais de ação ou sistemas fisiológicos, potenciando ou inibindo a resposta

farmacológica que seria obtida para cada um deles (Hoefler, 2005; Baxter, 2010).

As interações farmacodinâmicas encontram-se intimamente relacionadas com

os efeitos do álcool ao nível do sistema nervoso central, resultando na potenciação do

efeito quando administrado conjuntamente com medicamentos depressores do SNC,

como os ansiolíticos, hipnóticos, sedativos e alguns anti-histamínicos. Esta

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

26

potenciação pode resultar num aumento significativo de sedação, que conduz a um

comprometimento psicomotor, com perigo de quedas e risco de acidente ao conduzir

veículos ou operar com maquinaria (Anon, 1998; Donarelli, 2004; Viveiro, 2006).

Outras interações farmacodinâmicas muito comuns estão relacionadas com a

potenciação dos efeitos adversos de alguns medicamentos quando tomados

juntamente com álcool. Alguns dos resultados que podem ser observados são o

aumento de toxicidade hepática e hemorragias gastrointestinais por parte do

paracetamol e ácido acetilsalicílico, respectivamente (Anon, 1998; Saitz, Horton, &

Samet, 2003).

1.3. Farmacocinética do álcool (ADME)

1.3.1. Absorção

O álcool após ingerido é lentamente absorvido por difusão passiva, a nível do

esófago e do estômago e rapidamente ao nível da porção superior do intestino

delgado, sendo uma parte diretamente absorvida para a corrente sanguínea e outra

conduzida através da veia porta até ao fígado. A velocidade de absorção é

condicionada por diversos factores como a taxa de esvaziamento gástrico, presença de

alimentos no estômago, tempo e quantidade ingerida, entre outros (Guimarães,

Moura, & da Silva, 2006; Viveiro, 2006; Bruton, Lazo, & Parker, 2007; Inês, 2007;

Truven Health Analytics, 2014).

1.3.2. Distribuição

Uma vez que o álcool que atinge a corrente sanguínea não se liga a proteínas

plasmáticas, ocorre ampla distribuição pelos tecidos e fluidos corporais em função da

sua composição em água, não sendo distribuído ao tecido adiposo. Assim maiores

concentrações de álcool são encontradas em zonas com maior conteúdo em água,

como é o caso do plasma, saliva e urina (Guimarães et al., 2006; Truven Health

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1. Introdução

27

Analytics, 2014). No caso das grávidas este consegue atravessar fácil e rapidamente a

placenta (Weathermon & Crabb, 1999; Truven Health Analytics, 2014). Devido às

suas características o álcool atravessa facilmente a barreira hematoencefálica e atinge

o sistema nervoso central, onde apresenta concentrações semelhantes às

concentrações plasmáticas (Inês, 2007).

1.3.3. Metabolismo

O metabolismo do álcool dá-se essencialmente a dois níveis: a nível do

estômago e a nível do fígado. A nível do estômago, as enzimas da mucosa,

nomeadamente a álcool desidrogenase (ADH), metabolizam o álcool e outras

substâncias. Mas é maioritariamente a nível hepático, cerca de 90-98%, que se dá a

metabolização por oxidação do etanol, catalisada pela ação da álcool desidrogenase

(ADH), enzimas do sistema hepático microssomal (CYP2E1) e catalase, dando

origem a um metabolito tóxico e inativo, o acetaldeído, e a radicais de oxigénio,

ambos responsáveis por inúmeras reações adversas (Weathermon & Crabb, 1999;

Guimarães et al., 2006; Viveiro, 2006; Bruton et al., 2007; Inês, 2007; Truven Health

Analytics, 2014;).

A ADH além de participar na oxidação do etanol, desempenha um papel

importante na redução da forma oxidada do dinucleótido de nicotinamida e adenina

(NAD+) em NADH (forma reduzida) por transferência de um átomo de hidrogénio

do substrato, produzindo acetaldeído (Lieber, 1997; Weathermon & Crabb, 1999).

Por intermédio de duas isoformas da enzima aldeído desidrogenase (ALDH1 e

ALDH2), o acetaldeído é metabolizado, dando origem a um metabolito não tóxico, o

acetato, que é posteriormente libertado na corrente sanguínea e oxidado pelos tecidos

periféricos em água, dióxido de carbono e ácidos gordos. Para além da conversão de

acetaldeído a acetato, a ALDH2 desempenha um papel fundamental no metabolismo

do álcool ao manter os valores de acetaldeído baixos e não tóxicos para o organismo

(Weathermon & Crabb, 1999; Viveiro, 2006; Truven Health Analytics, 2014).

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

28

Figura 1 - Metabolismo do álcool. Adaptado de Weathermon & Crabb (1999)

Após o álcool ter sofrido o efeito de primeira passagem, isto é, ter sido

metabolizado a nível fígado, pode voltar novamente a ser transportado para este onde

volta a sofrer nova metabolização (Weathermon & Crabb, 1999).

1.3.4. Excreção

A excreção do álcool ocorre essencialmente a nível renal e 2 a 10% do álcool

que não sofreu efeito de primeira passagem no fígado tendo sido logo absorvido para

a corrente sanguínea, é excretado inalterado através do suor, respiração e urina

(Truven Health Analytics, 2014).

As taxas de eliminação corporal variam de individuo para individuo e devem-

se em grande parte a diferenças na atividade das enzimas do metabolismo do etanol

(Weathermon & Crabb, 1999).

1.4. Factores de risco das interações medicamentos-álcool

Existem vários fatores que influenciam a ocorrência de interações

medicamentosas e a sua expressão clínica. Monteiro e colaboradores (2007) propõem

que estes sejam divididos em três grupos, conforme ilustrado na Figura 2.

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1. Introdução

29

Figura 2 - Factores de risco para interações medicamentosas. Adaptado de Monteiro et al (2007)

1.4.1. Factores de risco relacionados com o doente

Os factores de risco relacionados com o doente englobam uma série de

condicionantes intrínsecas como o polimorfismo genético, género, idade, patologias

concomitantes e poli-farmácia, que vão afectar a expressão e a magnitude das

interações medicamentosas.

O polimorfismo genético encontra-se relacionado com variações genéticas ao

nível das enzimas, nomeadamente do citocromo P450 e transportadores de fármacos,

constituindo um factor de risco clinicamente importante (Monteiro et al., 2007;

Olivença & Simón, 2009). Por exemplo, os indivíduos asiáticos apresentam uma

variação genética inata a nível da enzima aldeído desidrogenase 2 (ALDH2) que lhe

confere inatividade, ocorrendo assim uma acumulação de acetaldeído no corpo, que

determina sintomas como náuseas, vómitos e rubor facial dores de cabeça, taquicardia

ou hipotensão aquando da ingestão de álcool (Weathermon & Crabb, 1999; Viveiro,

2006; Inês, 2007). Para além desta variação genética a população asiática apresenta

uma diminuição da atividade das enzimas da família do citocromo P450 (CYP2C19 e

CYP2D6), responsáveis pela biotransformação de alguns fármacos como os

antidepressivos e antipsicóticos, que se traduz numa maior probabilidade de vir a

desenvolver interações medicamentos-álcool.

As mulheres por apresentarem uma maior percentagem de gordura e baixo

teor de água corporal total relativamente ao homem, torna-as mais susceptíveis a

desenvolver interações medicamento-álcool, pois ao ingerirem as mesmas

quantidades de álcool, apresentam uma menor distribuição deste e por conseguinte

concentrações mais elevadas (Donarelli, 2004; Viveiro, 2006; Inês, 2007; Duquet,

Doente

• Polimorfismo genético• Género• Idade• Patologias concomitantes• Poli-farmácia

Medicamentos

• Margem terapêutica• Indução/Inibição enzimática• Ligação a proteínas plasmáticas• Dose• Novos fármacos

Prescrição

• Ambulatório vs Hospitalar• Multiplas prescrições

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

30

2008). Por outro lado, as mulheres apresentam uma menor atividade da ADH em

relação aos homens, o que determina uma menor metabolização do etanol atingindo,

consequentemente, concentrações de álcool no sangue mais elevadas (Lieber, 1997;

Donarelli, 2004; Duquet, 2008).

No caso particular dos idosos existe maior risco de interações entre

medicamentos e álcool devido diminuição da função hepática e renal, bem como a

existência de patologias que podem condicionar alterações na absorção, distribuição e

metabolismo dos fármacos. Adicionalmente os idosos são geralmente poli-medicados

(Aira et al., 2005; Inês, 2007; Baxter, 2010; Duquet, 2008; Immonen et al., 2013;

Cousins et al., 2014).

A poli-farmácia é considerada como um factor de risco major, uma vez que

quanto maior o número de fármacos administrados simultaneamente, maior o risco de

ocorrência de interações, nomeadamente em doentes idosos, doentes crónicos e com

patologias graves que requerem esquemas terapêuticos combinados (Franco et al.,

2006; Monteiro et al., 2007; Olivença & Simón, 2009; Immonen et al., 2013; Pasina

et al., 2013).

1.4.2. Factores de risco relacionados com medicamentos

A potência dos fármacos para atuarem como indutores ou inibidores

enzimáticos e a margem terapêutica estreita aumentam a sua a probabilidade de

manifestações clínicas prejudiciais das interações medicamentosas.

A extensão de ligação às proteínas plasmáticas, ainda que seja referida na

literatura como relevante, não constitui geralmente um factor de risco

medicamentosas com importância clínica.

Por fim, a dose de fármaco e as novidades terapêuticas também constituem

factores de risco a ter em conta aquando a sua administração. Quanto maior a

quantidade de fármaco a administrar, maior o risco de interação com outros

medicamentos (Monteiro et al., 2007). No que diz respeito ao álcool, e conforme já

referido, uma ingestão pontual ou aguda de álcool determina uma inibição

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1. Introdução

31

competitiva das enzimas do sistema hepático microssomal, nomeadamente do

CYP2E1, enquanto que para ingestão crónica de álcool ocorre uma indução do

CYP2E1 (Viveiro, 2006; Inês, 2007; Duquet, 2008; Truven Health Analytics, 2014).

Uma vez que a informação sobre as medicamentos recentes é limitada pode

haver um risco aumentado de ocorrência de interações medicamentosas (Monteiro et

al., 2007).

1.4.3. Factores de risco relacionados com a prescrição

Os doentes ao serem acompanhados por médicos de diferentes especialidades

para o tratamento de patologias concomitantes, leva a esquemas terapêuticos mais

complexos, o que se traduz num aumento do risco de interações medicamentosas por

aumento do numero de fármacos administrados em simultâneo (Monteiro et al.,

2007).

