16
Contexto o Jorn al-laboratório do curso de Jornalismo da Unesp _ ano 25 n° 47 _ outubro de 2009 PÁGINA 3 CRISE NO SENADO: SOLUÇÕES GIRAM EM TORNO DE MUDANÇAS ESTRUTURAIS PÁGINAS 8 E 9 EURECA! COMO UMA PITADA DE CRIATIVIDADE MUDA TUDO PÁGINA 11 RECEITA SUSTENTÁVEL: APRENDA A FAZER LÂMPADAS COM GARRAFAS PET

Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Jornal Laboratório de Estudantes de Jornalismo da UNESP/Bauru.

Citation preview

Page 1: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Con

text

ooJo

rnal

-lab

orat

ório

do

curs

o de

Jorn

alis

mo

da U

nesp

_ a

no 2

5 n°

47

_ ou

tubr

o de

200

9

Página 3Crise no senado: soluções giram em torno de mudanças estruturais

Páginas 8 e 9eureCa! Como uma Pitada de Criatividade muda tudo

Página 11reCeita sustentável: aPrenda a fazer lâmPadas Com garrafas Pet

Page 2: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 20092 Contextoo

Olho no FuturoDo fogo à luz elétrica. A luz sempre esteve

presente em todas as etapas da evolução hu-mana, acompanhando o homem das cavernas aos dias atuais. Esta é uma edição do Contexto que olha para a frente.

Olha para a crise política que assola o Sena-do Nacional, mas com a perspectiva de haver uma luz no fim do túnel. Ainda em política, o que pensam os pequenos partidos, que não estão sob os holofotes da mídia, mas que pre-tendem marcar presença nas eleições presi-denciais do ano que vem. Eleições que sempre afetam diretamente a economia e o dia a dia de milhões de brasileiros, que esperam do go-verno federal melhorias pelo país com o PAC e a possibilidade de poder olhar, com clareza, para o futuro. No âmbito local, o bauruense quer saber quando vai poder andar com segu-rança em uma cidade melhor iluminada. Afi-nal, todos pagam pela iluminação pública da cidade, porém em muitos bairros a realidade é bem diferente.

Quando pensamos no futuro, logo lembra-mos de Educação, que traz como destaque o método de ensino braile, que permite aos de-ficientes visuais o acesso à leitura e ao conhe-cimento. A editoria traz ainda uma matéria sobre o método Waldorf de ensino, que incen-

Editor GEralthiaGo Navarro

ChEfE dE rEdaçãoflávia Sato

Editora dE artEaNdrEa KlaCzKo

diaGramaçãoKariN Kimura/ diEGo SEGura

StEfhaNiE PiovEzaN

iluStraçõESaNtoNio fErNaNdES /BruNo CaNdEiaS

CaroliNE GomES /dora BoNadio orioN Gorrão m. CamPoS

Editora dE fotoGrafiamariNa WataNaBE

fotóGrafoSmarCuS Silva/ laíS moNtaGNaNa

rEviSãomariNa CuGlEr / dêNiS dE lima

rEBECa Corrêa

Editora dE PolítiCamariaNa rodriGuES

rEPórtErESENio lourENço/ fouad matuCK

Editora dE ECoNomiatalita GoBBi

rEPórtErESPâmEla PErEz / Nádia Pirillo

Editora dE EduCaçãodaNiEllE NaGaSE

rEPórtErESCamila Sayuri/ rEGiNa ColoN

Editora dE SoCialamaNda raBElo

rEPórtErESalaNa CarrEr/ aNa CaroliNa amaral

Editora dE ComPortamENtofraNCiS NEvES

rEPórtErESadriaNa arruda/ mElliNa ChEmiNaNd

rEPortaGEm ESPECial marCEl vErrumo/ Eloíza foNtES

Editor dE CiêNCia E tECNoloGiafEliPE CaStro

rEPórtErESrENato olívio/ thiaGo KoGuChi

Editora dE EColoGiaGaBriEla GiNi

rEPórtErESmurillo PErEira/ mariNa vEroNEzE

Editora dE ESPortESNatália PaSSafaro

rEPórtErESthaíS luquESi/ lidiaNE orEStES

Editora dE CulturaaNaiza SEliNGardi

rEPórtErESlauro martiNS NEto/ luCaS SoarES

PErfilPriSCila GomES

PoStalÉlCio PadovEz/ flaviaNa dE frEitaS

rEtiCêNCiaSfEliPE matoS

ExPEdiçãoPaulo GomES NEtto/ GaBriEl BarBoSa

JorNaliStaS rESPoNSávEiSluCiaNo GuimarãES mtB 28.132

mauro dE Souza vENtura mtB 6235

CaPafotoGrafia

marCuS SilvaProdução

laíS moNtaGNaNa

Jornal-laboratório Produzido Pelos alunos do 6º termo do Curso de ComuniCação soCial - Jornalismo Período diurno da unesP.

Contextoo

tiva desde a infância a criatividade nas ativi-dades escolares. Conheça também um pouco mais do trabalho realizado por instituições filantrópicas, que estão sempre buscando de-volver a dignidade àqueles que já não tinham mais esperança. E nada melhor do que levantar o astral falando de otimismo e vida noturna, com o trabalho daqueles que ganham a vida enquanto a maioria dorme.

Conheça pessoas que usam a imaginação e a criatividade para melhorar de vida, a e importân-cia destes atributos para o sucesso pessoal e pro-fissional. Em Ciência e Tecnologia, saiba mais sobre a maior rede de computadores da América Latina, presente na Unesp de Bauru. E ainda, um novo tratamento para doenças da pele e dos dentes. Em Esportes, a paixão dos torcedores pelos seus clubes em uma época marcada pelo profissionalismo crescente do futebol. E também um exemplo de dedicação dado pelos deficientes visuais que superam todas as dificuldades para praticar esportes. Em Cultura, o crescimento dos festivais de cinema no Brasil e o fenômeno do stand up comedy.

Para fechar, um perfil diferente e uma viagem pela Turquia, país de cultura milenar. Afinal, só olhando o passado, poderemos pensar no futuro. Boa leitura!

rEitorHerman Jacobus cornelis Voorwald

dirEtor da faaCroberto deganutti

CoordENador do CurSo dE JorNaliSmoPedro celso camPos

ChEfE do dEPartamENto dE ComuNiCação SoCialluiz augusto teixeira ribeiro

ProfESSorES oriENtadorESluciano guimarãesmauro de souza Ventura

ENdErEçocontextodePartamento de comunicação socialFaac - unesPaV. eng. luiz edmundo carriJo coube, 14-01ceP: 17033-360bauru/sP

tElEfoNE(14) 3103 - 6000

[email protected]

fotolito E imPrESSãoFullgraPHics

Foto

: Mar

ina

Wat

anab

e

Foto: Marina Watanabe/CONTEXTO Arte: Andrea Klaczko/ CONTEXTO

Edit

oria

l

Page 3: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 2009 3Contextoo

zam do mandato, por ser de oito anos, para concorrer a eleições do executivo de seus estados. Sendo assim eles teriam a garantia do cargo, em caso de derrota”.

Por outro lado, há aqueles que veem mudanças de outro modo.

Escândalo, corrupção, nepotis-mo, favorecimento e quebra de decoro são palavras totalmente incorporadas ao vocabulário polí-tico brasileiro. Nos últimos meses, o grande palco para estes aconte-cimentos foi o Senado Federal. A instituição parece se envolver mais em violações de conduta ético-moral, do que fazer o que realmente lhe é de dever.

No Brasil, o parlamento funcio-na com o modelo bicameral, ou seja, existem duas casas: Câmara dos Deputados e Senado Fede-ral. O Senado é a câmara alta do Congresso Nacional brasileiro. As atividades do Senado estão dire-tamente vinculadas à natureza financeira do ordenamento do te-souro da União e à disposição so-bre questões administrativas a fim de referendar propostas vindas do poder executivo e da Câmara dos Deputados, onde são aprovadas, alteradas e revogadas as leis.

A crise no senado é intensa e co-meça com seu principal represen-tante. O atual presidente do Sena-do, José Sarney (PMDB-AP), após denúncias publicadas em jornais, sofreu sete acusações no Conselho

de Ética do Senado. Elas foram desde o seu envolvimento em atos secretos para a criação de cargos até o desvio de dinheiro da Petrobras, passando por tráfi-co de influências e nepotismo.

Parlamento biCameral:funCional ou imPliCante?

Diante dessa situação, o deba-te para possíveis soluções acaba girando em torno de mudanças estruturais no parlamento. O historiador Maximiliano Vicente acredita que não existe a necessi-dade de um Congresso Nacional com duas casas por existir uma Câmara que já garante a repre-sentatividade de todos os estados. Entretanto, ele acredita que o modelo unicameral, caso extinto o Senado, deveria se aperfeiçoar “para garantir maior representa-tividade a estados que estão mal representados, como São Paulo, que deveria ter mais deputados”.

Na mesma linha, o presidente do Diretório Municipal do PSDB de Bauru, Gilson Rodrigues, de-fende o modelo unicameral, pelo fato do Congresso atual “tornar o processo legislativo lento, já que existe um jogo político entre as

duas casas e suas composições para se aprovarem as propostas”. Outra questão a ser levada em consideração é o trampolim elei-toral que o Senado pode sugerir. Rodrigues ressalta que “senado-res de regiões afastadas se utili-

O vereador bauruense Roque Ferreira (PT) acha que “o proble-ma não é discutir se o Senado é bicameral ou se vamos ter uma composição unicameral, mas sim a quem serve essas instituições”. Roque acredita que este seja um problema de natureza política e que poderia ser solucionado facil-mente pelo presidente Lula, “Se eu tivesse o poder do presidente e estivesse comprometido com a classe trabalhadora e suas reivin-dicações, convocaria uma Assem-bléia Nacional Constituinte que colocasse as demandas do prole-tariado e através dela promove-ria uma ruptura com os partidos burgueses colocando em xeque o status quo e a organização da so-ciedade”.

Enquanto as proposições de políticos e especialistas surgem, o povo brasileiro aguarda. O debate em torno do caso Sarney começa a esfriar e os acordos entre situação e oposição continuam acontecendo. As legendas se perdem em meio a todos os escândalos e os arqui-vamentos parecem ser sempre o destino final dos processos. Talvez as esperanças estejam em 2010 ou em qualquer ato ou pessoa que consiga colocar ordem na casa.

Era uma casa muito engraçada...Especialistas e políticos sugerem alguns possíveis destinos para o Senado Federal

Onde os fracos não têm vezPartidos menores lançam candidatura própria para as eleições 2010

Crédito: Bruno CandeiasÊnio Lourenço

PV, PSB, PC do B, PSOL e PSTU não querem ser coadju-vantes nas eleições de 2010. No cenário político atual, uma das grandes protagonistas é Marina Silva, que deixou o PT para con-correr à presidência pelo Partido Verde. Embalados pelo discurso

de oposição ao Governo Lula, o PSTU deve lançar José Maria de Almeida como candidato à vice-presidência na chapa do PSOL de Heloísa Helena, candidata pela segunda vez ao Planalto Fe-deral. O PSB tentará emplacar Ciro Gomes para a presidência e o PC do B, Protógenes Queiroz para o Senado.

Fouad Matuck

Conheça os Candidatos...Imagens: Andrea Klaczko

As propostas de Marina Silva vêm ganhando forças ao conseguir o apoio da classe empresarial. São exemplo disso, a recente filiação ao PV de empresários de destaque na-cional como Guilherme Leal, pre-sidente da Natura, Ricardo Young, presidente do Instituto Ethos, e Roberto Klabin, diretor-executivo da Klabin e do SOS Pantanal. No

entanto, para o cientista político Jefferson Goulart, a candidatu-ra de Marina Silva ainda é uma incógnita: “Por si, o PV não seria um ator de primeira constelação, mas é evidente que com Marina há potenciais alterações no qua-dro sucessório cujo alcance é difícil prognosticar com segurança”. Para Goulart, a concorrente do PV deve

afetar diretamente a candidata do Governo, Dilma Roussef: “Marina também é mulher, e assim como Dilma foi ministra de Lula, além de uma histórica vinculação com o PT e seu ideário. Não bastasse isso, no imaginário social tem uma grande identificação com a trajetória do presidente: a origem humilde e a ligação com as boas causas”.

Política

Page 4: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 20094 Contextoo

Gastos públicos cresceram quase 50 biAumento de 16% nas despesas e redução das receitas faz superávit cair quase 60%

Pâmela Perez

Conta de luz pode ficar mais cara em Bauru

Administração pública considera arrecadação atual insuficiente para investimentos em novos projetos de iluminação

Nádia Pirillo

Bauru é uma das 3400 cidades brasileiras que cobra uma taxa para investimentos em iluminação pública: a chamada CIP, que sig-nifica “Contribuição para Iluminação Públi-ca”. Atualmente, o valor da CIP no muni-cípio é de R$ 3,00, mas ela pode sofrer um aumento de mais de 60% e ficar próxima dos R$ 4,50.

O prefeito de Bauru, Rodrigo Agostinho (PMDB), explica que o aumento é necessá-rio porque os 300 mil reais arrecadados atual-mente pela prefeitura com a CIP não suprem as despesas. “O valor que é cobrado atual-mente é insuficiente pra pagar as despesas gastas pelo município e acaba não sobrando dinheiro pra se investir em novos projetos de iluminação”.

