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INSTRUMENTOS PERFURO CONTUNDENTES – LESÕES POR PROJÉTEIS
As lesões causadas pelos instrumentos perfuro contundentes são caracterizadas
pela ação de um mecanismo que perfura e contunde ao mesmo tempo, sendo que tais
ferimentos são geralmente produzidos pela utilização de armas de fogo, que será o
objeto do presente trabalho. As armas de fogo estão presente em grandes porcentagem
como instrumentos utilizados para a pratica de crimes dolosos e para o suicídio, sendo
comum também figurarem como responsáveis por lesões corporais ou homicídios
culposos.
A arma de fogo é um objeto caracterizado por possuir uma abertura em uma de
suas extremidades e ser parcialmente fechado na parte de trás, por onde é inserido o
projétil. Quando da realização do disparo, o projétil é impulsionado a grande velocidade
pela abertura da arma através da rápida expansão de gases provocado pela repentina
queima de pólvora. Importante frisar, que junto com o instrumento perfuro contundente,
ou seja, o projétil ou projéteis, escapam, também, pela boca da arma, outros elementos
que contribuem para a formação e caracterização da lesão, a saber, gases
superaquecidos, chama, fumaça e grânulos de pólvora que não se incendiaram.
Conforme preleciona Almeida Junior, em sua obra Lições de Medicina Legal:
“Nas armas de fogo, o instrumento vulnerante, de ação perfuro-contundente,
é representado pela bala ou pelos grãos de chumbo, cabendo a arma, em si
mesma, a tarefa de impelir violentamente o projétil em direção ao alvo. A
explosão da pólvora, na parte posterior do cano, fechada, produz súbito e
considerável desenvolvimento de gases, os quais, por sua enorme força
expansiva, obrigam o projétil a sair pela única abertura que lhe oferece, isto
é, a da parte anterior. (ALMEIDA, 1998, p. 140)
No tocante as armas de fogo, devemos levar em consideração as particularidades
em relação ao cano, a percussão, ao numero de tiros e a munição.
Ao falarmos do cano, o seu comprimento nos permite distinguir as armas de
cano longo (fuzis, espingardas etc) e armas de cano curto (revolveres e pistola). Sendo
estas as mais frequentes em pericias criminais
O interior, ou alma do cano, apresenta sulcos helicoidais – “raias” – que tem
como escopo imprimir ao projétil, ao sair, um movimento giratório, o que faz com que o
projétil tenha a sua trajetória mais constante. A largura e inclinação das raivas variam
segundo o tipo de arma utilizado.
O calibre pode ser real ou nominal. O calibre real é o próprio da arma, medido
na boca do cano. O calibre nominal e o da cápsula, o qual se excede ligeiramente o da
arma respectiva.
O modo de percussão das armas atuais se dá por meio do choque entre o
percussor e a escorva da arma, resultando em sua detonação. Nas espingardas e nas
garruchas de carregar pela boca, a percussão se aplica sobre a espoleta colocada no
ouvido. Porém se a arma exige cápsulas, estas recebem na escorva a pancada do
percussor.
Quanto ao número de tiros, existem armas de um só tiro, sendo necessário
carregá-las outras vez, para que se possa atirar novamente. Outras podem dar diversos
tiros sem a necessidade de recarregá-las. Isto, conforme Almeida Junior se consegue
graças a dispositivos vários:
a) A arma pode ter dois e mesmo quatro canos: espingardas de caca, certas
pistolas não automáticas.
b) A arma tem um cano único; mas atrás deste existe um tambor com
determinado número de câmaras, cada uma das quais se carrega com um
cartucho: a medida que se dão os tiros, o tambor vai girando e colocando
assim, nova câmara carregada em correspondência com a culatra. São os
revólveres.
c) A arma tem um cano único e não possui tambor. O “pente” de balas é
posto no depósito, atrás do cano. Logo depois de ter dado um tiro, o atirador,
mediante movimentos de uma alavanca, extrai a cápsula detonada, coloca no
cano novo cartucho e arma outra vez o gatilho para o tiro seguinte. São as
armas de “repetição”: certas pistolas, certos fuzis de caca, os fuzis de guerra.