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

32

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2. Desenvolvimento

33

2. Desenvolvimento

2.1. Metodologia

Para identificar as interações com maior relevância para a prática clínica,

recorri a três compêndios de referência sobre interações medicamentosas: Stockley’s

Drug Interactions, Micromedex Solutions e Drug Interactions Analysis and

Management. Foram definidos os seguintes critérios para inclusão das interações

neste trabalho, conforme descrito na Figura 3:

• Estarem documentadas em pelo menos duas das três fontes referidas;

• Terem relevância clínica no ambulatório.

Ainda em relação à bibliografia consultada, o Stockley’s não classifica de

forma explicita a gravidade das interações, embora demonstre a sua evidência clínica,

mecanismo de ação, importância e gestão. O Micromedex apresenta um breve resumo

da interação, define de forma objetiva o seu mecanismo, os seus efeitos, os seus níveis

de documentação e a sua gestão; classifica a gravidade das interações por níveis,

mencionando para algumas interações estudos que demonstram a sua evidência,

embora não revele a sua importância clínica. Por fim o Hansten & Horn para além de

descrever brevemente o mecanismo de ação da interação, a sua gestão, os factores de

risco e os fármacos relacionados, classifica a gravidade das interações por classes.

A classificação da gravidade das interações nas três fontes é diferente, como

demonstrado na Tabela 2.

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

34

Tabela 2 - Classificação da gravidade das interações nos compêndios utilizados

Stockley's

Não possui nenhum classificação operacional da gravidade de interações.

Micromedex

Minor

Moderada

Major

Contra-indicada

Hansten & Horn

Classe 1 - Avoid Combination: Evitar associação. Interações cujo o risco supera o benefício

Classe 2 - Usually Avoid Combination: Evitar associação a menos que o benefício ultrapasse o risco

Classe 3 - Minimize risk: Avaliar e tomar medidas para minimizar o risco

Classe 4 - No Action Needed: Associação de fármacos com baixo risco de provocar efeitos adversos

Classe 5 - No Interaction: Associação de fármacos cuja evidência sugere que não interagem

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2. Desenvolvimento

35

Figura 3 - Descrição da metodologia para inclusão de interações medicamentos - álcool

Interações medicamentos-álcool

Stockley’s Drug

Interactions

Drug Interactions

Analysis and Management

Micromedex

Solutions

196 Interações 169 Interações 58 Interações

Interações comuns a pelo menos duas das três fontes

91 Interações

• Eliminadas 27: Fármaco não comercializado em Portugal; • Eliminadas 3: Fármaco uso exclusivo hospitalar; • Eliminadas 12: Interações com pouca relevância clínica.

49 Interações

• Eliminadas 2: Fármacos destinados a mulheres a amamentar e crianças

• Eliminadas 5: Utilização rara na prática clínica

42 Interações

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

36

2.2. Resultados

2.2.1. Interação entre Benzodiazepinas e Álcool

Tabela 3 – Benzodiazepinas e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

BNZ Interação Evitar Stockley's

Alprazolam Farmacodinâmica consumo Micromedex

Clorazepato e álcool; Hansten&Horn

Diazepam Farmacocinética Classe 3 Monitorizar Flurazepam Lorazepam Moderada/ Midazolam Major Oxazepam (Midazolam) Triazolam

As benzodiazepinas são fármacos comummente utilizados no tratamento de

distúrbios de ansiedade, pânico e fobias, indução ou manutenção do sono. As

diferenças a que se assiste entre as várias benzodiazepinas encontram-se relacionadas

com a sua farmacocinética, ou seja, com o seu tempo de semi-vida que caracteriza a

sua duração de ação.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas

As interações que se estabelecem entre as benzodiazepinas e o álcool são

essencialmente interações farmacodinâmicas. A ingestão simultânea de fármacos

como o Alprazolam, Clobazam, Clorazepato, Diazepam, Flurazepam,

Lorazepam, Midazolam, Oxazepam Temazepam e Triazolam e álcool, pode

exacerbar os efeitos sedativos dos medicamentos por depressão do sistema nervoso

central, resultando um aumento do perigo de quedas, condução automóvel e acidentes

rodoviários por comprometimento da atividade psicomotora (ataxia) e diminuição da

capacidade de reação (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics,

2014).

As interações farmacocinéticas ocorrem devido a alterações no metabolismo e

excreção das benzodiazepinas. Estes fármacos são metabolizados por duas vias

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2. Desenvolvimento

37

principais, a primeira diz respeito à metabolização pelas isoenzimas do sistema

microssomal hepático, nomeadamente CYP3A4 e CYP2C19, cuja atividade se

encontra diretamente relacionada com os níveis de ingestão de álcool, produzindo

metabolitos ativos de elevado tempo de semi-vida. Fármacos como o Lorazepam,

Oxazepam e Temazepam, são essencialmente metabolizados por conjugação com

ácido glucurónico (fase II), produzindo metabolitos inativos, que posteriormente vão

ser excretados por via urinária (Viveiro, 2006).

Assim, para uma ingestão aguda de álcool e em doentes com função hepática

comprometida, fármacos como o Alprazolam, Lorazepam e Triazolam, assistem a

uma diminuição da sua metabolização por inibição competitiva das enzimas, o que se

traduz num aumento do risco de efeitos adversos por acumulação da substância ativa

no organismo.

O álcool além de potenciar a neurotransmissão inibitória, atua também ao

nível da absorção de fármacos, provocando um aumento das concentrações

plasmáticas das benzodiazepinas como o Diazepam e o Clobazam. A evidência

disponível indica que o álcool pode aumentar as concentrações plasmáticas do

Diazepam por aumento da sua velocidade de absorção e diminuição da sua depuração

(Hansten & Horn, 2013). Embora seu o mecanismo da interação seja desconhecido,

segundo a literatura, o álcool aumenta em 50% a concentração máxima de Clobazam,

estando a sua associação contra-indicada (Baxter, 2010; Truven Health Analytics,

2014).

O Midazolam quando administrado em conjunto com álcool, conduz a um

aumento do risco de hipoventilação, diminuição da saturação em oxigénio e apneia,

obstrução das vias aéreas respiratórias, e exacerbação da intensidade e duração da

sedação (Truven Health Analytics, 2014). Especialmente em idosos poli-medicados,

este medicamento mostrou um aumento da incidência de interações por diminuição da

sua metabolização (Baxter, 2010).

O Clorazepato dipotássico, tal como o Midazolam, provocam efeitos a nível

do sistema respiratório, nomeadamente a depressão deste, não sendo aconselhada a

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

38

sua utilização com álcool em indivíduos que padeçam de apneia do sono e

insuficiência respiratória grave (Truven Health Analytics, 2014).

O Flurazepam ao produzir metabolitos ativos com atividade psicotrópica,

leva a que estes possam interagir com o álcool ingerido, fazendo com que a interação

persista vários dias após a administração do fármaco ter sido interrompida (Baxter,

2010; Truven Health Analytics, 2014)

Em resumo, o mecanismo de ação destas interações é diverso, sendo que

alguns ainda permanecem desconhecidos (Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: A interação entre o Diazepam e o Álcool é

classificada como sendo de Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar o

risco (Hansten & Horn, 2013). As interações a que se assiste entre o álcool e esta

classe farmacoterapêutica, em geral, são de intensidade moderada, exceptuando o

Midazolam que ao ser administrado em conjunto com álcool conduz a manifestações

clínicas graves (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão

Os doentes devem ser advertidos das possíveis interações decorrentes da

administração simultânea de benzodiazepinas e álcool e encorajados a diminuir o seu

consumo, pois assiste-se a um aumento da sedação, diminuição do estado de alerta e

capacidade de reação, que pode comprometer atividades quotidianas que exijam

atenção, como por exemplo, a capacidade de condução. Os doentes que manifestem

depressão acentuada do SNC devem ser monitorizados (Hansten & Horn, 2013).

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2. Desenvolvimento

39

2.2.2. Interação entre Bupropiom e Álcool

Tabela 4 - Bupropiom e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Bupropiom Interação Classe 1 Evitar Stockley's

Farmacodinâmica Major associação; Micromedex

Minimizar

consumo

álcool

O Bupropiom é um fármaco antidepressor utilizado no tratamento da

depressão major.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A interação que se estabelece entre o

antidepressor e o álcool é de carácter farmacodinâmico, sendo que a sua associação,

segundo estudos realizados, não mostrou afectar os parâmetros farmacocinéticos de

ambos os fármacos (Baxter, 2010). A ingestão de álcool durante o tratamento com o

antidepressor é contra-indicada, devido à ocorrência de reações adversas graves dose-

dependentes, como episódios convulsivos. Para além destes efeitos, foi também

observada uma diminuição da tolerância ao álcool bem como um aumento de

manifestações neuropsiquiátricas (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Relevância Clínica/ Gravidade: Classe 1 - Evitar associação. Interações cujo o risco

supera o benefício, clinicamente relevante e de gravidade major (Hansten & Horn,

2013; Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: Os doentes devem ser alertados para o consumo de bebidas alcoólicas

durante a terapêutica e para a sua interrupção abrupta em situações de ingestão

crónica, pois estes podem constituir um factor de risco na ocorrência de convulsões,

sendo que o seu consumo deve ser minimizado e/ou evitado (Baxter, 2010; Truven

Health Analytics, 2014).

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

40

2.2.3. Interação entre Dissulfiram e Álcool

Tabela 5 - Dissulfiram e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão

Fontes de informação

Dissulfiram Interação Classe 1 Minimizar Stockley's

Farmacocinética Contra- e/ou evitar Micromedex

indicada consumo Hansten&Horn

álcool

Pertencente ao grupo dos fármacos que atuam no SNC para o tratamento da

dependência de drogas, o fármaco Dissulfiram é comummente utilizado no

tratamento da dependência alcoólica, proporcionando alguns efeitos adversos que

causam um acentuado mal estar, encorajando os doentes a deixar de beber por

intolerância ao etanol (Baxter, 2010)

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas:

Este medicamento atua por inibição irreversível de umas das principais

enzimas responsáveis pela metabolização do álcool, a aldeído desidrogenase. Assim,

assiste-se a uma diminuição da biotransformação do acetaldeído, provocando um

aumento da sua concentração no organismo e originando sintomas como fraqueza,

náuseas, vómitos, rubor facial (flushing), cefaleias, taquicardia, hipotensão, colapso

cardiovascular, sudorese, dificuldade respiratória, convulsões, confusão e vertigens

(Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Apesar de se tratar de uma interação farmacocinética, por inibição enzimática,

um estudo revela que após a administração de acetaldeído por via endovenosa este

não demonstrou provocar efeitos adversos acentuados como aqueles que resultam da

interação entre o dissulfiram e o álcool, o que sugere que possam estar envolvidos

outros mecanismos fisiológicos para além da acumulação de acetaldeído no

organismo (Baxter, 2010).

