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GeoTextos, vol. 4, n. 1 e 2, 2008. E. Jesus 165-187 .165
Emanuel Fernando Reis de JesusProfessor Associado do Departamento e Mestrado de Geografia da UFBAProfessor Pleno do Departamento de Cincias Humanas e Filosofia da [email protected]
Algumas reflexes terico-conceituais na climatologiageogrfica em mesoescala: umaproposta de investigao
Resumo
O sistema climtico formado por um conjunto de elementos altamente dinmi-cos que interagem com os fatores geogrficos do clima, existindo assim umapermanente troca de energia e interdependncia. Para efeito de estudo, asanlises climatolgicas so organizadas obedecendo a uma ordem de grandezaescalar em que, no plano da abordagem geogrfica, em particular, prioriza aquesto espacial dos diversos ambientes climticos. O enfoque na mesoescaladeve expressar o nvel de correlao existente entre os aspectos dinmicos econtroladores do clima assim como as tcnicas de investigao mais apropriadaspara esse nvel escalar. Este trabalho tem por objetivo principal tecer algumasconsideraes sobre estas questes, que ainda so relativamente pouco discuti-das quando comparadas com outras linhas de estudo da Climatologia. Ao final, apresentada uma proposta escalar para o estudo dos mesoclimas, aplicada aoEstado da Bahia.
Palavras-chave: Clima, Climatologia Geogrfica, Escalas, Mesoescala,Mesoclimas.
Abstract
SOME THEORETIC CONCEPTUAL CONSIDERATIONS ABOUT GEOGRAPHICALCLIMATOLOGY IN MESOSCALE
The climatic system is formed by a whole of highly dynamical elements whichInteract with climate geographical factors, there being a permanent exchange ofenergy and interdependence. For study purpose, climatic analyses are organizedaccording to a scale ranking, which on the geographic approach level particularlyprioritizes the spatial point of several climatic environments. The focus on
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mesoscale intends to express the correlation level existent between dynamicaland controlling aspects of climate, as well more suited techniques of inquiry forthis scale level. This paper main purpose is setting forth some considerationsabout these points which still are relatively less discussed as compared to otherClimatology study lines. At the end, a scale proposal for mesoclimates study issubmitted and applied to the State of Bahia.
Key-words: Climate, Geographic Climatology, Scale, Mesoscale, Mesoclimates.
1. Consideraes preliminares
A Climatologia surgiu como um campo especfico do conhecimento
cientfico e com identidade prpria somente aps a sistematizao da
Meteorologia, no final do sculo XIX, na Alemanha. Na realidade, a
Climatologia uma extenso da Meteorologia, ou seja, estuda as condi-
es meteorolgicas a longo prazo. Apesar de utilizar mtodos comuns
Meteorologia, seus objetivos e propsitos so eminentemente geogrfi-
cos. Os estudos do clima no campo da Geografia esto direcionados para a
espacializao dos elementos e fenmenos atmosfricos, buscando expli-
car sua dinmica processual. A Meteorologia uma cincia exata, que
trata da dimenso fsica da atmosfera, produtora da gama de conhecimen-
tos que explicam a extrema dinamicidade do ar atmosfrico, tendo como
produto de aplicao direta a previso do tempo.
A Geografia, visando integrar as diferentes esferas terrestres para
uma compreenso da produo e da organizao do espao, tem, no estu-
do do clima, um vetor de grande relevncia no espectro de suas anlises
espaciais. O estudo do clima sob o prisma geogrfico possui uma conotao
preferencialmente antropocntrica, da a sua singularidade, procurando
estabelecer a relao sociedade-natureza.
As narrativas a respeito do clima sempre estiveram presentes ao lon-
go do discurso geogrfico desde os primrdios e em diferentes momentos
de sua histria. na antiguidade, que encontramos os primeiros registros
da influncia do meio natural sobre o homem. O clima, em especial, seria
o responsvel por vrios aspectos do comportamento e dos hbitos de muitos
povos, que estariam condicionados, tambm, localizao dos lugares.
Atribui-se a Hipcrates, o mrito de ter publicado uma das obras mais
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antigas relacionando as influncias do clima sobre os seres vivos. A obra
intitulada Ares, guas e lugares (400 a.C.) dedicou os seus primeiros
captulos s influncias da localizao de uma cidade em relao aos ven-
tos predominantes em cada estao do ano. Hipcrates tambm relacio-
nou as influncias climticas numa escala mais geral, comparando as
caractersticas fsicas e de carter dos habitantes de algumas reas do
velho mundo, alm das caractersticas da fauna e da flora. O trabalho
pioneiro de Hipcrates tambm procurava relacionar os efeitos teraputicos
do clima para o homem.