d) A arma é semelhante as do tipo anterior: cano único, ausência de tambor,
carga de um “pente” de balas na parte traseira. Mas é a própria força da
pólvora, em cada tiro, que prepara a arma para o tiro seguinte, com o novo
cartucho, o rearmamento do gatilho. São armas automáticas: pistolas
automáticas, fuzis automáticos. (ALMEIDA, 1998, p. 141)
A munição e outro aspecto que deve sempre ser levado em conta, nas armas de
carregar pela boca a munição vai sendo introduzida no cano com o auxílio de uma
vareta, primeiro a pólvora, e em seguida a bucha, o projétil e por último uma nova
bucha que segurara o chumbo. Uma espoleta, cobrindo o “ouvido” da arma, sofrerá a
pancada do cano ao ser puxado o gatilho.
Já as armas de carregar pela culatra ou armar de retrocara, recebem os mesmos
elementos, mas arranjados em um cartucho. O cartucho e composto de5 partes:
1) O estojo: pode ser metálico ou de papelão.
2) A pólvora: pode ser negra, ou seja, compõe-se de salitre, enxofre e carvão em
proporções variáveis; ou pólvora sem fumaça, que é constituída essencialmente
por nitrocelulose ou nitrocelulose acrescida de nitroglicerina.
3) A bucha: pode ser feita das mais diversas substâncias, entre elas pano, papel,
papelão, cortiça, disco metálico, disco de ouro, etc.
4) A espoleta: constituída por uma mistura que deverá explodir ao
toque do percussor, e difere de acordo com o fabricante.
5) O projétil: ora é formado por chumbo, ora por bala
AS ARMAS DE FOGO EM AÇÃO
A arma é acionada assim que o gatilho é puxado, disparando-se o tiro. Isto
resulta em uma marcação tanto na arma como fora dela, além da criação de resíduos, e
estes elementos contribuirão para a solução dos problemas periciais.
Primeiramente o cão percute a espoleta do cartucho, o que ocasiona a explosão
que se propaga para a pólvora, cuja explosão força a bala através do cano e a impele em
direção ao alvo, e ao mesmo tempo descartando o estojo, que fica preso pelo extrator e é
expelido para fora da arma.
Um vez forçada a bala no interior do cano, recebe ela as impressões
correspondentes a radiação da arma. Este é um fato importantíssimo, pois as
particularidades da raiação da arma funcionam como se fossem impressões digitais,
permitindo que a arma seja identificada.
Como regra, todos os elementos contidos no cartucho deveriam queimar-se
totalmente dentro do cano, mas na realidade tal situação não ocorre. Tanto que fica
dentro do cano um resido, o “sarro”, variável no aspecto e na medida que os dias
passam. O sarro pode informar a natureza da pólvora utilizada e a data que o disparo foi
feito.
Dado o tiro, o que sai da boca da arma é um conjunto heterogêneo composto
pela bala, gases da explosão, grânulos de pólvora ainda incombusta, chama, fumaça e
resto da bucha.
Neste sentido, nos ensina o prefalado autor:
“O todo forma um cone de ápice voltado para o interior do cano e de base
para o lado de fora. A base tem, naturalmente, um diâmetro que será tanto
maior quanto mais afastado estiver da arma.” (ALMEIDA, 1998,p. 143.)
Em resumo, o aspecto mais importante em relação aos efeitos do tiro, e que nos
tiros de perto o alvo receberá além da bala, as impressões dos elementos do cone, tais
como o chamusçamento, esfumaçamento, e até incrustações de grânulos de pólvora
(tatuagem). Isto se constitui, como severa, importante fator de análise para laudos
periciais.
