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PUC-Rio / Departamento de Artes e DesignPPD CV Conclusão 2010.1Josef Albers e o Holofote:Um Estudo da Interação da Cor a Partir da Teoria do Conhecimento
Ricardo Durski Batista
Orientação:professor orientador: João de Souza Leiteprofessor tutor: Evelyn Grumach
Para minha mãe
IntroduçãoEste trabalho será uma análise da pedagogia de Josef Albers. Como a proposta de
Albers é eminentemente prática, serão realizados exercícios seguindo as propostas do
mesmo, pois do contrário seria um contra-senso um estudo crítico que fosse apenas
teórico. Para tal buscar-se-a apoio em material que exponha as suas propostas de
exercícios, material de autoria do próprio e relatos que podem ser encontrados em
alguns artigos pela internet. A pedagogia de Albers também será exposta como legítima
aquisição de conhecimento a partir de uma Teoria do Conhecimento fundamentada
nas idéias de Karl Popper. Por fim será apresentado um breve resumo da vida e idéias de
Johannes Itten e Josef Albers, afim de expor as diferenças de idéias existentes dentro da
Bauhaus e demonstrar a vivacidade e universalidade das idéias de Albers.
Apesar de sua enorme importância como pedagogo, Albers chegava ao ponto de
evitar a exposição de sua pedagogia, na tentativa de que seu trabalho como artista fosse
apreciado como tal, desassociado de seu ensino. Josef Albers aborda o ensino de uma
maneira sistemática. Começando sempre pela experiência do aluno com o universo
particular que será pesquisado. Este universo, que pode ser tanto o da cor, quanto o da
forma, é primeiramente apresentado em sua forma primordial, caótica, onde não
entram ideias pré-concebidas. O que temos na nossa frente neste momento são
elementos, coisas, estímulos que pertencem a este universo particular; no caso deste
trabalho estamos falando do universo das cores. Que não é o universo dos papéis,
apesar de coexistir com este, nem das tintas e nem mesmo da luz. Este universo só é
ocupado pelas cores e suas relações percebidas por nós.
“Nosso estudo da difere fundamentalmente daqueles que
fazem a análise anatômica das cores (pigmentos) e das propriedades
físicas (comprimento de onda). Estamos interessados na interação
da cor, isto é, na observação do que acontece entre as cores”
Podemos acrescentar que o seu estudo também não apresenta, inicialmente, uma
teoria sobre a mistura das cores, tanto de luz como de pigmentos. Apesar de uma teoria
da composição da cor através de mistura entre tons e relações complementares ser
introduzida desde o começo, e ao longo do curso de maneira gradual, mas não como
uma teoria completa e sistematizada, ou explicitada; esta tarefa cabe ao aluno, através
da descoberta. Isto não quer dizer que o aluno construa todo o conhecimento por si só,
a partir do que vê. Este caminho é dirigido pelo próprio Albers através das tarefas que
propõe e de alguns comentários acerca do universo das cores e dos meios de
reprodução da cor; como é o caso de seu comentário sobre a fotografia, que veremos
mais adiante. Uma das características do método pedagógico de Albers está no fato de
que cada exercício, serve de base para o exercício seguinte.
Josef Albers trouxe contribuições importantes para a pedagogia da arte e do
design, notadamente nos ensinos relacionados às cores e aos materiais. Não podemos
dizer que Albers ensinou uma teoria da cor, mas que ele ensinava a vê-las; como nos
aparecem em diferentes circunstâncias, como reagem umas as outras e como essas
características podem ser apreendidas por nós através da experimentação consciente.
Um dos seus exercícios com cores consistia em construir a ilusão de transparência
utilizando-se apenas papéis coloridos opacos. Nas próximas três imagens podemos ver
exemplos do exercício citado, além da evolução de situações simples para mais
complexas, que necessitam da utilização de diferentes princípios de combinação de
cores.
Albers encorajava os alunos a buscar respostas a partir do próprio material. Ele
acreditava que através do contato com os materiais o aluno apreendia o funcionamento
da natureza. Seus métodos privilegiavam a tomada de consciência dos materiais e da
natureza através da prática - ou das experiências. Através do contado e da experiência
com os materiais os alunos conheciam as limitações e possibilidades dos materiais.
É inegável a relação entre a arte moderna e o que era feito na Bauhaus, porém o
propósito dos exercícios de Albers não era criar objetos para serem apreciados em si
mesmos, mas exercitar a busca de soluções visando o desenvolvimento da capacidade
dos alunos de enfrentar questões relacionadas ao design. Quanto a isso podemos dizer
também que o uso de formas geométricas nos exercícios carregam consigo a ideologia e
a estética modernas.
