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1 Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto Julho 2011 | Volume 6 | Número 1 ISSN 1646-6586 Publicação Oficial do Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas EDIÇÃO ON LINE www.apfisio.pt/gifd_revista

Janeiro 2012

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Janeiro 2012

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> OBJECTIVOA Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto é uma publicação oficial do Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas. Esta revista pretende divulgar um conjunto de informações indispensáveis para a prática clínica e desenvolvimento profissional contínuo dos fisioterapeutas que actuam na área do desporto, bem como, temas de áreas relacionadas. Pretende-se abranger temáticas relevantes sobre a prevenção, diagnóstico e tratamento de lesões resultantes da prática desportiva. Contempla estudos experimentais, quasi-experimentais, descritivos/observacionais (levantamentos epidemiológicos, estudos de caso, descrição de experiências), revisões sistemáticas de literatura, meta-análises e artigos de opinião sobre a prática da fisioterapia no desporto, bem como em áreas relacionadas. Os artigos a publicar são submetidos a análise criteriosa pelo Conselho Editorial da revista. Esta publicação dirige-se a todos os fisioterapeutas, bem como a outros profissionais da área da Saúde e do Desporto.

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> PERIODICIDADESemestral (Janeiro e Julho)

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> COPYRIGTH ©

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> CONTACTOSRevista Portuguesa de Fisioterapia no DesportoE-mail: [email protected]

> PROPRIEDADEAssociação Portuguesa de FisioterapeutasRua João Villarett, 285 AUrbanização Terplana 2785-679 – São Domingos de RanaPortugalTel: (+351) 214 524 156 Fax: (+351) 214 528 922 E-mail: [email protected] Web: http://www.apfisio.pt NIF: 501790411

> EDITORGrupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto

> DIRECÇÃO DA REVISTADirector | Marco Jardim Director-Adjunto | Raúl OliveiraSub-Director | José Esteves

ISSN 1646-6586

REGISTO I.C.S nº 125207

> CONSELHO EDITORIALRaúl Oliveira (Coordenador)Faculdade de Motricidade HumanaAntónio Cartucho Hospital da CUF DescobertasAntónio Carvalhais Figueiredo Clínica CUF – Stª Maria de BelémFernando Pereira Faculdade de Motricidade HumanaHenrique Relvas ESS Cruz VermelhaJacob Friscknetch Federação Portuguesa de JudoJan Cabri Faculdade de Motricidade HumanaJoão Paulo Sousa Faculdade de Motricidade HumanaJosé Esteves Escola Superior de Saúde do AlcoitãoMaria António CastroEscola Superior de Saúde de CoimbraPaulo Carvalho Escola Superior de Saúde do PortoPaulo Amado Hospital Privado da BoavistaOrlando Fernandes Faculdade de Motricidade HumanaRicardo Matias Escola Superior de Saúde de SetúbalRui TorresEscola Superior de Saúde do Vale do SousaRui Soles GonçalvesEscola Superior de Saúde de CoimbraSusana VelosoUniversidade LusófonaThemudo Barata Faculdade de Motricidade Humana

AssociaçãoPortuguesa deFisioterapeutas

Grupo de Interesse em Fisioterapia no Desporto1985 - 2010

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INDICE

Editorial

A “Troika” em Fisioterapia no DesportoMarco Jardim

Revisão da Literatura

A Instabilidade Crónica da Articulação Tibio-Társica: Etiologia, Fisiopatologia e Métodos de Medição e AvaliaçãoMarc Reis & Raúl Oliveira

Inteligência Emocional e Prática Desportiva: Uma Análise GlobalJosé Silva, António Rosado & Sidónio Serpa

Artigo de Opinião

Tratamento da Luxação Acrómio-Clavicular de Grau III – controvérsiasNuno Moura, António Cartucho & Marco Sarmento

Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto | Volume 6 Número 1

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> EDITORIAL

A “Troika” em Fisioterapia no Desporto

Marco Jardim 1

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Marco JardimDiretor da Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto 1

A prática da atividade física ou desportiva é cada vez mais uma realidade das sociedades modernas e industrializadas. Em consequência das politicas de saúde e da evolução do próprio conceito de Saúde, a adoção de um estilo de vida ativo parece ser um comportamento efetivo da população em geral. Atualmente o desporto e a atividade física têm vindo a tornar-se uma preocupação cada vez mais generalizada, reconhecendo-se os seus efeitos ao nível do alívio do stress, da manutenção ou melhoria da condição física e dos benefícios associados ao próprio processo de socialização (Bahr & Holme, 2003). Neste capítulo, a adesão dos portugueses à atividade física regular tem sido pautada por uma tendência crescente (23% em 2000 e 26% em 2005), no entanto, muito longe da média dos restantes países da União Europeia (38%) (Marktest Consumidor, 2005). Paralelamente, em contexto do desporto federado (Federações Desportivas com Estatuto de Utilidade Pública contratualizado com o Estado), assiste-se a um aumento do número de atletas, estimando-se que em Portugal tenha quase duplicado entre 1996 (263 mil atletas) e 2010 (mais de 512 mil atletas) (PORDATA, 2010; IDP, 2010). Inerente ao aumento do número de praticantes, parece estar associado um aumento substancial dos níveis de incidência e prevalência de lesões, que em determinadas situações se podem traduzir em elevados níveis de incapacidade (Bahr & Holme, 2003) e consequentemente acrescidas repercussões socioeconómicas (Janda, 1997; Conn, Annest & Gilchrist, 2003).Ao nível dos países da União Europeia estima-se que 60 em cada 1000 habitantes sofrem pelo menos uma lesão por ano, contribuindo em 10 biliões de euros para o custo total de despesas na Saúde (Petridou, 2001). Como exemplo, em 2003 na Bélgica, verificaram-se custos acima dos 111 milhões de euros devido à ocorrência de lesões desportivas, representando 3,4% do total das despesas relacionadas com as baixas médicas. Sabe-se ainda que a ausência de um dia de trabalho e consequente perda de produtividade, custou em média ao Estado belga cerca de 200€ por lesão desportiva (Cumps, Verhagen, Annemans & Meeusen, 2008). Em Portugal não existem dados sobre o impacto das lesões desportivas nas despesas ou nos orçamentos do Estado, no entanto, num estudo realizado por Santos e colaboradores (2004) verificou-se um gasto médio de 29,33€ por lesão, representando um custo total de 59,71€ sobre o agregado familiar. Quanto ao período de ausência ao trabalho, 27 dos inquiridos apresentavam uma média de 10 dias de baixa médica, devido a episódios de lesão desportiva.Face à representatividade destes dados e a atual conjuntura económica portuguesa parece-nos determinante e prioritário o desenvolvimento de medidas que visem a minimização deste problema de saúde ao nível do desporto. Sabemos contudo que

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estas medidas para serem efetivas requerem processos sustentados e uniformizados de monitorização e análise de ocorrência de lesões desportivas, para que a implementação de programas de prevenção possam ser igualmente efetivos e irem ao encontro não só das necessidades da população desportiva, mas também das organizações e agentes desportivos, representando benefícios diretos ou indiretos na nossa saúde económica.Neste contexto, o fisioterapeuta apresenta competências ao nível do registo, análise e avaliação dos factores de risco das lesões desportivas, que associado à sua experiência clínica e conhecimento científico, prefigura-se como elemento fundamental na implementação de programas efetivos de prevenção de lesões desportivas, podendo desta forma constituir uma mais valia para a diminuição dos seus níveis de incidência e prevalência, assim como, na diminuição dos custos inerentes à prestação de cuidados clínicos (Bulley et al, 2005).Ao nível da fisioterapia no desporto, a literatura é escassa ou quase inexistente no que diz respeito à redução de custos com base na implementação de programas de prevenção de lesões desportivas. No entanto, um estudo realizado por Bronner, Ojofeitimi, & Rose (2003) numa instituição desportiva, verificou-se num período de cinco anos, que o número de lesões reduziu de 94% para 75% resultando uma diminuição anual de 1,2 milhões de dólares nos custos associados à prestação de cuidados de saúde.Acreditamos assim, que estas medidas possam ser um dos contributos da fisioterapia no desporto ao nível da diminuição das despesas relacionadas com os cuidados de saúde dos atletas e consequentemente para a reestruturação económica do país.

Bom Ano!!

(Editorial escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)

Bibliografia

Bahr & Holme (2003). Risk factors for sports injuries - a methodological approach. Br J Sports Med, 37(5):384-92.

Bronner, S., Ojofeitimi, S. & Rose, D. - Injuries in a Modern Dance Company – Effect of comprehensive management on injury incidence and time loss. The American Journal of Sports Medicine (2003); 31 (3): 365-373.

Bulley, C, & Donaghy, M (2005). Sports physiotherapy competencies: the first step towards a common platform for specialist professional recognition. Physical Therapy in Sport, 6(2), 103-108.

Conn, J., Annest, J., Gilchrist, J., (2003). Sports and recreation related injury episodes in the US population; 1997–99. Injury Prevention, 9:117–123.

Cumps, E., Verhagen, E., Annemans, L., (2008). Injury rate and socioeconomic costs resulting from sports injuries in Flanders: data derived from sports insurance statistics 2003. British Journal of Sports Medicine, 42; 767-772.

Janda, D. (1997) Sports injury surveillance has everything to do with sports medicine. Sports Medicine, volume 24, número 3.

Santos, O., Viseu J., Sermeus, G., (2004) Exercise-Related injuries in Portugal: a national postal survey. Revista Portuguesa de Medicina Desportiva, 109: 37-50.

http://www.marktest.com/wap/a/n/id~c49.aspx

http://www.idesporto.pt

http://www.pordata.pt/Tema/Portugal/Cultura+e+Desporto-14

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> REVISÃO DA LITERATURA

A Instabilidade Crónica da Articulação Tibio-Társica: Etiologia, Fisiopatologia e Métodos de Medição e Avaliação

Marc Reis 1, Raúl Oliveira 2

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>RESUMO

Introdução: A instabilidade crónica da tíbio-társica (ICTT) está associada à instabilidade mecânica e/ou funcional da articulação tíbio-társica, sendo descrita como a alteração residual mais comum após lesão capsulo-ligamentar. Testes dinâmicos mostram ser mais adequados para a identificação de défices funcionais relacionados com alterações na oscilação postural e no tempo de estabilização, com efeitos na estabilidade dinâmica, particularmente solicitada em gestos desportivos como a recepção de um salto ou numa mudança brusca de direcção na corrida. Objectivo: elaborar uma revisão compreensiva e analítica da literatura que descreva de forma sucinta o conceito de ICTT, os seus processos etiológicos e fisiopatológicos que fundamentam a disfunção, assim como os métodos de avaliação da oscilação postural que nos permitam quantificar objectivamente a dimensão dos mecanismos de controlo postural. Discussão: O desenvolvimento de instabilidade crónica da articulação tíbio-társica (ICTT) é a alteração mais comum após lesão deste complexo articular, sendo esta caracterizada como tendo uma componente mecânica e/ou funcional. Os sintomas como episódios de sensação de instabilidade articular (giving away), dor e défices em actividades funcionais associados a ocorrência de recidivas de lesão, determinam um quadro de ICTT. Os estudos enfatizam a importância da avaliação dinâmica do controlo postural, onde os mecanismos de feedforward têm especial relevância. A avaliação da OP, nomeadamente em single leg jump landing (SLJL), e do tempo de estabilização, deve ser parte integrante deste tipo de avaliação clínica. Conclusão: Uma boa compreensão dos mecanismos de controlo postural inerentes à ICTT e o conhecimentos dos métodos de avaliação da OP, permitem uma melhor integração e avaliação da efectividade de programas de reeducação neuro-motora na melhoria da estabilidade, no sentido de prevenir e/ou minimizar o risco de recidiva de lesão e consequente melhoria da performance do atleta, tanto em sujeitos com instabilidade, como em sujeitos saudáveis (prevenção).

