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JULHO 2021 REVISTA ESCOLA PARTICULAR 1

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JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 1

JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 3

O Sieeesp não tem trilhado outros cami-nhos que não aqueles guiados por um dos seus princípios mais valorosos: a

parceria entre escolas e as famílias.A partir desse caminho é que foram realizadas

mais de 200 lives desde março do ano passado, além de cursos, palestras e encontros on-line, abordando diversos temas, de metodologias a cuidados com as crianças e adolescentes, voltados para educadores mas também para a família.

Veio 2021, a pandemia não acabou e o Sieeesp acelerou os eventos, sempre incluindo as famílias: esse é o espírito do Programa A.M.I.G.A. (que vai até dezembro, com dois encon-tros mensais com atendimento de especialistas às famílias e educadores).

Esse também foi o princípio que norteou o 1º Workshop de Ciência, Relacionamentos Familiares e Inclusão (abril); o 2º Congresso Internacional de Transtornos de Aprendizagem e Comportamento para uma Educação Inclusiva: In-tercâmbio entre a Educação e a Saúde (março); e a Jornada de Autismo no SIEEESP (abril), contando com especialistas internacionais.

Tivemos a importante discussão, incluindo as famílias, do 1º Colóquio de Reflexões Jurídicas e Transdisciplinares (maio), abordando os 30 anos do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, contando com a presença de especialistas, promo-tores, educadores, nos debates e mesas-redondas. Foi um grande momento de reflexão sobre a ne-cessidade de cada um dos atores da sociedade,

ESCOLA-FAMÍLIA,UMA PARCERIA DE VALOR

inclusive escolas e famílias, de saber e assumir as suas responsabilidades perante as crianças e adolescentes.

Ainda em junho, aconteceu o 1º Seminário de Educação Básica Internacional, com a presença on-line de educadores internacionais, compartilhando e debatendo com os participantes as experiências

exitosas no Exterior, importantes para toda a comunidade escolar.

O próprio 5º Congresso Na-cional FENEP teve como eixo central exatamente o mesmo tema: Família e Escola, uma par-ceria que dá certo. Dá tão certo que esse mesmo espírito de união e inclusão nortearão também os dois próximos grandes eventos do Sieeesp, agora em julho: a Jornada Internacional do Sono: Saúde e Educação(12 a 14), e o 1º Workshop de Ludicidade do Sieeesp (22 a 24).

Mas se é certo que a pandemia tem causado muito sofrimento

para todos, e penalizou duramente as famílias, com perdas e mortes, também é certo que repre-sentou um grande ensinamento para todos nós, mostrando que os valores estão acima de tudo.

Pois nesses tempos difíceis muitas vezes erra- mos tentando acertar, mas algumas vezes acer-tamos. E, uma dessas vezes, com certeza, foi reforçar e valorizar ainda mais nossa aliança com as famílias, o que temos colocado em prática cotidianamente.

Porque não existe nada mais importante do que essa parceria, já que é a partir dela que se constrói a verdadeira educação de qualidade, que este País tanto precisa.

Presidente do [email protected]

BENJAMINRIBEIRO DA SILVA

Veio 2021, a pandemia não

acabou e o Sieeesp acelerou os eventos,

sempre incluindoas famílias

Editorial

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 20214

sieeesp.com.br

Os artigos assinados nesta publicação sãode inteira responsabilidade dos autores.

DIRETORIA

PresidenteBenjamin Ribeiro da Silva Colégio Albert Einstein

1º Vice-presidenteJosé Augusto de Mattos LourençoColégio São João Gualberto

2º Vice-presidente Waldman BiolcatiCurso Cidade de Araçatuba

1º TesoureiroJosé Antônio Figueiredo AntiórioColégio Padre Anchieta

2º TesoureiroAntônio Batista GrossoColégio Átomo

1º SecretárioAntônio Francisco dos SantosSistema Educacional São João

2º SecretárioItamar Heráclio Góes SilvaEduc Empreendimentos Educacionais

DIRETORES DE REGIONAIS

ABCDMROswana M. F. Fameli - (11) 4437-1008

AraçatubaWaldman Biolcati - (18) 3623-1168

BauruGerson Trevizani Filho - (14) 3227-8503

CampinasAntonio F. dos Santos - (19) 3236-6333

GuarulhosWilson José Lourenço Júnior - (11) 4963-6842

MaríliaEledir Leonardo - (14) 3413-2437

Ribeirão PretoJoão A. A. Velloso - (16) 3610-0217

OsascoJosé Antonio F. Antiório - (11) 3681-4327

Presidente PrudenteAntonio Batista Grosso - (18) 3223-2510

SantosErmenegildo P. C. Miranda - (13) 3234-4349

São José dos CamposMaria Helena Bitelli Baeza Sezaretto(12) 3931-0086

São José do Rio PretoCenira Blanco Fernandes Lujan - (17) 3222-6545

SorocabaEdgar Delbem - (15) 3231-8459

Rua Benedito Fernandes, 107 - Santo Amaro São Paulo - SP - CEP 04746-110 - (11) 5583-5500

@sieeesp SIEEESP

sieeesp https://linktr.ee/sieeesp

Expediente / Índice

Escola-Família, uma parceria de valor

3

A importância da proteção de dados na gestão das escolas

5

JULHO DE 2021 - Edição 280

PRODUÇÃO EDITORIAL

Editor-chefe:Marcos Menichetti - MTB 12.466

[email protected]

Para anunciar:[email protected]

Créditos das fotos: arquivos pessoais - freepik - rawpixel.com - adobe stock - creativeart - fullvector - pikisuperstar - gpointstudio - 3ab2ou - user17882893

Impressão: Companygraf

Ventilar novas perspectivas: uma reflexão sobre os espaços físicosdas escolas

12

Edgar Morin, 100 anos: a complexidade tecida

14

A essencialidade da educação infantil e a tarefa de renovaro mundo

22

Luiza Elena Leite Ribeiro do Valle - Pesquisas científicas revelam os milenares segredos do sono: e eles chegam à escola

32

Ferramentas para promover a empatia no Ensino Híbrido

36

ÍNDICE

A prática deliberada frente à educação universitária

40

46

ERRAMOS

A arte publicada à página 42, da edição 279, não corresponde ao 2º Congresso Internacional de Transtornos de Aprendizagem e Comportamento para uma Educação Inclusiva, do Sieeesp. A ima-gem correta relacionada ao evento é essa:

Júridico

1. Introdução

T rata o presente artigo do enfoque analítico da aplicação da Lei Geral

de Proteção de Dados1, Lei nº 13.709/2018, no âmbito do Ter-ceiro Setor. Tal temática traduz-se em questão proeminente afeta à Sociedade da Informação, na medida em que as Organizações da Sociedade Civil que compõem o Terceiro Setor, inclusive as edu-cacionais, independentemente da roupagem jurídica adotada (Asso-ciação, Fundação, Cooperativa So-cial ou Organização Religiosa), são significativas coletoras de dados

A IMPORTÂNCIA DA PROTEÇÃO DE DADOS NA GESTÃO DAS ESCOLAS

pessoais, inclusive daqueles sen-síveis2 e de crianças e adolescen-tes3 e, portanto, devem dar trata-mento adequado àqueles (coleta, recepção, classificação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento, ar-quivamento, armazenamento, eliminação, avaliação ou controle de informação, modificação, co-municação, transferência, difusão ou extração4).

Enfoca o ecossistema ciber, o histórico sintético legislativo mundial em termos de proteção de dados, bem como os 4 (quatro) meios (cadastros) por onde entram e

transitam dados pessoais oriundos de público híbrido. Alude ao binô-mio “privacidade-transparên- cia”, como desafio enfrentado pelas 3 (três) esferas de Governo e pelo Terceiro Setor. Aborda, ainda, a reengenharia corporativa pela qual passam as entidades do Ter-ceiro Setor, em razão da adequação à LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados.

2 - Proteção de Dados no Terceiro Setor: verdadeira odisseia

A sociedade contemporânea, adaptada à nova realidade tecnológi-ca, está imbuída de novos valores

1 Inspirada na GDPR – General Data Protection Regulation europeia.

2 Dados sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural

3 Com tratamento diferenciado, nos termos do artigo 14, da Lei 13.709/2018 e demanda consentimento específico e em destaque dado por pelo menos um dos pais ou pelo responsável legal.

4 Nos termos do artigo 5º, inciso X, da Lei 13.709/2018.

JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 5

Jurídico

como, por exemplo, “o ecossistema ciber5”, como um ambiente sincrôni-co em razão da ocorrência de múlti-plas atividades simultâneas. Assim, atualmente6 temos um ciberespaço7 influenciado pela cibercultura8, habitado por ciberdependentes9, que, eventualmente, estão ciberati-vistas10, que exercem a cibercidada-nia11 dentro da ciberdemocracia12 em cibercidades13.

Nesse contexto, o “ecossistema ciber” foi criado dentro da Socie-dade da Informação14, onde as informações representam parte significativa do valor agregado da maioria dos bens e dos serviços.

Por seu turno, a tecnologia, como parte do citado “ecossistema ciber”, adentrou na sociedade con-temporânea como solução para o enfrentamento de diversas questões de cunho individual (na qualidade de autônomas, locais e globais, ou seja, pensar globalmente e agir localmente) e, ainda, de cunho econômico nos três setores da eco-nomia: estatal15 (primeiro setor), empresas (segundo setor) e enti-dades sem fins lucrativos (terceiro setor). Não podemos olvidar, ainda, da influência da tecnologia, de forma

interativa e dialógica, nos grupos sociais.

Os dados pessoais, enquanto informações relacionadas à pessoa natural identificada ou identificável, são protagonistas no cenário acima e devem ser protegidos por conta do direito fundamental à privacida-de, previsto no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal.

Em termos de cronologia, pode-se traçar trilha evolutiva no que diz respeito à proteção de dados pes-soais. Inicialmente, em 10/12/1948 o direito à privacidade foi escalado a direito fundamental no âmbito da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU16 (“Artigo XII: Ninguém será sujeito à interfe-rência em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques”). Duas décadas depois, em 1970, foi editada, na Alemanha, a primeira legislação específica, qual seja, o Ato de Proteção de Dados de Hesse que, pela primeira vez, in-troduziu o termo proteção de dados na linguagem jurídica. Aludido ato

foi fruto da inquietação gerada pela previsibilidade do desenvolvimento econômico e social, na Alemanha, entre os anos de 1960 e 1970.

Posteriormente, ainda na linha do tempo, os Estados membros do Conselho da Europa, dentre outros pontos, com a intenção de ampliar a proteção dos direitos e das liberdades fundamentais de todas as pessoas, especialmente, o direito ao respeito pela vida privada, assinaram em 1981, a Convenção 10817, denomi-nada de “Convenção para a Pro-teção das Pessoas relativamente ao Tratamento Automatizado de Dados de Caráter Pessoal” (Ar-tigo 1º- Objectivos e finalidades. A presente Convenção destina-se a garantir, no território de cada Parte, a todas as pessoas singulares, seja qual for a sua nacionalidade ou residência, o respeito pelos seus direitos e liberdades fundamentais, e especialmente pelo seu direito à vida privada, face ao tratamento automatizado dos dados de carácter pessoal que lhes digam respeito - protecção dos dados).

Em 2016, foi publicado o Regu-lamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) - Regulamento

5 “A era cibernética, a Sociedade da Informação (...)”. CASSEB, Paulo Adib. CPI na Era Cibernética. O direito na sociedade da informação/Liliana Minardi Paesani, coordenadora. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 226.

