93
Joana Catarina Marques da Costa Araújo UMinho|2014 abril de 2014 A Evolução da Estrutura Concetual do IASB: do Processo de Convergência entre o IASB e o FASB ao Discussion Paper de 2013 Universidade do Minho Escola de Economia e Gestão A Evolução da Estrutura Concetual do IASB: do Processo de Convergência entre o IASB e o FASB ao Discussion Paper de 2013 Joana Catarina Marques da Costa Araújo

Joana Catarina Marques da Costa Araújorepositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/30531/1/Joana Catarina... · ii É autorizada a reproduÇÃo integral deste trabalho apenas para

Embed Size (px)

Citation preview

  • Joana Catarina Marques da Costa Arajo

    UM

    inho

    |201

    4

    abril de 2014

    A E

    volu

    o

    da

    Est

    rutu

    ra C

    on

    cetu

    al d

    o I

    AS

    B:

    do

    Pro

    cess

    o d

    e C

    on

    verg

    n

    cia

    en

    tre

    o I

    AS

    B e

    o F

    AS

    B a

    o D

    iscu

    ssio

    n P

    aper

    de

    20

    13

    Universidade do Minho

    Escola de Economia e Gesto

    A Evoluo da Estrutura Concetual do IASB: do Processo de Convergncia entre o IASB e o FASB ao Discussion Paper de 2013

    Joan

    a C

    atar

    ina

    Mar

    ques

    da

    Cos

    ta A

    raj

    o

  • Relatrio de EstgioMestrado em Contabilidade

    Trabalho realizado sob a orientao da

    Professora Doutora Tnia Micaela de Brito

    e Meneses Montenegro Barbosa

    e da

    Tcnica Oficial de Contas Carla Susana Ribeiro Barbosa

    Joana Catarina Marques da Costa Arajo

    abril de 2014

    Universidade do Minho

    Escola de Economia e Gesto

    A Evoluo da Estrutura Concetual do IASB: do Processo de Convergncia entre o IASB e o FASB ao Discussion Paper de 2013

  • II

    AUTORIZADA A REPRODUO INTEGRAL DESTE TRABALHO APENAS

    PARA EFEITOS DE INVESTIGAO, MEDIANTE DECLARAO ESCRITA DO

    INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE.

    Universidade do Minho, ___/___/______

    Assinatura: ________________________________________________

  • III

    Agradecimentos

    Agradeo ao Sr. Moreira, pela experincia que me proporcionou e pela sua

    disponibilidade. Este estgio foi o meu primeiro contacto com o mercado de trabalho e

    uma oportunidade de aprender e desenvolver os meus conhecimentos.

    Susana um obrigada pela pacincia, pelo tempo dispensado e por me ter transmitido

    os seus conhecimentos e experincias, fundamentais para alcanar os objetivos do

    estgio.

    Um especial agradecimento professora Tnia Montenegro por todo o apoio e pelo

    tempo que dedicou ao meu trabalho. A sua ajuda foi essencial em momentos de maior

    indeciso e a sua orientao e os seus comentrios foram extremamente importantes.

  • IV

  • V

    A Evoluo da Estrutura Concetual do IASB: do Processo de Convergncia entre o

    IASB e o FASB ao Discussion Paper de 2013

    Resumo

    A globalizao da economia e dos mercados de capitais veio aumentar a necessidade de

    assegurar a comparabilidade da informao financeira a nvel internacional, conseguida

    atravs da emisso de normas internacionais de contabilidade (Malikov & Brabec,

    2010). Nesse sentido, em 2010, o IASB publicou a atual verso da Estrutura Concetual

    (EC) de relato financeiro, cujo processo de reviso relativo aos captulos referentes ao

    Objetivo das Demonstraes Financeiras e s Caratersticas Qualitativas da Informao

    Financeira foi realizado em conjunto com o FASB. Do mesmo modo, vrios pases tm

    adaptado as suas ECs e os seus normativos contabilsticos EC e s normas do IASB.

    Contudo, diferentes pases, com diferentes backgrounds relativamente contabilidade e

    diferentes sistemas regulatrios, podem levar a diferentes interpretaes das normas. De

    facto, o projeto de reviso da EC mostrou-se bastante controverso e tem sido alvo de

    vrias crticas. Em 2013, o IASB publicou um Discussion Paper com propostas de

    alterao s restantes partes da EC, prevendo-se um amplo debate a nvel internacional.

    Este estudo pretende analisar as implicaes das alteraes feitas EC do IASB em

    2010 face realidade da EC Portuguesa, atravs do estudo das alteraes aprovadas

    pelo IASB em 2010 e da comparao entre a EC do IASB e da EC do SNC (em vigor

    em Portugal). O estudo procura tambm analisar as propostas de alterao enunciadas

    em julho de 2013 pelo IASB para as restantes partes da EC. Para tal, foi utilizada uma

    anlise documental da EC do IASB e da EC do SNC, e dos documentos publicados pelo

    IASB ao longo dos seus projetos de reviso da EC.

    Da reviso realizada pelo IASB em 2010 EC resulta que o objetivo do relato

    financeiro passa a estar centrado no fornecimento de informao til a grupos restritos

    de utilizadores, sendo destacados os investidores e os credores, e relevados para

    segundo plano os restantes grupos de utilizadores que tradicionalmente tm interesse na

    informao financeira das entidades. Por outro lado, a EC deixou de fazer referncia

    explcita ao conceito de stewardship e as caratersticas qualitativas da informao

    financeira foram divididas em dois grupos: as caratersticas qualitativas fundamentais e

    as caratersticas qualitativas de reforo. Destaca-se ainda a substituio do conceito de

    fiabilidade pelo conceito de representao fidedigna e a eliminao de referncias ao

    conceito de prudncia.

  • VI

  • VII

    The IASBs Conceptual Framework Evolution: from the IASB and FASB Joint

    Project to the IASBs Discussion Paper of 2013

    Abstract

    The economy and capital markets globalization increased the need to ensure the

    comparability of the financial information, obtained through a set of common

    accounting standards (Malikov & Brabec, 2010). To do so, in 2010, the IASB

    published its Conceptual Framework current version, whose revision process on the

    chapters related to The Objective of General Purpose Financial Reporting and the

    Qualitative Characteristics of Useful Financial Information was jointly made with the

    FASB. In the same way, many countries have been adapted their Conceptual

    Frameworks and their accounting standards to the ones issued by the IASB. However,

    different countries, with different accounting backgrounds and different regulatory

    systems, may create different interpretations of the standards, which can generate

    conflicts. Indeed, the revision process of the Conceptual Framework of the IASB

    proved to be very controversial and it has been a target of a high criticism. In 2013, the

    IASB published a Discussion Paper with proposed amendments to the remaining

    chapters of its Conceptual Framework, which is foreseen to be a target of critics too.

    This study aims to analyse the implications for Portugal of the amendments made to the

    IASBs Conceptual Framework, through the study of the amendments made in 2010 and

    by establishing a comparison between the current IASBs Conceptual Framework and

    the Portuguese Conceptual Framework. Furthermore, the study looks to analyse the

    proposed amendments announced in July of 2013 to the remaining chapters of the

    IASBs Conceptual Framework. To do so, we use a documental analysis of the

    Conceptual Frameworks, the IASBs and the Portuguese one, and the documents

    published by the IASB during the Conceptual Framework review process.

    From de revision made in 2010, the Objective of General Purpose Financial Reporting

    started to focus primarily on investors and creditors and the Conceptual Framework no

    longer explicitly refers to stewardship. The Qualitative Characteristics of Useful

    Financial Information were divided into two groups: fundamental qualitative

    characteristics and enhancing qualitative characteristics. We also emphasize the

    substitution of reliability by faithful representation and the elimination of prudence.

  • VIII

  • IX

    ndice Geral

    Agradecimentos .............................................................................................................. III

    Resumo ............................................................................................................................. V

    Abstract .......................................................................................................................... VII

    ndice Geral .................................................................................................................... IX

    ndice de Figuras .......................................................................................................... XIII

    ndice de Tabelas ........................................................................................................... XV

    Lista de Siglas ............................................................................................................. XVII

    1. Introduo.................................................................................................................. 1

    1.1. Cenrio para a Investigao .............................................................................. 1

    1.2. Objetivos e Questes-chave de Investigao.................................................... 3

    1.3. Metodologia ...................................................................................................... 4

    1.4. Estrutura do Relatrio ....................................................................................... 4

    2. A Estrutura Concetual da Contabilidade ................................................................... 7

    2.1. O Conceito ........................................................................................................ 7

    2.2. A Estrutura Concetual do IASB ....................................................................... 8

    2.2.1. Anlise das alteraes introduzidas em 2010 Estrutura Concetual do

    IASB. .................................................................................................................... 9

    2.2.1.1. Objetivo das demonstraes financeiras ........................................... 10

    2.2.1.2. Caratersticas qualitativas da informao financeira ......................... 13

    2.2.1.2.1. As Caratersticas Qualitativas Fundamentais .............................. 14

    2.2.1.2.2. As Caratersticas Qualitativas de Reforo ................................... 18

    2.2.1.3. Constrangimentos informao financeira til ................................ 20

    2.3. Estrutura Concetual do IASB de 2010 versus Estrutura Concetual do SNC.. 21

    2.3.1. Estrutura Concetual em vigor em Portugal............................................... 21

    2.3.2. Comparao da Estrutura Concetual do IASB de 2010 e da Estrutura

    Concetual do SNC ................................................................................................... 25

  • X

    2.4. Propostas de alterao para as restantes partes da Estrutura Concetual: Anlise

    do Discussion Paper de 2013 do IASB ...................................................................... 30

    2.4.1. Objetivo principal da Estrutura Concetual ............................................... 30

    2.4.2. Definio de Ativo e Passivo ................................................................... 31

    2.4.3. Reconhecimento de Elementos das Demonstraes Financeiras ............. 33

    2.4.4. Desreconhecimento de Elementos das Demonstraes Financeiras ........ 34

    2.4.5. Definio de Capital Prprio e distino entre Passivos e Instrumentos de

    Capital .................................................................................................................. 35

    2.4.6. Mensurao dos Elementos das Demonstraes Financeiras ................... 36

    2.4.7. Apresentao e Divulgao da Informao Financeira ............................ 38

    2.4.8. Apresentao do Lucro ou Prejuzo e do Resultado Integral

    (Comprehensive Income)......................................................................................... 41