EmpirismoDo pensamento crítico ao empirismo
Popper vê a passagem do pensamento mítico ao crítico, na grécia antiga, não
como uma passagem do pensamento mítico ao científico, mas como uma instauração
da própria crítica dentro do pensamento mítico, ou, como queiram, do próprio
pensamento. De início o pensamento crítico desenvolveu-se em cima de mitos, apenas
posteriormente a observação tornou-se ponto de sustentação para o pensamento
crítico.1 Geralmente o pensamento de Platão e Aristóteles é caracterizado como o ponto
culminante do pensamento clássico. A partir daí seguiram-se ou doutrinas de menor
importância, ou releituras, reproduções e interpretações, muitas vezes dispares, do
pensamento dos dois grandes filósofos. Não polemizaremos com tal interpretação
histórica, e seguiremos para o pensamento moderno, onde o pensamento clássico passa
a ser questionado mais avidamente, desenvolvendo questões cujo desenrolar estende-se
até os dias de hoje.
O pensamento moderno, categoria atribuída a este por Hegel, caracterizou-se
pela valorização do indivíduo e pela forte rejeição ao dogmatismo instalado pela
escolástica e sua leitura de Aristóteles. Um dos pontos a ser duramente atacado pelos
modernos seria a ordem do cosmos estabelecida por Aristóteles, adotada e defendida
pela Igreja. Apesar disto a ênfase aristotélica na pesquisa experimental e na observação
da natureza permanecem intactos, sendo cruciais para o desenvolvimento da revolução
científica e da modernidade. A isto pode-se acrescentar as ideias platônicas e pitagóricas
acerca da matemática. Grande parte da revolução científica assenta-se na percepção da
matemática como sendo a linguagem da natureza.
Uma característica muito marcante deste momento era a ênfase dada à
observação sensível dos fenômenos. Acreditava-se que a única fonte válida de
conhecimento era aquela advinda da experiência sensível. Isto aliava-se à crença na
indução como sendo o único modo de inferência válido. Porém a indução, pura e
simples, não é capaz de fornecer conhecimento verdadeiro, como alguns pensam, nem
capaz de fornecer regras gerais que nos capacitem a predizer os fenômenos. A indução
foi atacada por Hume, cuja tese, se aceita, tem como consequência a impossibilidade de
se obter qualquer conhecimento verdadeiro pelos sentidos, pois nada me garante que
um evento sempre se repetirá da mesma maneira. Para Hume a indução tem no
máximo uma utilidade prática, não sendo de forma alguma uma atitude racional.
1 ver Marcondes, Danilo “Iniciação à História da Filosofia pg. 27
Albers tornou-se um educador em meio ao muito influente movimento de
reforma pedagógica. Este movimento era contrário ao ensino clássico, onde era
suficiente que o aluno aprendesse a aplicar modelos já estabelecidos, sem que houvesse
nenhum incentivo para a busca criativa e espontânea na abordagem de problemas.
Mais ou menos na mesma época em que a reforma pedagógica ganhava força,
também surgiam novas ideias acerca do conhecimento, provindas principalmente do
que foi chamado Círculo de Viena. Este movimento é conhecido como neo-positivismo,
positivismo lógico ou empirismo lógico.
Dentre os professores que estudamos, Albers é o que parece ter se alinhado de
maneira mais coerente com os preceitos do empirismo. Enquanto os outros
mantinham posições profundamente especulativas, de difícil comprovação; além de
pressupostos duvidosos e muitas vezes recorrerem a ideias que hoje qualificariamos
facilmente como sendo de cunho esotérico.
A idéia que é mais pronunciada, no entendimento de Albers sobre sua pedagogia,
seria a crença na indução como forma primária de aquisição do conhecimento. Esta
tese foi atacada, a nosso ver, com muita propriedade, pelo filósofo da ciência Karl
Popper, que defende teses similares às de C.S. Peirce a esse respeito. Peirce foi um
filósofo muito agudo no que diz respeito à ciência, e sua influência é notada no
desenvolvimento das ideias de muitos pensadores, principalmente de língua inglesa, até
hoje. Em relação ao norte americano, Peirce, exporemos apenas uma parte de sua
filosofia, ou seja, a que diz respeito aos modos de inferência: indução, dedução e
retrodução. Estas ideias forma bastante discutidas em muitos textos do filósofo, por
isso o que vamos oferecer será uma visão reduzida e parcial destes modos de inferência.