Segundo o economista José Ricardo Carri-jo, quando os gastos do município são maio-res que a arrecadação, há duas saídas possíveis: aumentar o valor da arrecadação ou reduzir os gastos do município. “Como reduzir os gastos da cidade é algo complicado, visto que a demanda de investimentos de um municí-pio é alta, a população tem que arcar com os gastos, pagando mais na conta”, explica o economista. Porém, isto não é uma condição apenas do município: o Brasil é um dos paí-ses que mais cobram impostos da população. Um levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), mostra que o valor dos tributos arrecadados em 2008, que foi de R$ 1,056 trilhão, representa mais de 36% do PIB brasileiro, estimado em R$ 2,89 trilhões.

Plano muniCiPal

Em Bauru, a prefeitura estuda ampliar o número de casas isentas da taxa de ilumina-ção de 10 mil para 20 mil, passando o limite de isenção dos atuais 60 quilowatts para 70 quilowatts. O aumento na conta de luz para

as outras residências seria propor-cional a quanto cada família gasta por mês, ou seja, quanto maior o consumo de energia, maior o va-lor da CIP na conta de luz.

Um levantamento feito pela CPFL (Companhia Paulista de Força e Luz), no começo do ano e entregue no final de maio para a prefeitura, apontou as regiões mais deficitárias em abastecimen-to energético na cidade, que cor-respondem aos bairros da região oeste e centro-leste de Bauru. Dentre eles, está o Bairro Maram-bá, na região do Camélias, onde reside o encanador Oscar Lemos. Para o morador “compensa pagar a mais na conta, desde que a cida-de ganhe realmente novos pontos de iluminação”. A dona de casa Célia dos Santos acredita que “os casos de assalto e violência pode-riam diminuir se algumas ruas de Bauru fossem mais iluminadas”.

Rodrigo Agostinho explica que a prioridade são os locais próxi-mos a escolas, avenidas e regiões com grande índice de criminali-dade. É o caso da Avenida Duque de Caxias, onde as lâmpadas estão sendo trocadas por um tipo mais eficiente, chamado de vapor me-tálico. A lâmpada tem um valor maior, porém sua potência é me-lhor.

O plano de iluminação da pre-feitura está previsto pra ser fecha-do até o final desse mandato. A ideia, segundo o prefeito, é inves-tir 6,5 milhões de reais em ilumi-nação, prevendo a troca de 14 mil lâmpadas e a instalação de 3 mil novos pontos de iluminação.

O superávit primário - econo-mia da União, dos Estados e mu-nicípios - caiu 57,7% de janeiro a agosto em comparação com o mesmo período de 2008, segundo o Banco Central. A economia de quase R$ 44 bilhões está abaixo da expectativa do governo, que redu-ziu a meta de superávit de 3,8% para 2,5% do PIB.

Apesar de ser a principal vilã da diminuição das receitas que ban-cam o resultado primário, a crise econômica não foi a única prota-gonista da queda: somente neste ano, os gastos públicos cresceram quase R$ 50 bilhões.

as desPesas

De acordo com o Tesouro Na-cional, durante os oito primeiros meses do ano as despesas com pessoal e encargos cresceram mais de R$ 15 bilhões. O aumento do salário mínimo e do número de beneficiários acrescentaram mais R$ 4,8 bi à conta. Outros R$ 11,6 bilhões foram somados aos gas-tos com despesas discricionárias, aquelas em que o governo pos-sui poder de decisão conforme as prioridades. Por fim, a Previdência Social aumentou seus encargos em quase R$ 16 bi, especialmente por conta do reajuste salarial e da ele-vação de benefícios.

Segundo o economista José Go-bbo Jr., o aumento de custos com pessoal e Previdência são mais preocupantes, pois não se pode revertê-los reduzindo os salários. Até agosto, as verbas destinadas à Previdência e ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) represen-taram 72% dos gastos do Governo Central. Apesar do peso, no fim de agosto foram enviados 13 projetos à Câmara que podem aumentar em 2 bilhões os gastos com paga-mento de servidores.

Embora as contas demonstrem a necessidade de revisão de gastos públicos, reformas impopula-res não são esperadas em vir-tude das eleições. Para 2010, o governo prevê um cresci-mento de mais R$ 52 bilhões no orçamento, incluindo um aumento de 9% no salário mínimo.

as reCeitas

Outro fator responsável pela diminuição do superávit primário foi a diminuição das receitas em 0,8% em agosto frente ao mesmo período de 2008. Trata-se da décima que-da mensal consecutiva.

De acordo com a Receita Federal, as renúncias fiscais concedidas pelo governo como medida para atenuar os efeitos da crise são a principal causa

(gráfico). Além das desonerações, houve redução da lucratividade das empresas e queda no preço in-ternacional do petróleo. (gráfico)

as ConsequênCias

Segundo Gobbo, a redução do superávit primário pode gerar a falta de recursos para pagar os juros da dívida pública, fazendo com que haja uma expectativa de aumento dos juros. “Se o governo consumir mais recursos, restará menos crédito para o setor priva-do investir, o que acarretaria uma

diminuição da oferta de emprego. Assim, pode haver uma redução da atividade econômica”.

Apesar da consequência drástica, o economista acredita que o gover-no deve reverter o quadro e levar o país rumo a um futuro mais ilumi-nado. Entre as atitudes possíveis estão a fiscalização mais rigorosa pela Receita Federal, a promoção do trabalho formal para aumentar as receitas com Imposto de Renda e a abolição dos incentivos fiscais. “Creio que o aumento de impostos está fora de cogitação. A solução é

diminuir as renúncias fiscais e os gastos com custeio e manutenção da máquina pública”.

De acordo com o especialista em contas públicas, Valdemir Pires, “o período de perdas de receitas pú-blicas ficou reduzido e agora a re-tomada começa, salvo algum novo problema internacional. Mas, o próximo round para a saída da crise se concentrará nas contas pú-blicas: até que ponto as medidas de incentivo precisarão e poderão continuar sem reduzir a capacida-de do governo para intervir?”.

Foto

: Mar

cus

Silv

a/C

ON

TEX

TOIlustração: C

aroline Gom

es/CO

NTE

XTO

Economia

Page 5: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 2009 5Contextoo

Quando se fala em educação é fundamental que ela esteja asso-ciada à questão da inclusão. Inde-pendente das dificuldades e limi-tações de cada pessoa, todos têm o direito de aprender e adquirir conhecimentos. Fundamentado nessas questões, o sistema Braille permite que pessoas com defici-ência visual possam ler e escrever. O alfabeto é convencional, po-rém seus caracteres são redigidos em alto relevo para que a pessoa leia com a ponta dos dedos.

O método Braille nasceu na França. Seu inventor, Lou-is Braille (1809-1842) teve seu olho atingido por um instrumen-to pontiagudo enquanto brincava na oficina de seu pai aos três anos de idade. Aos cinco, complica-ções fizeram com que ele perdesse totalmente a visão. Seu empenho em continuar os estudos o fez in-gressar, aos dez anos, no Instituto para Jovens Cegos de Paris, onde futuramente também seria pro-fessor.

Braille não se conformava com os métodos de estudo da época, que consistiam em decorar con-ceitos, e resolveu criar seu próprio sistema. Em 1825 estava criado o sistema que foi batizado com o seu nome, porém sua adoção e implantação ocorreram de forma lenta e desordenada pelo mundo. A pedagoga com atuação no ensi-no de deficientes visuais, Luciane

Barbosa, conta que “demorou al-gum tempo para que esse sistema fosse aceito e adotado como o método de escrita para cegos. O reconhecimento veio após a mor-te de Braille”.

Com a utilização de seis pon-tos em relevo, dispostos em duas colunas verticais, é possível fazer até 63 combinações que podem

Método de ensino Waldorf desafia a necessidade técnica e aposta no desenvolvimento humanístico

Respeitar o desenvolvimento natural da criança é o objetivo de qualquer escola Waldorf. A filo-sofia de ensino, criada em 1919 pelo filósofo Rudolf Steiner, mostra-se uma das mais preocu-padas com as questões humanas.

De acordo com o método, o crescimento acontece a cada sete anos, chamados de setênios. O primeiro - dos 0 ao 7 anos - é caracterizado pela descoberta e vontade, ou seja, a criança co-meça a descobrir o mundo ao seu redor e, através da imitação de exemplos, passa a formar seu conhecimento. Respeitando essa fase do desenvolvimento, a peda-gogia Waldorf desenvolve práti-cas que vão ajudar na formação dos sentidos da criança. Deve-se a isso também, o fato da alfabe-tização só ter início depois desse primeiro setênio, pois uma vez desenvolvido o lado sensorial é que a fase técnica será apresen-tada.

No Ensino Fundamental – dos 7 aos 14 anos – a fase é a da intui-ção e a criança passa a lidar com

Além da grade curricular, que em muito difere das escolas tra-dicionais, o método Waldorf não aceita que o aluno leve alimen-tos industriais e assim, o lanche escolar deve ser natural. Outra característica, talvez a principal, é o caráter familiar.

A universitária Agata Takya Rodriguez foi educada desde o jardim em uma escola Waldorf e a primeira frase que disse para caracterizar o método foi relacio-nado à participação da família: “Para você estar na Waldorf, seus pais tem que estar também”. As escolas Waldorf são mantidas por uma instituição sem fins lu-crativos, então todo o valor ar-recadado é investido diretamente na escola. Dessa forma, para que não haja lucro e assim, gastos, os próprios pais ajudam nas tarefas extras, como na preparação das peças de teatro, excursões e qual-quer atividade que tenha necessi-dade. Esse caráter é avisado des-de a matrícula do aluno e caso os pais não aceitem, não tem como a criança permanecer na esco-la. Harmi Takya, mãe de Agata, confirma essa exigência: “É uma

suas aptidões através da imagina-ção. As atividades são todas ba-seadas na capacidade natural de imaginar o mundo, desenvolven-do o lado intelectual do aluno, que a partir do segundo setênio tem aulas de línguas estrangei-ras, música, teatro, dança, arte, trabalho corporal e artesanato. O intuito é oferecer experiências que ajudarão a formar a criança.

No terceiro e último setênio – dos 14 aos 21 anos – o ado-lescente desenvolve seu senso crítico. Com um Ensino Médio de quatro anos, a pedagogia Wal-dorf oferece aulas sem separação de áreas de conhecimento. Ci-ência, tecnologia, arte e filosofia se misturam, dando uma visão global do aprendizado. É nesse período que acontece a maior parte das oficinas, em que o alu-no tem contato com atividades e instrumentos diferentes ao aluno comum, como argila, litografia, encadernação, música, pintura e tecnologia. Ao final dos ensinos, é formado o “homem integral” (expressão da filosofia Waldorf ), uma pessoa desenvolvida física, psíquica e espiritualmente.

O ser humano como prioridade

Camila Sayuri

Regina Colon

Foto: Marcus Silva / C

ON

TEXTO

representar letras simples e acen-tuadas, pontuações, algarismos, sinais matemáticos e até mesmo notas musicais. O professor do método Braille do Lar Escola Santa Luzia para Cegos da cida-de de Bauru, Jorge Lopes, explica que para fazer os pontos no pa-pel, utiliza-se um equipamento chamado reglete, acompanhado de uma espécie de alfinete cha-mado punção. A reglete consiste

em uma prancha e uma régua com duas linhas, onde estão dispostas várias celas Braille, ou seja, as janelas com os seis furos. Para formar os relevos, a escrita é feita da direita para a esquerda, do lado de baixo do papel. O Lar Escola Santa Luzia foi fundado há 40 anos e, além de ensinar o método Braille, realiza atividades

de artesanato, teatro e música.Para alfabetizar uma pessoa

pelo método Braille é necessário primeiramente treinar e aguçar seu tato. Luciane Barbosa chama essa fase de “período preparatório ou pré-leitura”, que conta com atividades que utilizam materiais variados quanto à textura, forma e tamanho. “Esse estágio é muito importante e essencial para a alfa-betização Braille, pois o relevo no

papel exige movimentos precisos, cuja riqueza de detalhes pode ser decisiva para o reconhecimento de uma letra, um sinal de pontu-ação, entre outros”, explica.

Rafael Rodrigues, 20, é um dos alunos do Lar Escola Santa Luzia. Ele perdeu a visão aos 12 anos e começou a ter contato com o mé-todo há dois. Ele conta que no

escola que exige muito dos pais e se você não estiver envolvido, não será a mesma coisa para seu filho. Mas há transparência de tudo, da mesma forma que você participa, a escola também re-torna com informações do que acontece”.

Tanto a filha quanto a mãe estão mais que satisfeitas com a educação Waldorf, mas reconhe-cem os pontos negativos, como por exemplo, a falta de conteúdo técnico, necessário para um ves-tibular. “Tudo pode ser resolvido com um curso pré-vestibular”, de-fende Har-

mi. Agata também defende: “É muito fácil passar de ano, basta ser esforçado. Vi muita gente saindo de lá sem saber fazer con-ta. Mas estou muito feliz com a educação que tive. Quando tiver meus filhos, quero a mesma coisa para eles”.

Certamente todo método de ensino tem seus pontos positivos e negativos. “Todo aluno Wal-dorf é bom de ritmo”, conclui Harmi. Esse método não visa a formação acadêmica e sim a for-mação de cada ser humano.

