Upload
carlos-macedo-lima
View
93
Download
4
Embed Size (px)
Citation preview
INTEREÇÕES MEDICAMENTOSAS
Fundamentos - Resumo.
©2008 Todos os direitos Reservados por interacoesmedicamentosas.com.br
Muitos pacientes requerem uma terapia com várias drogas, freqüentemente sob a
supervisão de vários médicos, isto aumenta o risco de interações medicamentosas adversas
importantes. A maioria das interações sérias entre drogas envolve um dos quatro processos
farmacocinéticos: absorção, distribuição, biotransformação e depuração renal. As
conseqüências clínicas das interações medicamentosas farmacocinéticas são resultantes do
aumento ou da diminuição dos efeitos terapêuticos ou tóxicos da droga envolvida. Para
avaliar a importância das interações medicamentosas que afetam a absorção gastrintestinal,
é necessário distinguir as interações que alteram a velocidade de absorção de uma outra
droga daquelas que alteram a quantidade de droga absorvida. O deslocamento de uma
droga de seu sítio de ligação protéica por outra pode resultar em alterações dos seus
efeitos. Embora ocorram essas interações de deslocamento da ligação, elas raramente
apresentam importância clínica, a menos que um outro mecanismo esteja presente ou em
determinadas situações específicas. As interações que envolvem a biotransformação de
drogas podem aumentar ou diminuir a quantidade de droga disponível para a ação pela
inibição ou pela indução respectivamente das enzimas biotransformadoras, principalmente
das isoenzimas do citocromo P450. O conhecimento das vias específicas da
biotransformação de uma droga, e dos mecanismos moleculares da indução ou da inibição
enzimática, pode auxiliar no planejamento de estudos de possíveis interações de uma droga.
As drogas são eliminadas pela excreção urinária através de três mecanismos: filtração
glomerular, reabsorção tubular, e secreção tubular ativa. As interações mais importantes
parecem ser aquelas que envolvem a competição pela secreção tubular. A compreensão dos
mecanismos fundamentais das interações medicamentosas não é útil somente para prevenir
a toxicidade ou efeitos adversos das drogas, mas também para o planejamento de regimes
terapêuticos seguros.
Introdução.
A saúde, que é definida, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), como sendo
um estado de completo bem-estar físico, mental e social” e não apenas a ausência de
desconforto ou de enfermidade, é uma das necessidades básicas do homem e tem sido sua
constante preocupação. Para conservá-la ou restaurá-la vem o homem, desde as primeiras
eras, lançando mão dos mais variados recursos, mormente aqueles destinados a evitar e
combater as doenças, sobretudo por meio de drogas e medicamentos.
O restabelecimento da saúde de um paciente está baseado tanto no diagnóstico
correto como numa terapêutica adequada. O conhecimento das propriedades básicas das
substâncias utilizadas para este fim, bem como de sua ação farmacológica, é fundamental
para a prática da medicina. Porém isto não é suficiente, pois é preciso pensar que o corpo
humano é um sistema complexo formado por uma infinidade de substâncias que fatalmente
entrarão em reação com os fármacos administrados. Também é natural de se pensar que no
caso da administração com fins terapêuticos, ou não, de mais de uma substância, estas
possam se interagir entre si no organismo. Os efeitos de um medicamento, quando
administrado concomitantemente com outros, podem ser diferentes dos efeitos esperados se
este medicamento fosse empregado isoladamente.(FONSECA AL,1991)
A prescrição de vários medicamentos para o tratamento de uma patologia, é uma
prática muito comum. Nos hospitais, a maioria dos pacientes pode receber várias drogas
simultaneamente. Nos serviços clínicos, o número médio de drogas administradas a
pacientes durante uma hospitalização pode variar de 10 a 13, sendo que muitos podem
receber até muito mais. No caso dos pacientes ambulatoriais, além dos medicamentos
prescritos, muitos costumam consumir analgésicos, medicamentos para resfriados,
antiácidos, anticoncepcionais e outras drogas sem prescrição. Considerando ainda que a
maioria das 50.000 especialidades farmacêuticas registradas na Divisão de Medicamentos,
da Secretaria da Saúde, é constituída de medicamentos com vários princípios ativos, a
probabilidade de interação entre os vários fármacos e modificação dos efeitos terapêuticos é
muito alta.
Na prática clínica, muitas das interações medicamentosas têm importância relativa,
com pequeno potencial lesivo para os pacientes, porém há interações com efeitos colaterais
graves, podendo inclusive levar o paciente a óbito, o que ressalta a importância do
conhecimento das interações e da identificação precoce dos pacientes em risco (OGA &
BASILE, 1994).
Foi relatado em um estudo de STEEL et al (1981), que 36% de 815 pacientes
admitidos em um hospital universitário apresentaram algum tipo de doença iatrogênica. Em
9% deles, o incidente foi considerado grave e em 2 % a doença iatrogênica provavelmente
tenha contribuído para a morte do paciente. A exposição a medicamentos foi um fator
particularmente importante em determinar complicações nos pacientes em estudo. Ainda de
acordo com estes autores as estimativas sobre a incidência de interações droga-droga
oscilaram de 3 a 5 %, para pacientes que recebiam poucos medicamentos; naqueles que
recebiam entre 10 a 20 drogas, a incidência alcançada foi de até 20%.
O conhecimento dos mecanismos prováveis das interações medicamentosas é a única
maneira do profissional de saúde estar bem preparado para analisar novos achados de modo
sistemático. Para planejar um regime terapêutico adequado ao paciente, é necessário estar
familiarizado com os princípios básicos das interações entre as drogas.
Classificação das interações.
As interações medicamentosas podem ser classificadas por seu mecanismo de
instalação. Embora, sob o ponto de vista pragmático, interessa ao clínico simplesmente
saber se a interação ocorre ou não e qual a sua magnitude; o conhecimento dos mecanismos
no processo interativo é de suma importância. Estes mecanismos nem sempre são
totalmente conhecidos e geralmente são complexos, o que torna difícil classificá-los com
precisão. Além disso, a interação muitas vezes é resultante de mais de um mecanismo,
porém, conforme o mecanismo predominante, as interações podem ser classificadas em
físico-químicas, farmacodinâmicas e farmacocinéticas.
Interações Físico-Químicas.
Pode haver interações entre duas ou mais substâncias por mecanismos puramente
físico-químicos. Estas interações podem ser chamadas de farmacêuticas, porque se referem
àquelas interações antes das drogas serem administradas, fora ainda do organismo,
especialmente com misturas destinadas a uso intravenoso.
Estas reações físico-químicas podem resultar na inativação dos efeitos biológicos de
uma ou ambas as drogas ou na formação de novo composto, cuja atividade difere da
esperada. Tais reações podem exteriorizar-se por precipitação, turvação, floculação e
alterações na cor da mistura, contudo, a ausência dessas alterações não garante a
inexistência de interação; neste caso somente o conhecimento dessa possibilidade impede o
uso indevido.
Os mecanismos físico-químicos freqüentemente observados nas interações
medicamentosas compreendem as reações de óxido-redução, inativação de um medicamento
pela incidência de luz, fenômenos de adsorção, como por exemplo o caso do carvão ativo
que adsorve os alcalóides na sua superfície porosa, reações de precipitação e formação de
complexos, neutralização ácido-básica. Abaixo estão demonstrados alguns exemplos de
interações físico-químicas que podem ocorrer.
Exemplos de interações físico-químicas ou incompatibilidades farmacêuticas.
Os beta-lactâmicos podem ser inativados pelo pH ácido de soros glicosados.
Alguns antineoplásicos, como a doxorrubicina devem ser protegidos da luz por
serem fotossensíveis e devem ser administrados em equipos escuros.
Um agente conservador pode inativar outro medicamento. Ex. bissulfito para as
penicilinas.
O gluconato de cálcio e fosfato de potássio se forem misturados em nutrição
parenteral podem precipitar.
Os beta-lactâmicos podem ser inativados pelo pH ácido de soros glicosados.
As penicilinas e as cefalosporinas reagem com o grupo amino dos aminoglicosídeos
e os inativam, portanto não devem ser misturados em soluções intravenosas.
As tetraciclinas são agentes quelantes eficientes contra vários cátions com os quais
formam complexos pouco solúveis.
Inativação do nitroprussiato pela luz.
Adsorção da insulina pelo frasco e equipos.
Interações Farmacodinâmicas.
São as interações em que os efeitos finais são resultantes das ações farmacodinâmicas
próprias de cada agente terapêutico administrado e podem ocorrer em nível de receptores e
estruturas intimamente associadas a eles, ou ainda quando os fármacos agem em sistemas
diferentes mas o efeito de um deles é alterado pelo efeito do outro. As interações
farmacodinâmicas são quase sempre previsíveis se tivermos um profundo conhecimento da
farmacologia das drogas envolvidas.
A farmacodinâmica está relacionada com os efeitos bioquímicos e fisiológicos das
drogas e o seu mecanismo de ação. As interações medicamentosas classificadas como
farmacodinâmicas se referem quando duas ou mais drogas produzem efeitos que se
interagem ou quando a interação ocorre a nível de receptores farmacológicos.
Um receptor farmacológico é qualquer componente biológico que interage com uma
molécula da droga, produzindo um efeito sobre o organismo.
Quando a ligação da droga ao componente não levam a efeito algum, como no caso da
ligação dos medicamentos às albuminas, o componente não é denominado receptor.
Local de ação dos fármacos:
Água:
Os diuréticos osmóticos, como o manitol, não são reabsorvidos pelo rim e portanto
retém água na luz do túbulo renal, que de outra forma seria reabsorvida. Portanto, eles
atuam sobre a água corporal ao produzirem diurese. Alguns laxantes, como o ágar ou a
metilcelulose, tem moléculas grandes demais para serem absorvidas pelo intestino. Quando
administrado por via oral, elas incham por absorverem água, retendo assim uma quantidade
maior de água na luz intestinal. A massa resultante promove a motilidade intestinal e alivia
a constipação. Os dextrans de alto peso molecular, quando injetados por via endovenosa,
fazem com que a água dos tecidos entre para a circulação expandindo a volemia.
Íons H+ ou OH-:
Drogas como o cloreto de amônio e bicarbonato de sódio usadas para acidificar e
alcalinizar a urina atuam sobre os íons H+ ou OH-.
Íons metálicos:
Podem ser considerados como receptores dos agentes quelantes. Dimercaprol-Hg,
Penicilamina-Cu (na doença de Wilson) e o EDTA-Pb.
Receptores específicos:
Enzimas: Várias classes de medicamentos atuam sobre enzimas como
Antibacterianos, Antineoplásicos, Cianeto, Digitálicos, Antidepressivos, Anti-hipertensivos,
etc.
Ácidos Nucléicos: DNA e actinomicina D, RNA e estreptomicina.
Esteróis da membrana: Os antibióticos poliênicos (nistatina, anfotericina B) ligam-
se especificamente ao ergosterol e causam um vazamento ou lise da membrana da célula
fúngica.
Proteínas Receptores: A grande maioria das drogas atuam sobre receptores
específicos, com exceção de: Anestésicos, a maioria dos hipnóticos e sedativos; álcoois,
drogas osmoticamente ativas, drogas acidificantes e alcalinizantes e anti-sépticos. Os
receptores desencadeiam muitos tipos diferentes de efeitos celulares, alguns dos quais
podem ser muito rápidos, como aqueles envolvidos na transmissão sináptica, que
geralmente ocorrem na ordem de milissegundos. Outros efeitos mediados por receptores,
por exemplo, os produzidos pelo hormônio tireóideo ou por vários hormônios esteróides, são
muito lentos e levam várias horas ou dias. Em termos de estrutura molecula e da natureza
da transmissão, podemos distinguir quatro tipos de receptores protéicos:Receptores
ligados a canais ou ionotrópicos (exemplos, receptor nicotínico de acetilcolina, receptor
GABA e receptor de Glutamato); Receptores acoplados à Proteína G (exemplos,
receptores para muitos hormônios, receptor muscarínico, receptor
adrenérgico); Receptores ligados à quinase incluem os receptores da insulina e de várias
citocinas e fatores de crescimento; Receptores que regulam a transcrição de genes ou
Receptores Nucleares (exemplos, receptores para hormônios esteróides e para hormônio
da tireóide e outros agentes como o ácido retinóico e a VitaminaD).
FIGURA 29 - Local de ação dos fármacos.
As interações farmacodinâmicas podem ser sinérgicas ou antagônicas dos efeitos
tóxicos ou benéficos e são divididas em: interações sobre receptores, quando duas ou mais
drogas atuam sobre o mesmo sistema de receptores. Por exemplo as interações entre
agonista e antagonista adrenérgico ou interações sobre o sistema de controle fisiológico,
quando duas mais substâncias, mesmo agindo em receptores distintos, produzem seu efeito
em um mesmo sistema fisiológico, como por exemplo os vasodilatadores e os diuréticos que
atuando por mecanismos diferentes vão diminuir a pressão arterial. Os efeitos secundários
de várias drogas podem ser a causa de interações farmacodinâmicas. Uma droga pode
alterar o meio interno normal, desse modo aumentando ou diminuindo o efeito de outro
fármaco. Um exemplo bem conhecido deste tipo de interação é a intensificação dos efeitos
tóxicos da digoxina como resultado de uma hipocalemia induzida por diuréticos. Essas
interações são altamente previsíveis, uma vez que estão intimamente relacionadas com a
ação e o efeito das drogas no organismo. Praticamente as associações medicamentosas são
realizadas baseadas em interações farmacodinâmicas que propiciam a terapêutica.
Interações envolvendo a junção neuromuscular:
FIGURA 30 - Exemplos de interações na junção neuromuscular: 1 – Aminoglicosídios; 2 - Bloqueadores Neuromusculares; 3 - Anestésicos, Depletores de K+; 4 - Bloqueadores de canais de Ca++.
Interações nos receptores colinérgicos:
FIGURA 31 - Interações nos receptores colinérgicos.
Hexemetônio bloqueia competitivamente a ação despolarizante de carbacol nas
sinapses nicotínicas dos gânglios.
Alguns antibióticos (por exemplo, canamicina, gentamicina) potencializam o bloqueio
despolarizante produzido pela succinilcolina na junção neuromuscular.
A atropina bloqueia competitivamente a pilocarpina nos receptores muscarínicos.
Os inseticidas organofosforados atuam inibindo a acetilcolinesterase, aumentando
portanto os níveis de acetilcolina, principalmente nos terminais parassimpáticos, estes
efeitos são antagonizados pela atropina (antagonista colinérgico) e pela pralidoxima
(ativador da acetilcolinesterase) que são usados como antídotos destes inseticidas.
A atropina é utilizada para diminuir a salivação e secreções excessivas do trato
respiratório, em anestesia para cirurgias. Depois da cirurgia se utiliza um inibidor da
acetilcolinesterase (neostigmina) para reverter os efeitos da atropina.
Interações nos Receptores adrenérgicos:
FIGURA 32 - Interações em receptores adrenérgicos.
A fentolamina, as fenotiazinas e fenoxibenzamidas bloqueiam a ação da noradrenalina
sobre os receptores alfa-adrenérgicos nos vasos sangüíneos.
Metoprolol bloqueia os agonistas beta 1 adrenérgicos (cardíacos) como, por exemplo,
o isoproterenol.
Os Antidepressivos Tricíclicos bloqueiam a captação de noradrenalina, aumentando
portanto a concentração pós-sinápticas de neurotransmissores ativos.
A guanetidina diminui a liberação de noradrenalina, e quando se efetua um pré-
tratamento crônico com guanetidina, pode-se esperar que os receptores de noradrenalina
pós-sinápticos estejam “ hipersensíveis” para compensar os níveis cronicamente baixos de
noradrenalina. Assim, quando os baixos níveis sinápticos de noradrenalina são levemente
aumentados pela desipramina, verifica-se elevação significativa da pressão arterial.
As interações que envolvem anti-hipertensivos e antidepressivos tricíclicos, L-Dopa,
fenotiazinas, simpatomiméticos de ação direta e indireta e congêneres da anfetamina quase
sempre possuem uma base semelhante.
Nunca se deve associar os Inibidores da Monoaminooxidase (IMAO) com
antidepressivos tricíclicos, com riscos de episódios hiperpiréticos, convulsões graves, crises
hipertensivas e até morte. Deve ser observado um intervalo mínimo de 14 dias entre a
suspensão dos IMAO e o início do tratamento com tricíclicos e vice-versa.
Os hidrocarbonetos anestésicos gerais, o éter, o clorofôrmio sensibilizam os
receptores do coração à ação das catecolaminas.
Interações Farmacocinéticas.
São assim chamadas as interações em que um dos fármacos modifica a cinética de
outro administrado concomitantemente. Em 1953, Dost propôs o termo farmacocinética
para descrever o movimento da droga através do organismo. A farmacocinética igualmente
estuda quantitativamente a cronologia dos processos metabólicos da absorção, distribuição
e eliminação das drogas.
As interações farmacocinéticas são as mais freqüentes e promovem, muitas vezes,
influência significativa sobre a terapêutica medicamentosa. Ao contrário das interações
farmacodinâmicas que são quase sempre previsíveis, as alterações na farmacocinética de
uma droga induzida por outra não costumam ser intuitivamente óbvias. Essas interações
recebem muita atenção, e muitos exemplos são encontrados na literatura.
A farmacocinética utiliza metodologia matemática para descrever as variações no
tempo dos processos de absorção, distribuição, biotransformação e excreção. A variável
básica desses estudos é a concentração das drogas e dos seus metabólitos nos diferentes
tecidos e excreções do organismo. Esta concentração está correlacionada com a via de
administração, com a dose empregada, com a eliminação e varia com o tempo da
observação.
Quando uma droga se transfere de uma parte (ou compartimento) do corpo para
outra, essa transferência segue certas regras da cinética que dizem respeito, especialmente,
à velocidade de transferência e ao que dela depende, isto é, as modalidades de cinética de
primeira ordem, de ordem zero ou do tipo Michaelis-Menten.
A escolha do modelo farmacocinético requer considerações especiais e tem que levar
em conta as características físicas e químicas das drogas, assim como o seu compartimento
no sistema biológico (SILVA,1998).
A concentração sérica de fármacos está em equilíbrio dinâmico com os receptores
desses fármacos. Portanto, o nível sérico de um fármaco é excelente indicador para os
efeitos tóxicos e farmacológicos. Os parâmetros farmacológicos que representam a
absorção, distribuição e eliminação são obtidos do perfil de concentração plasmática do
fármaco.
Estudos laboratoriais mostram a estreita correlação entre o nível sangüíneo dos
fármacos e a intensidade de seus efeitos. O efeito de um fármaco geralmente aparece
quando a concentração deste no sangue atinge um certo nível plasmático efetivo, porém a
elevação deste nível pode causar sérios problemas ao aproximar-se do nível plasmático
tóxico. A relação entre o nível plasmático efetivo e o nível plasmático tóxico é denominada
índice terapêutico de um fármaco (GREENBLATT & KOCH-WESWER,1975).
O perfil farmacocinético de uma droga se estabelece através da análise dos seguintes
tópicos:
modelos farmacocinéticos;
ordens de cinética; absorção;
biodisponibilidade;
meia-vida biológica;
concentração plasmática;
distribuição (volumes real e aparente de distribuição);
biotransformação;
excreção.
Quando duas ou mais drogas são administradas concomitantemente elas podem ter
alterações em seu perfil farmacocinético. A absorção do local de administração, a
distribuição, biotransformação e eliminação determinam o tempo em que a droga começa a
agir, a intensidade e duração da ação; portanto, qualquer outra substância que interagir
nestes processos vai influenciar no tempo ou na intensidade de ação de um medicamento.
O conhecimento destas interações pode levar o clínico a fazer modificações na
dosagem e/ou na posologia destas drogas com o intuito de evitar possíveis efeitos
indesejados (GIBALDI & LEVY,1976).
A redução no grau de absorção ou a aceleração da biotransformação de um fármaco
ocasiona redução do seu nível plasmático e tende a prejudicar a eficácia terapêutica.