Isto já é o suficiente para que tenhamos uma referência que, acredito, reforçará e
ajudará a vermos a Teoria do Holofote de Popper em um contexto um pouco mais
amplo. Nos desculpamos adiantadamente pelo que será feito, pois as ideias que vamos
expor agora são parte de um sistema filosófico desenvolvido por Peirce, e quem tem um
alcance muito mais amplo do somos capazes de arranhar.
Em Peirce a indução é o terceiro de três momentos que fazem parte da nossa
maneira de conhecer. Brevemente, os três momentos são 1. Retrodução 2. Dedução 3.
Indução. Na retrodução nós formulamos uma hipótese que explicaria um fenômeno
observado. Desta hipótese nós deduziriamos as suas consequências possíveis, e no
momento seguinte, através da indução, observaríamos se o que foi deduzido
corresponde ou não ao que é observado.
Teoria do Balde x Teoria do HolofoteVamos contrapor duas teorias do conhecimento e advogar a favor de uma delas.
Aqui seguiremos livremente idéias do filósofo Karl Popper acerca da aquisição do
conhecimento. Começaremos expondo uma teoria do senso comum acerca do
conhecimento, a teoria do “balde mental”, como a chamou Popper. Depois
contrastaremos esta teoria com a proposta pelo filósofo, que chamarems de teria das
“conecturas e refutações”, e com isso tentaremos expor a falsidade da primeira tese.
Podemos dizer que a teoria do “balde” é aquela implicitamente assumida pelo
senso comum. Esta teoria assume que nosso cérebro é um balde vazio, e que através da
vida vamos acumulando conhecimento como um balde que aceita invariavelmente
qualquer coisa colocada nele. Esta teoria não diz nada sobre como o conhecimento é
fixado e processado pela mente.
Podemos melhor expor as falhas da primeira teoria explicando a segunda, a do
Holofote. Para esta teoria nós já nascemos com um aparato cognitivo disposto a
perceber certas coisas e não outras. Nascemos com capacidade potencial de observar
um espectro eletromagnético limitado. Nascemos com braços e pernas e com eles
aprendemos a andar em pé, a equilibrar-se,claro que também com a influência do
ambiente, não nascemos com rodas por exemplo. Para Chomsky temos uma capacidade
inata para o desenvolvimento da linguagem. Esta capacidade se dá em níveis do
aparelho fonador, bem como em nível de funcionamento cerebral. Estas características
primárias são como conjecturas/disposições iniciais acerca de como devemos nos
comportar no mundo, e foram moldadas ao longo da história da espécie através da
seleção natural. Além disso temos características, comportamentos e julgamento que
são ajustáveis ao longo da vida, como o gosto por uma certa comida e posições
referentes a questões morais, por exemplo. Porém o que nos interessa no presente são
as habilidades e capacidades imaginativas adquiridas através da experiência. Para isso
desejamos ampliar o escopo do que chamamos conhecimento. Incluiremos habilidades,
disposições e capacidades imaginativas dentro do que chamamos conhecimento, e
trataremos conhecimento como sendo o que nos dispõe ou possibilita a tomar decisões,
fazer reflexões, agir de forma consciente ou inconsciente, arranjar e rearranjar as coisas.
Como adquirimos conhecimento? Se não é pelo acúmulo de informações de que
forma o nosso conhecimento pode crescer? Defendemos, a maneira de Popper, a tese de
que sempre partimos de alguma teoria, uma suposição de como algo funciona. Quando
eu aprendo a andar de bicicleta eu testo várias formas de me equilibrar, apesar de não
estar plenamente consciente disso. Com o tempo as formas, ou hipóteses erradas acerca
de como devo distribuir meu peso vão sendo eliminadas, e as formas corretas vão as
substituindo. Estamos falando de um nível pré-consciente de conhecimento, ou
melhor, um conhecimento não explícito. Uma das teses que defendo é a de que parte do
conhecimento do designer é desta natureza. É através da tentativa e erro, expectativa e
expectativa frustrada, ao manipular materiais que o designer é capaz de formar um
corpo de memórias sensoriais e noções acerca do mundo. Esta seria uma das
características que fariam parte do que é ser designer. É deste modo que pretendemos
fundamentar a pedagogia de Albers como capaz de gerar conhecimento.Posteriormente
os exercícios serão analisados perante estas perspectivas.