    2.5. Concluso ....................................................................................................... 44

    2.5.1. Consideraes Finais ................................................................................ 44

    2.5.2. Contribuies, Limitaes do Estudo e Propostas de Investigao Futura ..

    .................................................................................................................. 46

    3. Descrio das atividades realizadas no mbito do estgio curricular ..................... 49

    3.1. Caraterizao da empresa de acolhimento...................................................... 49

    3.2. Aspetos formais do estgio ............................................................................. 49

    3.2.1. Procedimentos Contabilsticos ................................................................. 50

    3.2.2. Prticas de Controlo Interno ..................................................................... 53

    3.2.3. Apuramento de Contribuies e Impostos e Preenchimento das Respetivas

    Declaraes ............................................................................................................. 54

    3.2.4. Processamento de Salrios ....................................................................... 57

    3.2.5. Encerramento de Contas e Preparao das Demonstraes Financeiras .. 59

    3.2.6. Preparao da Informao Contabilstica para o Relatrio de Anlise de

    Gesto .................................................................................................................. 61

    3.2.7. Resoluo de Questes e Contactos a Entidades Competentes ................ 62

  • XI

    3.2.8. Conduta tica e Deontolgica Associada Profisso .............................. 62

    3.3. Concluso ....................................................................................................... 63

    Referncias Bibliogrficas .............................................................................................. 65

    Legislao Consultada .................................................................................................... 67

    Apndices ....................................................................................................................... 69

    Apndice 1: Atividades dirias desenvolvidas ao longo do estgio curricular ........... 69

  • XII

  • XIII

    ndice de Figuras

    Figura 1 Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira ................................... 14

    Figura 2 Caratersticas Qualitativas daInformao Financeira do SNC ...................... 24

  • XIV

  • XV

    ndice de Tabelas

    Tabela I Descrio de fiabilidade na Estrutura Concetual pr-2010 e de representao

    fidedigna na Estrutura Concetual ps-2010.................................................................... 17

    Tabela II Objetivo das Demonstraes Financeiras IASB vs SNC .......................... 25

    Tabela III Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira IASB vs SNC ...... 26

    Tabela IV Constrangimentos Informao Financeira til IASB vs SNC ............. 29

  • XVI

  • XVII

    Lista de Siglas

    AECA: Asociacin Espaola de Contabilidad y Administracin de Empresas

    AT: Administrao Tributria e Aduaneira

    CIRC: Cdigo do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas

    CIRS: Cdigo do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares

    CIVA: Cdigo do Imposto sobre o Valor Acrescentado

    CMVMC: Custo das Mercadorias Vendidas e Matrias Consumidas

    CNC: Comisso de Normalizao Contabilstica

    COSO: Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission

    EC: Estrutura Concetual

    EUA: Estados Unidos da Amrica

    FASB: Financial Accounting Standards Board

    FCT: Fundo de Compensao do Trabalho

    FGCT: Fundo de Garantia de Compensao do Trabalho

    GAAP: Generally Accepted Accounting Practices

    IAS: International Accounting Standards

    IASB: International Accounting Standards Board

    IASC: International Accounting Standards Committee

    IES: Informao Empresarial Simplificada

    IFRS: International Financial Reporting Standards

    INE: Instituto Nacional de Estatstica

    IRC: Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas

    IRS: Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares

    IVA: Imposto sobre o Valor Acrescentado

    NCRF: Norma Contabilstica e de Relato Financeiro

    OTOC: Ordem dos Tcnicos Oficiais de Contas

    POC: Plano Oficial de Contabilidade

  • XVIII

    RITI: Regime do IVA nas Transaes Intracomunitrias

    RIEEP: Regulamento de Inscrio, Exame e Estgios Profissionais da OTOC

    RLE: Resultado Lquido do Exerccio

    SAF-T: Standard Audit File for Tax Purposes

    SNC: Sistema de Normalizao Contabilstica

    TOC: Tcnico Oficial de Contas

    UE: Unio Europeia

  • 1

    1. Introduo

    1.1. Cenrio para a Investigao

    A crescente globalizao da economia e dos mercados de capitais veio aumentar a

    necessidade de assegurar a comparabilidade da informao financeira a nvel

    internacional. Nesse sentido, a emisso de um conjunto de normas de contabilidade a

    nvel internacional visa assegurar a comparabilidade da informao financeira, tanto

    para empresas cotadas em bolsas de valores estrangeiras, como para empresas

    multinacionais, facilitando tambm o processo de consolidao de contas (Malikov &

    Brabec, 2010).

    Em 2002, o International Accounting Standards Board (IASB) e o Financial

    Accounting Standards Board (FASB) iniciaram um projeto conjunto que visava a

    convergncia das normas de contabilidade emitidas pelos dois organismos. Esta deciso

    foi declarada no Memorando de Entendimento, tambm conhecido como Norwalk

    Agreement. Consequentemente, sendo a Estrutura Concetual a base para o

    desenvolvimento de futuras normas de contabilidade comuns, a reviso das estruturas

    concetuais do IASB e do FASB era um passo necessrio (Malikov & Brabec, 2010).

    Em 2005, o IASB e o FASB iniciaram ento o processo de reviso conjunto das suas

    estruturas concetuais. Inicialmente, o IASB estava otimista relativamente ao consenso

    que as alteraes iriam gerar e pretendia avanar diretamente para um Exposure Draft.

    No entanto, o IASB acabou por seguir o processo normal e emitiu um Discussion Paper

    em 2006, intitulado Preliminary Views on an Improved Conceptual Framework for

    Financial Reporting: The Objective of Financial Reporting and Qualitative

    Characteristics of Decision-useful Financial Reporting Information. O projeto de

    reviso mostrou-se bastante controverso, tendo sido alvo de vrias crticas (Whittington,

    2008a; Whittington, 2008b; Cho, Kim & Lim, 2010; Zhang & Andrew, 2014;

    Murphy,OConnell & hgartaigh, 2013). A origem das crticas esteve na alterao

    profunda de grande parte dos conceitos que a Estrutura Concetual do IASB preconizava

    e no impacto que a mdio e longo prazo estas alteraes tero ao nvel das normas de

    contabilidade (Whittington, 2008a). parte das alteraes introduzidas ao nvel das

    caratersticas qualitativas da informao financeira, a remoo do conceito de

    stewardship e a restrio dos principais utilizadores da informao financeira aos

    investidores e credores veio enfatizar a importncia que os mercados financeiros tm na

  • 2

    Estrutura Concetual resultante da reviso conjunta do IASB e do FASB (Whittington,

    2008a; Zhang & Andrew, 2014; Murphy et al., 2013). O ano de 2005 tambm ficou

    marcado pela adoo das International Accounting Standards (IAS) na UE (Unio

    Europeia), obrigatrias na preparao das demonstraes financeiras das empresas

    cotadas nos mercados de capitais da UE, sendo este considerado apenas o primeiro

    passo para a harmonizao contabilstica (Whittington, 2005). Consequentemente,

    vrios pases tm adaptado o seu normativo contabilstico s IAS, como o caso de

    Portugal, onde, em 2010, o Sistema de Normalizao Contabilstica (SNC), baseado nas

    IAS, veio substituir o Plano Oficial de Contabilidade (POC).1

    Apesar dos esforos feitos pelos organismos internacionais da rea da contabilidade e

    pela prpria UE no sentido da harmonizao contabilstica internacional, a diversidade

    cultural, histrica, econmica, financeira, legal e poltica de cada pas podem criar

    entraves a esse processo, atravs de diferentes interpretaes das normas de

    contabilidade. Essa diversidade de interpretaes das normas designada por

    Whittington (2008b) de estrutura institucional da contabilidade.

    Guimares (2000) apresenta duas reas de influncia no espao europeu relativamente

    s diferenas nos sistemas contabilsticos: os pases de influncia anglo-saxnica, como

    o Reino Unido, Dinamarca, Holanda e Irlanda, e os pases de influncia europeia-

    continental, como a Alemanha, Espanha, Frana, Itlia e Portugal. Os pases de

    influncia anglo-saxnica apresentam escassa ou nula relao entre a contabilidade e

    fiscalidade, forte influncia da profisso contabilstica no processo regulador,

    predomnio do investidor como principal fornecedor de financiamento e o principal

    objetivo da informao contabilstica a prossecuo da imagem verdadeira e

    apropriada da situao da empresa. No que concerne aos pases de influncia europeia-

    continental, existe uma estreita relao entre a contabilidade e a fiscalidade, a influncia

    da profisso contabilstica nas normas contabilsticas menos significativa, h um

    predomnio dos bancos como fontes de financiamento empresarial e em menor medida o

    Estado. Neste caso, a prossecuo da imagem verdadeira e apropriada o objetivo da

    informao contabilstica, mas sujeita ao estrito cumprimento da lei e a regulamentao

    contabilstica dirigida proteo dos credores.

    1 O SNC adquiriu fora legal com a publicao do Decreto-Lei n. 158/2009, de 13 de Julho, revogando o Plano Oficial de

    Contabilidade (POC) e a legislao complementar, com efeitos a partir de 01/01/2010.

  • 3

    Neste contexto de diversidade em que a harmonizao implica um processo de

    conciliao de diferentes pontos de vista (Guimares, 2000: 90), propomo-nos analisar

    as alteraes introduzidas na Estrutura Concetual do IASB em 2010 face verso em

    vigor antes dessa data; explorar as diferenas existentes entre a Estrutura Concetual dos

    IASB revista em 2010 e a Estrutura Concetual do SNC atualmente em vigor em

    Portugal, e ainda analisar as alteraes propostas no Discussion Paper publicado pelo

    IASB em julho de 2013, A Review of the Conceptual Framework for Financial

    Reporting.

    1.2. Objetivos e Questes-chave de Investigao

    O presente trabalho apresenta trs objetivos fundamentais:

    1. Analisar as alteraes Estrutura Concetual de Relato Financeiro do IASB j

    aprovadas em 2010, relativamente ao objetivo das demonstraes financeiras e s

    caratersticas qualitativas da informao financeira;

    2. Estabelecer uma comparao entre a Estrutura Concetual de Relato Financeiro do

    IASB atualmente em vigor (verso contendo as alteraes aprovadas pelo IASB em

    2010) e a Estrutura Concetual do SNC em vigor em Portugal;

    3. Analisar as propostas de alterao enunciadas em julho de 2013 pelo IASB para as

    restantes partes da Estrutura Concetual de Relato Financeiro.

