JURISPRUDÊNCIA STJ 3

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Células tronco

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  • Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ESPECIAL N 1.291.247 - RJ (2011/0267279-8)

    RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINORECORRENTE : CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA E

    OUTROSADVOGADO : LUIZ EDUARDO DE SOUZA MORAES E OUTRO(S)RECORRIDO : CRYOPRAXIS CRIOBIOLOGIA LTDA ADVOGADO : MARCELO GONALVES E OUTRO(S)

    EMENTA

    RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PERDA DE UMA CHANCE. DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO DE COLETA DE CLULAS-TRONCO EMBRIONRIAS DO CORDO UMBILICAL DO RECM NASCIDO. NO COMPARECIMENTO AO HOSPITAL. LEGITIMIDADE DA CRIANA PREJUDICADA. DANO EXTRAPATRIMONIAL CARACTERIZADO. 1. Demanda indenizatria movida contra empresa especializada em coleta e armazenagem de clulas tronco embrionrias, em face da falha na prestao de servio caracterizada pela ausncia de prepostos no momento do parto.2. Legitimidade do recm nascido, pois "as crianas, mesmo da mais tenra idade, fazem jus proteo irrestrita dos direitos da personalidade, entre os quais se inclui o direito integralidade mental, assegurada a indenizao pelo dano moral decorrente de sua violao" (REsp. 1.037.759/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 05/03/2010).3. A teoria da perda de uma chance aplica-se quando o evento danoso acarreta para algum a frustrao da chance de obter um proveito determinado ou de evitar uma perda.4. No se exige a comprovao da existncia do dano final, bastando prova da certeza da chance perdida, pois esta o objeto de reparao.5. Caracterizao de dano extrapatrimonial para criana que tem frustrada a chance de ter suas clulas embrionrias colhidas e armazenadas para, se for preciso, no futuro, fazer uso em tratamento de sade.6. Arbitramento de indenizao pelo dano extrapatrimonial sofrido pela criana prejudicda.7. Doutrina e jurisprudncia acerca do tema.8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

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    ACRDO

    Vistos e relatados estes autos em que so partes as acima indicadas, decide a Egrgia TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justia, Prosseguindo no julgamento, aps o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi, divergindo do voto do Sr. Ministro Relator,por maioria, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Votaram vencidos os Srs. Ministros Nancy Andrighi (voto-vista) e Sidnei Beneti. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bas Cueva (Presidente) e Joo Otvio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Braslia, 19 de agosto de 2014. (Data de Julgamento)

    MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO Relator

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  • Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ESPECIAL N 1.291.247 - RJ (2011/0267279-8)RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINORECORRENTE : CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA E

    OUTROSADVOGADO : LUIZ EDUARDO DE SOUZA MORAES E OUTRO(S)RECORRIDO : CRYOPRAXIS CRIOBIOLOGIA LTDA ADVOGADO : MARCELO GONALVES E OUTRO(S)

    RELATRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

    (Relator):

    Trata-se de recurso especial interposto por CARLOS MRCIO DA

    COSTA CORTZIO CORRA e OUTROS contra acrdo do Tribunal de

    Justia do Estado do Rio de Janeiro, ementado nos seguintes termos:

    Responsabilidade civil. Controvrsia entre consumidores e empresa especializada em coleta e armazenagem de clulas tronco embrionrias. Falha na prestao de servio, caracterizada pela ausncia de prepostos no momento do parto, que restou incontroversa. Exegese dos artigos 302 e 334, III, do CPC. Inadimplemento contratual, que por sua prpria natureza, mostrou-se capaz de repercutir na esfera de dignidade dos genitores do menor. Terceiro autor, beb de tenra idade, que, contudo, no dispunha de conscincia capaz de potencializar a ocorrncia do alegado dano moral. Inaplicabilidade da teoria da perda de uma chance hiptese dos autos, considerando-se que no restou evidenciada uma probabilidade certa ou evitar determinado prejuzo. Graves consequncias do ato ilcito, fruto grosseira falta de cautela com que autou a empresa r, a ensejar a aplicao da funo punitiva da responsabilidade civil, em conjunto com o paradigma meramente reparatrio. Montante indenizatrio que merece ser majorado para R$ 15.000,00 (quinze mil reais), em favor de cada um dos genitores do menor. Primeiro apelo parcialmente provido, declarando-se prejudicados os demais esclarecendo-se, de ofcio, que os nus sucumbenciais devem ser distribudos conforme o xito de cada um dos litisconsortes ativos.