Palavras-Chave: Instabilidade crónica da tíbio-társica; Oscilação Postural; Controlo Postural; Tempo de Estabilização

>ABSTRACT

Introduction: The Chronic Ankle Instability (CAI) is associated with a mechanical and/or functional instability of the ankle joint, being described as the most regular residual dysfunction after an ankle injury. Dynamic tests show to be the most adequate to identify the functional deficits related to the changes in postural movements and in the stabilization time, with consequences in dynamic stability, particularly the kind that is more important for sportive maneuvers such as the landing of a jump or the sudden change of a run. Goal: To elaborate a comprehensive and analytical literature revision that describes in a resumed way, the concept of CAI, its etiological and pathophysiological that is the base of the dysfunction, as well as the methods to evaluate the postural movement that allows us to objectively quantify the dimension of the mechanisms of postural control. Discussion: The development of CAI is the most common change after an injury in this joint complex, being characterize as having a mechanical and/or functional component. The symptoms such as episodes of a feeling of joint instability (giving away), pain or deficits in functional activities associated with the occurrence of recurrence of the injury, determine a CAI overview. Studies emphasize the importance of the dynamic evaluation of the postural control, where the feedforward mechanisms are especially relevant. The evaluation of the postural oscillation (PO), especially in a single leg jump landing and the stabilization time, should be fully integrated in this kind of clinical evaluation. Conclusion: A good comprehension of the postural control mechanisms directly related to CAI and the knowledge of OP evaluation methods, allow for a better integration and evaluation of the effectiveness of the neuro-motor rehabilitation programs in stability improvement, in order to prevent and/or minimize the risk of reoccurrence of the injury and consequent improvement of the athlete’s performance, in subjects with instability, as well as healthy subjects (Prevention).

Key Words: Chronic Instability of the ankle; Postural Movement; Postural Control, Stabilization Time

Marc ReisFisioterapeuta. Mestre em Fisioterapia pela FMH-UTL1

[email protected]

Raúl OliveiraFisioterapeuta. Doutorado em Fisioterapia pela FMH-UTL2

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Introdução

A instabilidade crónica da tíbio-társica (ICTT) tem sido objecto de estudo em muitas investigações, nomeadamente ao nível do seu processo fisiopatológico e factores de risco intrínsecos e extrínsecos associados à sua elevada taxa de incidência, assim como, dos seus efeitos funcionais após lesão capsulo-ligamentar resultante de mecanismos de entorse de repetição. Diversos estudos apontam para a presença de alterações da oscilação postural (OP) em indivíduos com ICTT, o que poderá indiciar alterações ou disfunções nas estratégias de controlo motor ou postural. Contudo, existe alguma controvérsia relativamente aos métodos utilizados para a sua medição quanto à sua fiabilidade e sua aplicação em situações de contexto clínico.O entorse da articulação tíbio-társica é um dos mecanismos de lesão mais frequente na prática desportiva (Suda, Amorim & Sacco, 2009). Os desportos em que os atletas real izam frequentemente saltos e recepções em apoio unipodal, apresentam um elevado risco de lesão na articulação tíbio-társica (Thacker et al., 1999). Garrick (1997) considerou também que o complexo ligamentar externo da articulação tíbio-társica é uma das estruturas mais frequentemente lesada em atletas. Em 85% dos casos ocorre um processo de entorse na sequência de um mecanismo de inversão associado ou não a flexão plantar.Algumas dessas lesões podem deixar sequelas como é o caso da ICTT, aumentando o risco de recidivas ou mesmo de uma instabilidade residual permanente com impacto na actividade desportiva dos atletas.A ICTT tem sido descrita como a alteração residual mais comum do complexo articular da articulação tíbio-társica, após lesão (Caulfield, Delahunt & Kenneth, 2006). Segundo Karlsson e Chan (2005), entre 10% a 76% dos sujeitos que sofreram lesão cápsulo-ligamentar da tíbio-társica, referiram ainda sentir alterações nesta articulação, entre seis meses e um ano após lesão. Segundo Yeung, Chan e Yuan (1994), entre 40% a 70% dos indivíduos que sofreram lesões capsulo-ligamentares desenvolveram ICTT. Esta

surge quando ocorre uma alteração da mecânica da estabilidade articular, devido a sucessivas lesões, resultando em défices do controlo neuromuscular (Gribble & Hertel, 2004). Na maioria dos casos, a instabilidade surge durante a prática de exercício físico, em que após uma lesão, o retorno ao treino provoca lesões recidivantes. Segundo Peters, Trevino e Renstrom (1991) após lesão capsulo-ligamentar da articulação tíbio-társica, cerca de 10% a 30% dos indiv íduos referem sintomas persistentes ou recidivas de lesões. Guskiewicz e Ross (2004) estimam que a frequência da sua ocorrência seja entre 30% a 78%.Uma parte importante da intervenção em fisioterapia na prevenção e tratamento da ICTT, integra programas de reeducação e de controlo sensório-motor, no sentido de uma melhoria ou optimização dos mecanismos neurofisiológicos de controlo postural e consequente melhoria da estabilidade articular, com minimização da OP em situações de maior risco de lesão capsulo-ligamentar, como acontece, por exemplo, na recepção após um salto e nas mudanças bruscas de direcção e/ou velocidade.Pretendemos neste artigo elaborar uma revisão compreensiva e analítica da literatura que descreva de forma sucinta o conceito de ICTT, os seus processos etiológicos e fisiopatológicos que fundamentam a disfunção, assim como os métodos de avaliação da OP que nos permitam quantificar objectivamente a dimensão do mecanismos de controlo postural. Estes métodos também servem para avaliar a efectividade dos programas de intervenção que os Fisioterapeutas no desporto implementam em casos de atletas com ICTT.

Instabilidade Crónica da Tibio-Társica: Conceitos e EtiologiaNão é consensual na literatura a definição de ICTT. Segundo Delahunt et al. (2010) a ICTT é um termo utilizado em sujeitos que apresentam instabilidade mecânica e funcional da tíbio-társica e que manifestam sintomas de sensação de instabilidade articular pelo menos um ano após a ocorrência de lesão e que tenham sofrido pelo menos dois entorses de média gravidade nos últimos 2/3 anos. O desenvolvimento de instabilidade crónica da articulação tíbio-társica (ICTT) é um dos

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principais problemas residuais após lesão, sendo esta caracterizada como tendo uma componente mecânica e outra funcional. Os sintomas como episódios de sensação de instabilidade articular (giving way), dor e défices em actividades funcionais associados a ocorrência de recidivas de lesão, determinam um quadro de ICTT (Delahunt et al., 2010).A ICTT apresenta uma etiologia multifactorial, onde se associam factores como a laxidão ligamentar, a fraqueza muscular, a diminuição no limiar de sensibilidade dos mecanismos proprioceptivos, desencadeando uma alteração estrutural e biomecânica da articulação, com consequente défice no controlo postural, comparativamente a sujeitos saudáveis (Denegar & Miller, 2002; Hubbard, Hertel & Sherbondy, 2006; Kavanagh, 1999; Willems, Witvrouw & Verstuyft, 2002).Hertel (2002) definiu a instabilidade crónica da articulação tíbio-társica como um episódio recorrente da sensação de instabilidade desta articulação, devido a défices neuromusculares e proprioceptivos, que reduzem a eficácia dos mecanismos aferentes e eferentes na estabilidade dinâmica da articulação.Em condições normais, as informações proprioceptivas - o sentido de posição e de movimento articular - são obtidas pelos mecanoreceptores articulares e receptores musculares (fuso neuro-muscular e órgão tendinoso de Golgi) após a detecção de um deslocamento ou de uma perturbação do movimento articular. É desencadeada uma resposta reflexa neural que origina uma activação neuromuscular, no sentido de aumentar o stifness muscular e o controlo do movimento articular, ou ainda a manutenção do controlo postural (Baltaci & Kohl, 2003) e a estabilidade funcional da articulação (Riemann & Lephart, 2002). No entanto, após um entorse da articulação tíbio-társica, a lesão nas estruturas cápsulo-ligamentares resulta numa redução da capacidade de detectar alterações no sentido de posição e movimento articular (Hertel, 2000) devido a um processo designado por desaferenciação neural (Freeman, Dean & Hanham, 1965).As alterações no controlo postural e/ou nos processos de controlo neuromuscular e sensório-motor, muitas vezes presentes em sujeitos com

ICTT, potenciam os riscos de recidivas de entorses como um mecanismo etiológico associado a este tipo de lesões. As sequelas estruturais e funcionais que muitas vezes permanecem após lesão, acentuam o risco de recidiva e elevam o número de lesões crónicas existentes.

Instabilidade Crónica da Tibio-Társica: fisiopatologia e disfunção de controle motorA ICTT é geralmente associada à instabilidade mecânica (IM) e/ou à instabilidade funcional (IF) da articulação tíbio-társica (Hertel, 2002; Monaghan, Delahunt & Caulfield, 2005). A IF foi descrita como uma tendência para a articulação tíbio-társica “ceder” durante a realização de actividades funcionais normais (Freeman, 1965; Demeritt et al., 2002). Segundo Konradsen et al. (1998) esta é uma das principais complicações que ocorre após lesão, desenvolvendo-se entre 15% a 60% dos atletas que sofreram lesão. Tropp (2002) descreve a IF como uma sensação subjectiva de giving way ou sensação de instabilidade articular caracterizada pela ocorrência de movimento articular para além do controlo voluntário, e não necessariamente para além do limite de movimento articular fisiológico. Delahunt et al. (2005) consideraram que existe uma alteração da posição do pé em sujeitos com IFTT, antes e depois da recepção ao solo, podendo contribuir para um aumento do risco de lesão. Para além do risco de recidiva, existe a possibilidade de sintomas residuais como a dor, o edema e o giving way da articulação. Estes sintomas têm sido utilizados quando se emprega o termo de ICTT (Delahunt, 2007b), sendo esta designação utilizada, quando a instabilidade, a ocorrência de recidivas ou a sensação de giving way persistem por mais de seis meses (Karlsson, Eriksson & Sward, 1996).A instabilidade mecânica (IM) foi definida como o movimento da articulação tíbio-társica para além do seu limite fisiológico, sendo um termo frequentemente usado associado à laxidão ligamentar (Tropp, 2002) e testado clinicamente através testes específicos de integridade ligamentar.Hertel (2000) define a IM como um aumento da laxidão ligamentar associada a excessiva

