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Irlandês.indd 1 28/08/2019 15:11:05...9 Agradecimentos Tenho uma dívida de gratidão para com a minha incrivelmente bela, talentosa e maravilhosa esposa, Nancy, que dedicou a cada

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  • tradução

    Drago

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  • Seoman é um selo editorial da Pensamento-Cultrix.

    Direitos de tradução para o Brasil adquiridos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA., que se reserva a propriedade literária desta tradução.R. Dr. Mário Vicente, 368 – 04270-000 – São Paulo, SPFone: (11) 2066-9000E-mail: [email protected]://www.editoraseoman.com.brFoi feito o depósito legal.

    Título original: “I heard you paint houses”: Frank “the Irishman” Sheeran and the inside story of the Mafia, the Teamsters, and the last ride of Jimmy HoffCopyright © 2004, 2005 by Charles BrandtCopyright da edição brasileira © 2016 Editora Pensamento-Cultrix Ltda.

    2a edição 2019.

    Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópias, gravações ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto nos casos de trechos curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas.A Editora Seoman não se responsabiliza por eventuais mudanças ocorridas nos endereços convencionais ou eletrônicos citados neste livro.

    Coordenação editorial: Manoel LauandProjeto gráfico: Gabriela Guenther Editoração eletrônica: Estúdio Sambaqui

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Brandt, Charles O irlandês : os crimes de Frank Sheeran a serviço da máfia / Charles Brandt ; tradução Drago. 2 ed. - São Paulo : Seoman, 2019.

    Título original: “I heard you paint houses” : Frank “the Irishman” Sheeran and the inside story of the Mafia, the Teamsters, and the last ride of Jimmy Hoff.

    ISBN 978-85-5503-108-3

    1. Gângsteres - Estados Unidos 2. Hoffa, James R. (James Riddle), 1913- 3. Máfia - Estados Unidos 4. Sheeran, Frank I. Título.

    19-30934 CDD-364.1060973

    Índices para catálogo sistemático:1. Estados Unidos : Máfia : Crime organizado :História 364.1060973

    Maria Paula C. Riyuzo - Bibliotecária - CRB - 8/7639

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  • À minha esposa,

    Nancy Poole Brandt,

    à minha mãe,

    Carolina DiMarco Brandt,

    e à memória do meu pai.

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  • ÍNDICE

    Agradecimentos 9

    Prólogo • “Russ & Frank” 11

    Capítulo Um • “Eles não ousariam” 16

    Capítulo Dois • O que isto é 28

    Capítulo Três • Arranje outro saco de pancadas 33

    Capítulo Quatro • Universidade de Little Egypt 39

    Capítulo Cinco • 411 dias 47

    Capítulo Seis • Fazendo o que eu tinha de fazer 55

    Capítulo Sete • Despertando na América 63

    Capítulo Oito • Russell Bufalino 73

    Capítulo Nove • Pão de prosciutto e vinho caseiro 77

    Capítulo Dez • O caminho até o centro da cidade 87

    Capítulo Onze • Jimmy 95

    Capítulo Doze • “Ouvi dizer que você pinta casas” 103

    Capítulo Treze • Eles não fizeram um paraquedas suficientemente grande 112

    Capítulo Catorze • O pistoleiro não usava máscara 120

    Capítulo Quinze • Consideração através de um envelope 131

    Capítulo Dezesseis • Dê um recadinho a eles 140

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  • Capítulo Dezessete • Nada além de escárnio 150

