12
Ruy de Carvalho “O respeito com que o país me tem agraciado, vem do público para quem as comendas, valem muito menos que os sorrisos, os abraços e o carinho…” p6/7/8 p3 Exposição no Centro de Actividades p9/10 Viagem guiada ao Oriental de São Martinho p11 Dia Internacional da Criança “Estreou-se na Covilhã, cidade onde se começou a conhecer” DIRETOR: ANTÓNIO JOSÉ DA SILVA // CHEFE DE REDACÇÃO: JOSÉ MANUEL MACEDO // EDIÇÃO Nº. 0 - JUNHO 2015 // DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

Embed Size (px)

DESCRIPTION

 

Citation preview

Page 1: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

Ruy de Carvalho

“O respeito com que o país me tem agraciado, vem do público para quem as comendas, valem muito menos que os sorrisos, os abraços e o carinho…” p6/7/8

p3

Exposição no Centro de Actividades

p9/10

Viagem guiada ao Oriental de São Martinho

p11

Dia Internacional da Criança

“Estreou-se na Covilhã, cidade onde se começou a conhecer”

DIRETOR: ANTÓNIO JOSÉ DA SILVA // CHEFE DE REDACÇÃO: JOSÉ MANUEL MACEDO // EDIÇÃO Nº. 0 - JUNHO 2015 // DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Page 2: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/2 JUNHO 2015

Celebrado acordo entre o Governo Regional da Ilha do Príncipe e a Câmara Municipal

Café Literário em 16 de Junho, com Deana Barroqueiro

Encontros na Biblioteca

O Governo Regional da Ilha do Príncipe esteve na Covilhã, nos dias 15 e 16 de Junho, para ce-lebrar uma série de protocolos com a Câmara Municipal e al-gumas instituições do concelho. O acordo de geminação, que visa aprofundar as relações ins-titucionais entre o Município da Covilhã e a Ilha do Príncipe, foi assinado na segunda, dia 15,

Realizou-se mais um Café Li-terário. Deana Barroqueiro, destacada Escritora de roman-ces históricos, apresentou no Café Verdinho, a sua obra “ O Espião D.JoãoII – Pero da Covilhã, acontecendo tal facto pela 1ª. Vez, exactamente na terra do personagem. Autora de uma vasta obra, predomi-nantemente de personagens

“A Língua Portuguesa: do pas-sado ao futuro” foi o tema em debate nos encontros do mês de Junho, com a presença do Professor Universitário Paulo Osório, no dia 17 de Junho, na Biblioteca Municipal da Covi-lhã. Licenciado em Português, La-tim e Grego pela Universidade Católica Portuguesa; Mestre e Doutor em Linguística Por-tuguesa pela Universidade de Coimbra e pela Universidade da Beira Interior, respectiva-mente, e Agregado em Letras pela Universidade da Beira

no Salão Nobre da Câmara.Durante as visitas feitas pelos representantes do Governo de Príncipe pelas diversas institui-ções covilhanenses foi, ainda, assinado um acordo de gemi-nação tripartido entre a Univer-sidade da Beira Interior, a Câ-mara Municipal da Covilhã e o Governo Regional do Príncipe; bem como um protocolo entre

e acontecimentos do Renasci-mento e Descobrimentos Por-tugueses, período que estuda há mais de vinte anos, escre-veu, também, numerosos ro-mances inspirados em conhe-cidos personagens da História. Com a participação de muitas pessoas, o Evento/Tertúlia, foi apresentado pelo Escritor, João Morgado.

Interior. Publica regularmente em revistas da especialidade, proferindo conferências em várias universidades estran-geiras como em França, Brasil, Espanha, Macau, Alemanha, Estados Unidos, Cabo Verde, Venezuela, Angola e Poló-nia. Professor Associado com Agregação da Universidade da Beira Interior e, actualmente, Presidente do Departamento de Letras da mesma institui-ção. Informar ainda que presi-de, à direcção da Associação Internacional de Linguística do Português (AILP).

Governo de Príncipe com o Parkurbis; e, outro, entre Prínci-pe e a AECBP (Associação Em-presarial da Covilhã, Belmonte e Penamacor).O Presidente da autarquia, Ví-tor Pereira, considera o estrei-tamento das ligações com a Ilha de Príncipe uma mais-valia para o município e o desenvol-vimento da economia regional.

Durante o almoço com vários empresários do concelho, numa apresentação que fez da Ilha, o Presidente, José Cardoso Cas-sandra, referiu com agrado o fato de estarem presentes em-preendedores de várias áreas que poderiam cooperar direta-mente com Príncipe, salientan-do as qualidades da Ilha para investir.

Page 3: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/3JUNHO 2015

Agenda Cultural do Município, apresentada em 8 de Junho

O Centro de Actividades não pára!...

Exposição de pintura e animação no Centro de Actividades

Editorial

António José da Silva(Director)

Jornal de Cultura

O Presidente da Câmara Mu-nicipal da Covilhã apresentou em 8 de Junho em conferência de imprensa, a Agenda Cultu-ral do Município.Serão dois os formatos em que os eventos culturais de todo o município poderão ser conhecidos, a partir de agora, um digital, actualizado em per-manência, e outro em papel com periodicidade mensal.O formato digital estará aces-sível a todos os cidadãos, sendo que a Agenda Cultural em papel será distribuída pe-los principais postos de fre-quência dos munícipes, tais como os edifícios autárquicos:

Alegria, festa, animação e muita diversão no Centro de ActividadesSão assim os dias do Centro de Actividades. Um espaço aberto para múltiplas activida-des.Os utentes apreciam o Espa-ço. Aí desempenham as mais diversificadas actividades, sempre num clima de grande motivação e entusiasmo.

Encontra-se aberta ao público a Exposição – “Sair, ver e fa-zer”.Os amantes da pintura, podem deslocar-se ao Centro de Ac-tividades e observar os traba-lhos realizados no Atelier de Pintura Criativa orientado por Carlos Silva.Esta exposição está patente ao público de 1 a 30 de Junho.