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amplitude de movimento articular ao nível da articulação subtalar, tibio-társica e/ou tíbio-peronial inferior devido a uma alteração estrutural nas estruturas capsulo-ligamentares. O autor descreve a IM como laxidão patológica secundária a lesão das estruturas ligamentares que suportam a articulação tíbio-társica. C o n c l u i u a i n d a q u e a s r e s t r i ç õ e s artrocinemáticas, as alterações degenerativas e as alterações sinoviais são factores associados à IM. Outros autores têm tentado definir, através de diversos estudos, a IM e a IF como entidades totalmente distintas (Tropp, Askling & Gillquist, 1985), evidenciando que a IF pode existir independentemente da IM (Lentell, Katzman & Walters, 1990; Birmingham, Chesworth & Hartsell, 1997).  No entanto, diversos estudos têm provado que as duas podem coexistir (Ryan L, 1994). É geralmente aceite que apesar da IF e da IM poderem existir isoladamente, a ICTT geralmente ocorre devido a uma interacção entre as duas (Hertel, 2002; Hertel, 2000; Denegar & Miller, 2002; Wilkerson & Nitz, 1994).Cerca de 45% de todas as lesões da articulação tíbio-társica ocorrem durante a recepção de um salto (McKay et al., 2001). Sujeitos com IF da articulação tíbio-társica, apresentam alterações do padrão de movimento antes do impacto ao solo na recepção de um salto unipodal, comparativamente com sujeitos saudáveis (Caulfield & Garrett, 2002). Estas diferenças podem surgir por alterações no controlo do padrão de movimento devido a lesão anterior (Caulfield & Garrett, 2004) ou a disfunções daí decorrentes. Brown e Mynark (2007) mostraram que indivíduos com ICTT demoram mais tempo a estabilizar após uma actividade dinâmica do que o grupo de controlo não lesado. Ross, Guskiewicz e Yu (2005) colocaram a hipótese de que este aumento no tempo de estabilização pode levar a um aumento de recidivas de lesões na articulação tíbio-társica devido a dificuldades acrescidas em executar de forma mais eficiente uma recepção após um salto. Durante a fase de recepção ao solo, os mecanismos neuromusculares do membro inferior são responsáveis pela desaceleração e estabilização do centro de massa corporal que através da actividade extensora, permitem

resistir ao colapso do membro inferior e atenuar ou amortecer as forças verticais de reacção ao solo (Devita & Skelly, 1992). Os sujeitos com ICTT apresentam maior tempo de estabilização do seu centro de massa após uma perturbação do equilíbrio e após a recepção de um salto relativamente a sujeitos saudáveis (Hiller, Refshauge & Beard, 2004). Estudos anteriores indicam que a instabilidade funcional da articulação tíbio-társica resulta de um atraso da resposta motora reflexa numa situação de stress ligamentar da articulação tíbio-társica e na lesão/perturbação funcional dos receptores articulares aquando da primeira lesão (Freeman et al., 1965; Wilkerson & Nitz, 1994). No entanto, há estudos que sugerem que o controle dinâmico da articulação tíbio-társica é obtido através de mecanismos de feedforward pelo sistema nervoso central dando menor relevo aos mecanismos de feedback através da acção reflexa (Konradsen, Voight & Hojsgard, 1997). Um défice no controlo postural manifesta-se frequentemente em indivíduos que sofreram entorses da articulação tíbio-társica agudos e recidivantes (Freeman, 1965; Garn & Newton, 1988). Estes défices posturais são, mais provavelmente, secundários a uma combinação de défices de controlo neuromuscular e de propriocepção (Hertel, 2002). O controlo neuromuscular é definido como uma activação motora inconsciente que ocorre na preparação e durante uma resposta ao movimento articular com o objectivo de manter e restaurar a estabilidade funcional da articulação (Holmes & Delahunt, 2009). Foi classicamente explicado por Freeman et al., (1965) que uma alteração ao nível dos mecanoreceptores após entorse leva a uma diminuição na transmissão dos impulsos aferentes para o sistema nervoso central, levando a uma diminuição da actividade reflexa, resultando em défices do equil íbrio e consequente desenvolvimento de IF. Segundo esta teoria, a estabilidade dinâmica da articulação tíbio-társica está dependente da capacidade de activação neuromuscular dos músculos eversores (peroneais laterais), em caso de uma perturbação inesperada em inversão, no sentido de prevenir a ocorrência de lesão. Indivíduos com IF demonstram ter um atraso e uma diminuição da resposta reflexa dos músculos peroneais devido a uma alteração do input

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sensorial proveniente das estruturas capsulo-ligamentares (Delahunt E., 2007a).A dificuldade e o elevado tempo necessário para recuperar o controlo postural após uma perturbação do equilíbrio em inversão, em sujeitos com IFTT poderá ser devido a um reduzido controlo no movimento de inversão. Um conjunto de factores poderá influenciar este controlo, como a redução e/ou tardia detecção e percepção do movimento de inversão e o aumento do tempo de latência dos músculos peroneais laterais (Hiller et al., 2007).Konradsen e Magnusson (2000) verificaram que os sujeitos com ICTT apresentam um défice na capacidade de detecção dos movimentos activos e passivos da articulação tíbio-társica, nomeadamente no movimento de inversão.Contrariamente, Riemann e Lephart (2002) sugerem que a actividade reflexa do longo peroneal dificilmente fornece a protecção adequada à articulação durante uma actividade dinâmica. Dois estudos examinaram a actividade do músculo peroneal durante a recepção de um salto em indivíduos com IF. Em ambos, não foi possível identificar qualquer diminuição do tempo de reacção muscular dos peroneais laterais após a recepção do salto (Caulfield et al., 2004; Delahunt, Monaghan & Caulfield, 2006). No entanto, em ambos os estudos verificou-se uma diminuição da actividade do músculo longo peroneal antes do contacto ao solo indicando que indivíduos com IF parecem apresentar um défice do mecanismo de feedforward do controle neuromuscular (Holmes & Delahunt, 2009).A combinação destes dois défices observados poderá deixar a articulação do tornozelo vulnerável a lesões recorrentes num contacto inesperado com o solo, resultando numa lesão de hiper-inversão e consequente estiramento e lesão dos ligamentos laterais da articulação tíbio-társica (Holmes & Delahunt, 2009).Caulfield e Garret (2002) verificaram existir diferenças significativas em relação ao ângulo/posicionamento articular da articulação tibio-társica e do joelho no momento de pré e pós-contacto durante um single-leg jump-landing (SLJL) entre indivíduos saudáveis e com IFTT. A partir dos 40 milissegundos pré-contacto ao solo, os sujeitos com IFTT iniciam a flexão do joelho, e a partir dos 20 milissegundos

apresentam uma preparação diferente do pé para a abordagem ao solo. Não existindo durante todo o movimento de pré-contacto qualquer tipo de força externa aplicada aos sujeitos, as alterações verificadas entre os dois grupos ao nível do comportamento cinemático da articulação tibio-társica, sugerem diferenças dos mecanismos de feedforward dos programas de controlo motor.Num estudo de Delahunt et al. (2005), o b s e r v o u - s e q u e s u j e i t o s c o m I F T T apresentavam um aumento significativo de supinação antes e depois do contacto do pé ao solo, assim como, um aumento significativo de flexão do joelho – entre os 95 ms antes do contacto ao solo até 5 ms após o mesmo, podendo esta posição inapropriada da tibio-társica estar relacionada com um aumento do r i s co de l e são , rec id i va de l e são , e consequentemente ICTT.Num outro estudo de Delahunt et al. (2006) com o objectivo de estudar o comportamento cinemático e cinético das articulações da articulação tibio-társica, joelho e anca e a actividade muscular principal dos músculos destas articulações durante um salto, verificou-se um aumento do movimento no plano frontal da articulação do tornozelo - aumento da posição e m i n v e r s ã o n o s s u j e i t o s c o m I F T T comparativamente a um grupo de controlo sem lesão, antes do contacto com o solo (dos 200 aos 95 ms pré-contacto) o que coincide com uma diminuição s ign ificat iva da act iv idade eletromiográfica do longo peroneal lateral no momento pré-contacto ao solo. A diminuição da actividade do músculo longo peroneal lateral no momento pré-contacto ao solo deixa a articulação tíbio-társica numa posição vulnerável (maior posição de inversão) e qualquer antecipação de contacto ao solo na recepção de um salto, pode originar um maior risco de lesão em hiperinversão. Konradsen et al. (1997) sugerem que uma pré-activação da actividade muscular dos peroneais laterais é necessária para uma efectiva e adequada estabilização articular e prevenção de entorse em inversão. Observaram ainda uma posição de menor flexão dorsal - dos 90 aos 200 ms pós contacto, assim como, uma diminuição na capacidade de desenvolver força excêntrica no plano sagital no mesmo período de tempo. Estes resultados sugerem que sujeitos com IF

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apresentam um défice no controlo do movimento de flexão dorsal (closed packed position), que associada à diminuição da sua amplitude de movimento leva a uma menor absorção de forças de reacção ao solo durante a recepção de um salto, aumentando o risco de lesão.Evans et al. (2004) identificaram défices no controlo postural em ambos os membros após lesão cápsulo-ligamentar da articulação tíbio-társica unilateral. Friden et al. (1989) verificaram uma diminuição do controlo postural em ambos os membros após uma lesão aguda unilateral da articulação tíbio-társica, comparativamente a um grupo de controlo saudável. Tropp, Odenrick e Gillquist (1985) justificaram estas afirmações defendendo a exis tência de a l terações centrais nos mecanismos de controlo postural que levam a défices bilaterais após lesão unilateral. A reforçar esta ideia, McKeon e Hertel (2008) recomendam a não utilização do membro não lesado como comparação para a avaliação do controlo postural num membro instável, após lesão aguda da articulação tíbio-társica.

Avaliação da Oscilação Postural na ICTTO sistema sensoriomotor é responsável pela manutenção da estabilidade articular funcional através da integração da informação aferente e eferente associada a comandos centrais, no sentido de promover uma activação neuro-motora, e assim controlar/regular a estabilidade dinâmica articular (Riemann & Lephart, 2002). Este sistema sensoriomotor requer uma interacção constante e eficiente entre sistemas perceptivos e sistemas de acção ou de movimento.A avaliação do equilíbrio e do controlo postural é um dos métodos para a determinação indirecta de défices sensoriais após uma lesão da articulação tíbio-társica e da ICTT. O controlo postural é normalmente medido a partir da oscilação postural, através da distância e amplitude de deslocamento do centro de pressão (Mattacola & Dwyer, 2002).Alterações ao nível do sistema sensoriomotor associadas a IF da articulação tíbio-társica têm sido demonstradas pela avaliação do controlo postural em apoio unipodal. Uma deficiente integração sensório-motora ao nível da informação aferente e eferente pode levar a uma redução da estabilidade postural por

d i s f u n ç õ e s a o n í v e l d o s m e c a n i s m o s neuromusculares de feedback e feedforward, o que leva a um aumento da oscilação postural (OP) em apoio unipodal em indivíduos com IF da articulação tíbio-társica (Hertel &, Olmsted-Kramer, 2007).A medição do controlo postural, através do uso de plataformas de força, tem sido usada como forma de prevenir o risco de entorses e avaliar os défices sensoriomotores quer em estadios sub-agudos quer em casos de ICTT (McKeon & Hertel, 2008).A utilização de plataformas de forças permite a medição, de entre outros parâmetros, da d i s t ânc i a e da á rea pe r co r r i da pe l o deslocamento do centro de pressão. As plataformas Footscan® são os sistemas mais utilizados devido à sua alta especificidade, fácil manuseamento e software detalhado para a análise clínica. Para além disso, fornece informação sobre a mecânica do pé, cujas possíveis alterações dinâmicas se tornam difíceis de identificar por observação directa pelo clínico. Desta forma, quanto mais informação se obtenha acerca da condição clínica, é possível uma maior eficácia do diagnóstico e maior sucesso na intervenção.De acordo com uma revisão sistemática realizada por McKeon e Hertel (2008), a avaliação do controlo postural através do uso de plataformas de força tem uma maior relevância na identificação de défices no controlo postural em situações de lesões agudas relativamente à determinação de alterações em condições de ICTT. Segundo estes autores, ao contrário do que acontece em lesões agudas da articulação tíbio-társica, o grau de evidência obtido não permite concluir que a ICTT esteja associada a uma alteração no controlo postural. Em sentido oposto, Lephart, Riemann e Myers (2002) concluem pela existência de um aumento da oscilação postural em indivíduos com ICTT.A avaliação da OP é habitualmente realizada através da medição dos deslocamentos sofridos pelo centro de massa (CM) e centro de pressão (CP). O centro de pressão é uma medida indirecta da OP e é habitualmente utilizada pela simplicidade dos instrumentos existentes para a sua medição. A excursão do CP é avaliada tridimensionalmente pela interacção entre o apoio do pé e as forças de reacção ao solo, indicando-nos o comportamento postural na