BiografiasAgora passaremos às breves biografias de Johannes Itten e Albers afim de
contrapor suas maneiras de abordar o ensino na arte ou design.
Johannes IttenJohannes Itten foi principal instigador da instituição do “Curso Básico” ou “Curso
Preliminar” na Bauhaus. Segundo Banham o curso de Itten chega a ser tomado como a
“essência ou até mesmo como o próprio método da Bauhaus”. Formalizado em livro
“Curso Básico da Bauhaus”, seu curso continua a ter grande influência em escolas de
design na alemanha, mesmo que a referência a Itten não seja feita de forma explicita.
Ao mesmo tempo os “princípios de Albers” são aplicados apenas raramente.
Posteriormente faremos observações aos exercícios a partir destas ideias.
Itten nasceu em Bernese, Suiça. Em Bern, de 1904 a 1908, estudou para ser
professor primário. Em sua prática como professor, em Bernese, Itten evitava criticar
diretamente os trabalhos de seus alunos. Ele acreditava que assim estimulava a auto
confiança e o crescimento pessoal. Estes princípios tem origem na reforma pedagógica,
com a qual Itten teve contato em Bern.
Através de Eugène Gilliard, Itten teve contato com as idéias de Eugène Grasset
acerca dos fundamentos do Design. Em seu livro Grasset afirma que o novo se dá pela
modificação de formas elementares. Ponto, linha, triangulo, quadrado, circulo, arco,
espiral... formas geométricas que depois serão revistas no curso fundamental de Itten
na Bauhaus. Com Hölzel, Itten obteve a confirmação de suas convicções sobre a arte
ser derivada de formas elementares - triângulo, círculo, quadrado – além de tomar
contato com teorias da cor e contraste, e exrcícios de ginástica que também se
tornariam importantes componentes de sua pedagogia na Bauhaus.
Schlemer nota que no início conturbado da Bauhaus, quando os alunos estavam
mais interessados em discutir problemas sociais do que se dedicar ao aprendizado das
artes, Itten mantinha o controle usando de uma postura pedante e ditatorial. Porém,
mais tarde, diz que Itten é “pedagogicamente mais capaz que os outros”.
Itten se propos a três tarefas no curso preliminar:
1. Liberar os alunos das convenções estabelecidas e fazer com que suas próprias
experiências e sentidos gerassem obras genuinas
2. Através de exercícios com materiais e texturas auxiliar o aluno a escolher o seu
caminho nos anos posteriores
3. Apresentar os princípios para a composição criativa. As leis da forma e da cor
abririam para o aluno o mundo da objetividade, posteriormente a subjetividade se faria
presente possibilitando a interação da forma e da cor de diversas maneira.
Suas aulas começavam com exercícios de ginástica, que possibilitavam que o
corpo se expressasse, experimentasse, sentisse e libertasse "movimentos caóticos", para
depois passar a exercícios de harmonização. A intenção destes exercícios era de que os
alunos utilizassem suas capacidades motoras, experimentassem movimento e ritmo,
diretamente e fisicamente, como príncipios existenciais primordiais e principios
fundamentais da organização pictórica.
As principais atividades do semestre consistiam em exercícios que iam dos
estudos de improvisação em duas dimensões até estudos de composição em três
utilizando diversos materiais. Suas lições baseavam-se no princípio de que tudo que é
perceptível é percebido através da diferença e uma teoria do constraste constituia a base
de todo o curso. Exemplos de contrastes trabalhdos no curso seriam: “grande-pequeno,
longo-curto, largo-estreito, grosso-fino, preto-branco, muito-pouco, reto-curvo, agudo-
grave, horizontal-vertical, diagonal-circular, alto-baixo, plano-linha, plano-corpo, linha-
corpo, áspero-suave, duro-macio, parado-movendo-se, leve-pesado, transparente-
opaco, contínuo-intermitente, e outros.” Estes eram complementados com os
contrastes de cores, baseados em Hölzel.
Para aguçar a sensibilidade de seus alunos, Itten os pedia para tocar diversos
materiais de olhos vendados. Exercícios com materiais contrastantes eram feitos com a
finalidade de se estudar a natureza. Este estudo se complementava com a utilização das
técnicas de luz e sombra na representação destes materiais. Os alunos deveriam criar
representações fotorealistas, de maneira a aguçar os sentidos e consequentemente a sua
percepção da realidade. Para Itten sentidos aguçados=pensamento real e exato.