Um jornal é concebido, entra em projecto, desenvolve-se, nasce!...Quando nasce, é como tudo na vida, vai lançando paulatinamente as primeiras sementes do tal pro-jecto que se crê frutuoso. Nasce para a Cultura, para dar voz às artes e às letras. Quer entrar em salões de exposições, em lançamentos de diversificadas Obras, em reuniões literárias, pugna por todas as alí-neas que compõem integralmente a Cultura Covilhanense. Quer levar ao conhecimento de quem o não tem a nossa realidade citadina; A literatura, a poesia, o desenho, a pintura, as artes plásticas, o teatro, e todas as restantes manifestações culturais. Vai estar atento à Agenda Cultural que a Camara Municipal e outras Instâncias lhe forneçam.Este jornal, para ter o sucesso dese-jável, não tem cor, nem tendência, nem qualquer outro tipo de descri-minação. Aqui, todas as correntes serão retratadas e impulsionadas. Deseja-se que perdure através dos tempos, independentemente dos actores políticos e sociais que lide-rarem as estruturas.Este Jornal, pugna por dar a co-nhecer com maior profundidade, as nossas fidedignas raízes sociais, alicerçadas nas Juntas de Fregue-sia e Associações Culturais. É um Jornal que tenciona dar grande co-bertura a todos os Lançamentos e Exposições de índole cultural, con-tando também, por parte dos inter-venientes, que dirijam as necessá-rias informações ao Jornal.Com o apoio da Câmara Municipal da Covilhã, de grandes Instituições culturais, e trabalhando desinteres-sadamente, com o único objectivo de prestar um serviço à Cidade, aos Escritores, e Artistas na sua globa-lidade. O Jornal que agora nasceu, vai “ter pernas para andar”!... Vai ser a realidade cultural que faltava.

Câmara Municipal, Biblioteca Municipal, Balcão Único, Loja Ponto Já, Teatro Municipal, e outros e, também nas juntas de freguesia, colectividades e associações, Universidade, escolas, ou outros locais de passagem e frequência do pú-blico.O Presidente da Câmara, Ví-tor Pereira, salientou o fato da Agenda Cultural conter todos os eventos do município, in-clusivamente os das juntas de freguesia, ou entidades priva-das, caso haja essa pertinên-cia, sendo que para tal terão de enviar esses eventos para a Agenda Cultural da autar-

quia.A agenda digital está organiza-da em várias categorias e nela encontram-se descritos os principais eventos decorridos ou a acontecer no município, recorrendo a várias ferramen-tas multimediáticas, como ví-deo e imagem. A agenda em papel segue uma configuração muito original, dobrada em ori-gami, muito apelativa e fácil de consultar.O formato em papel já come-çou a ser distribuído, e o for-mato digital aguarda apenas a aprovação das lojas on-line para estar acessível na rede.

Um espectáculo de magia, repleto de diversão

Danças de salão animaram os presentes

Page 4: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/4 JUNHO 2015

ficha técnica

Director: António José da Silva * Editor: Pedro Leitão * Chefe de Redacção: José Manuel MacedoMarketing: Rui Salcedas * Distribuição gratuita * E-mail: [email protected] * Variadíssimo Colectivo de Colaboradores e Colaboradores Regulares * Apoio da Câmara Municipal da Covilhã e da Universi-dade da Beira Interior * Paginação: Gigarte - Design e Comunicação * Exemplares: 1000

EXPOSIÇÃO DE SANTO ANTÓNIO

Está patente ao público, no Museu de Arte Sacra, a grande Exposição de Santo António. Horário da visita: das 10 às 18 horas, até ao dia 30 de Junho.

Muitas pessoas visitam a Ex-posição, deliciando-se com as verdadeiras obras de arte, que arrebatam o olhar de quem a visita. Vale a pena visitar o Mu-seu de Arte Sacra.

“Desfocagens de Arte” na TINTURARIA

Foi inaugurada em 2 de Junho, a Exposição de pintura “ (Des-focagens de Arte) de José Ma-ria Subtil. A Exposição está patente ao público até ao dia 2 de Julho, na Tinturaria.

Page 5: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/5JUNHO 2015

José Luis Adriano

Luís Pereira Garra

O Cancioneiro do concelho da Covilhã.Uma exigência do presente e um compromisso com o futuro

POR UMA CULTURA PLENA

António Gedeão, no seu poema “Pe-dra Filosofal” faz o elogio do sonho, escrevendo que “o sonho é uma cons-tante da vida”, e “que sempre que o homem sonha, o mundo pula e avan-ça...” . Na verdade, há projetos que se pen-sam e idealizam depois de se ter um sonho. Outros há que são um sonho e não passam disso mesmo. Eis a di-ferença entre o que se torna real e o que não passa de utopia ou fantasia. Há sonhos que a vontade e o querer transformam em realidade, outros há que não basta a vontade humana. Es-tes requerem condições e exigências que vão além do querer dos deuses, esses que levaram Fernando Pessoa a dizer e, porventura, a acreditar que “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”. Não. Não estou a falar des-ses deuses. O tempo em que vivemos criou outros deuses bem mais pode-rosos, sem os quais, nada feito.Falemos do Cancioneiro do concelho da Covilhã. Porventura, alguém duvida da neces-sidade de a Covilhã ter o seu Cancio-neiro? Quiçá, alguém poderá pensar ou questionar a sua importância e o seu valor cultural? Ninguém, julgo eu. Mas onde está esse Cancioneiro? Essa tarefa de recolha, organização e sistematização do património cul-tural imaterial, depositado na frágil memória e na vivência que se esfuma de nossos pais e avós? E se o tempo os leva? E se?... E se...?Acreditem que muitos sonham com este projeto e outros tantos têm a consciência, o querer e a disponibi-lidade para a sua concretização. E sabem as razões do seu sonho. Primeira razão: A identidade como matriz cultural de uma comunidade.Uma comunidade é um todo de pes-soas que partilha algo comum: para além do território geogáfico, há um