    As questes-chave implcitas para alcanar os objetivos deste estudo so as seguintes:

    1. Quais as diferenas entre a verso atual da Estrutura Concetual de Relato

    Financeiro do IASB atualmente em vigor (verso aprovada em 2010)

    relativamente verso anterior da Estrutura Concetual do IASB (verso de

    1989)?

    2. Quais as diferenas entre a verso atual da Estrutura Concetual de Relato

    Financeiro do IASB atualmente em vigor (verso aprovada em 2010) e a

    Estrutura Concetual do SNC em vigor em Portugal?

    3. Quais as propostas de alterao enunciadas em julho de 2013 pelo IASB para as

    restantes partes da Estrutura Concetual de Relato Financeiro e as suas

    implicaes ao nvel do processo de relato financeiro?

  • 4

    O relatrio de estgio serve tambm para descrever as atividades desenvolvidas no

    mbito do estgio curricular realizado no gabinete Contabilidade Costa do Sol, Lda.,

    sob a orientao da Tcnica Oficial de Contas Carla Susana Ribeiro Barbosa. O estgio

    curricular tem como objetivo o reconhecimento por parte da Ordem dos Tcnicos

    Oficiais de Contas (OTOC).

    1.3. Metodologia

    Tal como referimos anteriormente, este trabalho pretende descrever e analisar as

    alteraes Estrutura Concetual do IASB aprovadas em 2010, estabelecer uma

    comparao dessa verso atual com a Estrutura Concetual do SNC em vigor em

    Portugal, e ainda analisar as propostas de alterao Estrutura Concetual enunciadas em

    julho de 2013 pelo IASB. Para tal, foi realizada uma pesquisa exploratria e qualitativa,

    assumindo, do ponto de vista dos procedimentos tcnicos, o carter de anlise

    documental, por tratar da recolha e anlise do contedo de normas e outros documentos

    (Gil, 2002).

    Primeiramente ser examinada a Estrutura Concetual de Relato Financeiro do IASB

    atualmente em vigor, que reflete as alteraes aprovadas em 2010 respeitantes ao

    Objetivo das Demonstraes Financeiras e s Caratersticas Qualitativas da Informao

    Financeira, relativamente verso de 1989. Em segundo lugar, ser estabelecida a

    comparao desse documento com a Estrutura Concetual do SNC em vigor em

    Portugal. Em terceiro lugar, ser analisado o Discussion Paper publicado pelo IASB em

    julho de 2013, contendo as alteraes propostas para as restantes partes da Estrutura

    Concetual de Relato Financeiro, de modo a analisar as alteraes mais significativas e

    as suas implicaes ao nvel do relato financeiro.

    1.4. Estrutura do Relatrio

    O presente relatrio est dividido em trs seces principais: 1. Introduo, 2. A

    Estrutura Concetual da Contabilidade e 3. Atividades Desenvolvidas no mbito do

    Estgio Profissional. A Introduo apresenta o contexto da investigao, clarifica os

    objetivos do trabalho e a metodologia a utilizada. A segunda seco, A Estrutura

    Concetual da Contabilidade, divide-se em cinco partes. Na primeira parte definido o

    conceito de Estrutura Concetual, seguindo-se uma exposio da Estrutura Concetual do

    IASB e do projeto de reviso levado a cabo em conjunto com o FASB, salientando as

  • 5

    alteraes realizadas em 2010. Na terceira parte, feita uma comparao entre a

    Estrutura Concetual do IASB ps-reviso de 2010 e a Estrutura Concetual do SNC

    atualmente em vigor em Portugal, relativamente ao Objetivo das Demonstraes

    Financeiras e s Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira. A quarta parte

    debrua-se sobre as alteraes propostas pelo IASB em 2013 para as restantes partes da

    sua Estrutura Concetual, e a quinta e ltima parte apresenta as principais concluses

    relativas segunda seco, referindo os principais contributos do trabalho, as limitaes

    encontradas e as possibilidades de investigao futura. Por fim, a terceira seco

    destina-se a descrever as atividades prticas desenvolvidas ao longo do estgio

    curricular desenvolvido no mbito do Mestrado em Contabilidade e est dividida de

    acordo com o artigo 9. do Regulamento de Inscrio, Exame e Estgios Profissionais

    (RIEEP) da OTOC.

  • 6

  • 7

    2. A Estrutura Concetual da Contabilidade

    2.1. O Conceito

    Gabs Trigo (1991) define a Estrutura Concetual da Contabilidade como uma teoria

    contabilstica de carcter geral que estabelece uma estrutura lgico-dedutiva do

    conhecimento contabilstico e define uma orientao bsica para o organismo

    responsvel pela elaborao das normas contabilsticas de cumprimento obrigatrio. No

    mesmo sentido, Tua Pereda (1997) define-a como uma interpretao da teoria geral da

    Contabilidade, mediante a qual se estabelecem, atravs de um itinerrio lgico-

    dedutivo, os fundamentos tericos em que se apoia a informao financeira. Estas

    definies salientam o carcter lgico-dedutivo da Estrutura Concetual da Contabilidade

    e a sua importncia como base para a elaborao de normas de contabilidade.

    De forma mais simples, Guimares (2007: 46) define a Estrutura Concetual da

    Contabilidade como sendo um conjunto organizado (estrutura) de conceitos

    (concetual) da contabilidade.

    Para Salazar, Galvis & Soto (2006) a Estrutura Concetual est para a Contabilidade

    como a Constituio para um pas, sendo um fundamento terico que guia o

    desenvolvimento da regulao normativo-tcnica da profisso. Kirk (1981) salienta a

    importncia da Estrutura Concetual referindo que, sem esta, o normalizador ter de

    invocar os seus prprios conceitos no mbito do relato financeiro aquando da produo

    das normas de contabilidade. De acordo com este autor, a Estrutura Concetual permite

    que ao longo do tempo os novos membros do organismo normalizador no se

    distanciem dos princpios fundamentais, luz dos quais os seus antecessores se

    basearam na produo de normas de contabilidade e de relato financeiro, contribuindo

    para uma maior consistncia.

    O IASB (2010) define a Estrutura Concetual como um conjunto de conceitos

    subjacentes preparao e apresentao das demonstraes financeiras para utilizadores

    externos, tendo como objetivos fundamentais:

    a) auxiliar o IASB no desenvolvimento futuro de normas de relato financeiro e

    no processo de reviso das normas atuais, no sentido de promover a

    harmonizao contabilstica internacional;

  • 8

    b) apoiar os organismos normalizadores de cada pas no

    desenvolvimento/adaptao das normas de contabilidade e de relato financeiro;

    c) ajudar os preparadores das demonstraes financeiras na aplicao das

    normas internacionais de contabilidade e de relato financeiro e em lidar com

    temas que ainda no foram objeto de tratamento por uma norma;

    d) ajudar os auditores na formao de uma opinio sobre se as demonstraes

    financeiras esto (ou no) em conformidade com as normas internacionais de

    contabilidade e de relato financeiro;

    e) ajudar os usurios na interpretao da informao contida nas demonstraes

    financeiras luz das normas internacionais de contabilidade e de relato

    financeiro; e

    f) fornecer informao aos interessados no trabalho do IASB sobre a abordagem

    usada para a formulao das normas internacionais de relato financeiro.

    2.2. A Estrutura Concetual do IASB

    Em abril de 1989 foi aprovada pelo International Accounting Standards Committee

    (IASC) a primeira verso da Estrutura Concetual, designada na poca de Framework for

    the Preparation and Presentation of Financial Statements, tendo sido publicada em

    julho do mesmo ano e posteriormente adotada pelo IASB em 2001. Em 2002, na cidade

    de Norwalk, Estado do Connecticut nos Estados Unidos da Amrica (EUA), o IASB e o

    FASB iniciaram um projeto conjunto que visava a convergncia entre as normas

    emitidas pelo organismo internacional e as normas de contabilidade emitidas pelo

    organismo norte-americano, tendo sido assinado o Norwalk Agreement. Nessa

    conformidade, em 2005, o IASB e o FASB iniciaram um processo conjunto de reviso

    das suas Estruturas Concetuais, com o objetivo de fornecer uma Estrutura Concetual

    comum que permitisse a convergncia e melhoria das normas emanadas pelos dois

    organismos - as Internacional Financial Reporting Standards (IFRS) e as Generally

    Accepted Accounting Practices (US-GAAP) - no sentido de normas globais. O processo

    de reviso/convergncia das Estruturas Concetuais dos dois organismos considerado

    de grande importncia (Whittington, 2005), havendo, de acordo com Whittington

    (2008b) dois aspetos fundamentais a melhorar: por um lado, preencher lacunas para

  • 9

    atingir a plenitude (como por exemplo ao nvel da mensurao), e por outro, remover

    contradies internas por forma a melhorar a consistncia.

    A fase A do projeto conjunto de reviso teve como objeto o Captulo 1 da Estrutura

    Concetual de Relato Financeiro relativo ao Objetivo das Demonstraes Financeiras e o

    Captulo 3 relativo s Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira. Esta fase

    iniciou-se com a publicao de um Discussion Paper em julho de 2006, intitulado

    Preliminary Views on an improved Conceptual Framework for Financial Reporting:

    The Objective of Financial Reporting and Qualitative Characteristics of Decision-

    useful Financial Reporting Information. A este, seguiu-se, em maio de 2008, um

    Exposure Draft, sendo publicada a Estrutura Concetual revista em 2010.

    O IASB e o FASB publicaram ainda em conjunto um Discussion Paper em 2008 e um

    Exposure Draft em 2010 acerca do conceito da entidade que relata, discutiram as

    definies dos elementos das demonstraes financeiras e debateram e realizaram mesas

    redondas pblicas acerca de conceitos de mensurao. No entanto, o projeto conjunto

    foi suspenso em 2010.

    Em 2012, o IASB levou a cabo uma consulta pblica, na qual muitos respondentes

    identificaram a reviso da Estrutura Concetual como um projeto prioritrio, o que levou

    o IASB a retom-lo, embora desta feita sem a colaborao do FASB. Em julho de 2013,

    o IASB disponibilizou para comentrios um Discussion Paper sob o ttulo A Review of

    the Conceptual Framework for Financial Reporting.