Com quase 200 anos de existência, o método Braille proporciona acessibilidade aos deficientes visuais

alunos da 1ª série do Ensino Fun-damental até o 3° ano do Ensino Médio. Esses alunos frequentam as salas de aula convencionais e em outro período do dia, na Sala de Recursos, a professora Sale-te Maria de Lima transcreve os textos, exercícios de sala e lições de casa para o Braille. Ela conta que o tempo de alfabetização em Braille é variável de criança para criança e é muito importante o auxílio da família nesse processo.

Mas aprendizado não se res-tringe somente a aprender a ler e escrever, é necessário haver con-tato com livros e materiais para treinar o conhecimento adquiri-do. Jorge afirma que atualmente é possível encontrar praticamente todos os títulos da literatura, além de apostilas e algumas revistas em Braille. Além disso, a informáti-ca é outro recurso importante ao qual deficientes visuais podem ter acesso, através de um software chamado DOSVOX, um sistema computacional baseado no uso intensivo de síntese de voz, que se destina a facilitar o acesso de deficientes visuais a microcom-putadores.

Em 2009 o sistema Braille está em festa. Este ano, comemora-se o bicentenário de seu criador e se-rão realizadas comemorações em homenagem ao método que am-pliou o acesso ao conhecimento, ao aprendizado e à cultura.

começo sua maior dificuldade era decorar o alfabeto Braille, pois já sabia ler e escrever do modo con-vencional, mas aos poucos foi se adaptando e é considerado pelo professor Jorge um aluno mui-to esforçado e empenhado em aprender.

Outra instituição em Bauru que trabalha com o apoio aos de-ficientes visuais é a Escola Esta-dual Mercedes Paes Bueno, para

Lendo no escuro

Educação e inclusão caminham de mãos dadas

O método Waldorf valoriza a arte e a música na formação do intelecto

Fotos: Marcus Silva / C

ON

TEXTO

Educação

Page 6: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 20096 ContextooSocial

Um empurrão para se levantarLeitura de auto-ajuda oferece terapia para todos os males

Não é fácil definir uma data exata para quando as pessoas co-meçaram a ver a auto-ajuda como uma alternativa para a resolução dos mais diversos tipos de pro-blemas - desde vícios em algu-mas substâncias até o conhecido transtorno obsessivo compulsivo (TOC). Mas é fato que, há alguns anos, a expressão tem se torna-do cada vez mais corriqueira e perpassa as mais diversas formas,

como grupos presenciais e livros. Estes últimos têm se tornado populares e, não raro, muitos deles se tornam best-sellers. Um exemplo é o livro de auto-ajuda O Segredo, de Rhon-da Byrne, um dos maiores fenômenos editoriais dos últimos anos, lançado no Brasil em 2007. Segundo Mônica Marques, doutora em Comunicação e Semi-ótica pela PUC-SP, para

a Revista Nures da PUC-SP, “o livro vem propagandeando a tese de que somos aquilo em que pen-samos. Pensamentos bons atraem coisas boas, sentimentos ruins, coisas más, e assim por diante”.

A auto-ajuda, como próprio nome já sugere, se diferencia das demais formas de auxílio psico-lógico, pois é a pessoa quem se conscientiza da melhor forma de resolver seu problema. “(Na auto-ajuda) você mesmo estará fazendo o trabalho. É você quem

traça o caminho. Ao contrário da psicologia, na qual o paciente terá o auxílio de um profissional qualificado”, comenta Ribeiro, que pondera: “ a auto-ajuda tam-bém está presente na psicoterapia como outra forma de auxiliar o paciente”.

A literatura de auto-ajuda abor-da os mais variados tipos de pro-blemas, desde relacionamentos, trabalho, até casos graves como depressão. A maior parte deles traz uma história na qual se coloca

uma mensagem otimista e reflexi-va que estimula o leitor a superar aquela situação. Sobre a eficácia desses materiais como forma de superar problemas, a psicóloga do Centro de Psicologia Aplicada da UNESP Telma Maria Ribeiro explica que “sua pertinência está muito mais ligada ao momento pessoal de quem procura esse tipo de ajuda, pois se o indivíduo ainda não tiver amadurecido a situação o suficiente, de pouco adiantará a mensagem dos livros”.

Um espelho de palavrasEnxergar-se no outro é o que ilumina as reuniões dos grupos de ajuda mútua

“Preciso conversar com outro bê-bado”. No filme My name is Bill W (em português, O Valor da Vida) é a partir dessa frase que Bill descobre como controlar o alcoolismo. Ele criou, em 1935, o Alcoólicos Anô-nimos (A.A.), presente em mais de 180 países e inspirador de outras associações: Narcóticos, Neuróti-cos, Codependentes, Emocionais, Dependentes de Amor e Sexo, Trabalhadores Compulsivos, Co-medores Compulsivos, Fumantes, Devedores, Fóbicos Sociais. Em comum, mais que o anonimato: a ajuda mútua.

Mais do que já vimos nas nove-las, quando um ou dois episódios

Na sala de reuniões dos Al-coólicos Anônimos de Bauru, “eu sou responsável” é a frase de maior destaque na parede, título de uma oração. Por ela se resume uma ajuda centrada na ação do próprio doente: ele tem autonomia sobre seu tra-tamento. Para o professor da Universidade Estadual Paulis-ta e pesquisador dos Direitos Humanos, Clodoaldo Mene-ghelo, a terapia em grupo fun-ciona porque traz o aspecto social de um problema que o indivíduo acreditava ser pesso-al. “Facilita o tratamento por-que o enfrentamento se torna político, indo para a dimensão de sujeito coletivo.” O profes-sor explica que participando ativa e socialmente, o doente é sujeito da ação, e não apenas paciente.

Derivando do termo “pas-sivo”, o conceito de paciente impõe uma relação de sujeito e objeto entre o médico e o doente, em que apenas o mé-dico poderia alcançar a cura.

Alana Carrer

Ana Carolina Amaral pensar como agirão em cada dia, seguindo algumas recomendações que evitam o primeiro passo em direção ao erro. “Pergunte para qualquer membro qual princípio estava seguindo quando teve uma recaída: nenhum” ilustra o coorde-nador dos Alcoólicos Anônimos de Bauru. “Os princípios do A.A. em-basam nossa sobriedade, enquanto as experiências divididas nas reuni-ões nos fortalecem para continuar-mos sóbrios”, ele conclui. Como Osório, todos os coordenadores dos grupos de ajuda mútua sentem na pele o problema que os outros membros enfrentam. A maior par-te dessas instituições segue princí-pios semelhantes, não se envolven-do em outras questões públicas e, claro, preservando a identidade dos membros. Talvez porque não importe o nome do outro quando olhamos para nós mesmos.

ouvir é se identificar. “Muitas vezes ouvimos acontecimentos ruins, que refletem um passado a que não queremos voltar, um presente de que queremos sair, um futuro a que não queremos chegar. Colocando-nos no lugar do outro, negamos que possa acontecer conosco e nos fortalecemos para evitar isso.” Mas para Osório o que mais ilumina esse espelho são os depoimentos dos sóbrios, que trazem dicas para fugir das recaídas e os frutos que colhem por terem parado de beber. “É neles que nos espelhamos”, sor-ri. E como se a busca pela resposta estivesse no fundo do espelho, uma placa piscava em luzes vermelhas no fundo da sala dos A.A. de Bau-ru: evite o primeiro gole hoje.

Só por hoje

As reuniões são constantes e para a vida toda. Esse é um dos consen-sos entre a maioria das associações de terapia em grupo, já que não vêem cura para as perturbações mentais. Procuram, portanto,

pessoas cabisbaixas, mal vestidas e com vontade de chorar também deve ficar para as novelas. O A.A. de Bauru tem reuniões diárias e em plena noite de segunda-feira mais de 20 pessoas coloriam uma reu-nião. Coloriam: homens, mulhe-res, jovens, idosos, terno e gravata, bermuda e chinelo, bêbados de baixa renda, sóbrios bem sucedi-dos. Oito delas pediram a palavra, o tempo de cada um é sempre de dez minutos. Soa a campainha e, ao final do depoimento, o anôni-mo recebe em coro um “obrigado” em que mais uma vez a sinceridade é sentida, quase que como método de tratamento.

Funciona como um espelho. Para Osório, coordenador do A.A. de Bauru, dividir experiências é um método eficaz de ajuda porque “os membros enfrentam os mesmos problemas, suas mentes combatem os mesmos pensamentos, então eles sempre se identificam com as histórias”. Ele explica que falar para os companheiros de reunião é ad-mitir para nós mesmos, enquanto

mostraram um personagem nos Narcóticos Anônimos ou nas Mu-lheres que Amam Demais: as salas de reuniões desses grupos são claras, pintadas com palavras fortes. Os veteranos sorriem de cabeça levan-tada, falam sem medo, acolhem o novato que adentra a reunião. Não questionam, julgam ou pergun-tam, mas querem ouvi-lo. Querem sinceramente e é sinceridade o que esperam dele. Não poderiam se de-finir por outra palavra que não fos-se “irmandade”: em uma reunião de ajuda mútua, basta dizer seu pri-meiro nome para ganhar de todos a torcida pela recuperação - além da expectativa, quase um cobrança, de ser visto na próxima reunião.

A cena de uma sala com algumas

De mãos atadasDoentes são reduzidos a objetos em instituições de

tratamentos forçados

“O superpoder do médico faz um diagnóstico passivo da do-ença. Sem diálogo, o louco era um objeto sem nenhuma capa-cidade de autonomia”, acusa Clodoaldo, defensor da luta antimanicomial. O raciocínio segue a influência de um dos psiquiatras mais discutidos do mundo. Para o italiano Franco Basaglia, “a psiquiatria, desde seu nascimento, é em si uma técnica altamente repressiva que o Estado sempre usou para oprimir os doentes pobres”.

Em artigo científico publi-cado na revista Rubedo, o pes-quisador Eduardo Vasconcelos defende que os tratamentos psiquiátricos devem se livrar do asilamento e da violência institucionalizada. Para isso, o empoderamento do doente e sua família deixa nas mãos do médico apenas o que é de sua alçada. Assim o paciente, que “lavava as mãos” para o trata-mento, torna-se sujeito do seu problema. E tem nas mãos a solução.

Ilustração: Dora Bonadio/C

ON

TEXTO

Page 7: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 2009 7Contextoo Comportamento

“No meio do caminho tinha uma pedra”. Não é a toa que esse verso, escrito por Carlos Drum-mond de Andrade, tornou-se tão conhecido e utilizado para exemplificar o quanto é comum o surgimento de certos problemas. Todos nós queremos nos livrar daquela situação complicada o mais rápido possível, mas será que a solução é encontrada tão facil-mente?

De acordo com o psicólogo Angelo Abrantes, “a psicologia e o centro individual, de maneira isolada, não possuem o poder de fazer com que as pessoas superem dificuldades”. Assim, é preciso que o indivíduo entenda sua his-tória e a cultura em que está inse-rido para começar o processo de superação.

A força para enfrentar obstácu-los nasce em função de redes de apoio e da relação de cada um com a sociedade. Angelo ainda completa: “Nos momentos de crise conseguimos parar e refletir sobre os atos”.

Não há receita pronta para se conseguir o sucesso perante uma barreira. A fé, constantemente citada por pessoas que sofrem, não ausenta a dor, mas reconforta alguns corações. “A religião fun-ciona como instrumento de supe-ração com determinados limites”, afirma o psicólogo.

Apesar de passar por grandes obstáculos, muitos conseguem enfrentá-los e seguir adiante com muitos sonhos e grande otimismo. Logo, todos possuem a capacida-de de superação, que depende do esforço pessoal e de fatores sociais. Essa mistura de sobriedade conse-gue tirar a tal pedra do caminho, mas também nos prepara para outras possíveis pedras perante a nebulosa estrada da vida.

Acordar cedo, tomar café e ir trabalhar: essa é a rotina da maior parte das pessoas. Porém, existe uma parcela da população que não segue essa rotina. São pessoas que quando a cidade adormece começam a trabalhar ou estudar, seja por opção ou necessidade.

Dentre muitas queixas, a mais comum é em relação à qualidade do sono e à dificuldade de repor a noite perdida. Amarildo Aprígio é vigilante noturno há 25 anos, e desde então não dorme antes das 7 horas da manhã. “O sono durante o dia ajuda, mas não descansa. Sempre acordo mal-humorado, cansado e se tiver barulho é ainda pior”, afirma Aprígio, que começou a trabalhar durante a noite por necessidade. Já o músico Paulo César Gomes, apesar de concentrar suas atividades nos finais de semana, também tem seu relógio biológico prejudicado. “Ele [relógio biológico] responde à vida noturna, porque não consigo dormir antes das 2

A vitória de cada umNas adversidades da vida, o segredo é encontrar uma forma de seguir em frente

Enquanto a cidade dormeAs dificuldades de quem começa o dia ao anoitecer

horas da manhã, e o sono não é de qualidade já que costumo cochilar muito durante o dia”, completa Gomes.