É uma honra e um privilégio integrar a primeira edição do Jornal de Cultura que, espero, preencha um lugar de des-taque na nossa região. Não sendo eu um “especialista” da cultura, o desafio a que me propus é o de, em poucas palavras, vos falar da importância do movimento operário e da sua dimensão cultural, pois é esta a área onde poderei dar algum modesto contributo.A nossa região, em particular a Covilhã, está umbilicalmente ligada à indústria de lanifícios e à forma como ela se ins-talou e desenvolveu e que levou a que a partir desta se gerasse, crescesse e se consolidasse um movimento operário dinâmico, forte, interventivo e activo que foi criando e solidificando uma cultura operária que é parte inteira do nosso ADN.A cidade fábrica, a cidade vida, a cida-de de mulheres e homens que sofriam, que se associavam e que evoluíam cul-turalmente e lutavam foi excepcional-mente descrita por Ferreira de Castro no livro “A lã e neve”, obra notável, pungente e real da condição social e hu-mana dos operários da época. Esse pas-sado de miséria (que começa de novo a espreitar e a bater às portas de muita gente) fez da nossa região uma região distintiva com a marca indelével dos operários, da sua vida e da sua cultura. Ainda hoje, cá por dentro, sentimos o som das sirenes que nos chamavam para a labuta e ouvimos o matraquear sonoro e lindo dos teares e, sem o cor-rupio de outrora, percebemos o pulsar humano da cidade “velha” (que pode e deve ser nova sem perder a memória) e dos bairros e localidades operárias. Ainda hoje saboreamos a gastronomia em que da miséria se faziam e fazem requintados pitéus e apreciamos os cantos, as prosas e os poemas que nos deliciam os ouvidos e a mente e nos tornam ímpares, diferentes e únicos mas não superiores. Ainda hoje vemos o poderio dos edifícios fabris, onde tan-tas vidas se fizeram e desfizeram, em que uns tantos foram magistralmente recuperados pela UBI e outros tantos envelhecem ao abandono, sem que se lhes devolva a dignidade de outrora. Ainda hoje beneficiamos de um mo-vimento associativo que, criado pelos operários para responder à sua necessi-dade de convívio, de desporto e à sede que tinham de cultura, se soube adaptar e renovar, honrando sempre a sua géne-

“território” humano com vivênicas, valores, conhecimentos e práticas que, ao longo dos tempos, formata e molda todos quantos nela se inserem. Podemos assim falar de identidade cultural, qual mãe comum de que to-dos são gerados. Como elementos de uma comunidade, temos, então, uma filiação cultural.Segunda razão: A consciencialização de que a cultura é um fenómeno his-tórico.As comunidades modificam-se, transformam-se e adaptam-se, antes, lentamente, hoje, vertiginosamente. Este ‘movimento perpétuo’, trans-porta consigo a vitalidade cultural que sustentou essa mesmas comu-nidades, independentemente da mu-dança dos tempos, da substituição das formas e dos paradigmas. Caso contrário, seria impensável a sua existência. Temos, assim, a consci-ência que a nossa identidade cultural fez um percurso, logo, uma história.Terceira razão: O futuro não se deve entregar ao acasoA cultura, não é só um legado de muitas gerações, é, também, o es-paço presente onde cabe a nossa in-tervenção social e comunitária. Daí que ao vivenciar a cultura estamos a intervir na sua continuidade para os vindouros. Não somos a geração da memória e da oralidade. Somos a ge-ração dos saberes teóricos, da escrita, do registo e dos demais meios técni-cos. Colocá-los ao serviço da cultura é assegurar a nossa identidade para o futuro.Quarta razão: As condições e as oportunidadesSomos a geração que mais repon-sabilidade tem, quer sobre o estudo dos fenómenos culturais, não só pe-las condições técnicas e pelo saberes de que dispõe, quer, também, porque tem havido oportunidades financei-ras, infelizmente não aproveitadas. O Cancioneiro do concelho da Co-vilhã tem que ser feito. O projeto é gigantesco. Envolve saberes multi-disciplinares e custos elevados face às exigências técnicas a que obriga. Mas temos ao dispor aquela que poderá ser a última oportunidade, o Quadro Comunitário de Apoio QREN 2014/2020. O desafio foi recentemente colocado aos grupos folclóricos e às associa-ções culturais que se preocupam com esta área do nosso património cultu-ral imaterial.Acredito que seja desta vez que o so-nho passe a realidade.“Se no passado se vê o futuro, e no futuro se vê o passado, segue-se que no passado e no futuro se vê o pre-sente, porque o presente é futuro do passado, e o mesmo presente é o pas-sado do futuro” (Pe. António Vieira)

