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Excelentíssima Presidenta Dilma Rousseff, Gostaria de discorrer um pouco sobre conceito de produção científica e do preparo médico em nosso país, sem o intuito de esgotá-lo; no entanto de propor algumas sugestões. Não é raro podermos estabelecer um paralelo entre o desenvolvimento belicista do mundo e o aprimoramento das técnicas e de conhecimentos médicos. São muitos os exemplos deste tipo, a ultrassonografia que é utilizada na tecnologia dos sonares; a medicina hiperbárica cujos conhecimentos são frutos das investidas submarinas, etc. O modelo de saúde hospitalocêntrio está incluído nos exemplos supracitados. Originado em um mundo que carecia de cuidados assistenciais, principalmente em regiões remotas e no interior, as iniciativas militares necessitavam deslocar recursos médicos para zonas especiais em guerra. O uso do sistema centrado numa só estrutura, munidos de profissionais especializados em inúmeras áreas, de preferência as de urgência e emergência, foi idealizado. Seu intuito era lidar essencialmente com as lesões traumáticas e às doenças infecto-parasitárias que afligiam os militares e civis. Naturalmente a gestão e a crescente soma de conhecimentos adquiridos nestas experiências foram extrapoladas à forma como inúmeros governos administrariam a saúde de suas respectivas nações. Entretanto, mesmo disseminado pelo mundo, este construto já apresenta sinais de esgotamento. Atualmente, é ultrapassado, caro, excludente, hiperespecializado e centrado na doença. Dessa forma novos referenciais são demandados a todo tempo. Nosso país já está em interlocução com aquelas nações desenvolvidas que aprimoram e gerenciam novas formas de assistência: descentralizadas, preventivas, menos custosas, que lidam com as patologias prevalentes e locais. No entanto, isto não vem sendo sistematicamente discutido com as lideranças médicas brasileiras ou com os próprios médicos através das redes virtuais. Sem este espaço, não há interlocuções que efetivem o reposicionamento estratégico e necessário da classe; o que só gera desgaste e promove aqueles indivíduos que desejam avidamente o lucro e a satisfação de interesses pessoais através deste modelo centrado no hospital e na doença, que ganham com as tecnologias e os antigos e novos medicamentos. Se há uma demanda pela modificação do sistema, isto precisa chegar, em primeiro lugar, à formação de recursos humanos em saúde. Este é

Interiorização dos Médicos

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Soluções propostas para interiorização dos médicos!

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Excelentíssima Presidenta Dilma Rousseff,

Gostaria de discorrer um pouco sobre conceito de produção científica e do preparo médico em nosso país, sem o intuito de esgotá-lo; no entanto de propor algumas sugestões.

Não é raro podermos estabelecer um paralelo entre o desenvolvimento belicista do mundo e o aprimoramento das técnicas e de conhecimentos médicos. São muitos os exemplos deste tipo, a ultrassonografia que é utilizada na tecnologia dos sonares; a medicina hiperbárica cujos conhecimentos são frutos das investidas submarinas, etc.

O modelo de saúde hospitalocêntrio está incluído nos exemplos supracitados. Originado em um mundo que carecia de cuidados assistenciais, principalmente em regiões remotas e no interior, as iniciativas militares necessitavam deslocar recursos médicos para zonas especiais em guerra. O uso do sistema centrado numa só estrutura, munidos de profissionais especializados em inúmeras áreas, de preferência as de urgência e emergência, foi idealizado. Seu intuito era lidar essencialmente com as lesões traumáticas e às doenças infecto-parasitárias que afligiam os militares e civis. Naturalmente a gestão e a crescente soma de conhecimentos adquiridos nestas experiências foram extrapoladas à forma como inúmeros governos administrariam a saúde de suas respectivas nações.

Entretanto, mesmo disseminado pelo mundo, este construto já apresenta sinais de esgotamento. Atualmente, é ultrapassado, caro, excludente, hiperespecializado e centrado na doença. Dessa forma novos referenciais são demandados a todo tempo.