Ao mesmo tempo que os desenhos da natureza eram objetivos e precisos, os
desenhos de modelos vivos eram expressivos. Nestes desenhos os alunos deveriam
captar o movimento do modelo enquanto eram motivados a desenhar ritmadamente,
em círculos, por exemplo, ou sob o acompanhamento de música. No final estes estudos
acabavam refletindo a prática do próprio professor.
Outra parte do curso de Itten se dedicava à análise de obras dos grandes mestres.
Estas obras deveriam ser analisadas em termos de sua construção, seus eixos, seus
pesos. Esta análise deveria ser feita emocionalmente e então transportada para o papel.
O objetivo de Itten era que os alunos colocassem no papel, de forma concreta o que
sentiam através da obra.
“Sentimento e pensamento, intuição e intelecto, expressão e construção, são os
polos que caracterizam tanta a prática de ensino quanto a obra de Itten”
As mesmas tensões caracterisam a teoria da forma de Itten, que parte das formas
básicas do triângulo, o quadrado e o círculo. Ele toma o significado dessas formas da
maneira que lhe foi ensinado por seus antigos mestres, além de dedicar a elas muitas
pesquisas em seu diário, por exemplo:
Quadrado: calma-morte-negro-escuro-vermelho
Triângulo: severidade = vida-branco-brilhante-amarelo
Círculo: do zero ao infinito = constante...calmo...sempre azul
Segundo Rainer K. Wick podemos estar certos de que estas idéias tiveram grande
influência de Kandinsky, cujo livro “Do Espiritual na Arte” constava na biblioteca de
Itten.
Seus ensinamentos em três dimensões também contavam com formas
elementares, agora o cone, o cubo e a esfera. Muitas das composições eram baseadas em
cubos e remontam a experimentos do movimento De Stijl. Outra vertente de
composições eram as feitas com materiais encontrados, geralmente material
descartado. Estes exercícios possibilitavam aos alunos expressar a sua própria
criatividade, e eram apreciados de forma meramente estética.
Crítica a Johannes IttenItten buscava, em seu ensino, desenvolver a força criativa natural dentro de cada
um. Ao invés de oferecer uma série de conteúdos para serem adquiridos pelos alunos,
Itten queria que estes desenvolvessem suas capacidades latentes, aceitando com Goethe
que cada homem será um gênio, se suas caracteristicas de quando criança forem
desenvolvidas livremente e não forem tolhidas por um sistema educacional que
privilegia apenas certas qualidades. Por sua personalidade forte e seu carisma muitos de
seus alunos acabavam por produzir trabalhos semelhantes aos seus, o que ia de
encontro à sua pedagogia que privilegia a individualidade. Enquanto isso outros alunos
o evitavam, procurando auxilio nas aulas privadas de Theo van Doesburg. Itten nunca
esteve totalmente inclinado a preparar seus alunos para serem designers ou arquitetos.
O que ele estava procurando era o desenvolvimento do ser humano como um todo e
não prepará-los com habilidades em favor de um “design aplicado”. Na verdade ele
acreditava que a arte, quando tornada utilitária, ou funcional, ficava comprometida, e
isto não lhe agradava. Em seus cursos práticos vemos repetições dos fundamentos dos
cursos preliminares sobre forma, ou seja, usos do círculo, triângulo, quadrado e cubo.
Ademais estes objetos não são concebidos como criações para a era da máquina, são sim
peças únicas criadas de forma expressiva. Com a mudança de direção dada a escola, por
Gropius, que agora assumia uma posição mais pragmática e voltada à tecnologia, Itten
sentiu-se obrigado a deixar a Bauhaus por achar que não mais poderia contribuir com a
mesma. Gunter Otto critica Itten por suas avaliações dos grandes mestres, que
assumiria como certas suas próprias acerções de cunho subjetivo. Hans Giorn aponta
em Itten um falso clamor à objetividade, além de achar que sua pedagogia não garante a
plena realização das capacidades do indivíduo, como queria Itten.
Josef AlbersAlbers foi aluno de Itten no curso preliminar e colaborou com Moholy-Nagy por
cinco anos antes de ter total responsabilidade sobre o curso, em 1928. Werner Spies
considera o curso de Albers como sendo o mais universal, o que teria o maior
abrangência, um completo treinamento da visão.
Albers era extremamente crítico em relação à escola tradicional, sua visão reflete
aquela da “reforma pedagógica” da época. Menos história e mais preocupação com as
questões contemporâneas, menos cientificismo vazio e ensino apenas de “fatos
estabelecidos”. Em um ponto Albers diferenciava-se radicalmente da reforma
pedagógica, ele achava que a individualidade deveria ser excluída da preocupação da
escola. Embora concordasse que a escola deveria integrar indivíduos em favor da
sociedade.