    Capítulo Dezoito • Agora, apenas mais um advogado 160

    Capítulo Dezenove • Conspurcando a própria alma da Nação 170

    Capítulo Vinte • A trupe de comediantes de Hoffa 179

    Capítulo Vinte e Um • Tudo o que ele fez por mim foi desligar o telefone

    na minha cara 189

    Capítulo Vinte e Dois • Contando os passos em sua jaula 197

    Capítulo Vinte e Três • Nada vem de graça 206

    Capítulo Vinte e Quatro • Ele precisou de um favor, e foi apenas isso 216

    Capítulo Vinte e Cinco • Essa não era a maneira de Jimmy fazer as coisas 229

    Capítulo Vinte e Seis • As portas do inferno vão se abrir 235

    Capítulo Vinte e Sete • 30 de julho de 1975 245

    Capítulo Vinte e Oito • Pintando uma casa 248

    Capítulo Vinte e Nove • Todo mundo sangra 259

    Capítulo Trinta • “Os responsáveis não escaparam isentos de impostos” 263

    Capítulo Trinta e Um • Sob um juramento de sigilo 271

    Posfácio 279

    Epílogo 293

    Fontes 308

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    Agradecimentos

    Tenho uma dívida de gratidão para com a minha incrivelmente bela, talentosa e maravilhosa esposa, Nancy, que dedicou a cada capítulo e a cada revisão um trabalho de edição rigoroso, honesto e sensível, antes que eu enviasse o manuscrito a uma edito-ra. Enquanto estive em Nova York ou na Filadélfia trabalhando no livro, Nancy cuidou de tudo mais, dando-me diariamente inspiração, encorajamento e apoio. Nas vezes em que Nancy me acompanhou nas visitas a Frank Sheeran, fez com que ele recobrasse uma vitalidade juvenil. Também devo minha mais profunda gratidão pelo incentivo e apoio recebido dos nossos filhos Tripp Wier, Mimi Wier e Jenny Rose Brandt.

    Tenho uma dívida de gratidão para com a minha admirável mãe, que, aos 89 anos de idade, preparou comida italiana para mim, deu-me hospedagem e incentivou-me durante as longas semanas que passei em seu apartamento em Manhattan, sentado diante do meu laptop.

    Tenho uma dívida de gratidão para com o meu caro amigo William G. Thompson, um ícone do ramo editorial — tendo sido o primeiro editor a publicar as obras de Ste-phen King e de John Grisham — que generosamente disponibilizou seu vasto conhe-cimento como conselheiro editorial no desenvolvimento e na execução deste projeto.

    Encontrei uma “mina de ouro” quando Frank Weimann, do Literary Group, acei-tou ser o meu agente literário. Frank conduziu o projeto cordialmente como um tra-balho histórico que, de outro modo, seria negligenciado; deu ao livro o seu título e deu a Frank Sheeran um “empurrãozinho” no rumo certo durante a gravação da última entrevista que ele concedeu.

    Meus agradecimentos especiais à talentosa Kristin Sperber, editora da Steerforth, que, entre outras coisas, avisou-me quando, uma vez ou outra, eu escrevi como um advogado.

    Quando Neil Reshen sugeriu ao meu agente que entrasse em contato com a Steer-forth Press, logo tivemos o nosso livro aceito por uma editora que acredita em seus autores. Obrigado, Neil, por haver-nos guiado até o excepcional Chip Fleischer e sua assistente, Helga Schmidt.

    Muito obrigado a escritores tais como Dan Moldea, Steven Brill, Victor Riesel e Jonathon Kwitny, cujas reportagens investigativas realizadas com extrema habilidade — e, muito frequentemente, arriscando suas próprias integridades físicas — desco-briram e preservaram tantos aspectos importantes da história de Jimmy Hoffa, de sua época e de seu desaparecimento.

    Obrigado a vocês, agentes, investigadores e advogados de acusação e respectivos auxiliares, cujos esforços deram origem a muitas das manchetes e matérias jornalís-ticas que consultei.

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    Obrigado ao meu criativo primo Carmine Zozzora, por seu encorajamento coti-diano, que me manteve focado quando as coisas estiveram difíceis, e por seu sábio aconselhamento em todas as etapas do caminho, especialmente quando eu me punha a reclamar e ele repetia: “Apenas escreva o livro; o resto se arranja por si mesmo.”

    Uma montanha de gratidão a todos os meus soberbos amigos e familiares que “torceram” por este livro, e àqueles amigos mais chegados a quem eu repetidamente recorri em busca de aconselhamento, encorajamento e apoio — especialmente Marty Shafran, Peter Bosch, Steve Simmons, Leo Murray, Gary Goldsmith, Barbara Penna, Rosemary Kowalski, Jeff Weiner, Tracy Bay, Chris DeCarufel, Jan Miller, Theo Gund, e Molly e Mike Ward. Tenho uma dívida da mais profunda gratidão para com Rob Sutcliffe, por incontáveis motivos.