A bala, após deixar o cano, segue uma trajetória retilínea a princípio e se
encurva um pouco para o solo. Em sua progressão vai girando em torno de seu próprio
eixo longitudinal, o que mantém a bala com a sua ponta para a frente. Porém, a medida
que a velocidade da bala se reduz, existe a possibilidade de mudança na posição, o que
devera dificultar o sucesso ao atingir o alvo desejado.
Todos os elementos supracitados contribuem para a análise do ferimento,
possibilitando que o perito determine uma série de fatores que contribuem para a
elucidação da forma em que se deu a agressão.
Por possuírem multiplicidade de características, e por geralmente fornecerem
elementos essenciais para a determinação da causa jurídica, da materialidade do fato,
bem como da possível autoria, o estudo das lesões produzidas pelos projéteis faz-
se excepcionalmente necessária.
O perito ao analisar os ferimentos produzidos por projéteis de arma de fogo deve
ater-se aos seguintes pontos:
1- Forma, dimensões, e contorno das zonas do orifício de entrada e saída;
2- A trajetória do projétil no interior do corpo, além das descrições das lesões
internas;
3- A orientação do disparo em relação à posição do corpo;
4- A provável distância do disparo.
Passaremos a seguir ao estudo mais aprofundado dos ferimentos
perfurocontundentes, suas descrições e determinações.
ORIFÍCIO DE ENTRADA
Ocasionados pela entrada do projétil no corpo da vítima, as características dos
ferimentos de entrada dependem fundamentalmente do tipo de munição empregada,
ângulo de incidência, e distância do disparo. Conceitua, de forma brilhante tal ponto o
professor Almeida Junior:
“Orifício de entrada – quase sempre localizado na pele (excepcionalmente na boca, nos
olhos, no reto), e, na grande maioria das vezes, um só para cada bala. Há dois quando
esta, antes de penetrar no corpo, atravessa determinado segmento: a glândula mamária
pendente, o braço.” (ALMEIDA, 1998, p. 144)
Analisando-se o tipo de munição empregada, nos disparos efetuados com
munição de projéteis múltiplos, o aspecto da lesão depende da distância em que houve o
disparo, uma vez que, em disparos próximos ou encostados ao corpo da vítima tem-se
grande destruição do tecido humano, feridas irregulares, além de significativa perda de
massa corpórea.
Já nos disparos efetuados à longa distância por múltiplos projéteis, verifica-se a
existência de lesões múltiplas, distribuídas ao redor de um ponto central, e que se
afastam dependendo da distância entre o atirador e a vítima.
Ao se analisar os ferimentos produzidos por projéteis unitários deve-se observar
o ângulo em que o tiro foi dado, pois este determinará o formato da lesão única.
Geralmente observa-se o formato circular ou elíptico do projétil único, dependendo do
ângulo de incidência e das linhas de tensão que atuam sobre a pele.
Vale ressaltar que a forma tomada pelo orifício de entrada da lesão depende da
maneira pela qual o projétil atinge o alvo. (MARANHÃO, 2005, p. 298)
Os projéteis únicos podem também produzir feridas maiores quando o tiro for
dado com maior proximidade à pele da vitima, ocasionando grande dilaceração desta
acompanhada por grande perda de substância. Isto se dá devido à força expansiva dos
gases associada ao poder vulnerante do projétil.
Comumente, a penetração da bala produz uma ferida circular ovalar,
excepcionalmente, os orifícios de entrada produzidos pelos projéteis únicos podem ter
formato atípico, nos casos em que o projétil perde velocidade podendo ferir pelo flanco
ou pela base, ou quando o projétil atinge um alvo intermediário antes de incidir sobre o
corpo da vítima.
A lesão também será atípica nas hipóteses em que o projétil atinge a vítima "de
raspão", ou seja, de maneira tangencial à pele. Este tipo de ferida não penetra no corpo
não podendo, dessa forma, referir-se a orifício de entrada, já que foi produzida apenas
uma escoriação de formato alongado.