Inversamente, a inibição da eliminação de um fármaco (por biotransformação e/ou por
excreção) resulta quase sempre na exacerbação dos efeitos, inclusive da toxicidade. Essas
variações têm grande significado, principalmente para aqueles fármacos de pequena
margem de segurança, em que as doses terapêuticas e tóxicas estão bastante próximas.
Têm-se, por exemplo, os antibióticos aminoglicosídeos, quinidina, procainamida, fenitoína,
digitálicos, os anticoagulantes orais entre outros.
As interações farmacocinéticas podem ser classificadas baseando-se no seu
mecanismo, ou seja, na fase farmacocinética em que ocorre a interação, conforme pode ser
visto no quadro 2.
Classificação das interações medicamentosas baseadas nas fases farmacocinéticas
suscetíveis à interferência.
Absorção:
Interações físico-químicas no trato gastrintestinal
Motilidade gastrintestinal
Alteração na função da mucosa
Flora bacteriana
Distribuição:
Fluxo sangüíneo
Ligação tecidual
Ligação às proteínas plasmáticas
Transporte ativo para o local de ação
Biotransformação:
Indução Enzimática
Inibição Enzimática
Excreção:
Filtração Glomerular
Reabsorção Tubular
Secreção Tubular
Excreção biliar
Absorção.
A menos que uma droga atue topicamente ou seja, no seu próprio local de aplicação,
ela deve inicialmente penetrar no sangue para depois ser distribuída para o seu local de
ação. A mera presença da droga no sangue, contudo, não provoca uma resposta
farmacológica; para que seja eficaz, a droga deve deixar o espaço vascular e penetrar nos
espaços intracelulares e/ou extracelulares. A velocidade com a qual uma droga atinge seu
local de ação depende de dois processos: sua taxa de absorção e sua taxa de distribuição.
Assim sendo a absorção envolve a passagem da droga de seu local de administração
para o sangue e a distribuição envolve o transporte da droga para os tecidos. A
compreensão das características estruturais e funcionais que influenciam a passagem das
drogas nas membranas biológicas tem sido alvo de grandes esforços. Apesar de algumas
substâncias serem translocadas por mecanismos de transporte especializados e de
compostos polares pequenos poderem ser filtrados através dos poros membranosos, a
maioria dos compostos exógenos penetra nas células mediante difusão através das
membranas lipídicas.
No estudo da absorção das drogas, os seguintes itens devem ser analisados:
membranas biológicas;
propriedades físico-químicas das moléculas das drogas;
forças responsáveis pela passagem das drogas através das membranas;
modalidade de absorção das drogas;
locais de absorção das drogas e vias de administração.
Ingestão Oral.
O grau de absorção dos fármacos é decisivo, para se obter o nível desejado da
substância no sangue, particularmente quando a via escolhida é a oral. A absorção pelo
trato gastrintestinal (TGI) é regulada por fatores, tais como o estado físico da droga, a área
da superfície para a absorção, o fluxo sanguíneo esplâncnico, e a concentração no local da
absorção. Uma vez que grande parte da absorção pelo TGI ocorre por processos passivos, o
fármaco é mais bem absorvido na forma não-ionizada e mais lipofílica. Assim, poder-se-ia
esperar uma absorção ótima de ácidos fracos no meio ácido do estômago, enquanto a
absorção de bases poderia ser favorecida no intestino delgado relativamente alcalino,
todavia, é uma simplificação excessiva extrapolar o conceito de partição do pH para uma
comparação de duas membranas biológicas diferentes, como os epitélios do estômago e do
intestino. O estômago é revestido por uma membrana espessa, coberta de muco, com
pequena área de superfície e alta resistência elétrica.
A principal função do estômago é digestiva; por outro lado, o epitélio do intestino
possui uma área de superfície extremamente grande - ele é fino, tem baixa resistência
elétrica e sua principal função é facilitar a absorção de nutrientes. Dessa forma, qualquer
fator que acelere o esvaziamento gástrico poderá aumentar a velocidade de absorção de um
fármaco, ao passo que qualquer fator que retarde o esvaziamento do estômago
provavelmente terá o efeito oposto, independente das características do fármaco.(BENET et
al, 1996)
Estudos experimentais obtidos no trabalho clássico de BRODIE (1964) e de estudos
mais recentes são compatíveis com a seguinte conclusão: a forma não-ionizada de uma
droga será absorvida mais rapidamente do que a forma ionizada em qualquer lugar do TGI.
No entanto, a velocidade de absorção de um fármaco no intestino será maior do que a no
estômago mesmo quando o fármaco estiver predominantemente ionizado no intestino e em
grande parte não-ionizado no estômago.
Os fármacos que são destruídos pelo suco gástrico ou que irritam a mucosa gástrica,
são administrados algumas vezes em formas com um revestimento que impede sua
dissolução no meio ácido do estômago. Todavia, algumas preparações protegidas também
podem resistir à dissolução no intestino, determinando muito pouca absorção do fármaco.
A velocidade de absorção de um fármaco está estreitamente relacionada ao tempo
necessário para que o fármaco atinja o seu nível plasmático efetivo e conforme a natureza
da substância ingerida por via oral, absorção se dá em diferentes locais do trato digestivo.
Assim, substâncias altamente lipossolúveis são absorvidas já pela mucosa bucal. Entre os
fármacos mais utilizados por esta via, citam-se os nitratos e os nitritos, em formulações
sublinguais para o tratamento de angina do peito. O segmento terminal do intestino grosso,
o reto, também pode servir como local útil para administração de drogas, particularmente
quando a via oral é inadequada. Esta via protege sensivelmente as drogas não apenas de
alterações, mas também das reações de biotransformação que ocorrem no fígado.
Entretanto, a absorção por esta via é freqüentemente irregular e incompleta e muitas
drogas causam irritação da mucosa retal.
O Estudo da Farmacocinética nas Interações em Nível de Absorção
Em termos de importância clínica, a primeira etapa para classificar as interações que
influenciam a absorção das drogas envolve as alterações na concentração máxima atingida
no plasma (Cmáx) e no tempo decorrido para atingir esta concentração (tmáx) quando
comparadas com condições controle.
Os efeitos das interações envolvendo a absorção no perfil da concentração plasmática
da droga são ilustrados na figura 1. As interações clinicamente significantes são avaliadas
geralmente levando-se em conta a taxa de absorção, a Cmáx, o tmáx e a área sob a curva
concentração-tempo (ASC).
FIGURA 1 - Os efeitos das interações envolvendo a absorção no perfil da concentração plasmática da droga. a) Absorção acelerada. b) Absorção retardada. c) Absorção diminuída. d) Absorção aumentada. Em todos os casos, a linha sólida representa o controle e a linha pontilhada representa o efeito da interação. Índice terapêutico é a diferença entre a concentração mínima efetiva e a concentração tóxica. ASC = área sob a curva concentração-tempo. Cmáx. = concentração máxima atingida no plasma; tmáx = tempo para atingir a Cmáx. Notar que quando o índice terapêutico é estreito, variações no grau de absorção da droga pode ser importante clinicamente, uma vez que pode atingir concentrações plasmáticas abaixo da concentração terapêutica assim como atingir concentrações tóxicas. Adaptado de FLEISHER et al, (1999).
Os modelos farmacocinéticos para se estudar os efeitos das interações durante a
absorção são definidos com base em 4 possíveis etapas limitantes da absorção, que incluem
a permeabilidade das drogas nas membranas biológicas, taxa de desintegração e dissolução
da forma farmacêutica, esvaziamento gástrico e o trânsito do conteúdo no TGI, e efeito de
primeira passagem (biotransformação da droga na mucosa intestinal ou no fígado).
Mecanismo de Interações Medicamentosas na Absorção
Os processos de esvaziamento gástrico, trânsito intestinal, desintegração e dissolução
da forma farmacêutica, difusão da droga dissolvida pelo lúmen intestinal e o contato com as
membranas das células absortivas, assim como todos os processos envolvidos na passagem
da droga para a corrente sangüínea podem ser alterados por várias interações e, portanto,
podem influenciar a absorção das drogas.
Os processos de absorção que podem ser influenciados por interações estão ilustrados
na figura 2.
Os mecanismos deste tipo de interação podem ser divididos em duas categorias
principais: interações físico-químicas envolvendo mudanças na estabilidade, solubilidade e
difusão e interações fisiológicas ou bioquímicas.
FIGURA 2 - Os processos de absorção que podem ser influenciados por interações de drogas
com outras drogas e de drogas com alimentos.
Interações físico-químicas
As interações físicas e químicas podem ocorrer entre drogas, entre componentes
específicos da alimentação e entre componentes da formulação farmacêutica. Estes tipos de
interações envolvem a desintegração da forma farmacêutica (comprimidos, drágeas e
cápsulas), dissolução da droga e a degradação da droga.
Esses mecanismos também são importantes para antagonizar os efeitos exacerbados
de fármacos administrados em altas doses, assim como para prevenir efeitos tóxicos de
agentes não medicamentosos, e podem ser usados com fins terapêuticos. Uma interação
muito utilizada no caso de intoxicações por via oral, é a administração de carvão ativado que
absorve outras drogas na sua superfície porosa e assim diminui a absorção do agente tóxico.
Influência na taxa de dissolução
A concentração da droga que está em solução na luz intestinal, e portanto, disponível
para a absorção, é determinada pela taxa de dissolução da droga. Esta taxa de dissolução
pode ser afetada pelo pH do meio. Bases fracas tem velocidade de dissolução diminuída em
pH alto, enquanto que ácidos fracos se dissolvem mais rapidamente nestas condições.
Um estudo realizado por CARVER et al (1999) mostra que pacientes que receberam
alimentos concomitantemente com Indinavir (uma base fraca inibidora de protease),
comparado com a administração em jejum, tiveram uma diminuição significativa na
absorção do medicamento. Sendo que a área sob a curva concentração-tempo (ASC) de 0 a
infinito diminuiu em 68%, 45%, 34% e 30% nos pacientes que receberam alimentos
protéicos, carboidratos, gorduras e alimentos de alta viscosidade, respectivamente,
comparados ao grupo controle que recebeu o Indinavir em jejum. A Cmáx foi diminuída em
74%, 59%, 46% e 36%, e o tmáx foi prolongado de 1 hora para 3.8, 3.6, 2.1 e 2.0 horas para
proteínas, carboidratos, gorduras e alimentos viscosos respectivamente, demonstrando que
a elevação do pH gástrico por alimentos pode levar a precipitação de drogas. A redução da
concentração plasmática da droga observada com a ingestão de outros alimentos que não
causam elevações apreciáveis do pH gástrico indica que outros fatores também podem estar
influenciando na absorção do Indinavir.
A dissolução e a absorção de uma droga ácida como o ibuprofeno, um medicamento
antiinflamatório não esteróide (MAINE), poderiam ser aumentadas com a utilização de
alimentos e elevação do pH gástrico.
A formação de complexos e quelação entre drogas e íons metálicos presentes em
alimentos da dieta e em drogas antiácidas, representa um segundo tipo de interação físico-
química que diminui a dissolução da droga e conseqüentemente a sua absorção. Uma
interação clinicamente importante é a diminuição da absorção de fluoroquinolonas devido à
formação de complexos com íons metálicos presentes nos alimentos e antiácidos, que
resultam na perda da eficácia antibacteriana. Foi constatada uma ocorrência de 22 a 76 %
deste tipo de interação em pacientes que são medicados com estes agentes. A administração
concomitante de antiácidos a base de alumínio e magnésio e sucralfato tem os maiores
impactos na biodisponibilidade de quinolonas, seguidos por ferro, cálcio e zinco.
(LOMAESTRO & BAILE, 1995)
A adsorção e ligação de drogas com componentes da alimentação como as pectinas
também podem diminuir a taxa de dissolução. Da mesma forma, a colestiramina e o
colestipol que são resinas trocadoras de íons (para eliminação de sais biliares e redução de
colesterol) formam complexos com uma série de medicamentos (antidepressivos,
neurolépticos, digitálicos, anticoagulantes) diminuindo a sua absorção.
O efeito de goma guar (“guar gum”), um medicamento a base de fibra alimentar
comercializado no Brasil com o nome de BioFiber, sobre a absorção de digoxina e
fenoximetil penicilina (penicilina V, ou Pen V), foi estudado por HUUPPONEN et al (1984),
que verificaram que a goma guar reduz a concentração sérica de digoxina durante o período
absortivo. No entanto, a mesma quantidade de digoxina foi encontrada na urina de
pacientes que receberam a fibra e de pacientes que não receberam. Tal fato, porém não foi
verificado com a Pen V, uma vez que a Cmáx e ASC foram reduzidas pela administração de
goma guar.
Influência na taxa de degradação
Problemas relacionados à instabilidade em meio ácido de antibacterianos orais
(penicilina, eritromicina) estão sendo resolvidos através da elaboração de compostos mais
estáveis. Em outros casos, formulações farmacêuticas adequadas são utilizadas para
minimizar a degradação ácida da droga em preparações orais. Por exemplo, a didanosina,
um inibidor da transcriptase reversa instável em meio pH baixo, é formulado com um
antiácido para diminuir a instabilidade da droga no estômago.
A hidrólise enzimática ainda constitui um fator limitante para a administração oral de
drogas de natureza protéica como a insulina. Na tentativa de superar esta limitação, um
grande número de formulações, incluindo microsferas e lipossomas, estão sendo
investigados.
Interferência na difusão da droga pelo TGI
Barreiras físicas como a viscosidade do conteúdo gastrintestinal (GI) pode diminuir a
velocidade de difusão da droga da luz intestinal para as membranas absortivas,
principalmente no duodeno , quando uma droga é ingerida concomitantemente com
alimentos sólidos ou viscosos. No jejuno, a diluição e a digestão do alimento, diminuirão a
viscosidade; assim, os efeitos devido à viscosidade do meio podem resultar em diminuição
na absorção de drogas que são absorvidas preferencialmente na porção inicial do intestino
delgado.
Interações que interferem nos mecanismos fisiológicos do trato GI
A interação de drogas com alimentos, outras drogas e mesmo com os excipientes da
formulação farmacêuticas podem alterar a função fisiológica GI e influenciar na absorção. A
absorção das drogas e as interações estão relacionadas com as diferenças existentes entre
as porções do TGI (quadro 3).
QUADRO 3 - Propriedades Fisiológicas do TGI em estado de jejumRegião pH Tempo de permanência
Estômago 1.5-2 0-3 horasDuodeno 4.9-6.4 3-4 horas
Jejuno 4.4-6.4 3-4 horasÍleo 6.5-7.4 3-4 horas
Cólon 7.4 mais que 18 horas
A idade e algumas doenças podem alterar a fisiologia GI e intensificarem as
conseqüências das interações medicamentosas na absorção. No quadro 4 temos
resumidamente algumas alterações na fisiologia do TGI devido a estes fatores.
QUADRO 4 - Alterações na fisiologia GI devido à idade ou a doençasSituação Mudanças na fisiologia GI
Idade avançadaDiminuição da taxa de secreção ácida e aumento do pH gástrico
Irritação ou doenças intestinais inflamatórias
Aumento do transporte paracelular e diminuição de transporte mediado por transportadores específicos
Remoção cirúrgica do trato GI
Diminuição da área de absorção
Fibrose cística Diminuição do pH intestinalAIDS Diminuição da secreção ácida e aumento no pH gástrico
Fonte: FLEISHER D et al (1999).
Interações envolvendo o trânsito GI
As interações na luz do TGI incluem mudanças no pH e taxa de esvaziamento gástrico,
alterações na motilidade intestinal e nas secreções (intestinal, pancreática e biliar).
A taxa de esvaziamento gástrico afeta a transferência da droga (forma dissolvida ou
não) para os sítios de absorção no intestino. Um grande número de fatores influencia a
velocidade de esvaziamento gástrico, incluindo o volume e conteúdo estomacal, calorias,
osmolaridade, viscosidade, temperatura e capacidade de seqüestro de cálcio, e estes fatores
podem ser responsáveis pela variação na absorção de certas drogas. A alteração do pH
gástrico provocado pelos alimentos protéicos ou antiácidos pode exercer influência também
na velocidade da passagem do conteúdo gástrico para o intestino, além de alterar o grau de
ionização de eletrólitos fracos presentes no estômago.
Existam drogas que afetam a motilidade do TGI e, portanto, interferem na velocidade
e/ou no grau de absorção de outras drogas administradas concomitantemente. É importante
salientar que a absorção pode ter a sua velocidade reduzida, embora seja completa, visto
que ela ocorre ao longo de todo o TGI. Agentes GI pró-cinéticos (metoclopramida,
domperidona e cisaprida) aumentam a velocidade de esvaziamento gástrico e estes efeitos
podem propiciar o aparecimento mais precoce de concentrações máximas de outras drogas
administradas por via oral. A metoclopramida aumenta a velocidade de absorção de várias
classes de drogas, acarretando uma diminuição do tmáx e aumento da Cmáx, porém, o
efeito desses agentes na ASC de zero a infinito, quando mensuradas, não é consistente. A
cisaprida e a domperidona parecem ter efeitos similares, mas há menos estudos sobre estes
produtos. Apesar de muitos dos efeitos descritos na literatura serem de pequena
importância clínica, eles podem ser bastante significativos quando se prescreve drogas com
baixo índice terapêutico. (GREIFF & ROWBOTHAM, 1994)
Todos os analgésicos opióides (por exemplo, codeína, morfina) e as drogas
anticolinérgicas (atropina, loperamida) diminuem a velocidade de esvaziamento gástrico e a
motilidade intestinal e esta diminuição encontra-se associada a uma absorção mais lenta, a
Cmáx menor da droga e um Tmáx maior. Porém o óleo de rícino e outros catárticos que
aumentam a motilidade intestinal também podem diminuir o grau de absorção das drogas.
A interferência também pode ser indireta, por exemplo, substâncias como a levodopa,
a metildigoxina ou a penicilina, se encontram metabolizadas ou degradadas no estômago; se
o esvaziamento gástrico é reduzido e o tempo de permanência no estômago aumentar, a
quantidade disponível para o organismo é diminuída.
Alterações da função da mucosa induzidas por drogas
Vários estudos in vitro ou in vivo têm mostrado que agentes que alteram o muco GI e
as membranas epiteliais podem modificar a absorção de drogas. Algumas drogas podem
aumentar a fluidez da membrana da mucosa o que pode levar a um aumento da difusão de
substâncias através da membrana, resultando em maior taxa de absorção. As drogas com
toxicidade GI específica (por exemplo, a colchicina) podem lesar a mucosa ou bloquear o
transporte ativo. Teoricamente, estas ações podem resultar em interações com outros
fármacos.
A competição entre diferentes drogas e/ou nutrientes por transportadores da
membrana intestinal responsáveis pela absorção tem sido demonstrada em pesquisas
realizadas in vitro e in vivo. Em estudos clínicos, uma diminuição na absorção relacionada
com aumento da dose sugere que pode estar acontecendo uma saturação na absorção
mediada por transportadores específicos, porém tem-se dificuldade em se demonstrar
interações medicamentosas devidas a esta competição em ensaios clínicos.
Interações com vias de eliminação intestinal
Dados recentes sugerem que a absorção de drogas pode ser comprometida por
mecanismos de eliminação intestinal, incluindo secreção e a biotransformação intestinais.
Tem-se levantado a hipótese (CAVET et al, 1996) que uma competição entre digoxina e
antagonistas de cálcio (verapamil e nifedipina), ou entre digoxina e vimblastina, pela
eliminação intestinal via P-glicoproteína pode contribuir para o aumento da concentração
plasmática de digoxina. A eliminação intestinal de drogas pela P-glicoproteína e outros
possíveis transportadores na membrana da mucosa intestinal pode limitar a absorção de
várias drogas.