    Obrigado a Lynn Shafran, por todo seu aconselhamento e, principalmente, por haver trazido Ted Feury, falecido recentemente, até Nancy e eu. Muitíssimo obrigado a você, Ted.

    Obrigado ao ilustrador premiado, autor e artista, meu amigo Uri Shulevitz, que há mais de vinte anos encorajou-me a começar a escrever profissionalmente.

    Agradecimentos atrasados ao meu inspirador professor de Inglês na penúltima série do ensino médio, na Stuyvesant High School, em 1957, Edwin Herbst.

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    Prólogo

    “Russ & Frank”Em um chalé de veraneio, numa sala cheia de ansiosos e chorosos membros da família de Jimmy Hoffa, o FBI encontrou um bloco de anotações de folhas amarelas. Hoffa mantinha o bloco próximo do aparelho de telefone. No bloco, Hoffa escrevera, a lápis, as palavras: “Russ & Frank”.

    “Russ & Frank” eram amigos chegados e aliados ferrenhos de Jimmy Hoffa. O gi-gante musculoso Frank estivera tão próximo e provara ser tão leal a Jimmy, ao longo das tribulações que este tivera com a lei e com Bobby Kennedy, que era considerado como mais um membro da família.

    Naquele dia, à beira do lago, a família no chalé temia, nos recônditos mais profun-dos de suas almas, que apenas um amigo muito íntimo, alguém extremamente con-fiável, poderia ter chegado suficientemente próximo para causar algum dano ao sem-pre cauteloso e vigilante Jimmy Hoffa, um homem agudamente consciente de seus inimigos mortais. E, naquele dia, “Russ & Frank” — o mafioso Frank “O Irlandês” Sheeran e seu “padrinho”, Russell “McGee” Bufalino — tornaram-se os principais suspeitos no caso do desaparecimento mais notório da História norte-americana.

    Todos os livros e estudos sérios dedicados ao desaparecimento de Hoffa atestam que Frank “O Irlandês” Sheeran, um ferrenho aliado e apoiador de Hoffa dentro da organização dos “Caminhoneiros”, voltara-se contra seu amigo e mentor. Esses es-tudos alegam que Sheeran agira como um conspirador e perpetrador, tendo estado presente na ocasião em que Hoffa fora assassinado; e que este assassinato teria sido sancionado e planejado por Russell “McGee” Bufalino. Entre esses estudos contam-se livros resultantes de pesquisas meticulosas, incluindo The Hoffa Wars (“As Guerras de Hoffa”), do repórter investigativo Dan Moldea; The Teamsters (“Os Caminhonei-ros”), do fundador da Court TV — uma emissora de televisão especializada na trans-missão de julgamentos —, Steve Brill; e Hoffa, escrito pelo Professor Arthur Sloane.

    No dia 7 de setembro de 2001, mais de vinte e seis anos depois do início do mis-tério, um membro da família presente no chalé à beira do lago compartilhava aqueles momentos terríveis com sua mãe e sua irmã concedendo uma entrevista coletiva à imprensa. O filho de Hoffa, James P. Hoffa, presidente dos “Caminhoneiros”, tivera reavivadas suas esperanças quanto a um novo desenvolvimento dos fatos relativos ao desaparecimento de seu pai. O FBI revelara que um exame de DNA realizado com um fio de cabelo comprovara que Jimmy Hoffa teria estado no interior de um carro, suspeito de ter sido utilizado no cometimento do crime. Eric Shawn, o veterano cor-respondente da Fox News, perguntara a James se seu pai poderia ter sido levado ao interior daquele carro por vários outros suspeitos bem conhecidos. James meneou a

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    cabeça negativamente em resposta a cada um dos nomes contidos na lista e, afinal, disse: “Não. Meu pai não conhecia essas pessoas.” Quando Shawn perguntou se Frank Sheeran poderia ter convencido seu pai a entrar naquele carro, James acenou afir-mativamente e disse: “Sim, meu pai teria entrado em um carro em companhia dele.”