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manutenção do equilíbrio (McKeon & Hertel, 2008).O CP é definido como a projecção do centro de gravidade na base de sustentação, sendo uma medida indirecta no estudo da oscilação postural. O deslocamento do CP é descrito segundo coordenadas num plano antero-posterior e medio-lateral, sendo a variação do seu comprimento e área, parâmetros efectivos para a medição da OP (Kim, Ferdjallah & Harris, 2009).O comprimento do deslocamento do CP refere-se à distância percorrida pelo centro de pressão dentro da base de sustentação. A área é o parâmetro que delimita espacialmente a excursão do deslocamento do CP dentro da base de CP no plano antero-posterior e médio-lateral (Kim et al., 2009). Uma diminuição no comprimento e área do deslocamento do CP e uma redução da sua velocidade de excursão indicam uma melhoria da eficiência do controlo postural (Sefton et al., 2009).Hertel, Miller e Denegar (2000) referem que os testes de equilíbrio estático em apoio unipodal não são suficientemente sensíveis para detectar défices no controlo motor para a manutenção do equilíbrio, considerando os testes dinâmicos mais adequados para a identificação de défices funcionais relacionados com alterações na manutenção do equilíbrio em sujeitos com IFTT. Um estudo realizado por Ross et al. (2005), com uma amostra de 10 sujeitos com Instabilidade funcional da tíbio-társica e 12 sujeitos sem instabilidade, demonstrou que sujeitos com IF apresentam um elevado tempo de estabilização (TE) (p=0,03) após a recepção de um salto em apoio unipodal (a 50-55% da sua impulsão vertical máxima), comparativamente a sujeitos saudáveis, sendo este TE maior no sentido médio-lateral (1,90s ±0,77s) relativamente ao sentido antero-posterior (1,54s ±0,50s) (p=0,02). Os autores concluem que sujeitos com IF apresentaram um défice ao nível da estabilização dinâmica, e que as medições do TE após a recepção de saltos devem ser utilizadas como indicador de reintegração na actividade desportiva.Hertel e Olmester (2007) verificaram no seu estudo que sujeitos com ICTT apresentaram um aumento da velocidade de deslocamento do CP no sentido antero-posterior e medio-lateral. De acordo com os modelos dinâmicos do controlo

postural, o sistema nervoso central não controla apenas a posição relativa do centro de oscilação postural relativamente à base de sustentação, mas também a sua velocidade relativa de oscilação, para a manutenção da estabilidade (Pai, 2003).Os testes em SLJL têm sido frequentemente utilizados para avaliar os efeitos da IFTT na estabilidade postural dinâmica (Brown et al., 2004; Wikstrom et al., 2005) e a sua melhoria através de um treino de coordenação em pacientes com ICTT (Ross & Guskiewicz, 2006). A IFTT tem sido correlacionada com um aumento do TE nos planos frontal e sagital e diversos estudos sustentam este factor como o responsável pelas alterações e défices existentes na recepção de saltos (Brown et al., 2004; Ross et al., 2005).Ross et al. (2005) analisaram o TE no plano frontal e sagital de um tornozelo estável e instável durante a realização de um salto unipodal e descreveram a segurança e precisão das medidas do TE. Estes autores definiram o tempo de estabilização como o intervalo de tempo necessário para que a taxa de variação das forças de reacção ao solo imediatamente após a recepção de um salto em apoio unipodal seja similar à taxa de variação das forças de reacção ao solo numa posição de apoio unipodal estável. Este último dado, o valor absoluto mínimo de OP, é adquirido em apoio unipodal durante 10 segundos, após a recepção de um salto. Os sujeitos realizavam um salto a 50-55% da sua impulsão vertical máxima bilateral (medida a priori) e era-lhes pedido para realizarem recepção unipodal e sua manutenção durante 20 segundos. Cada medição foi realizada sete vezes e foram realizados três medições anteriores que serviam de treino para o sujeito. Estes autores concluíram que o TE até atingirem os valores de oscilação postural semelhantes ao de uma posição estática, era significativamente superior em sujeitos com instabilidade funcional da articulação tíbio-társica.Ainda, Scott e Guskiewicz (2004) verificaram que o grupo de sujeitos com ICTT (n=14) apresentou um TE superior no sentido antero-posterior (3,27s ±0,72 vs 2,33 ±0,33s; p<0,001) e médio-lateral (2,48 ±0,50s vs 2,00s ±0,65s; p=0,04), relativamente a um grupo de controlo de sujeitos saudáveis (n=14).

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A visão é um sistema determinante para o controlo do equilíbrio. Quando existe um conflito somatossensorial, como por exemplo, uma plataforma móvel ou uma superfície esponjosa, o equilíbrio pode ficar significativamente alterado comparando a performance com informação visual Vs sem informação visual. No entanto, se o input somatossensorial está alterado devido a lesão, ao retirar-se a informação visual, vai aumentar significativamente a oscilação (Bernier & Perrin, 1998). O sistema vestibular tem pouca influência na manutenção do equ i l íbr io quando o s i s tema v i sua l e somatossensorial estão íntegros e activos (Bernier & Perrin, 1998).Se o input somatossensorial está alterado, como se supõe que aconteça em caso de ICTT, o sistema visual pode compensar o défice do sistema somatossensorial. Desta forma, o balanço entre as medições com os olhos fechados e os olhos abertos é um indicador da integridade do sistema somatossensorial (Dornan, Fermie & Holliday, 1978), sendo o quociente de Romberg um dos indicadores a que se pode recorrer para avaliar a integridade do mesmo (Tarantola et al., 1997; Lelard et al., 2010). Este quociente representa o cálculo entre os valores obtidos nas oscilações posturais em condições de olhos fechados e olhos abertos, quantificando assim a contribuição do sistema visual para o controlo postural (Shabana et al., 2005). Para além do uso de plataforma de forças para a medição da oscilação postural, poderemos recorrer a um instrumento de avaliação que permita avaliar as consequências clínicas e funcionais da instabilidade, como a FAOS (Foot and Ankle Outcome Score). Esta é uma escala de auto-preenchimento e que integra 42 questões distribuídas em cinco sub-escalas: dor, outros sintomas, funcionalidade da vida diária, funcionalidade no desporto e laser e qualidade de vida relacionada com o pé e tibio-társica (Ross, Brandsson & Karlsson, 2001).

Conclusão

O desenvolvimento de instabilidade crónica da articulação tíbio-társica (ICTT) é a alteração mais comum após lesão deste complexo articular, sendo esta caracterizada como tendo uma componente mecânica e/ou funcional. Os sintomas como episódios de sensação de

instabilidade articular (giving away), dor e défices em actividades funcionais associados a ocorrência de recidivas de lesão, determinam um quadro de ICTT (Delahunt et al., 2010).A avaliação da OP é realizada pela medição da área e comprimento do deslocamento do centro de pressão, através do recurso a plataformas de força. Esta avaliação pode igualmente ser complementada pela utilização de instrumentos de avaliação, como a FAOS.Enfatizamos a importância da avaliação dinâmica do controlo postural, onde os mecanismos de feedforward têm especial relevância. A avaliação da oscilação postural, nomeadamente em SLJL, e do tempo de estabilização, deve ser parte integrante deste tipo de avaliação clínica.Estando a ICTT associada a défices no sistema sensorio-motor, é uma constante na prática da fisioterapia no desporto a utilização de programa de reeducação sensorio-motora, na melhoria da estabilidade, no sentido de prevenir e/ou minimizar o risco de recidiva de lesão e consequente melhoria da performance do atleta, tanto em sujeitos com instabilidade, como em sujeitos saudáveis (prevenção). Desta forma, é fundamental avaliar a evidência que esses programas podem ter na optimização e na efectividade dos mecanismos de protecção articular e de controlo postural.

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> REVISÃO DA LITERATURA

Inteligência Emocional e Prática Desportiva: Uma Análise Global

José Silva 1, António Rosado 2 , Sidónio Serpa 2

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José SilvaEscola Superior de Rio Maior1

António RosadoFaculdade de Motricidade Humana2

Sidónio SerpaFaculdade de Motricidade Humana2

>RESUMO

Nos anos 90 uma nova concepção de Inteligência despertou a atenção mundial: a Inteligência Emocional (IE). O conceito difundiu-se amplamente e em muitas áreas de estudo e, recentemente, captou, também, a atenção da área da Psicologia do Desporto e do Exercício, fazendo-se acompanhar por resultados bastante promissores. No entanto, os conhecimentos sobre a IE neste contexto carecem de sistematização e de um maior esforço de investigação, considerando quer problemas conceptuais quer metodológicos, atendendo ao reduzido número de pesquisas desenvolvidas nesta área específica e ao pouco suporte para a intervenção prática. Neste sentido, este artigo pretende concretizar: (a) uma breve análise das concepções teóricas sobre IE e sobre a sua avaliação; (b) uma análise crítica da literatura sobre IE no Desporto.

Palavras-Chave: Inteligência Emocional, prática desportiva.

>ABSTRACT

A new concept of Intelligence called the world’s attention during the last decade of the xx century: the Emotional Intelligence (EI). It widely spread in many research areas and more recently called the attention of Sport and Exercise Psychology showing very promising results. However, the EI intervention boundaries in the sport practice (SP) are not clearly defined yet due to conceptual problems and to the small amount of research produced in this specific area. Therefore this article intends to: (a) analyze the EI concept and its measuring; (b) make a critical analysis of literature about EI and sport.

Key Words: Sport and Exercise Psychology, Sports Practice.

Introdução

É na década de 90 que uma nova concepção de Inteligência desperta a atenção da comunidade mundial: a Inteligência Emocional (IE). É nesse período que este novo constructo começa a ser estudado nos mais diversos campos e domínios com resultados promissores quer do ponto de vista teórico quer metodológico. Em muita da literatura deste âmbito encontram-se sínteses evidenciando as relações positivas encontradas entre IE e, por ex., liderança, coesão, desempenho académico e profissional, bem-estar, saúde física e psicológica, satisfação em diversos domínios e nos mais variados contextos, destacando-se, por ex., o organizacional, o empresarial e o da saúde (Bar-On, 2006; Cherniss, 2004; Cherniss & Goleman, 2001;Latimer, Rench & Brackett, 2008; Maltaby, Day & Macaskill, 2010; Mayer, Roberts & Barsade, 2008; Mayer, Salovey, Caruso & Cherkasskiy, 2011; Meyer & Fletcher, 2007; Meyer & Zizzi, 2007; Nunez, León, González & Martín-Albo, 2011). A IE apresenta-se, assim, como um importante indicador de sucesso em muitos aspectos de vida (Goleman, 1995).

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Este novo conhecimento, proveniente de uma nova linha de pesquisa, e a sua resultante relevância, captou, também, a atenção das Ciências do Desporto tornando-se evidente que pode ser uma competência decisiva a acrescentar à intervenção no âmbito da Psicologia do Desporto e do Exercício.O contexto da prática desportiva (PD)1 engloba o treino e a preparação de aspectos técnicos, tácticos, físicos e psicológicos, contemplando, estes, necessariamente, também, a Inteligência Emocional. A IE pode, ainda, assumir particular relevo no desenvolvimento de competências pessoais e sociais, participando no processo formativo global que o desporto e a actividade física representam.Nes te cenár io su rgem duas ques tões fundamentais: Será que a IE influência o desempenho e a performance dos agentes desportivos (i.e., treinadores, atletas, árbitros, instrutores, equipas, praticantes e grupos de exercício, professores, funcionários das instituições e entidades desportivos, entre outros intervenientes no contexto da prát ica desportiva)? E será que a prática desportiva promove o desenvolvimento da IE?O primeiro estudo publicado entre IE e PD surge em 2003 (Zizzi, Deaner, & Hirschhorn, 2003). Juntamente com outras investigações pioneiras na área começava a dar-se forma a um novo domínio de estudo que aparenta ter um potencial contributo para a Psicologia do Desporto e do Exercício. No entanto, apesar da crescente tendência para a investigação da IE no contexto específico das práticas físico-desportivas, e dado o seu carácter recente, existe pouco suporte teórico e empírico neste domínio (Costarelli & Satmou, 2009; Laborde, Brull & Anders 2011; Latimer et al., 2008; Li, Lu & Wang, 2009; Mayer & Flecther 2007; Mayer & Zizzi 2007; Petrides, Niven, Mouskount i , 2006; Queirós , Carral & Fernández-Berrocal, 2004; Saklofske, Austin & Andrews, 2007). Assim sendo, a fundamentação teórica neste campo e a discussão dos resultados d a i n v e s t i g a ç ã o s ã o f r e q u e n t e m e n t e desenvolvidas tendo por base paralelismos com outros domínios e contextos que cruzam similaridades com o campo em análise.