6 Sobre Sociedade da Informação: “A formatação de um novo sistema de comunicação em meio digital, global, que estabelece a interação em tempo real, além das redes interativas de computadores que crescem de forma exponencial, cria novas formas e canais de comunicação que moldam as relações sociais e, simultaneamente, são moldados e formatados por estas.” BARRETO JUNIOR, Irineu Francisco. Atualidade do Conceito Sociedade da Informação para a Pesquisa Jurídica. In: PAESANI, Liliana Minardi (coord.). O Direito na Sociedade da Informação. São Paulo: Atlas, 2007. p. 64

7 Sobre ciberespaço: “É o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores. Essa definição inclui o conjunto dos sistemas de comunicação eletrônicos (aí incluídos os conjuntos de redes hertzianas e telefônicas clássicas), na medida em que transmitem informações. Consiste em uma realidade multidirecional, artificial ou virtual incorporada a uma rede global, sustentada por computadores que funcionam como meios de geração de acesso.” LÉVY, Pierre, Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 2009, p. 93.

8 Sobre cibercultura: “It is a culture, indeed, but a culture of the ephemeral, a culture of each strategic decision, a patchwork of experiences and interests, ratherthan a charter of rights and obligations. It is a multi-faceted, virtual culture, as in the visual experiences created by computers in cyberspace by rearranging reality.” É uma cultura, na verdade, mas uma cultura do efêmero, uma cultura de cada decisão estratégica, uma colcha de retalhos de experiências e interesses, do que uma carta de direitos e obrigações. É uma multifacetada cultura virtual, como nas experiências visuais criadas pelos computadores no ciberespaço, rearranjando a realidade (tradução livre). CASTELLS, Manuel, The Rise of Network Society, Blackwell Publishing Ltd, 2010, p. 214.

9 Sobre ciberdependente: “Muitas vezes a própria mídia já batiza a questão com algum nome como ciberdependente ou netviciado. Contudo, é importante notar que, por mais que estes sejam termos que foram utilizados pela mídia, o sujeito encontra eco e se reconhece nele.” FORTIM, Ivelise. Aspectos Psicológicos do Uso Patológico de Internet. Tese de Doutorado em Psicologia Clínica da PUC-SP. 2013. Disponível em: https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/15253/1/Ivelise%20Fortim.pdf. Acesso em 23/04/2019.

10 Sobre ciberativista: “O ciberativista é um ser das distâncias que se projeta em sistemas cuja escala é desproporcional à extensão de sua percepção e à capacidade de seu corpo.” CHESNEAUX, Jean. Modernidade-Mundo. Petrópolis: Vozes, 1995. p. 21.

11 Sobre cibercidadania: vale a reflexão sobre a versão fraca (reforçar o procedimento de representação parlamentar. Aproximação entre candidatos e eleitores, além de facilitar o processo eleitoral) versus a versão forte (desenvolver formas de democracia direta e baseadas na partição imediata do cidadão, sem intermediários) da teledemocracia de Antonio Enrique Perez Luño. PEREZ LUÑO, Antonio Enrique. ?Ciberciudadaní@ o ciudadaní@.com?. Barcelona, Gedisa, 2004. p. 61 – 72.

12 Sobre ciberdemocracia: “Na nova política hipertextual, mais ainda no que na tradicional, os oponentes fazem parte do jogo. A ciberdemocracia conhece cada vez menos exterioridade absoluta, feita, como é óbvio, a exceção dos hábitos políticos originários das civilizações anteriores (...). Uma das grandes palavras de ordem da ciberdemocracia, tanto num campo como no outro, é o combate à exclusão, à fractura, à divisão que, aliás, está cada vez mais definida enquanto divisão numérica. ” LÉVY, Pierre, Ciberdemocracia. Lisboa: Instituto Piaget, 2003. p. 141.

13 Sobre cibercidade: “A cibercidade é a cidade contemporânea e todas as cidades contemporâneas estão se transformando em cibercidades. Podemos entender por cibercidades as cidades nas quais a infraestrutura de telecomunicações e tecnologias digitais já é uma realidade.” LEMOS, André. Cibercidades: um modelo de inteligência coletiva. (org). Cibercidade. As cidades na cibercultura., Editora e-papers, Rio de Janeiro, 2004, pp. 19-26. Disponível em: https://www.facom.ufba.br/ciberpesquisa/andrelemos/modelo.pdf. Acesso em 23/04/2019.

14 A ideia de uma sociedade de informação aparece na pós-modernidade, em que o conhecimento e o acesso a eles se tornam importantes ferramentas do dia-a-dia para o cidadão e para a comunidade. RULLI JUNIOR, Antônio. Jurisdição e Sociedade da Informação. O direito na sociedade da informação/Liliana Minardi Paesani, Coordenadora. 1. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 80.

15 Segundo Perez Luño, pocas instancias de la vida jurídica se hallan tan necesitadas de um aggiornamento como la Administración Pública, secularmente adherida a prácticas carentes de toda agilidad y plenas de um acrónico y caduco formalismo. Por esse motivo, la informática, al posibilitar la racionalización, simplificación, celeridad y seguridad de las prácticas administrativas, se presenta como uma exigencia inaplazable para cualquier Estado no que desee vivir de espaldas al progeso. PEREZ LUÑO, Antonio Enrique. Manual de informática y derecho. Barcelona, Ariel, 1996. p.84. Poucos exemplos da vida jurídica são tão necessitados de uma atualização como a Administração Pública, secu-larmente aderida a práticas carentes de toda agilidade e cheia de acrônimos e formalismos ultrapassados. Por esta razão, a informática, ao possibilitar a racionalização, a simplificação, a velocidade e a segurança das práticas administrativas, é apresentada como uma demanda que não pode ser adiada por qualquer Estado que não queira viver de costas para o progresso (tradução livre).

16 Disponível em: https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf. Acesso em 21/01/2020.

17 Disponível em: https://www.cnpd.pt/bin/legis/internacional/Convencao108.htm. Acesso em 21/01/2020.

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 20216

(EU) 2016/67918 (vigência a partir de maio de 2018), que estabelece as regras relativas ao tratamento, por uma pessoa, uma empresa ou uma organização, de dados pes-soais. O regulamento europeu assim conceituou dados pessoais, em seu artigo 4º: “personal data means any information relating to an identified or identifiable natural person (‘data

subject’); an identifiable natural person is one who can be identified, directly or indirectly, in particular by reference to an identifier such as a name, an identification number, location data, an online identifier or to one or more factors specific to the physical, physiological, genetic, mental, economic, cultural or social identity of that natural person;”19

E, finalmente, em 15/08201820, foi publicada, no Diário Oficial da União, a Lei nº 13.709/18 - Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Superada a breve contextua-lização acima, adentremos no âmago do presente artigo: bem-vindos ao universo de dados e sua proteção no ambiente do Terceiro Setor!

A captação e a utilização de da-dos pessoais, pelas entidades do Ter-ceiro Setor, não é algo novo. Ocorre que, na contemporaneidade, houve cristalina alteração de logística: boa parte dos registros (dados) passou a ter caráter digital21 e, especial-mente com a edição da Lei Geral de Proteção de Dados, receberam re-gramento22 que, indubitavelmente, trouxe segurança jurídica e controle, não somente para empresas e ci-dadãos, mas, sobretudo, para aquilo que denominamos de “Terceiro Setor 4.0”.

Dada a relevância da pauta ati-nente à aplicação da LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados ao Ter-ceiro Setor, em dezembro de 2019, as instituições Atados23 e Social Good Brasil24 geraram pesquisa25 a fim de criar um mapeamento das organiza-ções do Terceiro Setor em relação ao seu conhecimento sobre a LGPD, identificando possíveis pontos de vulnerabilidade e oportunidades de melhoria no setor.

Conforme é sabido, desde os primórdios, referidas instituições captam, utilizam tais informações e as imputam em bases governamen-tais, por diversas razões:

18 Disponível em: https://gdpr-info.eu/. Acesso em 21/01/2020.

19 Tradução livre. "Dados pessoais": qualquer informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável ("causa"); uma pessoa identificável é aquela que pode ser identificada, direta ou indiretamente, nomeadamente por referência a um identificador como um nome, um número de identificação, dados de localização, um identificador online ou a um ou mais elementos específicos para a genética, física, fisiológica, psíquica, econômica, cultural ou social que a identidade da pessoa singular.

20 Em 2018 também foi assinado, a título exemplificativo, o California Consumer Privacy Act (CCPA) que garante direitos relacionados à privacidade aos consumidores da Califórnia, EUA.

21 Com o advento da transformação da informação em mercadoria, aliado ao surgimento e disseminação em escala mundial de redes sociais, o cidadão digital - de forma advertida ou inadvertida - divulga aspectos da sua esfera íntima em meio eletrônico, situando a vida humana em novos patamares de visibilidade e exposição daquilo que, antes, ficava adstrito ao círculo privado. O encontro entre a modernidade e a sociedade em rede inaugura a vigilância total, propiciada pelo avanço tecnológico e a geração de valor que equipara informação e mercadoria. BARRETO JUNIOR, Irineu Francisco. Proteção da Priva-cidade e de Dados Pessoais na Internet: O Marco Civil da rede examinado com fundamento nas teorias de Zygmunt Bauman e Manuel Castells. In: DE LUCCA, Newton; SIMÃO FILHO, Adalberto; DE LIMA; Cintia Rosa Pereira. (Org.). Direito & Internet III. São Paulo: Quartier Latin, 2015. p. 100-127.

22 Tratamento de dados pessoais inclusive, e não somente, nos meios digitais. Interessante notar que a Lei prevê que entidades sem fins lucrativos também poderão ser “órgãos de pesquisa”, desde que incluam em sua missão institucional, ou em seu objetivo social/estatutário, a pesquisa básica ou aplicada de caráter histórico, científico, tecnológico ou estatístico.

23 Plataforma social online que conecta pessoas às oportunidades de voluntariado em causas sociais. Disponível em: https://www.atados.com.br/sobre. Acesso em 13/01/2020.

24 Organização da Sociedade Civil parceira da Fundação das Nações Unidas, que lidera o +Social Good no mundo, é precursora do incentivo ao uso de tecnologias, dados e competências do futuro para o bem comum, gerando impacto socioambiental positivo. Disponível em: http://socialgoodbrasil.org.br/home/quem-somos/. Acesso em 13/01/2020.

25 Disponível em: https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLScF8a_c2YZeFe3iJ4PD3Ivq7HgD8EcxwE4YaaU24PgZ4maYcA/formResponse. Acesso em 13/01/2020.

JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 7

A sociedade contemporânea, adaptada à nova realidade tecnológica, está imbuída de novos valores como, por exemplo, “o ecossistema ciber ”, como um ambiente sincrônico em razão da ocorrência de

múltiplas atividades simultâneas

1) Cadastro de Diretores Es-tatutários, Conselheiros, Fun-cionários, Estagiários, Aprendi-zes, Voluntários e de Prestadores de Serviço;

2) Cadastro de usuários e de tomadores de serviço como, por exemplo, alunos de escolas sem fins lucrativos, pacientes de hos-pitais filantrópicos, usuários de serviços de Assistência Social nos termos da LOAS – Lei de Assistência Social (Lei 8.742/93), refugiados, de-pendentes químicos, dentre outros;

3) Cadastro quanto aos bene-ficiários de Parcerias celebradas com o Poder Público, nos termos da Lei 13.019/2014, que extinguiu a figura dos convênios em determina-das situações e criou 3 (três) novos instrumentos para fins de contra-tualização entre as organizações do Terceiro Setor e o Poder Público: Termo de Colaboração, Termo de Fomento e Acordo de Cooperação;

4) Cadastros em bases gover-namentais, por exemplo, no nicho Educacional (MEC, Secretarias Estaduais e Municipais de Educa-ção) e no nicho das Parcerias nos termos da Lei 13.019/2014 acima mencionada (Plataforma + Brasil ou em Plataformas Estaduais/Munici-pais criadas com esta finalidade). Recentemente, em 05/11/2019, foi apresentado o Projeto de Lei 5.865/2019, de autoria do deputado Luiz Lima, do PSL/RJ, que cria o Cadastro Nacional de Entidades do Terceiro Setor para registrar os Contratos de Gestão das Orga-nizações Sociais (Lei 9.637/98), os Termos de Parceria das OSCIP’s - Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Lei 9.790/99) e os Termos de Contratualização da Lei 13.019/2014 (acima tratados de forma analítica). Especificamente neste ponto o Estado, em termos de dados pessoais (inclusive aquelas sensíveis, sem o consentimento do

titular), somente poderá proceder ao tratamento e ao uso compartilhado de dados necessários à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas em contratos, convênios ou instru-mentos congêneres. Outrossim, os dados deverão ser mantidos em formato interoperável, ou seja, em sistema que viabilize a comuni-cação de forma transparente com outros sistemas. Resta saber se esta interoperabilidade será um ganho ou armadilha aplicando-se, analogicamente, o Panóptico de Foucault26:“Em suma, o princípio da masmorra é invertido; ou antes, de suas três funções — trancar, privar de luz e esconder — só se con-serva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o olhar de um vigia captam melhor que a sombra, que finalmente protegia. A visibilidade é uma armadilha.”

5) Prestação de informações no âmbito do requerimento ou da manutenção de Certificações Fe-derais (exemplo: CEBAS – Educa-ção com o preenchimento da Ficha de Perfil Socioeconômico dos alunos bolsistas), Estaduais e Municipais ou de fiscalização dos Tribunais de Contas27.

Com isto, no dia a dia das insti-tuições, objeto do presente artigo, há a prática do uso compartilhado de dados previsto no artigo 5º, inciso XVI, da LGPD – Lei Geral de Pro-teção de Dados com o primeiro setor, o que auxilia o Estado, inclusive, na definição de políticas públicas (política pública: conceito introduzi-do por Laswell28, na década de 1930, como forma de conciliar conhe- cimento científico/acadêmico com a produção empírica dos governos e, também, como forma de estabelecer o diálogo entre cientistas sociais, grupos de interesse e governo).

E, neste ponto, é desafiadora a tarefa tanto para o Estado, quanto

26 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: história da violência nas prisões; tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis, Vozes, 1987. p. 166.

27 Em 2017, diversas entidades sem fins lucrativos detentoras de CEBAS – Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social na área da Educação (MEC), foram fiscalizadas pelo TCU – Tribunal de Contas da União e instadas a apresentar ou ratificar informações pessoais acerca de responsáveis por alunos bolsistas.

28 Laswell, H.D. (1936/1958). Politics: Who Gets What, When, How. Cleveland, Meridian Books.

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 20218

Jurídico

para o Terceiro Setor, na aplica-ção do binômio “privacidade – transparência”. Isso porque de um lado o Estado e o Terceiro Setor recebem vultosa quantidade de dados pessoais que devem ser pro-tegidos nos termos da LGPD– Lei Geral de Proteção de Dados e, por outro lado, devem dar publicidade a uma série de informações nos termos da LAI – Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011 e De-creto 7.724/2012 – artigos 1º, pará-grafo único, inciso I e 2º, parágrafo único) que, acertadamente, também protege as informações pessoais em seu Decreto Regulamentador (De-creto 7.724/2012- artigos 55, incisos I e II, 56 e 63).

Sob outro aspecto, é inegável que a LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados impôs ao Terceiro Setor:

a) a confecção de diagnóstico e de adaptação de todas em áreas das instituições. Para o Terceiro Setor, é indubitável que os setores mais impactados são: 1) aquele que capta, armazena e utiliza as informações de usuários ou de consumidores e, 2) a área de Recursos Humanos. Isso porque a LGPD -– Lei Geral de Pro-teção de Dados abarca em termos de relação de trabalho, por exemplo, o uso da imagem dos colaboradores, a utilização de mídias sociais cor-porativas, bem como campanhas de vacinação. Trata-se de processo interno cujo zelo não pode ter pontas soltas do início ao fim: da contrata-ção ao desligamento.

b) o aprimoramento de Con-troles Internos, de Processos/Procedimentos e de Políticas de Segurança da Informação (níveis de

29 BAUMAN, Zygmunt. Vigilância Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. p. 10.

acesso aos colaboradores, criação de Comitê de Proteção de Dados e de Plano de Contingência, implantação de Auditoria Digital) e,

c) o aumento da proteção contra ataques cibernéticos (outsiders– vulnerabilidades expostas).

Os itens acima revelam que as organizações do Terceiro Setor estão em fase de transição, vale dizer, de verdadeira “reengenharia corpo-rativa” em um sistema de vigilância líquida29, que é menos uma forma delineada de observação e mais uma orientação.

Daí a importância da implan-tação de práticas preventivas, es-pecialmente de Governança e de Compliance Digital (pessoas, processos e sistemas), no Terceiro Setor, a fim de mitigar riscos e evi-tar passivo e, portanto, eventuais

JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 9

Jurídico

Gerente da Consultoria Tributária/Terceiro Setor da Meira Fernandes Contabilidade e Gestão. Docente na Escola Superior de Advocacia de São Paulo (ESA-SP), na Escola Aberta do Terceiro Setor a na SGP – Soluções em Gestão Pública. Vice-Presidente da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB de Pinheiros/SP. Palestrante na OAB/SP, na OAB/PA e na ALESP (ILP). Coordenadora de Atualização Legislativa da Comissão de Direito do Terceiro setor da OAB/SP (2013 - 2018). Graduada em Direito (FMU). Especialista em Direito Tributário (Mackenzie). Extensão em Direito Tributário e Societário (FGV). Extensão em Tributação do Setor Comercial (FGV). MBA em Gestão de Tributos e Planejamento Tributário (FGV). Compliance Digital (Mackenzie).

VANESSA RUFFA RODRIGUES

provisões (sem excluir eventuais danos de imagem/credibilidade) nos termos da norma contábil CPC 2530, por conta das multas oriundas tanto do artigo 52, LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados, quanto daquelas previstas no artigo 33, da LAI – Lei de Acesso à Informação, sem afastar eventuais condenações oriundas de demandas judiciais individuais (cíveis ou trabalhistas).

2. Conclusão Como vimos, na seara do Ter-

ceiro Setor a captação de dados pessoais, especialmente pelo meio digital, não está atrelada ao rotinei-ro acesso a serviços gratuitos online que permite que grandes empresas de coleta de dados como Google, Facebook e Amazon, através de algoritmos, controlem essas in-formações, como bem alertou o cientista britânico Tim Berners-Lee em 201731, criador da Internet, na Carta do 28º Aniversário de sua

invenção, mas, sim, em razão da própria legislação multidisciplinar que rege o setor.

Ademais, os respectivos bancos de dados gerados com a capta-ção das informações pessoais dos stakeholders das operações (como conjunto estruturado de dados pessoais) auxiliam as organizações do Terceiro Setor no planejamento estratégico, no gerenciamento e no direcionamento para a con-secução de seus objetivos sociais, uma vez que é possível, através da quantificação, da qualificação e da segregação desses elementos, identificar qual público alvo está mais exposto ou que demanda maior intensificação deste ou daquele ser-viço relacionado à política pública local.

Como garantir que o Terceiro Setor atingirá os objetivos da LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados? A missão é deveras desafiadora, uma vez que envolve mudança cultural,

recursos financeiros, conhecimento e engajamento dos indivíduos que estão na linha de frente da operação, capacitação, aprimoramento das re-lações trabalhistas e com usuários/clientes, enfim, verdadeira alteração de processos organizacionais, no que tange aos titulares dos dados pessoais e adoção de governança e de compliance digital. •

30 CPC 25 - Norma 25 do Comitê de Pronunciamentos Contábeis do Conselho Federal de Contabilidade, alinhada ao IFRS - International Financial Reporting Standards, utilizada para fins de Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes (inclusive de prognóstico de processos).

31 Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/03/1865827-inventor-da-web-pede-regulacao-mais-rigida-da-publicidade-politica-online.shtml. Acesso em 09/01/2020.

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Arquitetura Escolar

Ventilar novas perspectivas:

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uma reflexão sobre os espaços físicos das escolas

P aciência, resi l iência, adaptabilidade, f lexibi-lidade, poder de nego-

ciação, dever de escuta, empatia, compaixão, garra... São muitas as competências que 2020 e 2021 nos fizeram buscar dentro de nós mesmos. Em alguns casos, foi ne-cessário mais do que vasculhar em si: foi preciso desenvolver novas habilidades.

Do ponto de vista educacional, convivemos com mudanças quase semanais em relação ao funcio-namento escolar, capacidades de alunos em sala de aula, medidas de segurança para a saúde de todas as partes, entre outros pontos de aten-ção. Ainda não sabemos quando voltaremos à regularidade, mas temos ciência de que, em algum momento, isso há de ocorrer.

Estamos monitorando dia-riamente publicações e pesquisas sobre o tema, obviamente, com um olhar mais apurado sobre como aplicar novas medidas e práticas em nossas unidades escolares. Um levantamento recente da Febraban/Ipesp, aplicado em 3 mil pessoas, das cinco regiões do País, entre 1º e 7 de março deste ano, revelou que a maior parte da população es-pera uma normalidade somente em 2022. Esse mesmo estudo salienta que alguns hábitos, como o home office e novas medidas de higiene, podem ter vindo para ficar.

Em termos práticos, as medidas sanitárias também exigem uma atenção redobrada para algo essen-cial: o espaço físico. Da mesma for-ma que somos encorajados a abrir janelas e facilitar a circulação do ar quando estamos em nossos lares, a

mesma linha de pensamento é um pré-requisito para escolas e demais locais com alto fluxo de pessoas. A arquitetura e a engenharia civil são – e devem ser – grandes aliadas nessa luta.

Reportagem recente do The New York Times, intitulada “Por que abrir as janelas é uma chave para reabrir as escolas”, joga luz sobre esse debate. Em uma situação padrão, uma sala média de Nova Iorque, com 30 alunos, reproduzi-ria a imagem clássica de aglome-ração para nosso olhar atual. Na metrópole, medidas de contenção levaram a índices baixos de contá-gio nesses locais.

O texto salienta que somente a redução do contingente e o dis-tanciamento entre alunos não são o bastante, se não houver uma ventilação no ambiente que seja apropriada. Seriam necessárias

de quatro a seis trocas de ares por hora, por meio de filtração e (não ou) circulação do ar, alerta o jornal.

Em outro veículo de relevância – o The Wall Street Journal –, uma matéria aponta que as escolas que realizaram reaberturas graduais nos últimos meses aprenderam algumas lições: uso de máscara, adoção de locais arejados, distan-ciamento e testagem regular ainda são as medidas mais eficazes, ao passo que checagem de temperatu-ra diária e higienização de superfí-cies não são prioritárias. Debatido à exaustão, o modelo híbrido pode ser mais arriscado do que a retomada integral, levando em conta que há exposição ampliada a mais pessoas, destaca a publicação.

Arquiteturas amplas e arejadas são favoráveis não apenas para ventilar ambientes: a troca de ares proporciona também um inter-câmbio de ideias e conhecimento. Esses modelos jogarão a favor da retomada das atividades à normali-dade (e isso vai acontecer!), quando tudo for chegando aos eixos nova-mente. Quem puder investir nessa roupagem espacial terá vantagens para esse regresso. E esperamos que aconteça em breve. •

Cofundadora da Camino Education e diretora da Camino School. Foi vencedora do Prêmio Early Career 2017 do Teachers College, da Columbia University, por seu trabalho com programas de aprendizado Social Emocional para estudantes de baixa renda no Brasil.