    Ao término da coletiva de imprensa, James expressou à mídia seu desejo de que o caso pudesse ser solucionado por uma “confissão no leito de morte”. À época emque ele fez este pedido, Frank Sheeran era o único homem dentre os suspeitos origi-nais que ainda estava vivo e era suficientemente idoso para fazer uma “confissão noleito de morte”. A entrevista coletiva à imprensa foi concedida quatro dias antes dosfatídicos acontecimentos do dia 11 de setembro de 2001, e a aparição de James P. noprograma televisivo Larry King Live, agendada para a semana seguinte, foi cancelada.

    Um mês depois, com a história de Hoffa alijada das primeiras páginas dos jornais, a filha única de Jimmy, a juíza Barbara Crancer, telefonou a Frank Sheeran de sua câ-mara em St. Louis. À maneira de seu legendário pai, a juíza Crancer foi diretamente ao ponto crucial da questão e fez um apelo a Sheeran para que proporcionasse à sua família um encerramento para o caso, revelando tudo quanto soubesse acerca do desaparecimento de seu pai. “Faça a coisa certa” disse ela a Sheeran. Seguindo o acon-selhamento de seu advogado, Sheeran não revelou coisa alguma e, respeitosamente, pediu a Barbara que se dirigisse ao seu conselheiro.

    Esta não fora a primeira vez que a juíza Barbara Crancer escrevera ou telefonara ao Irlandês com o objetivo de fazê-lo revelar os segredos que guardava em sua alma. Em 6 de março de 1995, Barbara dirigira uma carta a Frank: “Pessoalmente, acredito que existam muitas pessoas, que se diziam amigas leais, que saibam o que aconteceu a James R. Hoffa, quem o fez e por quê. O fato de nenhuma delas jamais haver revelado nada à família dele — mesmo sob juramento de sigilo — é algo doloroso para mim. Eu acredito que você seja uma dessas pessoas.”

    No dia 25 de outubro de 2001, uma semana depois de ter recebido o telefonema de Barbara, Frank “O Irlandês” Sheeran — então contando mais de oitenta anos de idade e tendo de usar um andador para locomover-se — ouviu baterem à porta do pátio de seu apartamento no piso térreo. Quem batia à porta eram dois jovens agentes do FBI. Eles mostraram-se amigáveis, nada ansiosos e muito respeitosos para com o homem próximo do fim de sua vida. Os agentes esperavam que ele tivesse se abrandado com a idade e, talvez, até estivesse arrependido. Eles esperavam ouvir aquela “confissão de leito de morte” e disseram ser jovens demais para se lembrarem do ocorrido, mas admitiram ter lido milhares de páginas do arquivo relativo ao caso. Eles estavam in-formados acerca do telefonema que, fazia pouco tempo, Sheeran recebera de Barbara, declarando abertamente a ele que haviam discutido o teor da conversa com ela. Tal como viera fazendo desde 30 de julho de 1975 — data do desaparecimento de Jimmy —, Sheeran desalentadoramente instruiu aos agentes do FBI para que se dirigissem ao seu advogado, o ex-procurador distrital da Filadélfia, Sr. Emmett Fitzpatrick.

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    Não obtendo sucesso em persuadir Sheeran a cooperar, dispondo-o a fazer uma “confissão de leito de morte”, o FBI anunciou, no dia 2 de abril de 2002, que passava às mãos do procurador distrital de Michigan todas as dezesseis mil páginas do arqui-vo referente ao caso, além de liberar o acesso ao conteúdo de 1.330 dessas páginas à mídia e aos dois filhos de Jimmy Hoffa. Nenhum processo federal seria impetrado. Afinal, após quase vinte e sete anos, o FBI desistira.

    No dia 3 de setembro de 2002 — quase um ano depois da data em que James P. concedera uma entrevista coletiva à imprensa —, o Estado de Michigan também de-sistiu, encerrando o caso em sua alçada e exprimindo suas “reiteradas condolências” aos filhos de Hoffa.

    Ao anunciar sua decisão em uma conferência à imprensa, o Procurador Distrital de Michigan, David Gorcyca, foi citado ao afirmar que “infelizmente, este caso tem todas as características de uma grande história de mistério à qual falta o capítulo final.”