A teoria da influncia do meio natural e, por extenso, do clima so-
bre os povos pode ser considerada como um dos mais antigos paradigmas
da Geografia, independentemente do fato dela ter sido utilizada para justi-
ficar a superioridade de um povo sobre outro. O determinismo climtico j
ficava bem expresso desde a obra de Hipcrates, no momento em que,
para ele, um clima marcado por grandes variaes entre o ciclo das esta-
es do ano induzia aos exerccios vigorosos tanto do corpo quanto da
mente. J os povos que viviam em climas que no apresentavam grandes
contrastes estacionais, se tornavam, de certa forma, gordos e corpulentos,
j que no se exercitavam o necessrio. O homem estaria, portanto, sem-
pre relacionado ao meio natural, ou seja, a natureza era considerada como
um suporte da vida humana. Assim, todos os elementos produtores do
ambiente seriam responsveis diretos pelas condies de adaptao ou
no do homem ao seu meio natural.
Frederick Ratzel (1844-1904) definiu o objeto da Geografia como o
estudo das influncias das condies naturais sobre a humanidade. Ratzel
comparou a sociedade a um organismo que mantm grandes relaes
com os componentes do meio fsico, para atender as suas necessidades de
sobrevivncia.
Posterior fase determinista, que perdurou durante muitos anos desde
o final do sculo XIX, atravessando o sculo subseqente e se estendendo
ainda por muitos anos, nota-se que gradativamente houve um significati-
vo avano nas diversas reas do conhecimento humano com novas ten-
dncias opostas ao determinismo geogrfico. A chegada da revoluo
tecnolgica trazia novas maneiras de ver e compreender o mundo; o cha-
mado determinismo geogrfico cedia lugar, aos poucos, a um determinismo
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econmico, em que a natureza no mais ocuparia como antes uma posi-
o de vanguarda, mas sim, passaria condio de submissa s interven-
es antrpicas a partir do conhecimento tecnolgico disponvel.
No campo do estudo do clima, os trabalhos que vinham sendo elabo-
rados desde o final do sculo XIX, baseados apenas em parmetros envol-
vendo combinaes mdias de atributos trmicos e pluviais analisados
separadamente, j no eram mais aceitos por muitos estudiosos, receben-
do, assim, inmeras crticas daqueles que concebiam o clima como algo
mais dinmico e interativo.
O surgimento de uma Climatologia Dinmica esteve intimamente
associado s grandes contribuies produzidas pela Escola Norueguesa de
Meteorologia, onde grandes trabalhos foram produzidos por Bjerkenes (1921
e 1934), Bergeron (1930) e Rossby (1938 e 1947) sobre a dinmica da
circulao atmosfrica e das massas de ar, baseados nos princpios da
termodinmica. Aqueles estudiosos escandinavos desenvolveram impor-
tantes trabalhos fornecendo as bases conceituais e metodolgicas para os
fundamentos da Climatologia Dinmica, tanto no plano macro quanto na
mesoescala. Max Sorre (1880-1962), apesar de ser, antes de tudo, um
gegrafo humano, no seu clssico tratado intitulado Les Fondements de la
Geograhie Humaine, Tome Premier Les Fondements Biologiques, criou,
na realidade, um verdadeiro paradigma para o estudo geogrfico do clima,
partindo tambm da critica aos valores mdios e da anlise separativa dos
elementos do clima. Para Sorre (1951, p.13 e14), o clima representa o
ambiente atmosfrico constitudo pela srie de estados atmosfricos sobre
um lugar, em sua sucesso habitual.
Os elementos dessa concepo, seu carter de conjunto, de sntese e
de dinamismo (variabilidade e ritmo) passaram a nortear profundamente
a produo climatolgica, sob o prisma geogrfico, a partir da segunda
metade do sculo XX, recebendo, assim, um grande nmero de adeptos.