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    Narram os autores, desde a petio inicial, que os dois primeiros

    recorrentes, marido e esposa grvida, em 26 de novembro de 2008, firmaram

    contrato de prestao de servios com a empresa r para a coleta e

    armazenagem de clulas-tronco embrionrias do seu futuro filho, terceiro

    recorrente, a poca nascituro, hoje com pouco mais de cinco anos de idade.

    Noticiam que, em 31 de novembro de 2008, dias antes do parto, o

    primeiro recorrente, pai, informou a empresa r que a cesariana de sua esposa

    estaria marcada para o dia 06 de janeiro de 2009, como se procedeu.

    Todavia, na ocasio do parto, a empresa r no compareceu para a coleta

    do material contratado, embora avisada do dia do nascimento, tendo sido

    procurada pelo pai por diversas ocasies naquele dia, o que gerou famlia

    srios transtornos e preocupaes.

    Diante do inadimplemento contratual, os autores requereram indenizao

    pelos danos extrapatrimoniais sofridos.

    Citada, a demandada no refutou os fatos narrados pelos autores,

    justificando que o descumprimento contratual se deu por sua preposta no ter

    conseguido chegar em tempo ao local combinado, realmente, perdendo a

    oportunidade de realizar a coleta do material. Alegou ter restitudo o valor

    adiantado, sustentando ser incabvel a reparao extrapatrimonial por

    descumprimento contratual.

    Em sentena, a magistrada de piso julgou procedente o pleito

    indenizatrio dos dois primeiros autores (pais), entendendo ter sido extrapolado

    o limite dos meros dissabores do descumprimento contratual, caracterizando-se

    danos extrapatrimoniais que merecem ser reparados, condenando a empresa r

    ao pagamento de indenizao no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais).

    Contudo, julgou improcedente o pedido indenizatrio realizado pelo terceiro

    requerente, por entender se tratar de dano hipottico, logo, no havendo o que

    ser reparado. Assentou a magistrada que somente se poderia falar em dano Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 4 de 34

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    concreto, e no hipottico, se o menor viesse a ter necessidade das

    clulas-tronco embrionrias no colhidas.

    Por sua vez, o Tribunal de origem, dando parcial provimento ao recurso

    dos autores e negando provimento ao recurso da r, majorou o quantum

    indenizatrio fixado em favor dos pais, estabelecendo-o em R$ 15.000,00

    (quinze mil reais), para cada um deles. Manteve, porm, a improcedncia do

    pleito indenizatrio em favor da criana, mas por fundamento diverso do da

    sentena. O acrdo recorrido assentou no caber indenizao extrapatrimonial

    para menor incapaz por no ter a conscincia necessria a potencializar a

    ocorrncia de um dano moral, bem como afastou a teoria da perda de uma

    chance por no restar evidenciada a probabilidade real de a criana necessitar

    de tal material gentico, pois nasceu com sade normal.

    Irresignados, em suas razes, os autores sustentaram que o acrdo

    recorrido violou os artigos 2., 3., 4., 5., 15 e 70 do Estatuto da Criana e do

    Adolescente, alm do art. 14 do Cdigo de Defesa do Consumidor. Apontaram

    ainda dissdio jurisprudencial. No mrito, reiteraram tratar-se de hiptese de

    aplicao da teoria da perda de uma chance. Postularam o conhecimento e o

    provimento do recurso para que sejam julgados totalmente procedentes os

    pedidos, fixando-se indenizao por dano extrapatrimonial em favor do menor.

    Foram apresentadas contrarrazes e o recurso especial foi admitido na

    origem.

    o relatrio.