LETÍCIA LYLE

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Somente a redução do contingente e o distanciamento entre alunos não são o bastante, se não houver uma

ventilação no ambiente que seja

apropriada

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Centenário

E dgar Morin, francês nas-cido em Paris a 8 de julho de 1921, é um pensador da

complexidade e das incertezas, que nos deixa importante legado cul-tural à humanidade. Seu centenário, em vida, merece ser celebrado com uma visita à parte de sua vasta obra, em que se destacou como antropó-logo, sociólogo e filósofo, além de au-tor de mais de trinta livros. Criador da epistemologia da complexidade,

paradigma que se contrapõe à fragmentação do conhecimento, propõe o reconhecimento desse tecido em que se entrelaçam os saberes, a recursividade, os limites da ciência e também as ausências.

Essa vida longeva lhe permitiu passar por intensas experiências controversas, como a perda (luto) de sua mãe aos 10 anos – aconteci-mento que afirma ter sido o mais qualificante de sua vida. Isso o fez

viver duplo sentimento, revezando-se entre a tristeza e a busca por reencontrar um equivalente de co-munhão, de fé, tendo os romances como o de Tolstoi um grande papel em sua formação.

Judeu, passou pelas angústias da guerra do século XX e a política, enquanto estivera na escola, trazia temas como o do nazismo - em sua violência, poder de organização e potência dominadora; o stalinismo

EDGAR MORIN,100 ANOS:

A COMPLEXIDADE TECIDA

JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 15

com o fenômeno da divinização de um líder, culto da personalidade e revolução. Acreditava que a es-cravidão daqueles dias poderia ser ultrapassada a partir da promessa de uma sociedade nova, um tempo de “trabalhadores que forjam o novo porvir”. França já ocupada, clima de turbulência, mas ele observou o conselho do seu pai em resistir às pulsões de posicionamentos durante as crises históricas: “meu filho, se você for, morre”. Vivenciar todo esse massacre o fez pensar que isso não deveria ser algo inútil.

Filho de imigrantes judeus, sua cultura e valores patrióticos se formaram a partir de suas leituras e seu espírito autoditada, que se caracteriza por não excluir, antes, por um “espírito de vale, que junta o que vem de montanhas opostas”.

E, se vendo atraído pelas ideias contrárias encontra, no pensamen-to de Hegel, a contradição – tese, antítese, síntese.

Para se chegar à ideia de com-plexidade diz que era preciso aban-donar a ideia de salvação terrestre mitológica – como a do proletaria-do de Marx, e, assim, dedicou-se à ciência. Ciência que, na ingênua visão, à época, se parecia o lugar da certeza, enquanto a religião se dizia incerta. “Não sabíamos que a Ciência era um trabalho sobre a incerteza e contra a incerteza”.

Sua obra perpassa escritos que se classificam como ‘O Método’, o ‘Complexus’ - em que trata da ciência com consciência, a Antro-possociologia, o Tempo, a Política, o Viver e o Ensino. Sobre o ensino, escreve os livros ‘A cabeça bem-feita’

“Minhas experiências

vividasalimentaram

meu pensamento; que, por sua vez, ajudaram-me a

viver. Não separei meu ‘viver’ do ‘pensar’ ou da

atividade cerebral”

Edgar Morin in ‘Au péril des idées’

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e ‘Os sete saberes necessários para a educação do futuro’.

A elaboração do pensamento complexo inaugura uma nova epis-temologia, ou paradigma de conhe-cimento, que se fará abordar como uma maneira de articular o que era separado pela ciência clássica.

Perguntado sobre o que é com-plexidade, Morin escolhe responder com uma pequena história, em que um jornalista de imprensa local da cidade francesa de Besançon, antes de uma palestra, lhe perguntou sobre a complexidade, mas di-zendo que lhe dava até medo tratar dessa questão. Ao que explica que a noção de complexidade não se trata da dificuldade, mas vem da palavra “complexus” do latim, que significa o que é tecido con-juntamente, assim, trabalhando entre o conhecimento das partes e o conhecimento do todo.

Três princípios se destacam num resumo do pensamento com-plexo, elaborado por Morin:

(a) Princípio Hologramático, em que não apenas a parte está no todo, mas o todo está na parte, como num holograma – imagem física que reproduz perfeitamente um objeto e que, quando quebra-do, cria muitos outros menores objetos. Assim, conclui que o todo se encontra nas partes e as partes no todo. Princípio que nos permite compreender, por exemplo, que em cada célula do nosso organismo encontra-se toda a informação genética do corpo.

(b) Princípio da Dialógica, assu-mindo que as noções contraditórias não se separam ao se conceber um fenômeno. Duas lógicas que são ao mesmo tempo antagônicas e complementares, como a ordem e a desordem. Aplica esse conceito paradoxal com a autonomia, ao con-textualizar que a “nossa autonomia se faz graças à nossa dependência, por exemplo, a uma língua, edu-cação, conhecimento. Precisamos

Centenário

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alimentar nossa autonomia pela dependência.” Assim, acredita que “precisamos da eco-auto-organiza-ção, quer dizer, a dialógica, pela qual podemos compreender o que vem do ambiente externo e o que vem de dentro de nós.”

(c) Princípio da Recursividade, que vai além de se repensarem os conhecimentos anteriores em no-vos contextos, mas traz dinâmica autoprodutiva, de causa e efeito. Como processo recursivo, seus efei-tos e produtos tornam-se produ-tores e causas. O pensamento recursivo, em anel, em espiral, nos permite compreender a autonomia e a autoprodução. Esse processo recursivo é como um movimento de turbilhão, em que a cada instância produz outra. Assim, adverte que os avanços da ciência vão ao sentido da complexidade e não mais na divisão disciplinar que é quebrada.

“Necessitamos sim distinguir e separar, mas sejamos tam-bém capazes de rearticular e de contextualizar os grandes fenômenos que não cabem nos estreitos esquemas discipli-nares. Pensamento capaz de re-ligar e de enfrentar a incerteza. Pensamento que não busca apenas uma causa explicativa. Causalidade sim, mas tentar compreender multicausalidades que não são lineares e simples, mas circulares e recursivas” Edgar Morin (2011)

Essa articulação, tecida em co-nexões parte e todo, contraditório e recursivo, fundamenta a complexi-dade no pensamento do autor.

Já a obra que ficou icônica à educação veio em 1999, quando a ONU o convidou a escrever re-f lexões daquilo que considerava relevante ao se repensar a educação do próximo milênio. E o fez junto a outros pensadores pelo mundo, in-tegrando comentários e sugestões,

Centenário

JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 19

remodelando esse conteúdo no livro 'Sete saberes necessários à educação do futuro'. No Brasil, o texto original foi submetido à apre-ciação de Maria da Conceição de Almeida, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Os sete saberes de Morin cons-tituem eixos e, ao mesmo tempo, caminhos que se abrem a todos os que pensam e fazem educação, ao expor problemas centrais, igno-rados ou esquecidos, e que são necessários para se ensinar nesse século. Eles postulam:

1 – As cegueiras do conheci-mento: o erro e a ilusão - A educa-ção não deve se limitar a transmitir conhecimentos, mas em se fazer conhecer o que é conhecer. Para isso, cada pessoa precisará se posicionar numa busca contínua de lucidez, reconhecendo como pensa, seu funcionamento cerebral, sua razão e emoções - uma vez que é condi-cionada pelo seu próprio mundo emotivo, pelas suas percepções da realidade, pelo seu mundo cultural e por influências sociológicas, pois essas podem lhe conduzir ao erro ou à ilusão. Morin compara isso a uma cegueira ou funcionando como um parasita da mente humana. Espera-se que a educação se desafie a esse processo, que ensine a buscar e analisar a natureza de cada conhe-cimento, as possibilidades e riscos de perturbações aleatórias ou de ruídos, reconhecendo e eliminando as ilusões que advêm inclusive de teorias científicas, com o cuidado de, na busca de conhecimentos

que possibilitam eliminar o risco do erro, acabarmos por reprimir as manifestações de afetividade, antes reconhecendo que a afetivi-dade pode fortalecer o próprio conhecimento.

2 – Os princípios do conhe-cimento pertinente - Diante da necessidade de se promover o conhecimento capaz de apreender problemas globais e fundamentais é um grande impeditivo o conheci-mento fragmentado em disciplinas, por não operar o vínculo entre as partes e a totalidade. É necessário desenvolver a aptidão para situar as informações em um contexto, ensinando métodos que permitam estabelecer as relações mútuas e as influências recíprocas, inserindo no global os conhecimentos parciais ou locais.

3 – Ensinar a condição hu-mana - É necessário aprender o que significa ser humano, tomando-se conhecimento e consciência da sua identidade e da identidade comum a todos os outros humanos. Essa condição precisa ser ensinada e a educação que se desintegrou em disciplinas poderá reconhecer a complexidade ao colocar em evidência o elo indissolúvel entre a unidade e a diversidade. Afinal, o ser humano é, a um só tempo, físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico – uma unidade complexa da condição humana.

4 – Ensinar a identidade terre-na - Conhecer sobre os desenvolvi-mentos da era planetária e a identi-dade terrena do ser humano devem

É necessário aprender o quesignifica ser humano, tomando-se

conhecimento e consciência da sua identidade e da identidade comum a

todos os outros humanos

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se converter em um dos principais objetos da educação. A história da comunicação, das navegações, das dominações e das ações solidárias precisam ser reconhecidas ao ensino. Afinal, a pátria comum é a Terra, a problemática atual é planetária, o mundo se interligou e essa partilha não deve ser ignorada pela educação.

5 – Enfrentar as incertezas - As ciências permitiram a aquisição de muitas certezas, mas igual-mente revelaram inúmeras zonas de incerteza. É preciso ensinar princípios de estratégias que per-mitam enfrentar os imprevistos, o inesperado, o novo que não pode ser predito, abandonando as concep-ções determinísticas. Essas incerte-zas poderão ser ensinadas à luz do processo histórico da humanidade.

6 – Ensinar a compreensão - A compreensão é, a um só tempo, meio e fim da comunicação humana. A incompreensão generalizada entre as pessoas, em meio a uma profusão de meios de comunicação modernos, precisa ser objeto de estudo, não só com enfoque aos sintomas, mas às causas do racismo, da xenofobia, do

desprezo. Constituiria, ao mesmo tempo, uma das bases mais seguras da educação para a paz.

7 – A ética do gênero huma- no – Deve-se contribuir na for-mação dos sujeitos com base na consciência de que o humano é, em sua tripla realidade: ao mesmo tempo indivíduo, parte da socie-dade, e parte da espécie. Desse modo, todo desenvolvimento hu-mano deve compreender o desen-

REFERÊNCIAS MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2000.

MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensa-mento. 18 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.

MORIN, Edgar. Introdução ao pensa-mento complexo. 4 ed. Porto Alegre: Sulina, 2011.

Estrategista educacional. Bacharel e Mestre em Administração Estratégica. Co-fundadora da jointventure WELETO - plataforma tecnológica adaptativa de gestão de currículos e personalização de aprendizagens. Autora do livro “Gestão da Transformação Educacional: A escola do século XXI” (Editora Conhecimento). Organizadora de 50 publicações sobre formação ética, socioemocional e Projeto de Vida.

LILIAN NEVES

Centenário

A compreensão é, a um só tempo,meio e fim da comunicação humana

volvimento conjunto das autono-mias individuais, das participações comunitárias, e da consciência de se pertencer à espécie humana.