    2.2.1. Anlise das alteraes introduzidas em 2010 Estrutura Concetual do IASB.

    A reviso do objetivo das demonstraes financeiras e das caratersticas qualitativas da

    informao financeira corresponde fase A do projeto levado a cabo em conjunto pelo

    IASB e pelo FASB. O projeto de reviso mostrou-se bastante controverso tendo sido

    alvo de vrias crticas (Whittington, 2008a; Whittington, 2008b; Cho et al., 2010;

    Zhang & Andrew, 2014; Murphy et al., 2013), uma vez que se verificou uma mudana

    na argumentao e linha de pensamento do IASB, seguindo uma linha de pensamento

    mais ao estilo do organismo norte-americano. Dada a dimenso da Estrutura Concetual

    do FASB e o forte input do seu staff, era de prever que prevalecessem as suas ideias e a

    sua forma de argumentao, o que esteve na origem de algumas crticas (Whittington,

    2008a). De seguida, sero apresentadas a alteraes aprovadas em 2010 no que respeita

    ao Captulo 1 da Estrutura Concetual, em relao ao objetivo das demonstraes

  • 10

    financeiras, e ao Captulo 3, em relao s caratersticas qualitativas da informao

    financeira.

    2.2.1.1. Objetivo das demonstraes financeiras

    O objetivo das demonstraes financeiras constitui a base da Estrutura Concetual

    (IASB, 2010, pargrafo OB1) e referido nos seguintes termos:

    O objetivo das demonstraes financeiras fornecer informao financeira

    sobre a entidade que relata que seja til para investidores existentes e

    potenciais, financiadores e outros credores na tomada de decises sobre o

    fornecimento de recursos para a entidade (IASB, 2010, pargrafo OB2).

    O objetivo das demonstraes financeiras est direcionado para os utilizadores que

    disponibilizam recursos entidade, investidores e credores. Na Estrutura Concetual

    anterior, bem como no Discussion Paper publicado em 2006, eram mencionados sete

    grupos de utilizadores da informao financeira. Para alm de investidores e credores,

    eram referidos fornecedores, empregados, clientes, o Estado e organismos reguladores e

    o pblico em geral (IASB/FASB, 2006, pargrafo OB6). No entanto, a verso final

    apenas refere os investidores e credores como utilizadores primrios, referindo que as

    demonstraes financeiras so principalmente dirigidas a estes (IASB, 2010, pargrafo

    OB10).

    Na mesma linha de pensamento da atual Estrutura Concetual, o Marco Concetual

    Espanhol (AECA, 1999), apesar de referir outros utilizadores da informao financeira

    para alm de investidores e credores, defende que, ao satisfazer as necessidades dos

    fornecedores de capital entidade, a informao contida nas demonstraes financeiras

    satisfaz muitas das necessidades de outros utilizadores.

    Murphy et al. (2013) argumentam que, consequncia da reviso da Estrutura Concetual

    de 2010, a responsabilidade que o relato financeiro tem para com utilizadores para alm

    dos investidores e credores saiu bastante enfraquecida, e alertam para o facto de a

    componente social da contabilidade estar a ser posta em causa se outros grupos de

    utilizadores deixarem de ser considerados utilizadores primrios. Zhang & Andrew

    (2014) acrescentam que o enfoque dado aos investidores e credores reflete a supremacia

    do FASB no processo de reviso da Estrutura Concetual de 2010, bem como o

    compromisso desse organismo para com os mercados de capitais.

  • 11

    Na opinio de Lennard & Loweth (2005), na Estrutura Concetual do IASB de 2010, o

    objetivo das demonstraes financeiras promove a assuno de que os investidores

    utilizam as demonstraes financeiras apenas para tomar decises de vender, comprar

    ou deter valores mobilirios, o que, por vezes, resulta em demonstraes financeiras de

    qualidade inferior. Os autores referem que o foco das demonstraes financeiras no

    deve ser fazer uma avaliao do valor da empresa, uma vez que, por mais til e

    relevante que esta seja, nunca ir fornecer informao suficientemente tempestiva e

    fundamentada para sustentar decises de investimento em aes da entidade. Lennard &

    Loweth (2005) acrescentam ainda que se o objetivo das demonstraes financeiras fosse

    apenas influenciar decises sobre comprar, vender ou deter aes da empresa, a forma

    mais til que as demonstraes financeiras poderiam assumir seria a forma de um

    sumrio das expectativas da gesto da entidade em relao ao futuro da mesma.

    Alm das mudanas introduzidas ao nvel dos utilizadores das demonstraes

    financeiras, colocando o enfoque principal nos investidores e credores da entidade, a

    Estrutura Concetual do IASB, revista em 2010, afasta o conceito de stewardship do

    rgo de gesto do mbito do objetivo fundamental das demonstraes financeiras. A

    Estrutura Concetual do IASB pr-2010 fazia referncia explcita ao conceito (IASB,

    2013, pargrafo 9.5):

    As demonstraes financeiras tambm mostram os resultados do stewardship

    ou da accountability do rgo de gesto pelos recursos que lhe so confiados.2

    Os utilizadores que desejam avaliar o stewardship ou a accountability do rgo

    de gesto fazem-no para que possam tomar decises econmicas ().

    No entanto, em 2006, o IASB mostrava, no Discussion Paper, a sua pouca vontade em

    manter o termo stewardship como objetivo distinto das demonstraes financeiras,

    defendendo a perspetiva de que as exigncias de stewardship se encontram englobadas

    na utilidade da informao para a tomada de decises econmicas, no sendo, por isso,

    necessrio distingui-lo separadamente (IASB/FASB, 2006, pargrafo BC1.36). Apesar

    de no texto final da Estrutura Concetual de 2010 no ser usado o termo stewardship, o

    IASB refere que no foi sua inteno remover o conceito do objetivo das demonstraes

    financeiras. Em vez de utilizar a expresso stewardship, o IASB decidiu explicar o seu

    significado, uma vez que se tinham verificado algumas dificuldades em traduzi-lo para

    2 Na Estrutura Concetual atualmente em vigor em Portugal, no pargrafo 14, as expresses stewardship e accountability foram

    traduzidas como zelo e responsabilidade, respetivamente.

  • 12

    outras lnguas (IASB, 2013, pargrafo 9.9). Tal como menciona Whittington (2008b,

    pp. 498-499), luz da Estrutura Concetual de 2010, as necessidades de stewardship

    assumem-se satisfeitas no objetivo da utilidade da informao financeira para a tomada

    de deciso. Esta perspetiva bastante criticada por vrios autores (Whittington, 2008a,

    2008b; Murphy et al., 2013) e no est a ser bem aceite principalmente em novos pases

    adotantes das IFRS (Whittington, 2008a).

    Whittington (2008a, 2008b) faz referncia teoria da agncia de modo a enfatizar a

    importncia do conceito de stewardship como um objetivo distinto da informao

    financeira. Refere que, uma vez que a gesto da entidade (agente) tem liberdade para

    tomar decises (podendo deturpar o desempenho da entidade), o acionista necessita

    monitorizar a forma como a gesto dos recursos da entidade est a ser realizada, da a

    importncia maior de incluir o conceito de stewardship na Estrutura Concetual da

    Contabilidade.

    Murphy et al. (2013) baseiam-se no conceito de living law para justificar a necessidade

    da incluso do conceito de stewardship como um objetivo distinto das demonstraes

    financeiras na Estrutura Concetual. O conceito de living law refere-se a normas e

    princpios morais e ao que socialmente aceite numa comunidade. Os autores defendem

    que o conceito de stewardship faz parte da living law desde que o Homem comeou a

    viver em sociedade e continua a fazer parte da tradio moral do relato financeiro. O

    stewardship tem permanecido na terminologia e conscincia seno nas propriedades

    formais da Estrutura Concetual (Murphy et al., 2013, p. 81). Murphy et al. (2013)

    defendem que, sendo o stewardship um objetivo central, a contabilidade tem um

    impacto benfico na evoluo da sociedade e associam a sua marginalizao onda dos

    recentes escndalos financeiros. Assim, o conceito de stewardship considerado

    essencial para restaurar a confiana da sociedade na contabilidade e na informao por

    ela produzida. No mesmo sentido, Lennard & Loweth (2005) mencionam que um erro

    considerar que as normas de contabilidade apenas exijam a divulgao de matrias cuja

    relevncia para a tomada de decises econmicas possa ser demonstrada, e acrescentam

    que a divulgao deve estender-se a aspetos do stewardship dos recursos da entidade.

    Tal como referem Whittington (2008b) e Zhang & Andrew (2014), a inteno de no

    introduzir o conceito de stewardship como parte integrante do objetivo fundamental da

    informao financeira revela a prevalncia do pensamento do FASB no projeto conjunto

    com o IASB de reviso da Estrutura Concetual e a importncia que os mercados de

  • 13

    capitais assumem nos EUA, onde as demonstraes financeiras se destinam

    principalmente a fornecer informao para os mercados de capitais. A posio final dos

    dois organismos resultou na Estrutura Concetual de 2010, em que o conceito de

    stewardship no consta do mbito do objetivo fundamental da informao financeira, o

    que revela, segundo Rayman (2010), a opo em reforar o argumento de que a

    utilidade da informao para a tomada de deciso o principal objetivo das

    demonstraes financeiras e o pilar essencial para o funcionamento dos mercados de

    capitais e para reduzir a tendncia de viso de curto prazo. luz da Estrutura Concetual

    do IASB de 2010, a responsabilizao do rgo de gesto secundarizada sendo dada

    prevalncia ao conceito de utilidade da informao financeira.

    2.2.1.2. Caratersticas qualitativas da informao financeira

    De modo a cumprir os seus objetivos e, consequentemente, garantir uma utilizao

    eficaz, a informao financeira deve reunir determinadas caratersticas qualitativas. De

    facto, as caratersticas qualitativas da informao financeira destinam-se a potenciar a

    sua utilidade, ou seja, potenciar a satisfao das necessidades dos utilizadores e, assim,

    assegurar o cumprimento dos objetivos da informao financeira (AECA, 1999).

    O Captulo 3 da Estrutura Concetual refere-se s caratersticas qualitativas da

    informao financeira. Estas aplicam-se informao financeira proporcionada pelas

    demonstraes financeiras, bem como informao financeira disponibilizada de outras

    formas (IASB, 2010, pargrafo QC3). Na verso pr-2010 da Estrutura Concetual do

    IASB, as caratersticas qualitativas da informao financeira referidas eram a

    compreensibilidade, a fiabilidade, a relevncia e a comparabilidade.