Neste artigo pretendemos contribuir para a investigação da IE no domínio das práticas desportivas e para a sua operacionalização prática por parte dos psicólogos do desporto e do exercício e de outros profissionais da área do desporto, fazendo uma breve análise das concepções teóricas sobre IE e sobre a sua avaliação e uma análise crítica da literatura sobre IE em Desporto.Breve conceptualização teórica da IE Antes dos psicólogos começarem a tentar medir a inteligência emocional, Darwin já se tinha pronunciado, em 1872, sobre a importância adaptativa das emoções na vida humana e animal (Cherniss, 2004). Ao conceito contemporâneo de inteligência está i n e ren t e a i d e i a de “ capac i dade de adaptação” (Almeida, 1994). Segundo Sternberg (2004), "Inteligência é a capacidade de implementar comportamentos adaptativos dirigidos por objectivos" (p.322). No entanto, até aos anos 80 do século XX, dominavam duas ideias clássicas sobre inteligência: uma considerava que esta era uma capacidade geral única e que todos os indivíduos a possuíam em maior ou menor “quantidade”; a outra afirmava que podia ser medida através de instrumentos devidamente val idados e estandardizados (Flores & Tovar, 2005). Por outro lado, as definições e as propostas de instrumentos para a sua avaliação tendiam a enfatizar as componentes cognitivas do tipo intelectivo (raciocínio lógico-dedutivo). Se estas componentes e a sua avaliação não estão em causa, cedo se percebeu, também, que estas não actuam de forma autónoma nem são suficientes para determinar os comportamentos inteligentes (adaptativos) dos indivíduos.É neste quadro que Gardner (1983) refuta algumas das ideias instituídas, cujas perspectivas sobrevalorizam o coeficiente de inteligência (QI) e a sua determinação hereditária (Kate, Christodoulou, Seider & Gardner, 2011).Na realidade, tendo em conta algumas destas ideias, assim como os resultados obtidos nos testes de QI, seria de esperar que certos indivíduos fossem extremamente bem-sucedidos ao contrário de outros, o que se veio a verificar não ser assim tão simples e linear.

1Neste trabalho adoptamos a designação prática desportiva (PD) em sentido amplo, como prática de qualquer modalidade desportiva ou outra forma de exercício e actividade física.

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Gardner, em 1983, na sua obra Frames of Mind, reformula a concepção de inteligência, através da teoria das inteligências múltiplas, propondo um conceito pluralista. Esta teoria considera que os seres humanos possuem oito tipos de inteligência principais sendo cada uma relat ivamente independente da outra: Inteligência Linguística; Inteligência Lógico-Matemática; Inteligência Espacial; Inteligência Musical; Inteligência Cinestésica-Corporal e Inteligência Naturalista (incluída posteriormente em 1990) (Kate et al., 2011). Este abordagem contempla, ainda, a Inteligência Intrapessoal e a Inteligência Interpessoal, muito relacionadas com a Inteligência Social apresentada anteriormente por Thorndike, em 1920 (Kate et al., 2011).Segundo Kate et al. (2011), a inteligência intrapessoal é a habilidade do indivíduo para reconhecer e compreender os seus próprios estados emocionais, os seus sentimentos e humor, os seus desejos e intenções, e a inteligência interpessoal, a habilidade de reconhecer e compreender esses mesmos aspectos nas outras pessoas.No princípio dos anos 90, Salovey e Meyer (1990) baptizam estes dois tipos de Inteligência com o expressivo nome de “Inteligência Emocional”. Esta englobaria todo um conjunto de qualidades pessoais que contribuem para a qualidade de vida do sujeito.No entanto, é Goleman que, em 1995, ao lançar

a sua obra Emotional Intelligence, tem a possibilidade de expandir o seu significado, despertando a atenção mundial para este novo conceito (Martin & Boeck, 1997).A IE representa a habilidade de conciliar Emoção e Razão para incrementar o pensamento (Mayer et al., 2008), envolvendo a integração da emoção e da cognição (Mayer et al., 2011) nos processos de tomada de decisão. Os autores referem que as emoções são r e c o n h e c i d a s c o m o u m a d a s c l a s s e s fundamentais de operações mentais entre as quais se encontra, também, a motivação, a cognição e a consciência. Existem várias definições e modelos de IE que divergem em aspectos e questões particulares. M e s m o q u e , p o r v e z e s , p o s s a m v i r acompanhados de alguma controvérsia e de a problemática ser fonte de forte debate científico,

é importante salientar que, de um modo geral, existe um largo consenso acerca da noção básica e do sentido comum da IE. Cherniss (2004) clarifica que "no núcleo de cada definição estão as habilidades para perceber claramente as próprias emoções e as dos outros, de usar as emoções para facilitar o pensamento e a acção, de entender como as emoções afectam o próprio comportamento e o dos outros e para regular as próprias reacções emocionais " (p.315).A IE é definida, no seu emergir, por Salovey e Mayer (1990) como o “subconjunto da inteligência social que envolve a capacidade de monitorizar as próprias emoções e sentimentos e as dos outros, de os discriminar entre si e de uti l izar essa informação para guiar o pensamento e a acção " (p.189) ou como "a capacidade de perceber e expressar emoções, assimilar emoção no pensamento, compreender uma razão com emoção e regular a emoção em si e nos outros" (Mayer et al., 2011, p.528). Bar-On (2006), propondo o Emotional-Social Intelligence Model (ESI), define-a como “uma área, transversal, de competências emocionais e sociais interligadas que determinam como é que e f e c t i v amen te no s compreendemos e expressamos, compreendemos os outros, nos relacionamos com eles e com as exigências diárias” (p.14).Considerando os domínios da IE, Goleman (1995, p. 63), apresenta cinco áreas principais: conhecer as nossas próprias emoções, gerir emoções, motivarmo-nos a nós mesmos, reconhecer as emoções dos outros e gerir relacionamentos. Mayer e Salovey (1997) sugerem os seguintes domínios: percepção e expressão de emoção, assimilação da emoção no pensamento, compreender e analisar a emoção e regulação da emoção. Bar-On (1997) identifica como domínios as competências intrapessoais, as competências interpessoais, a adaptabilidade, a gestão de stress e o humor geral. Segundo Goleman (2001) todos estes modelos de IE, no entanto, compartilham um núcleo comum de conceitos básicos: a inteligência emocional, no nível mais geral, refere-se à capacidade de reconhecer e regular emoções em nós mesmos e nos outros. Esta definição, mais parcimoniosa, sugere quatro domínios principais

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da IE: auto-conhecimento, auto-gestão, consciência social e gestão de relacionamentos. Bar-On (2006) refere que, desde Darwin até ao presente, a maioria das descrições, definições e conceptualizações da Inteligência Emocional têm incluído um ou mais dos seguintes componentes chave: (a) a habilidade para reconhecer, compreender e expressar emoções e sentimentos; (b) a habilidade para compreender como os outros se sentem e estabelecer relação com eles; (c) a habilidade para gerir e controlar emoções; (d) a habilidade para gerir mudanças, de adaptar e resolver problemas de natureza pessoal e interpessoal e (e) a habilidade de gerar afecto positivo e ser auto-motivado.

Modelos de IE e instrumentos de avaliaçãoNa literatura podemos identificar três teorias principais ou modelos conceptuais sobre IE (Cherniss & Goleman, 2001; Maltby et al., 2010). Bar-On (2006) menciona a diferenciação

feita pela Encyclopedia of Applied Psychology (Spielberger, 2004) e distingue-as, em sinopse, da seguinte forma:

(a) The Salovey-Mayer Model, que define este constructo como a capacidade de perceber, compreender, gerir e utilizar as emoções para facilitar o pensamento, sendo medido

por uma ability-based measure (avaliação de desempenho de capacidade máxima).

(b) The Goleman Model que assume este constructo como um vasto leque de

competências e habilidades, medido by multi-rater assessment (avaliações por múltiplos juízes).

(c) The Bar-On Model que descreve um conjunto de competências emocionais e sociais interligadas que promovem o comportamento inteligente, medidas por auto-relatos dentro de uma aproximação multi-modal que inclui entrevista e avaliações por múltiplos juízes.

No entanto, também é frequente a referência a apenas dois modelos conceptuais de IE

designados habitualmente como Ability Models e Mixed Models (Flores & Tovar, 2005; Maltby et. al., 2010; Mayer et al., 2011; Meyer & Zizzi, 2007).

O s A b i l i t y M o d e l s r e f e r e m - s e , fundamentalmente, ao modelo desenvolvido por

Mayer e Salovey. Os Mixed Models referem-se, principalmente, ao modelo de Goleman e ao modelo de Bar-On.

Neste sentido, os Ability Models fundamentam-se numa perspectiva que assume a IE como um conjunto de habilidades emocionais e cognitivas consideradas únicas para a IE, independentes de qualquer aspecto e característ icas da personalidade ou do comportamento.

Já os Mixed Models sugerem a conjugação de habilidades mentais (por ex., auto-consciência emocional, empatia, resolução de problemas, controlo de impulsos) e características da personalidade (por ex., humor, autenticidade, afecto, optimismo), numa abordagem teórica que conjuga traços psicológicos, habilidades, estilos e outras características (Cherniss, 2004; Maltby et al., 2010; Mayer et al., 2008; Mayer et al., 2011; Meyer & Zizzi, 2007). O Modelo de Bar-On e de Goleman focam-se em abordar a IE tendo em conta o sucesso da “pessoa emocionalmente inte l igente”. Debruçam-se sobre todos os elementos que possam estar inerentes a esse sucesso, considerando aspectos da personalidade e comportamento como parte central desse sucesso (Maltby et al., 2010). O desenvolvimento dos modelos teóricos da IE foi acompanhado pelo aparecimento de um vasto leque de instrumentos que se propõe medir os constructos que lhe estão associados. Geralmente, a avaliação da IE é feita com base em dois métodos de medida: auto-relatos de desempenhos típicos ou performance máxima à semelhança dos testes de Q.I. (Latimer et al., 2008; Petrides et al., 2006).Na realidade, um dos maiores problemas no estudo e investigação da IE é que as teorias não são coesivas, atendendo à existência de diversos modelos conceptuais e, consequentemente, de diversos instrumentos de avaliação. As diferentes avaliações disponíveis para medir a IE, por vezes, não têm sequer forte correlação entre si. As teorias e pesquisas da IE são também acompanhadas pela crítica de que algumas abordagens apresentam pouco rigor científico (Cherniss, 2004; Maltby, et al., 2010;

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Mayer, at al., 2008; Mayer et al., 2011; Meyer & Zizzi, 2007). No âmbito das investigações que consultámos entre IE e PD alguns dos instrumentos mais utilizados foram os seguintes:

• EQ-i: Emotional Quotient Inventory (Bar-On, 1997) e EQ-i:YV: Emotional Quotient Inventory (Bar-On & Parker, 2000);

• E C I - 2 : T h e E m ot i o n a l C o mp ete n c e Inventory-2 (Goleman, 1998);

• MEIS: Multifactor Emotional Intelligence Scale (Mayer et al.,1999);

• MSCEIT: The Mayer-Sa lovey -Caruso Emotional Intelligence Test (Mayer et al., 2002);

• TMMS: Trait Meta-Mood Scale (Salovey, Mayer, Goldman, Turvey, and Palfay, 1995);

• EIS: Emotional Intelligence Scale (Schutte et al., 1998);

• TEIQue: Trait Emotional Intel l igence Questionnaire (Petrides & Furnham, 2003);

• TEIQue-SF: Trait Emotional Intelligence Questionnaire Short-Form (Petrides & Furnham, 2006).