se e mantendo intactas as razões da sua criação e existência. E, sim, ainda hoje temos um movimento sindical forte, in-terventivo e com dimensão cultural que nasceu e cresceu nas fábricas e se esten-deu a todos os sectores de actividade e aos serviços, sendo hoje incontornável e presente na vida económica, social e cultural da nossa região.Em cada ruela, em cada casa sem con-dições de salubridade, em cada bairro e localidade com casas de pequenas divisões, em cada sabor, em cada can-to e em cada poema e em cada asso-ciação há histórias de vida e de vidas que podem e devem ser preservadas na memória colectiva para que a história de miséria e sofrimento não se voltem a repetir. Espero que a notável ideia do movimento sindical criar um núcleo museológico de cultura operária possa ser concretizado por sua iniciativa e que os apoios para isso necessários não sejam entregues a outros fins e a outras entidades, que, embora também possam preservar (e têm preservado) uma outra parte da história não o podem fazer na dimensão humana e cultural do opera-riado e de quem a viveu e a vive.O desenvolvimento de práticas cultu-rais foi, é e será sempre essencial para assegurar o bem-estar dos trabalhado-res, o seu equilíbrio físico-psíquico e formar ou reforçar a sua consciência social e cultural para que sejam cidadão inteiros, plenos, responsáveis e res-ponsabilizadores e se assumam como agentes sociais transformadores no seu meio.Mas será que quando se operam profun-das alterações nas relações de trabalho, nomeadamente, a nível do vínculo, da flexibilidade de horário, dos bancos de horas e das cargas e ritmos de trabalho e quando estas condições de trabalho estão associadas aos baixos salários, à precariedade e ao desemprego, os tra-balhadores podem ter direito à cultura, ao desporto, ao lazer e a uma melhor qualidade de vida?Mas será que quando os produtores culturais estão financeiramente depen-dentes do poder económico e políti-co e que, por isso, oferecem produtos culturais que raramente são dirigidas às grandes massas e consequentemen-te aos trabalhadores, estamos a garan-tir a autonomia dos agentes culturais e o acesso a um direito consagrado na Constituição da República?Tenho para mim que não! E, por isso, o Estado (os governos) deve empenhar-se seriamente na alteração das práticas que têm vindo a ser seguidas, implementan-do verdadeiras políticas culturais, sem tutelas, que incluam a formação e bem--estar dos trabalhadores e que apostem na cultura como factor importante para o desenvolvimento. Os Sindicatos, as associações, o poder local não podem demitir-se desta em-preitada cultural, porque só com um povo e trabalhadores cultos estes po-dem contribuir para o desenvolvimento económico e social do seu país, da sua região, do seu concelho, da sua fregue-sia ou do seu bairro. Que este jornal seja um contributo e para ele desejo longa e profícua vida.

Page 6: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/6 JUNHO 2015

ao Jornal de Cultura

Jc – Passou grandes tempos da sua infância na Covilhã. Sabemos que guarda ines-quecíveis recordações. Gos-tava de nos descrever algo de especial que lhe ficasse gravado na memória?RC: Há alguns anos foi escrita para mim uma peça de teatro que se chamou “Palhaço De Mim Mesmo”, onde eu contra-cenava com meu filho João. A linha mestra da peça pren-dia-se com um idoso que se deslocava ao passado para se encontrar consigo próprio em jovem, com o intuito de lhe pe-dir para ele tratar de ser feliz, de forma a que ele, em velho, pudesse também vir a ser fe-liz. Só que encontra um jovem cheio de traumas e problemas psicológicos graves, situações que ele, ao longo da peça, tenta resolver. A encenação começa justamente na Covilhã, na Ca-

pela de Santa Cruz do Calvário, onde eu com sete anos, num fim de tarde entrei, curioso, para dar com um caixão aberto, onde jazia um corpo de alguém, supostamente abandonado ali pela família e pelo mundo. Aquilo fez-me muita impressão, o que me fez ficar a noite inteira junto do morto, a velá-lo, como se eu fosse um amigo chega-do. A minha família, entretanto, procurou-me pelos hospitais e por todos os cantos da Covi-lhã, acabando por me encontrar na morgue, onde eu, sozinho, adormecera ao lado do desco-nhecido, solidário com aquela última viagem de alguém que não merecia seguramente ser abandonado daquela forma. É uma memória estranha, devo dizer, mas que me marcou a afectividade pelo meu seme-lhante, e me faz viajar ao pas-sado, de cada vez que subo a

serra e me cruzo com aquela tão singela e solitária capela. JC - Adquiriu habitação na região, e sempre que pode, o que faz com regularidade, vem passar uns dias “cá em cima”. Os ares da Serra ins-piram-no? Até porque além do actor genial que o país co-nhece, também é um excelen-te escritor!...RC: Não é verdade. Não adquiri nenhuma casa na zona. Mas o meu filho reconstruiu uma ve-lha habitação em Caria, onde eu vou amiúde. No entanto, quando fico na Serra, e faço-o todos os anos, alugo uma casa nas Penhas da Saúde, onde fico uns dias com a família, para reforçar energias, comer bem e reviver o prazer que me dá a neve e o contacto com as gentes desta belíssima zona de Portugal.

JC – Que obras literárias já escreveu?RC: A minha mulher dizia que eu escrevia bem, mas eu sem-pre tive o cuidado de nunca me expor publicamente dessa forma. Sou muito preciosista, o que vai contra, penso eu, o ím-peto natural de quem escreve. A escrita funciona como o cur-so de um ribeiro, isto é, flui, e quando pensamos demasiado na forma e na construção do texto, a coisa tende a perder espontaneidade... naturalidade. Tenho um grande respeito por quem escreve, e como sempre dediquei a minha vida a mostrar ao mundo a beleza da escrita, acho que esta separação das águas me torna amigo dos es-critores e dos poetas, e me faz merecedor do carinho de quem entende esta minha opção de ser a ponte entre os grandes criadores e os grandes amado-

Ruy de Carvalho

“Comove-me o reconhecimento, e agradeço de todo o coração, e farei sempre mais e mais, se as forças mo permitirem, não para ficar na história, mas para en-cher o coração deste nosso povo que há nove séculos mostra ao mundo, sem descanso, aquilo que é capaz”

Entrevista conduzida por António José da Silva

Page 7: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/7JUNHO 2015

res, que são, no fundo, todas as pessoas para quem eu tra-balho.