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2. Desenvolvimento

41

A quantidade de álcool ingerida, a quantidade de dissulfiram administrada, a

utilização concomitante de outros medicamentos que possam afectar o mecanismo da

reação, a existência de insuficiência cardíaca e/ou pulmonar e a atividade e

sensibilidade da aldeído desidrogenase são alguns dos factores que podem influenciar

a expressão e a gravidade da interação entre o álcool e o dissulfiram (Baxter, 2010;

Truven Health Analytics, 2014).

Esta interação é mais pronunciada nos indivíduos que ingerem álcool do que

naqueles que inalam ou que aplicam topicamente preparações farmacêuticas que

contêm álcool na sua composição, sendo que os sintomas aparecem, habitualmente,

30 minutos após a ingestão ou contacto com substâncias que contenham 3% ou mais

em etanol na sua composição (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Evidências clínicas:

Foram descritas reações leves à utilização de duas formas farmacêuticas

distintas, gotas auriculares para tratamento de um tímpano furado e utilização de um

gel de alcatrão para o tratamento da acne, sendo que o primeiro individuo se

encontrava a fazer o tratamento com dissulfiram e o segundo apenas iniciou o

tratamento com a mesma substância ativa após 6 dias de ter começado a aplicar o gel.

A ocorrência de reações adversas como náuseas, dores de cabeça e rash cutâneo

sugerem que ambas as formulações continham álcool na sua composição (Baxter,

2010).

Diversos estudos realizados relataram palpitações com quebras sucessivas e

acentuadas na pressão arterial de indivíduos que ingeriram bebidas alcoólicas durante

a terapêutica com dissulfiram e após esta ter sido descontinuada (Baxter, 2010).

Gestão:

Na prática da atividade farmacêutica, é importante que os profissionais de

saúde, no momento da dispensa, encorajem os doentes a deixar de beber e os alertem

os para os perigos que correm devido à toma conjunta destas duas substâncias, uma

vez que esta interação pode ocorrer passados 14 dias da administração do fármaco ter

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

42

sido descontinuada e em casos em que tenha sido consumido álcool à menos de 12

horas (Truven Health Analytics, 2014).

A administração simultânea de ambas as substâncias está totalmente

contraindicada e a terapêutica com dissulfiram tem de ser monitorizada e realizada

sob supervisão de um médico, devido ao risco de reações adversas graves que podem

comprometer a vida do doente (Truven Health Analytics, 2014)

Por outro lado, existem uma série de produtos de consumo diário para os quais

os doentes têm que estar atentos, pois devido à sua composição em álcool podem

despoletar esta interação. Devem deste modo ser evitados e/ou utilizados com

precaução. Esses produtos englobam medicamentos (medicamentos utilizados para o

tratamento da tosse e cremes para o tratamento da ACNE), cosméticos (after-shave,

tónicos, perfumes, sprays, líquido das lentes de contacto) e comida (vinagre, molhos)

(Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

A gestão da interação e intervenção terapêutica passam por melhorar o bem

estar do doente, podendo destacar-se, segundo os compêndios, dois modos de atuação.

O primeiro consiste na administração de ácido ascórbico por via oral para reações

ligeiras entre as duas substâncias e por via endovenosa para reações mais acentuadas,

devido a uma maior rapidez de ação (Baxter, 2010). A segunda alternativa terapêutica

consiste na administração de uma substância denominada de 4-metilpirazol, que numa

dose de 7mg/kg de peso corporal impede a acumulação de acetaldeído no organismo

por inibição da enzima ADH (Truven Health Analytics, 2014).

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2. Desenvolvimento

43

2.2.4. Interação entre Acitretina e Álcool

Tabela 6 - Acitretina e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Acitretina Interação Classe 1 Evitar Stockley's

Farmacocinética Major associação Micromedex

Hansten&Horn

A Acitretina é um retinóide oral que pertencente ao grupo dos medicamentos

queratolíticos e antipsoriáticos de ação sistémica, que se caracteriza pelos seus efeitos

teratogénicos.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: O álcool quando associado à ingestão

com a Acitretina (t1/2: 48horas) tem a capacidade de promover a sua transesterificação

convertendo-a em Etretinato. Este é um composto teratogénico de elevado tempo de

semi-vida (120 horas) que se acumula e permanece no organismo durante anos. Desta

forma o álcool aumenta e perpetua os efeitos teratogénicos do ativo (Baxter, 2010;

Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). Um estudo realizado sugeriu

ainda que a magnitude da interação se encontra diretamente relacionada com a

quantidade de álcool ingerida (Baxter, 2010).

Relevância Clínica/ Gravidade: Classe 1 – Evitar associação, uma vez que o risco

supera o benefício. A administração conjunta destas duas substâncias pode resultar

numa interação farmacológica de gravidade major, sendo totalmente contraindicada

em mulheres grávidas, mulheres em idade fértil e que pretendam engravidar (Baxter,

2010; Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: Cabe aos profissionais de saúde o dever de informar e alertar os doentes,

especialmente do sexo feminino para o risco de efeitos teratogénicos, de modo a que

se possa tomar as devidas precauções e adoptar métodos contraceptivos seguros até

dois anos após a terapêutica com acitretina ter sido descontinuada. Os pacientes

devem ser alertados para deixar de beber bebidas alcoólicas e consumir substâncias

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

44

que contenham álcool na sua composição, como alimentos e medicamentos durante o

tratamento com o retinóide (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health

Analytics, 2014).

2.2.5. Interação entre Antidepressivos Tricíclicos e Álcool

Tabela 7 - Antidepressivos Tricíclicos (ADT) e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

ADT Interação Classe 3 Evitar Stockley's

Amitriptilina Farmacocinética Moderada consumo Micromedex

Clomipramina e álcool; Hansten&Horn

Imipramina Farmacodinâmica Monitorizar;

Mirtazapina Ajuste de

Nortriptilina dose;

Considerar

alternativas

A Amitriptilina, Clomipramina, Imipramina, Mirtazapina e

Nortriptilina são psicofármacos pertencentes ao grupo dos antidepressores e sub-

grupo dos tricíclicos e afins, utilizados na terapêutica da depressão major e em

situações de perturbação depressiva persistente (distimia).

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: As interações que se estabelecem entre

os antidepressores tricíclicos e o álcool podem ser farmacodinâmicas e/ou

farmacocinéticas. A interação farmacodinâmica estabelece-se quando a associação do

álcool e do fármaco provocam um aumento da depressão do SNC, conduzindo a um

aumento da sedação e comprometimento das funções motoras coordenadas pelas

funções psíquicas. Este acréscimo de sonolência, pode ser explicado pelo bloqueio

dos receptores H1 por parte do antidepressivo em sinergismo com os efeitos

depressores do etanol a nível do SNC. Por outro lado, as interações farmacocinéticas

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2. Desenvolvimento

45

encontram-se relacionadas com as alterações que ocorrem no metabolismo dos

antidepressivos tricíclicos devido à administração simultânea de álcool (Truven

Health Analytics, 2014). Assim para uma ingestão aguda de álcool, assiste-se a uma

diminuição do efeito de primeira passagem por inibição da atividade enzimática,

enquanto que para um consumo excessivo e contínuo de álcool se assiste à indução

das enzimas do sistema microssomal hepático, com aumento da biotransformação dos

fármacos (Hansten & Horn, 2013). Por último, o bloqueio dos receptores

muscarínicos por parte dos antidepressores triciclicos, produz efeitos anticolinérgicos,

nomeadamente na diminuição da motilidade gastrointestinal, que faz com que haja

uma menor absorção de álcool para a corrente sanguínea (Hansten & Horn, 2013).

Podem ser observados sintomas como sedação, comprometimento da atividade

psicomotora, alterações de comportamento e ocorrência de depressão respiratória.

Evidências: Publicações acerca das as interações farmacocinéticas que se

estabelecem entre a amitriptilina e o álcool revelaram que, após a sua toma em

simultâneo, o etanol provocou um aumento da concentração plasmática do

antidepressivo em 44%, e noutro estudo após uma hora e meia de ter sido

administrado o logaritmo da concentração de amitriptilina no sangue aumentou cerca

de 200% (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). A imipramina e a

amitriptilina mostraram ser os fármacos que mais reagem com o álcool, causando

interações farmacocinéticas por alteração do metabolismo (Truven Health Analytics,

2014). Um estudo irlandês relatou que 67% dos doentes que consumiram álcool e

amitriptilina em doses baixas foram vitimas de morte por intoxicação (Baxter, 2010).

O efeito depressor do SNC não é o mesmo para todos os fármacos desta classe

terapêutica, assim o fármaco com efeito sedativo mais marcado é a amitriptilina,

seguido da imipramina, sendo que os que menos interferem a nível do SNC,

provocando menos efeitos e menos sonolência são a nortriptilina e a clomipramina

(Baxter, 2010). O comprometimento psicomotor e os efeitos sedativos provocados

pela aministração de mirtazapina em monoterapia, mostraram ser agravados pela

ingestão concomitante de álcool (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ gravidade: Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar o

risco. Ao administrar fármacos desta classe terapêutica com álcool, podem ocorrer

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

46

interações de gravidade moderada, que em algumas situações se traduzem em perigo

de vida (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). Interações bem

estabelecidas e clinicamente relevantes.

Gestão: Os doentes a cumprir terapêutica com antidepressivos tricíclicos devem ser

encorajados a diminuir o seu consumo de álcool, pois as manifestações e as interações

farmacológicas que se estabelecem são mais marcadas nas primeiras semanas de

tratamento com a substância ativa e tendem a diminuir com o tempo (Baxter, 2010;

Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). Os pacientes devem também

ser alertados para o perigo de condução de veículos e uso de maquinas, devido ao

aumento de sonolência e comprometimento psicomotor (Truven Health Analytics,

2014). A monitorização das concentrações plasmáticas do fármaco e o seu eventual

ajuste em algumas situações são fundamentais para se obter a dose terapêutica e a

ação farmacológica pretendidas (Hansten & Horn, 2013). A monitorização com ajuste

de dose é habitualmente realizada em situações de alcoolismo ou de abstinência

alcoólica, de forma a que se consiga obter o efeito terapêutico desejado (Baxter, 2010;

Hansten & Horn, 2013). Outros fármacos do mesmo grupo terapêutico, como por

exemplo a Clomipramina e a Nortriptilina podem ser administrados em alternativa à

Amitriptilina, pois ao interagirem menos com o álcool, provocam uma menor

depressão do SNC e uma menor ocorrência de efeitos indesejáveis (Baxter, 2010).