    Este livro é uma “história de mistério”; mas não é uma história ficcional. Tra-ta-se de uma história baseada em entrevistas pessoais com Frank Sheeran, a maioria das quais foi registrada em fitas gravadas. Eu conduzi a primeira entrevista em 1991, no apartamento de Sheeran, pouco depois que meu parceiro e eu conseguimos asse-gurar a antecipação da soltura de Sheeran da prisão, com base em argumentos médi-cos. Imediatamente após essa primeira entrevista, em 1991, Sheeran pareceu pensar duas vezes quanto à natureza interrogativa do trabalho relativo à entrevista e decidiu encerrar sua colaboração. Ele teria admitido muito mais coisas do que gostaria. Disse a ele que voltasse a entrar em contato comigo, caso mudasse de ideia e quisesse tornar a se submeter ao meu questionamento.

    Em 1999, as filhas de Sheeran arranjaram uma entrevista privada de seu idoso e fisicamente debilitado pai com o Monsenhor Heldufor, da Igreja St. Dorothy, na Filadélfia. Sheeran encontrou-se com o monsenhor, que lhe concedeu a absolvição por seus pecados, para que ele pudesse vir a ser sepultado em um cemitério católico. Frank Sheeran declarou a mim: “Acredito que exista alguma coisa depois que morre-mos. Se tivesse de apostar nisso, não gostaria de perder a aposta. Eu não quero deixar nenhuma porta fechada.”

    Em seguida à sua entrevista com o monsenhor, Sheeran entrou em contato comigo; e a seu pedido compareci a uma reunião no escritório do advogado que o representava. Nessa reunião, Sheeran concordou em submeter-se ao meu interrogatório e a série de entrevistas foi reiniciada, prolongando-se por quatro anos. Eu trouxe para o processo das entrevistas as minhas experiências como advogado de acusação em processos relativos a homicídios e casos que envolviam a aplicação da pena de morte, como especialista em interrogatórios e estudioso de técnicas de interrogação, e como autor de vários artigos so-bre a regra exclusiva da Suprema Corte dos Estados Unidos que contempla as confissões. “Você é pior do que qualquer tira com quem já tive de lidar”, disse-me Sheeran, certa vez.

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    Passei incontáveis horas apenas “matando tempo” em companhia do Irlandês, en-contrando-me com supostos membros da Máfia, dirigindo até Detroit para localizar o lugar onde se deu o desaparecimento de Hoffa, dirigindo até Baltimore para re-constituir in loco as cenas de duas “entregas” do submundo executadas por Sheeran,reunindo-me com o advogado de Sheeran e encontrando-me com seus familiares eamigos, imiscuindo-me em sua vida tão intimamente quanto possível para chegara conhecer o homem que havia por trás da história. Passei incontáveis horas — portelefone ou pessoalmente — sondando e garimpando o manancial de informaçõesque constitui a fundamentação deste livro.

    Muito frequentemente, a primeira regra para proceder a um interrogatório bem-sucedido é ter fé em que o interrogado realmente deseje confessar, mesmo quando esteja negando ou mentindo. Assim foi o caso com Frank Sheeran. A segunda regra é manter o interrogado falando continuamente; e isto, também, jamais foi um proble-ma com o Irlandês. Basta deixar que as palavras fluam, e a verdade abrirá caminho por si mesma em meio a elas.

    Por muito tempo, uma parte de Frank Sheeran quisera poder externar esta histó-ria de seu peito. Em 1978, emergiu uma controvérsia sobre Sheeran ter feito sua con-fissão por telefone — ainda que, talvez, sob efeito do consumo de álcool — a Steven Brill, autor de The Teamsters. O FBI acreditou que Sheeran tivesse confessado tudo a Brill, e pressionou este para que lhe entregasse a fita gravada. Dan Moldea, autor de The Hoffa Wars, escreveu em um artigo que, durante um café da manhã em um hotel, Brill lhe dissera possuir uma confissão de Sheeran gravada em uma fita magnética. Porém, Brill — provavelmente demonstrando possuir juízo bastante para evitar tor-nar-se uma testemunha necessitada de proteção especial — desmentiu publicamente esta alegação nas páginas do New York Times.

    De maneira condizente, ao longo da maior parte do árduo processo das entre-vistas, foram envidados esforços para proteger e preservar os direitos de Sheeran, de modo a fazer com que suas palavras não pudessem consistir legalmente de uma confissão admissível em um tribunal de justiça.