A eliminação intestinal pode ser importante quando a droga é utilizada em baixas
concentrações, as quais não são capazes de saturar os transportadores presentes nas
membranas intestinais. Um estudo conduzido por ZHOU et al (1999), mostrou que uma
diminuição significativa na absorção do ácido 5-aminosalicílico (5ASA), uma droga utilizada
no tratamento de doença inflamatória intestinal, ocorre quando esta droga se apresenta em
baixas concentrações no lúmen intestinal. O transporte e o metabolismo do 5ASA foram
estudados em culturas de células Caco-2 e mostrou que em níveis abaixo de 200 mg/ml no
lúmen intestinal (concentrações que são normalmente encontradas em apresentações
farmacêuticas de liberação lenta) a eliminação intestinal (metabolismo pela N-
acetyltransferase e secreção do 5ASA) é responsável por 50% da sua eliminação toda;
porém este processo pode ser saturado em concentrações altas da droga. A eliminação
intestinal pode aumentar drasticamente quando a droga é administrada com alimentos,
devido a um maior tempo de exposição e baixa concentração da droga favorecendo as vias
de eliminação intestinal, o que.pode afetar de maneira significativa os níveis teciduais e
portanto, pode ser um importante fator na determinação da resposta terapêutica.
A descoberta de que várias drogas são metabolizadas pelo citocromo P450 (CYP) 3A4
intestinal, determina outra fonte de interação envolvendo a eliminação intestinal. Interações
entre suco de “grape-fruit” e drogas metabolizadas pelo CYP3A4 intestinal podem trazer
conseqüências clínicas importantes devido a um aumento da biodisponibilidade destas
drogas, muito provavelmente pela inibição do metabolismo oxidativo da membrana
intestinal. Os componentes dos sucos de frutas cítricas que são responsáveis por esta
interação não estão totalmente determinados, porém sabe-se que uma variedade de
flavonóides encontrada nestes sucos é capaz de inibir a atividade da CYP3A4 in vitro.
(AMEER & WEINTRAUB, 1997)
Modificações no Fluxo Sangüíneo Esplâncnico
Após haver atravessado o epitélio intestinal, o medicamento passa para a circulação
geral. Para as substâncias muito lipossolúveis, a penetração é muito rápida e o equilíbrio
entre o sangue e o sítio de absorção é rapidamente atingido, nestas condições, o débito
sangüíneo é o elemento modulador da absorção. Por exemplo, a administração oral de
digoxina e com certos antagonistas de cálcio resulta num aumento da absorção de digoxina,
e isto pode ocorrer devido à capacidade destas drogas em alterar o fluxo sangüíneo
esplâncnico em humanos. Evidências disto podem ser obtidas em experiências de perfusão
em ratos nas quais o antagonista de cálcio aumenta a permeabilidade do jejuno a digoxina.
O aumento do fluxo sangüíneo também pode ser responsável pela diminuição da
eliminação da droga na passagem pelo fígado (efeito de primeira passagem hepática) e
assim aumentar a sua biodisponibilidade. A ingestão de alimentos pode aumentar a
concentração plasmática do propranolol e da hidralazina, e isto tem sido atribuído a
modificações no fluxo sangüíneo esplâncnico, uma vez que, com o aumento deste fluxo
aumenta também a velocidade de absorção e as concentrações altas destas drogas no fígado
podem levar a saturação das enzimas responsáveis pela eliminação hepática de primeira
passagem.
Em contrapartida, a velocidade de absorção de substâncias pouco permeáveis e que
são absorvidas lentamente pode ser independente do fluxo sanguíneo esplâncnico. Assim a
biodisponibilidade da fenitoína, uma droga que pode sofrer saturação do seu sistema de
biotransformação, não é afetada pela mudança de fluxo induzida pela presença de
alimentos. (FLEISHER. et al, 1999).
Alterações na Flora Bacteriana Intestinal
As bactérias intestinais podem desempenhar importante papel na síntese de vitamina
K, essencial para a função normal da coagulação, ou podem reativar alguns metabólitos
inativos de drogas excretados pela bile, efetuando a sua desconjugação e a sua reabsorção.
Assim os antibióticos de amplo espectro podem interagir com essas drogas, modificando ou
eliminando a flora intestinal, fazendo por exemplo com que o efeito do anticoagulante oral,
que compete com a vitamina K, seja intensificado.
Se uma droga é biotransformada pelos microorganismos gastrintestinais, a terapia
com antibacterianos, pode provocar aumento de absorção da droga, como foi demonstrado
para alguns pacientes que receberam digoxina. (SELLERS, 1991)
Distribuição.
Após ser absorvido ou injetado na corrente sangüínea o fármaco distribui-se para os
líquidos extra e intracelular. O volume de distribuição aparente (Vd), é o parâmetro
utilizado para descrever essa distribuição e pode ser definido como o volume de líquido
necessário para conter a quantidade total (Q) da droga no corpo na mesma concentração
presente no plasma (Cp) e é matematicamente expresso como: Vd=Q/Cp em litros/Kg de
peso corporal.
O Vd depende das propriedades físico-químicas da droga, como a sua solubilidade em
água e lipídeos e a capacidade de se ligar às proteínas (plasmáticas ou teciduais). O volume
de distribuição elevado indica que a droga é distribuída a várias partes do corpo, com a
permanência de pequena fração no sangue, e um pequeno volume de distribuição indica que
a maior parte da droga permanece no plasma provavelmente como resultado da ligação às
proteínas plasmáticas (LPP).
A alteração de fármacos em nível de distribuição entre dois componentes
medicamentosos se dá principalmente por mecanismo competitivo frente a sítios comuns de
ligação protéica.
Ligação às Proteínas Plasmáticas (LPP)
Um grande número de drogas se apresenta ligadas a proteínas plasmáticas e podem
assim estar envolvidas em interações por deslocamento de LPP; muitos destes exemplos têm
sido citados na literatura, porém, não é intenção rever exemplos deste tipo de interação no
presente capítulo, o objetivo é abordar os conceitos envolvidos e a discussão da importância
clínica das interações que envolvem o deslocamento da LPP.
As drogas são transportadas para os seus sítios de ação, biotransformação e excreção,
normalmente, ligadas a proteínas plasmáticas ou a hemácias. A fração do fármaco que fica
livre em solução aquosa pode ser de até 1%, estando o restante associado principalmente a
proteínas do plasma. Uma vez que somente a droga livre pode exercer sua ação, a resposta
terapêutica de uma droga será dependente da porcentagem da droga livre. A mais
importante proteína, no que concerne à ligação a fármacos, é a albumina, que liga muitos
ácidos e um número menor de fármacos básicos (ver quadro 5).
Outras proteínas plasmáticas, incluindo a ß-globulina e a a1-glicoproteína ácida - uma
proteína de fase aguda que aumenta nas doenças - também foram apontadas como
responsáveis pela ligação de certos fármacos como clorpromazina e quinina.
As drogas geralmente se ligam a sítios específicos do plasma e dos tecidos e a
afinidade de uma droga pelo seu local de ligação é medida pela constante de associação (Ka)
entre a droga e a proteína. A reação de ligação pode ser considerada como uma associação
simples das moléculas do fármaco a uma população finita de seus locais de ligação: F
(fármaco livre) « L (local de ligação) + FL (complexo).
QUADRO 5 - Alguns fármacos que se ligam à albumina plasmática.
Fármaco% ligada na concentração
terapêutica% dos sítios de ligação
ocupadosDiclofenaco 99,5 < 1Diazepam 95-99 < 1Varfarina 95-99 < 1
Amitriptilina 90-95 < 1Nortriptilina 90-95 < 1
Clorpromazina 90-95 < 1Imipramina 90-95 < 1
Desmetilimipranina 90-95 < 1Indometacina 90-95 < 1Sulfisoxazol 90-95 50-60Tolbutamida 90-95 50-60
Ácido valpróico 90-95 50-60Fenitoína 90 3
Hidralazina 85-90 < 1Quinina 70-90 < 1
Lidocaína 50 < 1Ácido acetilsalicílico
(ASS)50 50
Fonte: HANG et al (1997).
Geralmente cada molécula de albumina tem, pelo menos, dois sítios de ligação para a
maioria dos fármacos e os diferentes sítios de ligação vão apresentar diferentes Ka. A
concentração normal de albumina no plasma é de cerca de 0,6 mmol/L (4g/100ml); com dois
sítios por molécula de albumina, a capacidade de ligação de fármacos da albumina
plasmática seria, portanto, de aproximadamente 1,2 mmol/L, de modo que os sítios de
ligação estão longe de saturação (ou seja, bem abaixo das concentrações terapêuticas da
maioria dos fármacos).
A concentração do fármaco ligado [FL] varia quase que em proporção direta à
concentração do fármaco livre [F]. Nessas condições, a fração ligada, mostrada no quadro 5,
é independente da concentração do fármaco; entretanto, alguns fármacos, como, por
exemplo, a tolbutamida e algumas sulfonamidas, agem em concentrações plasmáticas em
que a ligação às proteínas se aproxima da saturação; isto significa que a adição de uma
quantidade do fármaco no plasma vai aumentar de modo desproporcional a concentração da
forma livre; portanto se a dose desta droga for dobrada, a concentração de droga livre no
plasma pode aumentar em três vezes ou mais. Isto é mostrado na figura 3 para o fármaco
antiinflamatório fenilbutazona.
A existência, na albumina plasmática, de sítios de ligação para os quais muitos
fármacos diferentes têm afinidade significa que pode haver competição entre eles, de modo
que a administração de um fármaco B pode reduzir a ligação a proteínas de um fármaco A e
aumentar, então sua concentração plasmática na forma livre. Para fazer isto, o fármaco B
necessita ocupar uma fração considerável dos sítios de ligação. (HANG et al ,1997)
FIGURA 3 - Ligação da fenilbutazona à albumina plasmática. Adaptado de HANG et al, 1997.
Efeitos da LPP na Farmacocinética
Antes de considerarmos os efeitos do deslocamento da droga de seus locais de LPP, é
necessário discutir primeiramente os efeitos desta ligação na farmacocinética de uma
droga. A distribuição de uma droga é afetada pela sua LPP, uma vez que a droga ligada não
fica disponível para se difundir para os outros tecidos; isto significa que drogas altamente
ligadas no plasma, como por exemplo, a varfarina, tem a tendência de apresentar um
pequeno volume de distribuição; realmente o Vd da varfarina é baixo e se aproxima do
volume plasmático (0,05 l/Kg de peso corporal), significando que a varfarina quase não se
difunde para os outros tecidos.
Algumas drogas, porém, podem estar altamente ligadas no plasma e também nos
tecidos e então apresentar uma Vd maior, como os medicamentos antidepressivos tricíclicos
e fenotiazínicos, nos quais quase toda a droga presente no plasma se encontra ligada a
albumina, porém, devido à capacidade dessas drogas de se ligarem aos tecidos, a droga
circulante representa somente uma pequena fração do total da droga no corpo.(KOCH-
WESER e SELLERS, 1976)
A biotransformação de drogas com altas taxas de extração hepática, como o
propranolol, envolve a deslocação de seus sítios de ligação e a captação da droga pelas
células hepáticas. A ligação das drogas às proteínas plasmáticas pode afetar a
biotransformação, que pode estar aumentada se a droga está altamente ligada e é
rapidamente eliminada pela biotransformação hepática, pois a LPP age como um sistema de
transporte, levando a droga para fígado. Alternativamente, se esta tem uma baixa taxa de
extração hepática, a biotransformação pode ser diminuída pela LPP; pois neste último caso,
a eliminação metabólica será diretamente proporcional a fração livre de droga encontrada
no sangue assumindo uma cinética de primeira ordem (LEVY & YACOBI, 1974).
Em relação à eliminação renal, somente a droga não ligada é filtrada no glomérulo;
portanto uma diminuição da LPP irá aumentar a concentração da droga livre disponível para
a filtração - isto significa que se uma droga estiver altamente ligada a proteínas e depender
de sua filtração glomerular para a sua eliminação (não sujeita ao metabolismo ou secreção
tubular renal), geralmente apresentará um tempo de meia-vida longo, como o diazóxido que
está 90% ligado e tem uma meia-vida de 30 horas. A secreção tubular renal não é limitada
pela ligação protéica, assim drogas que tem uma alta taxa de excreção renal devida à
secreção tubular como a penicilina, a LPP irá favorecer a eliminação por transportar a
droga para seu local de excreção (D’ARCY & MCELNAY, 1982).
Efeitos de Deslocamento da LPP
Mudanças nas porcentagens de droga ligada e não ligada de uma droga pode ser
devido à competição com outras drogas e/ou a competição com substâncias endógenas pelos
sítios de ligação.
Os agentes mais importantes no deslocamento da LPP são compostos ácidos; eles
freqüentemente têm uma alta afinidade pela albumina. Se duas drogas se ligam a um
mesmo local da proteína haverá uma competição entre as drogas por estes sítios, pois
compostos com uma alta afinidade deslocam drogas com afinidade menor.
Muitos dos fármacos mostrados no quadro 5 não afetam a ligação de outros fármacos
por ocuparem, em concentrações plasmáticas terapêuticas, apenas uma diminuta fração dos
sítios disponíveis, e apenas alguns fármacos causam efeitos inesperados por deslocar outros
fármacos, como por exemplo, as sulfonamidas, que ocupam cerca de 50% dos sítios de
ligação em concentrações terapêuticas. O fármaco deslocado não precisa ocupar uma fração
apreciável destes sítios, de modo que o diazepam por exemplo, é consideravelmente
deslocado dos sítios de LPP pela aspirina, mas não vice-versa.
Mesmo que as drogas por si só não acarretam o deslocamento da LPP, os seus
metabólitos podem estar envolvidos nesta interação; por exemplo, o ácido tricloroacético -
um metabólito do cloral hidratado - desloca a varfarina de seus sítios de ligação na
albumina.
Um deslocamento não competitivo pode ocorrer quando uma droga ao se ligar à
proteína, faz com que ocorram mudanças físico-químicas desta macromolécula dando
origem a alterações na estrutura terciária (conformacional) da proteína, o que pode levar a
mudanças de afinidade nos sítios de ligação específicas para um outro grupo de drogas
(SELLERS & KOCH-WESER,1970).
O ácido acetilsalicílico (AAS) interfere na ligação de algumas outras drogas por um
mecanismo incomum. O AAS é capaz de acetilar resíduos de lisina das moléculas de
albumina. A ligação de albumina com acetrizoato, ácido flufenâmico e fenilbutazona e
possivelmente outras drogas aniônicas são modificadas na presença do AAS. (PINCKARD et
al, 1973)
Deslocamento da LPP e o Vd
Uma diminuição na LPP de uma droga, devido a uma interação por deslocamento,
aumentará seu Vd, uma vez que a droga deslocada se difundirá para os tecidos e isto levará
a uma diminuição na concentração total da droga no plasma, porém depois de atingindo o
equilíbrio a concentração da droga livre plasmática será a mesma que na situação anterior
(ver figura 4). Desde que as ações farmacológicas, incluindo os efeitos tóxicos, corresponde
a concentração da droga livre no plasma, este tipo de interação geralmente acarreta poucas
conseqüências para os pacientes, com exceção dos seguintes casos: injeção rápida de um
agente deslocador e durante o monitoramento do nível plasmático de uma droga.
Se uma injeção em “bolus” de um agente deslocador é administrada ao paciente, o
deslocamento de uma outra droga dos seus sítios de ligação será quase imediata, enquanto
que a distribuição e o estabelecimento da condição de equilíbrio levará algum tempo. Isto
significa que a concentração da droga livre no plasma aumentará e a concentração total da
droga permanecerá a mesma alguns instantes depois da injeção. Este aumento da
concentração plasmática da droga livre pode permitir uma maior reação com os receptores
ou permitir a entrada da droga em compartimentos que normalmente ela não atinge, como
por exemplo o sistema nervoso central (SNC). Um exemplo disto é a injeção de sulfonamidas
em neonatos levando ao deslocamento da bilirrubina, a qual pode entrar e se depositar no
cérebro levando ao quadro de kernicterus, com sérias conseqüências para a criança
(HAMAR & LEVY, 1980)
FIGURA 4 - Seqüência de alterações nas concentrações plasmáticas de drogas durante interações por deslocamento. 1-Situação antes do deslocamento; 2-Imediatamente após o deslocamento; 3-Redistribuição da droga deslocada; 4- Situação de equilíbrio re-estabelecida. Notar que nesta situação, apesar da concentração total no plasma estar diminuída, a concentração da droga livre no plasma é semelhante à situação 1.
A monitoração dos níveis plasmáticos é realizada com a determinação da
concentração total da droga - se a LPP é diminuída devido a uma competição entre drogas
pelos sítios de ligação da albumina, a concentração da droga total no plasma estará
diminuída, porém o nível da droga livre estará normal (assim como os seus efeitos
terapêuticos); se a dose do paciente for aumentada, baseada na monitoração plasmática,
poderá causar efeitos tóxicos devido a um aumento da concentração plasmática da droga
livre. Este tipo de problema pode surgir quando se está monitorando a fenitoína e o paciente
recebe, por exemplo ácido valpróico. (KOBER et al, 1981).
Efeitos do Deslocamento das LPP na Eliminação das Drogas
Para drogas com uma alta taxa de extração hepática (biotransformação), que envolve
mecanismos de transporte ativo para concentrar a droga nos hepatócitos, a maioria da
droga é retirada do sangue quando ele passa pelo fígado; portanto a extração é dependente
do fluxo sanguíneo hepático. Uma diminuição da concentração total da droga no plasma,
devido ao re-equilíbrio depois do deslocamento da LPP, e conseqüentemente o aumento do
seu Vd, levará a uma diminuição da eliminação hepática da droga, apesar do “clearance”
permanecer o mesmo, uma vez que o fluxo sanguíneo e a taxa de extração não sofrem
alterações (clearance=fluxo sangüíneo x taxa de extração) (HUANG & OIE, 1984).
Quando ocorre uma diminuição da eliminação de drogas com alta taxa de extração
hepática, depois do deslocamento, a concentração da droga livre pode aumentar, uma vez
que a quantidade total da droga no organismo se encontra aumentada; portanto se uma
droga é administrada por via parenteral, pode ser necessário reduzir a dosagem para se
evitar os efeitos tóxicos provocados pela competição pelas LPP; porém quando a droga é
administrada por via oral, o efeito de primeira passagem hepática pode ajudar a diminuir os
efeitos adversos conseqüentes desta interação (ROWLAND, 1980)
Para drogas com uma pequena taxa de extração hepática, na qual a biotransformação
depende da concentração da droga livre, uma diminuição na concentração total da droga
depois do deslocamento terá pouco efeito na eliminação (o “clearance” neste caso estará
aumentado devido ao aumento da taxa de extração).
Quanto à excreção renal, se a droga é eliminada, somente por filtração glomerular,
uma diminuição, depois do deslocamento, da concentração total da droga sem mudanças na
concentração da droga livre, não levará a mudanças na eliminação absoluta da droga. Esta
situação torna-se mais complexa quando ocorre secreção tubular ativa e reabsorção parcial
da droga. Quando ocorre secreção tubular, porém sem reabsorção a situação poderia se
assemelhar àquela das drogas envolvidas no processo ativo durante a biotransformação no
fígado. Nesta última condição, por exemplo, a taxa de eliminação pode estar diminuída,
devido à diminuição da concentração plasmática total da droga, depois do deslocamento,
requerendo em casos extremos, uma redução da dose (LEVY, 1980).
Ligação das Drogas aos Tecidos e o seu Deslocamento
Para algumas drogas o Vd é bem maior que o volume sanguíneo, significando que
grande parte destas drogas se encontra ligada aos tecidos - o deslocamento da ligação
tecidual levará a um aumento da droga livre que favorecerá a difusão da droga para o
compartimento plasmático; conseqüentemente a concentração da droga no plasma ficará
aumentada depois do re-equilíbrio da droga deslocada, ou seja, um efeito inverso do
observado no deslocamento das LPP (ver figura 5).