    A verso atual da Estrutura Concetual do IASB, resultante da reviso de 2010, distingue

    dois tipos de caratersticas qualitativas necessrias para proporcionar informao

    financeira til: as caratersticas qualitativas fundamentais e as caratersticas qualitativas

    de reforo. As primeiras dizem respeito relevncia e representao fidedigna, as

    segundas referem-se comparabilidade, tempestividade, verificabilidade e

    compreensibilidade, e servem de complemento s primeiras, de modo a reforar a

    utilidade da informao financeira. A Figura 1 apresenta as caratersticas qualitativas da

    informao financeira luz da atual Estrutura Concetual do IASB.

  • 14

    Figura 1 Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira

    2.2.1.2.1. As Caratersticas Qualitativas Fundamentais

    Relevncia

    A verso atual da Estrutura Concetual (de 2010), que resultou do projeto conjunto de

    reviso levado a cabo pelo IASB e pelo FASB, refere que a informao financeira

    relevante se for capaz de influenciar as decises dos utilizadores dessa informao,

    tendo dessa forma valor preditivo e/ou confirmatrio (IASB, 2010, pargrafos QC6-

    QC7). A informao financeira tem valor preditivo se puder ser usada para fazer

    previses sobre resultados futuros (IASB, 2010, QC8). No que respeita ao valor

    confirmatrio, a informao financeira deve ser capaz de avaliar previses feitas

    anteriormente, confirmando-as ou refutando-as (IASB, 2010, QC9). Por outro lado, a

    materialidade um aspeto da relevncia, na medida em que a informao material se,

    omitida ou deturpada, puder influenciar as decises que os utilizadores tomam com base

    nessa informao (IASB, 2010, pargrafo QC11).

    Cho et al. (2010) consideram esta definio de relevncia redundante e preferem uma

    segunda definio que, a par desta, estava contemplada no Exposure Draft de 2008

  • 15

    (IASB/FASB, 2008, pargrafo QC3), isto , a relevncia da informao financeira

    deveria ser definida como a pertinncia do fenmeno econmico selecionado para as

    decises dos utilizadores. Embora o Exposure Draft de Maio de 2008 apresentasse as

    duas definies anteriormente referidas (IASB/FASB, 2008, pargrafo QC3), a verso

    atual da Estrutura Concetual (resultante da reviso de 2010) contempla apenas a

    primeira. De acordo com Cho et al. (2010), a primeira definio, onde a relevncia

    vista como a pertinncia da informao financeira para as decises dos utentes,

    redundante pois no se distingue da definio de utilidade para a tomada de deciso,

    uma vez que a informao financeira capaz de influenciar uma deciso aquela que

    til para a tomada de deciso. Por outro lado, para estes autores a segunda definio, em

    que a relevncia vista como a pertinncia do fenmeno econmico selecionado para as

    decises dos utilizadores, mais consistente com o atual modelo em que a relevncia e

    a representao fidedigna so as caratersticas qualitativas fundamentais da informao

    financeira, uma vez que o compromisso entre a relevncia e a representao fidedigna

    s faz sentido na segunda definio, isto , a informao financeira s til para a

    tomada de deciso se representar de forma fidedigna o fenmeno econmico escolhido

    pelo utilizador.

    Representao Fidedigna

    Fruto da reviso da Estrutura Concetual em 2010, o termo fiabilidade deu lugar

    expresso representao fidedigna (que antes era um aspeto da fiabilidade), uma vez

    que se verificava alguma subjetividade na interpretao do mesmo (IASB, 2013). A

    informao financeira est fidedignamente representada quando apresenta fielmente o

    fenmeno econmico que se prope a representar e, assim, respeita trs aspetos:

    completa, neutra e isenta de erros (IASB, 2010, QC12).

    A informao financeira completa quando compreende toda a informao necessria

    para que o utilizador entenda o fenmeno apresentado, devendo ser includas todas as

    descries e explicaes de factos significativos acerca da qualidade e natureza dos

    itens, fatores e circunstncias que possam afetar a sua qualidade ou natureza e o

    processo usado para determinar a representao numrica (IASB, 2010, QC13). Uma

    representao neutra carateriza-se pela ausncia de influncia na seleo ou

    apresentao da informao financeira, ou seja, a informao no de qualquer forma

    enfatizada ou manipulada de modo a ser recebida favorvel ou desfavoravelmente pelos

  • 16

    utilizadores (IASB, 2010, QC14). Por fim, a iseno de erros significa que no existem

    erros nem omisses na representao do fenmeno, nem na seleo e aplicao do

    processo escolhido para produzir essa informao (IASB, 2010, QC15).

    De acordo com a Estrutura Concetual pr-2010, a informao financeira fivel quando

    isenta de erros e preconceitos materiais e representa fidedignamente o que pretende

    representar. Outros aspetos da fiabilidade eram a substncia sobre a forma, a

    neutralidade, a prudncia e a plenitude.

    A Tabela I apresenta uma comparao feita pelo IASB entre o conceito de fiabilidade

    utilizado na Estrutura Concetual pr-2010 e a expresso representao fidedigna

    utilizada na Estrutura Concetual aps a reviso. Como possvel constatar, os dois

    conceitos tm bastantes aspetos em comum: a neutralidade, a plenitude e a iseno de

    erros. Face alterao introduzida em 2010, o IASB explica que a nica diferena entre

    fiabilidade e representao fidedigna, que a segunda no faz referncia

    substncia sobre a forma nem prudncia (IASB, 2013). A expresso substncia sobre

    a forma foi retirada do texto da Estrutura Concetual de 2010 pois a sua utilizao

    poderia ser redundante, uma vez que a representao fidedigna implica que a

    informao financeira represente a substncia econmica de um fenmeno em vez de

    representar meramente a sua forma legal (IASB, 2013). Do mesmo, a prudncia no foi

    includa como um aspeto da representao fidedigna luz da Estrutura Concetual de

    2010, uma vez que a sua incluso seria inconsistente com a neutralidade (IASB, 2010).

    A prudncia representa a incluso de um grau de precauo no exerccio dos

    julgamentos necessrios ao elaborar as estimativas necessrias em condies de

    incerteza, de forma que os ativos ou os rendimentos no sejam sobreavaliados e os

    passivos ou os gastos no sejam subavaliados (IASB, 2010). Ora, de acordo com o

    IASB (2010), apresentar deliberadamente estimativas conservadoras (prudentes) de

    ativos e passivos, e das componentes do resultado num dado exerccio ter implicaes

    nos exerccios seguintes e esse comportamento no pode ser considerado neutro.

  • 17

    Tabela I Descrio de fiabilidade na Estrutura Concetual pr-2010 e de

    representao fidedigna na Estrutura Concetual ps-2010

    Estrutura Concetual pr-2010 Estrutura Concetual ps-2010

    Para ser til, a informao deve ser fivel. A

    informao fivel quando:

    isenta de erros e preconceitos

    materiais; e

    Possa ser considerada pelos

    utilizadores das demonstraes

    financeiras como representando o

    que se prope representar.

    Outros aspetos da fiabilidade:

    Substncia sobre a forma;

    Neutralidade;

    Prudncia; e

    Plenitude.

    Para ser til, a informao deve

    representar fidedignamente o que se

    prope representar. Uma representao

    perfeitamente fiel ser:

    Completa;

    Neutra; e

    Isenta de erros.

    Fonte: IASB (2013)

    As alteraes constantes da Tabela I, no mbito dos conceitos fiabilidade/representao

    fidedigna, foram alvo de crtica a nvel internacional (Whittington, 2008a; Zhang &

    Andrew, 2014). Zhang & Andrew (2014) defendem que esta alterao resulta numa

    mensurao cada vez mais dominada pelo justo valor, que coloca os mercados

    financeiros no centro da prtica contabilstica. Whittington (2008a) entende que a

    substituio de fiabilidade por representao fidedigna elimina a possibilidade de

    compromisso entre a relevncia e a fiabilidade, compromisso, esse, que muitas vezes

    era usado como argumento contra a utilizao do justo valor (pois a mensurao ao

    justo valor muitas vezes percebida como relevante mas pouco fivel). Para alm disso,

    a remoo da expresso isenta de erros e preconceitos materiais presente na definio

    de fiabilidade da Estrutura Concetual pr-2010 parece favorecer a utilizao da

    mensurao ao justo valor, que envolve mais estimativas e subjetividade, levando a

    erros e preconceitos (Whittington, 2008a). A favor da reintroduo do conceito de

    prudncia na Estrutura Concetual tm sido usados os argumentos de que esta

    importante para neutralizar o efeito de estimativas excessivamente otimistas de gesto e

    de que a sua remoo pode resultar no reconhecimento de ativos e ganhos incertos e o

    no reconhecimento de possveis passivos ou perdas (IASB, 2013).

  • 18

    Relao entre relevncia e representao fidedigna

    luz da Estrutura Concetual de 2010, para que a informao seja til, esta deve ser

    relevante e uma representao fidedigna da realidade que se prope representar. De

    outra forma, nem a representao fidedigna de um fenmeno irrelevante, nem a

    representao no fidedigna de um fenmeno relevante ajuda os utilizadores a tomar

    boas decises (IASB, 2010, pargrafo QC17). Tal como referem Cho et al. (2010) a

    informao financeira til est relacionada com o fenmeno econmico atravs da sua

    representao fidedigna, e afeta as decises dos utilizadores atravs da relevncia desse

    fenmeno.

    O Exposure Draft de maio de 2008 apresenta a relao entre a informao financeira, o

    fenmeno econmico e a tomada de deciso:

    Como caratersticas qualitativas fundamentais, a relevncia e a representao

    fidedigna trabalham juntas para contribuir para a utilidade da informao na

    tomada de deciso. A representao fidedigna de um fenmeno irrelevante no

    til, tal como a representao no fidedigna de um fenmeno relevante

    resulta em informao que no til na tomada de decises. () Juntas, a

    relevncia e a representao fidedigna tornam a informao financeira til para

    a tomada de decises. (IASB/FASB, 2008, pargrafo QC14).