    À medida que o livro foi escrito, Frank Sheeran leu e aprovou cada capítulo. Ao término do trabalho, ele releu e concedeu sua aprovação a todo o manuscrito.

    No dia 14 de dezembro de 2003, Frank Sheeran morreu. Seis semanas antes, du-rante os estágios finais de sua convalescença, ele concedeu-me sua última entrevista gravada, no leito que ocupava no hospital. Ele me disse que se havia confessado e recebido a comunhão de um padre visitante. Deliberadamente evitando a utilização de qualquer espécie de linguajar que pudesse protegê-lo de possíveis ações legais, Frank Sheeran encarou a lente de uma câmera de vídeo para viver o seu “momento da verdade”. Segurando e exibindo um exemplar deste livro, ele endossou todo o con-teúdo que você irá ler agora — inclusive o papel que desempenhou no que aconteceu a Jimmy Hoffa no dia 30 de julho de 1975.

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    No dia seguinte, cerca de uma semana antes de perder completamente sua vita-lidade física e sua lucidez, Frank Sheeran pediu-me para que rezasse por ele, e que, juntos, orássemos o Pai Nosso e a Ave Maria. Assim fizemos.

    Em última análise, as palavras de Frank Sheeran constituem um testemunho vá-lido no tribunal da opinião pública, para que você, leitor, possa julgá-lo como uma parte da História do século passado.

    O fio condutor desta história é a própria biografia, singularmente fascinante, de Frank Sheeran. O espirituoso Irlandês foi criado como um católico devoto e um filho dos tempos difíceis da Grande Depressão; um combatente empedernido e heroico da Segunda Guerra Mundial; um oficial do alto escalão da Fraternidade Internacional dos Caminhoneiros; um elemento citado por Rudy Giuliani em uma ação civil da R.I.C.O., por haver “atuado em consonância com” as regras da Cosa Nostra — umdos dois únicos não ítalo-americanos na lista compilada por Giuliani de vinte e seisfiguras proeminentes da Máfia, que incluía os nomes dos “chefões” dos Bonanno, dosGenovese, dos Colombo, dos Luchese e de outras “famílias” de Chicago e Milwaukee,bem como os nomes de vários subchefes; um criminoso condenado, membro dolegendário braço armado da Máfia — além de pai de quatro filhas e avô amoroso.

    Em consideração a todos os aspectos positivos da complexa vida de Frank Shee-ran — incluindo seu serviço prestado à Pátria como militar e o amor que ele sempre demonstrou para com suas filhas e seus netos —, eu fui um dos homens que ajuda-ram a levar o esquife verde, envolto pela bandeira dos Estados Unidos, que continha o corpo do Irlandês, até o lugar de seu repouso final.

    Este livro é o capítulo final da tragédia de Hoffa, um crime que feriu e assombrou a todos que de algum modo estiveram conectados a ele — incluindo os que o perpe-traram; mas que feriu e assombrou especialmente aos familiares de Jimmy Hoffa, em seus esforços para que o destino de seu pai pudesse ser esclarecido e sua memória, também, repousasse em paz.

    Nota do Autor: As partes deste livro em que são transcritas as palavras de Frank Sheeran — proferidas em centenas de horas de entrevistas — são citadas entre aspas. Alguns trechos e alguns capítulos escritos por mim acrescentam detalhes relevantes e informações complementares.

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    Capítulo Um

    “Eles não ousariam”

    Pedi ao meu chefe, Russell ‘McGee’ Bufalino, que me permitisse telefonar para Jimmy em seu chalé à beira do lago. Eu estava numa missão de paz. Tudo o que eu estava tentando fazer, naquele momento em particular, era evitar que aquilo acontecesse com Jimmy.

    Eu telefonei para Jimmy na tarde do domingo, dia 27 de julho de 1975. Na quar-ta-feira, 30 de julho, Jimmy já se fora. Infelizmente, como dizemos, ele se fora para a Austrália: a região mais baixa da Terra. Vou sentir falta do meu amigo até o dia em que me juntar a ele.