Além do que já foi mencionado, deve-se observar com relação também à forma
do orifício de entrada, que este possui geralmente bordas invertidas, invaginadas,
voltadas para o interior do corpo. Ao se mencionar as dimensões do orifício de entrada,
este nem sempre é o mesmo em relação ao projétil, já que, em razão da distância em que
o disparo foi efetuado e da elasticidade da pele, este pode ser maior, menor ou igual ao
diâmetro do projétil.
Nesse mesmo sentido, Odon Ramos Maranhão comenta sobre as dimensões do
orifício de entrada causado pelas armas de fogo:
“O orifício de entrada é usualmente menor do que o calibre do projétil que o
produziu e com ele guarda proporção direta. O exame do orifício sugere, com
boa aproximação, o calibre da bala vulnerante.” (MARANHÃO, 2005, p.
299)
Posto isso, importante comentar que o disparo muito próximo dá origem a
orifício maior do que se espera, sendo exceção neste sentido. O diâmetro é geralmente
menor que o orifício de saída, não constituindo verdadeira regra, devendo esta
comparação ser feita com cuidado, pois pode induzir a erro.
Comparando o orifício de saída, ao de entrada, este se mostra geralmente menor,
pois em virtude da elasticidade da pele, esta é distendida pela bala antes de ser
perfurada. Nos tiros muito próximos, entretanto, o diâmetro da ferida é maior que o da
bala.
Por fim, importante comentar, que a entrada do projétil na vítima deixa
determinados sinais que contornam o orifício de entrada, sendo conhecidos como orlas e
zonas. Os sinais provocados pelo projétil denominam-se orlas, já as zonas se
caracterizam pela carga explosiva. Quatro espécies devem ser consideradas. Vejamos:
1) Orla de contusão: Ao penetrar do projétil, a pele se invagina como um dedo
de luva e se rompe. Devido à diferença de elasticidade existente entre a epiderme e a
derme, forma-se uma orla escoriada, contundida.
2) Orla de enxugo: Devido à maneira pela qual o projétil penetra na pele,
carregando impurezas provenientes da pólvora e dos meios anteriormente atravessados.
A bala, por atrito, “se limpa”, formando a orla de enxugo;
No mesmo sentido, entendo Almeida Júnior:
“Ao atravessar o cano da arma, a bala se cobre de resíduos que ai existem –
“sarro” da pólvora, ferrugem. Entrando na pele, ela se limpa dessas
impurezas, “enxuga-se” nas bordas da ferida. Assim se forma a orla de
enxugo, também característica do orifício de entrada.” (ALMEIDA, 1998, p
146.)
3) Zona de tatuagem:. Não é removível. Também conhecida como “tatuagem
verdadeira”, caso o tiro seja efetuado de curta distância, os grânulos o atingirão, e se
depositarão em torno do orifício de entrada, em uma zona circular tanto mais ampla e
mais rarefeita quanto maios a distancia. Esta zona é muito importante, porque, além de
assinalar com segurança o orifício de entrada, pode informar quanto a distância e
direção do tiro e quanto a quantidade de pólvora.
4) Zona de esfumaçamento. É removível, consiste em simples depósito de
pólvora incombusta e impurezas. A importância diagnóstica da zona de esfumaçamento
é menor que a da Zona de tatuagem, se bem que aquela possa indicar o orifício de
entrada, distância e direção do tiro.
ORLAS DE CONTUSÃO, ENXUGO E ESCORIAÇÃO
Tratam-se de regiões circunscritas, que circundam o orifício de entrada, dando-
lhe características aptas a reconhecer o ferimento produzido por instrumentos perfuro
contundentes.
A orla de contusão ocorre devido à contusão que o projétil causa na rede de
capilares da pele no momento em que se encontra com a epiderme, causando então uma
pequena zona equimótica.
Após a contusão e a passagem do projétil pela epiderme, esta se rasga dando
margem à conseqüente exposição da derme, camada mais elástica, que encapsula e
acompanha o projétil antes de se romper. À exposição da derme ocasionada pela
passagem do projétil por esta dá-se o nome de orla de escoriação.