JC - Como actor, cobriu os palcos nacionais com o seu indescritível talento. Ganhou prémios, muitas homena-gens, condecorações, lou-vores… Tem o grau de Co-mendador1… É reconhecido nacional e internacionalmen-te. Um ícone de Portugal. Tem a noção da enorme gratidão que o país lhe deve?RC: Tenho de facto, não uma, mas quatro comendas, muito embora me sirvam de pouco, porque o ser agraciado desta forma, tem servido para dar vi-sibilidade aos políticos e pouco mais. O respeito com que o país me tem agraciado, vem do pú-blico, para quem as comendas valem muito menos dos que os sorrisos, os abraços e o carinho

com que me envolvem na rua e nos teatros. A cultura tem sido alvo das maiores descrimina-ções por parte do poder político nos últimos 40 anos. Antes era a censura que nos perseguia, e agora é o estrangulamento por parte de um poder que tem medo da cultura, e da força que o saber e o sorriso podem dar a um povo que não merece aquilo que não têm feito por ele. Por-tugal a mim não me deve nada. Eu invisto tudo o que tenho de melhor com todo o amor e prazer, na expectativa de ser-vir de exemplo a quem manda, sonhando para o teatro, enfim para as artes de uma forma geral, o papel libertador e trans-formador que desde sempre as qualificou na vida dos povos. Tenho pena que muita gente te-nha deixado de ir ao teatro, aos espectáculos, mas entendo que não há dinheiro para tudo, mas

não deixo de lamentar as estra-tégias de alguns mecenas, e a estúpida perseguição do fisco a tudo o que pode representar o contraponto à tristeza, ao fecho e ao empobrecimento cultural do nosso povo. Comove-me o reconhecimento, e agradeço de todo o coração, e farei sempre mais e mais, se as forças mo permitirem, não para ficar na história, mas para encher o co-ração deste nosso povo que há nove séculos mostra ao mundo, sem descanso, aquilo que é ca-paz.

JC - … E alguma vez ficou magoado com actos ou omis-sões de pessoas ou perso-nalidades de quem esperava mais consideração?RC: As coisas que me mago-am acabam por dar energia e força às que me alegram. Não sou de ressentimentos. Não

gosto de perder tempo. Con-tudo esperava um pouco mais de consideração por parte do Ministério das Finanças, da Mi-nistra inclusive, e de quem go-verna... não porque eu me sinta alguém diferenciado, mas por-que, como milhares de outros portugueses, tenho sido vítima de ridículas perseguições que amesquinham quem as faz, pela forma injusta e pouco séria como tentam extorquir o valor do trabalho de quem sempre cumpriu com as suas obriga-ções. Aproveito também para chamar a atenção de alguns co-legas para as invejas que tanto prejudicam quem as tem. O mal é algo que se entranha e quan-do se lhe dá força, transforma o olhar e os gestos em armas surdas, sujas e pouco dignas de um ser humano. Todos de-vemos ser dignos de respeito, porque só assim nos envergo-nhamos de não estarmos ao ní-vel de quem nos procura e nos aplaude. Tenho para mim, que se não formos melhores no fim da vida, do que fomos no início, não valeu a pena ter vivido.

JC – E momentos de enorme felicidade? Guarda algum ou alguns especiais, dos quais recordarão eternamente?RC: Todos os aplausos são mo-mentos de felicidade. Todos os abraços e todos os beijos. To-dos os sorrisos e todos os dias em que posso contribuir para o bem estar de alguém, são mo-mentos de felicidade. Sou das poucas pessoas que o grande público sempre respeitou a sua privacidade e isso é um bem inestimável. Estou feliz por tudo o que dizem, por tudo o que dão, por tudo o que a vida me permitiu fazer dela. A felicida-de é uma coisa muito simples, muito íntima, muito pessoal. Há pessoas a quem se lhes pede que sorria apenas, e há outras a quem a vida exige que mo-vam montanhas. Deve haver razões para isso. No que me diz respeito, a vida pediu-me sempre para ser eu próprio, e para dar sempre o meu melhor. É isso que tenho feito!

JC – “ Trovas & Canções”, é o grande espectáculo que representa em palcos a nível nacional, conjuntamente com outros grandes actores. É um

Page 8: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/8 JUNHO 2015

espectáculo de teatro, músi-ca e poesia. O que nos pode dizer sobre este espectáculo, que já conheceu grandes noi-tes de norte a sul do país?RC: É de facto um espectácu-lo maravilhoso. Esta simbiose entre a poesia e a música leva a uma intimidade tal com o pú-blico, que transforma cada es-pectáculo num recital. Estamos a preparar uma segunda edição do Trovas, naturalmente com um formato semelhante, mas com muitas surpresas, nome-adamente num alargamento dos temas, e num investimento nas memórias de cada um dos artistas presentes, sem excluir os convidados que, desta vez, terão também um papel impor-tante na curva dramática do fu-turo Trovas. É impressionante o carinho com que temos sido re-cebidos de norte a sul do país. Vela a pena o esforço e o em-penho, porque o que se apren-de é de uma riqueza imperdível.

JC – Finalmente, pedíamos--lhe algumas breves palavras para os Covilhanenses e resi-dentes na Beira interior!?RC: Não nasci na Covilhã, mas é como se tivesse sido daí. Foi na Covilhã que me estreei, as-sim como foi nessa bela cidade que me comecei a conhecer. A Beira tem para mim um encan-to muito especial. Aprendi a co-nhecê-la na nossa literatura, e acabei por vivê-la nas minhas viagens e nos amigos que dei-xei um pouco por cada terra, por cada aldeia, e em todas as casas que visito em cada noite através dos meus perso-nagens. Vou todos os anos “pe-regrinamente” à Covilhã. Mato saudades, apanho frio, como o melhor queijo do mundo, re-vejo grandes amigos e encon-tro-me... Há na subida à Serra um certo simbolismo. A minha carreira também teve muitas curvas, algumas subidas ín-

gremes, por vezes barreiras, noites frias, mas sempre a von-tade de nunca parar. O cume não foi um objectivo, mas sim um refrigério. Descer pelo outro lado, por Seia, sabe a bem-es-tar, a conforto, a boa comida, à presença dos belos cães, ao quente das roupas da serra, e às gentes sempre prontas para um sorriso e um agrado. A Bei-ra interior mantêm ainda hoje os cheiros da minha infância. Há por ali grandes e inesque-cíveis amigos. Há ainda os lu-gares de grande rudeza que

lembram um Portugal antigo, pela memorável solidariedade dos seus habitantes, e pela for-ça que sempre esteve presente em todas as dificuldades que a vida sempre mostrou a quem resiste, a quem sabe dizer não. Sou do Benfica por causa da Covilhã. Sou teimoso como os beirões. Sou leal como a natu-reza da serra. E se sou actor, foi porque um dia, aí, na Covilhã, me puseram num palco, e me convenceram que eu tinha jeito para a coisa. Muito obrigado.