Mas há quem não sinta tanto essa inversão. O porteiro noturno José Reis Júnior é um exemplo. “Muita gente fala que o sono da noite nunca é reposto durante o dia, mas eu, quando vou dormir, me concentro nisso”, conclui Júnior. O porteiro acredita que não sente tanto essa mudança de horário porque tem a mesma rotina das pessoas com hábitos diurnos, com a diferença que realiza suas atividades de acordo com os horários adequados às suas obrigações. “Procuro levar minha vida o mais simples possível e sem exageros”, ressalta José. O estudante Samuel Bonassoli Mira, que trabalha durante o dia, faz faculdade à noite e estuda quando chega em casa, também acredita que dormir tarde não interfere na qualidade do sono. “Sempre tenho muito sono, por isso, não tenho problemas com insônia”, brinca e completa dizendo que “não acho que ficar

sem dormir parte da noite traz prejuízo para a saúde. O sono é passível de ser recuperado, o problema é o meio utilizado para ficar acordado, como tomar energéticos ou comer guloseimas para despertar”, conclui o estudante.

O ponto em que todos estão de acordo é que a atividade noturna os distancia da família em datas e comemorações importantes como aniversários e o Natal. Aprígio diz que “em datas comemorativas meus familiares pedem para eu

não vir trabalhar. E sempre ligam para dizer que estou fazendo falta”. Já Gomes, que está no ramo musical há 42 anos diz que no Natal e Ano Novo, umas das melhores datas de trabalho, é muito difícil se reunir com a família, “meus familiares já se acostumaram ao meu ritmo, mas às vezes eles reclamam de não estar presente nessas ocasiões”. Samuel diz que os pais entendem, mas não gostam muito, e José acredita que a rotina noturna faz bem para ele e que, por isso, a família entende.

E assim, enquanto a cidade dorme preparando-se para um

novo dia, há sempre aqueles que continuam a todo vapor, aproveitando a tranquilidade noturna para a rotina de suas vidas.

Mellina Cheminand

Adriana Arruda

Relógio invertido: para muitos, as horas mais escuras são as mais produtivas

Foto: Marcus Silva / C

ON

TEXTO

Foto

: Mar

cus S

ilva

/ CO

NTE

XTO

Na hora da crise, perspectiva é tudo

“Tenho esperança no futuro das células-tronco e estou na

fila como número 1”

“Não desanimo e tenho fé. Amo meus filhos incondicionalmente, mais do que meu pai não me amou”

“Refleti e vi que tinha duas alternativas: ajudar-me ou entrar no fundo do poço. Fiquei com a primeira e não me arrependo”

Rogério Rosa, professor

Possui um câncer destrutivo desde 2000. Perdeu 90% da audição,

mas ganhou otimismo. “Senti o drama de como era ser surdo, entrei em depressão e me

exclui do mundo educativo”

“O plano de saúde tratou o assunto como prótese de estética

e não como aparelho auditivo”

Maria de Lourdes Pinto, aposentada

Sofria castigos do pai, que não aprendeu a amá-la. É teimosa e realiza a lição de maneira oposta: ama e cuida de seus 6 filhos.

“Meu pai tentou me matar colocando veneno dentro de uma linguiça. Desconfiada, dei para o cachorro, que abandonou a vida em meu lugar”

Fernando Vieira, estudante

Ficou tetraplégico em um mergulho há 14 anos. Quer continuar lutando e pretende cursar Psicologia.“Achava que voltaria a andar rápido depois do acidente, mas descobri que tinha ficado tetraplégico. Senti grande revolta”

“Meu pequeno está com 3 anos e 5 meses. Fui escolhida

por Deus, presenteada com um anjo de luz que irradia

meus dias”Erlânia Nascimento, pedagoga

Mãe de criança deficiente. Mergulhou no mundo de Anthony

e aprendeu novas formas de vida“Anthony desenvolveu a síndrome de autismo com 18 meses, paralisando a fala e a socialização. Meu mundo caiu, mas consegui ter

forças para vencer”

a Pedra arranCada do Caminho

“Dentre muitas queixas, a mais comum é em relação à qualidade do sono e à dificuldade de repor a noite perdida.

“Fui presenteada com outro filho, Erik, e sei apreciar a

delícia de ser mãe”Erika Gutierrez, assistente de

departamento pessoal

Perdeu o filho com um dia de vida em 2006. Ganhou o pequeno Erik há 11 meses.

“Desânimo. Vontade de morrer. Essas foram as sensações que tive ”

Page 8: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 20098 ContextooEspecial

Eureca!Os insights que mudaram o rumo da História

Especial

Foi dormindo que a professora de música, Christina Paz, teve uma ideia inusitada. Meses depois, o sonho fez de Christina a inventora de um equipamento de secagem de calçados e de tênis. Já os insights da escritora e jornalista Sarah Morale-jo, acontecem mais quando ela está em contato com a água. Atividades cotidianas, como lavar louça e na-dar, já renderam à escritora diversas narrativas e versos. E era bem acor-dado e longe das águas que o ana-lista de sistemas, Gilbert Salazar, observava a má postura das pessoas em frente ao computador. Em uma dessas ocasiões, Gilbert encontrou uma solução para reeducar a postu-ra errada da maioria dos usuários: criou um colete que ajuda na cor-reção postural.

Christina Paz, Sarah Moralejo e Gilbert Salazar não se conhecem e são de diferentes estados do Bra-sil, mas têm algo em comum: eles criam. “O criador é aquele que usa os meios e ferramentas à sua dis-posição como algo a ser modelado pelos seus desejos e não aceita os modelos que recebe de seu tempo”, define o professor de Pedagogia da Universidade de São Paulo Clau-demir Belintane, para quem o ato de criar está intimamente relacio-nado com a necessidade humana de dar vazão ao seu íntimo, sendo um processo singular e individual. Repertório, observações cotidianas, associações gravadas consciente e inconscientemente seriam alguns dos pilares do processo criativo. “O criador tem que se envolver com o já criado, conhecer bem as grandes criações e se dedicar às técnicas e outras exigências de sua área”, constata Belintane. “Criatividade não é somente criar algo novo. E isso é muito cobrado neste contex-to pós-moderno em que vivemos, em que há a urgência pelo novo e o inusitado em tudo e a todo mo-mento. Criatividade tem muito a

Eloiza FontesMarcel Verrumo

Num estalo, uma ideia, um devaneio e cria-se a mais nova invenção

Concretizando insights ver com lidar com o óbvio, com o que está ali, e que de tão evidente ninguém percebe ou acha que não tem potencial para mais nada além do que já é”, afirma Sarah.

No ato de criar não basta ter um insight, é preciso transformar ideias em produtos e colocá-las no papel. Com o objetivo de fazer com que os inventores brasileiros tirem as ideias da cabeça e as concretizem, existe a Associação Nacional dos Inventores (ANI). A entidade sem fins lucrativos foi criada em 1992 e orienta e incentiva criadores e empresas, esclarecendo, por exemplo, como um inven-tor deve proceder para pa-tentear sua idéia e torná-la viável mercadologicamen-te. “Quando os inventores aparecem com uma nova criação, a primeira coisa que precisam fazer é patenteá-la para garantir a proprieda-de de sua ideia”, informa o presidente da ANI, Carlos Mazzei. De acordo com o Instituto Nacional de Pro-priedade Industrial (INPI), a patente é um título outorga-do pelo Estado que confere ao titular o direito temporá-rio e exclusivo da fabricação, venda e utilização comercial da invenção.

O número de patentes registradas em um país é indicativo de seu grau de inovação. Segundo dados da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), no Brasil, foram registradas 384 patentes em 2007, o que coloca o país no 24º lugar no ranking mundial. Os Estados Unidos ficaram em primeiro lugar, com 52.280 patentes, 33,5% do total mundial.

arranJos harmôniCos e inCons-Cientes

Cantora profissional e professo-ra de música, as ideias da carioca Christina Paz sempre estiveram

longe dos pés. Cercada por notas musicais, foi durante um sonho que Christina visualizou um produto absolutamente diferente de tudo o que já vira e com que trabalhara. “Minha cabeça funciona com sons, instrumentos e melodias. O insi-ght não pareceu algo consciente”, recorda-se Christina. A imagem era do que seria chamado de equi-pamento de secagem de calçados e de tênis, um aparelho que serve para as pessoas secarem as partes internas de seus sapatos em dias de chuva. “É útil também em lugares

frios, como alternativa para aque-cer os calçados, antes de usá-los. É boa opção em academias, porque, além de secar a transpiração, pode agregar produtos desodorizantes. Além disso, como conseqüência natural, ajuda a combater as bacté-rias”, destaca a inventora.

Meses após sonhar com o produ-to, a cantora procurou a ANI para saber como patentear e comerciali-zar a invenção. A agência a encami-

nhou para um especialista e, então, foi elaborado um protótipo para ser colocado em uma exposição de invenções. “A criação chamou a atenção de muita gente e teve boa divulgação na mídia. Uma indús-tria interessada na fabricação do produto passou a estabelecer con-tato com a ANI”, conta Christina.

O produto consiste em uma for-ma em formato espiral semelhante ao pé, composta por filamentos de resistência elétrica em toda a sua extensão e promove a secagem do calçado de dentro para fora, graças

ao aquecimento dessa for-ma. Como um ferro de pas-sar, tem um termostato re-gulável para cada material, seja couro ou sintético. “A forma, que pode ser adap-tada a diversos tamanhos de calçados, contém furos para a saída do ar quente e fica presa a uma pequena e leve haste em forma de ‘Y’. A haste inclui um gancho que permite apoiar o conjunto sobre um tampo ou super-fície, ou mesmo pendurá-lo no varal”, explica.

mergulhos Criativos no universo das fanfiCtions

Fanfiction (a ficção criada por fãs) é a reelaboração do enredo de uma obra pelos seus consumidores. “Fan-fiction é criar algo novo com base no que já foi es-crito”, define a jornalista e escritora dessas narrativas, Sarah Moralejo, de

São Paulo. É quando, por exemplo, um leitor de Har-ry Potter, insatisfeito com os rumos que J. K. Rowling deu aos personagens, reescreve a narrativa, criando um novo desfecho para a história e, ao mesmo tempo, respeitando as características identitárias da obra.

“Existem dois desafios: manter a fidelidade ao que

foi escrito e, ao mesmo tempo, lan-çar elementos novos para tornar o novo texto atraente. Se o novo es-critor não tem criatividade, acaba somente falando do que já existe, do que já foi falado. Romper os li-mites da narrativa, seja expondo o óbvio em um novo formato, seja trazendo uma nova forma de falar sobre o convencional, seja perce-bendo aquilo que ninguém perce-beu e desenvolvendo no mesmo universo já planejado é um traba-lho que exige certo grau de adap-tação, de leitura e de reflexão que, se você não consegue atingir de forma criativa, gera um texto me-díocre”, defende a escritora. Para criar novos roteiros, narra-tivas ricas e interessantes, Sarah tem que ler muito, assistir a muitos filmes e entrar em contato com obras de todas as naturezas que possam enriquecer seu repertório cultural.

Para o pedagogo Clau-demir Belintane, Sarah percorre o caminho certo, porque, para ser criativo, o escritor precisa manter contato intenso com as grandes obras e escrever com frequência, para ser criativo. “O criador tem que se envolver com o já criado, conhecer bem as grandes criações e se dedicar às técnicas e outras exigências de sua área”, afirma.

Apreendido o repertório cultu-

Aparelho vibra para alertar usuário sobre postura errada

Foto: DIVULGAÇÃO

Secador de tênis ajuda pessoas em dias de chuva

Foi dentro de uma banheira que Arquimedes teria gritado “Eureca!” e resolvido um mistério. O rei Hieron de Siracusa havia adquirido uma coroa de ouro, mas desconfiava que ela não era pura. Após ter a idéia de que massas iguais de um mesmo metal deslocam o mesmo volume de água, Arquimedes descobriu que a coroa do rei Hieron não era pura: a coroa tinha tirado da banheira mais água do que uma barra pura de ouro com a mesma

massa...

Muitas são as hipóteses sobre o inventor da roda. Uma das teorias supõe que uma roda feita a partir de um tronco de árvore era a ancestral das atuais rodas. O tronco era análogo a um rolo, o qual evoluiu para uma roda em forma de disco. Já as rodas dos automóveis teriam se originado diretamente das rodas das antigas

carruagens puxadas a cavalos

Thomas Edison teria inventado a lâmpada elétrica após testar mais de 6 mil materiais de filamentos e investir mais de US$40.000. Foi em outubro de 1879 que Edison teve um insight e testou um filamento de linha de coser de algodão carbonizado. O resultado do teste foi animador: após 40 horas o filamento ainda estava incandescente. Havia sido inventada a parte interna da lâmpada. O bulbo

seria desenvolvido em dezembro do mesmo ano.

Page 9: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 2009 9Contextoo

Eureca!Os insights que mudaram o rumo da História

Especial

Num estalo, uma ideia, um devaneio e cria-se a mais nova invenção

Concretizando insights ral, o escritor precisa transformar a ideia em palavras. Para Sarah, a inspiração parece ser mais acen-tuada quando ela está em contato com água. Era assim na adolescên-cia, quando ela deixava a louça a ser lavada pela metade e ia escre-ver versos. É assim hoje, quando ela registra ideias em seu caderno, após mergulhos criativos durante suas aulas de natação. “Acredito que o contato com a água faz as minhas ideias fluírem melhor”, brinca Sarah.

além das aParênCias Cotidianas

O analista de sistemas Gilbert Salazar trabalhava em uma em-

presa, na capital de Minas Gerais, quando passou a observar a postu-ra de seus colegas diante dos com-putadores. “É comum as pessoas se distraírem e relaxarem, ficando

horas a fio em postura inadequa-da. A repetição dessa atitude por dias e meses acaba causando vício postural, dores nas costas e outras deformações na coluna vertebral. Assim, tive a ideia de criar algo que as alertasse sobre a má postu-ra”, explica.