Segundo Sorre, a unidade de anlise dos fenmenos climticos o tem-
po, que se traduz por uma combinao de propriedades e elementos at-
mosfricos que, a cada momento e em cada lugar, se apresenta como um
fato singular e com possibilidades pouco provveis de se reproduzir em
outro lugar de forma semelhante. O ritmo sazonal constitui estados at-
mosfricos comparveis periodicamente, os quais podem ser agrupados
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numa mesma estao do ano, em um nmero limitado de tipos cuja su-
cesso regulada pelas leis da dinmica atmosfrica.
Pdelaborde (1957) exerceu tambm uma grande influncia no cam-
po da Climatologia Dinmica em mesoescala, com sua tese de doutorado
Le Climat du Bassin Parisien, onde exps as bases fundamentais do
mtodo geogrfico para o estudo do clima. A partir de uma investigao
minuciosa sobre os diversos tipos de tempo associados aos mecanismos
da circulao atmosfrica atuantes, onde foram focalizados tambm os
seus efeitos combinados aos fatores geogrficos regionais, o autor definiu
o clima da bacia parisiense pela freqncia e variabilidade dos tipos de
tempo e das massas de ar, suas distribuies anuais e sazonais. Foi a
partir desse estudo que Pdelaborde props um mosaico de tipos de tempo
para todas as situaes possveis e, da, uma distribuio das diversidades
climticas regionais.
O enfoque dinmico desenvolvido a partir de teorias da circulao
atmosfrica e da perspectiva Sorreana possibilitava uma explicao da
gnese dos estados do tempo em sua sucesso habitual.
Oliver e Fairbridge (1987) propuseram uma classificao gentica do
clima baseada na freqncia relativa das massas de ar, agrupadas em trs
grandes categorias (climas dominados por uma nica massa de ar, climas
dominados por fluxos sazonais e climas dominados por fluxos zonais e
extrazonais). A freqncia das massas de ar era estimada atravs da
plotagem dos dados climticos em diagramas termopluviomtricos, com-
putando o nmero de meses em que incidem na faixa caracterstica de
cada massa de ar. No Brasil, particularmente, destaca-se a valiosa contri-
buio realizada por Monteiro (1962, 1964, 1971, 1976, 1991 e 1999). Este
gegrafo representa um dos precursores mais importantes da Climatologia
Geogrfica do pas, pois ele teve a preocupao de instrumentalizar o
paradigma Sorreano, incorporando, na anlise geogrfica do clima, os con-
ceitos de sucesso e ritmo climtico, propondo, assim, um novo mtodo
para o estudo do clima denominado de anlise rtmica.
Para Monteiro, a anlise dinmica extremamente importante para
a definio em mesoescala dos sistemas morfolgicos, para a interpreta-
o da dinmica dos processos erosivos do meio ambiente e de outros
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aspectos, tudo isso direcionado para a explicao da organizao
dos espaos geogrficos.
No passado, o clima era visto como algo determinante, posterior-
mente como elemento passivo de ser controlado pela tecnologia, porm,
impossvel de ser dominado frente s suas intempries.
Hoje, mais do que tudo isso, o clima , acima de tudo, algo de extre-
mo valor, um patrimnio para a humanidade, sendo considerado como
um importante recurso natural. O clima , na realidade, um insumo natu-
ral extremamente vinculado aos processos fsicos e econmicos.
Desta forma, a relao entre o clima e a organizao do espao de-
pende do grau de desenvolvimento econmico e tecnolgico de cada soci-
edade, em particular, e de quais atributos climticos so mais relevantes
em cada regio.
Na qualidade de recurso natural, o clima, quando sabiamente utili-
zado, poder contribuir em muito para o bem-estar econmico e social,
com reflexos significativos na qualidade de vida.
Nos dias atuais, uma srie de acontecimentos catastrficos vm se
registrando em diversas reas do planeta, em grande parte relacionados
aos eventos climticos. Dentre esses acontecimentos, destacam-se aque-
les ligados s crises no fornecimento mundial de alimentos, incidncia
cada vez maior das secas severas, ocorrncia de episdios pluviais in-
tensos e ao problema da desertificao, dentre muitos outros. Essas e ou-
tras questes ambientais vinculadas direta ou indiretamente ao clima de-
monstram a intensa vulnerabilidade da sociedade contempornea em re-
lao aos fenmenos da natureza.