Deve o perito ter atenção ao identificar a orla de escoriação já que esta pode ser
normalmente impedida de ser observada devido à orla de enxugo que fica parcialmente
sobreposta a ela.
Nas palavras de Eduardo Roberto Alcântara Del-Campo:
“Na verdade, a orla de escoriação corresponde à diminuta exposição da
derme sobre a lesão causada na epiderme, em razão da diferença de
elasticidade entre as camadas. A orla de contusão, por outro lado, indica uma
área maior, que circunda o ferimento, e é formada pelo halo hiperêmico
decorrente da lesão dos capilares da área atingida pelo embate do projétil.”
(DEL-CAMPO, 2007, p. 183)
Nesse sentido, cumpre-nos explicitar que, a pele se constitui de duas camadas
distintas, a primeira mais fina e menos elástica, a epiderme, não deixa-se quase
distender, rompendo-se facilmente, e a segunda, mais elástica, deixa-se distender em
maior âmbito. Dessa forma, o orifício da epiderme torna-se muito maior que o da
derme.
Cumpre-nos também ressaltar à orla de contusão, sendo esta um anel de
coloração escura ao redor do orifício de entrada, decorrente do embate do projétil contra
a pele.
A orla de enxugo recebe esse nome devido ao projétil, recoberto de resíduos de
pólvora, fuligem, e ferrugem, trazidos no momento em que este atravessa o cano da
arma, enxuga-se ao atravessar a derme, depositando na superfície desta todas estas
impurezas.
Os ferimentos de entrada produzidos pelos instrumentos perfuro contundentes
em sua grande maioria apresentam as descritas orlas, de contusão, de escoriação, e de
enxugo.
ZONAS DE CHAMUSCAMENTO, ESFUMAÇAMENTO E TATUAGEM
Passamos agora a tratar das outras características essenciais para a análise das feridas
perfuro contusas.
No momento do disparo do projétil, além deste, encontra-se expelido pela arma
outras substâncias que servem para identificar algumas características das feridas
produzidas por estes. É expelido pelo cano da arma: Fumaça, variando de acordo com o
propelente utilizado, gases em alta temperatura e em combustão, grãos de pólvora, que
podem ter entrado ou não em combustão, bem como micropartículas metálicas, que se
desprendem do projétil no momento em que este produz atrito com o cano da arma.
Dependendo da distância em que o disparo foi efetuado, da idade e conservação
da arma, esses componentes diversos do projétil podem, ou não, atingir a vítima, já que
não possuem força suficiente para ir além de poucos centímetros do cano da arma.
Como já mencionado como uma das substâncias que podem deixar o cano da
arma juntamente com o projétil, os grânulos de pólvora que não entraram em
combustão, poderão se depositar em torno do orifício de entrada, dependendo da
distância do disparo.
Importante se faz, para o perito, observar a zona de tatuagem, já que, esta, além
de assinalar claramente o orifício de entrada, lhe informará sobre a distância em que o
disparo foi efetuado e também sobre a qualidade da pólvora que foi utilizada.
A zona de tatuagem, em relação à distância, terá um diâmetro maior ao redor do
orifício de entrada se o tiro foi dado de maior distância, e, diâmetro menor caso o
disparo seja feito de menor distância. Os grânulos de pólvora ficaram também mais
acumulados quanto mais próximo tenha ficado a vítima no momento do disparo.
Poderá também, o perito, verificar a qualidade da pólvora, segundo o exame dos
pontos arredondados desta ou incrustações lineares de variada coloração produzida. A
pólvora sem fumaça tatua menos intensamente já que queima de melhor maneira.
Importante também se faz, observar o perito que, no indivíduo que se mantinha
vivo ao receber o disparo, os grânulos de pólvora permanecerão, em parte, incrustados
na pele deste, e, alguns serão expulsos pela cicatrização da pele. Isso não ocorre no
indivíduo morto, já que não haverá tal cicatrizarão.