2.2.6. Interação entre ISRS e Álcool

Tabela 8 - Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS) e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

ISRS Desconhecido Moderada Evitar Stockley's

Citalopram consumo Micromedex

Escitalopram álcool;

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2. Desenvolvimento

47

O Citalopram e o Escitalopram são fármacos antidepressores tricíclicos,

inibidores selectivos da recaptação de serotonina (ISRS), utilizados no tratamento da

depressão, perturbação do pânico e ansiedade generalizada.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: O mecanismo de interação entre os

inibidores seletivos da recaptação de serotonina e o álcool é desconhecido (Truven

Health Analytics, 2014); por outro lado, segundo Baxter (2010) não foram observadas

interações farmacodinâmicas e farmacocinéticas entre os fármacos referidos. Quer o

citalopram, quer o escitalopram não mostraram, quando administrados com o álcool,

influenciar e comprometer a atividade cognitiva e motora (Truven Health Analytics,

2014).

Relevância clínica/ Gravidade: Interações de gravidade moderada (Truven Health

Analytics, 2014).

Gestão: Embora não tenham sido demonstradas evidências de interação entre os ISRS

e o álcool, os autores referem que o seu consumo durante o tratamento com o

antidepressor não é recomendado (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

2.2.7. Interação entre Analgésicos estupefacientes e Álcool

Tabela 9 - Analgésicos Opióides e Álcool

Álcool

Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Analgésicos Interação Major Evitar Stockley's

Opióides Farmacodinâmica consumo Micromedex

Burprenorfina álcool;

Hidromorfona Ajuste de

dose;

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

48

A Buprenorfina e a Hidromorfona são analgésicos opióides utilizados no

tratamento da dor intensa e moderada a grave (traumática, oncológica e da cólica

renal), embora a buprenorfina também esteja indicada tratamento da dependência de

drogas.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A associação dos analgésicos opióides

com o álcool resulta numa interação farmacodinâmica que se manifesta pelos efeitos

aditivos das duas substâncias ao nível da depressão do SNC e pelo aumento do risco e

da intensidade de efeitos adversos graves, como depressão respiratória, hipotensão e

sedação (Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ gravidade: As interações entre a buprenorfina e o álcool e a

hidromorofona e o álcool, encontram-se bem estabelecidas, são clinicamente

relevantes e de gravidade major. Em algumas casos, quando a administração de

hidromorfona é concomitante à ingestão de álcool pode conduzir a colapso

respiratório, coma ou morte (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: A ingestão de álcool durante o tratamento com analgésicos estupefacientes é

contra-indicada. Assim, os doentes que se encontrem a fazer tratamento com

buprenorfina e hidromorfona devem evitar o consumo de álcool e ser alertados para o

perigo da sua associação, uma vez que se tratam de fármacos muito potentes e com

efeitos marcados no SNC (Truven Health Analytics, 2014). Devido ao aumento da

sonolência e da depressão do SNC provocada pela co-administração das duas

substâncias, os doentes devem evitar conduzir ou utilizar máquinas (Baxter, 2010).

Podem ser necessários ajustes de dose, de uma ou de ambas as substâncias, em

situações em que o consumo de álcool não consiga ser evitado (Truven Health

Analytics, 2014).

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2. Desenvolvimento

49

2.2.8. Interação entre Paracetamol e Álcool

Tabela 10 - Paracetamol e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Paracetamol Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacocinética Major consumo Micromedex

álcool; Hansten&Horn

Monitorizar;

Considerar

terapêutica

com

acetilcisteína

O Paracetamol ou Acetaminofeno é um fármaco comummente utilizado com

atividade analgésica e antipirética que atua a nível do SNC.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: O paracetamol é essencialmente

metabolizado a nível do fígado por conjugação com sulfato ou glucoronídeo, sendo

uma pequena percentagem (cerca de 5%) oxidada pelas enzimas do sistema do

citocromo P450 (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). Porém, quando

administrado concomitantemente com álcool, este último vai influenciar a sua

biotransformação, dando origem a uma interação farmacocinética. Para um consumo

crónico de etanol, assiste-se a um aumento da metabolização do paracetamol por

indução enzimática do sistema microssomal hepático (CYP2E1), com formação e

acumulação de um metabolito hepatotóxico, o N-acetil-p-benzoquinona-imina

(NAPQI) (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). Por outro lado,

para um ingestão aguda de álcool assiste-se a uma inibição do sistema enzimático,

facto que confere proteção contra a toxicidade causada pelo consumo excessivo de

paracetamol (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014).

O paracetamol quando tomado em doses terapêuticas por indivíduos não alcoólicos,

após sofrer metabolização é neutralizado pelo glutatião (GSH), produzindo um

composto atóxico para o organismo que é excretado por via renal (Truven Health

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

50

Analytics, 2014). Em casos de alcoolismo, a indução enzimática do CYP2E1 aliada à

depleção do glutatião devido ao desiquilibrio nutricional, conduzem a um aumento do

risco de hepatoxicidade por aumento da concentração de NAPQI que se liga

covalentemente aos hepatócitos provocando a sua necrose (Baxter, 2010; Hansten &

Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). A interação apesar de bem

documentada, apresenta um mecanismo de ação ambíguo, facto que leva os autores

sugerirem que são necessários mais estudos para avaliar e comprovar a toxicidade do

paracetamol quando ingeridas quantidades significativas de álcool (Truven Health

Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: A classificação da presente interação não apresenta

consenso entre os dois compêndios. Por um lado revela gravidade major devido ao

risco aumentado de hepatoxicidade (Truven Health Analytics, 2014), por outro é lhe

atribuída Classe 3 – avaliar e tomar medidas para minimizar o risco (Hansten & Horn,

2013). Trata-se de uma interação clinicamente importante, uma vez que o paracetamol

é dos analgésicos e antipiréticos mais utilizado no ambulatório.

Gestão: O paracetamol quando tomado em doses terapêuticas, inferior a 4 gramas de

substância ativa por dia, é bastante bem tolerado, sendo praticamente atóxico (Baxter,

2010). A dose diária máxima de fármaco não deve ser excedida salvo indicação e

vigilância médica. É imperatório advertir os doentes para os efeitos prejudiciais e

irreversíveis que decorrem do consumo excessivo de álcool durante o tratamento com

acetaminofeno, reforçando sempre a sua contra-indicação em doentes alcoólicos e que

padeçam de insuficiência hepática (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics,

2014). Em doses elevadas, tanto o álcool como o paracetamol provocam toxicidade a

nível do fígado que em sinergismo, podem conduzir a necrose dos tecidos e falência

orgânica. Outro parâmetro importante a ter em conta na gestão da interação prende-se

com a monitorização das concentrações plasmáticas de acetaminofeno após

sobredosagem deste em indivíduos alcoólicos, sendo recomendado o tratamento com

acetilcisteína que funciona como antídoto (Hansten & Horn, 2013; Truven Health

Analytics, 2014).

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2. Desenvolvimento

51

2.2.9. Interação entre Ácido Acetilsalicílico e Álcool

Tabela 11 - Ácido Acetilsalicílico e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

AAS Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacocinética Moderada consumo Micromedex

álcool; Hansten&Horn

Monitorizar;

Considerar

alternativas

O Ácido Acetilsalicílico (AAS) consoante a sua dosagem, pertence a grupos

farmacológicos distintos com ações também distintas ao nível do organismo. Assim,

em doses baixas (100 a 300 mg/dia) o fármaco pertence ao grupo dos anti-agregantes

plaquetários, atuando ao nível do sangue como profilaxia do tromboembolismo

arterial, ao passo que em doses mais elevadas (500 a 1000 mg/dia), pertence ao grupo

dos fármacos que atuam no SNC com atividade analgésica e antipirética.

Mecanismo de Ação/ Manifestações clínicas: O álcool, ao ser um composto nefasto

para o organismo, quando ingerido em simultâneo ou após a administração de AAS,

vai exacerbar os efeitos deste último ao nível do estômago, provocando um

prolongamento do tempo de hemorragia e um aumento da irritação e erosão da

mucosa gástrica acompanhada de ulceração (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013;

Truven Health Analytics, 2014). Segundo um estudo, a ingestão de etanol anterior à

administração de AAS não demonstrou influenciar e/ou potenciar os efeitos

indesejáveis deste a nível gástrico (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics,

2014). O AAS ao inibir da ADH gástrica, promove uma diminuição da metabolização

do álcool e consequentemente uma maior absorção deste para a corrente sanguínea

(Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar

o risco. Trata-se de uma interação de gravidade moderada, bem estabelecida e

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

52

clinicamente relevante devido à extensa utilização do AAS no ambulatório (Baxter,

2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). A magnitude da

interação é tanto maior quanto maior for quantidade de AAS administrada juntamente

com álcool, devido ao sinergismo de efeitos que se estabelece entre as duas

substâncias (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: Na gestão da interação devem ser consideradas alternativas à forma

farmacêutica convencional do AAS que produzam uma menor agressão da mucosa

gástrica e menor incidência de efeitos adversos quando tomadas conjuntamente com

álcool; são exemplos: os comprimidos efervescentes, os comprimidos revestidos por

película e os salicilatos não-acetilados (Truven Health Analytics, 2014). A

administração concomitante de AAS e álcool é desaconselhada em indivíduos que

sofram de patologias do estômago, como por exemplo úlcera péptica, hemorragia

ativa e recorrente, perfuração gastrointestinal e diátese hemorrágica (Truven Health

Analytics, 2014). Embora a sua associação não seja contraindicada, devem ser

tomadas as devidas precauções: minimizando o seu consumo, espaçando tomas entre

os dois ativos cerca 8 a 12 horas e monitorizando a ocorrência de possíveis

hemorragias (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014).

