Investimentos em cincia e tecnologiaAron KuppermannCalifornia Institute of Technology, Pasadena, EUAO apoio cincia e tecnologia em um mundo em rpida mudana est sendo fortemente escrutinizado, tanto nos pases desenvolvidos como nos em desenvolvimento. Entre as questes levantadas esto: Por que apoiar C&T? Qual frao dos recursos da sociedade deve ser alocada para essa atividade? Como repartir esses recursos entre pesquisa bsica, pesquisa aplicada e desenvolvimento tecnolgico? Quais devem ser os mecanismos de apoio? Podem tais investimentos ser feitos de forma ecologicamente segura e compatvel com uma sociedade sustentvel? Essas so questes duras e importantes que se procurar discutir no presente artigo. Algumas das respostas so aquelas vlidas h 50 anos e tm um forte elemento de permanncia. Outras esto em processo de mudana fundamental e sujeitas ao debate e anlise internacionais. Este encontro uma das vrias manifestaes desse escrutnio realizado pela comunidade internacional de cientistas interessados, tecnlogos, educadores, economistas, socilogos e polticos. O resultado de discusses dessa natureza deve ajudar a dar forma ao futuro deste planeta e de seus habitantes.Por que a cincia deve ser apoiada pela sociedade? Existem muitas respostas para essa questo, de mais amplas a mais localizadas. A mais ampla diz ser a espcie humana essencialmente uma espcie curiosa que por milnios tem transferido um reservatrio de conhecimentos de gerao a gerao. Seu futuro parece estar profundamente ligado continuao desse crescimento do conhecimento e o desejo por essa continuidade est profundamente embutido na estrutura de nossos crebros, na estrutura gentica e na resultante evoluo das sociedades humanas. Devemos apoiar a cincia porque parte de nossa natureza inerente. Resposta mais localizada diz que o conhecimento acerca da natureza nos permite desenvolver os meios tecnolgicos necessrios para melhorar nossa qualidade de vida de forma sustentvel, consistente com os recursos finitos do planeta e com seu equilbrio ecolgico. Isso tambm responde questo: por que a tecnologia deve receber investimentos feitos pela sociedade.A questo sobre qual a frao dos recursos da sociedade deve ser alocada para C&T difcil de responder devido a argumentos ab initio, mas pode ser discutida com base na experincia passada. Existe forte correlao entre a frao do PIB investido em C&T por um pas e seu desenvolvimento geral. Essa frao vai de 2,6% para os pases mais desenvolvidos do mundo a 0,1% para os menos desenvolvidos. Tal correlao no prova existir uma ligao de causa e efeito entre investimentos em C&T e desenvolvimento, mas difcil no especular que haja algum processo de retroalimentao entre essas duas variveis, pelo qual investimentos levam a desenvolvimento e este a mais investimentos. A varivel importante, em qualquer caso, parece ser no o investimento absoluto mas a frao de investimento. Isso quer dizer que pases com um PIB pequeno (devido, por exemplo, sua pequena populao) tm, quando investem a mesma percentagem de seu PIB em C&T, aproximadamente o mesmo nvel de desenvolvimento que aqueles cujo PIB significativamente maior. Isso sugere que os pases em desenvolvimento devem lutar para investir uma proporo maior de seu PIB em C&T. E verdade que os intensos problemas e necessidades sociais de tais pases tornam poltica e psicologicamente difcil atingir nveis de investimento adequados. No entanto, devemos nos lembrar de que as percentagens envolvidas so pequenas - 0% comparado a 2%, por exemplo - e o objetivo de tais financiamentos, a longo prazo, fazer decrescer significativamente os problemas sociais que tornaram difcil o incio dos investimentos. O assunto parece dizer respeito, como no caso de muitos temas polticos e econmicos, ao balano entre perspectivas de curto e de longo prazos. muito importante a questo sobre qual frao dos investimentos da sociedade deve ser alocada para C&T e qual para P&D. Ela muito debatida hoje, tanto no mundo desenvolvido quanto no em desenvolvimento. Nos diferentes contextos, a natureza dos argumentos diferente, embora existam importantes elementos comuns. No mundo desenvolvido, alguns afirmam que a quantidade de conhecimento cientfico j disponvel mais que o suficiente para resolver os problemas que a sociedade enfrenta. Como resultado, quase todos os recursos disponveis para C&T devem ser alocados na aplicao daquele conhecimento, objetivando a melhoria da sociedade, ou seja, investimento em T (ou P&D), menos que em C. O argumento falho sob dois aspectos importantes. Primeiro, a suposio de que j possumos suficiente conhecimento bsico poderia bem ter sido feita trs ou quatro dcadas atrs. Ainda assim, as descobertas feitas desde ento pela cincia bsica em biologia molecular e em fsica do estado slido levaram a aplicaes que afetam dramaticamente toda a sociedade, tanto no mundo desenvolvido como no em desenvolvimento. A verdade que no temos como saber ao que levaro novos conhecimentos e, assim, do maior interesse, para o mundo desenvolvido, continuar com seus investimentos em C. Em