O Monitor Postural, como é chamado o produto, é um colete movido à pilha usado na cintura da pessoa, e se propõe a monito-rar a postura de quem o utiliza. Quando a pessoa estiver com a coluna encurvada ou com os om-bros caídos, ela será avisada por um alerta vibratório (semelhante ao vibracall de um celular), levan-

do-a a corrigir sua postura.

“Os usuários do aparelho serão as pessoas que usam computadores, ado-lescentes e jovens em suas cadeiras escolares, pessoas que trabalham sen-tadas e até as que já tenham curvatu-ras acentuadas na coluna torácica ou ombros caídos. Para

essas pessoas, esse dispositivo será muito útil na pre-

venção de problemas da coluna vertebral”, comenta Gilbert.

O mineiro garante já ter usado sua criatividade para solucionar problemas em seus relacionamen-tos, no trabalho e no casamento.

“Gosto muito da frase de Albert Einsten: ‘Em momentos de crise, só a imaginação é mais im-portante que o conheci-mento’. Procuro usar a imaginação para solucio-nar tudo o que faço. Tudo o que existe pode ser feito de maneira melhor. É ne-cessário observar, avaliar, imaginar e então pro-mover uma mudança ou criar algo novo”.

Mercado de trabalho valoriza profissionais criativos

É comum, em processos de seleção para contratação de profissionais, os candidatos passarem por testes que avaliam seu potencial criativo. Para a psicóloga Marilza Zanardo, que atua na área de Recursos Humanos em uma empresa da cidade de Bauru, a criatividade em processos seletivos é sempre levada em consideração. “A criatividade ajuda a perceber o modo de agir da pessoa no mundo, refere-se à sua capacidade de fantasia, presença de espírito, agilidade mental, adaptação a tarefas e resolução de problemas”, observa Marilza.Uma das formas de se identificar o potencial criativo dos candidatos é por meio de testes de personalidade. “Pequenos testes, ou testes parciais de características, ajudam a refletir sobre aspectos importantes da personalidade dos candidatos, promovendo maior conhecimento e fazendo com que se reconheçam partes importantes subjetivas ou inconscientes deles”, explica a psicóloga. Uma das mais famosas avaliações é o Teste de Torrance, no qual, a partir de figuras geométricas simples, as pessoas devem criar desenhos complexos. Então, os avaliadores julgam a complexidade dos desenhos e o nível de criatividade dos candidatos, ou seja, quanto mais simples o desenho, menos criativo é

o candidato. O publicitário Lupércio Zampieri, de uma agência de publicidade de Bauru, acredita que, assim como ele, profissionais de diferentes áreas precisam ser criativos para se manterem no mercado de trabalho. Lupércio lembra que, em sua área de atuação, um bom conhecimento sobre comunicação e cultura também é fundamental. “Não vou produzir comunicação se não conhecer com quem estou falando, preciso entender as razões que levam uma pessoa a se comportar de um jeito ou de outro. Como o público com quem eu quero me comunicar enxerga determinado objeto. Por outro lado, preciso conhecer que tipo de ferramenta de comunicação eu tenho à disposição para chamar a atenção do público-alvo. A criatividade está relacionada à tarefa de ligar pontos de diversas áreas do

conhecimento”, defende o publicitário.Tanto no mercado de trabalho quanto na vida cotidiana, é possível perceber a presença de pessoas mais criativas do que outras. O professor de Pedagogia da Universidade de São Paulo, Claudemir Belintane, compara os diferentes níveis de criatividade com as diversas capacidades das pessoas para lidarem com determinado tema. Belintane acredita que pessoas menos criativas podem praticar atividades para desenvolverem seu potencial criativo. “Não acredito que o desenvolvimento da criatividade diminua com o passar dos anos. Tem gente que começa a ser criativo ou a criar suas mais importantes obras a partir dos cinqüenta anos, como foi o caso de José Saramago”, exemplifica.

Contratam-se ideias

Aparelho vibra para alertar usuário sobre postura erradaCrédito: Andréa Klaczko

Ilustrações: Antônio Fernandes/CONTEXTO

Foto: DIVULGAÇÃO

Thomas Edison teria inventado a lâmpada elétrica após testar mais de 6 mil materiais de filamentos e investir mais de US$40.000. Foi em outubro de 1879 que Edison teve um insight e testou um filamento de linha de coser de algodão carbonizado. O resultado do teste foi animador: após 40 horas o filamento ainda estava incandescente. Havia sido inventada a parte interna da lâmpada. O bulbo

seria desenvolvido em dezembro do mesmo ano.

O escocês Alexander Graham Bell transmitiu, em março de 1876, uma mensagem a seu auxiliar através de sua mais recente invenção: o telefone. Com o aparelho já patenteado, o inventor foi a uma feira divulgar o produto. O telefone estava com baixa popularidade na feira até que D. Pedro II, Imperador do Brasil e conhecido de Graham Bell, teria pegado uma extremidade do aparelho e ouvido Bell. A surpresa do imperador teria contribuído para a popularização

da invenção.

Muitas são as possíveis datas da invenção do sistema de troca de informações tão utilizado hoje, a Internet. Teria surgido em 1969 quando cientistas da Universidade da Califórnia trocaram informações entre dois computadores por meio de um cabo de cinco metros? Ou quando todos os computadores adotaram o protocolo usado atualmente? Ou quando começou a se utilizar o primeiro navegador de internet? Há também aqueles que creditam a Tim Berners-Lee,

criador da World Wide Web (WWW), o título de “pai da internet”.

Page 10: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 200910 ContextooCiência e Tecnologia

A luz que traz a curaNovos tratamentos à base de luz artificial auxiliam no tratamento de doenças

Sem luz não existe vida. Todos os seres necessitam dela para so-brevivência e a exposição ao sol é o que permite que nossa pele pro-duza a vitamina D, essencial para a saúde dos ossos e a existência de cálcio no sangue. Entretanto, há casos em que o excesso de luz traz malefícios, como, por exemplo, na ocorrência do câncer de pele. De acordo com o INCA (Insti-tuto Nacional do Câncer), 25% dos tumores malignos registrados no Brasil são da região cutânea. No ano passado, mais de 100 mil brasileiros foram afetados. Mas a luz que causa danos pode ajudar a repará-los.

A fototerapia é um tipo de tra-tamento recente que utiliza basi-camente dois tipos de radiação luminosa, o laser e o LED (diodo emissor de luz, em tradução do inglês). Ambos são luzes artifi-ciais que possuem propriedades diferentes das radiações normais, como a luz solar e, por isso, po-dem ser manuseadas e utilizadas na medicina e na odontologia.

Apesar do uso conhecido do la-ser em tratamentos estéticos e de

problemas bucais, a esteticista Ja-nete Pugliese explica que o laser e o LED já são utilizados em outros problemas, como artrite, artro-se, fibromialgia, bronquite e até asma. Segundo a esteticista, “al-guns pacientes que recebem esse

tipo de tratamento ficam até um ano sem crise respiratória”.

Para Maria Aparecida de An-drade Moreira Machado, doutora da Faculdade de Odontologia de Bauru da USP, a utilização de luzes artificiais em tratamentos bucais é

Renato Olívio

Thiago Koguchi

Foto: Laís Montagnana / C

ON

TEXTO

Imagine um supercomputador, ca-paz de armazenar e processar infor-mações em grandes quantidades, em um curto espaço de tempo. Agora imagine uma máquina destas dentro da universidade pública, oferecendo condições cada vez mais propícias para o estudo e pesquisa nas áreas de novos materiais, genética, biome-dicina, meteorologia, entre outras.Por mais incrível que possa parecer, esta não é uma realidade tão distan-te da comunidade científica. No mês de setembro, a Universidade Estadual Paulista (Unesp) colocou em funcio-namento o GridUnesp, o maior con-junto de computadores para proces-samento de dados da América Latina. Sua capacidade de processamento é de 33,3 Teraflops, o que equivale a 33,3 trilhões de cálculos por segundo. O funcionamento do GridUnesp par-te de um princípio bastante simples. Um computador principal, instalado em São Paulo, na Barra Funda, dis-tribui as atividades de processamento dos cálculos pelos outros seis compu-tadores secundários, denominados

“clusters”, e que estão espalhados por outros campi da Unesp no Estado: São José do Rio Preto, Rio Claro, Arara-quara, Bauru, Botucatu e Ilha Soltei-ra. Todos eles trabalham em conjunto e as tarefas são distribuídas de acordo com o grau de ociosidade de cada um dos “clusters” espalhados pelo Estado.Sérgio Novaes, professor do Instituto de Física Teórica (IFT) e coordena-dor geral do projeto, explica que a origem da criação do Grid vem de uma carência de sua linha de pes-quisa, que precisa de tecnologia cada vez mais avançada no processamento de cálculos. “O nosso grupo de pes-quisa trabalha na área de Física Ex-perimental de Altas Energias. Essa é uma área que possui uma enorme demanda por processamento e ar-mazenamento de dados. Conscien-tes dessa necessidade, os físicos de altas energias vêm trabalhando e aprimorando a arquitetura de pro-cessamento em Grid. Apesar de ser um conceito bastante novo, ele se de-senvolveu muito, principalmente em vista dessa necessidade de nossa área”.E não é somente com os Grids de São Paulo que o GridUnesp está in-terligado. Além de operar dentro do computador principal e dos “clus-ters” espalhados pelo Estado, o Grid também pode interligar-se a máqui-nas de outros países, como Estados Unidos, Japão e Europa, aumen-tando ainda mais a capacidade de processamento computacional. Esta inovação permite a algumas áreas do conhecimento expandir as suas pes-quisas, como o desenvolvimento de

recente, mas já atingiu resultados expressivos. Como exemplo, ela cita o tratamento bucal de crian-ças com câncer que está sendo realizado, por ela, em Cuiabá. “Al-gumas crianças que passaram pelo tratamento fototerápico ganha-ram peso, porque, quando você tem uma lesão na boca, a primeira coisa que você evita é comer”.

Para a doutora, o tratamento fototerápico é revolucionário, pois não utiliza produtos químicos, o que diminui os efeitos colaterais. “Quando eu dou um medicamen-to, cada vez mais eu inutilizo o sistema imunológico do paciente. A doença pode se manifestar em outros lugares, as bactérias sofrem mutações e tornam-se resisten-tes aos medicamentos”, afirma. Janete Pugliese ainda afirma que “enquanto a luz de alta potência destrói, a luz de baixa potência es-timula as células a trabalharem”.

Apesar dos inúmeros benefícios, o tratamento fototerápico ainda é pouco pesquisado no Brasil. Exis-tem poucos centros que trabalham com esse tipo de terapia, o que en-carece o processo. Outro problema

mas acredito que consigamos levar esse tratamento para a população”, comenta Maria Aparecida.

Engana-se quem acha que os tratamentos à base de luz são re-centes. Registros históricos afir-mam que os egípcios utilizavam a luz solar, associada a produtos quí-micos, no combate a doenças de pele. O atual desafio é fazer com que sejam desenvolvidos novos aparelhos para que mais pessoas se beneficiem do novo tratamento.

O tratamento fototerápico é

revolucionário, pois não utiliza

produtos químicos, o que

diminui os efeitos colaterais

novos materiais, a genética, os bio-materiais e as redes de altas energias.Pablo Venegas, coordenador do pro-jeto do “cluster” em Bauru e profes-sor do Departamento de Física da Unesp de Bauru, explica que apesar de beneficiar imediatamente apenas a comunidade acadêmica, o Grid pode trazer benefícios à população a médio e longo prazo. “Na área de super-condutores e transmissão de energia elétrica, por exemplo, o Grid pode ajudar a desenvolver um sistema de transmissão que funcione a tempera-tura ambiente, diminuindo os gastos com a construção de novas usinas hi-droelétricas. Isso afetaria não só a eco-nomia do país, mas também ajudaria na preservação do meio ambiente”.Financiado pela Unesp e a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos do Ministério da Ciência e Tecno-logia), o projeto do Grid custou aos cofres públicos cerca de R$ 8 mi-lhões de reais e inicialmente benefi-ciará apenas os campi com “clusters” instalados, mas pode ser expandido a outros até o fim do ano de 2009.

é a resistência das grandes empre-sas de medicamentos. “Enfrenta-mos a resistência dos laboratórios,

Supercomputador dá novo fôlego para pesquisa na Unesp

A luz do bem: sem efeitos colaterais e sem cicatrizes

Foto: Laís Montagnana / C

ON

TEXTO

O cluster de Bauru trará benefícios

para a população a longo prazo

Maior conjunto de computadores da América Latina, o GridUnesp oferece novas ferramentas de pesquisa na área de engenharia de materiais, genética e biomedicina

Page 11: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 2009 11Contextoo Ecologia

Alternativas que ajudam o planeta

A velocidade e intensidade de emissão de poluentes na atmosfe-ra têm causado sérias mudanças no sistema climático da Terra, o que têm gerado pesquisas, ado-ção de medidas severas dos órgãos ambientais e negociações entre os líderes mundiais para restringir a emissão de gases poluentes.