“Trovas & Canções” é um espectáculo maravilhoso

“Tenho para mim, que se não formos melhores no fim da vida, do que fomos no início, não valeu a pena ter vivido”

Page 9: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/9JUNHO 2015

reportagem

Viagem guiada ao Oriental de São MartinhoJosé Manuel Macedo

O Jornal de Cultura visitou o Centro Cultural e Recreati-vo Oriental de São Martinho, onde foi amavelmente recebido pelo seu presidente, o Senhor Carlos Raposo. O encontro proporcionou uma agradável conversa, permitindo conhecer um pouco da sua história e fa-lar dos projetos atuais e futuros desta prestigiada coletividade Covilhanense.Criado em 1954 por um grupo de jovens carenciados, motiva-dos pelo gosto de “jogar à bola”,

rapidamente aglutinaram forças que os fez crescer como grupo e atingir resultados desporti-vos vitoriosos. Logo em 1958 e depois em 1961, sagraram-se campeões de futebol da FNAT.

Enquanto nos conta a história deste clube, Carlos Raposo mostra evidente emoção quan-do fala da criação do Rancho Folclórico do qual os seus pais sempre fizeram parte. O traba-lho exaustivo de recolha etno-gráfica levou o Rancho a ser

premiado a nível nacional. O Xadrez, Damas e o Ténis de Mesa, este último com partici-pações a nível internacional, fazem desta coletividade um embaixador da cidade e região. Mas as atividades recreativas, pelo caráter lúdico e de bem--estar dos seus associados, desenvolvem-se com a criação de grupos de Aeróbica, Step, Dance Fusion, Yoga e Danças de Salão.É, no entanto na área cultural, que o Oriental de São Martinho

marca a diferença nesta cida-de. Segundo Carlos Raposo, o grupo de cantares “O Trovas ao Luar” é o responsável pela or-ganização do “Encontro de Mú-sica Tradicional Portuguesa”, com enorme êxito na Covilhã. O canto coral e a música atra-vés da criação do Grupo Coral Infantil, Grupo Coral Juvenil e Grupo de Dança Jazz, levam a coletividade ao lançamento no ano 2000, do CD “Levados da Breca”. A “Escolinha de Mú-sica”, outro espaço onde os

Page 10: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/10 JUNHO 2015

jovens aprendem a tocar ins-trumentos, através do trabalho profissional do professor Diogo. Mas outro dos grandes motivos de satisfação de Carlos Rapo-so, são o êxito dos musicais, iniciados com o espetáculo “ “Contrastes”, seguido de “Can-tiga da Rua”. “Uma Viagem à Broadway”, torna-se num raro fenómeno de êxito, que as re-petições sempre esgotam a lo-tação disponível. Carlos Rapo-so contou-nos ainda que após ter tomado posse falou com os seus colegas de direção a quem transmitiu “que o que era bom, era para manter”, e que “os musicais têm sido um êxito e por isso vão continuar“, estan-do já a decorrer audições para o casting de novos projetos. O Presidente Carlos Raposo, fala-nos com muito orgulho da sede própria do Oriental, uma obra lindíssima, com toda a sua estrutura em cantaria, com uma traça antiga onde o granito e a madeira se conjugam harmo-niosamente, oferecendo aos sócios e visitantes um ambiente fresco e agradável, enquanto são transportados ao passado através das fotos e dos troféus ganhos ao longo dos anos, e tão bem expostos na sala dos troféus.

Com cerca de mil sócios, após uma atualização dos ficheiros, esta coletividade oferece aos seus associados protocolos com alguns ginásios, propor-cionando-lhes descontos no preço dos seus serviços. Esta é uma das boas razões para as pessoas se interessarem em ser sócios do Oriental de São Martinho. O associativismo é também esta permuta entre ati-vidades das empresas, diz-nos Carlos Raposo. A sua equipa diretiva muito coesa, composta de gente jovem, com duas me-ninas muito ativas, está motiva-da a proporcionar aos sócios de todas as idades, as melho-res condições para a ocupação saudável dos seus tempos li-vres. Quanto aos apoios das entida-des oficiais, tão necessários às coletividades, Carlos Raposo contou ao Jornal de Cultura, que tanto a anterior Câmara, como a atual, bem como a Jun-ta de Freguesia, têm sempre apoiado a instituição das mais diversas formas. A última aju-da estabelecida por protocolo assinado com a Câmara atual em Outubro, vai proporcionar a obtenção de uma verba de 40.000,00 Euros, paga fasea-damente em tranches anuais

até ao ano de 2017. Mas esta verba vai ser empregue exclu-sivamente nas obras de manu-tenção da sede, pois há áreas prioritárias, como o teto do bar, que evidencia claramente a ne-cessidade de uma intervenção urgente. Quase a terminar a nossa visi-ta, uma pergunta tinha de ser feita: Após estes dois anos de

mandato, sente-se feliz? Sente--se realizado?.A resposta foi imediata: “As pessoas que me conhecem sa-bem que só de falar no Oriental, fico feliz. Os meus pais fizeram sempre parte ativa desta coleti-vidade e ela, faz também parte de mim, da minha história de vida”.