Conceptualização no contexto das práticas físico-desportivasA IE emergiu como um conceito fundamental e tem despertado um interesse crescente no domínio das Ciências do Desporto, sendo, actualmente, conceptualizado como mais uma competência (ou conjunto de competências) a desenvolver na intervenção profissional nesta área. Neste contexto, a IE pode ser vista como uma ferramenta de trabalho junto de atletas, prat icantes de exercíc io , t re inadores , instrutores, administradores, etc. (Latimer et al., 2008; Meyer & Fletcher, 2007; Meyer & Zizzi, 2007; Nunez et al., 2011; Thelwell, Lane, Weston & Greenlees, 2008; Zizzi, et al., 2003).As emoções são, na realidade, uma parte integrante da prática desportiva e podem ser uma chave para a optimização do desempenho no desporto (Cashmore, 2008; Laborde, Brull, Weber & Anders, 2011; Latimer et al., 2008). No entanto, o uso discrepante de diferentes modelos conceptuais e técnicas de medida, utilizadas no domínio da IE, tem dificultado a clarificação da relação entre IE e Desporto (Meyer & Fletcher, 2007; Meyer & Zizzi, 2007; Newman, 2010) e a investigação nesta área está, ainda, na infância. Na maioria da literatura consultada, com excepção de um trabalho (Newman, 2010), não encontrámos nenhuma referência à existência de

um modelo de IE ou a instrumentos de avaliação unicamente desenvolvidos para o contexto das práticas físico-desportivas e a investigação tem sido principalmente realizada com base nos modelos e teorias gerais referidas e através das medidas de avaliação correspondentes. Na aproximação que tem sido feita entre os modelos e as medidas de avaliação existentes e o domínio das actividades físicas e desportivas podem mencionar-se por ex., Meyer e Fletcher (2007) e Meyer e Zizzi (2007) que analisaram os vários modelos e respectivas medidas da IE e consideram o modelo da Salovey e Mayer e a MSCEIT como válidos para o Desporto.Igualmente, Latimer et al. (2008), fizeram o enquadramento da aplicabilidade dos vários domínios da IE no contexto da PD afirmando a MSCEIT como uma medida que poderá ser válida no contexto do Desporto e do Exercício. Lane, Meyer, Devonport, Davies, Thelwell, Gill, Diehl, Wilson e Weston (2009) referem, no entanto, que até essa data, nenhum estudo tinha publicado ou investigado a validade factorial de um teste de desempenho ou uma medida de auto-relato para amostras de atletas e realizaram um estudo de investigação da validade factorial do EIS para esse efeito. Também Stanimirovic e Hanrahan (2012) examinaram a estrutura dimensional e a validade factorial do EQ-i numa amostra de atletas masculinos. Os autores concluem que, de uma maneira geral, as qualidades psicométricas destas escalas necessitam, ainda, de ampla confirmação.Neste contexto, alguns autores destacam a importância de se desenvolver uma medida de IE específica para o contexto das práticas físicas e desportivas porque as medidas tradicionais não foram concebidas para uso específico neste contexto (Frank, Lu, Eva & Lavon, 2010; Lu, Li, Hsu & Williams, 2010; Newman, 2010). Neste âmbito, encontrámos um instrumento de

avaliação da IE no contexto da PD: O Emotional Intelligence Sports Inventory (ESI). Newman (2010) menciona que o ESI representa uma inovação na avaliação de competências psicológicas em atletas de elite proporcionando uma medida válida e eficiente da IE. O ESI consiste em dez factores: auto-conhecimento, a u t o - c o n fi a n ç a , a u t o - s u fi c i ê n c i a , competitividade, realização, resiliência, focalização, flexibilidade, auto-controle e

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optimismo. Apesar da curiosidade e interesse que este instrumento possa suscitar não encontrámos nenhum estudo em que tenha sido utilizado nem nenhuma investigação recente em que tenha sido referenciado.

Relação entre Inteligência Emocional e Prática DesportivaAs relações entre IE e as práticas físico-desportivas têm sido, no essencial, desenvolvidas com base em evidências de outras sub-disciplinas da Psicologia, como por ex., da psicologia social, da personalidade e organizacional, que têm fornecido informação a esta área (Latimer et al., 2008). Tendo em conta a existência de poucos estudos entre IE e PD, e as particularidades de cada investigação, a discussão dos resultados e a fundamentação teórica das pesquisas entre IE e PD tem sido feita com base em paralelismos que permitem, não sem dificuldades teóricas, transpor o conhecimento da relação da IE com determinados domínios (por ex., liderança, coesão, comunicação, resolução de problemas, bem-estar, etc.) e contextos (por ex., empresarial, da saúde, do trabalho em equipa, etc.,) com domínios similares relacionados com a IE no contexto da PD. Para ilustrar podemos verificar esse suporte nalguma fundamentação teórica que se encontra sobre IE e PD. Por ex., Meyer e Zizzi (2007) debruçando-se sobre pesquisas realizadas com líderes na assistência em saúde e no contexto empresarial, consideram-nas populações com experiências similares às dos líderes no Desporto. Também Meyer e Fletcher (2007) reviram a investigação da IE no contexto empresarial e da saúde, de forma a identificarem potenciais relações com o domínio do Desporto.Num outro caso, Latimer et al. (2008) demonstram como é que a teoria da IE pode prover um quadro teórico para estudar os aspectos interpessoais das emoções e das habilidades relacionadas com as emoções no contexto do desporto e do exercício. Referem que os grupos de trabalho servem como um modelo apropriado no campo do desporto e do exercício uma vez que a sua natureza social e os factores relacionados com a performance e o sucesso (ex., liderança, coesão de grupo,

comunicação) são similares em ambos os contextos. Em vários estudos realizados no campo da IE, podemos verificar que esta tem sido associada, positivamente, a vários aspectos da vida. Numa perspectiva mais ocupacional tem sido relacionada, por ex., com a avaliação profiss iona l e da carre i ra , l iderança ,

desempenho, satisfação, estratégias de coping para lidar com a insegurança e a tensão profissional, resolução de conflitos, desempenho em entrevistas de trabalho, l iderança, colaboração e cooperação, saúde no trabalho,

desempenho académico e profissional, burnout, etc. (Bar-On, 2006; Cherniss, 2004; Cherniss & Goleman, 2001; Latimer et al., 2008; Maltby et al., 2010; Mayer et al. 2008; Mayer, et al., 2011; Meyer & Fletcher, 2007; Meyer & Zizzi, 2007).O desporto de elite pode ser equiparado a uma ocupação profissional (Latimer, et al., 2008; Meyer & Fletcher, 2007; Perlini & Halverson, 2006) e muitos destes aspectos contribuem para o desempenho e a satisfação no mundo do desporto (Meyer & Fletcher, 2007) estando bastante relacionados com o contexto da PD em geral. Também as relações encontradas entre IE e liderança podem apresentar uma potencial relevância para os treinadores (Meyer & Zizzi, 2007).Numa perspectiva mais relacionada com a saúde e o bem-estar biopsicossocial, a análise dos estudos existentes também indica a associação

positiva da IE, por ex., com o stress, o humor, a auto-estima, a satisfação com a vida, o uso de substâncias, os estados depressivos, o auto-conceito, a saúde física e psicológica, o bem-estar, o ajuste psicológico, a adaptação e a interacção social (Bar-On, 2006; Cherniss, 2004; Cherniss & Goleman, 2001; Latimer et al., 2008; Maltby et al., 2010; Mayer et al., 2008; Mayer, et al., 2011; Meyer & Fletcher, 2007; Meyer e Zizzi, 2007; Nunez et al., 2011).Trinidad, Ungerb, Choub e Johnson (2004) apresentam resultados que indicam que níveis elevados de IE agem como factor protectivo dos riscos de fumar e de abuso de álcool em adolescentes. Schutte, Malouff, Thorsteinsson, Bhullar e Rooke (2007), numa meta-análise de 44 estudos e 7898 participantes, destacam que maiores níveis de inteligência emocional estão

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associados a maiores níveis de saúde. A IE apresentava uma associação média ponderada de r = .29 com a saúde mental, r = .31 com a saúde psicossomática e r = .22 com a saúde física. A análise dos estudos tem mostrado que IE pode ter uma influência positiva na minimização do uso de substâncias (tabaco, álcool, drogas, narcóticos, esteróides) que são utilizadas pelos atletas (Meyer & Fletcher, 2007; Meyer & Zizzi, 2007). Os autores referem, ainda, que, actualmente, não há estudos suficientes que abordem a relação entre a inteligência emocional e a saúde física ou a saúde psicossomática para permitir um exame aprofundado do papel moderador da IE e do tipo de conceituação e mensuração da inteligência emocional. Pesquisas futuras examinando a relação entre inteligência emocional e saúde física e psicossomática, usando uma ampla gama de conceituações e medições da inteligência emocional, podem resolver esta falta.Para além de sabermos que estes resultados podem ser importantes no contexto do desporto, em que atletas, treinadores e outros profissionais estão expostos a imensos factores de stress psicossocial, sabemos, também, que estão

associados à performance atlética (Meyer & Fletcher, 2007) e que muitos objectivos associados às práticas físico-desportivas estão relacionados com os seus potenciais benefícios biopsicossociais. O paralelismo entre o contexto empresarial/organizacional, o mundo do desporto e o conhecimento da importância da saúde física e

mental na performance atlética, reforça a necess idade de examinar a potenc ia l importância da IE no Desporto (Meyer & Zizzi, 2007).