O Prof. Dr. Alceu Alves expli-ca que a abundância na oferta do petróleo e do carvão mineral (combustíveis altamente poluen-tes) criou uma matriz energética mundial baseada nessas duas fon-tes, resultando num forte merca-do consumidor e criando preços competitivos para os produtos que utilizavam esses combustíveis. “A princípio, não havia a preocupa-ção com o meio ambiente e acredi-tava-se que as reservas de petróleo seriam suficientes para manter a humanidade ‘em movimento’ por muito tempo”, destaca Alceu.

Mas, em 1973, com a primeira crise do petróleo, o mundo notou que a situação seria diferente e, assim, iniciou-se uma busca inten-siva por alternativas ao uso do pe-tróleo. “Atualmente, há uma forte

preocupação com aspectos ecoló-gicos, neste contexto, as energias limpas estão ganhando força e tendem a tomar o espaço anterior-mente ocupado pelas energias ‘su-jas’”, ressalta o docente Alceu.

Segundo o Prof. Dr. José Fran-cisco Rodrigues as energias lim-pas são formas de gerar energia causando nenhum ou pouco im-pacto ambiental e emitindo uma pequena quantidade de resíduos. As principais energias limpas são a eólica, a solar, o biogás, o biocom-bustível e a energia gerada através das marés.

Assim, para reverter o cenário alarmante de poluição e aqueci-mento global, a tendência é que os combustíveis fósseis sejam subs-tituídos por esse tipo de energia. “Não há dúvida que, em menos de 30 anos, o petróleo e o carvão perderão o espaço que hoje ocu-pam no cenário mundial de ener-gia e serão substituídos por outras fontes energéticas, principalmen-te as renováveis”, garante o Prof. Alceu. Uma mostra de que isso já vem ocorrendo é a crescente venda de carros flex e as novas in-venções que surgem no mercado como os carros elétricos.

ideias limPas

Além de substituir os com-bustíveis fósseis, as energias lim-pas também podem substituir a energia gerada pelas hidrelétricas. Hoje em dia, milhares de mora-dores já utilizam as placas solares para aquecer a água de suas resi-dências. “Implantei o sistema de aquecedor solar na minha casa há quatro anos e garanto que, além de contribuir com o meio ambiente, ajudo o meu bolso economizando bastante na conta de luz”, relata a aposentada Sonia Lanfredi.

As novidades são inúmeras e praticamente todos os dias são di-vulgadas notícias de novas formas de geração de energia usando di-ferentes fontes renováveis e tecno-logias inovadoras que não agridem o meio ambiente. Um dos assuntos que muito se discute atualmente é a célula combustível, que utiliza oxi-gênio e hidrogênio para produzir energia e tem a água como resíduo. “O desenvolvimento da tecnologia está em fase adiantada e eu creio que, em alguns anos, já estará dis-ponível no mercado a preços com-petitivos, o que causará uma grande revolução na vida das pessoas e do planeta”, afirma o Prof. Alceu.

Para diminuir a quantidade de poluentes emitidos no meio ambiente, as energias limpas ganham espaço no cenário mundial

Alternativas simples podem reduzir o consumo de energia e preservar o meio ambiente

surpresa. Durante o dia, a ofi-cina funcionava normalmente sem precisar acender uma lâm-pada sequer. Em pouco tempo, a ideia luminosa se espalhou pela vizinhança e aguçou a curiosida-de de diversos pesquisadores.

Um grupo de alunos da Uni-versidade Presbiteriana Macken-zie de São Paulo propôs-se a estudar a descoberta de Alfredo. De acordo com as pesquisas, as chamadas “lâmpadas d’água”, através da captação dos raios so-lares, podem gerar uma intensi-

dade luminosa equivalente a de uma lâmpada comum de 40W ou 60W.

Segundo o físico Paulo Soares Martins, especialista nos estudos referentes à ótica, o sucesso da invenção se deve aos fenômenos da refração e reflexão. Paulo ex-plica que quando os raios solares incidem sobre a superfície da garrafa, parte deles é refletida, e outra consegue passar o plástico, chegando à mistura. Ao encon-trar um meio mais refringente (água + água sanitária), os raios

perdem velocidade e mudam de sentido. Como a luz tende a se expandir, ao passar da mistura e encontrar novamente o plástico, parte dos raios é refletida e outra refratada, saindo da “lâmpada” com maior velocidade e sentido diverso. “O invento é uma ferra-menta eficiente capaz de poten-cializar a luz do Sol”, explica o físico.

As “lâmpadas” de Seu Alfredo são exemplos de como iniciativas simples são capazes de cooperar com a redução do consumo de

Marina Veroneze

Murillo Pereira

A uma garrafa do tipo PET (Po-litereftalato de etileno), adiciona-se água limpa, água sanitária, e pronto! Durante a crise energéti-ca de 2002, o conhecido apagão, o mecânico de Uberaba (MG), Alfredo Moser, encontrou uma boa alternativa para acabar com a escuridão e com as altas contas de luz. Decidiu abrir buracos nas telhas que cobriam sua oficina e encaixar as garrafas com a mistu-ra. O efeito foi uma interessante

energia e, consequentemente, com a preservação dos recursos naturais. Aos menos criativos que Alfredo, a opção por lâmpa-das com grande luminosidade, maior durabilidade e menor gas-to energético, como as do tipo fluorescentes, é uma alternativa viável para a redução das salga-das contas de luz e da degrada-ção do meio-ambiente - uma vez que, quanto menor o consumo de energia, menor será a ne-cessidade de novas usinas para produzi-la.

solar

Transforma diretamente a energia proveniente do sol em eletricidade ou usam o calor para

aquecer água.

Prós: equipamentos de baixa manutenção; não geram qualquer tipo de resíduo durante sua

operação

Contras: a produção é interrompida à noite e diminuída em dias de chuva e uma enorme quantidade de energia é utilizada durante a fabricação dos painéis.

eóliCa

O vento gira as pás de um gigantesco cata-vento, que aciona um gerador, produzindo corrente elétrica.

Prós: fonte inesgotável de energia; não gera nenhum tipo de poluição ambiental.

Contras: Intermitência dos ventos, gera ruídos.

bioCombustíveis

Geração de etanol e biodiesel para veículos automotores a partir de produtos agrícolas.

Prós: utiliza matéria-prima totalmente renovável; substitui di-retamente o petróleo, e os vegetais usados na fa- bricação absorvem CO2 em sua fase de crescimento.

Contra: produção da matéria-prima ocupa terras destinadas ao plantio de ali-mentos.

Ilustração: Bruno C

andeias/CO

NTEX

TO

Ilustração: Caroline G

omes/C

ON

TEXTO

MATERIAIS NECESSÁRIOS:GARRAFA PET TRANSPARENTE 10 mL DE ÁGUA SANITÁRIA

2L DE ÁGUA LIMPATUBO DE FILME FOTOGRÁFICO

MASSA DE VIDRACEIRO

ENCHA A GARRAFA PET COM ÁGUA E ÁGUA SANITÁRIA

PARA A ÁGUA FICAR COMPLE-TAMENTE LIMPA

FECHE BEM A GARRAFA PARA QUE A ÁGUA NÃO EVAPORE. COLOQUE O TUBO DE FILME NA TAMPA PARA

EVITAR O RESSECAMENTO CAUSADO PELO SOL

FAÇA UM FURO NA TELHA DO TAMANHO DA

GARRAFA PET

COMO FAZER UMA LÂMPADA D’ÁGUA

COLOQUE A GARRAFA DENTRO DO BURACO E VEDE O LUGAR COM MASSA DE VIDRACEIRO

E não é que funciona?

Page 12: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 200912 ContextooEsportes

Os sentidos que estimulam o esporteDeficientes visuais encontram no esporte uma forma de se integrar a sociedade e melhorar a autoestima

Ela faz toda a diferençaApenas treino, concentração e preparo físico são garantias de vitória no futebol?

De longe, se vê que ele é como os outros: vai pra lá e pra cá sem parar, mesmo com a respiração ofegante cada vez que termina um exercício, pergunta ao treinador: “E agora?” e continua mais uma série. Tho-mas Atanázio Filho, de 49 anos, é daquele tipo de pessoa que não desiste fácil – determinação, garra e força de vontade não faltam. Ainda pequeno, ele perdeu a visão numa briga e viu no esporte uma possi-bilidade de melhorar sua vida. Há oito anos pratica natação no SESI em Bauru: “Na verdade a idéia de fazer natação partiu da vontade de

fazer algo mais consistente, às vezes você fica parado e tem pessoas que se acostumam com isso, eu não”.

Em geral, o esporte para defi-cientes não é muito valorizado, “Bauru, infelizmente, ainda é uma cidade onde é muito difícil você ver as pessoas incentivando as outras na área governamental”, desabafa o aluno e cita cidades como Cam-pinas, São Carlos e São Caetano que estão bem mais à frente. Em Londrina no Paraná, por exemplo, a prefeitura arca com todas as des-pesas para incentivar o deficiente visual a competir. “Em Bauru tive que correr atrás e por falta de in-centivo competi apenas por cinco

anos de 2002 a 2006”. Thomas competiu nos Jogos Abertos, Jogos Regionais e na Competição Master que são campeonatos do interior do estado.

O professor André Barbosa Velo-sa é treinador no SESI e desde 2001 acompanha o trabalho de Thomas. Para ele, é uma lição de vida ter um aluno deficiente, mas, apesar disso, o treinamento é o mesmo dos ou-tros alunos. “Não tive que mudar muito o meu treinamento, a úni-ca dificuldade é que eu falo muito com os gestos, tive que aprender a verbalizar mais as coisas”, afirma André. Para o professor, Thomas é seu melhor aluno e fala isso com

naturalidade: “acho que na verdade ele enxerga, ele está é mentindo para nós”, brinca o treinador.

No Brasil o órgão que cuida da área de esportes para cegos é a ABDC, Associação Brasileira de Desportos para Cegos. No caso da natação poucas regras foram adapta-das para a prática de deficientes visu-ais, no início da década de 1980 foi introduzido o tapper (um técnico que com um bastão toca nas costas do atleta para ele saber a hora da vi-rada). E foi apenas em 1988, nas Pa-raolimpíadas de Seul, que a natação para deficientes passou a fazer parte do quadro paraolímpico.

O esporte praticado pelo defi-ciente visa prevenir enfermidades secundárias, testa os limites e as potencialidades, aumenta a auto-estima, estimula a independência e a autonomia e o mais importante é que integra o deficiente à vida social. Thomas afirma que “de imediato os benefícios são muitos: poder con-versar, mostrar que você não é um coitado, que você é uma pessoa nor-mal”. Apesar de ser cego, ele treina e compete com pessoas que enxergam e afirma que se identifica muito mais com essas pessoas e isso é muito im-portante para sua inclusão social.

Muito treino e dedicação ao esporte fazem com

que Thomás se diferencie de outros deficientes

visuais

O futebol, além de paixão nacional, é constante palco de muitas emoções: ansiedade dos atletas em campo, pressão e apreensão do técnico e dos co-legas no banco, e a fundamen-tal participação da torcida. Para muitos pesquisadores não é fácil dizer em que intensidade as in-fluências que o torcedor exerce afeta o comportamento de cada atleta. Embora de fato também não se possa negar que a torcida representa um dos mais impor-tantes fatores externos em uma partida.

De acordo com Danielle Cris-tina Ferrarezi Barboza, especia-lista em psicologia do esporte, a influência da torcida repercute no jogo de maneira expressiva. A professora comenta que “a concentração dos atletas é muito difícil de ser mantida, por vários aspectos: o comportamento da torcida, do técnico e dos cole-gas”. A psicóloga ainda completa

tomarem decisões no decorrer da partida, de-sempenhando suas fun-ções de forma mais livre, auxiliando no processo de criação de jogadas, na execução de ações rápidas, características decisivas no futebol.

O locutor Esportivo Toni de Paula, da Rádio Bandeirantes de Bauru, concorda com a influ-ência da torcida no fu-tebol e ressalta que nem sempre ela é positiva: “Não posso deixar de me manifestar quanto ao aspecto negativo nes-sa relação de amor do torcedor por seu clube, afinal isso gera violên-cia, que tem durante o tempo se transformado em cultura, como na Inglaterra através dos Hooligans, e mesmo em nosso país com as organizadas”.

Além de constantes influências positivas da torcida, como a van-tagem do “mando de campo”, no espetáculo do futebol também há cenas imprevisíveis, como re-cordou Toni de Paula: “Em 1995 o Noroeste perdia no primeiro tempo para o Botafogo de Ri-beirão por 4 a 1, mal começava o segundo tempo e os torcedo-res começaram a se movimentar para ir embora do estádio, já frustrados com o que viam. Foi quando o time de Bauru iniciou uma das mais incríveis viradas da história, ganhando o jogo por 5 a 4. Na medida em que os gols iam acontecendo os torcedores começaram a voltar, mesmo sem acreditar no que estavam vendo. Quando terminou o jogo o está-dio estava de novo com o mesmo público do início e ao contrário do final do primeiro tempo, em que se ouviam apenas reclama-ções e vaias, no final do jogo a ar-quibancada se transformou num só carnaval. Coisas do futebol!”.

Thais Luquesi

Lidiane Orestes que o atleta precisa se adaptar a essa intera-ção, pois ao mesmo tempo em que ela motiva a equipe com aplausos, fogos e ban-deiras, ela intimida o time adversário.