FIGURA 5 - Curvas de concentração plasmática – tempo para drogas envolvidas em interações por deslocamento de seus sítios de ligação. a) Deslocamento da droga das LPP e diminuição da contração plasmática devido ao aumento do Vd, a taxa de eliminação pode diminuir ou aumentar, isto vai depender se a eliminação da droga envolve processos ativos de transporte ou não – b) Deslocamento da droga de seus sítios de ligação teciduais e aumento da concentração plasmática da droga (redução do Vd), a taxa de eliminação geralmente vai aumentar, pois uma quantidade maior da droga vai estar sendo transportada para os seus sítios de eliminação. Adaptado de D’ARCY & MCELNAY, 1982.
Depois do deslocamento da droga dos seus sítios de ligação nos tecidos, haverá uma
redução do Vd associado a uma diminuição do tempo de meia-vida da droga no organismo,
pois o transporte da droga para os seus órgãos de eliminação (geralmente os rins ou o
fígado) estará aumentado, porém o aumento da droga livre no plasma poderá resultar em
aumento dos efeitos terapêuticos e até aparecimento de efeitos tóxicos; isto significa que em
interações deste tipo, o regime posológico talvez deva ser alterado, com menores doses
administradas em intervalos mais curtos, para prevenir grandes flutuações nos níveis
séricos da droga; mantendo, porém a mesma dosagem total.
Uma interação importante que envolve o deslocamento da ligação tecidual ocorre
entre a digoxina e quinidina. Um estudo foi realizado por LEAHEY et al (1978) em pacientes
sob terapia com digoxina que receberam também a quinidina e o resultado deste trabalho
mostrou que o nível sérico da digoxina aumentou de 1,4 ng/ml para 3,2 ng/ml com a
administração da quinidina (o intervalo terapêutico está entre 0,8 e 2,0 ng/ml); 59% dos
pacientes apresentaram sintomas como anorexia, náusea e vômito depois de iniciar a
terapia com quinidina - estes efeitos desapareceram nos pacientes em que a dose de
digoxina foi reduzida, sugerindo que os sintomas referidos eram causados pela digoxina.
Alguns pacientes, inclusive apresentaram arritmias cardíacas graves.
Apesar das interações entre digoxina e outras drogas, como a quinidina verapamil e
amiodarona, envolverem outros mecanismos como a diminuição da secreção tubular renal
da digoxina, o deslocamento tecidual da digoxina pode trazer conseqüências clínicas
importantes para o paciente.
Significado Clínico das Interações por Deslocamento
A ligação das drogas às proteínas é um parâmetro farmacocinético importante. Muitos
métodos estão disponíveis para o estudo de fenômenos envolvendo a ligação das drogas às
proteínas plasmáticas ou teciduais. As interações que envolvem o deslocamento das drogas
dos seus sítios de ligação do plasma ou do tecido foram relatadas como sendo os
mecanismos causadores em muitas interações medicamentosas. Entretanto, a importância
deste tipo de interação foi superestimada e exagerada, sendo que grande parte dos dados
foi obtida de estudos in vitro. (MCELNAY & D'ARCY, 1983)
Uma vez que a droga deslocada pode normalmente se redistribuir fora do
compartimento plasmático, os aumentos de concentrações da droga livre são geralmente
transitórios e conseqüentemente não causarão alterações significativas nos efeitos
farmacológicos. Geralmente as interações clinicamente importantes envolvendo o
deslocamento das drogas de seus sítios de ligação apresentam um outro mecanismo
envolvido, como a redução da biotransformação e/ou diminuição da eliminação renal;
entretanto em determinadas situações específicas como por exemplo, quando a droga é
administrada por via endovenosa ou quando o paciente está sob monitorização terapêutica,
o conhecimento das interações por deslocamento das LPP é fundamental.
O deslocamento das drogas das ligações teciduais tem um grande potencial para
causar efeitos adversos no paciente, uma vez que neste caso ocorre um aumento da
concentração sérica da droga que pode levar a um aumento dos efeitos farmacológicos e
possivelmente o aparecimento de efeitos tóxicos. O deslocamento das drogas dos seus sítios
de ligação tanto no plasma como nos tecidos poderá aumentar significativamente a
concentração da droga livre no plasma, levando a um aumento dos efeitos da droga
deslocada.
Metabolismo.
Muitas interações medicamentosas podem ocorrer por alterações nas enzimas
biotransformadoras que estão presentes no fígado e em outros tecidos extra-hepáticos. Os
mecanismos farmacocinéticos envolvidos nestas interações consistem principalmente em
mudanças no complexo enzimático citocromo P450 (CYP), que pode ser inibido ou induzido
por algumas drogas, afetando assim a biotransformação destas drogas. O entendimento
destes mecanismos é extremamente importante para a escolha de um regime terapêutico
envolvendo várias drogas.
Biotransformação e o Papel do CYP.
A maioria dos fármacos possui caráter lipofílico e, em pH fisiológico, permanecem não
ionizados ou parcialmente ionizados. Devido a estas características, os mesmos tenderiam a
permanecer no organismo, já que seriam reabsorvidos nos rins, após a filtração glomerular.
Visando a eliminar estas substâncias exógenas, o organismo pode lançar mão de sistemas
enzimáticos utilizados normalmente para a degradação de substâncias endógenas. Desse
modo, a biotransformação é a transformação enzimática dos fármacos em metabó1itos com
características mais hidrofílicas, tendo como objetivo facilitar a excreção pelo organismo.
A biotransformação de fármacos pode ser dividida em duas fases. A fase I consiste nas
reações de oxidação, redução e hidrólise, ocasionando sempre uma modificação estrutural
do fármaco, o que na maioria das vezes pode levar a sua inativação. No caso de
administração de pró-fármacos, a fase I vai ser fundamental para gerar a substância
farmacologicamente ativa. Na fase II, conhecida como fase de conjugação, ocorrem reações
de conjugação do fármaco com substâncias endógenas, visando a facilitar sua excreção. Os
processos das fases I e II são independentes, ou seja, o fármaco pode sofrer apenas reações
de fase I ou de fase II, ou as duas, seqüencialmente. Geralmente as reações da fase I
introduzem um grupo relativamente reativo, como o grupo hidroxila, na molécula, e este
grupo funcional servirá, então, como ponto de ataque para o sistema conjugador, que fixa a
ele um substituto maior, como um grupo glicuronil, sulfato ou acetil.
O órgão onde ocorre a maioria das reações de biotransformação é o fígado, por
apresentar várias enzimas ou complexos enzimáticos especializados. Dentre elas, destacam-
se as mono-oxigenases do complexo enzimático CYP, as redutases, as esterases e as
transferases (COSTA & STRECK, 1999).
O CYP é o principal responsável pela biotransformação de fármacos no organismo
humano, estando presente principalmente no retículo plasmático liso (fração microssômica)
dos hepatócitos, podendo também ser encontrado em outros órgãos, como pulmões e rins. O
CYP é uma proteína com um grupo prostético heme (ou grupo ferro-porfirina, ver figura 6) e
pertence ao grupo das mono-oxigenases, que são enzimas que catalisam reações nas quais
um átomo de oxigênio da molécula de O2 é incorporado na molécula do substrato orgânico,
o outro átomo é reduzido a H2O. As mono-oxigenases requerem dois substratos que
funcionam como redutores dos dois átomos de oxigênio do O2. O substrato principal (no
caso o fármaco) recebe um dos dois átomos de oxigênio e o co-substrato (no caso do CYP é a
nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato - NADPH) fornece átomos de hidrogênio para
reduzir o segundo átomo de oxigênio a água (LEHNINGER, 1986).
FIGURA 6 - Estrutura do grupamento heme unido covalentemente ao citocromo. O anel porfirínico está indicado em azul. Fonte: ALBERTS et al, 1997.
O sistema transportador de elétrons, envolvido na biotransformação das drogas, se
processa da seguinte maneira: O NADPH ao se oxidar reduz uma flavoproteína - a NADPH
citocromo P450 redutase. Esta ao oxidar-se reduz uma proteína Fe++ não-heme, que por
sua, ao se oxidar, reduz o CYP, que reage com o oxigênio molecular para formar o complexo
ativo oxigênio-CYP e o transporta para a molécula da droga, oxidando-a (observar a figura 7)
(MELLO, 1998).
FIGURA 7 - Sistema transportador de elétrons envolvido na hidroxilação de drogas via CYP. Adaptado de MELLO, 1998.
Isoformas do CYP
O CYP apresenta várias isoformas, que são formas múltiplas de uma mesma enzima
que catalisam o mesmo tipo de reação , neste caso de oxidação , apresentando afinidade por
substratos diferentes, biotransformando, portanto, fármacos distintos. Além disso, as
isoformas diferem na sua distribuição pelo organismo e na regulação de sua atividade,
apresentando diferentes inibidores, indutores e fármacos marcadores. Estes últimos são
utilizados para a determinação da atividade de cada isoforma e, por isso, são também
substratos das mesmas.
Atualmente mais de 30 isoformas do CYP estão identificadas em humanos, as quais
são classificadas de acordo com as convenções da biologia molecular e identificadas por um
número arábico indicando a família (membros de uma mesma família são os que apresentam
mais de 40% de aminoácidos idênticos); seguido de uma letra em caixa alta que indica a
subfamília (55% de aminoácido idênticos) e um outro número representando o gene na
subfamília, por exemplo CYP1A2. As enzimas envolvidas na biotransformação de drogas em
humanos pertencem às famílias 1,2,3 e 4 (NELSON et al, 1996).
Aproximadamente 70% do CYP hepático são constituídos pelas isoformas CYP1A2,
CYP2A6, CYP2B6, CYP2C, CYP2D6, CYP2E1 e CYP3A. Entre estes o CYP3A (CYP3A4 e
CYP3A5) e o CYP2C (principalmente o CYP2C9 e 2C19) são as subfamílias mais abundantes,
responsáveis por 30% e 20% respectivamente do CYP total. As outras isoformas apresentam
a seguinte contribuição para o CYP total: CYP1A2 em 13%, CYP2E1 em 7%, CYP2A6 em 4%
e CYP2D6 em 2% (LIN & LU, 1998). Uma avaliação do mecanismo de “clearance”
metabólico de 315 drogas diferentes (BERTZ & GRANNEMAN, 1999) revelou que 56% são
eliminadas primariamente através da ação das várias isoformas do CYP; a CYP3A4 foi a mais
importante (50%), seguida pela CYP2D6 (20%), CYP2C9 e CYP2C19 (15%) e o restante era
biotransformado pelas CYP2E1, CYP1A2, CYP2A6 entre outras, de modo que podemos
estimar que 90% das reações de oxidação das drogas em humanos podem ser atribuídas a
estas sete enzimas principais. O conceito que a maioria das oxidações de drogas são
catalisadas por um pequeno número de enzimas é importante na prevenção e identificação
das possíveis interações medicamentosas envolvendo a biotransformação dos fármacos.
Um dos muitos aspectos interessantes do CYP é que além de poder catalisar várias
reações de oxidação (hidroxilação, desalquilação, epoxidação, oxigenação de heteroátomos)
ele também pode biotransformar um grande número de xenobióticos de caráter lipofílico.
Cada isoforma do CYP possui atividade catalítica para um amplo espectro de substratos. A
capacidade do CYP em biotransformar múltiplos substratos é responsável por um grande
número de interações medicamentosas associadas com a inibição do CYP. A inibição da
biotransformação de fármacos por competição por uma mesma enzima pode resultar em
elevações na concentração plasmática de algumas drogas e levar a sintomas clínicos
importantes. As interações medicamentosas em nível de biotransformação também podem
ser no sentido de indução do CYP.
A atividade das isoformas também pode ser afetada pelo polimorfismo genético e de
acordo com a atividade enzimática de cada isoforma, pode-se dividir a população em dois
grupos distintos: os metabolizadores extensivos (MEs) e os metabolizadores pobres (MPs).
Os primeiros possuem a isoforma com atividade normal, não apresentando problemas para
biotransformar os fármacos. Os metabolizadores pobres têm a atividade da isoforma
diminuída ou nula, podendo levar a diferenças significativas na posologia de alguns
fármacos. Entre as principais isoformas que apresentam polimorfismo genético, segundo um
estudo de INGELMAN-SUNDBERG et al (1999), estão a CYP2D6 (caráter autossômico
recessivo, sendo a freqüência de metabolizadores pobres de 5 a 10% na população
caucasiana) e a CYP2C19 (também de caráter autossômico recessivo, com a freqüência de
metabolizadores pobres variando entre 2% a 3% na população caucasiana, podendo chegar
até 23% na população oriental).
Mecanismos de Inibição do CYP
O ciclo catalítico do CYP consiste de pelo menos 7 etapas distintas:
ligação do substrato à forma férrica da enzima;
redução do grupo heme de férrico (Fe+++) para o estado ferroso (Fe++) por um
elétron vindo do NADPH;
ligação do oxigênio molecular;
transferência de um segundo elétron;
quebra da ligação O-O;
oxigenação do substrato;
liberação do substrato.
Embora a interferência em qualquer uma destas etapas possa levar a inibição da
atividade enzimática do CYP, as etapas (a), (c) e (f) são particularmente vulneráveis à
inibição. O mecanismo de inibição do CYP pode ser dividido em três categorias: inibição
reversível ou competitiva, inibição não-competitiva e inibição irreversível. Entre estas, a
inibição reversível é provavelmente o mecanismo mais comum responsável pelas interações
medicamentosas. As interações reversíveis resultam da competição pelo sítio ativo da
enzima e provavelmente envolva somente a primeira etapa do ciclo catalítico do CYP. Por
outro lado, agentes que atuam durante a ligação do oxigênio ou em etapas subseqüentes
levam a inibições não-competitivas ou inibições irreversíveis (HALPERT, 1995).
Inibição reversível ou competitiva
Muitos dos inibidores reversíveis potentes do CYP são drogas que contêm o
nitrogênio, com a presença dos grupos imidazol, piridina e quinolina (figura 8). Estes
compostos ligam-se ao ferro do grupo prostético heme e/ou também a região lipofílica da
proteína no CYP; as drogas que se ligam simultaneamente a estas duas regiões são
inibidores mais potentes. A potência de um inibidor é determinada por seu caráter lipofílico
e pela força de ligação entre o par de elétrons do nitrogênio da droga e o ferro do grupo
heme do CYP. Por exemplo, o cetoconazol e a cimetidina (figura 8), que são compostos
contendo o imidazol, interagem com o Fe+++ do CYP (CYP férrico); porém, a cimetidina é
um inibidor reversível relativamente mais fraco, devido provavelmente a sua baixa
lipossolubilidade e a sua menor afinidade em se ligar ao CYP microssômico; por outro lado,
o cetoconazol é um potente inibidor do CYP, possivelmente pela sua alta lipossolubilidade.
De modo similar, o fluconazol contém um grupo triazol (figura 8) que se liga ao ferro do
heme prostético, mas é um inibidor menos potente, novamente devido principalmente a sua
menor lipossolubilidade (LIN & LU, 1998).
FIGURA 8 - Estruturas dos grupos imidazol, piridina e quinolina e dos fármacos cetoconazol, cimetidina e fluconazol.
Os agentes derivados da piridina também podem interagir com o Fe+++ do CYP -
entre os derivados de piridina o inibidor mais conhecido é a metirapona; este composto age
como um inibidor potente e seletivo das várias isoformas do CYP, incluindo a inibição da
11b-hidroxilase que catalisa a etapa final da biossíntese do cortisol. Esta inibição da 11b-
hidroxilase permite o uso da metirapona no diagnóstico e tratamento das manifestações de
excesso de cortisol (síndrome de Cushing) e outras desordens hormonais (JONEN et al,
1974).
As quinolinas consistem de uma outra classe de heterocíclicos contendo o nitrogênio
que também apresentam uma potente inibição do CYP, como por exemplo as elipticinas - um
grupo de agentes antileucêmicos (inibem a síntese do ácido desoxirribonucléico (DNA) e do
ácido ribonucléico (RNA)) com propriedades imunossupressoras, isolados primariamente da
Ochrosia elliptica - que contém o grupo quinolina em sua estrutura, interage com o ferro (na
forma férrico ou ferroso) do CYP. A elipticina e seu derivado 9-hidroxi-elipticina têm sido
usados com sucesso como inibidores da CYP1A1 e CYP1A2.(LESCA P et al, 1979).
Outros derivados de quinolina, como a quinidina e a quinina (figura 9) são potentes
inibidores reversíveis da 4-hidroxilação da debrisoquina, uma reação catalisada pela
subfamília CYP2D. Curiosamente a quinidina é um potente inibidor da CYP2D6 em
humanos, porém ela é biotransformada pela CYP3A4 e não pela CYP2D6; assim um potente
inibidor de uma determinada isoforma do CYP não precisa ser necessariamente o substrato
desta isoforma (LIN & LU, 1998).
FIGURA 9 - Estruturas da quinidina e quinina – potentes inibidores de CYP2D.
A quinina contém um grupo quinolina ligado através de uma ligação álcool secundária
a um anel de quinuclidina. A quinidina possui a mesma estrutura que a quinina exceto pela
configuração espacial do grupo álcool secundário.
Muitos agentes antimaláricos (como a primaquina, cloroquina, amodiaquina e
mefloquina – ver figura 10) contêm um anel quinolina e são potentes inibidores reversíveis
do CYP; porém, a atividade inibitória não está associada com a estrutura da quinolina, uma
vez que o nitrogênio da piridina está inacessível pelo impedimento estéreo. Em vez disso, o
grupo amino em substituintes do anel quinolina parece ser o determinante primário da
potência inibitória observada nestes compostos. Acredita-se que o grupo amino terminal da
primaquina está envolvido na ligação direta com o Fe+++ do heme. (MURRAY & FARREL,
1986)
FIGURA 10 - Estrutura dos agentes antimaláricos - primaquina, cloroquina, amodiaquina e mefloquina
Inibição não-competitiva – Formação de complexo estável
Um grande número de drogas, incluindo metilenedioxibenzenos, alquilaminas,
antibióticos macrolídeos e hidrazinas, sofre ativação metabólica pelo CYP para formar
metabólitos inibitórios. Estes metabólitos podem formar complexos estáveis com o heme do
CYP (figura 11), chamado complexo metabólico intermediário (CMI), de forma que o CYP
fique em um estado inativo funcionalmente (estas substâncias são chamadas de substratos
suicidas); a formação deste complexo pode ser revertida e a função catalítica do CYP férrico
pode ser restaurada por incubação in vitro com compostos altamente lipofílicos que
deslocam o metabólito intermediário do sítio ativo da enzima. A dissociação ou
deslocamento do CMI resulta na reativação da atividade funcional do CYP; porém, em
situações in vivo, o CMI é tão estável que o CYP envolvido neste complexo fica indisponível
para a biotransformação de drogas e a síntese de novas enzimas é a principal maneira pela
qual a atividade pode ser restaurada.
FIGURA 11 - Estruturas propostas para o CMI formado durante o ciclo catalítico do CYP. Esquerda – compostos com o grupo metilenedioxifenil formando um complexo carbene-ferro; Centro – Alquilaminas formando um complexo nitroso-ferro. Direita – 1,1 dialquil-hidrazinas formando um complexo nitrene-ferro. Fonte - LI & LU, 1998.
O piperonil butóxido, um derivado metilenedioxibenzeno, tem sido usado como um
inibidor do metabolismo oxidativo de drogas. Este composto age por formar um CMI,
provavelmente por uma ligação entre o carbono e o ferro (figura 11).
A troleandomicina e a eritromicina são os antibióticos macrolídeos mais estudados na
inibição seletiva que envolve a formação de CMI. Estes 2 agentes possuem em sua estrutura
uma amina terciária (figura 12) que depois de passar por várias etapas de biotransformação
mediadas pelo CYP (N-demetilação, N-hidroxilação e N-oxidação) produz um metabólito
nitroso que se liga fortemente ao CYP ferroso (figura11) levando a formação de um CMI.
FIGURA 12 - Estrutura dos antibióticos macrolídeos troleandomicina e eritromicina. Em destaque o grupo amino terciário.