    O pargrafo QC18 da Estrutura Concetual de 2010 expe o processo de aplicao das

    caratersticas qualitativas fundamentais: a relevncia deve ser considerada em primeiro

    lugar e s depois a representao fidedigna. Neste sentido, o mtodo contabilstico a

    utilizar ser o que proporcione maior relevncia, sendo depois sujeita essa seleo a um

    nvel mnimo de representao fidedigna (Whittington, 2008a). Whittington (2008a)

    argumenta que a substituio da expresso fiabilidade por representao fidedigna

    eliminou a possibilidade de compromisso pleno entre a relevncia e a fiabilidade, e

    limitou o mbito do compromisso possvel entre a relevncia e a representao

    fidedigna.

    2.2.1.2.2. As Caratersticas Qualitativas de Reforo

    luz da Estrutura Concetual do IASB de 2010, a comparabilidade, a tempestividade, a

    verificabilidade e a compreensibilidade so caratersticas qualitativas que tm como

    intuito reforar a relevncia e a representao fidedigna, que so as caratersticas

  • 19

    qualitativas fundamentais da informao financeira. Desta forma, as caratersticas

    qualitativas de reforo no so capazes de tornar til a informao financeira que no

    seja relevante ou fidedignamente representada, mas devem ser maximizadas, tanto

    individualmente como de forma combinada (Ernst&Young, 2010). A sua utilizao no

    necessita de seguir nenhuma ordem especfica, sendo que, por vezes, pode ser

    necessrio que uma delas seja reduzida para maximizar outra (IASB, 2010, QC34).

    A comparabilidade permite aos utilizadores da informao financeira identificar

    semelhanas e diferenas entre itens das demonstraes financeiras, em diferentes

    perodos de tempo ou entre diferentes entidades. A aplicao de mtodos e polticas

    contabilsticas de forma consistente contribui para a comparabilidade da informao

    financeira (Ernst&Young, 2010). No entanto, a Estrutura Concetual do IASB (2010,

    QC22) alerta para o facto da comparabilidade e a consistncia no terem o mesmo

    significado. A consistncia refere-se ao uso dos mesmos mtodos para itens

    semelhantes, pela mesma entidade ao longo do tempo ou entre entidades num

    determinado perodo. Do mesmo modo, a comparabilidade tambm no significa o

    mesmo que a uniformidade (IASB, 2010, QC23). Hendriksen e Van Breda (1992)

    referem, relativamente uniformidade e consistncia, que a comparao entre duas

    entidades depende da primeira e a comparao de diferentes perodos de relato de uma

    mesma entidade funo da segunda. No entanto, estes autores alertam que o objetivo

    deve ser a comparabilidade e no a uniformidade, dado ser cada vez mais comum o uso

    de formatos estandardizados de demonstraes financeiras por diferentes entidades. J a

    consistncia necessria ao longo do tempo, por forma a diminuir a dificuldade em

    fazer previses (Hendriksen e Van Breda, 1992).

    A verificabilidade um novo conceito includo na Estrutura Concetual fruto da reviso

    realizada em 2010, sendo que a informao financeira verificvel quando possvel a

    observadores independentes e experientes chegarem a um consenso geral sobre se a

    representao de determinada transao ou acontecimento uma representao

    fidedigna (Ernst&Young, 2010). A verificao pode ser feita de duas formas:

    diretamente, atravs da observao direta de um montante ou representao, como por

    exemplo, contagem de dinheiro; ou indiretamente, utilizando modelos, frmulas ou

    outras tcnicas, como por exemplo, relativamente aos inventrios, utilizar o valor e as

    quantidades das existncias iniciais para calcular o valor e as quantidades finais, atravs

    do mesmo mtodo de custeio (IASB, 2010, QC27). A verificabilidade implica, para

  • 20

    alm da divulgao das quantias que descrevem o fenmeno, a divulgao dos

    pressupostos que lhe esto subjacentes, os mtodos de recolha da informao e outros

    fatores e informao que sejam relevantes. O IASB optou por colocar a verificabilidade

    como uma caraterstica qualitativa de reforo e no como um aspeto da representao

    fidedigna, uma vez que uma caracterstica desejvel, mas no necessariamente exigida

    (IASB, 2013). Como exemplo, o IASB refere estimativas que no podem ser

    diretamente verificadas, mas fornecem informao relevante e, por isso, so importantes

    e devem ser divulgadas.

    A tempestividade, apesar de estar contemplada na Estrutura Concetual pr-2010 como

    constrangimento informao financeira til, aparece agora como caraterstica

    qualitativa de reforo e apresenta um conceito mais amplo. Antes, a tempestividade

    referia-se ao facto da informao perder a sua relevncia se for disponibilizada com

    atraso (Freitas, 2007). Contudo, fornecer informao atempada implica, por vezes, que

    esta seja apresentada antes de se conhecerem todos os aspetos de determinada transao

    ou acontecimento, o que prejudica a fiabilidade. Por outro lado, a informao pode

    perder a sua relevncia se demorar at que se conheam todos os aspetos da transao

    ou acontecimento (Freitas, 2007). A informao tempestiva agora vista como aquela

    que capaz de influenciar a tomada de deciso pelos utilizadores, em vez de evidenciar

    apenas o equilbrio entre o relato atempado e a informao de confiana (Ernst&Young,

    2010).

    A compreensibilidade diz respeito informao financeira que classificada,

    caraterizada e apresentada de uma forma clara e concisa (IASB, 2010, QC30). No

    entanto, a Estrutura Concetual do IASB de 2010 refere que a informao se destina

    principalmente a utilizadores com conhecimentos na rea dos negcios, tendo estes, por

    vezes, de recorrer tambm ao aconselhamento de profissionais da contabilidade para

    entender situaes mais complexas.

    2.2.1.3. Constrangimentos informao financeira til

    As caratersticas qualitativas apresentadas anteriormente contribuem em conjunto para a

    utilidade da informao financeira. Contudo, a obteno de informao financeira til

    tambm apresenta constrangimentos. A Estrutura Concetual do IASB pr-2010 referia a

    tempestividade e a relao custo-benefcio como constrangimentos informao

    financeira til. Na verso atual da Estrutura Concetual, no mbito dos constrangimentos

  • 21

    informao financeira til, foi eliminada a tempestividade (sendo agora uma

    caraterstica qualitativa de reforo), mantendo-se apenas como constrangimento a

    relao custo-benefcio, isto , fundamental que os benefcios decorrentes da

    informao financeira excedam os custos inerentes sua preparao (Ernst&Young,

    2010).

    Os custos relativos informao financeira so suportados tanto a montante como a

    jusante. De um lado esto os preparadores da informao financeira que incorrem em

    custos na recolha, processamento, verificao e divulgao da informao; do outro

    lado, surgem os utilizadores que incorrem em custos na anlise e interpretao da

    informao financeira ou em custos de obter informao adicional atravs de outras

    fontes (IASB, 2010, QC36). Salazar et al. (2006) salientam a dificuldade de avaliao

    da relao custo-benefcio, pelo facto dos custos no serem necessariamente suportados

    por aqueles que usufruem dos benefcios, sendo um processo que envolve juzos de

    valor. Por isso, ao desenvolver normas de contabilidade, o IASB ir considerar os

    custos e benefcios da informao financeira de um modo mais geral (IASB, 2010,

    QC39).

    Apesar da relao custo-benefcio constar como um constrangimento informao

    financeira til, h cada vez mais um entendimento de que, independentemente dos

    custos com a sua preparao, a informao financeira til promove o eficaz

    funcionamento dos mercados de capitais e reduz o custo de capital para a entidade que a

    relata (Ernst&Young, 2010).

    2.3. Estrutura Concetual do IASB de 2010 versus Estrutura Concetual do SNC

    2.3.1. Estrutura Concetual em vigor em Portugal

    A adoo do SNC em 2010, que tem por base as IAS, veio substituir o POC, trazendo

    grandes alteraes em termos concetuais e terminolgicos. Na opinio de Guimares

    (2007), o SNC veio trazer uma melhoria significativa da Estrutura Concetual da

    Contabilidade, como suporte terico fundamental da prtica contabilstica.

    A Estrutura Concetual atualmente em vigor em Portugal, baseada na Estrutura

    Concetual do IASB pr-2010, tem como finalidade estabelecer os conceitos subjacentes

  • 22

    preparao das demonstraes financeiras. O seu propsito o de (Aviso n.

    15652/2009, pargrafo 2):

    a) ajudar os preparadores das demonstraes financeiras na aplicao das Normas

    Contabilsticas e de Relato Financeiro (NCRF) e no tratamento de tpicos que

    ainda tenham de constituir assunto de uma dessas Normas;

    b) ajudar a formar opinio sobre a aderncia das demonstraes financeiras s

    NCRF;

    c) ajudar os utentes na interpretao da informao contida nas demonstraes

    financeiras preparadas; e

    d) proporcionar aos que estejam interessados no trabalho da Comisso de

    Normalizao Contabilstica (CNC) informao acerca da sua abordagem

    formulao das NCRF.

    A Estrutura Concetual do SNC, semelhana da do IASB, no uma NCRF e, por isso,

    a mesma tanto para as entidades que utilizam as NCRF como para as entidades mais

    pequenas que utilizam a NCRF-PE (Normas Contabilsticas e de Relato Financeiro para

    Pequenas Entidades). A este respeito Guimares (2007, p. 49) refere o seguinte:

    Com efeito, sendo a EC o referencial terico do normativo contabilstico

    evidente que a mesma independente quer da dimenso das unidades

    econmicas (entidades) quer das suas necessidades de relato financeiro. Ou

    seja, por exemplo, os conceitos de ativo, passivo, capital prprio, rendimentos

    e gastos so os mesmos para os dois nveis de normalizao.

    A Estrutura Concetual do SNC aborda o objetivo das demonstraes financeiras, as

    caratersticas qualitativas da informao financeira til, a definio, reconhecimento e

    mensurao dos elementos das demonstraes financeiras e os conceitos de capital e

    manuteno de capital.

    Relativamente ao objetivo das demonstraes financeiras, a Estrutura Concetual do

    SNC refere o seguinte: O objetivo das demonstraes financeiras o de proporcionar

    informao acerca da posio financeira, do desempenho e das alteraes na posio

    financeira de uma entidade que seja til a um vasto leque de utentes na tomada de

    decises econmicas (Aviso n. 15652/2009, pargrafo 12). Para tal, as demonstraes

  • 23

    financeiras devem ser preparadas de acordo com o regime do acrscimo e o pressuposto

    de continuidade.