    Eu estava no meu apartamento em Philly1, usando o meu próprio telefone, quan-do fiz a ligação interurbana para o chalé de Jimmy, em Lake Orion, perto de Detroit. Se eu soubesse das coisas que iriam rolar no domingo teria usado um telefone públi-co, não o da minha casa. Você não consegue se manter vivo por tanto tempo quanto eu se tratar de assuntos importantes usando o seu próprio telefone para fazer as liga-ções. Eu não fui feito com um dedo: meu pai usou a ferramenta certa para engravidar a minha mãe.

    Quando estava na minha cozinha, diante do aparelho telefônico de disco fixado na parede, pronto para discar o número que eu sabia de cor, considerei por algum tempo sobre o modo como deveria abordar Jimmy. Eu aprendi, durante os meus anos de negociações no sindicato, que é sempre melhor rever as coisas que você tem na cabeça antes de abrir a boca. E, além disso, aquela não seria uma ligação fácil de fazer.

    Quando saiu da cadeia — graças a um indulto presidencial concedido por Nixon, em 1971 — e começou a lutar para reaver a presidência dos Caminhoneiros, Jimmy tornou-se um sujeito com quem era muito difícil conversar. Às vezes esse tipo de comportamento torna-se característico de alguns sujeitos, logo que acabam de ser postos em liberdade. Jimmy decidiu dar rédea solta à sua língua: no rádio, nos jor-nais, na televisão... Cada vez que abria a boca, ele dizia algo sobre como iria expor a Máfia, e como iria varrer a Máfia do sindicato. Ele até mesmo chegou a dizer que impediria a Máfia de utilizar o fundo de pensão. Não consigo imaginar que certas pessoas tenham gostado de saber que a sua galinha dos ovos de ouro seria morta,

    1 Maneira informal de referência à cidade da Filadélfia, principal centro urbano da Pensilvânia, estado norte-americano. (N.T.)

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    caso ele reassumisse a presidência. Vindo de Jimmy, tudo isso soava como hipocri-sia, para dizer o mínimo — considerando que, para início de conversa, foi o próprio Jimmy quem trouxe a assim chamada Máfia para o sindicato, franqueando-lhe acesso ao fundo de pensão. Jimmy me trouxera para o sindicato através de Russell. Assim, por muitos bons motivos, eu estava mais do que apenas um tanto preocupado com o meu amigo.

    Eu comecei a ficar preocupado cerca de nove meses antes daquele telefonemaque Russell me concedera permissão para fazer. Jimmy havia voado para a Filadélfia para ser o palestrante especialmente convidado da Noite de Agradecimento a Frank Sheeran, no Latin Casino. Havia três mil dos meus bons amigos e meus familiares lá — incluindo o prefeito, o procurador distrital, uns caras ao lado de quem eu lutei na Guerra, o cantor Jerry Vale e as bailarinas Golddigger Dancers, com pernas que não acabavam mais, além de certos outros convidados aos quais o FBI se referia coleti-vamente como La Cosa Nostra. Jimmy presenteou-me com um relógio de ouro, com diamantes incrustados em torno do mostrador. Jimmy olhou para os convidados que ocupavam as mesas no salão e disse: ‘Nunca havia me dado conta de que vocês eram assim tão poderosos.’ Este foi um comentário muito especial, porque Jimmy Hoffa era um dos dois homens mais poderosos que eu já conheci.

    Antes que fosse servido o jantar — costela, de primeira qualidade —, quando po-sávamos para fotografias, um joão-ninguém que estivera na cadeia com Jimmy per-guntou a ele se poderia arranjar-lhe dez mil dólares para iniciar um negócio. Jimmy meteu a mão no bolso e deu-lhe 2.500 dólares, imediatamente. Assim era o Jimmy: um coração-mole.