“Aprender através do fazer” é a expressão que pode resumir a proposta pedagógica
de Albers. Para ele a pessoa devia aprender através de seu próprio caminho, mesmo que
ela encontra-se soluções já estabelecidas estas teriam sido aprendidas, e não ensinadas.
Mesmo que o caminho deste tipo de aprendizado seja mais longo, ele levaria a melhor
apropriação dos resultados por parte do aluno. “Erros reconhecidos encorajam o
progresso. Desvios conscientes e busca de falsos caminhos de forma controlada aguçam
a crítica...”
Em seu curso sobre forma, um curso eminentemente prático, ele em princípio
limitava rigorosamente o uso de ferramentas para encorajar o aluno a ter o seu próprio
pensamento, e não recair sobre soluções tradicionais.
Albers caracterizava seu método como indutivo. Ou seja, ele não apresentava aos
alunos uma teoria elaborada (caso extremo: Kandinsky, menos fortemente: Itten), mas
deixava que os alunos acumulassem experiências da forma mais livre possível. Isto
consistia no uso de materiais de maneira desinibida, de olho em suas possibilidades
técnicas e estéticas. Muito importante também era a apreciação coletiva dos resultados,
o que estimulava o pensamento sobre o trabalho. O trabalho nunca é puramente
manual, sempre há atividade intelectual incluida. Para Albers isto levava ao
conhecimento dos princípios universais da forma, como harmonia, ritmo, escala,
proporção e simetria. Um pouco diferente do manifesto da Bauhaus que dizia que a arte
não poderia ser ensinada, ele acreditava que esta poderia ser aprendida.
A importância do papel como meio
Albers não enfatiza tal ponto em “A Interação da Cor”, mas o uso de papeis
coloridos prescinde de uma demonstração de uma teoria sobre a composição e
combinação da cor, o que seria necessário no caso do uso de tintas. Isto reflete uma
afirmação do próprio sobre seu método de ensino:
“This book, therefore, does not follow an academic conception of ‘theory and
practice.’ It reverses this order and places practice before theory, which, after all, is the
conclusion of practice.”
Portanto a não exposição de uma teoria das cores, a princípio, por Albers, é uma
atitude deliberada e completamente condizente com o seu objetivo, ensinar a ver.
É em relação ao pensamento de Albers sobre sua própria pedagogia, ou teoria do
conhecimento, que está nosso ponto de discordância. Isto de maneira nenhuma
invalida o seu método. Discordamos sobre o que ele pensa ser o seu método, do que ele
é, mas não da maneira como ele se realiza. Isto não significa necessariamente que
Albers esteja errado acerca da natureza de sua pedagogia, pois é uma questão que não
lhe interessava, ou não era relevante para ele, apesar de ser relevante para este trabalho.
Em suas palavras, “em relação à interpretação da cor,... Kandinsky frequentemente
pedia em relação à arte: o que importa não é o quê, mas o como.
Um princípio muito caro a Albers era o que ele chamava de Economia de Meios,
ou seja, conseguir o máximo de efeito/resultado através do mínimo de esforço/trabalho.
É baseado neste princípio que Albers adotou as formas geométricas como sendo ideais
para o ensino da cor. Estas formas seriam mais eficazes na produção dos efeitos
relativos às interações entre as cores. Por isso os exercícios, em sua imensa maioria, são
executados com papéis recortados em formaas geométricas. Percebemos também que
suas “Homenagens ao Quadrado”, que buscam investigar e instigar o observador em
relação a interação das cores, também usam formas geométricas simples. O próprio uso
de papéis também é resultado deste princípio, pois estes proporcionam um manuseio
mais dinâmico das cores, e conseqüentemente as suas relações. Esta tarefa seria muito
mais enfadonha, sujeita a erros, às mudanças do úmido ao seco e das modificações das
cores ao longo do tempo, e menos asseada, se fosse executada com tinta. Os papéis
proporcionam uma composição mais limpa, o que é muito importante para a
apreciação do resultado dos exercícios.