Edgar Morin é o autor dessa epistemologia da complexidade, de vida longa e frutífera à tessitura do conhecimento humano, que muito nos acrescentou às ciências, à edu-cação e à vida futura. Celebrado seja o seu centenário! •

Matéria de Capa

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 202122

A primeira infância, desde o nascimento até os seis anos de idade, é clinica-

mente comprovada como o período mais crítico de definição do cenário para o crescimento, desenvolvi-mento e trajetória de aprendizagem de uma criança.

Pesquisas em neurobiologia e desenvolvimento cognitivo suge-rem que 90% do desenvolvimento do cérebro ocorre nos primeiros seis anos de vida. A saúde emocional, física, as habilidades sociais e as ca-pacidades cognitivo-linguísticas que surgem nos primeiros anos de vida são pré-requisitos essenciais para o sucesso na escola e, posteriormente, em toda trajetória de vida.

A Unicef afirmou que “durante os primeiros anos, as crianças precisam de cuidados responsivos,

nutrição adequada, estimulação e proteção para desenvolver suas habilidades sociais, emocionais e cognitivas”. É por isso que a edu-cação infantil é fundamental para o desenvolvimento de todos os cidadãos do nosso País.

A pandemia As instituições educacionais

foram fechadas em março de 2020 e a maioria tentou adaptar suas atividades com o uso da Internet, buscando promover um mínimo de aprendizado contínuo durante a pan-demia; nesse contexto, milhões de crianças na faixa etária de 0 a 5 anos perderam os cuidados e relações de aprendizagem próprias das unidades escolares na primeira infância.

Globalmente, o número de crian- ças afetadas apenas pelo fecha-mento de escolas foi impressionan-te, variando entre 1,4 bilhão e 1,6

bilhão de crianças em 190 países - ou seja, aproximadamente 90% das crianças em idade escolar do mundo (UNESCO, 2020). De fato, a ONU (2020) observou que, embora as crianças não fossem a face da pandemia, elas corriam o risco de estar entre suas maiores vítimas em termos de potenciais efeitos profundos em seu bem-estar.

De acordo com o Unicef, o fecha-mento de escolas pode levar a resul-tados drasticamente negativos para as crianças. Fechar escolas expõe as crianças a múltiplos riscos. Quanto mais tempo as escolas estão fecha-das, mais as crianças sofrem com grandes perdas de aprendizagem e com impactos negativos de longo prazo. Além disso, dependendo da condição socioeconômica, muitas crianças contam com escolas para nutrição, apoio psicossocial e ser-viços de saúde.

A essencialidade daEDUCAÇÃO INFANTIL

e a tarefa de renovar o mundo

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Globalmente, o número de crianças afetadas apenas pelo fechamento de escolas foi

impressionante, variando entre 1,4 bilhão e 1,6 bilhão de crianças em 190 países

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Um novo formato de educação Enquanto algumas unidades de

educação infantil mudaram para um formato on-line, remoto ou híbrido, muitos pais manifestaram suas preocupações sobre o aumento do tempo que as crianças passariam na frente de uma tela e seu impacto negativo na vida das crianças. Em-bora haja evidências de que passar um longo período na frente de uma tela pode impactar as crianças, o efeito de mais um ano de atividades nessa modalidade de aprendizagem pode trazer consequências de longo prazo para o desenvolvimento de uma criança, podendo inclusive cau-sar um efeito negativo de exposição às telas, multiplicador à medida que a criança cresce.

De acordo com pesquisas re-centes, os pais estão preocupados com a perda de aprendizado de seus filhos e acreditam que é muito importante manter alguma forma de instrução educacional para as crianças durante a pandemia. Os pais afirmam que mantiveram seus filhos com algum tipo de relação com as escolas, na tenta-tiva de obterem alguma forma de aprendizado, mesmo que on-line. Seria essa uma forma de tentar garantir a continuidade da edu-cação formal. Para aqueles que adotaram um formato on-line, há evidências de que esse formato tem sido uma proposta viável, a fim de

evitar um ano de aprendizagem quase zero. Quando questionados sobre o alcance dos resultados de aprendizagem de seus filhos, os pais reconheceram os avanços, mas mencionaram as dificuldades dessa modalidade na educação infantil; alguns relatam que houve apenas uma manutenção daquilo que seus filhos eram capazes de compreender anteriormente, como reconhecer cores, nomes impres-sos, letras do alfabeto, números etc., mais do que desenvolver qualquer outra habilidade.

Muitos pais acreditam que, em-bora as atividades estejam sendo gerenciadas de alguma forma, os resultados da aprendizagem são diferentes, destacando por exemplo a preocupação com o desenvolvi-mento social de seus filhos.

Para os pais, a cada dia fica mais evidente que garantir para as crianças uma educação infantil de qualidade é uma a prioridade, pois afeta a capacidade das crianças de aprender, gerenciar seus próprios comportamentos e se relacionar bem com os outros.

Matéria de Capa

De acordo com o Unicef, o

fechamento de escolas pode

levar a resultados drasticamente

negativos para as crianças

complementando a ação da família e da comunidade, por meio das in-terações e experiências vivenciadas no ambiente educacional.

A educação infantil é um instru-mento de ampliação do universo de experiências, conhecimentos e habilidades dessas crianças; portanto, nesse momento, quando as crianças estão privadas desta interação, elas deixam de descobrir um mundo de possibilidades fora do seu ambiente familiar, além de estarem limitadas de fazer amigos e aprender a conviver.

Contudo, apesar de todos os esforços e iniciativas de amenizar as consequências deste momento, é inevitável o prejuízo educacional na vida das crianças; afinal, a Educa-ção Infantil é um local privilegiado de socialização com outras crianças e adultos, o que nos primeiros anos de vida é de extrema importância para o desenvolvimento de suas habilidades.

Limitações da educação infantil à distância

É preciso ter como premissa que a base da educação infantil con-sidera o fator das interações como elemento fundamental de todo o processo de desenvolvimento das crianças. Portanto, qualquer forma de ensino a distância deve ser vista com as particularidades da educa-ção infantil.

É muito claro que essa forma de relação educacional tem enormes limitações em se tratando das crianças e, neste longo período de pandemia, desapareceu um vasto horizonte de dimensões relacionais e de aprendizagem fundamentais para o processo de desenvolvi-mento infantil; mesmo os pais notam no período de confinamento a ausência substancial de oportuni-dades recreativas, brincadeiras e de socialização.

Confirmando estudos sólidos de pedagogia, pediatria e neurociên-cia, o uso de tecnologias digitais, pelo menos nos primeiros dois anos de vida, inibe o desenvolvimento neuronal e de sinapses. Crianças de 0 a 2 anos não devem ser expostas à mídia digital; também é conside-rado inadequado se em exposição prolongada de 3 a 5 anos. Para essa idade, todas as ferramentas digitais e mídias "tradicionais", para não prejudicarem o desenvolvimento, tanto na forma direta (neuronal) quanto na indireta (sedentarismo, estresse visual etc.) devem ser utilizadas no máximo uma hora por dia. Isso levando em conside- ração que a estrutura mental des-sas crianças está baseada em um

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A situação da Educação Infantil diante da ausência do ambiente escolar

É preocupante o cenário da educação infantil durante o período de distanciamento do ambiente escolar imposto pela pandemia, principalmente se consideramos a forma e as especificidades des-ta etapa. A educação infantil, como primeira etapa da Educação Básica, tem como finalidade o de-senvolvimento integral da criança, considerando seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,

pensamento com esquemas sen-sório-motores e operacionais e que estar diante de uma tela, sem dúvida, diminui as oportunidades de exercício afetivo, exploração e interpelação do mundo.

Em qualquer caso, é necessário ref letir com seriedade sobre os riscos e as vantagens do uso de tecnologias, afim de que sejam com-binados e não substitutos da rotina saudável e própria da infância.

A importância de se refletir sobre a essência da Educação Infantil no atual contexto

Hoje, vivemos um contexto muito peculiar na educação; não tivemos tempo de planejar as ações que pudessem assegurar a continuidade da aprendizagem e, consequentemente, do desenvolvi-mento das crianças. Corremos o risco de, nesse processo de mudan-ças e de adaptações, perdemos a capacidade de olhar para a educa-ção e reconhecer os seus aspectos elementares.

Se não ref letirmos de forma coerente sobre o que está acon-tecendo, corremos o risco de fi-carmos perdidos no meio desse processo. Afinal, a nossa bússola, as práticas e métodos que nos direcio-navam, estão sendo questionados, estamos vivenciando uma situação nova, e não podemos nos perder no meio desse processo.

Hoje, é fundamental que qual-quer ref lexão sobre a Educação considere as condições da existên-cia humana no mundo moderno. A Educação só pode responder à responsabilidade pela continui-dade do mundo se, por meio dela, a criança se constituir como sujeito pronto para assumir essa respon-sabilidade, isto é, um sujeito sufi-cientemente apegado ao mundo, por um lado, e, por outro, capaz de ter iniciativa e de realizar uma ação criativa, pois a Educação, como de-senvolvimento das qualidades indi-viduais, pressupõe aprender sobre o mundo. Precisamos redescobrir a preocupação essencial da reflexão

humanista sobre a Educação: pen-sar a Educação como Educação de si mesmo e em interação com o mundo humano.

Portanto, se considerarmos que a infância é a irrupção do futuro no presente, refletir sobre a essência da Educação infantil é pensar essa realidade, o presente e a infância, e relacioná-la com a continuidade do mundo. Ou seja, em suma, a essência da Educação é educar as crianças e prepará-las para a tarefa de renovar o mundo.

Os profissionais da educação infantil

Em todo o mundo, os educado-res não estão apenas lamentando a perda de vidas e da alteração das suas rotinas, mas também expe- rimentando uma variedade de sentimentos e pressões, definidas como consequências do contexto e das expectativas do que ocorrerá.

É importante que cada professor reserve um tempo para si mesmo todos os dias para fazer algo que

Matéria de Capa

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Matéria de Capa

não seja relacionado à a escola ou a tecnologia, sente-se ao ar livre, leia o seu livro favorito, faça uma caminhada, um exercício, assista um filme.

Além disso: - Reconheça o que está e o que

não está sob seu controle: com um mundo em mudanças repentinas isso pode causar preocupação e ansiedade. Aprenda a reconhecer o que está sob seu controle e o que não está.

- Reconheça momentos de gra-tidão ou alegria. Procure momen-tos de alegria e conexão e se segure neles. Experimente anotar momen-tos engraçados, algo que o fez sorrir ou algo pelo qual você seja grato. Você pode escrever esses momen-

tos em um diário ou anotá-los em uma nota para colocar perto de sua estação de trabalho. Você também pode compartilhar esses momentos com seus alunos e pedir-lhes que compartilhem os seus.

- Se proporcione rotinas de autocuidado ao longo do dia. Começar e terminar o dia com práticas de autocuidado pode ser muito útil. Você pode começar o dia com uma meditação guiada e terminar com exercícios. Mas é importante procurar pequenas maneiras de cuidar de si mesmo ao longo do dia.

- Defina e mantenha limites. Lidar com mudanças em rotinas e programações pode ser desafiador. Trabalhar em casa pode confundir

os limites de quando o dia de tra-balho começa e termina. Determine uma programação que leve em consideração uma hora de início e uma hora de término, suas práticas de autocuidado e intervalos.

- Reflita sobre seus sentimentos e necessidades. É importante re-conhecer e nomear suas emoções. Quando você estiver ciente de um novo sentimento, pare um mo-mento para refletir:

- Nomeie o sentimento e por que você pode estar se sentindo assim. Pense no que você pode precisar naquele momento e no futuro.

É fundamental que todos os professores tornem-se responsáveis pelo autocuidado e pela empatia por aqueles com quem trabalham.