Resu l tados das invest igações ent re Inteligência Emocional e Prática Desportiva Sendo um dos primeiros estudos sobre IE no contexto desportivo, a investigação de Zizzi et al. (2003) tem vindo a ser referenciada em g r a n d e p a r t e d a s i n v e s t i g a ç õ e s q u e posteriormente se debruçaram sobre a temática. Num estudo que explorava a relação entre IE e performance, os autores identificaram que as c o m p o n e n t e s d a I E p a r e c e m e s t a r moderadamente associadas ao desempenho no

pitching mas não no desempenho do hitting, sugerindo que os maiores níveis de IE no

pitching poderiam ser justificados pelo facto de se ter mais tempo para pensar nas emoções e de as regular.Também Crombie, Lombard e Noakes (2009) verificaram que a IE estava positivamente associada ao desempenho desportivo das equipas

de Cricket, mostrando ser um indicador significativo de desempenho desportivo. Petrides et al. (2006) verificaram que as pontuações de IE corre lac ionavam-se positivamente com as avaliações técnicas. Encontraram, ainda, níveis de convergência, de moderados a altos, entre a autoavaliação da IE e a avaliação feita por outros. Lane (2007) faz referência a dois estudos que exploraram a noção de que a relação entre humor e performance é mediada pela IE: o de Lane, Soos, Leibinger, Karsai e Hamar (2005) e o de Lane, Thelwell, Weston e Devonport (2005). No primeiro, foi investigada a relação entre estados de humor, IE e performance desportiva. Os resultados indicaram que a IE está associada ao vigor e à performance. No segundo, foi investigada a relação entre IE e os

estados de humor associados a uma performance eficaz no desporto, tendo-se verificado a sua associação positiva. L a n e , T h e l w e l l e D e v o n p o r t ( 2 0 0 9 ) investigaram a relação entre IE e a memória de estados de humor associados a um desempenho óptimo e disfuncional em situações desportivas de competição e situações académicas, verificando que a IE esteve associada a estados óptimos de humor para ambas as situações. Numa linha muito similar, Lane, Devonport, Soos, Karsai, Leinbinger e Hamar (2010) estudaram a relação entre a IE e a memória de emoções pré-competitivas no desempenho óptimo e disfuncional. A IE correlacionou-se com a avaliação retrospectiva de emoções em ambos os tipos de desempenho. A direcção dessa relação mostra que a IE se correlaciona com emoções agradáveis. Lane, Devonport e Stevens (2010) e Lane e Wilson (2011) verificaram, em corridas de longa d u r a ç ã o , q u e a I E s e c o r r e l a c i o n a significativamente mais com emoções agradáveis e menos com emoções desagradáveis, antes e depois da corrida e que os corredores com alta

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IE relataram mais emoções agradáveis e menos emoções desagradáveis do que os corredores com baixa EI. Solanki e Lane (2010) concluíram que a prática de exercício físico para regular o humor se relacionava significativamente com a IE, o que sugeriu que indivíduos que recorrem ao exercício para melhorar o humor apresentam maiores níveis de IE relatada. Perlini e Halverson (2006) verificaram que a IE intrapessoal e o humor geral adicionaram variância significativa nas estimativas dos resultados desportivos e de jogos realizados.  Os jogadores tiveram pontuações de IE superiores nas escalas intrapessoal, gestão de stress e humor geral em comparação ao padrão populacional. Costarelli e Satmou (2009) verificaram que

atletas praticantes de Judo e Taekwondo tiveram maior IE comparando com o grupo de controlo.Li et al. (2009) verificaram que a IE era significativamente superior num grupo de PD regular e no grupo de PD insuficiente, em comparação ao grupo inactivo. Queirós et al. (2004) mencionam que os seus resultados indicam que a participação dos idosos num programa de exercício físico regular está positivamente associada e de forma significativa aos indicadores que definem a IE percebida. Meyer e Zizzi (2007) fazem referência ao estudo de Meyer, Kilty, Parker, Fletcher, Cole e Davis (2005) em que o total de IE pontuada pe los t re inadores não se d i ferenc iou significativamente dos valores padrões estandardizados da população em geral. Em relação à IE de treinadores de vários desportos não foram encontradas diferenças significativas, assim como entre treinadores e treinadores adjuntos/assistentes. Afkhami, Mokhtari, Tojjari, Bashiri e Salehian (2011) e Thelwell et al. (2008) investigaram a relação entre IE e a eficácia de treino, verificando associações positivas entre estas duas variáveis. Meyer e Fletcher (2007) referem o estudo de Magyar (2004), que investigou a relação entre IE e liderança eficaz entre líderes de dois campos desportivos de verão. Os resultados indicaram que a IE era um predictor

significativo de preocupação pessoal (personal caring). Numa estudo similar, desenvolvido no

mesmo contexto, Magyar, Guivernau, Gano-Overway, Newton, Kim, Watson e Fry (2007), verificaram que existia correlação positiva entre

todos os factores da IE e o personal caring e de alguns factores da IE com a liderança eficaz.

No contexto do Fitness, Eckmann (2004) refere um estudo em que os vencedores do prémio

IDEA (Health and Fitness Association) pontuaram significativamente mais em vários factores da IE comparando com os membros que ainda não tinham recebido prémios IDEA, o que sustenta a ideia de que altos níveis de competência emocional podem beneficiar os

profissionais da indústria de Fitness e por outro lado, que os clientes podem beneficiar da interacção com estes líderes. Ilyasi, Sedagati e Salehian (2011) verificaram que a IE apresentou uma correlação positiva com a orientação para a competitividade e para objectivos mas não com a orientação para vitória. Os resultados do seu estudo indicaram que entre equipas e atletas individuais não existiam diferenças significativas tanto em relação à orientação desportiva como em relação à IE. Kajbafnezhad, Ahadi, Heidarie, Askari e Enayati (2011) referem que, ao nível da IE, não existiam diferenças significativas entre atletas de práticas desportivas colectivas ou individuais. No entanto, Bal, Singh, Sood e Kumar (2011) analisaram 20 jogadores de Futebol e 20 Ginastas e encontraram diferenças significativas ao nível de alguns factores da IE. Frank et al. (2010) e Lu et al. (2010) verificaram que atletas com menor IE demonstraram níveis de ansiedade pré-competitiva cognitiva mais elevados em comparação com os atletas com elevada IE. Laborde et al. (2011) destacam, por seu lado, que atletas com elevada IE experienciavam menos stress comparando com os atletas com baixa IE.No estudo de Saklofske et al. (2007), a IE total não se correlacionou com as atitudes face ao exercício mas verificaram pequenas correlações entre alguns factores da IE e os benefícios do exercício.Nunez et al. (2011), no sentido de testarem um modelo teórico que pudesse explicar o bem-estar psicológico no contexto desportivo, mostraram que a IE mediava a relação entre clima

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motivacional para a tarefa; a orientação para tarefa influenciava a motivação intrínseca, que, por sua vez, influenciava o bem-estar psicológico. Além disso, a IE percebida influenc iou d i rec tamente o bem-es tar psicológico. Ahmed e Ahmed (2011) analisaram as relações entre IE e género. Os jogadores masculinos indicaram maior habi l idade de gestão intrapessoal e interpessoal e maior IE geral. Kajbafnezhad (2011) estudou, no domínio da PD, a relação entre competências psicológicas e IE. Os resultados mostraram que existia relação significativa e positiva entre estas variáveis. Lane, Andrew, Thelwell, Lowther e Devonport (2009) investigaram também a relação entre EI e competências psicológicas. Os resultados sugeriram que as competências psicológicas usadas, tanto em competição como nos treinos, relacionam-se com as percepções de IE. Mais especificamente, diálogo interno, visualização mental e activação, estavam associadas à habilidade de avaliar as emoções dos outros e de regular emoções. A direcção dessa relação mostrou que indivíduos que relataram o uso frequente de competências psicológicas também relatam uma forte percepção de IE. Latimer et al. (2008) referiram ser necessário realizarem-se vastas pesquisas antes que a IE e as suas componentes possam ser plenamente entendidas no contexto do Desporto e Exercício. Apesar do s re su l t ados da s pe squ i sa s apresentadas acima mostrarem que a IE pode assumir um papel importante no contexto da PD, muitas dessas linhas de investigação precisam de ser consolidadas e ainda há muito trabalho a desenvolver-se neste domínio de estudo. Considerando, ainda, que este campo teórico alcançou alguma consistência, é importante considerar a transição para o domínio da intervenção prática. Neste sentido destacamos diversos domínios e contextos de intervenção, que podem operar de forma independente ou interligada na área da PD. Reconheça-se que a IE pode ser desenvolvida de forma a produzir um efeito no rendimento desportivo (i.e., associada a factores como desempenho, performance, rendimento, satisfação, comprometimento, recuperação de lesões, etc.) assim como ser um mecanismo para desenvolver a IE da pessoa e/ou do grupo

promovendo o desenvolvimento de habilidades emocionais como competências de vida. Os principais domínios operantes são: Desempenho e Performance, i.e., desenvolver a IE de forma a optimizar o rendimento e a eficácia; Comprometimento e Satisfação de praticantes, i.e., aplicar e desenvolver a IE de forma a criar relações e envolvimentos favoráveis à prática e Domínio Formativo e de Desenvolvimento, i.e., a PD pode servir de contexto para a tomada de consciência da importância, utilidade e aplicabilidade das habilidades emocionais, constituindo uma ferramenta para desenvolver a IE como competências de vida. Por ex., Lane (2007) salienta que ensinar os alunos a transferirem as suas competências de controlo emocional para diferentes domínios é, claramente, uma característica desejável no processo de educação desportiva. Estes domínios aplicam-se, naturalmente, com as necessárias adaptações, aos principais contextos de intervenção (modalidades desportivas, exercício físico, reabilitação, saúde e bem-estar; contexto educacional, formação psicossocial e vertentes organizacionais das instituições desportivas) e aos seus diversos agentes.

Conclusões e recomendaçõesApesar da conceptualização e da avaliação da IE estarem envolvidas em ampla controvérsia teórica e metodológica, que contagia, naturalmente, a investigação da IE na PD, é importante destacar que esta nova tendência de pesquisa na área da Psicologia do Desporto e do Exercício tem-se mostrado bastante reveladora e assume uma posição bastante importante para a intervenção prática. Numa s íntese abrangente dos estudos consultados verificou-se que a IE esteve associada a uma melhor performance e desempenho e à boa gestão de estados emocionais que influenciam a performance. Indivíduos que recorrem ao exercício para melhorar o humor indicaram maiores níveis de IE e a prática desportiva foi relacionada, regularmente, com competências de IE mais desenvolvidos em comparação ao padrão geral populacional e em relação a não praticantes. A IE está, ainda, associada ao bem-estar psicológico no contexto do desporto e ao uso de

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competências psicológicas, tanto em contexto de competição como de treino e noutras esferas da vida. Evidentemente, estas linhas de estudo não são conclusivas. Nomeadamente, se a avaliação da IE é fundamental na pesquisa e nas práticas profissionais, estudos sobre o valor psicométrico dessas escalas são, ainda, amplamente, necessários. Neste sentido, sugere-se que as novas linhas de investigação aprofundem as relações entre prática desportiva e IE e a sua avaliação. As relações entre IE, Resiliência e Robustez Mental devem, também, ser melhor exploradas na área das actividades físicas e desportivas. Por outro lado, uma percepção mais clara da causalidade e da direccionalidade destas relações pode assumir um papel importante na intervenção da Psicologia do Desporto e do Exercício. Igualmente importante será compreender-se, de forma mais precisa, como é que a IE pode afectar a performance e o desempenho na PD, tendo em consideração os vários agentes envolvidos neste contexto e delinearem-se métodos que permitam desenvolver as competências de IE no domínio na PD.

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> ARTIGO DE OPINIÃO

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Tratamento da Luxação Acrómio-Clavicular de Grau III –

controvérsias

Nuno Moura 1, António Cartucho 1 , Marco Sarmento 1

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Introdução

A patologia traumática aguda da articulação acrómio-clavicular representa aproximadamente 9% de toda a patologia traumática do ombro, tendo-se constatado um aumento, pelo menos em termos percentuais, desta patologia nos últimos tempos, em parte associada à prática de algumas actividades recreativas, como a bicicleta ou os chamados “desportos radiais”.O mecanismo de lesão mais frequente é a queda sobre o ombro em adução, no qual a omoplata e ombro sofrem um deslocamento distal enquanto que a extremidade externa da clavícula permanece imóvel, pela acção dos poderosos ligamentos esterno-claviculares. As diferentes estruturas estabilizadoras da acrómio-clavicular vão cedendo conforme a magnitude das forças deformantes sendo inicialmente lesados apenas os ligamentos acrómio-claviculares, depois os coraco-claviculares e nas lesões mais graves igualmente a fascia trapézio-deltoideia.O grau de lesão destas estruturas está relativamente representado na classificação mais utilizada para estas lesões, descrita inicialmente por Tossy e depois expandida por Rockwood (Rockwood, Williams & Young, 1998), na qual o grau I e II, por manterem uma integridade dos ligamentos coraco-claviculares, são geralmente passíveis de tratamento conservador.O grau III, no qual ocorre uma lesão completa dos ligamentos acrómio-claviculares e coraco-claviculares sem disrupção da fascia trapézio-deltoideia, representa uma fronteira para as lesões mais graves e geralmente de tratamento cirúrgico (tipos IV, V e VI) e tem sido, desde há vários anos, alvo de controvérsia não só entre o tratamento conservador ou cirúrgico mas igualmente pela técnica cirúrgica mais indicada para a sua resolução.