Page 11: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/11JUNHO 2015

Clube do Professor mobiliza centenas de crianças

Centenas de crianças mobilizadas

Rogélia Maria Proença

O Clube do Professor organi-zou no dia 1 de Junho, a “Ponte Solidária”.Este evento serviu para cele-brar o Dia Mundial da Criança reunindo no Jardim Público e na Ponte da Carpinteira deze-nas de crianças covilhanenses.

DIA INTERNACIONAL DA CRIANÇA

As crianças tiveram um dia fe-liz. Brincaram e divertiram-se com as muitas iniciativas, que tiveram lugar, quer no Jardim, quer nos Penedos Altos. Todos unidos por uma ponte – Uma ponte solidária.

Poetisa, contista, cronis-ta. Autora da trilogia poé-tica Um Amor que vence Chronos (2013), O Livro dos Silêncios (2013), Pó de Estrelas (2014), lança-da em Coimbra e CovilhãO seu mais recente livro de poesia, intitulado Papel de Seda, sairá em final de maio e será lançado em Lisboa e posteriormente na Covilhã.Com participação em va-riadíssimas colectâneas de poesia, prosa poética, carta, diário, conto, conto infantil, a Autora tem di-

A ponte serviu de símbolo da união solidária entre as escolas e o Mundo. A vertente solidária da iniciativa está patente na recolha de bens alimentares e brinquedos para serem distribuídos pelas famí-lias mais carenciadas.

NO TEU JARDIM

Contra o intenso azul-anil do céuAs árvores impõem-se díspares e floridasVerdes, rosas, castanhas e persistentes,

Do lado de fora da minha janela...E, do lado de dentro de mim,

Tudo se regozija e animaComo a festa das flores no jardimQue comandas, Rapaz de Bronze...

Basta-te um olhar azul e puroUm sorriso verdadeiro, uma palavra

E as flores dançam invisíveisA quem não as reconhecer...

Tu tens o dom de devastar florestasOu mandares florir a Primavera...

E nesse País distante e Azul onde morasNão esqueças o caminho de estrelasQue te traz para esta pequena florQue tanto vive, se te demoras...!

(Março, 2015) RMP, in Papel de Seda, 2015

versas obras publicadas também em co-autoria, tendo participado no 1º Encontro de escritores Portugueses e Brasileiros, em Lisboa, em Janeiro de 2014 e dinamizado várias sessões de leitura e es-crita pelas várias escolas e instituições da região. Foi considerada Poetisa Revelação pela Corpos Editora, Poesia Fã Clube, Porto, em Fevereiro de 2014. A temática da sua obra versa uma forma muito própria, espiritual e inigua-

lável de fundir diversos temas: vida, sonho, es-perança, inconformismo, plenitude, sede existen-cial, reflexão sobre o acto poético, saudade, cisão interior, demanda do eu e do outro, e prazer de ser Mulher, numa feminilidade mística e uma força aními-ca, associadas ao Amor e os desafios vividos. Vale a a pena ler uma poesia que glorifica a sensibilidade e a Língua Portuguesa em toda a sua musicalidade.É professora por vocação e paixão.

Conheça os nossos Poetas

Page 12: Jornal de Cultura da Covilhã - Edição Nº 0

/12 JUNHO 2015

“À lupa”com Pedro Leitão

Escritor“Aprendi a não tentar convencer ninguém. O trabalho de conven-

cer é uma falta de respeito, é uma tentativa de colonização do

outro. José Saramago”.

LivroLoucura – Mário de Sá Carneiro.Um homem, decide provar à mulher que ama e com quem desen-

volve uma relação de amor livre, quase animal, que se ela fosse feia ele, mesmo assim, continuaria a gostar dela como se ela fosse a mais formosa das mulheres. O seu amor por ela era um sentimento tão forte, tão verdadeiro que era capaz de a amar sendo ela feia, disforme. Para provar o seu amor ele quis demonstrar isso da maneira mais horrível, tirando a Marcela a sua beleza, numa loucura que se irá voltar contra si próprio.

Filme La vita è bella é um filme ita-liano de 1997, do género comédia dra-mática, dirigido e protagonizado

por Roberto Benigni.Viver uma guerra, como se fosse um jogo. O amor incondi-cional de um pai que tenta com genialidade e humor, alterar a realidade e proteger o seu filho dos horrores da guerra.

Música Radiohead - Creep

YouTubewww.youtube.com/watch?v=X-

FkzRNyygfk

Chamavam-lhe o menino Azul.Ninguém sabia porquê, mas, o facto é que desde a loja das artes de pesca até ao canal do sul, desde a marginal à encosta que levava à falésia e ao mar do norte, desde o emaranhado das pequenas casas ao plano costeiro de vegetação rasteira, onde houvesse por ali vivalma, aquele menino era conhecido pelo menino azul.Desde há muito que assim o chamam sem saber porquê e nunca ninguém se lembrara de perguntar para com os seus botões porque aquele menino se chamaria azul.Dos olhos não lhe viria tal nome por-que estes pareciam duas castanhas a assomar nos ouriços de umas sobran-celhas pintadas de ouro sol com tal brilho que parecia que aqueles olhos estavam sempre envolvidos em água de chuva.Com certeza, da pele não lhe viria também a cor do nome, porque por mais voltas que se dessem a este mundo e ao outro, por certo se en-contrariam meninos pretos e bran-cos, acastanhados pelos trópicos ou esbranquiçados e avermelhados nór-dicos, amarelados de leste, e até às pintas como se usa nas regras natu-rais dos castelos e planícies Escoce-sas; mas azuis ou verdes, não havia registos nas conservatórias e notaria-dos, enciclopédias históricas e geo-gráficas, programas de natureza ou atestados antropológicos. Não exis-tem meninos azuis. Quem sabe não seria pela roupa, perguntará o leitor atento ao problema que aqui vimos trazendo; mas não, pela roupa não se-ria porque, se haviam dias que havia azul nas calças de ganga ou nas riscas da camisa, noutro qualquer dia eram verdes os panos e no seguinte, laran-jas ou vermelhos, outra vez azuis, e outra vez de outra cor qualquer. Não se pode dizer que houvesse por ali algum mistério – já dissemos que não, que ninguém ainda havia tido qualquer dúvida na questão de no-