Ausência de educação e o impacto socioemocional nas crianças

Em todo o mundo, foram mi-lhões de crianças que perderam os cuidados próprios da primeira infância desenvolvidos pelos cen-tros de educação infantil devido ao fechamento durante a pandemia. Hoje, já se sabe que o impacto socioemocional desses fechamen-tos em crianças pequenas é algo extremante preocupante: estudos indicam que a maioria das crianças sente falta dos amigos, de brincar com outras crianças e da rotina e estrutura das creches e do ambiente escolar.

Os pais descrevem o impacto negativo do fechamento dessas instituições no bem-estar social e

emocional de seus filhos, sugerin-do que essa condição resultou em acessos de raiva, ansiedade, apego, tédio e subestimulação. Estudos apontam que o desenvolvimento socioemocional das crianças foi severamente interrompido du-rante o bloqueio das atividades presenciais, com uma variedade de impactos negativos, sugerindo que as famílias sentiram falta do ambiente acolhedor fornecido pelos programas de educação infantil, que davam suporte ao desenvolvi-mento socioemocional de seus filhos, bem como estrutura e rotina aos seus filhos.

Embora o desenvolvimento socioemocional seja definido de maneiras diferentes, em geral refere-se ao processo pelo qual as crianças desenvolvem a capacidade de iniciar e manter relacionamen-tos de confiança com adultos e colegas; compreender e expressar emoções de maneira apropriada; e tornar-se independente, explorar e se envolver com o meio ambiente e tomar decisões responsáveis.

Em suma, o desenvolvimento socioemocional está relacionado com a maneira como as crianças pensam, sentem e agem, e os pri-meiros anos da infância são um

momento crucial para o desenvolvi-mento da autorregulação - uma série de capacidades mentais com-plexas que incluem controle de impulso e emoção, equilíbrio de pensamento e comportamento, planejamento, autossuficiência e responsabilidade social no com-portamento. Além de que o desen-volvimento social e emocional das crianças afeta seu desenvolvimento geral e aprendizagem.

O desenvolvimento socioemo-cional pode estar associado a cinco competências essenciais: autoconsciência, consciência so-cial, autogestão, habilidades de relacionamento e tomada de de-cisão responsável. Além disso, as habilidades sociais e emocionais in-cluem autoconfiança, empatia, con-centração, persistência, atenção, comunicação eficaz e resolução de problemas. Todas essas habilidades permitem que as crianças intera-jam positivamente com os outros, tenham uma atitude positiva em relação à escola e aumentem o de-sempenho escolar. Crianças com baixa competência socioemocional exibem comportamentos mais desafiadores, incluindo agressão e desequilíbrio.

As crianças aprendem sobre as emoções e como elas podem ser ge- renciadas no contexto das interações sociais. Embora essa aprendizagem comece em casa, os ambientes de Educação e Cuidados na Primeira Infância são um local privilegiado de apoio ao desenvolvimento socio-emocional das crianças.

Os educadores da primeira infância podem promover habili-dades sociais e emocionais, propor-cionando às crianças um ambiente seguro, estimulante e sensível. Pro-fessores, educadores e cuidadores desempenham papéis importantes para ajudar as crianças a desen-volver competência social e emo-cional. Os ambientes de educação infantil são especialmente ricos em oportunidades que ajudam as crianças a desenvolver e consolidar habilidades socioemocionais.

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Confirmando estudos sólidos de pedagogia,

pediatria e neurociência, o uso de tecnologias digitais, pelo menos nos primeiros dois anos de vida, inibe o desenvolvimento

neuronal e de sinapses

Matéria de Capa

A pandemia afeta o presente, mas também o futuro das crianças

Devemos ter em mente que a privação das crianças ao ambiente educacional é uma condição que prejudica o seu crescimento e de-senvolvimento. Do ponto de vista educacional, a impossibilidade de continuar uma rotina educacional pode trazer consequências graves.

Existem problemas que afetam o estado cognitivo, o psicológico e o emocional das crianças, espe-cialmente daqueles que vivem em contextos já difíceis. Neste período de confinamento, muitas crianças vivem em casas superlotadas, em péssimas condições sanitárias e humanas. Crianças que romperam relações com seus colegas de escola e professores por falta condições. Crianças que vivenciam não só a pobreza, mas também a violência, a solidão e o isolamento.

Os professores da educação infantil são os que mais enfren-

Professor, palestrante e escritor. Doutorando em Educação. Pós-graduado em Psicanálise e em Neuroeducação. Mestre em Teologia e Doutorando em Educação. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Aprendizagem e Processos Inclusivos (NEPAPI) da PUCRS.

ISRAEL BONIEK

Palestrante. Mestre e Doutorando em Educação. Experiência como diretor pedagógico. Graduado em Administração de Empresas. Especialização em Tecnologia Educacional.

VICENTE FALCÃO

tam desafios quando se trata de manter contato com suas crianças. Para ter acesso aos professores, as crianças pequenas precisam confiar nos pais, muitos dos quais têm empregos fora de casa, além das responsabilidades de cuidar dos filhos, o que dificulta ainda mais a tarefa de investirem tempo ao lado de seus filhos, e serem co-instrutores.

O acesso a recursos didáticos digitais por si só não é suficiente. É preciso mais do que isso para cons-truir um processo educacional de sucesso. Os problemas que estamos vivenciando não são totalmente novos, mas foram ampliados pela crise imposta pela pandemia. Já vivíamos a terceirização da educa-ção, feita pelas famílias que abri-ram mão de exercer com coerência o seu papel; portanto, vemos esse momento como uma oportunidade de reconhecermos que a Educação deve estar a serviço da vida; ela não pode ser um processo vaidoso

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 202130

de acúmulo de informações. Seu principal objetivo é guiar o ser hu-mano em um caminho de valores que podem ser incorporados pela criança desde muito cedo.

Como educadores que se dedi-cam à infância não podemos nos esquecer do quanto é importante pensar a educação como instru-mento de humanização. Educar é introduzir as crianças na realidade do infinito e da totalidade; é expan-dir horizontes. Educar vai além do que podemos ensinar e além das formas utilitárias de aprendizagem. O educar está relacionado ao que somos. •

Autores do livro “Momento Imperfeito - Reflexões sobre a Essência da Educação Infantil”. Editora Crescer Criança.

Entrevista

PESQUISAS CIENTÍFICAS REVELAM OS MILENARES SEGREDOS DO SONO:

E ELES CHEGAM À ESCOLAEntrevista com a psicóloga Luiza Elena Leite Ribeiro

do Valle, Pós-Doutoranda em Neuropsicologia (EBWU/FL),

doutora em Ciências (USP/SP), mestre em Psicologia

Escolar e Educacional (PUCC), especialista em Psicologia Clínica, Psicopedagogia e

Psicologia do Sono.

A preocupação com o sono vem sendo motivo de mobilização de profis-

sionais de diversas áreas em alertas sobre a Saúde, em todo o mundo. Este não é um tema novo?

Certamente, o sono não é uma descoberta atual! Ao mesmo tempo, a Jornada Internacional sobre o Sono, Saúde e Educação, que acontecerá nos dias 12, 13 e 14 de julho, promovido pelo SIEEESP ao lado da Associação Brasileira do Sono - que inclui ainda a Medicina

do Sono e a Odontologia do Sono - e traz pesquisadores e clínicos de renome, será um marco inédito na conquista de uma mudança prio-ritária: a compreensão do papel da Educação em nossa sociedade e a valorização do professor! O so-no trazido pela primeira vez, en-quanto Jornada Internacional de Sono, Saúde e Educação, irá focar positivamente condições que são indispensáveis à saúde do professor e ao bom desempenho dos alunos! Neste evento, teremos participa-ções também internacionais, que muito agradecemos.

O sono sempre despertou a curiosidade das pessoas, já que ele ocupa uma grande parte de nossas vidas. O filósofo Aristóteles propôs que os sonhos traziam informações sobre saúde, merecendo ser inves-tigados pelos médicos, como o fez Hipócrates, o pai da Medicina. Os gregos, assim como os babilônios e os egípcios, reconheciam nos sonhos mensagens divinas. Muitas passagens bíblicas contam sobre mensagens proféticas em sonhos, como no Egito antigo, quando José previu as pragas que se abateriam sobre o povo.

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Os gregos, assim como os babilônios e os egípcios,

reconheciam nos sonhos mensagens divinas

ENTREVISTAENTREVISTAENTREVISTAENTREVISTAENTREVISTA

transtornos de movimento relacio-nados ao sono), Síndrome de Per-nas Inquietas, além de outros dis-túrbios de sono que acompanham transtornos específicos em pessoas com necessidades especiais ou de aprendizagem. O sono também pode ser alterado por diferentes fatores, tanto externos, como inter-nos. O especialista em sono poderá realizar o diagnóstico e tratamento, o que poderá ocorrer em parceria com outros especialistas para a orientação de pais e professores. É de extrema importância que as queixas não sejam subestimadas. A prevenção sempre permite evi-tar agravamentos e os professores podem fazer muita diferença se souberem mais sobre o sono.

na contramão das práticas diárias a que se dedicavam!

Há, ainda, quem pense que dormir é um tempo perdido... Ou acham que isso pode ficar para depois... O sono é uma experiência individual e, portanto, é mais tran-quilo para uns do que para outros, mas o fato é que existem regras para garantir o bom sono, que ainda dependem de característi-cas biológicas e psicossociais! São cuidados abordados em Higiene do Sono, nome que se dá para as recomendações necessárias a um sono saudável. E o grande ganho na realização da Jornada Interna-cional do Sono para educadores é que o tema será abordado de forma direcionada às questões que os professores vivenciam, não como informações gerais que, às vezes, mais confundem.

O professor tem condições de perceber um aluno que apresenta algum desses distúrbios? A quem encaminhar o aluno?

Sim. Frequentemente, os pais ficam com um olhar restrito sobre os membros da família, porque não encontram dados de compa-ração. Assim, se o filho não res-peita os horários de dormir, pode lhes parecer que dormir é mesmo uma opção deles; se o filho está sonolento, já pela manhã, os pais podem concordar que ninguém gosta mesmo de sair da cama... Os professores podem alertar os pais por meio da observação do compor-tamento do aluno. O desinteresse, a falta de concentração, de memória, o baixo rendimento, dificuldades no relacionamento, mau humor e tantos outros sinais que prejudicam o aprendizado, podem indicar pro-blemas no sono, porque sono e vigí-lia caminham juntos e a orientação de um especialista pode resolver.

Conversar com os pais é o pri-meiro passo, demonstrando mais interesse do que crítica ao aluno. Cabe assinalar que os transtornos do sono, muitas vezes, seguem

Assim também, segundo a Bíblia, o nascimento de Jesus foi comunicado por mensagens oníricas. Com o passar do tempo, os instrumentos de investigação e comunicação se multiplicaram e os conhecimentos também. Com recursos de alta tecnologia, hoje é possível trazer respostas a este mistério milenar, e as respostas apontam o quanto dependemos dele em nossa vida diária: saúde, desempenho, felicidade, enfim, dependem do sono. É, portanto, com alegria que, pela primeira vez, profissionais interdisciplinares se reúnem para colaborar com pro-fessor, nossa grande esperança na construção dos novos tempos!

Quais são os mais comuns distúrbios do sono e que tipo de avaliação e tratamento exigem?

O sono é essencial para a saúde física e para o equilíbrio psicológi-co, ou seja, todas as pessoas pre-cisam de um sono reparador. Exis-tem numerosos Distúrbios do Sono, mas são pouco conhecidos e, desse modo, é comum que não sejam tratados, ou sequer avaliados. Há uma classificação internacional dos Transtornos do Sono, que é revisada periodicamente, conforme os estudos especializados se aper-feiçoam constantemente.