Entre os elementos que deixam o cano da arma no momento do disparo,
comporão a zona de esfumaçamento, os elementos de pólvora que incompletamente
entraram em combustão, depositando-se, nos casos de disparos próximos ao alvo, em
torno do orifício de entrada. Tais elementos, por permanecerem de modo superficial,
podem ser facilmente removidos por lavagem. Assim cabe ao perito observá-los e
descrevê-los antes e depois da lavagem.
Verifica-se a importância da zona de esfumaçamento, pois, semelhantemente à
zona de tatuagem, esta servirá para que o perito identifique o orifício de entrada, a
distância e a direção do disparo.
Quanto à zona de chamuscamento, refere-se tal zona a região da pele e dos pêlos
da vítima que possa vir a ser queimada pelos gases super aquecidosou grânulos de
pólvora que se queimam fora do cano da arma, nos casos de disparos a curta distância.
TRAJETÓRIA DO PROJÉTIL
O projétil ao atingir e adentrar no corpo da vítima produzirá um trajeto no
interior deste. Quando o projétil não atravessa o corpo da vítima tal trajeto ser um canal
fechado, quando de outra forma estar-se-á diante de um canal aberto. Tal trajeto não
existirá caso o projétil ferir superficialmente a vítima, ou no caso de o tiro estourar a
parte atingida dilacerando o corpo da vítima.
O trajeto poderá ser único para cada projétil, ou múltiplo, caso haja a
fragmentação do mesmo. O projétil terá percurso retilíneo, ou poderá sofrer desvios.
Acerca da trajetória do projétil dentro do corpo da vítima, esclarece Odon Ramos
Maranhão:
“As lesões produzidas por disparo de arma de fogo se devem, mais
freqüentemente, às ‘balas’ do que à carga de chumbo (grânulos). Por isso, é
necessário dar atenção a este tipo de ferimento. Quando o projétil atinge o
organismo – e nele penetra – pode atravessá-lo ou ficar nele retido. Se
considerarmos o túnel que o projétil cria no corpo da vítima, veremos que
pode ser penetrante ou transfixante.” (MARANHÃO, 2005, p. 298)
Sobre a penetração transfixante, ensina-nos Odon Ramos Maranhão acerca das
lesões assim provocadas:
“Quando há orifícios de entrada e de saída, épossível o estudo do percurso da
bala noorganismo. Em situação mais simples, unindo-se os dois pontos
(entrada e saída) temos adireção e o percurso do projétil. Entretanto,nem
sempre é tão fácil assim, como ocorreucom um indivíduo que tentou
suicídiodisparando a arma no ouvido direito e o projétil,depois de bater no
rochedo, caminhou entre ocouro cabeludo e a camada óssea, saindo juntoao
pavilhão da orelha esquerda... Quando setrata de ‘regiões moles’, o percurso
é direto,mas, se houver interposição de ossos ouvasos, tudo se modifica. A
reconstituição datrajetória é, por vezes, difícil e até impossível.”
(MARANHÃO, 2005, p. 303)
Em se havendo a arma suspeita de ter saído os disparos, deve-se verificar a sua
compatibilidade com o disparo que veio a matar uma pessoa. Deve haver
compatibilidade com o calibre da arma, em não existindo, pára-se aqui o estudo. O
segundo elemento é o número de raias da arma. Estas provas, todavia, são genéricas e
podem ser inconclusivas, devendo-se proceder o estudo de estriação lateral fina , este
por sua vez específico e determinante.
ORIFÍCIO DE SAÍDA
Em regra, o orifício de saída é maior que o orifício de entrada, é um ferimento
irregular, e possui tecidos orgânicos voltados para fora da ferida, isto visto que o projétil
se deforma por ser freqüentemente deformado pelos ossos e tecidos orgânicos durante
sua trajetória pelo corpo. Ademais, o orifício de saída não apresenta orlas de contusão,
escoriação, ou de enxugo, nem zonas de chamuscamento, esfumaçamento ou tatuagem.