2.2.10. Interação entre Metronidazol e Álcool

Tabela 12 - Metronidazol e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Metronidazol Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacocinética Contra- consumo Micromedex

indicada álcool; Hansten&Horn

Monitorizar

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2. Desenvolvimento

53

O Metronidazol é um antibiótico bastante utilizado em ambulatório para

tratar infeções específicas do foro ginecológico, abdominal e urinário causadas por

bactérias anaeróbias.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A interação que decorre da associação

entre o álcool e o metronidazol pode resultar numa reação do tipo dissulfiram,

mimetizando a que ocorre pela co-administração de dissulfiram e etanol (Truven

Health Analytics, 2014). As manifestações clínicas caracterizam-se por náuseas,

vómitos, rubor facial, cólicas, dores de cabeça, tendo sido reportado um caso de morte

súbita devido à associação destes ativos (Truven Health Analytics, 2014). Apesar de

controverso, pensa-se que o mecanismo da presente interação possa estar relacionado

com a inibição, por parte do metronidazol, da enzima aldeído desidrogenase,

resultando num aumento dos níveis de acetaldeído no organismo (Hansten & Horn,

2013; Truven Health Analytics, 2014). Outras publicações, sugerem que possam estar

implicados outros mecanismos de interação, devido a não terem sido observadas

reações do tipo dissulfiram e variações na concentração de acetaldeído nos casos

estudados (Baxter, 2010). A ingestão de álcool associada à administração de

metronidazol por via intravaginal (óvulos) e por via endovenosa, também demonstrou

provocar reações do tipo dissulfiram (Baxter, 2010). Em termos de gravidade, a

administração por via intravaginal mostrou desencadear reações mais leves, devido a

uma menor absorção do ativo; ao passo que por via endovenosa, todo o fármaco

administrado tem 100% de biodisponibilidade, o que se traduz em reações mais

acentuadas (Baxter, 2010).

Relevância clínica/ Gravidade: A classificação segundo os compêndios não é

consensual. Por um lado a associação entre o álcool e o metronidazol é contra-

indicada (Truven Health Analytics, 2014), por outro é lhe atribuída uma classificação

de Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar o risco (Hansten & Horn,

2013). Apesar de controversa, trata-se de uma interação bem documentada,

clinicamente relevante e potencialmente grave (Baxter, 2010).

Gestão: A ingestão de álcool durante a terapêutica com metronidazol é contra-

indicada devido aos efeitos adversos graves decorrentes da sua associação (Truven

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

54

Health Analytics, 2014). É da responsabilidade dos profissionais de saúde encorajar

os doentes a diminuir o consumo de álcool ou de qualquer medicamento que contenha

etanol ou propilenoglicol na sua composição (Hansten & Horn, 2013; Truven Health

Analytics, 2014). A advertência dos doentes para os efeitos adversos e a

monitorização destes são dois factores de extrema importância na gestão da interação

(Hansten & Horn, 2013). Dependendo da forma farmacêutica administrada e das

diretivas do fabricante, a ingestão de álcool só se encontra indicada 24 a 72 horas

após ter sido descontinuada a terapêutica com metronidazol (Baxter, 2010; Truven

Health Analytics, 2014).

Para além do Metronidazol, o Tinidazol, outro derivado 5-nitroimidazólico, também

interage com o álcool desencadeando um perfil de reações adversas idêntico e

característico de uma reação tipo dissulfiram (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013).

2.2.11. Interação entre Eritromicina e Álcool

Tabela 13 - Eritromicina e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Eritromicina Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacocinética consumo Hansten&Horn

álcool;

A Eritromicina é um antibiótico pertencente ao grupo dos macrólidos com

efeito bactericida em concentrações elevadas para um largo espectro de ação.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: O álcool quando tomado juntamente

com a eritromicina retarda o esvaziamento gástrico, conduzindo a uma diminuição da

absorção do antibiótico com possível diminuição da eficácia terapêutica (Baxter,

2010). De outro modo, estudos revelam que os níveis de álcool no sangue podem

aparecer aumentados cerca de 40% pela administração intravenosa de eritromicina

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2. Desenvolvimento

55

(Baxter, 2010). O antibiótico ao acelerar o esvaziamento gástrico conduz a um

aumento da absorção do etanol, por diminuição da sua metabolização ao nível da

mucosa gástrica (Baxter, 2010). Por outro lado, estudos demonstraram não ocorrer

qualquer interação entre a eritromicina e o álcool quando administrados em conjunto,

sendo que as diferenças entre eles se podem dever à quantidade de antibiótico

administrada e à sua via de administração (Hansten & Horn, 2013). Não são

conhecidas alterações significativas causadas pelo aumento dos níveis de álcool no

sangue aquando a administração de eritromicina (Baxter, 2010; Hansten & Horn,

2013).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar

o risco. Interação cuja relevância clínica é desconhecida (Baxter, 2010; Hansten &

Horn, 2013).

Gestão: Durante a terapêutica com eritromicina, os pacientes devem ser alertados

para limitar o seu consumo de álcool, de forma a evitar os efeitos indesejáveis

provocados pelo aumento dos níveis de etanol no sangue (Hansten & Horn, 2013).

2.2.12. Interação entre Metoclopramida e Álcool

Tabela 14 - Metoclopramida e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Metoclopramida Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacodinâmica Moderada consumo Micromedex

e álcool; Hansten&Horn

Farmacocinética Monitorizar

A Metoclopramida é um fármaco antiemético utilizado no tratamento e

prevenção de náuseas e vómitos, bem como na preparação de exames de diagnóstico

do aparelho digestivo.

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

56

Mecanismo de Ação/ Manifestações clínicas: A administração de metoclopramida

associada à ingestão de álcool resulta numa interação farmacodinâmica provocada

pelo sinergismo de efeitos sedativos, visto que o etanol intensifica a sedação

provocada pela metoclopramida (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health

Analytics, 2014). Devido à ao seu efeito procinético, a metoclopramida ao modificar a

motilidade favorecendo o esvaziamento gástrico, faz com que seja absorvida uma

maior quantidade de álcool ao nível do estômago (Baxter, 2010; Truven Health

Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: A gravidade da interação pode ser classificada como

moderada (Truven Health Analytics, 2014) e de Classe 3 – Avaliar e tomar medidas

para minimizar o risco. A relevância clinica das manifestações decorrentes desta

interação não se encontra bem estabelecida (Hansten & Horn, 2013).

Gestão: Minimizar o consumo de álcool aquando a terapêutica com metoclopramida;

monitorizar a depressão do SNC causada pela associação dos fármacos, sendo

recomendada precaução na condução de veículos e uso de máquinas devido a um

aumento da sonolência e diminuição da capacidade de reação (Baxter, 2010; Hansten

& Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014).

2.2.13. Interação entre Varfarina e Álcool

Tabela 15 - Varfarina e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão

Fontes de informação

Varfarina Não Classe 3 Minimizar Micromedex

estabelecido Moderada consumo Hansten&Horn

álcool;

Monitorizar

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2. Desenvolvimento

57

A Varfarina é um anticoagulante oral comummente utilizado no ambulatório

na profilaxia e tratamento de doenças tromboembólicas. A sua administração deve ser

muito bem controlada devido ao perigo de hemorragias.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: O mecanismo de ação da interação

entre a varfarina e o álcool não se encontra bem estabelecido. Pensa-se que possa

estar relacionado tipo de ingestão de etanol, potenciando ou diminuindo a ação

anticoagulante por alteração do seu metabolismo (Hansten & Horn, 2013; Truven

Health Analytics, 2014). A alteração do metabolismo da varfarina vai conduzir a

alterações no tempo de protrombina e nos valores de INR (índice internacional

normalizado) (Truven Health Analytics, 2014). Assim para um consumo esporádico

de etanol em indivíduos sãos, este não mostrou afectar o metabolismo da varfarina

nem o seu efeito anticoagulante (Truven Health Analytics, 2014). Por outro lado,

aquando ingestão crónica e simultânea de álcool com o anticoagulante pode assistir-se

a uma indução das enzimas do sistema microssomal hepático, com aumento do

metabolismo e diminuição do efeito anticoagulante (Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar

o risco. Embora não esteja bem estabelecida, trata-se de uma interação de gravidade

moderada e clinicamente importante, uma vez que a varfarina é um fármaco bastante

dispensado em ambulatório e que requer algumas precauções (Hansten & Horn, 2013;

Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: Todos os doentes que se encontrem a cumprir tratamento com varfarina,

devem minimizar seu consumo de bebidas alcoólicas, só estando aconselhadas no

máximo 2 a 3 bebidas/dia, de modo a evitar alterações no efeito anticoagulante

(Hansten & Horn, 2013). No caso de pacientes que ingiram grandes quantidades de

álcool (mais de 3 bebidas por dia) a resposta hipoprotrombinémica deve ser

monitorizado devido ao risco de alteração do efeito anticoagulante (Hansten & Horn,

2013; Truven Health Analytics, 2014).

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

58

2.2.14. Interação entre Nitroglicerina e Álcool

Tabela 16 - Nitroglicerina e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Nitroglicerina Interação Classe 3 Evitar Stockley's

Farmacodinâmica Moderada consumo Micromedex

álcool; Hansten&Horn

Monitorizar

A Nitroglicerina ou Trinitrato de glicerina é um fármaco anti-anginoso com

ação vasodilatadora direta, comummente prescrito para o tratamento adjuvante da

angina de peito comercializado sob a forma de sistema transdérmico e comprimidos

sublinguais para a terapêutica de crises agudas.

Mecanismo de Ação/ Manifestações clínicas: A co-administração de nitroglicerina e

álcool pode resultar num aumento do risco de hipotensão, associado ao efeito

vasodilatador de ambas as substâncias, e na manifestação de sintomas como tonturas e

fraqueza (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 3 - Avaliar e tomar medidas para minimizar o

risco (Hansten & Horn, 2013). A interação que se estabelece entre a nitroglicerina e o

álcool é de gravidade moderada e clinicamente importante (Truven Health Analytics,

2014).

Gestão: Atuando de forma a minimizar o risco, os doentes devem limitar o seu

consumo de álcool e evitar a sua ingestão durante a terapêutica com nitroglicerina.

Sinais e sintomas de hipotensão causados pela administração concomitante das duas

substâncias, quer sejam em doentes a cumprir terapêutica aguda, quer sejam em

doentes a cumprir terapêutica crónica devem ser monitorizados (Hansten & Horn,

2013).

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2. Desenvolvimento

59

2.2.15. Interação entre Tadalafil e Álcool

Tabela 17 - Tadalafil e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Tadalafil Interação Moderada Minimizar Stockley's

Farmacodinâmica consumo Micromedex

álcool;

O Tadalafil é um medicamento inibidor da fosfodiasterase tipo 5 utilizado no

tratamento da disfunção eréctil, embora seja necessária estimulação sexual para que

este seja eficaz.