No Departamento de Educação Física da UNESP de Rio Claro foi desenvolvi-da uma pesquisa com jogadores de futebol para analisar a rela-ção entre a torcida e o desempenho do atle-ta, e a maioria afirma que a torcida a favor influência o rendi-mento. Além disso, para eles, ela eleva a motivação e o senso de autoconfiança no time, que atuando como suporte emo-cional, permite que eles se sintam apoia-dos e incentivados a

Apoio e paixão incondicional podem mudar resultados de partidas

Foto: Marina W

atanabe/ CO

NTEX

TO

Foto

: Lai

s Mon

tagn

ana/

CO

NTE

XTO

Curiosidades Nos Esportes para Cegos

Futebol Judô

É conhecido como futebol de cinco. Os participantes jogam com vendas nos olhos para que não haja injustiça, pois possuem diferentes níveis de deficiência visual. Os atletas se

orientam pela audição.

A luta é interrompida quando os competidores perdem o contato. Os judocas não são punidos quando saem da área de

combate.

Natação Goal Ball

É praticada com a ajuda do “tapper” que dá tapa nas costas dos nadadores para orientá-los.

São 3 jogadores em casa equipe e o objetivo é arremessar a bola “sonora” no gol adversário.

ClassifiCação oftalmológiCa esPortiva

da ibsa*

b1

Ausência total da percepção da luz em ambos os olhos, ou incapacidade para

reconhecer a forma de uma mão em qualquer

distância ou sentido.

b2

Da habilidade de reconhecer a forma

de uma mão até uma acuidade visual de 2/60 metros e/ou um campo

visual inferior a 5º de amplitude.

b3

Desde uma acuidade visual superior a 2/60

metros até 6/60 metros e/ou um campo visual de

mais de 5º e menos de 20º de amplitude.

*IBSA: Federação Internacional de Esportes para Cegos

Foto: Arquivo pessoal

Page 13: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 2009 13Contextoo

tras é a ‘Geração’, com filmes e oficinas direcionadas ao pú-blico infanto-juvenil, tentando aumentar o interesse por cine-ma das gerações mais novas”. Além de estimular a produção nacional, os produtores de fes-tivais também citam o contato com o público como algo im-portante desses eventos. “Nos festivais, acontecem discus-sões sobre novas tecnologias e modos de produção, dis-tribuição, exibição, pirataria, entre outros. No Festival do Rio temos o ‘Cine Encontro’ que, além de exibir filmes a preços populares, também possibilita um bate-papo do público com os reali-zadores, sejam produ-tores, diretores, ou atores das produ-ções” afirma Didonet.

Cultura

Cartazes, anúncios e panfle-tos divulgam o que vai aconte-cer em algum lugar da cidade. No local do evento há poucos elementos decorativos, pouca coisa. No espaço do palco, uma pessoa vesti-da com roupas semelhan-tes às da p l a -

teia. C o m a u x í l i o de micro-fone, pedestal, banquinho e, habi-tualmente, uma garrafinha de água mineral, o humorista lança mão de seu texto cons-truído a partir de observações do cotidiano. Um foco de luz

Um novo foco para o humor

conduz os olhares e a atenção do público, que espera a deixa para cair na risada. Essa nova fórmula para se fazer humor, celebra-

da em vá- rias par-tes do país, é conhecida como Stand Up Comedy.

O “humor de cara limpa”,

Stand Up Comedy transforma a simplicidade do dia-a-dia em sucessoLauro Martins Neto

Aproximando-se mais do estilo estadunidense, Chico Anysio e Jô Soares seguiram o gênero principalmente em apresentações ao vivo e aber-turas de shows. Entre os atu-ais humoristas da comédia em pé, destacam-se os membros do Clube da Comédia Stand Up, como Danilo Gentili, Marcela Leal, Marcelo Mans-field, Oscar Filho, Diogo Por-tugal, Márcio Ribeiro e Rafi-nha Bastos.

Em sua essência, o gênero Stand Up costuma entreter a platéia utilizando-se de lin-guagem simples e despojada, com temas triviais do dia-a-dia. “O humor em pé não tem objetivos claros. Busca além do riso, fazer com que o es-pectador olhe para a realidade à sua volta com criticidade”, destaca Diogo Portugal. O humorista ressaltou ainda a importância da função crítica, social e formadora de opinião que o humor possui.

Uma das grandes ferramen-tas para a divulgação e, con-sequentemente, para o suces-so do Stand Up é a internet. Sites como YouTube, Orkut, Twitter e blogs ajudam a dis-seminar os vídeos das apresen-tações e shows desse gênero,

Tapete vermelho, celebrida-des internacionais, fotógrafos, jornalistas e fãs: tudo isso em um evento ligado ao cinema. Há alguns anos esse glamour estava restrito apenas ao públi-co estrangeiro, em premiações como o Oscar e em festivais nos moldes de Cannes, Vene-za, Berlim ou Toronto. En-tretanto, nos últimos anos, a cena descrita também pode ser vista no Brasil. A cada ano são criados novos festivais de cine-ma no país e os já existentes ganham cada vez mais prestí-gio, tanto no cenário nacional, quanto no internacional.

Hoje em dia existem diversos festivais e mostras de cinema espalhados pelo país. Dentre eles, os três mais conhecidos são o Festival de Gramado, do Rio e de Brasília. O evento de Gramado continua sendo o mais tradicional do país, en-quanto o de Brasília é o mais antigo e o do Rio atinge o lu-gar de maior festival de cinema do Brasil e da América Latina. A assessora de comunicação do Festival de Gramado, Ana Mota, lembra-se da tradição

do Festival: “Gramado é o úni-co festival do Brasil que nunca deixou de acontecer, mesmo em tempos de crise. No perío-do da Ditadura já tivemos edi-ção do Festival com apenas um filme concorrendo”.

O aumento na quantida-de e importância dos festivais no circuito nacional também é observado pelos realizado-res dos eventos. “Nos últimos anos teve um crescimento no número de cursos de Cinema e Audiovisual e no interesse pela produção no país. Com mais cursos, aumenta o núme-ro de realizadores e a produção nacional”, aponta Ana Mota. Para a assessora, a maior mis-são dos festivais é incentivar a produção no país: “O diretor Jorge Furtado (O Homem que Copiava; Meu Tio Matou um Cara) começou participando na mostra de curtas de Gra-mado e hoje tem um grande reconhecimento no cenário nacional”.

A mesma idéia é comparti-lhada por um dos produtores do Festival do Rio, Marcos Di-donet. “No Rio uma das mos-

Lucas Soares

ou “comédia em pé”, como também pode ser chamado no Brasil, é um gênero humorís-tico inaugurado nos Estados Unidos no final do século

XIX. O comediante de Stand Up, como o

próprio termo já diz, ge-

ra lmen-te se

apre-s e n t a

em pé, sozinho, sem

acessórios, cená-rios, caracterização ou

uso de qualquer outro recurso cênico.

No Brasil, o gênero foi in-troduzido pelo ator José Vas-concelos, na década de 60.

e os perfis dos comediantes de cara limpa. Para Diogo Portugal “a internet é uma grande aliada dos humoristas de Stand Up, pois, diferen-temente do que muitos pen-sam, ela também cativa novos adeptos ao gênero, levando-os às apresentações”.

Já para o humorista Oscar Filho, o sucesso se deve ao fato de o gênero ainda ser no-vidade no Brasil. “Sua essên-cia é auto-renovável. Você fala o que quiser, aborda situações do cotidiano e agrega piadas no texto em tempo real. Por exemplo, se eu estiver viajan-do e vir uma coisa engraçada na estrada, posso acrescentar esse acontecimento no texto da minha apresentação. Isso torna a comédia Stand Up contemporânea e faz com que o público se identifique mais”, afirma o artista.

Assim, aos poucos, a comé-dia em pé vai ganhando novos fãs e admiradores. A assistente social Idalina dos Santos Lima é mais uma que se encanta com esse gênero de humor: “Um artista, sozinho, conse-gue tirar do público o riso fá-cil. É interessante ver a solidão do artista no palco e sentir as gargalhadas da plateia”.

Luz, câmera, PREMIAÇÃO!Crescem o número e a importância dos festivais de cinema do país

Porém, apesar do aumento do

acesso aos diferen-tes tipos de filmes no

país, muitos deles ain-da ficam restritos aos fes-

tivais. Para os amantes do cinema, Marcos Didonet dá

a dica: “O festival viabiliza a

troca muito forte de quem está antenado com a indústria do cinema e quem está a fim de se aproximar e de ver o que de melhor é lançado pelo mundo, porque cerca de 80 por cento dos filmes [do festival do Rio] não serão distribuídos. É uma oportunidade única”.

De cima para baixo, cenas de

filmes premiados no Festival do Rio 2009: “Dzi

Croquettes”, “Os Famosos e Os Duendes da Morte” e “Viajo

Porque Preciso, Volto Porque Te Amo”

Ilustração: Caroline G

omes

Foto

: Laí

s Mon

tagn

ana/

CO

NTE

XTO

Page 14: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 200914 ContextooPostal Nações

O encanto desértico no Norte do Chile

Elcio C. Padovez, da Turquia

Da Fontana de Trevi, uma luz ecoa, em águas muito azuis, o brilho da Roma clássica. Alto da Acrópole, Atenas. Outras luzes, sejam artificiais ou dos raios que Zeus envia até a capital grega. Esqueçam o charme arrogante dos romanos ou a alegria dos gregos. De uma lua e uma estrela banhadas em vermelho é que vem a luminosidade mais surpreendente da Europa: a Turquia.

Muito cedo, ainda na penumbra, uma voz chama para a primeira oração do dia. 98% da população turca segue o islamismo. O sol começa a dar as caras por esses lados aqui da Eurásia. Muitas mãos carregam bandejas com pequenos copos de vidros com chá de maça, bebida mais do que típica. Os bazares começam a abrir. Na Turquia, uma das grandes vocações é o comércio. E a arte da pechincha é a favorita entre os comerciantes turcos. Não existe preço definido para os produtos dos bazares. Tudo é questão de negociar, chorar um desconto, ter paciência e sabedoria para fechar um bom negócio.

Exceto Istambul, que não é a capital, a Turquia ainda é pouco conhecida dos viajantes brasileiros, mas vem mostrando, ao longo dos anos, grande potencial turístico. Istambul, a única cidade no mundo que separa dois continentes (Europa e Ásia), é a porta de entrada, com uma imensidão de mesquitas às margens do estreito do Bósforo, no Mar de Mármara ou no Mar negro. 15 milhões de pessoas habitam esta maravilhosa cidade, guardiã de uma parte da história do império romano, quando foi escolhida por Constantino para ser a Roma do Oriente. Nas ruas, um caos de buzinas, gritos, vendedores com milhares de bugigangas, mulheres

Areia, terra, lagoas, vulcões, lhamas, geisers, cordilheiras e neve. É assim que se configura o deserto mais seco do mundo, localizado no norte do Chile. O Atacama é realmente misterioso e empolgante: foge ao senso comum de que no deserto só encontramos areia e revela inúmeras faces de uma paisagem natural contrastante e bela.

Para famílias, mochileiros e pessoas com vontade de conhecer novos lugares, vale a pena ir a pequena cidade de San Pedro de Atacama e contratar os passeios que as inúmeras agências de turismo da cidade oferecem. São muitas opções que envolvem lagoas, salares, águas termais, trekking em

vulcões e caminhada com lhamas.A experiência é inesquecível. Com

uma semana podemos entender o que é a cultura do povo atacamenho e conhecer essa região tão particular e típica do Chile. A realidade é totalmente diferente da de Santiago. No Atacama, não veremos modernidade, restaurantes chiques, nem monumentos históricos e grandiosos. É tudo muito simples e muito personalizado.

O encanto já começa na viagem de Santiago ao deserto. De ônibus ou de avião, o caminho é incrível, já que começa com os Andes nevados em Santiago e termina com uma paisagem arenosa e seca em Calama,

que é a maior cidade perto de San Pedro. Depois é necessário viajar até San Pedro de Atacama e começar a se encantar pelo deserto.

Ao chegar a San Pedro, a impressão que temos ao caminhar nas ruas não asfaltadas é a de que estamos em um antigo filme de faroeste. As casas da cidade são todas feitas de pedra e muito pequenas e simétricas. O povo possui um forte traço atacamenho de cultura, atitude, linguagem e aparência. Fazem questão de manter as tradições, e possuem uma forte relação com o deserto e sua fauna e flora.

San Pedro de Atacama é um pequeno povoado de 2500 habitantes localizado

Fotos: Elcio P

adovez/CO

NTE

XTO

de véu pelos mercados e homens tomando café e jogando dama. Assim caminha o dia em Istambul. Mas a magia da grande

iluminação começa ao entardecer, de frente ao mar. O sol desbota em tons de amarelo avermelhado que vão se misturando as águas cor safira dos mares. As cúpulas e as pontas douradas dos minaretes das mesquitas ganham mais brilho com o por do sol. Homens na beira das pontes arrumavam varas de pescar a procura de um peixe desatento. Mais uma vez, uma voz convida para a última prece. Em um Café, jovens, homens de terno e gravata e turistas se misturam entre pufes para tomar chá ou café turco, além de fumar narguilé. O cheiro do café, muito forte, se espalha como um incenso repleto de mística. A lua ensaia aparecer. Os monumentos mais importantes, como a Aya Sofia, a Mesquita Azul e o palácio do sultão Ahmet ganham a luz da noite e das lâmpadas.