Classificar a LesãoA existência de uma lesão da articulação acrómio-clavicular de grau III implica, como já foi referido, a existência de rotura completa dos ligamentos e cápsula acrómio-clavicular bem como dos ligamentos coraco-claviculares. Este diagnóstico é dado pela conjunção da clínica, com a presença de dor aguda na face superior do ombro após um episódio traumático, que agrava com a mobilização, com presença associada de uma deformidade (redutível nas primeiras semanas, apesar da dor) ao nível desta articulação, juntamente com achados imagiológicos característicos, visualizados num estudo radiográfico simples, com incidência em AP (ou incidência

Nuno Moura, António Cartucho, Marco SarmentoOrtopedistas, especialistas da Unidade de Patologia do Ombro e Cotovelo do Hospital CUF-Descobertas1

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de Zanca para melhor definição da acrómio-clavicular), que irá permitir avaliar a estabilidade vertical da acrómio-clavicular e uma incidência axilar, que irá permitir avaliar a estabilidade horizontal desta articulação. Neste grau de lesão ocorre principalmente uma instabilidade vertical da articulação acrómio-clavicular, que pode ser verificada na presença de um intervalo coraco-clavicular 25 a 100% superior ao contra-lateral (Bearden, Hughston & Whatley, 1973) (a realização de uma incidência em AP de ambas as articulações acrómio-claviculares pode ajudar na percepção da magnitude de translação superior).

Diferentes cirurgias para a mesma patologiaÉ habitual ver referido em artigos de revisão nesta área que existirão descrições de mais de 75 técnicas cirúrgicas para resolver este problema (Johansen, Grutter, McFarland & Petersen, 2011; Simovitch, Sanders, Ozbaydar, Lavery, & Warner, 2009; Weinstein, McCann, McIlveen, Flatow & Bigliani, 1995) mas estas técnicas podem ser agrupadas consoante o modo de estabilização utilizado, tentando reduzir a articulação acrómio-clavicular ou assumindo a necessidade de substituir os ligamentos coraco-claviculares por outra estrutura.As técnicas que assentam na capacidade intrínseca de cicatrização dos ligamentos coraco-claviculares após a lesão têm como objectivo permitir uma redução da articulação acrómio-clavicular, com normalização da distância coraco-clavicular, que se deverá manter por um período não inferior 12 semanas para permitir uma cicatrização adequada dos ligamentos coraco-claviculares e eventualmente mesmo os acrómio-claviculares. A redução da articulação pode ser mantida com simples fios de Kirschner, cerclagens acrómio-claviculares ou coraco-claviculares, parafusos coraco-claviculares, placas ou mais recentemente com um sistema de botões metálicos unidos por fios ou fitas não reabsorvíveis, que podem ser aplicados por via artroscópica.Outras técnicas utilizam algum tipo de substituto para os l igamentos coraco-c laviculares (podem ser cons ideradas ligamentoplastias) por não confiarem na capacidade de cicatrização dos mesmos ou por serem utilizadas numa fase mais tardia (após as

3 semanas pós-lesão) em que a capacidade intrínseca de cicatrização já poderá estar comprometida. Nestes casos poderá ser utilizado um enxerto biológico (autólogo ou não) ou uma transposição ligamentar, podendo algumas destas técnicas ser realizadas por via artroscópica. Finalmente poderá ser realizado de forma complementar à cirurgia um desbridamento da articulação acrómio-clavicular com ou sem ressecção distal da clavícula, tentando desta forma eliminar uma fonte potencial de dor como sejam as alterações degenerativas que podem surgir precocemente nesta articulação.Como facilmente se depreende a combinação destes gestos cirúrgicos, métodos de fixação e materiais utilizados origina uma grande diversidade de intervenções cirúrgicas possíveis, dificultando deste modo o surgimento de trabalhos científicos que comparem o tratamento não cirúrgico ao tratamento cirúrgico e os diferentes tratamentos cirúrgicos entre si.

Tendências actuaisFoi certamente apoiada no desenvolvimento de técnicas de reconstrução ligamentar e na diminuição das complicações anestésicas/infecciosas dos procedimentos cirúrgicos em geral que no final dos anos 70 se assistiu a uma tendência para o tratamento cirúrgico desta patologia, contrariando a indicação para tratamento conservador preconizada para esta lesão (e até para lesões mais graves) que reinava até esta altura. Esta tendência foi posteriormente contrariada por um ressurgimento das indicações para o tratamento conservador, apoiadas pela medicina apoiada na evidência, dos anos 90, que em alguns casos se mantém actual na presente data (Bannister, Wallace, Stableforth & Hutson, 1989; Phillips, Smart & Groom, 1998; Taft, Wilson & Oglesby, 1987).Quando o objectivo é apenas a recuperação funcional parece ser ainda adequado considerar inicialmente o tratamento conservador após uma lesão de grau III da acrómio-clavicular, principalmente em relação a indivíduos menos activos (McFarland, Blivin, Doehring, Curl & Silberstein, 1997; Nissen & Chatterjee, 2007). No entanto, o surgimento de estudos

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Figura 1 - Imagem artroscópica do sistema de duplo botão colocado por baixo da apófise coracóide

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biomecânicos mais aprofundados e algumas técnicas de reconstrução menos invasivas poderá levar a um ressurgimento da tendência para o tratamento cirúrgico, nomeadamente em indivíduos jovens e activos (Fukuda, Craig, An, Cofield & Chao, 1986; Mazzocca, Arciero & Bicos 2007; Salzmann, Walz, Schoettle & Imhoff, 2008). Outra das questões que se poderá colocar nesta patologia é o componente de deformidade cosmética que esta lesão acarreta, facto geralmente negligenciado nas escalas de avaliação funcional utilizadas nos diversos trabalhos científicos mas que pode ser extremamente importante para alguns indiv íduos . O surgimento de técnicas artroscópicas para o tratamento desta patologia poderá ser a resposta óbvia, por respeitarem este componente cosmético embora sejam tecnicamente exigentes, nomeadamente nos doentes operados numa fase mais tardia (após as 3 semanas de lesão) em que parece existir necessidade de adicionar algum tipo de plastia biológica à estabilização, estando as técnicas artroscópicas que apenas aplicam uma estrutura inerte a reduzir a articulação acrómio-clavicular (sistema de fixação com 2 botões ósseos unidos por fios de sutura ou fitas não reabsorvíveis de alta resistência) actualmente recomendadas apenas para o tratamento numa fase precoce após a lesão (Cohen, Boyer, Pujol, Hamida Ferjani, Massin & Hardy, 2011; Salzmann, Walz, Schoettle & Imhoff, 2008).

Estes achados estão em conformidade com o facto destas técnicas artroscópicas permitirem habitualmente apenas uma restituição da distância coraco-acromial normal, permitindo um contacto dos topos dos ligamentos coraco-claviculares lesados que irão cicatrizar. Quando realizadas numa fase mais tardia (após as 2/3 semanas) é natural que a resposta cicatricial subsequente à lesão esteja já muito reduzida e possa, deste modo, não levar a uma cicatrização adequada destes ligamentos.Existem ainda outra vantagem teórica para a utilização de técnicas artroscópicas, que será a probabilidade de tratar concomitantemente outras lesões intra-articulares (existentes em até 15% dos casos) (Pauly, Gerhardt, Haas & Scheibel, 2009) que poderiam posteriormente necessitar de outro tratamento.

Critérios de decisãoQual será então, hoje em dia, a nossa abordagem perante uma luxação acrómio-clavicular de grau III?P o d e r - s e - á m a n t e r u m a a b o r d a g e m maioritariamente conservadora, relegando as indicações para tratamento cirúrgico apenas para os casos com evolução menos favorável (dor crónica ou instabilidade residual major)?Assim como noutros campos da Ortopedia a informação ao doente deverá igualmente ser privilegiada, informando-o da evolução natural da doença, tanto quanto possível, e das

Figura 1 - Exame radiológico de uma lesão acrómio-clavicular de grau III

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possibilidades, conservadoras ou cirúrgicas, de alterar esta mesma evolução.É fundamenta l exp l icar a or igem da deformidade característica desta patologia bem como explicar que esta será permanente, podendo apenas diminuir ligeiramente as suas dimensões após a resolução do edema pós-traumático. É ainda importante explicar que, com a opção pelo tratamento conservador, a i n s t ab i l i dade da a r t i c u l a ção d im inu i habitualmente de uma forma gradual até às 6-8 semanas, pelo que deverá ser restringida a realização de qualquer esforço que promova mobilidade exagerada nesta articulação durante esta fase, para não aumentar o risco de promover uma instabilidade residual (Johansen, Grutter, McFarland & Petersen, 2011). Deverá ainda ser referido que, à luz dos poucos estudos até agora realizados, nomeadamente 2 metanálises (Phillips, Smart & Groom, 1998; Smith, Chester, Pearse & Hing, 2011), não parece existir diferença significativa em relação à força, dor, capacidade de arremesso ou evolução para artrose entre o tratamento cirúrgico e o conservador.No entanto é necessário realizar uma análise cuidadosa destes dados, para perceber porque não existe ainda um consenso estabelecido nesta área. Na últ ima metanál ise real izada comparando tratamento conservador com cirúrgico (Smith, Chester, Pearse & Hing, 2011) foram incluídos apenas 6 trabalhos, todos

retrospectivos, com um total de apenas 380 doentes. Apenas foi observada uma diferença significativa em relação ao melhor resultado cosmético do tratamento cirúrgico e menor tempo de incapacidade laboral para o tratamento conservador, não tendo sido observadas alterações significativas nos restantes itens estudados. Foram utilizadas, nestes 6 trabalhos, técnicas cirúrgicas diferentes em todos (!) e 2 deles têm mais 20 anos, sendo portanto difícil (senão mesmo impossível) comparar o sucesso relativo de uma determinada técnica cirúrgica, nomeadamente das mais recentes.Outros estudos com follow-up prolongado registam uma percentagem de resultados satisfatórios com o tratamento conservador superiores a 80% (Dias, Steingold, Richardson, Tesfayohannes & Gregg, 1987, Schlegel, Burks, Marcus & Dunn, 2001, Wojtys & Nelson, 1991) mas a avaliação objectiva pode revelar alterações em relação ao membro contra-lateral de até 17% de perda de força de supino (Schlegel, Burks, Marcus & Dunn, 2001), que poderá ter algum significado nos jovens atletas.

A nossa abordagemTodas estas considerações levam-nos a colocar indicação cirúrgica precoce nos casos de luxação acrómio-clavicular de grau III de doentes que não aceitem a deformidade cosmética resultante ou pretendam garantir uma função da cintura

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Revista Portuguesa de Fisioterapia no Desporto | Volume 6 Número 1

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escapular o mais aproximada possível com a existente antes da lesão, desde que aceitem um período de incapacidade laboral que poderá ser mais prolongado, os riscos inerentes a uma intervenção cirúrgica e a possibilidade de falência do sistema de fixação utilizado. Caso o tratamento possa ser realizado antes das 2 semanas, o nosso tratamento de eleição é um sistema de fixação com 2 botões ósseos unidos por fios de sutura ou fitas não reabsorvíveis de alta resistência, colocado por via artroscópica.Nos restantes casos a nossa abordagem é inicialmente conservadora, respeitando o período de estabilização natural desta lesão que poderá atingir as 8-12 semanas, ficando reservado o tratamento cirúrgico para os casos de evolução não satisfatória, sendo nestas situações privilegiada a realização de uma ligamentoplastia com enxerto autólogo ou transposição ligamentar (por via aberta ou artroscópica) da articulação acrómio-clavicular.

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