segundo lugar, corte ou diminuio significativa dos investimentos em C pelo mundo desenvolvido vo de encontro curiosidade humana, de que j falamos anteriormente. Se o mundo desenvolvido cortar esses investimentos, o que devemos esperar para o futuro da humanidade? O efeito total pode ser uma queda significativa de seu desenvolvimento como espcie inteligente.Nos pases em desenvolvimento, o argumento diz que a cincia uma atividade internacional sem donos. Assim, uma vez que essa atividade se tornou cara demais para eles, deixe-se que o mundo desenvolvido invista em cincia. Qualquer conhecimento bsico de que os primeiros necessitem para fazer seu prprio desenvolvimento tecnolgico est na literatura franca. Novamente, o argumento falacioso em vrios aspectos. Antes de mais nada, ele poderia tambm ser aplicado parte T de C&T. Desenvolver novas tecnologias caro e estas podem ser compradas do mundo desenvolvido em pacotes fechados. As. dificuldades desse procedimento so j bem conhecidas, tornando muito difcil ou mesmo impossvel, para os pases em desenvolvimento, explorar reas nas quais tenham vantagem competitiva e, assim, se desenvolverem como uma economia aberta. Da mesma forma, tambm difcil ou impossvel, para esses pases, adaptar tecnologias estrangeiras s condies especficas de seu meio-ambiente. Tais adaptaes requerem mais que conhecimento de caixas pretas e, portanto, capacidade tecnolgica em recursos humanos. Tal capacitao s pode ser construda por um sistema de educao superior no qual se estude aprofundadamente o estado da arte em C&T. Essa base institucional requer um investimento adequado em C bsica, bem como em T. Outra falcia do argumento a favor de investimento baixo ou nulo em C pelos pases em desenvolvimento que isso levaria sua no-representatividade na busca internacional pelo conhecimento e cidadania de segunda classe em uma atividade intelectual fundamental para o homem.A concluso que, em pases desenvolvidos, a frao da C&T devotada a C deve ser mantida nos nveis atuais, sem se deteriorar. Nos pases em desenvolvimento, ela deve ser suficiente para garantir saudvel e razovel participao no empreendimento cientfico internacional. Alm disso, a pesquisa em programas de graduao em cincia bsica deve ser bsica para resultar em cientistas bem treinados, mesmo que eles, depois, se engajem em trabalho aplicado. Pesquisa em programas de graduao em cincias aplicadas e em tecnologia deve ser aplicada, mas o curso associado deve ter um componente saudvel de cincia bsica a fim de evitar a acelerada obsolescncia que ocorre a pessoal estreitamente treinado quando a tecnologia sofre uma rpida alterao.Os mecanismos para financiar as atividades de C&T devem estar fundamentalmente baseados na distino entre bem pblico e bem privado. Atividades para o bem pblico devem ser apoiadas por fundos pblicos, enquanto as privadas, pelo setor privado. Evidentemente, existem interfaces de grande importncia entre esses dois setores. Os mecanismos que governam tais atividades ainda no foram adequadamente amadurecidos nos pases desenvolvidos, e isso deve ser o foco de srios esforos. Nos pases em desenvolvimento, o principal produto do setor pblico para consumo do privado a mo-de-obra altamente treinada no estado da arte em C&T. Essa mo-de-obra empregada pelo setor privado na resoluo de seus problemas. Esse o mecanismo mais importante de transferncia de C&T do setor pblico para o privado. Os mesmos indivduos altamente treinados, atravs de seus contatos com a universidade, tambm estabelecem um fluxo de informao na direo oposta, que ajuda a manter a ltima informada dos desenvolvimentos e necessidades da indstria. Esse fluxo bidirecional de informao deve, no entanto, ser intensificado tanto nos pases desenvolvidos quanto nos em desenvolvimento. Os investimentos do setor pblico em C&T devem ser efetuados atravs de mecanismos transparentes aos recipientes dos fundos, nos quais cuidadoso julgamento interpares seja o fator determinante para as decises de alocao. Esse deve ser o caso tanto na universidade como nos centros de pesquisa governamentais.Para finalizar, importante sublinhar que no apenas os investimentos em T (e em C) podem ser feitos de forma ecologicamente segura, mas que este deve ser um critrio central para tais investimentos. No passado, quando a populao mundial era relativamente pequena e os recursos naturais aparentemente infinitos, praticamente no havia considerao do impacto tecnolgico sobre o ambiente. Agora que a populao mundial exerce forte presso sobre o planeta, o desenvolvimento tecnolgico deve ser direcionado para a utilizao de recursos renovveis e para a preservao da integridade ecolgica do ambiente. A considerao de tais critrios requerer maior conhecimento bsico dos sistemas ecolgicos e mais, no menos, desenvolvimento tecnolgico. Tambm vai requerer a estabilizao da populao mundial em um nvel sustentvel. Felizmente, a humanidade est apta a atingir tais objetivos; de outra forma, estaremos destinados a um baixo nvel evolutivo entre as inteligncias que possivelmente permeiam o universo.