Diante desses novos desafios a serem analisados nos dias de hoje,
na abordagem geogrfica do clima, a utilizao do mtodo sistmico vem
sendo amplamente empregado, uma vez que o mesmo expressa uma vi-
so extremamente interativa, relacionando processos e respostas. O enfoque
sistmico fornece uma nova via de investigao, abrindo novas relaes
para as interpretaes mais complexas a respeito do clima. O estudo das
interaes em macro e mesoescala oceano-atmosfera e demais interaes
processuais entre a atmosfera, a biosfera e os solos so peas fundamen-
tais dentro deste enfoque, na rea da Climatologia, em seus trs nveis
escalares. Dois trabalhos em mesoescala, enfatizando o enfoque sistmico
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no estudo do clima, foram elaborados por Terjung (1976) e Carleton (1999).
Esses dois gegrafos propuseram a anlise de nveis mais sofisticados de
investigao, recomendando que sejam trabalhados os sistemas
morfolgicos at chegar aos sofisticadssimos sistemas fsico-humanos de
processo e resposta.
A percepo atual da complexa relao entre o meio ambiente e a
sociedade passa necessariamente pelo diagnstico de como o clima e seus
elementos interferem, so modificados e ao mesmo tempo so derivados
pela ao do homem.
No problema das escalas do clima, constatamos que enquanto naquela zonalestamos muito ligados fundamentao fsico-meteorolgica que nos capacita aentender os fenmenos bsicos do desempenho atmosfrico, na escala regio-nal estamos bem mais envolvidos com fatores geogrficos causais na definiode interaes que produzem padres de organizao natural a servio da adap-tao ou derivao humana (MONTEIRO, 1999, p.25).
a partir do nvel escalar da mesoescala em direo s escalas infe-
riores do clima, que se percebe as correlaes mais complexas e mais
interativas entre o sistema climtico e a sociedade. As intervenes
antrpicas so capazes de produzir microclimas e alterar substancialmen-
te o clima local, projetando seus efeitos gradativamente no mbito das
escalas intermedirias do clima (climas sub-regionais e mesoclimas).
No mundo cada vez mais globalizado, por outro lado, constata-se a
existncia de uma verdadeira desordem na natureza, impulsionada pelas
aes antrpicas, na maioria das vezes imponderadas, o que vem moti-
vando as grandes tendncias dos estudos climticos associados aos im-
pactos ambientais.
Todas essas questes at aqui suscitadas esto relacionadas ao trata-
mento escalar atribudo ao estudo do clima, do qual depende o xito de
uma pesquisa.
2. As escalas do clima
O ambiente atmosfrico regido por um conjunto integrado de fen-
menos que se encadeiam e se superpem no tempo e no espao. Os fen-
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menos existem sob as mais diversas ordens de grandeza, convivem
concomitantemente em regime de trocas energticas recprocas e
interdependentes, entre tempo e espao, que se integram a nveis escala-
res hierarquizados (tamanho, durao, freqncia e intensidade) dos fe-
nmenos atmosfricos.
Uma das maiores dificuldades nas anlises climatolgicas situar,
concretamente, a realidade em estudo, com relao aos tipos de dados e
fontes necessrias, em funo dos resultados que se pretende alcanar.
Na realidade, definidos os objetivos ou propsitos gerais de um determi-
nado estudo, colocam-se os seguintes problemas: Qual a fonte a levantar?
Por onde comear? Em que escala espacial trabalhar? Qual a srie tempo-
ral a ser utilizada? Essas indagaes esto intimamente relacionadas
questo escalar em que se esteja trabalhando, para que haja uma sintonia
com os mtodos a serem utilizados.
Os fenmenos meteoroclimticos, na maioria das vezes, so produ-
zidos por mecanismos semelhantes, porm, com graus de intensidades e
espacialidades de ocorrncia diferenciados.
A Figura 1, a seguir, evidencia as caractersticas de alguns eventos
meteorolgicos, correlacionando o ciclo de durao de cada um deles com
as suas respectivas dimenses de observao (micro, meso e macro) e
temporalidades de ocorrncia na atmosfera, desde fraes de segundo at
meses e anos de durao.
Os estudos dos fenmenos relacionados com o comportamento da
atmosfera so orientados no sentido da compreenso de sua extenso (es-
pao) e de sua durao (tempo).
Para efeito de melhor compreenso dos estudos do clima, foi preciso
se estabelecer um referencial escalar, com possibilidades metodolgicas,
isto , uma escala taxonmica como parte da prpria pesquisa climatolgica.