menclatura – até porque a generali-dade dos animais humanos só se cos-tuma admirar com coisas admiráveis quando serão precisamente as simpli-cidades as guardadoras dos segredos mais profundos universais ou trans-cendentais da tão buscada felicidade.Fosse como fosse, o facto aqui trazi-do à luz da discussão é que o menino azul teria algum motivo para ser des-sa cor e não de outra, ser assim cha-mado e não de outra maneira qual-quer, se bem que desde que o mundo é mundo, o que mais se encontram são incongruências, podendo esta ser uma delas.E o que vimos então aqui contar, é um segredo incompleto, obliterado, apaixonado aqui, recomposto de ra-ciocino além, para que de alguma forma possamos perceber no fim da história porque é que este rapaz não se poderia chamar Luís ou Paulo ou ter qualquer outro nome normal de batismo.A tarde ia já a horas de o sol cansado tocar lá ao fundo na linha onde aca-bava o mar, e pintar o céu de sangri-nhal reflexo de fogueiras de lumes selvagens dos trópicos; tribos perdi-das, paixões selvagens. Por essa hora Marcelino Cemfogos regressava dos rochedos com dois polvos e um saco de percebes, meia dúzia de navalheiras, uma estrela-do--mar que trouxera por trazer.Ao chegar ao molhe, viu que aquele rapaz a quem chamavam azul, ali es-tava, ali olhava, ali permanecia sere-no, inalterável, impávido a ver o mar onde lá ao fundo se estava a esconder o sol.Então rapaz; estás à espera de sereias, perguntou Marcelino. Nunca se sabe o que as ondas podem trazer, disse o rapaz; mas se quer mesmo saber, gosto de ver o mar a esta hora; por um lado com o entardecer chega uma brisa fria que me faz perceber que há ventos que vêm de tão longe, tão longe, das montanhas brancas e mais para lá, dos glaciares com seus gelos permanentes onde os pinguins passam horas como eu, tranquilos a observar; e sabe, quando olho além para longe, fico a pensar que além--mar deve haver um sítio incrível, só assim se pode perceber que o sol o tenha escolhido para se esconder. Marcelino Cemfogos, que não per-cebia nada de conversas que não tivessem ou cartas ou azimutes, ru-mos e copos, putas e whiskies, pesca e muitas marés vivas, tempestades medonhas, ondas gigantes, naufrá-gios, auroras boreais e peixe, todo o peixe do mar, Marcelino – dizíamos – achou que aquela conversa de ven-tos e sois escondidos era conversa de xaxa. Pegara já nos sacos e redes para abalar quando se lembrou de colocar a questão que aqui nos vem trazen-do a mim e ao leitor. Olha lá rapaz, disse Marcelino Cemfogos, porque é

que te chamam menino azul. O rapaz, ainda sorriu como quem quisesse e soubesse perfeitamente responder à pergunta; como se até tivesse sido aquela questão uma forma de ele se sentir feliz. Porém, assossegou e res-pondeu: Talvez me chamem assim pela mesma razão que a si lhe cha-mam Marcelino, ou Cemfogos ou ao polvo que aí traz lhe terem chamado polvo.O pescador de percebes, sem perce-ber nada da conversa, seguiu por fim caminho em direção ao largo da ân-cora onde iria permanecer até noite alta, vendido o peixe recebido o di-nheiro, deixado depois em copos de rum que lhe afagavam os desalentos de uma vida sozinho, quase nenhum proveito, pouca fartura, desventura tanta, trabalho mais que escola, pão amassado a custas de corpo, e nenhu-ma bênção da alma a não ser as mu-lheres dispostas a dormir com ele de quando em quando que por dinheiro lhe davam uma das poucas razões de viver.O menino azul, voltara ao seu silên-cio de ver o mar. Guardara o seu se-gredo que continuava só seu e dela.Fora um dia, numa tarde de maio, que a vira pela primeira vez, vestido de risca azul larga e um alinhado fino branco. Andava por ali descalça a apanhar pedras e conchas trazidas do fundo do mar pela rebentação. Os ca-belos dourados esvoaçavam no vento de poente que trazia com ele exis-tências de algas e sal. Os olhos dela, eram os olhos mais bonitos e verdes que alguma vez vira. Verdes. Para meter conversa falei-lhe de búzios e de que um dia achara um tesouro na enseada dos desejos. Nos dias se-guintes, sempre ao entardecer, ali me encontrava eu com ela, o vento com o mar e ficávamos juntos até ao anoite-cer. Poderia viver assim para sempre. Mas um dia, as histórias felizes têm sempre um dia assim, um dia – dizí-amos – ela chegou ao canavial junto às dunas e disse-me que ia embora. O universo pareceu entristecer porque o vento parou, o canavial parou, o mar parou e eu apenas sentia o coração a bater no pulso, no pescoço, e chegou--me a vontade de um vómito interior, um medo de arrepiar, um choro conti-do. Tudo desapareceu em meu redor; apenas fiquei eu e ela. Então, olhei-a nos olhos e disse-lhe que o seu olhar tinha a ternura de planícies verdes e flores. Já ela, olhou para mim e para me dizer adeus jurou que seria sem-pre minha e que eu lhe faria lembrar para sempre o mar. Disse adeus à me-nina dos olhos que choravam verde e ela, ela chamou-me menino azul.

Anoiteceu na praia.Olhei o mar sentado no paredão.Talvez ela sonhasse comigo e, por estas horas, já estaria por certo a dor-mir.

MENINO AZUL

Pedro Leitão