Os Distúrbios do Sono ocorrem nas diferentes fases da vida dos in-divíduos, e, dentre eles, se destaca a Insônia, que é a dificuldade crônica para começar a dormir, retomar o sono ou permanecer dormindo. Por outro lado, a Sonolência Excessiva persistente também é um Distúr-bio do Sono, além de transtornos como Apneia Obstrutiva do Sono (quando ocorrem dificuldades na passagem do ar, resultando em ronco e em risco de vida), Distúr-bios Circadianos do Sono (quando o sono não corresponde ao ritmo necessário à reparação individual que a pessoa necessita), Paras-sonias (sonambulismo, terrores noturnos, bruxismo, pesadelos e

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Por que nem todas as crianças e jovens têm um sono tranquilo? Há causas físicas e psicológicas que interferem no sono?

Cada pessoa tem seu próprio ritmo, que também depende da fase em que se encontra. Na in-fância, quando a criança descobre que o mundo, ou na adolescência, quando há uma busca de identidade e aceitação, o sono merece atenção.

No mundo atual, o sono tem que concorrer com inúmeros estímulos para crianças e jovens: televisão, jogos, bate-papo na internet etc. Com a pandemia os problemas se intensificaram porque as atividades saudáveis, ao lado de amigos, na escola, esportes, brincadeiras e etc., foram retiradas da rotina, aumentando o estresse de pais e professores que tiveram que se adaptar a condições impensadas,

características genéticas de um dos progenitores, que os pais nem imaginam que existe, muito menos o que devem fazer. A orientação do professor será importante para que os pais sintam apoio, confiança e cumplicidade nos cuidados com o filho. Em pesquisa que realizei, com a utilização do Questionário Infantil do Sono (QRL), verificamos que apenas 6% dos pais percebem os problemas de sono que queixam nos filhos, como um transtorno de saúde, que, por definição da OMS, não significa a mera ausência de doença, mas o bem-estar.

Qual a relação entre sono e aprendizagem?

O grande comandante de todos os processos que ocorrem no orga-nismo é o cérebro. É onde ficam as lembranças, as emoções, a apren-dizagem e a coordenação do sono. O sono interfere na memória, na atenção, nos registros sensoriais, no raciocínio, na motivação, enfim nos aspectos cognitivos que relacio-nam uma pessoa ao seu ambiente e que determinam a qualidade de seu desempenho e sua saúde. O sono não é um período passivo; ao con-trário, é o momento de restauração biopsicossocial e, portanto, envolve o aprendizado formal e informal.

Que prejuízos os distúrbios do sono causam, especialmente às crianças e jovens?

As consequências do sono inade-quado são inúmeras e gravíssimas! Por exemplo, a privação de sono, mesmo durante uma só noite, pode ocasionar uma diminuição da ativi-dade do sistema imunológico no dia seguinte, tornando a pessoa presa fácil de infecções, sem falar em dor, mal estar e péssimo rendimento. Na adolescência, a privação do sono começa a ser percebida quando o adolescente já não consegue acordar pela manhã para ir à escola, sente-se cansado e com pouca motivação para realizar outras atividades co-tidianas. No adolescente, o tempo de permanência na cama à noite é

fortemente modulado por fatores socioculturais, como a preocupação de ser aceito por um grupo com quem se identifica. O simples “ficar na cama” não representa um sono satisfatório, sequer significa que a pessoa dormiu. Essa questão vem preocupando pesquisadores e será o tema abordado na abertura do even-to pela própria presidente da ABS, Drª Andreia Bacelar, que tem uma proposta nova sobre uma fase de “atraso do sono”, que ainda é igno- rada pelas instituições escolares.

médico ou aposentadoria precoce, fazendo-o sentir-se culpado da própria doença.

Como se deu o seu envolvi-mento com a Educação?

Meu envolvimento com a Educa-ção não ocorre sem motivo. Antes de ser psicóloga, eu fui professora da Rede Municipal do Rio de Ja-neiro e pude sentir as dificuldades do professor e, quis ir adiante, en-tendendo os Transtornos de Apren-dizagem, que me levaram a muitos estudos em Neuropsicologia e ao mestrado em Psicologia Escolar e Educacional, especialidade que, finalmente, está decretada como obrigatória nas escolas.

A especialização em Psicologia do Sono, muitíssimo recente no Brasil, ainda não tem campo nas escolas. Apesar disso, para a rea-lização desta Jornada contamos com a participação voluntária de profissionais incríveis, que pres-tam sua homenagem ao professor trazendo-lhe os estudos a que se dedicam! Dois novos livros serão lançados sobre o sono e também foram escritos com o mesmo cari-nho, aliás, nome da coleção que a Drª Ângela Mathylde desenvolveu para os mestres: “Tenho um aluno com Transtorno do Sono. E agora?”.

Todo esse entusiasmo resultou na formação de um grupo de espe-cialistas que se disponibiliza a fazer pesquisas buscando solucionar o que aflige a comunidade escolar. Somos o Grupo Interdisciplinar de Pesquisa do Sono: “Intersomnus” do Instituto de Neurociências e Pesquisa Dr. Márcio Ribeiro do Valle (institutomrvalle.com). Estamos muito orgulhosos em colaborar com os professores, em seu incontestável valor, ao assumir para si o desafio de fazer cada aluno “dar certo” na vida, promovendo o melhor de seu potencial. Parabéns ao SIEEESP, à ABS, ao IPAMS, e, principalmente, a vocês professo-res, a quem nos unimos visando a realização dos sonhos que podem ser realidade pela Educação! •

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 202134

Entrevista ENTREVISTAENTREVISTA

É verdadeira a afirmação de que os transtornos de sono es-tão presentes em transtornos de saúde mental, como ansiedade, depressão, síndrome de pânico, entre outras doenças, que são frequentes na atualidade?

Sim, não apenas estão presentes como podem levar a tais distúrbios, entre outros. Em minha pesquisa de doutorado sobre o Estresse Transtornos de Sono do Professor, ficou demonstrada a relação entre esses distúrbios que caminham juntos, frequentemente, sem que sejam atendidos antes de explo-direm em “Burnt out”, quando o caso é levado a afastamento para tratamento médico, mas com con-sequências adversas relativas ao período em que a pessoa ficou “lu-tando” sem entender que precisava de um tratamento. A pesquisa está disponível na biblioteca da USP, sendo suficiente acessar com o meu nome ou com o título da pesquisa. Pelo desconhecimento, há uma reação de descaso com o esforço do professor, mesmo após afastamento

Ensino Híbrido

T emos facilidade de reco-nhecer uma pessoa an-tipática. É nítido. Igual-

mente, temos facilidade também de reconhecer uma pessoa simpática. Tanto a antipatia quanto a sim-patia são pontos equidistantes do que entendemos como empatia. E como a empatia pode estabelecer o “tom” de um relacionamento, e especialmente os que acontecem dentro do ambiente escolar, ainda mais quando nos deparamos com a questão do Ensino Híbrido, tão em voga atualmente?

Se olharmos para trás no trans-curso dos processos educacionais e das ideias pedagógicas, veremos claramente uma significativa mu-dança na relação professor-aluno em sala de aula. Desde Pestalozzi, por exemplo, já se entende a necessidade de uma relação dialógica, baseada na empatia e valorização do aluno como centro do processo educativo (CODEA, 2020), em contraposição à postura da época de alunos sentados, calados e imóveis, e que eram puni-dos fisicamente ou humilhados em caso de erros ou rebeldias.

Mas, afinal, o que é empatia? Podemos definir a empatia como uma qualidade da personalidade humana, em que há uma “tendência para sentir o que se sentiria caso se estivesse na situação e circunstâncias experimentadas por outra pessoa” (CUNHA, 1997). Em termos simples, colocar-se no lugar do outro. Em termos neurobiológicos, trata-se da utilização de uma classe especial de neurônios existentes no cérebro, os neurônios-espelho, que nos torna capazes de “entender a intenção

alheia a partir da observação de seu comportamento” (CODEA, 2020a, p. 72) e, ainda, de predizermos o com-portamento e as emoções alheias, como base para a empatia e a repul-são que sentimos pelas pessoas.

Também podemos definir a empatia como habilidade intra-pessoal, no contexto das inteligên-cias múltiplas (GARDNER, 2015). Juntamente com a escuta, é uma forma de estímulo à cooperação e à resolução de conflitos (GUILLÉN, 2017). Pessoas empáticas são mais competentes socialmente dos que a não empáticas (Cecconello e Koller, 2000) e, portanto, melhor capazes de estabelecer vínculos positivos, e desenvolvem melhor autoes-tima e capacidade de resolução de problemas, através de melhor autoeficácia.

Ensino HíbridoSe essas qualidades já são dese-

jadas e necessárias para a Educação, se tornam ainda mais necessárias quando falamos de Ensino Híbrido. Os modelos de Ensino Híbrido pres-supõem o retorno total às atividades presenciais, e o que está sendo feito pela maioria dos sistemas de ensino é uma espécie de Educação Híbrida, em que se alternam atividades pre-senciais e remotas.

Assim, em se tratando especifi-camente da adoção de métodos de Ensino Híbrido, como a sala de aula invertida, por exemplo, entendo que a empatia que se estabelece entre professor e alunos é funda-mental para o sucesso da estraté-gia. Explico: a adoção de métodos de Ensino Híbrido estabelece a

Ferramentas para promover a empatia no Ensino Híbrido

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necessidade de uma mudança de paradigma em relação ao modelo tradicional de ensino, com o profes-sor no centro do processo. Quando colocamos o aluno como centro e o professor como um coordenador e orientador do processo educativo, necessitamos de uma adaptação cultural, com a inversão de papeis e a adoção de novos comporta-mentos.

A empatia é fundamental neste processo, pois há a necessidade de uma aproximação afetiva que proporcione a necessária proteção aos alunos durante o processo de adaptação à nova estratégia. As dúvidas, ansiedades e angústias, potencialmente geradas pela mu-dança de paradigma, poderão, des-ta forma, serem amenizadas pela presença afetuosa do professor e, claro, pela aplicação de um plane-jamento cuidadosamente feito, em conjunto com a gestão da Escola.

Empatia no fazer pedagógicoJá foi dito (CODEA, 2019, p. 135)

que, no paradigma tradicional da Educação, “o aluno é um ser receptor, e não emissor, em que é um reprodutor de ‘verdades’, e não um criador de conhecimento”. Ele, portanto, não está apto, a priori, para exercer essa mudança para-digmática em si.

Claramente, evidenciei que as me- todologias ativas de aprendizagem

JULHO 2021 • REVISTA ESCOLA PARTICULAR 37

Lembrando que pessoas

empáticas são mais competentes socialmente, isso

pode significar uma sala de aula mais

colaborativa e com um objetivo comum

Palestrante e professor nas áreas de Neurociência Pedagógica e Docência do Ensino Fundamental e Médio. Mestre em Ciência da Motricidade Humana. Coautor no curso de Neurociência da Educação pelo CBI of Miami. Autor do livro “Neurodidática – Fundamentos e Princípios” (Wak Editora).

ANDRÉ CODEA

têm um importante papel nessa árdua tarefa de um novo paradigma educacional, baseado na Neuro-didática e, também, associado à figura docente como elemento incentivador e orientador deste novo processo, baseado no Ensino Híbrido.

Desta forma, podemos pensar em algumas estratégias em relação ao Ensino Híbrido e sua aplicação em sala de aula, tendo a empatia como pano de fundo. Lembrando que pes-soas empáticas são mais competentes socialmente, isso pode significar uma sala de aula mais colaborativa e com um objetivo comum.

