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Introdução ao Planejamento Urbano Identidade local Aula 01 CEUNSP Prof. Estevam Vanale Otero Prof. Fernando Luiz Antunes Guedes Profa. Noemi Yolan Nagy Fritsch 2016

Introdução ao Planejamento Urbano Identidade local · não-lugares). Labirinto de limiares, fronteiras nebulosas e marcos fragmentários. -Nomes de ruas e praças são anacrônicos,

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Introdução ao Planejamento Urbano Identidade local

Aula 01

CEUNSP

Prof. Estevam Vanale Otero

Prof. Fernando Luiz Antunes Guedes

Profa. Noemi Yolan Nagy Fritsch 2016

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Identidade local

A guerra dos lugares Antônio A. Arantes

“Somos parte de um mundo só. Estamos juntos, mas não estamos no mesmo mundo. Se você, que nunca roubou, entrar no meu mundo, você é estranho. Se eu, que tenho passagem na polícia, entrar no seu mundo, sou estranho. Você tem um mundo e eu tenho outro. Os nossos dois mundos estão em guerra.”

Hanz, paulistano, 25 anos, pintor desempregado, mano e michê.

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O espaço social onde essa “guerra” ocorre (“campo de batalha”) são as ruas e praças das grandes cidades. - Fronteiras contraditórias (separam – e põem em contato - práticas e visões de mundo opostas). - Lugares (com identidade) e não-lugares (relações efêmeras) híbridos. -Configurações surgem à margem dos locais com suposta “identidade”. - Marcos físicos (ruas, praças, monumentos) são apenas “balizas” (suportes físicos), que, apesar de “significarem” alguma coisa (eventos e locais históricos, lembranças compartilhadas do passado), passam também a demarcar “territórios” sem fronteiras nítidas.

Marco Zero de São Paulo – Pça. da Sé – Jean Villin, 1934

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- Territórios sociais não estão “lado a lado”, como numa colcha de retalhos, mas se sobrepõem (um invade a área do outro), criando “zonas de transição” (limiares, conforme Victor Turner). - Atores e cenários não se classificam em nenhuma posição clássica (direito, costumes, convenções). São ambíguos (e podem dar a impressão de que poluem). - As territorialidades são flexíveis, as identidades são contrastantes (no espaço e no tempo).

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- Mesmo sem terem sido instituídos para isso (exemplo: Pça. dos 3 Poderes em Brasília), locais podem ser marcos institucionais (políticos, religiosos) e abrigarem manifestações públicas, e ao mesmo tempo serem social e politicamente híbridos.

- Em territórios como a Pça. da Sé (S. Paulo), por exemplo, expõem-se as tensões e conflitos sociais e a falta de direitos da população.

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-Reflexos de se saber que se está num lugar privilegiado para a exposição das tensões sociais (palco):

- Assaltos;

- Comércio/consumo de drogas; - “Moradias” improvisadas;

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Identidade local - Subemprego e informalidade; - Mendicância; - Poções “milagrosas”; - Cultos religiosos.

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Identidade local -Fronteiras pouco nítidas entre o público e o privado

- Hábitos pouco vinculados ao que é “familiar” (alimentar-se de sobras de comida ou lixo, abrigar-se sobre marquises, etc.); -Medo e risco constante (a qualquer momento, tudo pode acontecer); -“O perigo usa capuz e ouve RAP” ;

-Todo habitante da rua é um criminoso em potencial; - Aproximar-se provoca repulsa; - Simples suspeitas justificam prisões.

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-Metrô: “ilha” de limpeza e civilidade em meio ao caos. Dá sensação de segurança e organização (“não ultrapasse a linha”, “não force as portas”, etc.); -Regras, câmeras, rapidez, higiene – inspiram confiança (outro mundo, abrigo); -“Democratização” do uso (pobres e ricos usam o metrô); -Nomes das estações remetem à identidade sem que se veja nada que destoe (Liberdade, Paraíso, Tietê, República);

- Apesar disso, pode ser um “não-lugar” (massificado, padronizado);

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Identidade local Monumentos e logradouros são suportes físicos de acontecimentos sociais (marcos identitários).

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Identidade local Mas esses espaços abrigam atores que, mesmo sem intenção de agredir, podem ser tidos como violentos e perigosos se estereotiparem “tribos” visadas negativamente pelo cidadão “comum” (punks, “manos”, rappers, rockeiros, pitboys, cheiradores de cola, prostitutas, etc.) Casais homossexuais só não seriam agredidos, por exemplo, por conta da vigilância policial ostensiva.

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-Caminhar pela cidade é cruzar fronteiras, atravessar e interpenetrar territórios. Se acrescentarmos afeto a esse percurso, não veremos apenas pontos desconexos e aleatórios da paisagem. Cruzaremos umbrais, ordenaremos diferenças, construiremos sentidos, posicionar-nos-emos. -Andar pelo espaço urbano deve ser como articular a fala (De Certeau). Há 3 funções envolvidas: 1) apropriar-se da topografia; 2) atuar no espaço; 3) relacionar-se entre posições diferentes. -Deslocar-se excita a imaginação, libera lembranças e emoções. Revive experiências passadas e referências pessoais vividas nos lugares. Um marco remete a outro. A lembrança faz o trajeto, ignora distâncias, estabelece relações. Quando nos detemos num lugar conhecido, a memória sai da superfície e se aprofunda. Mas, apesar disso, cada nova passagem pelo mesmo local é uma nova experiência. -Caminhar é decifrar. Passos desatentos nos distanciam do lugar, tornam invisíveis os marcos e tornam os espaços sem lugares. Mas os marcos visíveis, de identidade, são apenas parte de uma realidade mais profunda.

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-São Paulo é um agregado de tensões e conflitos de múltiplos territórios (lugares e não-lugares). Labirinto de limiares, fronteiras nebulosas e marcos fragmentários.

-Nomes de ruas e praças são anacrônicos, simples símbolos, ignorados pela multidão, muitas vezes analfabeta. -Novas fronteiras se constroem: ruas fechadas, corredores, estacionamentos, zonas bancárias, grupos de lojas e escritórios traçam novos territórios baseados em interesses técnicos e empresariais. Esquece-se a história, o fato social, a IDENTIDADE.

- Assim, novas sociabilidades também surgem, desvinculadas dessa IDENTIDADE, apropriando-se dos não-lugares, numa sociedade fragmentada em guerra com ela mesma.

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-Bibliografia: -ARANTES, Antônio Augusto – Paisagens paulistanas: transformações do espaço público, Unicamp, Campinas, 2000.

-Créditos: Profa. Eloisa Dezen-Kempter Prof. Fernando Luiz Antunes Guedes