    Como utentes das demonstraes financeiras a Estrutura Concetual do SNC refere os

    investidores, empregados, mutuantes, fornecedores, clientes, o Estado e o pblico em

    geral, ainda que nem todas as necessidades de informao destes utilizadores possam

    ser satisfeitas pelas demonstraes financeiras. Para alm disso, a Estrutura Concetual

    refere o rgo de gesto como tendo a responsabilidade pela preparao das

    demonstraes financeiras.

    A Estrutura Concetual do SNC apresenta quatro caratersticas qualitativas principais: a

    compreensibilidade, a relevncia, a fiabilidade e a comparabilidade. A materialidade

    um aspeto da informao financeira relevante. Por outro lado, para ser fivel, a

    informao financeira necessita ser uma representao fidedigna das transaes ou

    outros acontecimentos que lhe so subjacentes, atender ao princpio da substncia sobre

    a forma e da prudncia, ser neutra e plena. As caratersticas qualitativas preconizadas na

    Estrutura Concetual do SNC j no esto em consonncia com a Estrutura Concetual do

    IASB, devido reviso que esta sofreu em 2010.

    Como constrangimentos informao financeira relevante e fivel a Estrutura

    Concetual do SNC apresenta a tempestividade, uma vez que se a informao for

    disponibilizada com atraso pode perder a sua relevncia, o balanceamento entre

    benefcio e custo e o balanceamento entre caratersticas qualitativas. Assim, a aplicao

    das caratersticas qualitativas e das normas contabilsticas de forma adequada resultam

    normalmente na transmisso, por parte das demonstraes financeiras, de uma imagem

    verdadeira e apropriada da posio financeira, do desempenho e das alteraes da

    posio financeira da entidade (Aviso n. 15652/2009, pargrafo 46). A Figura 2

    apresenta as caratersticas qualitativas da informao financeira enunciadas na Estrutura

    Concetual em vigor em Portugal, baseadas nas caratersticas qualitativas indicadas pelo

    IASB na sua Estrutura Concetual pr-2010.

  • 24

    Figura 2 Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira do SNC

    De acordo com o pargrafo 81 da Estrutura Concetual do SNC (Aviso n. 15652/2009),

    o reconhecimento de um item deve ser efetuado quando for provvel que qualquer

    benefcio econmico futuro associado ao item flua de ou para a entidade e se o seu custo

    puder ser mensurado com fiabilidade. Quanto mensurao, a Estrutura Concetual do

    SNC apresenta diversas bases: o custo histrico, o custo corrente, o valor realizvel, o

    valor presente e o justo valor.

    Apesar de se basear na Estrutura Concetual do IASB, a Estrutura Concetual do SNC no

    se encontra em conformidade com esta, devido reviso realizada pelo IASB em 2010.

  • 25

    2.3.2. Comparao da Estrutura Concetual do IASB de 2010 e da Estrutura

    Concetual do SNC

    A reviso realizada pelo IASB em 2010 Estrutura Concetual deu origem a diversas

    alteraes nos captulos relativos ao objetivo das demostraes financeiras e s

    caratersticas qualitativas da informao financeira, j analisadas no ponto 2.2.1. deste

    relatrio. Dado que a Estrutura Concetual do SNC se baseia na Estrutura Concetual do

    IASB pr-2010, torna-se pertinente examinar as implicaes das alteraes no contexto

    portugus, estabelecendo uma comparao entre a Estrutura Concetual do SNC e a

    Estrutura Concetual do IASB atualmente em vigor. A Tabela II apresenta a comparao

    estabelecida para o objetivo das demonstraes financeiras e a Tabela III para as

    caratersticas qualitativas.

    Tabela II Objetivo das Demonstraes Financeiras IASB vs SNC

    IASB (2010) SNC (Aviso n. 15652/2009)

    Fornecer informao financeira sobre a

    entidade que seja til a investidores

    existentes e potenciais, financiadores e

    outros credores para a tomada de deciso

    sobre o fornecimento de recursos para a

    entidade.

    Os investidores e credores so os

    utilizadores primrios. Outras partes

    podem ter interesse na informao,

    mas esta no dirigida a elas.

    Stewardship: o conceito deixou de

    constar do texto da Estrutura

    Concetual, sendo clarificado que o

    modo como o rgo de gesto exerce

    a sua responsabilidade na gesto dos

    recursos da entidade est implcito na

    utilidade da informao financeira

    para a tomada de deciso.

    Proporcionar informao acerca da

    entidade que seja til a um vasto leque de

    utentes na tomada de decises

    econmicas.

    Investidores atuais e potenciais

    Empregados

    Mutuantes

    Fornecedores

    Outros credores comerciais

    Clientes

    Governo e seus departamentos

    Pblico

    Stewardship: zelo e responsabilidade

    do rgo de gesto pelos recursos da

    entidade.

  • 26

    Tabela III Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira IASB vs SNC

    IASB (2010) SNC (Aviso n. 15652/2009)

    Caratersticas

    Qualitativas

    Caratersticas qualitativas

    fundamentais:

    Relevncia

    Representao fidedigna

    Caratersticas qualitativas de

    reforo:

    Comparabilidade

    Verificabilidade

    Tempestividade

    Compreensibilidade

    Relevncia

    Fiabilidade

    Compreensibilidade

    Comparabilidade

    Relevncia

    A informao capaz de fazer a

    diferena nas decises tomadas

    pelos utilizadores: valor preditivo

    e confirmatrio.

    Materialidade: a informao

    material se omitida ou distorcida

    puder influenciar as decises que

    os utilizadores tomam com base

    na informao financeira.

    A informao influencia as

    decises tomadas pelos

    utilizadores: funo preditiva e

    confirmatria.

    Materialidade: a informao

    material se a sua omisso ou

    inexatido influenciarem as

    decises econmicas dos utentes,

    tomadas na base das

    demonstraes financeiras.

    Fiabilidade

    O conceito de Fiabilidade foi

    substitudo por Representao

    Fidedigna.

    O IASB verificou existir uma falta

    de entendimento comum do

    conceito de Fiabilidade,

    entendendo que Representao

    Fidedigna traduz melhor o

    conceito pretendido e contm as

    qualidades-chave contidas na

    Fiabilidade.

    A informao fivel quando

    estiver isenta de erros materiais e

    preconceitos e os utentes dela

    possam depender ao representar

    fidedignamente o que pretende

    representar ou se pode esperar que

    represente. Para ser fivel a

    informao financeira tem de

    respeitar as seguintes

    caractersticas:

    Representao Fidedigna

    Substncia sobre a forma

    Neutralidade

    Prudncia

    Plenitude

    Representao

    Fidedigna

    A informao deve representar

    fidedignamente o fenmeno que

    se prope representar. Para isso, a

    informao deve ser:

    Completa

    Neutra

    Isenta de erros

    Conceito associado fiabilidade,

    significando que a informao

    deve representar fidedignamente

    as transaes que pretende

    representar ou possa

    razoavelmente esperar-se que

    represente.

  • 27

    Tabela III Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira IASB vs SNC

    (continuao)

    IASB (2010) SNC (Aviso n. 15652/2009)

    Substncia

    sobre a

    Forma

    O IASB excluiu do texto da

    Estrutura Concetual a expresso

    substncia sobre a forma, na

    medida em que o seu uso seria

    redundante, pois o conceito de

    representao fidedigna j tem

    implcito que a informao

    financeira representa em primeiro

    lugar a substncia econmica do

    fenmeno.

    Conceito associado fiabilidade.

    As transaes e outros

    acontecimentos que tenham por

    fim representar devem ser

    contabilizados e apresentados de

    acordo com a sua substncia e

    realidade econmica e no

    meramente com a sua forma legal.

    Neutralidade

    A neutralidade passou a estar

    associada representao

    fidedigna, significando a ausncia

    de preconceitos na seleo ou

    apresentao da informao

    financeira.

    Uma representao neutra se

    no for inclinada, ponderada,

    (des)enfatizada, ou manipulada

    para aumentar a probabilidade de

    ser recebida (des)favoravelmente

    pelos utilizadores.

    Conceito associado fiabilidade.

    A informao financeira tem de

    ser livre de preconceitos.

    A informao no neutra se

    influenciar a tomada de uma

    deciso ou um juzo de valor a fim

    de atingir um resultado ou um

    efeito predeterminado.

    Prudncia

    O IASB excluiu do texto da

    Estrutura Concetual o conceito de

    prudncia, por considerar que

    pode enviesar as demonstraes

    financeiras e entrar em conflito

    com a neutralidade.

    Conceito associado fiabilidade.

    Incluso de um grau de precauo

    no exerccio dos juzos

    necessrios ao fazer as estimativas

    necessrias em condies de

    incerteza.

    Plenitude

    A Estrutura Concetual faz

    referncia expresso

    informao completa, sendo

    uma caraterstica associada

    representao fidedigna e

    significando que abrange toda a

    informao necessria, incluindo

    todas as explicaes necessrias,

    para que um utilizador

    compreenda o fenmeno

    representado.

    Conceito associado fiabilidade.

    A Estrutura Concetual do SNC faz

    referncia materialidade e ao

    custo: a informao deve ser

    completa dentro dos limites da

    materialidade e do custo.

  • 28

    Tabela III Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira IASB vs SNC

    (continuao)

    IASB (2010) SNC (Aviso n. 15652/2009)

    Compreensibilidade

    Caraterstica qualitativa de

    reforo. Pressupe que a

    informao classificada e

    apresentada de forma clara,

    concisa, e compreensvel.

    Presume-se que os utilizadores

    tm conhecimentos mnimos de

    contabilidade e acerca das

    atividades econmicas,

    conseguindo analisar com

    diligncia a informao.

    A informao deve ser

    rapidamente compreensvel

    pelos utentes.

    Presume-se que os utentes

    tenham um razovel

    conhecimento das atividades

    empresariais e econmicas e da

    contabilidade e vontade de

    estudar a informao com

    razovel diligncia.

    Comparabilidade

    Caraterstica qualitativa de

    reforo, julgada importante mas

    no fundamental para a relevncia

    e representao fidedigna da

    informao financeira. Representa

    a possibilidade de comparar

    informao financeira da mesma

    entidade ao longo do tempo e com

    informao de outras entidades.

    A consistncia nas polticas

    contabilsticas um meio para

    aumentar a comparabilidade.

    Possibilidade de comparar a

    informao financeira da

    mesma entidade ao longo do

    tempo, e com informao de

    outras entidades.