Mecanismo de Ação/ Manifestações clínicas: Os inibidores da fosfodiasterase tipo

5, intensificam e prolongam os efeitos do óxido nítrico libertado pelo endotélio do

pénis, aumentando a semi-vida da guanosina monofosfato cíclico (GMPc), facto que

favorece o relaxamento e a vasodilatação dos vasos sanguíneos dos corpos cavernosos

e conduz à ereção. Pensa-se que o mecanismo de ação possa estar relacionado com o

risco de, quando associados, potenciarem a vasodilatação periférica e provocarem

hipotensão postural e tonturas (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). Por

outro lado, estudos revelaram que a ingestão de álcool simultânea à administração de

tadalafil não mostrou provocar alterações na pressão arterial e na função cognitiva,

bem como na ocorrência de hipotensão ortostática (Baxter, 2010). Apesar de

controversa, os autores sugerem que se possa tratar de uma interação dose-dependente

em relação à quantidade de álcool ingerida, não sendo afectada a farmacocinética do

tadalafil (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: Interação clinicamente importante, gravidade

moderada (Truven Health Analytics, 2014), embora não apresente consenso entre os

dois compêndios.

Gestão: Os pacientes que se encontram a tomar tadalafil devem ser alertados para os

perigos que decorrem da associação deste com o álcool, nomeadamente risco de

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

60

hipotensão postural, que se traduz numa quebra súbita e acentuada da pressão arterial

ao levantar. O consumo de álcool por parte dos doentes deve ser limitado e sempre

que possível diminuído (Truven Health Analytics, 2014).

2.2.16. Interação entre Verapamilo e Álcool

Tabela 18 - Verapamilo e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Verapamilo Não Classe 2 Minimizar Stockley's

estabelecido Moderada e evitar Micromedex

consumo Hansten&Horn

álcool

O Verapamilo é um fármaco antiarrítmico, bloqueador da entrada do cálcio,

utilizado no tratamento da hipertensão arterial, angina de peito e situações de

alteração do ritmo cardíaco.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: Embora não se encontre bem

estabelecido, pensa-se que a administração de verapamilo concomitantemente com a

ingestão de álcool possa provocar um aumento da concentração plasmática de etanol,

exacerbando e prolongando os efeitos tóxicos deste ao nível do organismo com

comprometimento psicomotor (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health

Analytics, 2014). Este facto pode dever-se a uma inibição do metabolismo do álcool

por parte do verapamilo, conduzindo a diminuição da eliminação do etanol (Baxter,

2010; Truven Health Analytics, 2014).

Evidências: Um estudo demonstrou que quando administrados concomitantemente,

se assistiu a um aumento de 17% da concentração plasmática do etanol e um aumento

de 30% da sua área sob curva (AUC) (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

Por outro lado, outros estudos demonstraram não existir correlação entre a

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2. Desenvolvimento

61

administração de verapamil e a ingestão de álcool, relatando não se terem sido

observadas alterações psicomotoras, manifestações clinicamente relevantes e

alterações a nível da toxicidade e concentração sanguínea etanol (Baxter, 2010).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 2 – Evitar associação a menos que o

benefício ultrapasse o risco (Hansten & Horn, 2013). Trata-se de uma interação de

gravidade moderada e clinicamente relevante, ainda que não se encontre bem

estabelecida (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: Os doentes que se encontram a realizar terapêutica crónica com verapamil

devem estar atentos para os efeitos tóxicos do etanol provocados pela sua

administração concomitantemente. Deste modo devem ser aconselhados a minimizar

e a limitar o consumo de álcool (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics,

2014).

2.2.17. Interação entre Isotretinoína e Álcool

Tabela 19 - Isotretinoína e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão

Fontes de informação

Isotretinoína Não Major Minimizar Stockley's

estabelecido consumo Micromedex

álcool

A Isotretinoína é um fármaco retinóide de ação sistémica comummente

utilizado no tratamento de formas graves de acne.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: O mecanismo de ação descrito

encontra-se discrepante entre ambos os compêndios. Por um lado, pensa-se que possa

ocorrer uma reação do tipo dissulfiram, por inibição da aldeído desidrogenase, com

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

62

aumento das concentrações de acetaldeído no organismo (Truven Health Analytics,

2014). Por outro, pensa-se que a ingestão de álcool possa ser responsável pela indução

enzimática do sistema microssomal hepático, conduzindo a um aumento do

metabolismo da isotretinoína e diminuição da sua eficácia (Baxter, 2010)

Relevância clínica/ Gravidade: Major (Truven Health Analytics, 2014). São

necessários mais estudos para avaliar a importância clinica e o mecanismo de ação da

presente interação, uma vez que esta não se encontra bem estabelecida (Baxter, 2010;

Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: A ingestão de etanol durante a terapêutica com isotretinoína é contra-

indicada. Uma vez que é comum este tipo de medicação ser tomada por adolescentes,

os profissionais de saúde devem alertar para os perigos decorrentes da sua associação,

aconselhando os jovens a diminuir e a limitar o seu consumo de álcool (Truven

Health Analytics, 2014).

2.2.18. Interação entre Ranitidina e Álcool

Tabela 20 - Ranitidina e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Ranitidina Interação Moderada Minimizar Stockley's

farmacocinética consumo Micromedex

álcool

A Ranitidina é um fármaco antagonista dos receptores H2 da histamina,

modificador da secreção gástrica, empregue no tratamento de úlcera gástrica e

duodenal, esofagite de refluxo e síndrome de Zollinger-Ellison.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A ranitidina quando associada à

ingestão de álcool vai inibir a atividade da enzima álcool desidrogenase responsável

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2. Desenvolvimento

63

pelo metabolismo do etanol, provocando um aumento da sua concentração sanguínea

e da sua biodisponibilidade (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). Estudos

demonstraram um aumento da concentração máxima de etanol e da sua área sob a

curva quando co-administrada ranitidina por via oral (Baxter, 2010; Truven Health

Analytics, 2014). Vários autores sugerem que este facto possa estar relacionado com

um aumento da taxa de esvaziamento gástrico, diminuindo o efeito de primeira

passagem por diminuição do tempo de exposição do álcool à enzima ADH (Baxter,

2010; Truven Health Analytics, 2014). Por outro lado, após a administração de álcool

por via intravenosa, a sua concentração bem como os seus parâmetros

farmacocinéticos não mostraram ser afetados pela toma concomitante de ranitidina

por via oral (Truven Health Analytics, 2014). A maioria dos estudos não referenciou

alterações psicomotoras significativas resultantes do aumento da concentração de

álcool no sangue, embora esteja documentado que possam ocorrer (Baxter, 2010).

Episódios de hipoglicemia foram relatados após a administração concomitante de

álcool e ranitidina, pois pensa-se que este ultimo possa influenciar o metabolismo da

glucose (Baxter, 2010).

Relevância clínica/ Gravidade: Interação de gravidade moderada, controversa e cuja

relevância clínica não se encontra bem definida (Baxter, 2010; Truven Health

Analytics, 2014).

Gestão: A ingestão de álcool durante a terapêutica com ranitidina pode provocar um

aumento da concentração de etanol no organismo com agravamento da patologia

gastrointestinal, devendo por isso ser minimizada (Truven Health Analytics, 2014)

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

64

2.2.19. Interação entre Isoniazida e Álcool

Tabela 21 - Isoniazida e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Isoniazida Interação Classe 3 Evitar Stockley's

Farmacocinética Major consumo Micromedex

álcool; Hansten&Horn

Monitorizar

A Isoniazida é um fármaco antibacteriano ou antibacilar utilizado no

tratamento de primeira linha da tuberculose.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A isoniazida é um fármaco que se

caracteriza por provocar toxicidade ao nível do fígado, bem como a ingestão

excessiva e/ou crónica do etanol. Ao serem administrados em conjunto, os efeitos

hepatotóxicos das duas substâncias são potenciados, podendo conduzir, ainda que

raramente, a casos de hepatite (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). A

ingestão crónica de álcool conduz à indução das enzimas do sistema microssomal

hepático responsáveis pela metabolização da isoniazida que, para além de diminuir a

concentração e eficácia do fármaco, dá origem a metabolitos ativos que conduzem à

necrose hepatocelular (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). Um estudo

revelou que um doente que ingeriu álcool após tomar o antibacilar, experienciou uma

reação do tipo dissulfiram (Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: A classificação entre os compêndios não é

consensual. Por um lado, é lhe atribuída gravidade major (Truven Health Analytics,

2014), por outro é lhe atribuída uma classificação de Classe 3 – Avaliar e tomar

medidas para minimizar o risco (Hansten & Horn, 2013); Interação clinicamente

importante, devido à crescente evolução da doença, embora não se encontre bem

estabelecida (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014).

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2. Desenvolvimento

65

Gestão: Os doentes tuberculosos devem ser alertados para os perigos que decorrem

da associação da terapêutica com a ingestão de álcool e encorajados a evitar o

consumo de bebidas alcoólicas. A função hepática dos doentes antes e durante a

terapêutica com isoniazida deve ser monitorizada devido à hepatoxicidade causada

pelo fármaco (Hansten & Horn, 2013).

2.2.20. Interação entre Cloropromazina e Álcool

Tabela 22 - Cloropromazina e Álcool

Álcool

Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Cloropromazina Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacodinâmica Moderada consumo Micromedex

álcool; Hansten&Horn

Monitorizar

A Cloropromazina é um fármaco antipsicótico utilizado no tratamento de

psicoses agudas (agitação psicomotora, alteração do comportamento, síndromes

confusionais), psicoses crónicas (esquizofrenia, estados delirantes), vómitos graves de

origem central e como terapêutica adjuvante do tétano.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: Da co-administração de

cloropromazina e álcool resulta um sinergismo de efeitos, que se traduz num aumento

de depressão do SNC, exacerbação dos efeitos sedativos, comprometimento da

atividade psicomotora e alterações no estado de vigilância (Truven Health Analytics,

2014). Em alguns casos também foi descrita a ocorrência de depressão respiratória e

hipotensão (Truven Health Analytics, 2014). Devem ser tomadas precauções na

condução de veículos e a manipulação máquinas, uma vez que os efeitos sedativos e o

comprometimento psicomotor são mais marcados para a cloropromazina quando

associada à ingestão de álcool, que para os outros fármacos pertencentes à mesma

classe terapêutica (Baxter, 2010). Estudos demonstraram que quando administrados

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

66

em conjunto, o álcool vai atuar como factor precipitante dos efeitos extrapiramidais,

provocando manifestações clínicas como acatisia e distonia. A explicação para este

facto pode dever-se à formação de monoaminas envolvidas na manifestação dos

efeitos extrapiramidais, que ser ajudada pela inibição da ADH por parte da

cloropromazina (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). A administração de

cloropromazina, nos estudos realizados, não mostrou influenciar significativamente os

parâmetros farmacocinéticos do álcool (Baxter, 2010).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar

o risco (Hansten & Horn, 2013). Interação de gravidade moderada e clinicamente

importante (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: Durante a terapêutica com cloropromazina a ingestão de álcool deve ser

evitada, sendo da responsabilidade dos profissionais de saúde encorajar os doentes a

minimizar o seu consumo alertando-os para os efeitos adversos graves que podem

decorrer da sua associação (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). Por um

lado, o aumento de sedação provocada bem como o comprometimento psicomotor,

podem ser factores preocupantes e a ter em atenção na condução automóvel (Baxter,

2010). Por outro, a manifestação de efeitos extrapiramidais devidos à ingestão de

álcool sugere que esta deve ser minimizada. Os doentes que apresentem depressão do

SNC acentuada devem ser monitorizados (Hansten & Horn, 2013).