Levando em conta esses princípios, nos dias de hoje, me parece razoável o uso do
computador para as experimentações, e a impressão a Laser como meio final de
demonstração dos exercícios. O uso dos programas gráficos para a elaboração dos
exercícios possui pelo menos um ponto falho, que diz respeito à obtenção das cores
para os exercícios. Nestes programas as cores podem ser obtidas pela manipulação de
valores de cores primárias, o que necessita, a priori, de uma teoria da cor adequada à
técnica utilizada para a mistura de cores. Isto introduz um elemento teórico em um
nível elementar do aprendizado, onde ele não seria desejável se quiséssemos reproduzir
com maior fidelidade a pedagogia de Albers. Porém este trabalho não se limita a
reproduzir os exercícios, mas também a analisa-los a partir de uma teoria do
conhecimento, além de propor e analisar outros estudos que surgiram ao longo da
feitura do trabalho.
Estudos
Escala de cinzasEm seu livro “A Interação da Cor”, Albers propõe que façamos uma escala de tons
de cinza recortados de alguma revista. Ele ainda recomenda que estes pedaços de papel
sejam retirados de uma mesma edição, afim de que não haja variação nos tons de cinza.
Acredito que na época revistas em preto e branco eram a norma. Como hoje é muito
difícil encontrar uma edição inteira que ofereça grande quantidade de tons de cinza,
optamos por fazer o exercício a partir de imagens disponíveis em bancos de dados na
internet.
A tela do computador torna mais fácil a comparação entre tons de cinza
próximos, principalmente quando uma área de cor é colocada em interseção com outra.
Isto se deve provavelmente pelo fato do monitor emitir a sua própria luz, o que garante
bastante homogeneidade à iluminação a qual os objetos estão submetidos. Em uma
situação onde as áreas de cor estão submetidas à luz refletida, aparentemente, a
comparação se torna mais difícil, muito provavelmente pela falta de homogeneidade
que a luz ambiente fornece, já que ela é refletida de maneira bastante caótica por todos
os objetos no ambiente até chegar ao objeto, além de poder incidir diretamente sobre
ele. Aparentemente uma situação de luz do sol incidindo diretamente sobre a cor seria
ideal, porém neste caso nos defrontamos com um problema decorrente da intensidade
desta luz, que acaba por nos ofuscar a visão e faz com que nossa capacidade de
distinguir tons próximos seja menor do que em situações de iluminação mais amena.
Nesta variação digital do exercício de escala de cinzas de Albers podemos observar
que há mais área coberta pelas partes mais claras e mais escuras do que pelas áreas
médias. Isto aparece aqui pois as áreas de cor, recortadas de imagens digitais PB, foram
dispostas de maneira que nenhuma se sobrepusesse completamente sobre a outra e que
todas fossem aproveitadas. Isto comprova as palavras de Albers, de que a fotografia,
diferentemente da capacidade humana de enxergar meios tons mais delicados, tende a
deixar os cinzas escuros ainda mais escuros e os cinzas claros ainda mais claros. Esta
variação também pode ser executada com pedaços de papel.
Por que Albers não chamou a atenção para esta forma de executar o exercício, já
que ela parece comprovar de maneira tão clara a sua observação para o desvio de tons
de cinza que ocorre na fotografia? Podemos especular que sua rigidez formal o tenha
afastado desta possibilidade, não deixando nem que ele mesmo a percebesse. Podemos
até dizer que esta variação do exercício sintetiza mais informação que a versão proposta
por Albers.
Exercício Original
Amostra do processo de feitura do exercício anterior:
Podemos tomar a afirmação de Albers sobre a fotografia como uma hipótese da
qual podemos deduzir situações a serem confirmadas ou negadas pela experiência. A
hipótese teria a forma de uma afirmação: As fotografias tendem a exagerar os cinzas
médios tanto em direção ao branco quanto em direção ao preto. A dedução teria a
forma de: Se a hipótese estiver correta, ao recortarmos tantos pedaços de cinza quanto
pudermos de várias fotografias escolhidas ao acaso, distribuirmos estes pedaços de
modo que todos os pedaços estejam aparentes, alinhados pela direita e os tons mais
escuros fiquem na parte de cima, e os claros na parte de baixo, teremos um acumulo
maior de pedaços nas extremidades de cima e de baixo, formando quase que um gráfico
informativo sobre a distribuição dos tons nas fotografias em preto e branco.
Uma cor parece duas e quatro cores parecem trêsPara fazer este exercício começamos escolhendo duas cores bastante
contrastantes para usar de fundo, o Ciano e o Vermelho. Estas foram escolhidas dentre
6 cores, sendo 3 primárias, Ciano, Magenta e Amarelo, e suas 3 cores complementares,
Vermelho, Verde e Azul, resultado da mistura das primeiras duas a duas.