Os derivados de metilenedioxibenzeno e os macrolídeos, como a troleandomicina e
eritromicina, não agem somente como inibidores mas também produzem efeitos de
indutores. Doses repetidas de troleandomicina induz o CYP em ratos (PESSAYRE et al,
1982a), entretanto a maioria das isoenzimas induzidas fica geralmente complexada e
funcionalmente inativa. A concentração da CYP livre depende da dosagem diária de
troleandomicina e da duração do tratamento.
A CYP3A4 humana está entre as isoenzimas induzidas pela troleandomicina. Em 6
pacientes tratados com troleandomicina (2g/dia durante 7 dias), verificou-se (PESSAYRE et
al, 1982b) um aumento de 76% do CYP total comparado com o grupo controle; porém a
maioria do CYP induzido estava presente na forma de CMI; a eritromicina produz efeito
semelhante (DANAN et al, 1981).
Os efeitos indutores da troleandomicina e da eritromicina são causados pela
diminuição da degradação do CMI, e não pelo aumento da síntese do CYP. Uma vez que a
maioria do CYP induzido está na forma de complexo e portanto não disponível para
biotransformação in vivo, a indução pela formação de CMI pode ser mascarada pelos efeitos
inibitórios destes antibióticos.
Outra droga alquilamina, associada com a formação de complexo com o CYP, é a
orfenadrina (figura 13) - um relaxante muscular usado no tratamento da doença de
Parkinson. Como esta droga possui um grupamento amino terciário, se acredita que o
metabolismo da alquilamina para um metabólito nitroso é a reação de biotransformação que
dá origem ao CMI (REIDY et al, 1989).
FIGURA 13 - Estrutura da orfenadrina
Os derivados da hidrazina pertencem a uma outra classe de compostos que podem
levar a formação de CMI. O tipo de substituição da hidrazina é um fator importante para a
formação do complexo envolvendo o CYP. A hidrazina 1,1-disubstituída, em contraste com a
hidrazina monosubstituída, é oxidada pelo CYP para intermediários nitrene que se ligam
fortemente ao ferro do grupo prostético heme, formando o complexo nitrene-ferro (figura
11). A isoniazida - a hidrazida do ácido isonicotínico (figura 14) - também leva a formação de
CMI, o que pode explicar o porque da isoniazida, que é biotransformada principalmente pela
N-acetilação em humanos, inibe a biotransformação da fenitoína e varfarina mediada pelo
CYP (MUAKKASSAH et al, 1981).
FIGURA 14 - Estrutura da isoniazida.
Inibição irreversível do CYP – Inativação da enzima
Algumas drogas contêm certos grupos funcionais que podem ser oxidados pelo CYP a
intermediário reativos que causam a inativação irreversível da enzima antes da sua
liberação do sítio ativo; ou seja, é necessária uma ativação metabólica para uma posterior
inativação da enzima. Este tipo de inativação do CYP pode ser o resultado de alterações
irreversíveis do grupo prostético heme ou da porção protéica, ou ainda uma combinação de
ambos. De modo geral, as modificações do grupo heme sempre inativam o CYP, enquanto
que alterações na proteína só resultam em perda da atividade catalítica se aminoácidos
fundamentais para a ligação do substrato, transferência de elétrons ou ativação do oxigênio,
forem modificados.
Alquilação do grupo heme
Drogas que possuem uma ligação dupla (olefinas) ou uma ligação tripla (acetilenos) na
porção terminal podem ser oxidadas pelo CYP para radicais intermediários que alquilam o
grupo prostético heme e assim inativam a enzima. Entre as evidências da alquilação do
heme inclui a demonstração de perdas equimolares de enzima e de heme, assim como o
isolamento e a caracterização estrutural do heme adulterado. A alquilação do grupo heme é
iniciada pela adição do oxigênio ativado para o carbono interno da dupla ou tripla ligação e
é concluída com a ligação do carbono ao nitrogênio pirrólico do heme. É interessante
observar que o acetileno reage com o nitrogênio do anel pirrólico A do CYP2B1 em
microssomos hepáticos de rato induzidos por fenobarbital, enquanto que olefinas lineares
reagem com o nitrogênio do anel pirrólico D (LI & LU, 1998).
O etinilestradiol, um estrógeno amplamente utilizado como contraceptivo oral, é um
derivado acetilênico (ver figura 15), que ao contrário de outros derivados de estradiol, tem
atividade biológica longa e uma alta biodisponibilidade. Estudos realizados por
GUENGERICH (1988), indicam que esta droga é um substrato para a CYP3A4 e também
leva a destruição estrutural desta mesma enzima. Atualmente está esclarecido que a
atividade longa e a alta biodisponibilidade do etinilestradiol são atribuídas principalmente a
alteração do heme prostético da enzima que o biotransforma.
FIGURA 15 - Estrutura do etinilestradiol
Assim como as olefinas e acetilenos, as diidropiridinas também podem ser oxidadas
pelo CYP para metabólitos reativos que alquilam o heme prostético. Por exemplo, os radicais
4-alquil-1,4-diidropiridina são oxidados pelas enzimas do CYP para radicais intermediários
que alquilam o nitrogênio do grupo heme. Porém nem todas as diidropiridinas provocam a
alquilação do heme, a substituição na posição 4 do anel diidropiridina é um fator
importante. A alquilação do heme é detectada se o substituinte é um grupo alquil alifático
primário (metil, etil, propil); caso o substituinte seja um grupo aromático (fenil) ou um
radical secundário (isopropil) não ocorre a alquilação do heme. Por exemplo, a nifedipina,
uma diidropiridina com um aril na posição 4 (ver figura 16) não inativa o CYP (DE MATTEIS
et al, 1982).
FIGURA 16 - Estrutura da nifedipina – uma diidropiridina com um substituinte aromático na posição 4.
Ligação covalente a apoproteína
O exemplo mais conhecido de inativação do CYP através de modificação na cadeia de
aminoácidos por um metabólito ativado é o caso do cloranfenicol. O grupo dicloacetamida
(ver figura 17) é oxidado para um radical oxamil que acila um resíduo de lisina no sítio ativo
do CYP (HALPERT, 1981), porém esta inativação pelo cloranfenicol não ocorre igualmente
para todas as isoformas do CYP; estudos (HALPERT et al, 1985) com microssomos hepáticos
de ratos revelaram que a CYP2B1, CYP2C6 e CYP2C11 são suscetíveis à inativação pelo
cloranfenicol, enquanto a CYP1A1 e a CYP1A2 são resistentes.
FIGURA 17 - Estrutura do cloranfenicol com o grupo dicloacetamida em destaque.
Outros compostos com uma ligação tripla terminal inativam o CYP por se ligarem
covalentemente à proteína. Por exemplo o 2-etinilnaftaleno (figura 18) é convertido pela
CYP2B1 para uma ceteno, que modifica o sítio ativo da enzima, incluindo a alteração em um
resíduo de treonina da posição 302 que desempenha uma função importante na ativação do
oxigênio molecular (ROBERTS et al, 1993).
FIGURA 18 - Estrutura do 2-etinilnaftaleno
A oxidação de grupos contendo o enxofre também pode resultar em modificações da
cadeia protéica do CYP. Vários compostos com enxofre podem inativar o CYP por ligação
covalente a cadeia protéica depois que são ativados por oxidação pela enzima, como por
exemplo o ácido tienílico - um tiofeno substituído - que é oxidado pela CYP2C9 para um
metabólito reativo, possivelmente um sulfóxido tiofeno que se liga covalentemente a
apoproteína do CYP (LOPEZ-GARCIA et al, 1993).
De modo semelhante, os grupos contendo o nitrogênio também podem inativar o CYP.
Por exemplo, as ciclopropilaminas são biotransformadas para metabólitos reativos e
experimentos de BONDON et al, (1989) mostram que ocorre uma ligação covalente entre o
radical ciclopropilamina e a proteína.
Os dados a respeito do cloranfenicol, ácido tienílico e ciclopropilaminas mostram
claramente que o CYP pode gerar espécies reativas que modificam a proteína, porém
algumas drogas podem modificar a apoproteína e o grupo prostético heme
simultaneamente. Por exemplo, a espironolactona (figura 19), um agente tioesteróide usado
como diurético, pode inativar as subfamílias CYP2C e CYP3A e esta inativação ocorre depois
da hidrólise do 7a-tioéster que dá origem a um grupo tiol livre - o CYP oxida então este
radical tiol para um composto tioesteróide eletrófilico que se liga covalentemente a proteína
e modifica também o grupo prostético heme (DECKER et al, 1989).
FIGURA 19 - Estrutura da espironolactona.
Mecanismos de Indução do CYP
Um dos aspectos intrigantes do CYP é que algumas de suas isoformas (CYP1A1,
CYP2C9, CYP2E1 e CYP3A4) são induzíveis e outras, não. Diferentemente da inibição, que é
uma resposta quase imediata, a indução do CYP é um processo regulatório mais lento que
pode reduzir a concentração de algumas drogas no plasma, e assim comprometer a eficácia
terapêutica destas drogas.
Apesar do fenômeno de indução do CYP ser conhecido há mais de 4 décadas, somente
nos últimos anos os mecanismos envolvidos na indução começaram a ser elucidados. De um
ponto de vista biológico, a indução é uma resposta adaptativa que protege as células de
xenobióticos tóxicos, uma vez que aumenta a atividade de desintoxicação. A indução da
biotransformação tem sido constatada depois da administração de doses terapêuticas de
algumas drogas; porém o número de drogas que podem produzir este efeito é, talvez, mais
limitado do que se suspeitava anteriormente.
A rifampicina, os barbitúricos, a fenitoína e a carbamazepina estão bem estabelecidos
como indutores que produzem mudanças clinicamente importantes na biotransformação de
drogas. Recentemente mais algumas drogas, como o omeprazol e a sinvastatina têm sido
observadas por causar mudanças na farmacocinética de alguns substratos para isoformas
específicas do CYP, mas a importância clínica destas observações precisa ser melhor
estabelecida. O uso de etanol e o tabagismo também podem causar a indução do CYP2E1 e
CYP1A, respectivamente, o que pode ter implicações terapêuticas e toxicológicas
importantes (GONZALEZ, 1988).
Os indutores podem ser monofuncionais, quando promovem a indução apenas do CYP
ou alguma isoforma específica, ou multifuncionais quando leva a indução de várias enzimas,
incluindo as enzimas da fase I e da Fase II da biotransformação (figura 20) (PARK et al,
1996).
FIGURA 20 - Classificação dos indutores das enzimas biotransformadoras. Adaptado de PARK et al, 1996.
Os níveis de CYP hepáticos podem ser controlados pela concentração de seus
substratos no fígado. Há muitos passos no caminho do DNA até chegar à enzima, e todos
eles, em princípio, podem ser regulados. Dessa forma, uma célula pode controlar as
enzimas, que ela faz das seguintes maneiras (figura 21):
quando e com que freqüência um determinado gene é transcrito (controle
transcricional);
como o transcrito primário de RNA é processado (controle de processamento de
RNA);
selecionando quais RNA mensageiros (mRNAs) maduros no núcleo da célula são
exportados ao citoplasma (controle de transporte de RNA);
selecionando quais mRNAs no citoplasma são traduzidos pelos ribossomos (controle
de tradução);
desestabilizando seletivamente certas moléculas de mRNA no citoplasma (controle
de degradação de mRNA);
ativando, inativando ou compartimentalizando seletivamente moléculas de proteínas
específicas depois que elas foram sintetizadas (controle de atividade de proteína)
(ALBERTS et al, 1997).
FIGURA 21 - Mecanismos pelos quais as enzimas podem ser reguladas. Fonte: ALBERTS et al, 1997.
Algumas enzimas CYP estão presentes somente em baixos níveis e são induzidas por
xenobióticos, enquanto outras são expressas continuamente em níveis relativamente mais
altos.
Para a maioria dos genes o controle transcricional é o predominante e portanto a
maioria dos casos de indução do CYP é conseqüência de um aumento da transcrição
genética, porém a regulação pós-transcricional tem sido reconhecida para CYP2E1 e
possivelmente para CYP3A1. Por exemplo os níveis da CYP2E1 podem ser controlados pela
fosforilação da enzima. Os agentes que levam a fosforilação desta enzima
conseqüentemente aumentam a degradação da mesma, enquanto substratos que inibem
esta fosforilação previnem a sua degradação a levam a um aumento dos níveis de CYP2E1. A
fosforilação ocorre em um resíduo de serina na posição 129 e inicia uma rápida perda do
grupo prostético heme (ELIASSON et al, 1990).
Por muitos anos, os cientistas estão tentando resolver o mistério de como as células
reconhecem o agente indutor e como o sinal é transferido para a maquinaria de transcrição.
O mecanismo molecular de indução tem sido mais claramente definido para agentes
químicos ambientais do que para os agentes terapêuticos, embora os princípios básicos
sejam os mesmos.
Os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, representado principalmente pelo 2,3,7,8-
tetraclorodibenzodioxina (TCDD), também chamado apenas de dioxina; são indutores
efetivos de CYP1A1 e CYP1A2 que estão sob controles regulatórios similares. (THOMAS et
al, 1983). A indução da CYP1A1 envolve a interação do indutor com um receptor citosólico
hidrofóbico denominado de receptor Ah (hidrocarboneto aromático) e a translocação do
complexo indutor-receptorAh para o núcleo da célula (POLAND et al,1976).
O gene CYP1A1 possui uma região de controle gênico – que consiste de seqüências de
DNA necessárias ao início de transcrição do gene e seqüências que regulam a taxa em que
esta transcrição ocorre – chamada de elementos regulatórios receptor Ah (AhRE). O
receptor Ah na sua forma ativa consiste de um heterodímero composto por um domínio
ligado ao indutor (ALBD) e um transportador nuclear para o receptor Ah (ARNT). Na
ausência de um indutor, o ALBD fica associado a uma proteína denominada HSP-90 (do
inglês “heat shock protein”). O agente indutor penetra no citoplasma celular, desloca a HSP-
90 de seu sítio de ligação e se liga ao ALBD. Isto permite o transportador nuclear (ARNT) se
associar com o ALBD para formar o complexo indutor-receptorAh. A translocação deste
complexo para o núcleo permite que ele se ligue ao AhRE do gene CYP1A1 levando ao
aumento da taxa de transcrição do gene conforme esquematizado na figura 22 (WHITLOCK,
1993).
FIGURA 22 - Mecanismo proposto para a indução do CYP1A1. Adaptado de PARK et al, 1996.
Receptores para a indução de outras isoformas do CYP, incluindo as famílias CYP2 e
CYP3, que são responsáveis pela biotransformação da maioria das drogas, ainda não foram
definidos.
Vários genes da família CYP2 são induzidos pelos barbitúricos. Um estudo de PIKE et
al (1985) demonstra que indução do CYP pelo fenobarbital em ratos é mediada pelo
aumento do respectivo RNA mensageiro devido ao aumento da taxa de transcrição do gene
e não envolve mudanças nas taxas de processamento, transporte ou degradação do RNAm.
Embora existam vários estudos e possíveis mecanismos de regulação propostos para
indução do CYP pelos barbitúricos, ainda não foi identificado um receptor envolvido neste
caso. Um trabalho de SHAW & FULCO (1993) com o Bacillus megaterium sugere que os
barbitúricos induzem o CYP por deslocar uma proteína regulatória repressora do seu sítio
de ligação no gene.
As Implicações Clínicas das Interações em Nível de Biotransformação.
O estudo das interações medicamentosas envolvendo a biotransformação das drogas é
de grande interesse para a prática clínica, não somente para prevenir a toxicidade e os
efeitos adversos dos medicamentos mas também para o planejamento de terapias seguras.
Os substratos, inibidores e indutores das diversas isoformas do CYP estão listados no
quadro 6.
QUADRO 6 - Lista de substratos, inibidores e indutores das principais isoformas do CYP.
Isoenzima Substrato Inibidor Indutor
CYP1A2
AmitriptilinaClomipramina
ClozapinaImipraminaPropranololR-Varfarina
TeofilinaCafeína
HaloperidolVerapamil
FluvoxaminaSuco de “grape-fruit”
Quinolonas1FurafilneEnoxacina
EritromicinaCiprofloxacina
OmeprazolFenobarbital
FenitoínaRifampicinaTabagismo
CYP2C9
TolbutamidaS-VarfarinaFenitoína
Antiinflamatórios não esteróides2
FluconazolCetoconazolMetronidazolItraconazolSulfafenazol
RitonavirFluvoxamina
RifampicinaFenobarbital
CYP2C19
DiazepamMefenitoínaOmeprazolPropranolol
ClomipraminaImipramina
Hexobarbital
FluoxetinaSertralinaRitonavir
Omeprazol
CYP2D6
Antidepressivos 3Antipsicóticos 4
Beta-bloqueador 5Codeína
DebrisoquinaEsparteína
Antidepressivos 6CimetidinaFlufenazina
Antipsicóticos 7Quinidina
Haloperidol
Desconhecido
CYP2E1Acetaminofeno
EtanolDissulfiram
EtanolIsoniazida
CYP3A4CYP3A5
Psicotrópicos 8Antiarritmicos 9Bloq.de cálcio 10Antiulcerosos 11
Analg. opióides 12Horm. esteróides 13Anti-histamínicos 14Antimicrobianos 15
Antidepressivos 19Antifúngicos azol 20
CimetidinaDiltiazem
EritromicinaInibidores de
proteasesGestodene
CarbamazepinaDexametazonaFenobarbital
FenitoínaRifampicina
1 fenoxacina, ciprofloxacina; 2 ibuprofeno, flurbiprofeno; 3 amitriptilina, clomipramina, desipramina, doxepina, fluoxetina, imipramina, nortriptilina, paroxetina, venlafaxina; 4 haloperidol, perfenazine, risperidona, tioridazina; 5 metoprolol, penbutolol, propranolol, timolol; 6 paroxetina, fluoxetina, sertralina, fluvoxamina, nefazodona, venlafaxina,
clomipramina, amitriptilina; 7 haloperidol, perfenazina, thioridazina; 8 triazolam, alprazolam, midazolam, diazepam, bromazepam, imipramina, amitriptilina, nefazodona; 9 amiodarona, lidocaína, quinidina, propafenona, disopiramida; 10 diltiazem, verapamil, nifedipina; 11 omeprazol; 12 alfentanil, 13 tamoxifeno, testosterona, cortisol, progesterona, etinilestradiol, paclitaxel; 14 terfenadina, loratasina, astemizol; 15 eritromicina, troleandomicina, dapsona; 16 ciclosporina, tacrolimus; 17 carbamazepina; 18 ritonavir, saquinavir, indinavir, nelfinavir; 19 nefazodona, fluvoxamina, fluoxetina, sertralina, paroxetina,venlafaxina; 20 cetoconazol, itraconazol, fluconazol. Fonte: TANAKA, 1998.
Implicações clínicas da inibição enzimática.
A relevância clínica das interações medicamentosas por inibição da biotransformação
depende de vários fatores. O índice terapêutico da droga envolvida é uma das mais
importantes considerações. Pacientes recebendo anticoagulantes, antidepressivos ou
agentes cardiovasculares geralmente apresentam um risco maior devido ao baixo índice
terapêutico destas drogas. Embora a maioria das interações que podem ocorrer com estes
agentes são manejáveis, geralmente por ajuste adequado da dosagem, algumas destas
interações podem colocar em risco a vida do paciente.
Uma interação importante, que pode levar a arritmia ventricular fatal em alguns
pacientes, ocorre com a administração concomitante de terfenadina e cetoconazol (HONIG
et al, 1993). A terfenadina é extensivamente biotransformada pela CYP3A4 para 2
metabólitos, por N-dealquilação e hidroxilação. Depois da administração oral de 60mg, a
terfenadina não é normalmente detectável no plasma, devido à alta taxa de extração
hepática (efeito de primeira passagem); portanto a administração de drogas que inibem esta
biotransformação pode resultar em aumento da concentração plasmática da terfenadina, a
qual pode levar o aparecimento de efeitos colaterais graves como a arritmia cardíaca.