Nosso país já está em interlocução com aquelas nações desenvolvidas que aprimoram e gerenciam novas formas de assistência: descentralizadas, preventivas, menos custosas, que lidam com as patologias prevalentes e locais. No entanto, isto não vem sendo sistematicamente discutido com as lideranças médicas brasileiras ou com os próprios médicos através das redes virtuais. Sem este espaço, não há interlocuções que efetivem o reposicionamento estratégico e necessário da classe; o que só gera desgaste e promove aqueles indivíduos que desejam avidamente o lucro e a satisfação de interesses pessoais através deste modelo centrado no hospital e na doença, que ganham com as tecnologias e os antigos e novos medicamentos.

Se há uma demanda pela modificação do sistema, isto precisa chegar, em primeiro lugar, à formação de recursos humanos em saúde. Este é

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um dos pontos nevrálgicos, sobre o qual irei discorrer mais ao final do texto. Em um segundo momento, um processo de readequação da infraestrutura dos locais que receberão estes profissionais; fornecendo as condições necessárias à realização de procedimentos e cuidados médicos. Um sistema necessário para diagnosticar e lidar com as doenças prevalentes e comuns àquela população, sem a pretensão de atender às demandas especializadas; que seriam referenciadas a um centro regional melhor equipado e preparado para este fim.

Este segundo passo, poderá ser precedido de um estudo epidemiológico e dos recursos físicos e estruturais necessários - possivelmente conduzido por institutos sérios e de referência, como a Fiocruz - em cada região que receberá os profissionais de saúde. Um levantamento que pormenorizará as condições necessárias ao pleno funcionamento das equipes de saúde (construções, materiais, pessoal capacitado, etc.). O governo federal coordenaria todas as etapas e estabeleceria as metas, verificando-as regularmente e atrelando a liberação de verbas à execução e conclusão de cada etapa.

Sobre a questão da formação médica, penso que na atual conjuntura poderia ser criada uma campanha nacional de capacitação de TODOS os médicos brasileiros para atender aos quesitos supracitados [a reciclagem nacional dos médicos possibilitaria a disseminação dos novos conhecimentos à atual e as próximas gerações profissionais; garantiria a quebra de resistência após a ampla aceitação e discussão do modelo pela classe]. O intuito é a readequação e reestruturação do modelo de saúde que seria proposto conjuntamente com um modelo de carreira de Estado para a Saúde (esta atrelada à capacitação nesta especialização de forma direta e condicional). Isto certamente garantiria à interiorização e fixação do profissional no interior; além de atender de imediato a uma demanda antiga das Entidades Médicas: o concurso público federal com carreira de Estado. De fato, esta preparação técnica e as garantias de trabalho seriam aceitas por toda a classe médica sem titubeio.

Portanto, a proposta é pela criação de um sistema federal de especialização à distância em Medicina da Família e da Comunidade [talvez utilizando os mesmos recursos aplicados em: www.edx.org, www.coursera.org], aberta aos médicos de todo o país, e obrigatória aos médicos recém-formados. As aulas, o conteúdo programático, os conhecimentos científicos necessários seriam baseados em um modelo internacional de atenção em saúde comprovadamente funcional e efetivo. Obviamente que tudo seria adequado às nossas demandas nacionais e de saúde local. Até os professores de alguns módulos poderiam ser renomados cientistas

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convidados de outras nações, como já ocorre nos Congressos das especialidades médicas. Suas aulas, então, traduzidas e legendadas dentro do sistema garantiriam o acesso aos aprendizados. Poderiam ser criados pólos regionais de treinamentos das práticas médicas - para aqueles saberes que não poderiam ser transmitidos à distância - supervisionados por médicos que seriam capacitados pelo governo e trabalhariam dentro das próprias Instituições Federais – sem custo adicional com infraestrutura e mão-de-obra. A experiência de trabalho de campo supervisionada poderia ser realizada, antes dos médicos serem transferidos aos municípios do interior, em unidades de saúde adaptadas e administradas pelos próprios pólos [esta última incursão poderia ser feita somente por médicos que já estivessem admitidos na carreira de Estado].

Enfim, com estes esforços conjuntos um cenário prospectivo mais favorável ao sistema único de saúde poderia ser alcançado. E isto passa pela mudança dos conhecimentos médicos: de um modelo hospitalocêntrico para um que se detenha nas demandas de saúde local e regional, de forma descentralizada e preventiva. Um que realmente fizesse frente à precariedade da assistência médica atual e viabilizasse o SUS. Leandro Nunes Azevedo