2.2.21. Interação entre Olanzapina e Álcool

Tabela 23 - Olanzapina e Álcool

Álcool

Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão

Fontes de informação

Olanzapina Interação Moderada Minimizar Stockley's

Farmacodinâmica consumo Micromedex

álcool

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2. Desenvolvimento

67

A Olanzapina é um fármaco antipsicótico utilizado no tratamento de adultos

com esquizofrenia e outras psicoses.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A olanzapina quando administrada em

monoterapia caracteriza-se por provocar diversos sintomas, destacando a sonolência e

hipotensão ortostática. A administração concomitante de álcool com o antipsicótico

além de provocar uma exacerbação destes sintomas, resulta em efeitos aditivos ao

nível da depressão do SNC (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). Não existe

evidência clínica de alteração dos parâmetros farmacocinéticos da olanzapina

causados pela ingestão simultânea de etanol (Baxter, 2010; Truven Health Analytics,

2014).

Relevância clínica/gravidade: Interação clinicamente relevante, de gravidade

moderada e bem estabelecida (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: O consumo de álcool durante a terapêutica com olanzipina deve ser evitado

e/ou minimizado. Em situações de hipotensão postural com sintomas de desmaios e

tonturas, o doente deve ser imediatamente sentado ou deitado, de forma a que os seus

valores de pressão arterial estabilizem (Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014).

2.2.22. Interação entre Quetiapina e Álcool

Tabela 24 - Quetiapina e Álcool

Álcool

Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão

Fontes de informação

Quetiapina Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacodinâmica Moderada consumo Micromedex

álcool Hansten&Horn

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

68

A Quetiapina é um fármaco antipsicótico comummente utilizado no

tratamento da esquizofrenia e de outras psicoses, nomeadamente no episódio maníaco

moderado a grave.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A quetiapina à semelhança do que

acontece com outros fármacos antipsicóticos provoca sonolência, tonturas e em

algumas situações hipotensão postural. Assim, quando administrada com álcool estes

efeitos podem ser potenciados, comprometendo a atividade motora e cognitiva. Este

mecanismo resulta de uma depressão exacerbada do SNC provocada pelos efeitos de

cada uma das substâncias quando associadas (Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013;

Truven Health Analytics, 2014). A quetiapina, nos estudos realizados, não mostrou ter

qualquer influência na farmacocinética do álcool (Baxter, 2010).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar

o risco (Hansten & Horn, 2013). Interação de gravidade moderada (Truven Health

Analytics, 2014), bem estabelecida e clinicamente relevante.

Gestão: Os fabricantes de quetiapina recomendam que consumo de bebidas

alcoólicas durante a terapêutica deve minimizado e se possível evitado (Hansten &

Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). A condução automóvel após a

administração concomitante de quetiapina e álcool é desaconselhada (Hansten &

Horn, 2013). Em situações de hipotensão postural com sintomas de desmaios e

tonturas, o doente deve ser imediatamente sentado ou deitado, de forma a que os seus

valores de pressão arterial estabilizem (Baxter, 2010).

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2. Desenvolvimento

69

2.2.23. Interação entre Tizanidina e Álcool

Tabela 25 - Tizanidina e Álcool

Álcool

Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Tizanidina Interação Classe 3 Minimizar Micromedex

farmacodinâmica Moderada consumo Hansten&Horn

álcool

A Tizanidina é um fármaco relaxante muscular de ação sistémica utilizado no

tratamento de espasmos musculares dolorosos associados a problemas na coluna

vertebral, perturbações neurológicas como esclerose múltipla, doenças degenerativas

da medula espinal, acidente vascular cerebral e parelesia cerebral.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A tizanidina em monoterapia pode

provocar sintomas como sonolência, tonturas, cansaço, boca seca, náuseas,

perturbações gastrointestinais e hipotensão. O mecanismo de ação encontra-se

relacionado com a potenciação dos efeitos adversos da tizanidina, nomeadamente a

sonolência, e com a exacerbação da depressão do SNC quando ingerido álcool após a

sua administração. Para além destes efeitos, estudos demonstraram que o álcool

quando co-administrado com a tizanidina provoca um aumento da sua concentração

plasmática cerca de 15% (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para minimizar

o risco (Hansten & Horn, 2013). Interação bem estabelecida, clinicamente importante

e de gravidade moderada (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: A ingestão de álcool durante a terapêutica com tizanidina deve ser

minimizada e se possível evitada., devido aos efeitos depressores do SNC que

decorrem da sua associação (Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014).

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

70

2.2.24. Interação entre Clonazepam e Álcool

Tabela 26 - Clonazepam e Álcool

Álcool

Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Clonazepam Interação Major Evitar Stockley's

Farmacodinâmica consumo Micromedex

álcool;

O Clonazepam é um fármaco antiepilético e anticonvulsivante, com ação no

SNC, utilizado no tratamento da epilepsia e das crises mioclónicas.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: O Clonazepam devido aos seus efeitos

depressores do SNC, quando associado à ingestão de álcool, também depressor do

SNC, vai potenciar a sedação provocada pelo sinergismo de efeitos de ambas as

substâncias quando administradas em conjunto (Baxter, 2010; Truven Health

Analytics, 2014).

Relevância clínica/ Gravidade: Interação de gravidade major, bem estabelecida e

clinicamente importante (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: Em relação à gestão da interação, a informação entre os compêndios é

contraditória. Por um lado, os autores referem que a administração concomitante de

clonazepam e álcool deve ser evitada (Truven Health Analytics, 2014); por outro,

sugerem que não existe perigo de administração concomitante das duas substâncias

para uma ingestão pontual e de quantidades moderadas de álcool. Os doentes que

consumam grandes quantidades de álcool em associação com clonazepam devem

estar alerta para a potenciação dos efeitos sedativos e para um aumento do risco de

convulsões (Baxter, 2010).

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2. Desenvolvimento

71

2.2.25. Interação entre Tacrólimus e Álcool

Tabela 27 - Tacrólimus e Álcool

Álcool

Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão Fontes de

informação

Tacrólimus Interação Classe 3 Minimizar Stockley's

Farmacocinética Major consumo Micromedex

e álcool; Hansten&Horn

Farmacodinâmica

O Tacrólimus é um fármaco imunomodelador utilizado por via oral como

profilaxia da rejeição do transplante de rim, coração ou fígado ou como tratamento da

rejeição do transplante resistente à terapêutica prévia com outros imunomodeladores.

Este fármaco também pode ser administrado por via tópica no tratamento da dermite

atópica moderada a grave em doentes que sejam intolerantes ou não respondam a

outras terapêuticas, nomeadamente com corticosteróides tópicos.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A abordagem ao mecanismo de ação

da interação que se estabelece entre o tacrólimus e o álcool, embora não se encontre

totalmente esclarecida, pode ser discutida sob duas vertentes:

• Para as cápsulas orais de libertação prolongada está demonstrado que o álcool,

quando ingerido simultaneamente à toma de tacrólimus, acelera a dissolução

do invólucro, aumentando a libertação do ativo (Truven Health Analytics,

2014);

• Para a forma farmacêutica de aplicação tópica (pomada), o seu mecanismo de

ação embora seja desconhecido, pode ser visto de duas maneiras distintas: por

um lado, o facto do tacrólimus ao atuar na mesma via bioquímica do álcool

conduz à libertação de neuropéptidos; por outro, uma vez que inibe a ADH

cutânea provoca em ambas as situações erupções e rubor facial associados a

um aumento da vasodilatação (Baxter, 2010). Estudos demonstraram que 6 a

7% dos doentes que se encontravam a aplicar tacrólimus por via tópica, após a

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

72

ingestão de álcool manifestaram reações cutâneas adversas ao nível do rosto

(Baxter, 2010; Hansten & Horn, 2013); pensa-se que a magnitude da interação

é tanto maior, quanto maior for a quantidade de álcool ingerida (Baxter, 2010).

Relevância clínica/ Gravidade: Interação com importância clínica, embora não se

encontre bem estabelecida e a sua classificação de gravidade não seja concordante.

Por um lado, é classificada como sendo de Classe 3 – Avaliar e tomar medidas para

minimizar o risco (Hansten & Horn, 2013); por outro, é considerada uma interação de

gravidade major (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: O consumo de álcool durante a terapêutica com tacrólimus, quer por via oral,

quer por via tópica, deve ser minimizado, de forma a que os efeitos adversos

decorrentes da associação não sejam tão pronunciados. Uma vez que se trata de um

medicamento de receita restrita, cabe aos profissionais de saúde terem conhecimento

das suas reações adversas graves, acompanhando os doentes nessas situações (Baxter,

2010; Hansten & Horn, 2013; Truven Health Analytics, 2014). Embora sejam

necessários mais estudos para demonstrar a sua eficácia, pensa-se que a administração

de ácido acetilsalicílico possa diminuir os sintomas provocados ao nível da pele

(Baxter, 2010).

2.2.26. Interação entre Codeína e Álcool

Tabela 28 - Codeína e Álcool

Álcool Fármaco

Principal Mecanismo da

Interação Gravidade Gestão

Fontes de informação

Codeína Interação Moderada Evitar Stockley's

Farmacodinâmica consumo Micromedex

álcool;

A Codeína é um fármaco antitússico de ação central estupefaciente que atua

no aparelho respiratório e apresenta-se sob a forma de preparações simples ou

combinadas com outros fármacos de ação expectorante, estando indicado no

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2. Desenvolvimento

73

tratamento da tosse seca e persistente. Para além desta indicação, a codeína em

preparações combinadas com o paracetamol, apresenta uma ação analgésica potente e

antipirética.