A inibição enzimática também pode reduzir a eficácia clínica de uma droga, caso ela
seja administrada na forma de pró-fármaco e requer uma ativação metabólica para exercer
os seus efeitos terapêuticos, como por exemplo, a codeína e o proguanil.
O polimorfismo genético das isoformas do CYP também é um fator importante quando
se estudam as interações medicamentosas em nível de biotransformação. Um exemplo é o
caso da interação do omeprazol e do diazepam – os quais são biotransformados
predominantemente pela CYP2C19. A coadministração de omeprazol resulta em um
aumento significativo na AUC do diazepam para os MEs, o que não ocorre em MPs
(ANDERSSON et al, 1990). De modo similar a coadministração de quinidina – um inibidor da
CYP2D6 – aumenta a concentração plasmática da encainida, um agente antiarrítmico
biotransformado principalmente pela CYP2D6 em ME. Porém em MP a quinidina tem pouco
ou nenhum efeito sobre a concentração plasmática da encainida (TURGEON et al, 1990),
sugerindo que os MEs são mais suscetíveis à inibição enzimática que os MPs, provavelmente
por que em MPs outras vias de eliminação passam a ser predominantes.
Apesar das interações que envolvem a inibição enzimática serem geralmente relatadas
como prejudiciais, estas interações podem ser exploradas terapeuticamente como no caso
da associação do cetoconazol com a ciclosporina, com o objetivo de prolongar a meia-vida
desta (KEOGH et al,1995), ou ainda a associação do saquinavir com o ritonavir para
aumentar a biodisponibilidade do saquinavir (KEMPF et al, 1997).
Implicações clínicas da indução enzimática.
Geralmente, os metabólitos são farmacologicamente menos ativos que a droga
inalterada; portanto a indução enzimática na maioria das vezes resulta em diminuição dos
efeitos terapêuticos devido ao aumento da biotransformação das drogas. Em alguns casos,
os metabólitos formados durante a biotransformação podem ser quimicamente reativos e a
indução enzimática pode levar a um aumento da toxicidade de certas drogas pelo aumento
da produção de metabólitos tóxicos.
O significado clínico das interações por indução enzimática pode ser determinado por
vários fatores incluindo:
o índice terapêutico e a eficácia da droga;
a fração eliminada por biotransformação;
as enzimas envolvidas no “clearance” metabólico;
a potência dos indutores enzimáticos;
o polimorfismo genético individual.
A rifampicina é um dos mais potentes indutores conhecido. Esta droga induz várias
isoformas do CYP, incluindo as famílias CYP2C e CYP3A. De acordo com HEIMARK et al
(1987) a redução das respostas antitrombóticas da varfarina pela rifampicina é causada pelo
aumento da biotransformação da varfarina. Outra interação clinicamente importante com a
rifampicina envolve a administração concomitante de contraceptivos orais, que pode
resultar em distúrbios menstruais ou em uma gravidez indesejada. O mecanismo envolvido
nesta interação consiste do aumento da biotransformação dos componentes estrogênicos e
progestogênicos do contraceptivo oral (BACK et al,1979). A rifampicina também aumenta a
biotransformação da ciclosporina, podendo resultar em concentração subterapêutica deste
agente imunossupressor (DANIELS et al, 1984).
A indução enzimática representa um problema comum no tratamento da epilepsia. O
fenobarbital, fenitoína e a carbamazepina são potentes inibidores do CYP (RIVA et al, 1996).
Assim como a rifampicina,o fenobarbital também pode estimular a atividade catalítica de
muitas isoformas do CYP, incluindo as famílias CYP2C e CYP3A. A fenitoína e a
carbamazepina parecem ser indutores menos potentes que a rifampicina e o fenobarbital
nas doses utilizadas clinicamente. Porém um estudo realizado por SHAW et al (1985) mostra
um aumento de 60 e 90% no “clearance” da fenazona em voluntários sadios depois de
múltiplas doses de fenitoína e carbamazepina, respectivamente.
Assim como a inibição enzimática, os MEs são mais susceptíveis a indução enzimática
que os MPs. O tratamento com rifampicina leva a um aumento significativo no metabolismo
da S-mefenitoína em MEs, mas este efeito não ocorre na biotransformação da S-mefenitoína
nos MPs (ZHOU et al, 1990).
A redução na concentração plasmática de um fármaco devido a administração
concomitante de um indutor enzimático, pode ser contornada pelo aumento da dosagem,
porém existe o perigo de acumulação excessiva deste fármaco quando o indutor é suspenso
e a atividade enzimática volta ao normal.
Excreção.
Depois de absorvidas e distribuídas, as drogas são eliminadas. Atualmente, o termo
eliminação se refere aos processos que resultam no término da ação das drogas no
organismo e geralmente envolvem a biotransformação inativadora e a excreção. Os
fármacos são excretados do organismo tanto em forma inalterada como na forma de
metabólitos. Os órgãos excretores, com a exceção dos pulmões, eliminam os compostos
polares de forma mais eficiente do que as substâncias com lipossolubilidade elevada.
O rim é o órgão mais importante de excreção de fármacos e de seus metabólitos. As
substâncias eliminadas nas fezes são sobretudo aquelas administradas por via oral e que
não são reabsorvidas pelo TGI. A excreção de fármacos no leite materno é importante não
por causa das concentrações eliminadas, mas porque são fontes potenciais de efeitos
farmacológicos indesejáveis no lactente.A excreção pulmonar é importante sobretudo para a
eliminação de vapores e gases anestésicos e a excreção de fármacos pelo suor, saliva, e
pelas lágrimas não é importante do ponto de vista quantitativo.
Teoricamente, as interações medicamentosas podem alterar a velocidade de
eliminação das drogas por qualquer uma das vias excretoras, todavia, as únicas interações
desse tipo que foram alvo de estudos cuidadosos são as que envolvem a excreção renal;
portanto os mecanismos das interações envolvendo esta via constituem o principal objetivo
deste capítulo.
A Função dos Rins na Eliminação de Drogas
Estrutura funcional básica do rim
Os rins são os órgãos responsáveis pela manutenção do volume e da composição do
fluido extracelular do indivíduo dentro dos limites fisiológicos compatíveis com a vida. A
manutenção do meio interno do organismo é feita pelos rins, principalmente através dos
seguintes processos:
regulação do volume de água do organismo;
controle do balanço eletrolítico;
regulação do equilíbrio ácido-base;
excreção de resíduos metabólicos endógenos como a uréia, proveniente das
proteínas, o ácido úrico dos ácidos nucléicos e a creatinina da creatina muscular.
O rim também atua na remoção de xenobióticos e seus metabólitos, do organismo. A
unidade funcional do rim é o néfron e cada rim é composto de aproximadamente 1,3 milhões
de néfron.
A figura 23 ilustra os diferentes componentes do néfron.. O sangue é filtrado no
glomérulo, que compreende os capilares glomerulares e a cápsula de Bowman. O fluido que
atravessa a membranas glomerular e entra no espaço de Bowman é um ultrafiltrado do
plasma; contém quase todas as substâncias que existem no plasma, exceto a maioria das
proteínas e substâncias que se encontram ligadas a estas. Este ultrafiltrado vai em direção
ao glomérulo onde cerca de 80% do seu conteúdo é reabsorvido. A alça de Henle conecta o
túbulo proximal ao túbulo distal, que por sua vez se conecta aos ductos coletores, que então
levam o filtrado renal para a bexiga.
FIGURA 23 - Estrutura do néfron. Adaptado de BONATE et al, 1998.
O rim é geralmente dividido em córtex renal e medula renal. O córtex renal é
constituído pela porção externa do rim que contém o glomérulo, túbulos proximal e distal, a
porção externa da alça de Henle, e ductos coletores. O córtex renal também contém muitas
enzimas biotransformadoras de porção interna do rim e contém a alça de Henle e os ductos
coletores.
O rim tem 3 mecanismos distintos: filtração glomerular (FG); secreção tubular (ST) e a
reabsorção tubular (RT). Os dois primeiros, filtração glomerular e a secreção tubular, atuam
no sentido de remover as drogas do organismo, enquanto o outro mecanismo, reabsorção
tubular, é um mecanismo de redistribuição agindo no sentido de manter a droga no
organismo. A taxa de excreção renal (TER) pode ser expressa matematicamente como: TER
= (FG + ST) – RT.
Filtração Glomerular
A ultra-estrutura da parede capilar glomerular é tal que permite um alto grau de
filtração de fluido, ao mesmo tempo em que restringe a passagem de compostos com pesos
moleculares relativamente grandes.
Diversos fatores influenciam a filtração glomerular das moléculas, incluindo as
dimensões, a carga e o formato moleculares. A passagem limitada de macromoléculas pode
ser encarada como conseqüência da presença de uma "barreira" de parede capilar
glomerular com poros uniformes, que possuem raios individuais de aproximadamente 50 Å.
Como aproximadamente 130 ml de água plasmática são filtrados através das membranas
capilares glomerulares a cada minuto (190 litros diários), o rim é admiravelmente adequado
a seu papel na excreção de drogas. A medida que se forma o ultrafiltrado, qualquer droga
que se encontre livre na água plasmática, ou seja, que não esteja ligada às proteínas
plasmáticas ou a elementos formados do sangue (por ex., hemácias), será filtrada como
decorrência da força impulsora proporcionada pela ação cardíaca.
Todas as drogas não-ligadas sofrerão filtração, contanto que seu tamanho molecular,
carga e formato não sejam excessivamente grandes. Os compostos com um raio efetivo
maior do que 20Å podem apresentar uma restrição na sua taxa de filtração glomerular; o
impedimento à passagem aumenta progressivamente com as ampliações no raio molecular e
a passagem aproxima-se de zero quando o raio do composto excede cerca de 42Å.
As substancias com carga (por ex., dextranas sulfatadas) costumam ser filtradas a
velocidades menores do que compostos neutros (por ex., dextranas neutras), mesmo quando
seus tamanhos moleculares são comparáveis. A maior restrição à filtração de moléculas
carregadas, em especial a ânions, provavelmente deve-se a uma interação eletrostática
entre a molécula filtrada e a presença de cargas negativas fixas na parede capilar
glomerular. Esses componentes estruturais altamente aniônicos da parede contribuem para
a existência de uma barreira eletrostática e tem maior tendência a se localizar nas regiões
de membrana basal endotelial ou glomerular.
A configuração molecular também pode influenciar a velocidade da filtração
glomerular das drogas. Diferenças no formato tridimensional das macromoléculas resultam
em uma restrição à passagem glomerular de moléculas globulares (por exemplo, proteínas)
em grau maior do que a de emaranhados aleatórios ou moléculas ampliadas (por exemplo,
dextranas). Assim, a retenção bastante eficiente de proteínas na circulação é atribuída a
uma combinação de fatores, que incluem sua estrutura globular, seu tamanho molecular e a
magnitude de sua carga negativa.
Os fatores que afetam a taxa de filtração glomerular (TFG) das drogas também são
capazes de influenciar a taxa de depuração da droga. A inflamação dos capilares
glomerulares, por exemplo pode provocar aumento da TFG e, conseqüentemente. aumento
da filtração das drogas. A maioria das drogas liga-se, pelo menos parcialmente, a proteínas
plasmáticas e , portanto, suas taxas de filtração efetivas são inferiores a TFG teórica.
Entretanto, qualquer fator que altere a ligação droga-proteína modifica a taxa de filtração
da droga. A faixa habitual de meias-vidas observadas para a maioria das drogas
exclusivamente depuradas por filtração glomerular é de 1 a 4 horas. Entretanto, serão
observadas meias-vidas consideravelmente mais longas caso ocorra grande ligação a
proteínas. (BERNDT & STITZEL, 1996)
Reabsorção Tubular
Normalmente, 180 litros de líquido são filtrados por dia, pelos glomérulos, enquanto o
volume diário de urina geralmente varia de 1 a 2 litros, ou seja, somente cerca de 1% do
filtrado é excretado, o restante é reabsorvido. À medida que o filtrado glomerular passa
através do túbulo renal, a água é progressivamente reabsorvida, o que aumenta a
concentração das drogas presentes no filtrado, criando portanto um gradiente de
concentração favorável à reabsorção destas drogas. Se o túbulo for livremente permeável às
moléculas do fármaco, cerca de 99% do fármaco filtrado vão ser reabsorvidos
progressivamente.
A maioria da reabsorção é um processo de modo passivo. Essas substâncias deixam o
filtrado para penetrar nas células tubulares e devem ser capazes de sair novamente da
célula para circular no sangue. Desse modo, devem atravessar pelo menos duas membranas
lipídicas. Fármacos com elevada lipossolubilidade e, portanto de alta permeabilidade
tubular são, assim, lentamente excretados. Se o fármaco for altamente polar e, por
conseguinte, de baixa permeabilidade tubular, o fármaco filtrado não vai conseguir sair do
túbulo e sua concentração vai subir constantemente, podendo ficar até cerca de 100 vezes
mais alta na urina que no plasma. Os fármacos tratados desse modo incluem digoxina e os
antibióticos aminoglicosídeos como gentamicina.
Sendo ácidos fracos ou bases fracas, muitos fármacos alteram sua ionização com o pH
(ver figura 24), e isto pode afetar acentuadamente a excreção renal. O efeito do pH sobre a
ionização implica que um fármaco básico vai ser mais rapidamente excretado numa urina
ácida, porque o baixo pH no túbulo vai favorecer a ionização e inibir, portanto, a
reabsorção. Reciprocamente, uma droga ácida vai ser excretada mais rapidamente se a
urina se tornar alcalina.
FIGURA 24 - Efeito do pH sobre a ionização de drogas ácidas e drogas básicas.
A fração da droga na sua forma aceptora de prótons (que corresponde à fração da
forma ionizada para as drogas ácidas ou a fração da forma não ionizada para as drogas
básicas) pode ser calculada em função do pH urinário e do pKa da droga utilizando a
seguinte expressão matemática: Fração do Aceptor de Prótons = 10(pH-pKa) / [1+10(pH-
pKa)] , que corresponde a um rearranjo da equação de Henderson-Hasselbach. A
porcentagem da droga ionizada é uma função altamente não linear com grandes taxas de
mudanças quando o pH da urina é próximo ao pKa da droga, ou seja, neste caso pequenas
mudanças no pH urinário resultam em grandes mudanças na porcentagem da droga que é
reabsorvida (ou excretada) (BONATE et al, 1998). Por exemplo, o fenobarbital – um ácido
fraco – tem um pKa de 7,2 a 37°C em uma solução aquosa com força iônica igual a do
plasma; em um pH plasmático de 7,4 ; cerca 61,3 % da droga vai estar em sua forma
ionizada (figura 25). Em valores de pH urinário menores que 7,2 a forma não ionizada da
droga será predominante, mas em pH urinário maior que 7,2 a forma ionizada predominará
e será excretada. A coadministração de drogas que aumentam o pH urinário, como o
bicarbonato de sódio, aumentará a eliminação renal do fenobarbital, e esta associação é útil
no tratamento da intoxicação por barbitúricos. (LINDBERG et al, 1992).
Na prática clínica, alterações no pH urinário são significativas se o pKa está entre 7,5
a 10,5 para drogas de natureza básica e entre 3,0 e 7,5 para drogas ácidas.
FIGURA 25 - Porcentagem de fenobarbital (uma droga ácida de pKa = 7,2) na forma ionizada em função do pH do meio.
Apesar da reabsorção tubular ser geralmente um processo de transporte passivo, a
reabsorção tubular pode ser ativa. Exemplos disto é a reabsorção da glicose e de vitaminas.
A reabsorção ativa está associada com as propriedades de outros transportes ativos
mediados por carreadores como: necessidade de energia; transporte com um gradiente
eletroquímico; saturação; estereoespecificidade e sujeito à inibição competitiva.
Secreção Tubular
O rim é o principal órgão excretor de drogas e seus metabólitos e tem desenvolvido
sistemas de transporte de alta capacidade para eliminar rapidamente grandes quantidades
de compostos exógenos que chegam até ele. Além da filtração glomerular, o processo de
secreção tubular é muito importante e pode resultar na remoção de grandes quantidades de
substâncias do sangue em um curto intervalo de tempo. O conhecimento dos mecanismos de
secreção tubular de drogas e seus metabólitos permitirá a prevenção e o entendimento das
interações medicamentosas envolvendo a excreção renal.
As células de túbulos contornados proximais transportam ativamente certas
substâncias do plasma para a urina tubular através de sistemas de transporte específicos.
Os mecanismos celulares de transporte renal envolvem um sistema de transporte para
ânions orgânicos, um sistema de transporte para cátions orgânicos e um transportador de
múltiplas drogas ou P-glicoproteína (Pgp).
Diferentemente do mecanismo de filtração glomerular, a eliminação de drogas que são
secretadas do plasma para os túbulos renais pode ou não ser afetada pelo deslocamento das
LPP. Isto ocorre porque a cinética da ligação à proteína é normalmente muito mais rápida
comparada com a cinética do transporte tubular, além do que a cinética do transporte ativo
é saturável. Quando a droga livre no plasma é transportada para o túbulo renal, ocorre um
desequilíbrio nas mediações da membrana basal tubular, porém uma dissociação da droga
ligada, que é muito mais rápida que o transporte, restabelece rapidamente a condição de
equilíbrio no local; inclusive, a LPP pode aumentar a excreção renal de drogas que são
secretadas ativamente para o túbulo renal, uma vez que as proteínas plasmáticas podem
atuar neste caso como um transportador da droga para seu local de excreção (INOUE et al,
1987). Para drogas altamente ligadas a proteínas plasmáticas e eliminadas principalmente
por secreção tubular renal, um deslocamento das LPP por outras drogas vai aumentar o seu
Vd e pode resultar em diminuição da sua depuração renal.
Sistema de transporte para ânions orgânicos
Os mecanismos de transporte renal de ânions orgânicos só foram identificados no
túbulo proximal. Estes mecanismos permitem a secreção de muitos ânions orgânicos, entre
eles compostos endógenos como o oxalato, prostaglandinas e o ácido úrico, e muitos tipos
de compostos exógenos, como os antibióticos (cefalosporinas e penicilinas), contrastes
radiológicos, diuréticos (furosemida), analgésicos, e seus metabólitos, conjugados ou não.
Este transporte pode ser tão eficiente que alguns ânions são quase removidos
completamente durante a primeira passagem pelo rim (ROCK-RAMEL, 1998).
ULLRICH & RUMRICH (1988) têm estudado o sistema de secreção tubular renal e
reportam três sistemas diferentes de carreadores de ânions: um sistema de co-transporte
Na+/Dicarboxilato, um sistema de co-transporte Sulfato/Oxilato e um sistema para longas
cadeias hidrofóbicas, moléculas carregadas negativamente e ácidas graxos de cadeia longa,
que é chamado de transportador de ânions orgânicos ou transportador para-amino-hipurato.
O mecanismo mais extensamente estudado foi o da secreção de para-amino-hipurato
(PAH). O processo global de secreção requer, em primeiro lugar, a captação de PAH do
líquido intersticial pela célula através da membrana basolateral (MBL) e, em segundo lugar,
o movimento subseqüente do PAH da célula para o líquido tubular através da membrana
luminal (ML) também chamada de membrana com borda em escova.
Desde os primeiros experimentos in vitro, está claro que os procedimentos que
comprometem a produção de energia celular, incluindo a diminuição de temperatura,
inibidores metabólicos, ou anóxia, resultam em uma redução acentuada do transporte de
ânions orgânicos.
A etapa que requer energia deve ocorrer na MBL onde os ânions são transportados do
fluido extracelular (FEC) para a célula do túbulo renal contra um gradiente eletroquímico. A
remoção de sódio e a inibição da bomba de Na+/K+ (Na+/K+ ATPase) com ouabaína
indicaram que esta etapa requer um gradiente de Na+ com alta concentração de Na+
extracelular em relação ao meio intracelular, sugerindo que o transporte do ânion é
mediado por um mecanismo de co-transporte Na+/ânion orgânico.(PRITCHARD & MILLER,
1993). Porém, quando esta possibilidade era testada em vesículas isoladas de MBL por
BERNER & KINNE (1976), o acoplamento direto de NA+ com o ânion orgânico secretado
não foi demonstrado. Estes resultados levaram muitos grupos a sugerirem que a entrada do
ânion orgânico deve estar ligada ao metabolismo, talvez através de uma troca por um
intermediário metabólico.