Na Capadócia, as surreais montanhas pontiagudas repousam no silêncio noturno. A beira do mar Adriático, só se ouvem as ondas que guiam para a Grécia. Em Istambul, o barulho das buzinas e dos gritos persistem noite adentro, mas o aroma do café parece acalmar os ânimos. A fumaça cheiro de incenso dos narguiles sobe o céu da lua e da estrela. Mesmo negra, a borra do café turco vai iluminando o caminho dos viajantes em busca de novos horizontes.

Café Turco

O Atacama atrai turistas de todo o mundo com lindas paisagens e variedade de passeios

em um dos oásis que se encontram na região baixa do Atacama. Neste lugar se encontram algumas das mais altas cumbres da Cordilheira dos Andes. Hoje San Pedro é considerada a capital arqueológica do Chile e é privilegiada pelo charme de suas paisagens e pelo céu incrivelmente azul.

A atmosfera do lugar é de encanto e mistério. Cada passeio é uma experiência única, com detalhes incríveis. O que impressiona é a variedade de paisagens que vemos no Atacama. Alguns lugares possuem lagoas muito azuis e são verdadeiros oásis no deserto, como as famosas Lagunas Altiplánicas ou as Termas

de Puritama. Outros lugares são uma paisagem típica desértica, como o Valle de la Luna e o Valle de la Muerte. Além disso, é possível subir alguns vulcões, como o Láscar, o vulcão mais ativo da América do Sul, ou então fazer passeios alternativos como caravanas indígenas e caminhadas com lhamas.

Visitar o Atacama e seu charmoso povoado chamado San Pedro é realmente indispensável para quem visita o Chile. É uma viagem diferente de tudo, com pequenos toques da cultura chilena. O contato com a natureza, a visão desértica e o clima de mistério fazem com que o turismo no Atacama seja algo inesquecível.

As esculturas naturais de

pedra são parte das atrações do

Atacama

Foto: Flaviana de Freitas/CO

NTE

XTO

Flaviana de Freitas, do Atacama

Panorama de Istambul com Mesquita Azul e o Mar de Mármara ao fundo

Page 15: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 2009 15Contextoo Reticências

No último domingo

Um prato estilhaçou-se no chão. Esse era o barulho que vinha da cozinha. Mesmo sem assistir a cena, Marcos sabia exatamente como ela teria se de-senrolado. Não por ser um fato freqüente em sua casa, mas pelo treinamento que sua deficiência visual lhe proporcionara desde seu nascimento. A mãe estava bastante atribulada com os pre-parativos do seu sétimo aniversá-rio. Não era fácil fazer uma festa toda adaptada e, infelizmente, Marcos só podia ajudar com as bexigas. Era o único trabalho que Márcia achara conveniente para o filho.

Durante a festa, tudo ocorreu como o combinado, a mãe se surpreendeu com a organização e senso de espaço que tinham aquelas crianças. Entretanto, o que a espantou mesmo, foi o que ela viu na manhã do dia se-guinte.

Ainda afetada pela agitação da festa, Márcia levantou-se logo às seis e meia da manhã. Sonolenta, saiu ao jardim arrastando suas pantufas verdes pelo carpete de madeira recém encerado. A mãe não podia acreditar no que via. Marcos estava prostrado diante

ao sol nascente, simplesmente olhando em direção a ele.

Despertando-se de súbito do sono que ainda lhe perse-guia, Márcia gritou em êxtase ao filho: “Marcos, você sabe o que está fazendo?”. Porém, seu filho não sabia. Ele ainda dor-mia. Preocupada, depois de ver a cena se repetindo por alguns meses, a mãe procurara um psi-quiatra. Com orientações bem claras, a mãe começou a obser-var melhor o filho. Depois de três anos, a mãe percebeu que alguma coisa muito estranha es-tava ocorrendo.

Marcos passou a admirar o sol mais vezes ao dia, mesmo fora de seu transe “particular”, e isto se tornara uma rotina. Sem conseguir um diálogo sobre o assunto com o filho, Márcia obedece ao médico e pede por sua internação.

No hospital, o menino ago-ra com 10 anos, não conseguia perceber os motivos que o levara para lá, mas pensara a princípio que poderia ser bastante diverti-do. A mãe preocupava-se com as atitudes do filho, mas mantinha a fé que aquilo fosse um sinal de que os olhos de Marcos pudes-sem voltar a enxergar um dia.

Depois de algumas sema-nas os exames oftalmológicos nada constataram. O menino

certamente perceberia a dire-ção do sol pelo calor, era o que pensava um dos médicos. Seria uma explicação razoável se, duas semanas depois, pelo menos 13 pacientes não tivessem passado a admirar o sol como ele e, na semana seguinte, Marcos não ti-vesse voltado a enxergar.

O que foi motivo de festa para a mãe que acreditou que um mi-lagre fora concedido a ela. O me-nino em choque chorou, até hoje não sei qual a razão. Já, os demais pacientes juntaram-se aos 13, to-das as manhãs, na esperança de serem os próximos escolhidos pelo “milagre divino”.

Marcos, antes de despedir-se da mãe num domingo de visita, disse que não viesse lhe buscar no domingo seguinte, pois já não estaria mais lá. Már-cia não deu muita impor-tância às palavras do filho e prometeu, arrependi-da, voltar para levá-lo para casa.

No de-correr da semana,

alguns pacientes, com diferentes patologias mentais, entre elas esquizofrenia e transtorno bipo-lar, demonstraram uma melho-ra significativa nos exames de quinta-feira. Todos os médicos apostaram em milagres. Eu sa-bia que não.

A verdade era que no Sol ha-via uma comunidade de seres reluzentes, que provocavam o brilho dele. Cada habitante ti-nha energia vital concentrada e que irradiava de seu plexo-solar. Aqueles que sabiam

Felipe Matos captar essa energia se curavam verdadeiramente. E era de lá que Marcos vinha e era para lá que ele voltaria, já que conse-guira realizar sua missão e plan-tar sua semente. Sei disso pelo olhar de satisfação que tinha ao contar-me sua história no do-mingo passado e pelo último suspiro que dera antes de voltar para casa, sem seu corpo.

Foto

graf

ia

Foto Externa - Mariana Watanabe e Foto Interna - Laís Montagnana

Apesar de fiel à ima-gem formada pelo olho

humano, a fotografia, ao congelar um instante, torna o olhar muito mais amplo e profundo. Uma ação que du-raria segundos ao olhar pode ser vista por um tempo maior se registrada, criando a possi-bilidade do espectador enxer-gar elementos que passariam despercebidos.

Produzir uma foto vai além do simples registro de um momento. Nunca a produção de imagens causará um efei-to único ou terá um significa-do igual para todas as pesso-as. E assim é no Contexto. As fotografias não só ilustram

as matérias, mas também, transmitem diversas mensa-gens por si só. Algo natural visto que mais de 80% das informações que o homem contemporâneo absorve se dão através do mecanismo da percepção visual.

Nesta edição, temos “luz” como fio condutor, e a capa mostra a luz em sua forma mais simples: o contraste do ambiente escuro com as velas coloridas acesas, e um fósfo-ro acendendo-as. Essa luz, junto à foto do editorial, uma criança brincando, remete às outras luzes: renovação, cria-tividade, visão, ação, idéias, brilho, energia, dar a luz...

Ilust

raçã

o: O

rion

Cam

pos

Page 16: Jornal Contexto (UNESP) - Outubro de 2009

Outubro de 200916 Contextoo

buscar, não tinha como voltar. Agora aprendi a lição, não saio de casa sem contrato”.

Quando pergunto sobre o futuro, um silêncio paira em meio à turbulência do backstage. A per-gunta parecia sem sentido para a drag que não se vê fazendo outra coisa na vida. “Quero continuar a me apresentar sempre. Temos muitas drag de 60 anos na ativa. Claro que as mudanças de es-tilo ocorrem com o passar do tempo, mas parar não está nos meus planos”. As mudanças de es-tilo que ela se refere são as três modalidades de drag em apresentações.

Alessandro agora deu lugar a Lad-jayah, pelo menos nas duas horas que estão por vir. Pronta para subir ao palco ela posa para fotos. Entre flash termi-no minha s a b a t i n a com per-

guntas que iniciam um novo ciclo. Quais seus planos para o futuro? “Ser uma grande estre-la, realizar meus sonhos com o fruto do meu trabalho”. E podemos saber quais são esses sonhos? “A drag é a luz na noite, luz na escuridão, é a magia que encanta. Meu so-nho é estar sempre glamurosa e bem vestida. Já os meus dese-jos são secretos...(risos). O que não podemos esquecer é que somos anjos de uma asa só, mas podemos voar bem alto se nos abraçarmos ”.

Perfil

mas no inicio não é fácil. Meus irmãos não acompanham minha carreira, cada um tem sua vida. Meus pais e meu namorado são as pessoas mais importantes da minha vida. São meus pilares, sempre me dando força pra se-guir em frente. O preconceito antigamente era muito maior, o olhar da sociedade mudou! Hoje somos vistos como uma forma de diversão, as pessoas gostam da brincadeira, vibram com as performances. É a magia nos olhos do público que me moti-va”. Hoje, residente em São José do Rio Preto, Ladjayah é respei-tada e tem lugar de destaque.

Como um executivo em seu escritório ela é dona da situação. O dia a dia corrido é marcado por testes de maquiagem e figu-rino, pelo auxílio à mãe nas tare-fas domésticas e, claro, pela con-fecção das roupas para os shows. “Nenhuma drag usa uma rou-pa igual à outra. É um público

muito exigente. As pedrarias são montadas uma a uma, tem que ter muita criativida-de para costurar os modelos”. Os vestidos para as apresentações vão de R$ 400,00

podendo até chegar a 15 mil re-ais em apresentações nacionais. “Nossos cachês de show muitas vezes não pagam os gastos com produção, mas fazemos por prazer, por vocação”.

Quando pergunto sobre a concorrência no meio artístico, o que recebo são risos. “Concorrência existe sim, muita! Como em qual-quer profissão. Mas o ciú-me é parte permanente do espetáculo, cada uma quer sempre fazer seu melhor. O importante é que não temos violência, é uma concorrência saudável, afinal, quem é rei nun-ca perde a majestade”.

Ser drag não é apenas se ves-tir, é uma questão de espírito, de personalidade. Colocando a peruca vermelha Ladjayah se emociona quando fala de seu

Somos anjos de uma asa só, mas podemos voar bem alto se nos abraçarmos

Foto

: Pris

cila

Gom

es/ C

ON

TEX

TO

Priscila Gomes primeiro show. “Foi em um aniversário de um amigo, fui como convidado fazer a apresentação,

O que me motiva é a magia nos olhos do público

Cinquenta minutos separam Alessandro Henrique Lamis de Ladjayah Carey. O menino tí-mido de olhos verdes, caçula de cinco irmãos, me recebeu em seu camarim onde “dava à luz” à irre-verente e glamurosa drag queen.

Sombras vermelhas contorna-das por fortes traços pretos de-senham mais uma etapa na vida de Alessandro. Personagem de sua própria história, divide–se em duas identidades únicas. Há trinta anos nascia na cidade de Votuporanga, interior de São Paulo, a criança que gostava de brincar de pique, de caçar passa-rinho, de jogar bola com os ami-gos. Há oito, brotava a majesto-sa artista, a reluzente profissão pra vida toda. Dois vértices tão distintos unidos por uma mesma emoção.

Uma pincelada de blush per-meia a conversa que relembra momentos do pas-sado e regem a vida atual. O fã da can-tora americana Ver-messa Mitchel con-ta, com sutileza e delicadeza, os prin-cipais momentos de sua trajetória. “A primeira vez a gen-te nunca esquece!”, confidencia Ladjayah. Vestir-se e maquiar-se como mulher era apenas uma brincadeira entre amigos na ado-lescência. “A primeira vez que me vi montada como mulher foi um susto, mas um susto gostoso”. A diversão acendeu a chama e deu lugar à profissão que escolheu. Profissão mesmo. Seu sustento vem exclusivamente de apresen-tações em shows e das roupas que desenha e confecciona para outras drags da região.

Mas e antes? Como foi a re-ação da família quando soube da sua opção? Houve precon-ceito? Pergunto eu, tão ansiosa e curiosa para descobrir a res-posta quanto para saber como ela delineia tão perfeitamente os olhos. “Um baque! Não é sim-ples entender essa opção. Minha mãe hoje aceita minha escolha,

os tiPos de drag

Drag Glamour: interpreta músicas lentas e suas roupas são ricas em pedrarias. Geralmente as drags com mais idade fazem esse tipo de apresentação.

Drag Top: (caso de Ladjayah Carey) é a drag moderna, fashion, que apresenta músicas dançantes, performáticas.

Drag Caricata: apresenta músicas com personagens caracterizados.

Purpurina, glamour, irreverência e coragem

o nervo-sismo era imen-so, parar no salto não é fácil, mas deu tudo certo. Foi o pri-meiro passo da minha carreira”. A drag, hoje consagrada, é vencedora de concursos e inspiração para as novas gerações.

A meia calça ar-rastão dá o tom sensual e agressivo à personagem simbolizan-do a luta cotidiana com a su-peração de obstáculos. “Tomei muitos furos. Uma vez fui fazer um show em Ribeirão Preto e o contratante não me pagou. Tive que ligar para um amigo ir me