Mecanismo de ação/ Manifestações clínicas: A administração de codeína

concomitantemente à ingestão de álcool conduz a uma interação farmacodinâmica por

sinergismo de efeitos ao nível da depressão do SNC, exacerbando os efeitos sedativos

e comprometendo a atividade psicomotora (Truven Health Analytics, 2014). O

consumo de álcool durante a terapêutica com a codeína, não mostrou alterar os seus

parâmetros farmacocinéticos, sugerindo que não ocorrem interações deste tipo entre

as duas substâncias (Baxter, 2010).

Evidência clínica: Um estudo duplamente cego realizado num simulador automóvel,

após a administração conjunta de álcool e em separado, revelou um comprometimento

da capacidade de condução com majoramento do número de acidentes e condução

fora da estrada (Baxter, 2010).

Relevância clínica/ Gravidade: Interação de gravidade moderada, bem estabelecida

e relevante na prática clínica (Truven Health Analytics, 2014).

Gestão: O consumo de álcool durante a terapêutica com codeína deve ser evitado. Os

doentes devem ser alertados para o perigo de condução de veículos e manipulação de

máquinas, devido à diminuição do estado de alerta e comprometimento psicomotor

(Baxter, 2010; Truven Health Analytics, 2014). Porém, a associação de codeína e

paracetamol requer especial atenção, uma vez que o paracetamol quando tomado

concomitantemente com álcool pode provocar interações de gravidade major.

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

74

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3. Conclusão

75

3. Conclusão

O objetivo desta monografia consistia descrever interações medicamento-

álcool com relevância clínica no ambulatório no que respeita ao seu mecanismo de

ação, gravidade e gestão proposta. Foi possível obter uma lista de quarenta e duas

interações medicamento-álcool com base em três fontes bibliográficas de referência:

Stockley’s Drug Interactions, Micromedex, Drug Interactions Analysis and

Management.

A presente monografia corrobora discrepâncias entre os compêndios

selecionados, no que diz respeito:

• Mecanismo de ação das interações: a interação entre a Isotretinoína e o álcool

não apresenta consenso entre os compêndios. Por um lado, a associação deste

fármaco com álcool pode provocar uma reação do tipo dissulfiram,

por outro a ingestão de álcool pode diminuir a sua eficácia terapêutica;

• Classificação de gravidade: tanto o Tacrólimus, como a Isoniazida como o

Paracetamol, mostraram discrepâncias na sua classificação de gravidade,

sendo consideradas por um compêndio de interações de classe 3 e por outro

de gravidade major.

• A gestão das interações também apresenta diferenças entre os compêndios,

como acontece na interação entre o dissulfiram e o álcool. Por um lado um

compêndio sugere a administração de ácido ascórbico em situações de

interação, enquanto que outro compêndio propõe a administração de um

antídoto, o 4-metilpirazol.

Embora haja algumas interações cujo mecanismo ainda não se encontra bem

estabelecido, como sucede no caso da Isotretinoína, Varfarina e Verapamilo, o

número de interações cujo principal mecanismo é farmacocinético, é sensivelmente

idêntico às que possuem o principal mecanismo ao nível da farmacodinâmica. Dentro

de cada um destes grupos os mecanismos implicados nas interações farmacocinéticas

são mais diversificados; as interações farmacodinâmicas prendem-se maioritariamente

com o efeito depressor sinérgico no SNC provocado pela associação álcool-

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

76

medicamento. Contudo, é de salientar que a interação medicamento-álcool pode

ocorrer por mais do que um mecanismo simultâneo, não sendo por vezes claro qual é

o principal.

Em relação à relevância clínica, e como seria expectável face ao critério de

inclusão adotado, todas as interações descritas são clinicamente importantes. Todavia

a classificação de gravidade não foi unânime entre as fontes. Na sua maioria, as

interações são consideradas, segundo Hansten e Horn (2013) de classe 3 (“minimize

risk”), existindo apenas uma interação de classe 1 (“avoid combination”) entre o

bupropiom e o álcool, e uma interação uma interação de classe 2 (“usually avoid

combination”) entre o verapamilo e o álcool. Segundo Truven Health Analytics,

(2014), as interações são maioritariamente de gravidade moderada, se bem que

também se encontram descritas interações de gravidade major. De salientar que não

foi possível obter a classificação de gravidade para todas as interações, uma vez que

apenas dois dos compêndios possuíam sistema de classificação explícito.

A gestão da interação diz respeito ao conjunto de ações a tomar pelos

profissionais de saúde e/ou doente de forma a minimizar o risco e a ocorrência de

efeitos adversos graves, minimizando assim a morbilidade associada à administração

concomitante de álcool e medicamentos. Conforme demonstrado pelos resultados não

existe uma maneira única de atuar. A medida mais frequentemente recomendada foi a

redução e a abstinência do consumo de álcool durante a terapêutica farmacológica. A

monitorização dos doentes foi a segunda medida mais recomendada, relacionando-se

com a vigilância, controlo e medição de certos parâmetros clínicos importantes,

devido à potenciação ou diminuição da eficácia do medicamento. Por sua vez, a

terceira medida mais frequentemente sugerida diz respeito ao ajuste de dose do

fármaco, que se encontra relacionada com um aumento ou diminuição da quantidade

administrada, por aumento do risco de ineficácia terapêutica ou devido ao risco de

toxicidade, respectivamente.

A gestão das interações medicamentosas é um tema bastante complexo e

constitui um dos aspectos mais críticos para a prática clinica. A informação disponível

é por vezes vaga; pode ainda exibir falta de consistência entre as fontes. Assim, o

objetivo de um painel Delphi realizado recentemente por Floor-Schreudering et al.

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3. Conclusão

77

(2014) foi estabelecer guidelines para a gestão das interações medicamentosas,

procurando uniformizar os elementos informativos e o modo de atuação dos

profissionais.

O principal ponto forte deste trabalho foi a escolha das fontes bibliográficas.

Tratam-se de três fontes internacionais de referência. Acresce que a utilização de mais

do que uma fonte é importante, por estar documentada a existência de discrepâncias

entre as várias fontes de informação no que diz respeito à classificação e identificação

das interações medicamentosas, bem como à evidência clínica subjacente (Vitry,

2006; Olvey, Clauschee, & Malone, 2010; Guidoni, Obreli-Neto, Pereira, & Baldoni,

2011).

Uma das principais limitações deste trabalho de revisão é não fornecer uma

listagem exaustiva de interações entre medicamentos e álcool. A lista das interações

descritas nesta monografia foi obtida com base na metodologia descrita, que visou

incluir as interações com maior interesse para os profissionais de saúde, em termos do

significado clínico e frequência de utilização. Ainda assim, considero que esta

sistematização de interações entre medicamentos e o álcool é útil, pois a sua

identificação e gestão pode conduzir a uma diminuição de efeitos prejudiciais.

Outra limitação é o facto da recolha de dados a partir das fontes de

informação ter sido feita apenas por uma pessoa. Face à inexistência de dupla

verificação independente não é possível excluir a possibilidade de erros ou omissões,

resultantes até de enviesamento pessoal, com majoração de alguns aspectos em

detrimento de outros. Uma vez que se trata de uma tarefa bastante morosa poderá ser

considerada futuramente, se existirem recursos humanos para tal.

A falta de concordância entre as fontes estende-se ao modo como as interações

são apresentadas: fármaco a fármaco ou grupo terapêutico. Este facto pode conduzir a

generalizações incorretas, uma vez que nem todos os fármacos pertencentes a uma

mesma classe terapêutica interagem segundo os mesmos mecanismos (Olvey et al.,

2010; Guidoni et al., 2011).

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

78

Numa futura abordagem podem utilizar-se os RCM (resumo das características do

medicamento) dos medicamentos envolvidos nas interações como fonte de

informação adicional. Não obstante, são conhecidas limitações sobre a sua utilização

no que diz respeito à sua capacidade de resposta a questões práticas, nomeadamente

na sua classificação de gravidade e gestão de interações (Beers, Egberts, Leufkens, &

Jansen, 2013; Salgado, Arguello, Martinez-Martinez, Benrimoj, & Fernandez-Llimos,

2013).

O presente trabalho visa retratar as interações medicamento-álcool com

significado clínico. Em relação aos antibióticos, o senso comum considera que a sua

administração concomitante com álcool reduz a eficácia da terapêutica

antimicrobiana. Todavia, os antimicrobianos que mostraram produzir interações com

o álcool clinicamente relevantes (metronidazol, tinidazol e isoniazida) encontram-se

relacionados com a ocorrência de reações do tipo dissulfiram, não afetando a

concentração e da eficácia dos mesmos.

Por outro lado, existe um conjunto de fármacos frequentemente utilizados no

ambulatório que não constam da lista de interações obtida, embora estejam descritos

na literatura por provocarem interações medicamentos-álcool, são eles os

antidiabéticos orais e anti-inflamatórios não esteroides. O facto de estas interações

estarem omissas neste trabalho pode dever-se aos critérios metodológicos adoptados,

nomeadamente a relevância clínica e serem comuns a pelo menos duas das três fontes

de informação. Isto reforça a importância de na prática se usar mais do que uma fonte

de informação para pesquisar questões clínicas sobre interações medicamentos-álcool.

Em resumo, as interações que ocorrem devido a toma simultânea de bebidas

alcoólicas e medicamentos podem por em risco a saúde dos doentes. A identificação

dos efeitos prejudicais de uma interação medicamentosa nem sempre é óbvia,

nomeadamente devido à variabilidade de sinais e sintomas que cada individuo pode

apresentar. Como tal, um importante papel do farmacêutico comunitário é conhecer as

principais interações e informar os utentes das possíveis manifestações que possam

decorrer do uso concomitante de medicamentos e álcool. Os doentes devem estar

alerta para a ocorrência destas manifestações, devendo comunicar rapidamente a um

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3. Conclusão

79

profissional de saúde, qualquer sinal ou sintoma anómalo, de forma que este possa

agir em conformidade.

Muitas vezes as interações que se estabelecem entre os medicamentos e o

álcool podem ser resultado de uma ingestão pontual, ou em outros casos podem

traduzir problemas graves de alcoolismo, que requerem encaminhamento para o

médico.

Um bom aconselhamento farmacêutico passa por prever, informar e alertar os

utentes para estas interações, de forma a promover uma utilização segura, eficaz e

responsável dos medicamentos.

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Interações medicamentos - álcool com relevância clínica no ambulatório

80

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