1 – Explique claramente – o primeiro passo para a adoção de uma nova estratégia metodológica é a explicação clara, concisa e segura, ressaltando as potenciais aquisições positivas e a maior facilidade de aprendizagem, mas também evidenciando a necessi-dade de maior participação ativa e compromissada por parte do aluno.

2 – Escute de forma sensível – escutar atentamente, de forma legítima e sem preconceitos seus alunos é a melhor forma de situar-se empaticamente a eles. O real interesse em suas vidas e seus problemas faz a diferença na crença

no sucesso da mudança e na pers-pectiva de conseguirem vencer suas próprias dificuldades.

3 – Incentive – ao surgirem os primeiros sinais de angústias e ansiedades em relação à nova estra-tégia, minimize os problemas como ocorrência natural do processo e incentive os alunos a continuarem na empreitada. Esclareça que os eventuais problemas os fortale-cerão como solucionadores de problemas, e que se sentirão mais seguros à medida que insistirem e avançarem, corrigindo os eventuais tropeços, comuns na caminhada.

4 – Coloque-se como elemento de suporte – ressalte para os alunos que sempre estará ao lado deles para quaisquer dificuldades, e que juntos todos poderão obter o sucesso desejado. E, efetivamente, aja desta forma, construindo uma relação de segurança e apoio.

5 – Incentive a empatia – use os alunos que estiverem dominan-do melhor a metodologia e tendo maior sucesso como auxiliares para aqueles que estiverem tendo maior dificuldade. Isso criará um clima empático entre os próprios alunos, e sua linguagem e forma particula-res de comunicação poderão fazer a diferença na melhoria de rendi-

REFERÊNCIASCECCONELLO, Alessandra Marques; KOLLER, Silvia Helena. Competência social e empatia: um estudo sobre re-siliência com crianças em situação de pobreza. Estudos de Psicologia, 5(1), pp. 717-913, 2000.CODEA, André. O Ensino Híbrido no Contexto da Pandemia. Portal Planneta Educação. Disponível em: <https://www.plannetaeducacao.com.br/portal/a/426/o-ensino-hibrido-no-contexto-da-pandemia>. Publicado em: 21/04/2021.CODEA, André. O aluno como centro do processo educativo. In: Revista Presença Pedagógica, 169, pp. 26-30, outubro de 2020.CODEA, André. Imitação codificada. In: Revista Psique, nº 168, pp. 67-73, 2020a.CODEA, André Luiz de Britto Teles. Neu rod id át ic a: f u nd a mentos e princípios. Rio de Janeiro: Editora WAK, 2019.CUNHA, Antonio Geraldo da. Di-cionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa (2.ed.). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.GARDNER, Howard. As Inteligências Múltiplas. Revista Neuroeducação, nº 3, pp. 28-35, 2015.GUILLÉN, Jesús C. Neuroeducación en el aula: de la teoría a la práctica. Madrid, España, 2017.

Ensino Híbrido

mento geral, com benefícios óbvios para todos os envolvidos.

6 – Tenha bom humor – ter bom humor é um atributo básico para gerar empatia. Juntamente com o conhecimento, gera respeito e admiração. Claro que nem sem-pre estamos bem, nosso humor é flutuante e sujeito às variáveis internas e externas que incidem sobre nós. Mas, na medida do pos-sível, ter bom humor aproxima as pessoas, e irá aproximar você de seus alunos. •

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 202138

REVISTA ESCOLA PARTICULAR • JULHO 202140

Aprendizagem

A prática deliberada con-siste em uma série de treinamentos físicos e

psicológicos especializados que visam sobretudo o aprendizado de novas habilidades. Esse conceito foi criado pelo psicólogo Karl Anders Ericsson por meio do estudo dessa prática durante mais de 35 anos, comparando com outras práticas de ensino existentes, a prática comum e a prática intencional, utilizadas como formas de aprendizagem de várias atividades esportivas e intelectuais. Na educação existem estudos interessantes dessa prática, com resultados importantes.

Por outro lado, trazendo o as-sunto ao ensino universitário, te-mos como premissa fundamental a necessidade de que o ensino formal se estruture na formação de real conhecimento.

A PRÁTICA DELIBERADA FRENTE À EDUCAÇÃO UNIVERSITÁRIA

Em consonância com esse apren- dizado real, sabemos que aprender a fazer é mais importante que apren- der a saber. A prática deliberada busca essencialmente o aprender a fazer, não o aprender a saber. Assim, a prática deliberada e a edu-cação buscam resultados objetivos e mensuráveis de aprendizado de habilidade, não resultados teóricos e distantes da realidade do meio pelo que vive e se relaciona (ERCS-SON, K.A., KINTSCH, W., 1995).

Ademais, estudos recentes têm implicado a prática deliberada como uma forma eficiente de ensi-nar áreas que até pouco tempo eram consideradas extremada-mente técnica e herméticas, como a física (DESLAURIERS, L., SCHE-LEW, E. WIEMAN, C., 2011). O alvo principal desse trabalho surgiu da preocupação do Nobel

Carl Wieman com o aprendizado em Física e com a consequência do mesmo para o futuro da educação científica. Eles demonstraram que há uma melhora significativa na capacidade de aprender quando a prática deliberada é dada correta-mente em classe, seguindo os pres-supostos estabelecidos por Isaac Karl Ericsson que seriam a prática intencional, com objetivos claros e evidentes dados por professionais experientes da área, juntamente com avaliações formais, seriadas e imediatas ao aprendizado da habi-lidade, adequada a cada novo tipo de competência.

Nesse importante estudo, os alunos aprendiam as dificuldades que os mesmos físicos apresen-tariam na prática, os obrigando a argumentar nas mesmas situações as quais um físico experiente se

depararia. A parte de que o engaja-mento foi muito superior nos alunos que tiveram essa prática, e os resul-tados de aprendizado, foram mais que duas vezes superiores aos alu-nos que tiveram aulas com profes-sores sendo atendidos pelo método expositivo tradicional. Outros estu-dos similares mostraram benefícios evidentes de práticas similares quando comparadas com os méto-dos tradicionais (DESLAURIERS, E., 2011; ADAMS, W.K., 2006, BREWE, E., 2009, WATKINS, J., 2013, HANDELSMAN, J., 2004). Apesar disso, muitos professores ainda mantém o método tradicional expositivo de ensino.

As outras práticas existentes também funcionam, mas utilizam

objetivos e metas bastantes diferen-tes. Toda prática é uma atividade na qual visamos aprimorar uma habi-lidade. A primeira prática, a prática comum, é uma prática automática. Temos um objetivo claro e simples pela frente, buscamos aprendê-lo por meio da repetição mecânica de exemplos similares ou iguais, fazendo os exercícios propostos pelo professor através da metodo-logia clássica de repetição e erro. O resultado final é uma habilidade aprendida através unicamente dos seus conceitos básicos (ERICSSON, 2017, P.35-36).

Já na outra prática, a prática intencional ou ingênua, temos ademais de objetivos definidos uma maior exigência de aprender

a habilidade de uma forma mais completa e profunda (ERICSSON, 2017, 44-45). Não há, no entanto, o objetivo de se tornar um especia-lista na área.

E, por fim, temos a prática deli-berada. O que ela tem de diferencial respeito às demais seria que ela surge não somente para aprender uma habilidade, ela surge para dominar essencialmente todos os aspectos os quais ela pode ser exigida. Isso se faz por meio de um tripé característico de aprendizado: foco e concentração máximos na meta, avaliação imediata através de feedbacks contínuos e progressivos dos erros e acertos, e fixação ime-diata dos erros através de represen-tações mentais, que são construídas através dos professionais expertos nas respectivas áreas (ERICSSON, 2017, pg.45-48). Ericsson consta-tou que em todas as habilidades esportivas e intelectuais de alto nível dependem essencialmente da intensidade da dedicação e dos feedbacks contínuos dados por pro-fessores que realmente dominam a área a qual trabalham.

Isso significa que a prática deliberada vai em encontro com o ambiente universitário de alto nível. O aluno universitário deve, para avançar na sua formação de excelência, ter competências ele-vadas em cada disciplina para que seja realmente habilitado a exercer sua profissão, em benefício da so-ciedade a qual está inserido. O que a prática deliberada se diferencia nesse aspecto é que ela busca sa-ber qual será a melhor forma para sermos realmente hábeis nessas atividades que devem ser apren-didas, e como fazemos para que se tornem permanentes na motivação do aluno para aprender.

Muitos professores, no entanto, podem argumentar que o material disposto não pode ser aplicado na prática diária, devido a problemas de formação do professor ou falta de motivação, tanto no corpo do-cente como no corpo discente. Na realidade, a prática deliberada

O aluno não pode ser exigido nem muito além do seu conhecimento, para não ficar ansioso e desistir, nem muito abaixo das

suas capacidades para não se frustrar

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somente dará bons resultados quando o professor se propor a avaliar os resultados do seu ensino na criação real de habilidades nos alunos. A presença de atitude de mudança, aprendendo enquanto o trabalho é feito, e se pressionando continuamente e ter excelência no seu trabalho, do começo ao fim, so-mente será despertado no professor quando o mesmo avalie o seu tra-balho através da prática deliberada e se convença ou não da sua eficácia (ERICSSON, 2017, p. 128-155).

Quanto à motivação do profes-sor, estudos do psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi que explicam o fenômeno de felicidade que existe na prática educativa mostram que a motivação do aluno somente é fortalecida se o mesmo aprende algo novo que lhe estimula e não lhe gera frustações. O aluno não

pode ser exigido nem muito além do seu conhecimento, para não ficar ansioso e desistir, nem muito abaixo das suas capacidades para não se frustrar (CSIKSZENTMI-HALYI, M., 2008, p.75-76). Por isso, é muito importante a prática deliberada, já que ela ensina o aprendizado de forma contínua, tirando o aluno da sua zona de conforto, mas não exigindo nada que não esteja acima das suas reais possibilidades, através da avalição continuada do nível do aluno em classe com a construção progres-siva da representação mental do seu aprendizado.

Em resumo, de acordo com a prática deliberada, ficam algumas dicas aos professores e aos alunos, de como podemos melhorar a criação de nossas habilidades de competências:

Pós-Doutorando pela Emil Brunner International (EUA). Doutorado em Medicina pela UAB (ESPANHA). Médico (UFSM) e otorrinolaringologista (HGUVH - BARCELONA). Pós-Graduação em Neuropsicologia (UNIASSELVI). Filosofia (UNISUL).

RAFAEL LUÍS BOEMO

Pós-Doutoranda em Neuropsicologia (EBWU/FL), doutora em Ciências (USP/SP), mestre em Psicologia Escolar e Educacional (PUCC), especialista em Psicologia Clínica, Psicopedagogia e Psicologia do Sono.

LUIZA ELENA LEITE RIBEIRO DO VALLE

REFERÊNCIAS

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1) Pergunte-se: você, professor, quais habilidades você quer criar no seu aluno;

2) Enfatize no saber fazer não no saber teórico;

3) Crie representações mentais nos alunos. Questione e pergunte que o mesmo explique todos os passos da construção do seu conhe-cimento;

4) Construa objetivos baseados no assunto e nos erros mais co-muns dos alunos;

5) Faça perguntas que os tirem da zona de conforto;

6) Expresse seu raciocínio em voz alta para que os alunos enten-dam os problemas;

7) Repita continuamente o aprendido e faça avaliações sem-pre após o aprendizado de novas habilidades;

8) Dê modelos práticas para aprender;

9) Ensine o aluno a se moni-torizar continuamente e a ser independente.

Somente assim criaremos uma sociedade de profissionais feli- zes, expertos e prontos para assu-mir as suas próprias habilidades. Parafraseando o próprio Ericsson, “somente somos humanos quando estamos melhorando a nós mes-mos”. •

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