Com atenção a diferença entre o orifício de saída e o de entrada, apresenta
Almeida Junior três pontos:
“1) o projétil sai que sai do corpo não é igual ao que entrou, pois, além de
possivelmente deformado pelos ossos, ainda traz consigo fragmentos de
tecidos; 2) o complexo epiderme-derme é evertido, de dentro para fora; 3) a
bala se enxuga na face profunda da derme, e não em sua face superficial.
Acresce que a força viva, na saída, e menor que na entrada.” (ALMEIDA
1998, p. 147/148)
Ressalta Del-Campo acerca do tema:
"Alguns projéteis especiais, de alta energia, com velocidades superiores a 750
m/s, em razão das ondas de choque produzidas pelo seu deslocamento,
costumam produzir ferimentos de saída de grandes proporções." (DEL-
CAMPO, 2007, p. 179.)
Sobre o orifício de saída, importante comentarmos acerca de suas diferenças
para com o orifícios de entrada: 1) o orifício de saída é dilacerado; 2) é evertido; 3)é
desproporcional ao projétil (maior); 4) não tem orlas e nem zonas.
Estas diferenças podem não ser tão evidentes e esquemáticas em cada caso, pois
a bala pode ter diferentes características, por exemplo: se penetrar no corpo após
ricochetear, não traça características tão claras o orifício de saída.
Por fim, necessária se faz uma breve consideração acerca dos projéteis retidos,
ou seja, aqueles que se alojam no corpo da vítima, não resultando, por conseqüência, em
um orifício de saída. O perito, ao deixar de encontrar um orifício de saída deve presumir
que o projétil esteja retido no corpo da vítima, devendo encontrá-lo através de uma
procura minuciosa. Por vezes, a bala se aloca no intestino da vítima, ou cai na corrente
sanguínea, o que pode dificultar em muito o trabalho do médico-legista.
AS VESTES
Certas vezes existem orifícios no vestuário da vítima que correspondem aos
feitos pelos projéteis, em outras ocasiões as vestes mostrarão sinais de combustão
produzidos pelos gazes superaquecidos, e sinais de resquícios de pólvora que saíram do
cano da arma. Os panos que a bala atravessa antes de atingir o corpo da vítima fornecem
fragmentos que, acompanhando o projétil, ora se mantém presos a ele, ora se distribuem
ao longo da lesão. Em alguns casos, na bala se grava, em “impressões” indumentárias, o
desenho do tecido. Dessa forma podem as vestes, em determinadas ocasiões, servir para
que o perito descubra características do disparo e da arma utilizada.
DISPAROS ENCOSTADOS
Nesses tipos de disparo, importa diferenciar se estes foram deferidos apenas
contra tecidos corpóreos, ou se incidiram sobre partes do coro e quere cobrem ossos
planos.
Na primeira ocasião descrita, o projétil e os demais elementos que saem do cano
da arma no momento do disparo penetram no interior do corpo da vitima causando uma
grande lesão interna, levando as zonas de chamuscamento, esfumaçamento, e tatuagem,
a ficarem todas no interior do corpo, e, ficando o orifício de entrada com forma circular
ou elíptica.
Dependendo da força em que a arma foi pressionada na região da pele em que
foi feito o disparo, faz-se possível a evidência da marca do cano da arma nesta região.
Na segunda ocasião, por ter uma região óssea na região atingida pelo disparo, o
projétil poderá, ou não, perfurar tal região, não conseguindo os gases e a pólvora, em
hipótese alguma, perfurá-la. Por ter nestes casos, um refluxo dos gases, haverá
uma explosão dos tecidos formando um ferimento de bordas invertidas e com formato
estrelado. Tal ferimento é denominado como mina de Hoffmann.
DISPAROS EM OSSOS
Freqüentemente são produzidas fraturas caso o disparo seja feito contra ossos
longos. Podendo, inclusive, haver mais de um orifício de Said ocasionado pelas
partículas de ossos que se despedaçam com o impacto do projétil. Nos casos dos ossos
planos diferencia-se facilmente o orifício de entrada do de saída em razão do cone de
dispersão formado pelos fragmentos ósseos.