SHIMADA et al (1987) propuseram que os ânions orgânicos atravessam a MBL através
de uma troca por outro ânion através de um processo de antiporte, ou seja por meio de um
trocador aniônico eletroneutro. Este outro ânion por sua vez é mantido em altas
concentrações no meio intracelular através de um mecanismo de simporte envolvendo a
entrada de Na+. Depois foi demonstrado (PRITCHARD, 1995) que o a-cetoglutarato (a-KG)
provavelmente seja o ânion fisiológico envolvido nesta troca aniônica que ocorre na MBL, a
qual é responsável pela entrada dos ânions orgânicos nas células do túbulo proximal para
sua posterior secreção.
Como descrito na figura 26, a captação do ânion orgânico pelas células tubulares
consiste de um processo terciário, ligado ao consumo de energia metabólica por duas etapas
intermediárias. O 5’-trifosfato de adenosina (ATP) é hidrolisado pela bomba de Na+/K+, que
resulta em uma alta concentração de Na+ extracelular em relação à concentração de Na+
intracelular. O Na+ penetra na célula a favor de seu gradiente e por um mecanismo de co-
transporte o a-KG entra acoplado, criando então um gradiente (concentração intracelular
maior que a concentração extracelular) de a-KG. O ânion orgânico é transportado através da
MBL por um trocador aniônico que envolve a saída do a-KG. Desta maneira o a-KG é
reciclado e o processo global consiste da entrada do ânion orgânico juntamente com o íon
Na+.
Os inibidores do trocador ânion orgânico/a-KG, como a probenecida, ou inibidores do
co-transportador Na+/a-KG, como o lítio ou fumarato, podem inibir o sistema de secreção
tubular de ânions orgânicos.
Interessante notar que diferente do sítio do ânion orgânico no trocador que aceita um
amplo espectro de substratos o sítio para o dicarboxilato é muito específico. Somente o
glutarato, suberato, ou adipato pode substituir o a-KG. (PRITCHARD & MILLER, 1996).
Diferentes mecanismos facilitadores do efluxo celular do PAH forma identificados em
vesículas de ML, como a difusão do PAH por meio de um via voltagem-sensitiva, um
trocador PAH/anion com afinidade para muitos ânions monovalentes e um trocador PAH/a-
KG similar ao encontrado na MBL, porém o efluxo apical do PAH ainda não está elucidado
(ROCK-RAMEL, 1998).
FIGURA 26 - Mecanismo de secreção de ânions orgânicos. 1- Criação de um gradiente eletroquímico a favor da entrada de Na+ na célula pela Bomba de Na+/K+ (Na+/K+-ATPase). 2- Co-transporte de um íon Na+ e o a-KG. 3- Troca aniônica com a entrada do ânion orgânico (OA-) e a saída do a-KG. 4- Secreção passiva do ânion orgânico para o lúmen tubular. Adaptado de PRITCHARD & MILLER, 1996.
Sistema de transporte para cátions orgânicos
Em todos os animais estudados, de crustáceos e peixes a mamíferos, tem sido
mostrado uma secreção de cátions orgânicos. Durante a secreção, estes solutos devem
atravessar duas membranas lipoprotéicas e interagirem com o citoplasma celular. Dados de
estudos sobre depuração renal em túbulos isolados perfundidos e células de túbulo proximal
monocamada indicam que proteínas carreadoras específicas da membrana plasmática
medeiam o transporte de cátions orgânicos na MBL e na ML das células epiteliais tubulares.
Além disso, estes estudos mostram que os movimentos dos cátions orgânicos do FEC para o
lume tubular não podem ser explicados somente por processos passivos de transporte, como
a simples difusão, pelo contrário o transporte transepitelial de cátions orgânicos depende de
energia e é interrompido por inibidores do metabolismo (PRITCHARD & MILLER, 1996).
Em 1979, estudos iniciais do transporte transepitelial de N-metilnicotinamida (NMN)
envolvendo a passagem desta substância pela ML e MBL levaram KINSELLA et al, (1979) a
proporem um modelo de duas etapas, na qual a secreção do cátion orgânico era mediada
por carreadores distintos para cada face das células do túbulo proximal. Os cátions
orgânicos atravessariam a MBL por difusão facilitada, dirigida pelo potencial elétrico
transmembrana (lado interior negativo). A secreção luminal seria mediada por um trocador
envolvendo outros cátions orgânicos ou prótons (antiporte). Porém, este modelo precisou
ser modificado para incluir dois novos elementos: o seqüestro dos cátions orgânicos por
elementos intracelulares e a participação da hidrólise de ATP neste sistema. (PRITCHARD &
MILLER, 1996).
SMITH et al (1988) correlacionaram a diferença de potencial elétrico na MBL e o
transporte de tetraetilamônio (TEA) para dentro da célula e concluíram que procedimentos
que despolarizavam a MBL inibiam a entrada de TEA e procedimentos que hiperpolarizavam
estimulavam a entrada de TEA.
A diferença de potencial nas MBL das células do túbulo proximal varia em média de –
60 a –80 mV; portanto, se a difusão facilitada fosse o único mecanismo que contribuísse
para a acumulação intracelular, não poderíamos esperar que a fração entre a concentração
tecidual e a concentração no FEC ( [T]/[FEC] ) fosse maior que 10 a 15 para cátions
orgânicos monovalentes. Portanto, a difusão facilitada por si só não poderia resultar nas
altas concentrações de TEA encontradas nos túbulos proximais de coelhos (SCHALI et al,
1983) e cobras (HAWK & DANTZLER, 1984), onde os valores [T]/[FEC] podem exceder a
100.
Desde que nenhum mecanismo adicional que realiza a entrada de cátions orgânicos, e
portanto aumentam a sua concentração intracelular, foi identificado, muitos pesquisadores
têm sugerido que os cátions orgânicos possam ser seqüestrados no citoplasma e assim a
concentração celular destes cátions podem superestimar a concentração que seria possível
de se conseguir somente com a difusão facilitada pela diferença de potencial. Certamente a
ligação intracelular às proteínas citosólicas pode contribuir, porém um segundo tipo de
seqüestro muito importante consiste na acumulação dos cátions orgânicos em organelas
intracelulares ácidas, como os endossomos, lisossomos e vesículas de Golgi. Estudos de
PRITCHARD et al (1994) com vesículas endossomais isoladas do córtex renal de ratos
mostram que o seqüestro de TEA é realizado por um mecanismo dependente de ATP e que
este mecanismo é saturável e pode ser inibido por vários outros cátions orgânicos, incluindo
darstina, quinina e o NMN. O seqüestro de TEA em vesículas intracelulares depende do
baixo pH intravesicular, que é mantido por uma H+-ATPase na membrana endossomal,
sugerindo que o cátion orgânico entre na vesícula por uma troca com um próton (figura 27).
A capacidade da célula tubular renal de seqüestrar os cátions orgânicos em vesículas
intracelulares é fundamental para a entrada e posterior secreção tubular destas
substâncias.
Vários estudos em vesículas de ML isolados, assim como em células do túbulo
proximal mostram que o transporte do cátion orgânico para o lume tubular é realizado por
um antiporte cátion orgânico/próton eletroneutro, que pode utilizar a energia potencial
estocada na forma de gradiente de pH para dirigir o movimento de uma variedade de
substratos catiônicos para o lume tubular (PRITCHARD & MILLER, 1993) (figura 27).
FIGURA 27 - Mecanismo de transporte de cátions orgânicos (OC+) no túbulo proximal. 1- Entrada do cátion orgânico (OC+) na célula tubular facilitada pela diferença de potencial elétrico transmembrana. 2- Seqüestro do OC+ em endossomos, um processo que envolve a hidrólise de ATP pela H+–ATPase. 3 - Secreção luminal do OC+ através de uma troca com um próton. Adaptado de PRITCHARD & MILLER, 1996.
O sistema de transporte catiônico é responsável pela secreção de bases fracas;
freqüentemente são compostos contendo o nitrogênio (incluindo a maioria dos
neurotransmissores) que estão ionizados no pH fisiológico. O quadro 7 mostra algumas
substâncias que interagem com o sistema de transporte catiônico.
QUADRO 7 - Compostos que interagem com o sistema de transporte catiônico.ENDÓGENOS XENOBIÓTICOS
Acetilcolina AmiloridaColina Cimetidina
Dopamina EfedrinaEpinefrina MetadonaHistamina Morfina
Norepinefrina ProcainamidaSerotonina Trimetoprim
FONTE: BONATE et al, (1998).
P-glicoproteína
A P-glicoproteína é uma bomba de efluxo de múltiplas drogas dependente de energia.
Ela transporta muitos cátions orgânicos e está associada com o fenômeno de resistência
múltipla a drogas (MDR). Esta proteína pertence a super família de transportadores ABC
( do inglês “ATP Binding Cassete”) que contêm uma fita altamente conservada, que é ligante
de ATP; a ligação e hidrólise do ATP parece ser essencial para o funcionamento da Pgp
incluindo o transporte de drogas. Esse tipo de transportador está envolvido em outros
processos como na fibrose cística e na resistência do protozoário Plasmodium falciparum, à
droga antimalárica cloroquina. O número de membros conhecidos da super família ABC de
transportadores de células eucarióticas está aumentando rapidamente e as funções normais
de alguns deles estão se tornando evidentes. A Pgp é uma proteína da membrana plasmática
de 170 kDa e é codificada pelo gene MDR1 localizado no cromossomo humano 7. O gene
MDR1 desempenha um importante papel na absorção e excreção de muitos agentes
farmacológicos usados normalmente e xenobióticos, e ele tem uma função chave na
regulação dos níveis celulares e teciduais desses agentes (AMBUKAR et al, 1999).
A Pgp pode ser encontrada na ML do túbulo proximal renal e parece ser responsável
pelo transporte de compostos contendo nitrogênio, compostos aromáticos hidrofóbicos e
também de substâncias neutras como os corticosteróides e a digoxina. Alguns compostos
podem ser transportados tanto pela Pgp como pelo antiporte H+/cátion orgânico
pertencente ao sistema de secreção de cátions, enquanto outras substâncias, como o TEA,
não interagem com a Pgp. Assim, este transportador ABC deve ser considerado como um
sistema de transporte adicional para a secreção e eliminação renal de drogas e seus
metabólitos (SOMOGYI 1996).
Entre as interações clinicamente importantes envolvendo o transporte renal pela Pgp,
destacam as interações com a digoxina; que é o glicosídio cardíaco mais utilizado
atualmente e a sua eliminação é realizada principalmente por excreção renal envolvendo a
filtração glomerular e a secreção tubular. A coadministração de medicamentos, como a
quinidina, verapamil, e ciclosporina A, que diminuem a excreção da digoxina requer um
ajuste da dose de digoxina para prevenir a toxicidade causada pelo aumento da
concentração plasmática da digoxina. Estudos realizados por TANIGAWARA et al (1992)
demonstraram que a digoxina é secretada pela Pgp no túbulo proximal renal e este
transporte pode ser inibido pela quinidina, verapamil e ciclosporina A, indicando que o
mecanismo envolvido nesta importante interação medicamentosa consiste na inibição da
Pgp localizada na ML das células tubulares renais (figura 28). Outros trabalhos
(WOODLAND et al, 1997) mostram que a propafenona e seus principais metabólitos, o 5-
hidroxipropafenona e o N-depropilpropafenona inibem significativamente a secreção tubular
renal de digoxina e de vimblastina por inibirem o transporte realizado pela Pgp na ML.
FIGURA 28 - Mecanismo de inibição da eliminação renal, mediada pela Pgp, de digoxina pela quinidina, ciclosporina A e verapamil. Adaptado de TANIGAWARA et al, 1992.
Interações Medicamentosas em Nível de Excreção Renal.
A importância clínica do estudo destes processos de transporte renal está
intimamente relacionada com a prevenção e tratamento das interações medicamentosas. As
interações em nível de filtração glomerular estão relacionadas principalmente com o
deslocamento das LPP e geralmente não traz implicações clínicas importantes, a não ser o
ajuste de doses em alguns casos.
O processo de reabsorção tubular está sujeito a alterações principalmente pela
mudança do pH urinário. As drogas ácidas (como por exemplo os salicilatos e barbitúricos)
têm sua reabsorção diminuída por alcalinizantes da urina como NaHCO3, acetazolamina,
entre outros. As drogas de caráter básico (anfetaminas, metadona, quinidina e
procainamida) podem ter sua reabsorção diminuída por acidificantes da urina como por
exemplo, ácido ascórbico e NH4Cl. Esses processos decorrem de alterações na ionização da
droga, modificando conseqüentemente a sua lipossolubilidade e a sua capacidade de serem
reabsorvidas para o sangue a partir dos túbulos renais aumentado ou diminuindo assim a
depuração renal da droga. As alterações do fluxo urinário também podem modificar a
reabsorção das drogas, por exemplo o fato dos diuréticos tenderem a aumentar a excreção
urinária de outras drogas como o caso da furosemida que aumenta a taxa de excreção da
indometacina e assim reduz a sua concentração plasmática.
As interações medicamentosas envolvendo a inibição da secreção tubular ativa e
conseqüentemente a diminuição da eliminação renal com o aparecimento de efeitos tóxicos
dos fármacos, parecem ser as mais importantes clinicamente e estão sendo alvos de muitos
estudos.
A probenicida é o inibidor típico da secreção de ânions orgânicos e pode ser utilizada
para avaliar se uma substância é eliminada por secreção tubular via transporte aniônico ou
ainda para prolongar a meia-vida de outra substância como a penicilina.
Um trabalho de SOMOGYI et al (1983) mostra que a cimetidina inibe o sistema de
secreção tubular de cátions orgânicos e diminui a depuração renal de procainamida e do seu
metabólito N-acetilprocainamida, e representa a primeira evidência documentada deste tipo
de interação em humanos. As implicações clínicas deste estudo se referem principalmente a
necessidade de um ajuste das doses de procainamida em pacientes que estejam recebendo
cimetidina. A interação é pertinente não somente para drogas de caráter básico que são
depuradas pelos rins, mas também para os metabólitos de drogas e substâncias endógenas
que são secretados pelo sistema de transporte catiônico tubular renal. Em um trabalho
realizado por VLASSES et al (1989) fica evidente que o trimetoprim também pode aumentar
as concentrações plasmáticas de procainamida e N-acetilprocainamida, pela competição da
secreção tubular renal catiônica.
Conclusões.
O uso de várias drogas é muitas vezes essencial para que se obtenha o resultado
terapêutico desejado ou para o tratamento de doenças coexistentes.
Vários exemplos são encontrados na prática clínica, onde se faz necessário a
prescrição de dois ou mais fármacos, como no tratamento da hipertensão e da insuficiência
cardíaca, na quimioterapia antineoplásica e no tratamento de certos moléstias infecciosas.
Quando os profissionais de saúde utilizam vários fármacos ao mesmo tempo, eles enfrentam
o problema de saberem se uma associação específica em dado paciente possui o potencial
de provocar uma interação e, neste caso, como tirar proveito dela se ela conduzir a um
aumento de eficácia, ou como evitar as conseqüências de uma interação caso sejam
adversas.
A interação potencial de drogas é a expressão que se refere às possibilidades de que
uma droga possa alterar os efeitos farmacológicos de outra droga administrada
concomitantemente. O resultado final pode ser a intensificação, inclusive com o
aparecimento de efeitos tóxicos, ou a diminuição dos efeitos de uma ou de duas drogas. Ou
ainda o aparecimento de novo efeito que não é observado com nenhum dos dois fármacos
usados isoladamente.
As interações medicamentosas mais importantes ocorrem com aqueles fármacos
apresentam toxicidade facilmente reconhecível e baixa índice terapêutico, de tal modo que
mudanças relativamente pequenas no efeito da droga podem ter conseqüências adversas
significantes. Ainda mais, as interações entre drogas podem ser importantes se a doença
que está sendo controlado com a droga é grave ou potencialmente fatal quando não tratada
e se os objetivos finais terapêuticos estão claramente definidos.
A freqüência das interações medicamentosas clinicamente importantes não é bem
estabelecida. A incidência de interações indesejadas aumenta proporcionalmente ao número
de fármacos administrados tanto por automedicação quanto por prescrição médica. Embora,
relativamente pouco freqüentes, há reações adversas sérias ou letais cansadas por
interações entre fármacos com potencial de risco maior, como anticoagulantes, glicosídeos
cardíacos, antiarrítmicos, hipoglicemiantes, lítio, antineoplásicos e agentes nefrotóxicos.
Interações que determinam perda de eficácia se dão, por exemplo, entre corticosteróides,
anticonvulsivantes, contraceptivos orais, cimetidina, teofilina e alguns antibióticos.
As interações, especialmente as que resultam em efeitos adversos, têm sido descritas
em estudos com modelos animais, in vitro e em relatos de casos, o que pode superestimar
sua prevalência, não definindo a relevância clínica. Sua observação em ensaios controlados
é, provavelmente, a forma mais adequada de detectar e quantificar as interações
clinicamente importantes. O reconhecimento dos efeitos benéficos e a identificação e
prevenção das interações adversas entre drogas exigem um conhecimento minucioso dos
fármacos prescritos, incluindo a suas propriedades químicas, farmacodinâmicas e
farmacocinéticas. O acesso a fontes de informação segura, objetiva e bem organizada é
importante e pode reduzir a necessidade do profissional de memorizar as interações
potenciais, porém o conhecimento dos mecanismos prováveis das interações
medicamentosas é essencial para o planejamento de um regime terapêutico seguro e eficaz.
As interações envolvendo mecanismos farmacocinéticos são as mais freqüentes e
promovem, muitas vezes, influência significativa sobre a terapêutica. As interações que
envolvem a absorção, a distribuição, a biotransformação e a depuração renal recebem muita
atenção e muitos exemplos são encontrados na literatura.
Existem algumas estratégias que podem ser adotadas para diminuir o risco de
potenciais problemas resultantes das interações medicamentosas. O número de drogas
prescritas para cada paciente deve ser limitado ao mínimo necessário. O uso de drogas deve
ser revisado regularmente e os agentes desnecessários devem ser suspensos, com
subseqüente monitoração. Os pacientes devem ser incentivados a relatarem ao médico,
farmacêutico e outros profissionais de saúde envolvidos, sintomas que ocorrem quando
novas drogas são introduzidas.
Referências.
ALBERTS, B. et al. Biologia Molecular da Célula 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
AMBUDKAR, S.V. et al. Biochemical, cellular, and pharmacological aspects of the multidrug
transporter. Annual Review of Pharmacology and Toxicology, v.39, p.361-398, 1999.
AMEER, B. & WEINTRAUB, R.A. Drug interactions with grapefruit juice. Clinical
Pharmacokinetics, v. 33, n. 2, p. 103-121, Aug. 1997.
ANDERSSON, T. et al. Effect of omeprazole treatment on diazepam plasma levels in slow
versus normal rapid metabolizers of omeprazole. Clinical Pharmacology and Therapeutics,
v. 47, n. 1, p. 79-85, Jan. 1990.
BACK, D.J. et al. The effect of rifampicin on norethisterone pharmacokinetics. European
Journal of Clinical Pharmacology, v. 15, n. 3, p. 193-197, Apr. 1979.
BENET, L.Z.; KROETZ, D.L.; SHEINER, L.B. Farmacocinética: A dinâmica da absorção,
distribuição e eliminação dos fármacos. In: HARDMAN, J.G.; LIMBIRD, L. E. (eds.) Goodman
e Gilman: As Bases Farmacológicas da Terapêutica 9. ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill,
1996.
BERNDT, W.O. & STITZEL, R.E. Excreção de Drogas. In: CRAID, C.R. & STITZEL, R.E.