A dinmica do tempo e do clima resulta de um conjunto de interaes
ocorridas no plano da interface e da multi-espectral, que intercambia e
altera substancialmente a radiao solar atravs das diferentes esferas
terrestres.
Para a estruturao de um sistema taxonmico, com o propsito de
anlise climatolgica, Ribeiro (1993, p. 288) props alguns critrios
balizadores:
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- So consideradas escalas superiores aquelas mais prximas do
nvel planetrio;
- O grau de dependncia da radiao solar na definio climtica
maior nas escalas superiores, enquanto que a influncia da superfcie,
inclusive ao antrpica, vai se tornando maior na medida em que se
atinge as escalas inferiores;
- As combinaes de processos fsicos interativos numa escala su-
perior resultam em modificaes sucessivas no comportamento da atmos-
fera nas escalas inferiores;
- As combinaes particulares de processos fsicos nas escalas infe-
riores possuem limitada repercusso nas escalas superiores;
Figura 1ESCALA TMPORO-ESPACIAL DOS FENMENOS METEOROCLIMTICOS
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Figura 2ESCALA DE ANLISE GEOGRFICA DO CLIMA
Fonte: Faissol, (1978), adaptado por Jesus (1995).
A questo escalar no contexto da Geografia Fsica sempre foi muito
mais discutida no campo da Geomorfologia e de se estranhar o fato de
- As escalas inferiores so aquelas mais prximas dos indivduos,
da superfcie em geral;
- Quanto mais extenso o resultado de determinada combinao,
maior ser o tempo de sua permanncia, sendo o inverso igualmente
verdadeiro;
- A extenso de uma determinada combinao na atmosfera resul-
ta num atributo tridimensional, sendo, portanto, volumtrica a noo de
extenso, em climatologia, e tendo como limite superior o prprio limite
da atmosfera.
A Figura 2 representa as diferentes escalas geogrficas do clima com
as suas respectivas dimenses espaciais.
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que numa cincia extremamente preocupada com as reparties espaci-
ais, a Geografia, como um todo, tenha se preocupado to pouco com a
discusso taxonmica.
No campo da Climatologia, deve-se aos franceses o pioneirismo na
discusso das escalas do clima.
A denominao de mesoclimas surgiu, pela primeira vez, na litera-
tura climatolgica, no trabalho de Scaetta (1935), ao examinar os diferen-
tes nveis climticos, bioclimticos e microclimticos regionais. Monteiro
(1976) props uma organizao taxonmica para os espaos zonais, regio-
nais e locais. Oliver e Fairbrigde (1987), Atkinson (1987), Ribeiro (1993),
Jesus (1995), Mendona e Oliveira (2007) desenvolveram discusses no
mbito escalar da abordagem climatolgica.
O Quadro 1 assinala dimenses espaciais e temporais de maior acei-
tao, por parte dos climatlogos e meteorologistas, embasados em uma
flexibilidade entre as diferentes ordens de grandezas.
Quadro 1ORGANIZAO DAS ESCALAS ESPACIAL E TEMPORAL DO CLIMA
Subdivises
Macroclima
Mesoclima
Microclima
Fonte: Mendona e Oliveira (2007, p. 23).
Entre os gegrafos climatolgos e os meteorologistas, existe uma
pequena divergncia no tocante terminologia referente questo das
escalas do clima. As grandezas escalares atribudas ao estudo do clima
para os gegrafos priorizam a questo espacial, enquanto que as escalas
do clima para o meteorologista priorizam a questo temporal.
ExemplificaoEspacial
Algumas semanas avrios decnios.
O globo,um hemisf-rio, oceano, continen-te, mares etc.
Vrias horas aalguns dias.
Regio natural, mon-tanha, regio metro-politana, cidade etc.
De minutos ao dia.
Temporalidade dasVariaes maisRepresentativas
Bosque,uma rua, umaedificao, casa etc.
EscalaVertical
EscalaHorizontal
Ordem deGrandeza
Clima zonalClima regional
Clima regionalClima localTopoclima
10km aa l g u n smetros
Abaixo de100 metros
3 a 12 km> 2.000km
De 12 km a100 metros
2000 kma 10 km
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Jesus (1995) discutiu aspectos conceituais e metodolgicos relativos
s questes de escala, tempo e espao em Climatologia, nos nveis hierr-
quicos macro, meso e microescalar, propondo um roteiro de investigao
para cada um deles, com os respectivos nveis de interveno dos fatores
climticos.