    A mensurao e exposio dos

    efeitos financeiros de

    transaes e outros

    acontecimentos semelhantes

    devem ser realizados de forma

    consistente pela entidade ao

    longo do tempo, e de maneira

    consistente para diferentes

    entidades.

    Verificabilidade

    Caraterstica qualitativa de

    reforo, que implica que

    observadores experientes e

    independentes com conhecimento

    devam conseguir alcanar

    consenso, de que uma

    representao particular de um

    fenmeno econmico uma

    representao fidedigna.

    A verificao pode ser direta ou

    indireta, e implica, para alm da

    divulgao das quantias que

    descrevem o fenmeno, a

    divulgao dos pressupostos que

    lhe esto subjacentes, os mtodos

    de recolha da informao e outros

    fatores relevantes.

    A Estrutura Concetual do SNC

    no faz referncia

    verificabilidade.

  • 29

    Tabela III Caratersticas Qualitativas da Informao Financeira IASB vs SNC

    (continuao)

    IASB (2010) SNC (Aviso n. 15652/2009)

    Tempestividade

    Caraterstica qualitativa de

    reforo, que implica ter

    informao disponvel para os

    decisores a tempo de ser capaz

    de influenciar as suas decises.

    A informao tempestiva

    apenas til se for revelante e

    uma representao fidedigna.

    Se houver demora indevida no

    relato da informao ela pode

    perder a sua relevncia.

    um constrangimento

    informao financeira til (e

    relevncia). Para se conseguir

    uma ponderao entre a

    relevncia e a fiabilidade a

    considerao dominante a de

    como melhor satisfazer as

    necessidades dos utentes.

    Tabela IV Constrangimentos Informao Financeira til IASB vs SNC

    IASB (2010) SNC (Aviso n. 15652/2009)

    Constrangimentos

    informao til

    O IASB, na Estrutura

    Concetual, apenas faz

    referncia ao custo como

    constrangimento informao

    financeira til.

    Os custos incorridos no relato

    da informao financeira

    devem ser justificados pelos

    benefcios de relatar essa

    informao.

    Dificuldade em fazer anlises

    custo-benefcio inerentes ao

    processo de relato financeiro.

    Custos para os preparadores da

    informao: colher, processar,

    verificar, e disseminar a

    informao.

    Custos para os utilizadores:

    analisar e interpretar a

    informao disponibilizada e

    obter informao adicional por

    outras vias.

    Tempestividade

    Balanceamento entre

    caratersticas qualitativas

    Balanceamento entre

    benefcio e custo: os

    benefcios derivados da

    informao devem exceder

    o custo de a proporcionar.

    Existe dificuldade em fazer

    o teste custo-benefcio do

    processo de relato

    financeiro.

  • 30

    2.4. Propostas de alterao para as restantes partes da Estrutura Concetual:

    Anlise do Discussion Paper de 2013 do IASB

    O projeto conjunto do IASB e do FASB de reviso da Estrutura Concetual havia sido

    suspenso em 2010. No entanto, muitos dos respondentes a uma consulta pblica levada

    a cabo pelo ISAB em 2011 identificaram-no como um projeto prioritrio. Assim, o

    IASB, desta feita sem a colaborao do FASB, pretende rever a atual Estrutura

    Concetual, sobretudo nas partes que no foram objeto de reviso em 2010, uma vez que

    de opinio de que a atual verso da Estrutura Concetual apresenta alguns problemas.

    A verso atual apresenta parca orientao nas reas da mensurao, da apresentao e

    divulgao da informao financeira, ou na forma de identificao da entidade que

    relata; as definies de ativo e passivo podem ser melhoradas; e alguns aspetos esto

    desatualizados e no refletem a atual linha de pensamento do IASB, como por exemplo

    no que se refere ao facto de o reconhecimento de um ativo ou passivo depender de

    benefcios econmicos futuros (IASB, 2013).

    Este projeto tem como objetivo dotar a Estrutura Concetual do IASB de conceitos

    completos e atualizados, que o IASB possa utilizar quando desenvolve ou rev as IFRS,

    o que, consequentemente melhorar as demonstraes financeiras (IASB, 2013). O

    primeiro passo para a nova fase de reviso da Estrutura Concetual foi a emisso de um

    Discussion Paper sob o ttulo A Review of the Conceptual Framework for Financial

    Reporting, disponibilizado em julho de 2013 para obter os pontos de vista e comentrios

    de partes interessadas. Os comentrios sero considerados pelo IASB, que ir

    desenvolver e publicar em 2014 um Exposure Dratf, com base nesses comentrios,

    contendo as propostas de reviso. Prev-se que em 2015 o IASB emita a nova Estrutura

    Concetual revista.

    O Discussion Paper (IASB, 2013) prope alteraes em vrias reas da Estrutura

    Concetual do IASB de 2010. As prximas seces deste trabalho dedicam-se anlise

    dessas alteraes.

    2.4.1. Objetivo principal da Estrutura Concetual

    A Estrutura Concetual estabelece os conceitos adjacentes preparao e apresentao

    das demonstraes financeiras (IASB, 2013). Relativamente aos seus objetivos

    fundamentais, a Estrutura Concetual do IASB de 2010 apresenta uma extensa lista. O

  • 31

    Discussion Paper (IASB, 2013) refere que uma lista to extensa de objetivos

    desnecessria, propondo que o principal objetivo da Estrutura Concetual revista seja

    auxiliar o IASB na identificao de conceitos que este usar consistentemente no

    desenvolvimento de novas IFRS ou na reviso das normas j existentes. Apesar de o

    objetivo principal da Estrutura Concetual estar direcionado para o IASB, este alude para

    o facto de a Estrutura Concetual tambm auxiliar outras partes interessadas na

    compreenso e interpretao das IFRS e no desenvolvimento de polticas contabilsticas

    quando no houver uma norma ou interpretao acerca de determinada transao ou

    acontecimento.

    2.4.2. Definio de Ativo e Passivo

    As atuais definies de ativo e passivo so as seguintes (IASB, 2010, pargrafo 4.4):

    Um ativo um recurso controlado pela entidade, decorrente de acontecimentos

    passados e do qual se espera que benefcios econmicos futuros fluam para a

    entidade.

    Um passivo uma obrigao presente da entidade, decorrente de

    acontecimentos passados, de cuja liquidao se espera que resulte um exfluxo

    de recursos da entidade, incorporando benefcios econmicos futuros.

    As atuais definies referem-se a benefcios econmicos esperados, o que de acordo

    com o IASB (2013) leva, por vezes, confuso entre o recurso ou a obrigao em si e o

    influxo ou exfluxo resultante de benefcios econmicos. Assim, o Discussion Paper

    (IASB, 2013) prope que as definies de ativo e passivo sejam melhoradas, de modo a

    estabelecer que um ativo um recurso e no o influxo de benefcios econmicos que o

    recurso pode gerar, e que um passivo uma obrigao e no o exfluxo de benefcios

    econmicos que a obrigao pode gerar. Adicionalmente, o Discussion Paper prope

    que as definies esclaream que os ativos e passivos devem ser capazes de gerar,

    respetivamente, influxos e exfluxos de benefcios econmicos, mas que estes influxos e

    exfluxos no so certos e que a sua probabilidade no necessita alcanar um limite

    mnimo para que o ativo ou passivo cumpra a respetiva definio.

    Segundo o IASB (2013), as definies atuais de ativo e passivo incorporam a noo de

    incerteza, na medida em que os benefcios econmicos futuros so esperados e no

    certos. O mesmo acontece relativamente aos critrios de reconhecimento, em que um

    ativo ou passivo deve ser reconhecido se for provvel que os benefcios econmicos

  • 32

    futuros associados iro fluir para ou da entidade. Na proposta de reviso, o IASB da

    opinio de que a noo de incerteza no deve ser includa nas definies de ativo e

    passivo, pois dessa forma muitos itens que so claramente ativos seriam excludos do

    reconhecimento, tais como opes de compra. O IASB apresenta trs argumentos contra

    a incluso da incerteza nas definies de ativo e passivo: a existncia de incerteza rara,

    pelo que no necessrio estabelecer um princpio para poucos casos; permitir juzos de

    valor apropriado em normas baseadas em princpios, como o caso das normas

    emitidas pelo IASB; e se para uma situao particular a incerteza for significativa, o

    IASB decidir como lidar com a incerteza ao desenvolver ou rever normas relacionadas

    com a situao em causa (IASB, 2013).

    Assim, as definies propostas clarificam que no necessrio que seja certo que um

    recurso econmico venha a produzir benefcios econmicos futuros, mas este deve ser

    capaz de os produzir. Do mesmo modo, no necessrio que seja certo que uma

    obrigao presente resulte na transferncia de um recurso econmico, mas essa

    obrigao deve ser capaz de resultar na transferncia de recursos econmicos. As

    definies propostas no especificam um limite mnimo de probabilidade para os casos

    em que existe incerteza quanto existncia de um ativo ou passivo, j que, se assim

    fosse, poderia resultar em informao no relevante nem verificvel (IASB, 2013).

    As definies propostas no Discussion Paper so as seguintes (IASB, 2013, pargrafo

    2.11):

    Um ativo um recurso econmico presente, controlado pela entidade como

    resultado de acontecimentos passados.

    Um passivo uma obrigao presente de a entidade transferir um recurso

    econmico como resultado de acontecimentos passados.

    Um recurso econmico um direito, ou outra fonte de valor, que capaz de

    produzir benefcios econmicos.

    Na definio de ativo, o IASB (2013) prope acrescentar o termo presente, que j

    consta da definio de passivo, apesar de este conceito estar implcito na atual definio

    de ativo. Do mesmo modo, o IASB prope manter, em ambas as definies, a expresso

    resultado de acontecimentos passados, uma vez que o acontecimento passado que deu

    origem ao ativo ou passivo pode ajudar a classificar ganhos ou gastos presentes

    decorrentes desse acontecimento.

  • 33

    De modo a fornecer maior orientao acerca das definies, o IASB sugere definies

    para os conceitos de controlo, no caso da definio de ativo, e de obrigao presente,

    transferncia de um recurso econmico e obrigao construtiva, no caso da definio

    de passivo. Para alm disso, o IASB prope orientaes no que se refere divulgao

    da substncia de direitos e obrigaes contatuais e relativamente a contratos executrios

    (IASB, 2013, pargrafo 3.3).

    2.4.3. Reconhecimen