Farmacologia Moderna 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1996. p. 45-50.
BERNER, W. & KINNE, R. Transport of p-aminohippuric acid by plasma membrane vesicles
isolated from rat kidney cortex. Pflugers Archiv. European Journal of Physiology, v. 361, n.
3, p. 269-277, Feb. 1976.
BERTZ, R.J. & GRANNEMAN, G.R. Use of in vitro and in vivo data to estimate the likelihood
of metabolic pharmacokinetic interactions. Clinical Pharmacokinetics, v. 32, n. 3, p. 210-
258, Mar. 1997.
BONATE, P.L.; REITH, K.; WEIR, S. Drug interactions at the renal level. Implications for
drug development. Clinical Pharmacokinetics, v. 34, n. 5, p. 375-404, May 1998.
BONDON, A. et al. Oxidation of cycloalkylamines by cytochrome P-450. Mechanism-based
inactivation, adduct formation, ring expansion, and nitrone formation. Journal of Biological
Chemistry, v. 264, n. 4, p. 1988-1997, Feb. 1989.
BRODIE, B. B. Physiochemical factors in drug absorption. In: BINNS, T.B. (ed.) Absorption
And Distribution Of Drugs. Baltimore: The Williams E Wilkins Co., 1964. p. 16-48.
CARVER, P.L. et al. Meal composition effects on the oral bioavailability of indinavir in HIV-
infected patients. Pharmaceutical Research, v. 16, n. 5, p. 718-724, May 1999.
CAVET, M.E.; WEST, M.; SIMMONS, N.L. Transport and epithelial secretion of the cardiac
glycoside, digoxin, by human intestinal epithelial (Caco-2) cells. British Journal of
Pharmacology, v. 118, n. 6, p. 1389-1396, July 1996.
COSTA, T.D. & STRECK, E.L. Isoformas do citocromo P450 e outros fatores que alteram a
biotransformação de fármacos Infarma, v. 11, n. 11/12, p. 36-41, nov./dez. 1999.
D’ARCY, P.F. & MCELNAY, J.C. Drug interactions involving the displacement of drugs from
plasma protein and tissue binding sites Pharmacology and Therapeutics, v. 17, n. 2, p. 211-
220, 1982.
DANAN, G.; DESCATOIRE, V.; PESSAYRE, D. Self-induction by erythromycin of its own
transformation into a metabolite forming an inactive complex with reduced cytochrome P-
450. Journal of Pharmacology and Experimental Therapeutics, v. 218, n. 2, p. 509-514, Aug.
1981.
DANIELS, N.J.; DOVER, J.S.; SCHACHTER, R.K. Interaction between cyclosporin and
rifampicin. Lancet, v. 2, n. 8403, p. 639, Sep. 1984.
DE MATTEIS, F. et al. Inactivation of cytochrome P-450 and production of N-alkylated
porphyrins caused in isolated hepatocytes by substituted dihydropyridines. Structural
requirements for loss of haem and alkylation of the pyrrole nitrogen atom. Febs Letters , v.
145, n. 1, p. 87-92, Aug. 1982.
DECKER, C.J. et al. Oxidative metabolism of spironolactone: evidence for the involvement of
electrophilic thiosteroid species in drug-mediated destruction of rat hepatic cytochrome
P450. Biochemistry, v. 28, n. 12, p. 5128-5136, June 1989.
ELIASSON, E.; JOHANSSON, I.; INGELMAN-SUNDBERG, M. Substrate-, hormone-, and
cAMP-regulated cytochrome P450 degradation. Proceedings of The National Academy of
Sciences of USA, v. 87, n. 8, p. 3225-3229, Apr. 1990.
FLEISHER, D. et al. Drug, Meal and Formulation Interactions Influencing Drug Absorption
After Oral Administration. Clinical Pharmacokinetics, v. 36, n. 3, p. 169-254, Mar. 1999.
FONSECA, A.L. Interações Medicamentosas Rio De janeiro: Editora De Publicações
Científicas, 1991.
GIBALDI, M. & LEVY, G. Pharmacokinetics in clinical practice. I. Concepts. Jama : The
Journal of The American Medical Association, v. 235, n. 17, p. 1864-1867, Apr. 1976.
GONZALEZ, F.J. The molecular biology of cytochrome P450s. Pharmacological Reviews, v.
40, n. 4, p.243-288, Dec. 1988.
GREENBLATT, D.J. & KOCH-WESWER, J. Clinical pharmacokinetics. New England Journal
of Medicine, v. 293, n. 19, p. 964-970, Nov. 1975.
GREIFF, J. M. & ROWBOTHAM, D. Pharmacokinetic drug interactions with gastrointestinal
motility modifying agents. Clinical Pharmacokinetics, v. 27, n. 6, p. 447-461, Dec. 1994.
GUENGERICH, F.P. Oxidation of 17 alpha-ethynylestradiol by human liver cytochrome P-
450. Molecular Pharmacology, v. 33, n. 5, p. 500-508, May 1988.
HALPERT, J.R. Covalent modification of lysine during the suicide inactivation of rat liver
cytochrome P-450 by chloramphenicol. Biochemical Pharmacology, v. 30, n. 8, p. 875-881,
Apr. 1981.
HALPERT, J.R. Structural basis of selective cytochrome P450 inhibition. Annual Review of
Pharmacology and Toxicology, v. 35, p. 29-53, 1995.
HALPERT, J.R. et al. Isozyme selectivity of the inhibition of rat liver cytochromes P-450 by
chloramphenicol in vivo. Molecular Pharmacology, v. 28, n. 3, p. 290-296, Sep. 1985.
HAMAR, C. & LEVY, G. Serum protein binding of drugs and bilirubin in newborn infants and
their mothers. Clinical Pharmacology and Therapeutics, v. 28, n. 1, p. 58-63, July 1980.
HANG, P.H.; DALE, M.M.; RITTER, J.M. Farmacologia 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 1997.
HAWK, C.T. & DANTZLER, W.H. Tetraethylammonium transport by isolated perfused snake
renal tubules. American Journal of Physiology, v. 246, n. 4 Pt 2, p. F476-F487, Apr. 1984.
HEIMARK LD et al. The mechanism of the warfarin-rifampin drug interaction in humans.
Clinical Pharmacology and Therapeutics, v. 42, n. 4, p. 388-394, Oct. 1987.
HONIG, P.K. et al. Terfenadine-ketoconazole interaction. Pharmacokinetic and
electrocardiographic consequences. Jama : The Journal of The American Medical
Association, v. 269, n. 12, p. 1513-1518, Mar. 1993.
HUANG, J.D. & OIE, S. Hepatic elimination of drugs with concentration-dependent serum
binding. Journal of Pharmacokinetics and Biopharmaceutics, v. 12, n. 1, p. 67-81, Feb. 1984.
HUUPPONEN, R.; SEPPALA, P.; LISALO, E. Effect of guar gum, a fibre preparation, on
digoxina e penicillin absorption in man. European Journal of Clinical Pharmacology, v. 26, n.
2, p. 279-291, 1984.
INGELMAN-SUNDBERG, M.; OSCARSON, M.; MCLELLAN, R.A. Polymorphic human
cytochrome P450 enzymes: an opportunity for individualized drug treatment. Trends in
Pharmacological Sciences, v. 20, n. 8, p. 342-349, Aug. 1999.
INOUE, M. et al. Mechanism of furosemide resistance in analbuminemic rats and
hypoalbuminemic patients. Kidney International, v. 32, n. 2, p. 198-203, Aug. 1987.
JONEN, H.G. et al. Influence of pyridine and some pyridine derivatives on spectral
properties of reduced microsomes and on microsomal drug metabolizing activity.
Biochemical Pharmacology, v. 23, n. 8, p. 1319-1329, Apr. 1974.
KEMPF, D.J. et al. Pharmacokinetic enhancement of inhibitors of the human
immunodeficiency virus protease by coadministration with ritonavir. Antimicrobial Agents
and Chemotherapy, v. 41, n. 3, p. 654-660, Mar. 1997.
KEOGH, A. et al. Ketoconazole to reduce the need for cyclosporine after cardiac
transplantation. New England Journal of Medicine, v. 333, n. 10, p. 628-633, Sep. 1995.
KINSELLA, J.L. et al. Transport of organic ions in renal cortical luminal and antiluminal
membrane vesicles. Journal of Pharmacology and Experimental Therapeutics, v. 209, n. 3, p.
443-450, June 1979.
KOBER, A.; OLSSON, Y.; SJOHOLM, I. Binding of drugs to human serum albumin. XIV. The
theoretical basis for the interaction between phenytoin and valproate. Molecular
Pharmacology, v. 18, n. 2, p. 237-242, Sep. 1980.
KOCH-WESER, J. & SELLERS, E.M. Drug therapy. Binding of drugs to serum albumin
(second of two parts). New England Journal of Medicine, v. 294, n. 10, p. 526-531, Mar.
1976.
LEAHEY, E.B. et al Interaction between quinidine and digoxin. Jama : The Journal of The
American Medical Association, v. 240, n. 6, p. 533-534, Aug. 1978.
LEHNINGER, A.L. Princípios de Bioquímica São Paulo: Sarvier, 1986.
LESCA, P. et al. A class of strong inhibitors of microsomal monooxygenases: the ellipticines.
Chemico-Biological interactions, v. 24, n. 2, p. 189-197, Feb. 1979.
LEVY, G. Effect of plasma protein binding on renal clearance of drugs. Journal of
Pharmaceutical Sciences, v. 69, n. 4, p. 482-483, Apr. 1980.
LEVY, G. & YACOBI, A. Letter: Effect of plasma protein binding on elimination of warfarin.
Journal of Pharmaceutical Sciences, v. 63, n. 5, p. 805-806, May 1974.
LIN, J.H. & LU, A.Y. Inhibition and induction of cytochrome P450 and the clinical
implications. Clinical Pharmacokinetics, v. 35, n. 5, p. 361-390, Nov. 1994.
LINDBERG, M.C.; CUNNINGHAM, A.; LINDBERG, N.H. 7 Acute phenobarbital intoxication.
Southern Medical Journal, v. 85, n. 8, p. 803-807, Aug. 1992.
LOMAESTRO, B.M. & BAILE, G.R. Absorption interactions with fluoroquinolones: 1995
update. Drug Safety, v. 12, n. 5, p. 314-333, May 1995.
LOPEZ GARCIA, M.P. et al. Human-liver cytochromes P-450 expressed in yeast as tools for
reactive-metabolite formation studies. Oxidative activation of tienilic acid by cytochromes P-
450 2C9 and 2C10. European Journal of Biochemistry, v. 213, n. 1, p. 223-232, Apr. 1993.
MCELNAY, J.C. & D’ARCY, P.F. Protein binding displacement interactions and their clinical
importance. Drugs, v. 25, n. 5, p. 495-513, May 1983.
MELLO, A.C. Biotransformação das drogas. In: SILVA, P. Farmacologia 5. ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. p. 51-57.
MUAKKASSAH, S.F.; BIDLACK, W.R.; YANG, W.C. Mechanism of the inhibitory action of
isoniazid on microsomal drug metabolism. Biochemical Pharmacology, v. 30, n. 12, p. 1651-
1658, June 1981.
MURRAY, M. & FARREL, G.C. Mechanistic aspects of the inhibition of microssomal drug
oxidation by primaquine. Biochemical Pharmacology, v. 35, n. 13, p. 2149-2155, July 1986.
NELSON, D.R. et al. P450 superfamily: update on new sequences, gene mapping, accession
numbers and nomenclature. Pharmacogenetics, v. 6, n. 1, p. 1-42, Feb. 1996.
OGA, S.; BASILE, A.C.; Medicamentos e suas Interações São Paulo: Atheneu, 1994.
PARK, B.K. et al. Relevance of inductuion of human drug-metabolizing enzymes:
pharmacological and toxicological implications. British Journal of Clinical Pharmacology, v.
41, n. 6, p. 477-491, June 1996.
PESSAYRE, D. et al. Self-induction by oleandomycin of its own transformation into a
metabolite forming an inactive complex with reduced cytochrome P-450. Comparison with
troleandomycin. Journal of Pharmacology and Experimental Therapeutics, v. 221, n. 1, p.
215-221, Apr. 1982a.
PESSAYRE, D. et al. Formation of an inactive cytochrome P-450 Fe(II)-metabolite complex
after administration of troleandomycin in humans. Biochemical Pharmacology, v. 31, n. 9, p.
1699-1704, May 1982b.
PIKE, S.F. et al. Induction of cytocrome P-450 by phenobarbital is mediated at the level of
transcription. Biochemical Pharmacology, v. 34, n. 14, p. 2489-2494, July 1985.
PINCKARD, R.N.; HAWKINS, D.; FARR, R.S. The influence of acetylsalicyclic acid on the
binding of acetrizoate to human albumin. Annals of The New York Academy of Sciences, v.
226, p. 341-354, Nov. 1973.
POLAND, A.; GLOVER, E.; KENDE, A.S. Stereospecific, high affinity binding of 2,3,7,8-
tetrachlorodibenzo-p-dioxin by hepatic cytosol. Evidence that the binding species is receptor
for induction of aryl hydrocarbon hydroxylase. Journal of Biological Chemistry, v. 251, n. 16,
p. 4936-4946, Aug. 1976.
PRITCHARD, J.B. Intracellular alpha-ketoglutarate controls the efficacy of renal organic
anion transport. Journal of Pharmacology and Experimental Therapeutics, v. 274, n. 3, p.
1278-1284, Sep. 1995.
PRITCHARD, J.B. & MILLER, D.S. Mechanisms mediating renal secretion of organic anions
and cations. Physiological Reviews, v. 73, n. 4, p. 765-796, Oct. 1993.
PRITCHARD, J.B. & MILLER, D.S. Renal secretion of organic anions and cations. Kidney
International, v. 49, n. 6, p. 1649-1654, June 1996.
PRITCHARD, J.B. et al. ATP-dependent transport of tetraethylammonium by endosomes
isolated from rat renal cortex. American Journal of Physiology, v. 266, n. 6 Pt 2, p. F966-
F976, June 1994.
REIDY, G.F.; MEHTA, I.; MURRAY, M. Inhibition of oxidative drug metabolism by
orphenadrine: in vitro and in vivo evidence for isozyme-specific complexation of cytochome
P-450 and inhibition kinetics. Molecular Pharmacology, v. 35, n. 5, p. 736-743, May 1989.
RIVA, R. et al. Pharmacokinetic interactions between antiepileptic drugs. Clinical
considerations. Clinical Pharmacokinetics, v. 31, n. 6, p. 470-493, Dec. 1996.
ROBERTS, E.S. et al. Mechanism-based inactivation of cytochrome P450 2B1 by 2-
ethynylnaphthalene: identification of an active-site peptide. Chemical Research in
Toxicology, v. 6, n. 4, p. 470-479, July/Aug. 1993.
ROCH-RAMEL, F. Renal transport of organic anions. Current Opinion in Nephrology and
Hypertension, v. 7, n. 5, p. 517-524, Sep. 1998.
ROWLAND, M. Plasma protein binding and therapeutic drug monitoring. Therapeutic Drug
Monitoring, v. 2, n. 1, p. 29-37, 1980.
SCHALI, C. et al. Secretion of tetraethylammonium by proximal tubules of rabbit kidneys.
American Journal of Physiology, v. 245, n. 2, p. F238-F246, Aug. 1983.
SELLERS, E.M. Interações entre drogas. In: KALANT, H. & ROSCHLAU, W.H.E. Princípios
de Farmacologia Médica 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991. p. 89-96.
SELLERS, E.M. & KOCH-WESER, J. Displacement of warfarin from human albumin by
diazoxide and ethacrynic,mefenamic, and nalidixic acids. Clinical Pharmacology and
Therapeutics, v. 11, n. 4, p. 524-529, July/Aug. 1970.
SHAW, G.C. & FULCO, A.J. Inhibition by barbiturates of the binding of Bm3R1 repressor to
its operator site on the barbiturate-inducible cytochrome P450BM-3 gene of Bacillus
megaterium. Journal of Biological Chemistry, v. 268, n. 4, p. 2997-3004, Feb. 1993.
SHAW, P.N. et al. Antipyrine metabolite kinetics in healthy human volunteers during
multiple dosing of phenytoin and carbamazepine. British Journal of Clinical Pharmacology,
v. 20, n. 6, p. 611-618, Dec. 1985.
SHIMADA, H.; MOEWES, B.; BURCKHARDT, G. Indirect coupling to Na+ of p-
aminohippuric acid uptake into rat renal basolateral membrane vesicles. American Journal
of Physiology, v. 253, n. 5 Pt 2, p. F795-F801, Nov. 1987.
SILVA, P. Farmacologia 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. p. 12-19.
SMITH, P.M.; PRITCHARD, J.B.; MILLER DS Membrane potential drives organic cation
transport into teleost renal proximal tubules. American Journal of Physiology, v. 255, n. 3 Pt
2, p. R492-R499, Sep. 1988.
SOMOGYI, A. Renal transport of drugs: Specificity and Molecular Mechanisms. Clinical and
Experimental Pharmacology and Phisiology, v. 23, n. 10/11, p. 986-989, Oct./Nov. 1996.
SOMOGYI, A.; MCLEAN, A.; HEINZOW, B. Cimetidine-procainamide pharmacokinetic
interaction in man: evidence of competition for tubular secretion of basic drugs. European
Journal of Clinical Pharmacology, v. 25, n. 3, p. 339-345, 1983.
STEEL, K. et al. Iatrogenic illness on a general service at a university hospital. New England
Journal of Medicine, v. 304, n. 11, p. 638-642, Mar. 1981.
TANAKA, E. Clinically important pharmacokinetic drug-drug interactions: role of
cytochrome P450 enzymes. Journal of Clinical Pharmacy & Therapeutics, v. 23, n. 6, p. 403-
416, Dec. 1998
TANIGAWARA, Y. et al. Transport of digoxin by human p-glycoprotein expressed in a
porcine kidney epithelial cell line (LLC-PK1). Journal of Pharmacology and Experimental
Therapeutics, v. 263, n. 2, p. 840-845, Nov. 1992.
THOMAS, P.E. et al Induction of two immunochemically related rat liver cytochrome P-450
isozymes, cytochromes P-450c and P-450d, by structurally diverse xenobiotics. Journal of
Biological Chemistry, v. 258, n. 7, p. 4590-4598, Apr. 1983.
TURGEON, J. et al. Genetically determined steady-state interaction between encainide and
quinidine in patients with arrhythmias. Journal of Pharmacology and Experimental
Therapeutics, v. 255, n. 2, p. 642-649, Nov. 1990.
ULLRICH, K.J. & RUMRICH, G. Contraluminal transport systems in the proximal renal
tubule involved in secretion of organic anions. American Journal of Physiology, v. 254, n. 4
Pt 2, p. F453-F462, Apr. 1988.
VLASSES, P.H. et al. Trimethoprim inhibition of the renal clearance of procainamide and N-
acetylprocainamide. Archives of internal Medicine, v. 149, n. 6, p. 1350-1353, June 1989.
WHITLOCK, J.P. Jr Mechanistic aspects of dioxin action. Chemical Research in Toxicology, v.
6, n. 6, p. 754-763, Nov./Dec. 1993.
WOODLAND, C. et al. The digoxin-propafenone interaction: Characterization of a
mechanism usind renal tubular cell monolayers The Journal of Pharmacology and
Experimental Therapeutics, v. 283, n. 1, p. 39-45, Oct. 1997.
ZHOU, H.H. et al. Induction of polymorphic 4'-hydroxylation of S-mephenytoin by
rifampicin. British Journal of Clinical Pharmacology, v. 30, n. 3, p. 471-475, Sep. 1990.
ZHOU, S.Y. et al. Intestinal metabolism and transport od 5-aminosalicylate Drug Metabolism
and Disposition, v. 27, n. 4, p. 479-485, Apr. 1999.
http://interacoesmedicamentosas.com.br/info/imrefer.php