Outro aspecto significativo em relao escala consiste em o pesqui-
sador saber colocar o problema da pertinncia de ligao entre uma uni-
dade de observao e o atributo que se deve associar mesma. Em qual
escala, por exemplo, as unidades possuem propriedades globais? Muitos
estudos empricos tm demonstrado que pode haver propriedades globais
em nveis diferentes. Na realidade, cada estudo deve ser colocado dentro
de sua perspectiva correta, isto , no seu campo de pertinncia, no nvel
de sua dimenso de anlise. Essa pertinncia no ocorre apenas em rela-
o rea escolhida, mas tambm em relao ao tipo de dados utilizados
na anlise.
Assim, para a compreenso do mecanismo da circulao atmosfrica
em relao ao fluxo das brisas litorneas (clima local), necessria a
disponibilidade de dados dirios para efeito de seu estudo. Enquanto que,
para o mesmo tipo de anlise vinculada a uma circulao secundria (cir-
culao monnica), fundamental a disponibilidade de dados que ex-
pressem a sazonalidade dos atributos climticos. Para o mesmo tipo de
abordagem, com o propsito de se investigar a variabilidade e as tendn-
cias climticas da circulao normal, essencial a disponibilidade de da-
dos anuais e interanuais de vrios anos. Fica, assim, bem evidente que as
duas noes de escalas (cartogrfica e geogrfica) permeiam a anlise do
clima. A primeira est ligada ao tamanho da unidade de observao con-
siderada, enquanto que a segunda est ligada questo conceitual
conduzida no tema em pauta.
Enfim, o real significado da escala inclui, necessariamente, uma re-
lao indissocivel entre a dimenso espacial e o fenmeno climtico
analisado.
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3. A hierarquizao do fato climtico
A realidade climtica pode, objetivamente, ser caracterizada por uni-
dades espaciais com grandezas escalares completamente diferenciadas,
que variam desde o nvel planetrio (zonal) at o nvel microclimtico. A
depender dos objetivos a que se prope um estudo e a escala em que se
esteja trabalhando, necessariamente no ser preciso o rigor de 30 anos
de dados climatolgicos conforme recomendado pela OMM (Organiza-
o Meteorolgica Mundial), para se trabalhar em Climatologia.
Um estudo de Climatologia Sintica sobre a ocorrncia de um epis-
dio pluvial concentrado de grande intensidade, em regies tropicais, na
maioria das vezes, perdura 2 a 3 dias, ou pouco mais, sendo necessrio
to somente uma avaliao diria (horria) do evento meteoroclimtico.
Outro fato que bem exemplifica a necessidade da hierarquizao das
ordens de grandezas climticas, que, a partir do momento em que des-
dobramos as unidades, o nmero de variveis que intervm no processo
torna-se maior. Na realidade, existe uma superposio ou uma interao
entre fatores e elementos estruturais de uma determinada ordem de gran-
deza imediatamente inferior, e assim, sucessivamente, at as menores
unidades (microclimas). Da mesma forma, medida que reduzimos as
dimenses no espao, a velocidade das mudanas temporais, em nvel de
processo, tambm se altera.
Os climas zonais so desdobrados em unidades menores, e novos
fatores geogrficos assumem efeitos significativos sobre as condies cli-
mticas. Nesse nvel de abordagem, inserem-se os climas regionais e, no
interior destes, aparecem os mesoclimas (do grego meso), que significa
intermedirio em dimenso, no contexto das hierarquias do clima.
O clima regional aparece inserido em cada faixa zonal, sendo defini-
do a partir das influncias produzidas pelos fatores geogrficos controladores
do clima. Dentre aqueles de maior relevncia podemos mencionar: a ori-
entao e a disposio dos grandes conjuntos orogrficos; as interfernci-
as das correntes ocenicas; as condies topogrficas predominantes; o
maior ou menor grau de influncia da maritimidade e da continentalidade;
a posio latitudinal e a exposio da regio, dentre muitos outros fatores
estticos. Em consonncia a esses fatores de natureza geogrfica, os de
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natureza dinmica tambm se estruturam num sistema de circulao at-
mosfrica secundria, representada por um conjunto de perturbaes
sinticas que passam a atuar em diferentes pocas do ano. Essas corren-
tes secundrias so resultantes da instalao de pequenos centros de ao
(ncleos ciclnicos e anticiclnicos), que atuam na dinmica do tempo e
do clima regional ao longo do ano.