CMYK
RGB
Depois escolhemos o amarelo como a cor a ser alterada pela influência das cores
de fundo. Neste caso podemos perceber que o amarelo é alterado pelos fundos, mas de
maneira muito pouco intensa. Em seguida fizemos a experiência de utilizar o Magenta,
alterando a cor dos dois quadrados menores gradativamente do branco ao Magenta
mais saturado (ou brilhante, na linguagem utilizada por Albers). Rapidamente a
influência dos fundos se mostra presente e os dois quadrados menores parecem duas
cores bastante distintas. Notamos que o contraste entre as duas cores parece mais
acentuado quando utilizamos o Magenta em torno de 76%. Talvez isto se dê por ocasião
dos contrastes de luz e de cor estarem se somando neste ponto. Notadamente o
contraste de intensidade de luz decai depois deste ponto.
O exercício seguinte parte dos mesmos princípios para fazer com que quatro
cores pareçam três cores. O resultado não foi completamente satisfatório, apesar de
apontar que existe uma solução para o problema.
Estudo CMYBEste estudo tem um viés sistemático e investiga as interações entre o Ciano, o
Magenta e o Amarelo, diante do Azul. Percebemos que a interação entre o Magenta e o
Azul é onde ocorre mais alteração nas cores. Note que Estas duas cores são as que mais
se assemelham em valor (luminosidade).
Teste de HipóteseA partir do estudo anterior podemos formular e testar a hipótese de que cores de
valores semelhantes sofrem maior alteração ao interagirem.
Estudo de tamanhoEsta foi uma tentativa de observar se há, e como se daria a interação entre cores
dependendo da área ocupada pelo fundo.
Cores tênues e borda coloridaEste estudo a princípio visava observar se o branco puro apareceria como tal se
aparecesse dentro de um conjunto de quadrados fracamente coloridos. Várias versões
foram feitas, e foi constatado, na presença de alunos e do orientador deste trabalho, que
a borda fina faz com que as cores esmaecidas pareçam recobertas levemente pelo tom
da borda.
ConclusãoPedagogicamente, Josef Albers, tem um valor incontestável. Seu método
permanece relevante até hoje, e sua maneira construtiva de ensino é estimulante e
proporciona o prazer da descoberta. Se Albers peca em algum aspecto é principalmente
por ser um homem de seu tempo, apesar de paradoxalmente seu método ser atemporal
e universal. Por seu método basear-se principalmente na cor percebida, ele pode ser
adaptado para outros suportes que não apenas o papel.
Nossa crítica a Albers também é um sinal dos tempos, e o seu método pedagógico
permanece inabalado em relação a ela. A nossa crítica é direcionada à maneira que
Albers acredita que se dá o conhecimento, o que não era uma questão muito relevante
para ele, mas para nós torna-se uma questão crucial para a afirmação do Design como
área legítima de conhecimento objetivo, e portanto, uma área capaz de gerar e testar
hipóteses, e não uma área determinada principalmente por estilos, modismos, gosto
“subjetivo” e uma vaga noção de criatividade. Para nós o fator diferenciador do designer
formado pela academia, do designer prático (e legítimo), é o domínio do conhecimento
que possui, ou seja, saber o que sabe. Com menos certeza eu colocaria que o designer
formado na academia deveria saber o que sabe, e como sabe. Ou talvez isto caiba
melhor em uma Filosofia do Design.
Este trabalho é uma tentativa, humilde e breve, de tentar mostrar que o Design é
capaz de colocar marcos objetivos onde podemos nos basear afim de exercer nossa
atividade de forma consciente. E, afinal, qual trabalho de design (gráfico) não é fruto de
uma complexa e intrincada rede de hipóteses a respeito de como este será percebido
pelos outros. Quando digo isto não quero destruir a parte autoral, que também
pertence ao design, mas defender que o que pode ser consciente e objetivo, o seja.
Como alguém já disse: “Dai a César o que é de César”.
Bibliografia:
http://www.tate.org.uk/research/tateresearch/tatepapers/07spring/saletnik.htm#is7noteref9
Peirce, Charles Sanders “Semiótica”
Popper, Karl, “Conhecimento Objetivo”
Wick, Rainer K., “Teaching at the Bauhaus”
Banham, Reyner, “Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina”
J. Abbott Miller,” ABC da Bauhaus”
Meggs,” History of Graphic Design”
Wingler, Hans,” Bauhaus”
Marcondes, Danilo, “Iniciação à História da Filosofia”