    Naturalmente, Russell Bufalino estava lá. Ele era o outro dos dois homens mais poderosos que já conheci. Jerry Vale cantou a canção favorita de Russ, “Spanish Eyes”, dedicando-a especialmente a ele. Russell era o chefe da família Bufalino, que contro-lava o interior do Estado da Pensilvânia e grandes regiões dos Estados de Nova York, Nova Jersey e Flórida. Tendo seu quartel-general fora dos limites da cidade de Nova York, Russell não integrava o círculo fechado das cinco famílias de Nova York, mas todas essas famílias vinham até ele em busca de aconselhamento para fazerem qual-quer coisa. Se houvesse algum assunto importante para ser resolvido, eles deixavam o trabalho a cargo de Russell. Ele era respeitado pelo país inteiro. Quando AlbertAnastasia foi fuzilado numa cadeira de barbeiro em Nova York, eles fizeram com queRussell agisse como o cabeça daquela família, até que as coisas se acertassem. Nãohavia maneira de obter mais respeito do que Russell possuía. Ele era muito poderoso.O grande público nunca ouvira falar dele, mas as famílias e os federais sabiam quantoele era poderoso.

    Russell presenteou-me com um anel de ouro que ele mandara fazer especialmente para apenas três pessoas: para si mesmo, para seu subchefe e para mim. Havia uma

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    grande moeda de três dólares no topo, circundada por diamantes. Russell era um figurão no mundo do roubo e receptação de joias. Ele era um ‘sócio oculto’ de várias joalherias da ‘Rua dos Joalheiros’, na cidade de Nova York.2

    O relógio de ouro que Jimmy me deu ainda está no meu pulso, e o anel de ouro que Russell me deu ainda está no meu dedo, aqui, na casa de abrigo assistido onde vivo, agora. Na minha outra mão, uso um anel incrustado com as pedras dos signos de cada uma das minhas filhas.

    Jimmy e Russell eram muito parecidos. Ambos tinham uma compleição física solidamente musculosa, da cabeça aos pés; e ambos eram de baixa estatura, mesmo para os padrões médios da época. Russ media cerca de 1,7m de altura, e Jimmy mal passava de 1,6 m. Naqueles dias, eu media 1,93 m e tinha de me curvar se quisesse falar com eles mais reservadamente. Os dois também possuíam grande destreza e agilidade. Eles possuíam uma grande resistência, tanto física quanto mental. Mas em um aspecto importante eles eram diferentes. Russ era um homem discreto e de poucas palavras, que falava sempre em voz baixa e muito calmamente, mesmo que estivesse louco da vida. Jimmy, por sua vez, explodia diariamente, apenas para man-ter seu temperamento em plena forma, e adorava publicidade.

    Na noite anterior ao jantar oferecido em minha homenagem, Russ e eu tivemos uma reunião com Jimmy. Nós nos sentamos a uma mesa no Broadway Eddie’s, e Russell Bufalino disse a Jimmy Hoffa, sem rodeios, que ele deveria retirar sua candi-datura à presidência do sindicato. Ele lhe disse que certas pessoas estavam muito sa-tisfeitas com a gestão de Frank Fitzsimmons, que substituíra a Jimmy quando ele fora para a prisão. Ninguém àquela mesa disse isso, mas todos sabíamos que essas certas pessoas estavam muito satisfeitas devido à facilidade com que obtinham polpudos empréstimos do Fundo de Pensão dos Caminhoneiros gerido pelo extremamente maleável Fitz. Eles também obtinham empréstimos sob a gestão de Jimmy, que fazia seus próprios arranjos por debaixo dos panos; mas os empréstimos sempre eram concedidos de acordo com as condições impostas por Jimmy. Fitz, em vez disso, do-brava a espinha para essas certas pessoas. Tudo com que Fitz se importava era beber e jogar golfe. Não preciso dizer a você quanto proveito alguém pode tirar do fato de possuir a chave do cofre de um fundo de pensão de um bilhão de dólares.

    — Por que você está se candidatando? —, disse Russell. — Você não precisa do dinheiro.

    2 Na verdade, a “Jeweler’s Row” — que traduzimos livremente como “Rua dos Joalheiros” — loca-liza-se na região central da cidade da Filadélfia, no trecho da Rua Sansom entre as Ruas Sétima e Oitava, e na própria Rua Oitava, entre as ruas Chestnut e Walnut. Na cidade de Nova York existe um trecho da Rua 47, entre a Quinta e a Sexta Avenida, que é conhecido como “Diamond and Jewelry Way” ou “Diamond District”. Em ambos os casos, tratam-se de lugares conhecidos pela concentra-ção de joalherias e ourivesarias. (N.T.)

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