A identidade do clima regional em geral confunde-se com suas prprias reper-cusses sobre a cobertura vegetal, onde se estabelece uma forte relao nosdomnios climatobotnicos (clima do cerrado, clima das caatingas, clima dasflorestas latifoliadas, dentre outros) (RIBEIRO 1993, p. 289).
Os climas regionais apresentam extenso horizontal aproximada entre
150 a 2.000 km e, verticalmente, esto limitados pelos fenmenos que
ocorrem na baixa troposfera. Os estados do tempo derivados da intensida-
de de participao dos centros de ao e frentes duram, em mdia, de 1 a
30 dias, como, por exemplo, o que ocorre nas atuaes dos sistemas
extratropicais que invadem o centro-oeste e o sudeste brasileiro, por oca-
sio dos messes de inverno. Esses sistemas de natureza frontal proporcio-
nam grandes perturbaes meteoroclimticas regionais.
A abordagem sugerida para efeito de anlise em mesoescala (climas
regionais) apoia-se na identificao do ritmo anual, sazonal e mensal dos
elementos do clima que representem os mecanismos da atuao dos sis-
temas de circulao atmosfrica secundria. necessria a anlise criteriosa
dos fatores geogrficos regionais que concorrem para a definio de cada
domnio climtico regional. A anlise das cartas sinticas complementadas
pelas imagens de satlites meteorolgicos, e apoiadas pelas informaes
das estaes meteorolgicas de superfcie, poder conduzir a bom termo
as anlises dos climas regionais.
Em cada posio da regio, as configuraes espaciais determinadas
pela compartimentao topogrfica, cobertura natural, rede de drenagem,
altitude, dentre outros aspectos geogrficos, interagem de forma significa-
tiva com os padres climticos regionais.
Nesta escala, torna-se importante considerar as variaes anuais,
sazonais e mensais dos elementos climticos, assim como a anlise dos
sistemas de circulao atmosfrica atuantes e os tipos de tempo que assu-
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mem grande significao. necessrio tambm, nesse nvel (clima regi-
onal), conhecer a situao sintica da atmosfera regional a fim de se defi-
nir a posio dos centros de ao atuantes (clulas ciclnicas e
anticiclnicas). Ainda neste nvel de abordagem climatolgica, como es-
tratgia de investigao, preciso conhecer as normais ou mdias de um
longo perodo e tambm acompanhar essas mdias com estudo de varia-
es em intervalos menores, selecionados por critrios de
representatividade. nesse nvel das escalas do clima que se determinam
os chamados anos padro.
O clima regional geralmente possui inmeras variaes no seu inte-
rior em funo, sobretudo, da compartimentao topoclimatolgica.
Os grandes conjuntos morfolgicos produzem interferncias no fluxo
energtico ou mesmo na circulao secundria, criando reas de barla-
vento e sombras de chuvas (sotavento).
Em mesoclimatologia, a configurao do terreno, o tipo de solo e sua coberturanatural, so considerados como feies da localidade, sujeitos apenas a peque-nas mudanas no tempo, determinando o clima que predomina em determinadolugar, da ordem de centenas de quilmetros quadrados, e pode ser chamadoclima local (OLIVER; FAIRBRIDGE, 1987, p. 38)
A altitude em particular, na categoria da mesoescala, possui uma
importncia significativa, ou seja, um papel destacado na distribuio da
radiao lquida, na reteno do vapor dgua e no armazenamento de
calor sensvel. Essas e outras caractersticas passam a proporcionar a for-
mao de verdadeiros enclaves climticos, com grandes reflexos na estru-
tura trmica, surgindo, assim, os chamados mesoclimas, no interior dos
climas regionais.
Remp (1937) considerou como mesoclima aquele circunscrito de
maneira natural ou artificial, produzido em funo da posio de um vale
ou declive, assinalando, assim, sua concepo sobre mesoclimas. A defi-
nio de Remp abre para uma ampla pauta de discusses e, ao mesmo
tempo, coloca a questo do aspecto relativo que deve ser considerado na
anlise do mesoclima no contexto da terminologia escalar do clima.
Bruchmann (1999) definiu, como mesoclima, a extenso da superf-
cie terrestre que produz uma modificao no ambiente climtico, propor-
cionando mesoclimas de montanha e vales, dentre outros. O autor enfatizou
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SEMI-DETALHADO
(escala intermediria)
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