PROBLEMAS PERICIAIS
Nesta parte iremos analisar os problemas médico-legais, de maior incidência, na
lesões por armas de fogo:
1) Identificação do atirador pelo exame da arma: Para se verificar o autor do
disparo, deve-se verificar a presença, em uma superfície lisa, da impressão digital. Para
tal, se faz necessário que haja cautela ao se manipular a arma, a fim de preservar este
vestígio.
2) Determinação da qualidade da pólvora: Para se determinar se o disparo foi
feito com pólvora negra ou pólvora sem fumaça a partir do exame do sarro.
3) Data do ultimo disparo: Quando se tratar de pólvora negra, as informações
são imprecisas e quando foi usada pólvora sem fumaça,serão nulas. No caso de pólvora
negra, após o tiro, percebe-se a presença de gás sulfídrico no cano, mas esse gás logo
desaparece, sendo possível durante algumas horas, assinalar a presença de sulfitos, os
quais gradualmente se convertem em sulfato. Quando se trata de pólvora sem fumaça,
pesquisamos nitrito e nitrato. O sarro pré existente antes do disparo pode prejudicar tais
exames e falsear os resultados.
4) Identificação da arma pelo exame do estojo: Os estojos encontrados no local
do crime, devem ser devidamente recolhidos e encaminhados ao laboratório para
exames. Com efeito, o estojo contem marcas mais ou menos individualizadoras da arma
a que serviram: marcas produzidas pela parte interna do cano; marca do percussor sobre
a espoleta; marcada espalda do cano sobre o talão; marca do extrator na gola do estojo.
Tais impressões variam de arma para arma.
5) Identificação da arma pelo exame da bala: O cano imprime a bala um certo
numero de marcas capazes de informar, não só a respeito do tipo,mas também da
própria individualidade da arma.
6) Qual a mão que atirou: Esta questão surgira no caso de suspeita de suicídio, e
poderá complicar-se caso a arma tenha sido posta,intencionalmente, na mão do cadáver,
a fim de simular o suicídio.
7) Distancia do tiro: Quesito de suma importância, pois a partir dele, poderemos
elucidar da maneira mais clara algum delito resultante de lesão por arma de fogo. Há
tiros “encostados”, isto e com a boca da arma tocando o alvo; tiros “próximos”, dados
no máximo, a alguns decímetros (entre eles se acham os tiros “a queima roupa”, de
pouquíssimos centímetros) e tiros “a distancia”.
8) Direção do tiro: A direção do tiro em relação o corpo da vitima será indicada
por duas ordens de elementos: os caracteres no orifício de entrada e a direção do trajeto
da lesão.
INTERESSE JURÍDICO
Diversos são os interesses jurídicos resultantes da realização da perícia em
lesões perfuro contusas, em especial aquelas provocadas por meio do disparo de armas
de fogo, acerca do tema Odon Ramos Maranhão destaca os principais:
“São vários os problemas periciais de interesse jurídico: a) natureza do fato:
acidente, suicídio ou homicídio; b) distância do disparo, para estudo da
autoria; c) identificação da arma também visando estabelecimento da autoria;
d) saber se se trata de lesão mortal (produzida em vida) ou pós-mortal (delito
impossível); e) na hipótese da lesão não ser mortal,quais as sequelas
restantes.” (MARANHÃO, 1998, p. 307.)
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA JUNIOR, António Ferreira. Lições de Medicina Legal. 22ª edição; São
Paulo: Companhia Editora Nacional, 1998.
CARDOSO, Leonardo Mendes. Medicina Legal para o acadêmico de direito. 2ª edição;
Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2009.
DEL-CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara. Medicina Legal. 4 ed.; São Paulo: Saraiva.
2007.
FRANÇA, Genival Veloso. Medicina Legal. 8ª edição; Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2008.
MARANHÃO, Odon Ramos. Curso Básico de Medicina Legal. 8ª edição; SãoPaulo:
Editora Malheiros, 2005.