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    RECURSO ESPECIAL N 1.291.247 - RJ (2011/0267279-8)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

    (Relator):

    Eminentes Colegas. A polmica devolvida ao conhecimento desta Corte

    Superior situa-se em torno da responsabilidade civil da empresa r,

    especializada na coleta e armazenagem de clulas-tronco embrionrias, pelos

    danos extrapatrimoniais sofridos por criana, decorrentes da falha na prestao

    do servio contratado, que no se realizou, deixando de coletar o material

    gentico que poderia ser usado, no futuro, em eventual tratamento de sua sade.

    A discusso situa-se em torno da legitimidade da criana e a

    possibilidade de aplicao da teoria da perda de uma chance, destacando-se que

    o recurso especial unicamente da criana.

    A condenao da empresa recorrida ao pagamento de indenizao por

    danos morais aos pais da criana pelos prejuizos decorrentes do

    descumprimento contratual transitou em julgado, no tendo sido interposto

    recurso pela r.

    Assim, o presente recurso especial centra-se exclusivamente na questo

    da existncia, ou no, de dano extrapatrimonial sofrido pela prpria criana,

    que era a beneficiria do contrato celebrado por seus pais.

    Adianto meu voto, no sentido de prover o presente recurso especial,

    entendendo que a criana foi a principal prejudicada pelo ato ilcito praticado

    pela empresa recorrida, tendo, naturalmente, direito indenizao pelo dano

    extrapatrimonial sofrido por ter sido frustrada a chance de ter suas clulas

    embrionrias colhidas e armazenadas para que, se eventualmente for preciso,

    fazer-se uso delas em tratamento de sade.

    Trata-se de caso claro de aplicao da teoria da perda de uma chance,

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    desenvolvida na Frana (la perte d'une chance), denominada na Inglaterra de

    loss-of-a-chance .

    Tive oportunidade de analisar a teoria da perda de uma chance em sede

    doutrinria (Princpio da Reparao Integral - Indenizao no Cdigo Civil.

    So Paulo: Saraiva, 2010, p. 166-174).

    Em verdade, no h falar em responsabilidade civil sem dano, fazendo-se

    necessria a presena de seus trs principais elementos - a certeza, a

    imediatidade e a injustia do dano.

    A certeza do dano constitui o principal elemento, significando que a

    leso ao interesse do prejudicado deve ser real e efetiva, sem deixar dvida

    acerca da sua existncia, ficando, assim, excludos os danos hipotticos.

    Essa afirmativa, porm, deve ser relativizada, pois, entre o dano certo e o

    hipottico, existe uma nova categoria de prejuzos, que foi identificada pela

    doutrina e aceita pela jurisprudncia a partir da teoria da perda de uma chance.

    Relembre-se que a teoria da perda de uma chance tem aplicao,

    quando o evento danoso acarreta para algum a perda de uma chance de

    obter um proveito determinado ou de evitar uma perda.

    O precedente mais antigo, no direito francs, foi o caso apreciado pela

    Corte de Cassao, em 17 de julho de 1889, que aceitou indenizar uma parte

    demandada pela perda provocada pela conduta negligente de um oficial

    ministerial, que impediu o prosseguimento do procedimento e,

    consequentemente, a possibilidade de ganhar o processo.

    Os irmos Mazeaud, partindo desse caso clssico, explicam que a perda

    de uma chance para a parte demandante no apenas um prejuzo hipottico,

    embora no se tenha certeza acerca da deciso que seria tomada pelo Tribunal

    no julgamento do caso. Em funo disso, a jurisprudncia francesa passou a

    reconhecer a existncia de um dano certo e especfico pela perda de uma

    chance, determinando o arbitramento da indenizao em conformidade com a Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 7 de 34

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    maior ou menor probabilidade de sucesso do recurso no tribunal (MAZEAUD

    Henri; MAZEAUD, Lon. Leciones de derecho civil. Buenos Aires: Ed.

    Jurdicas Europa-Amrica, 1962. v. II; TUNC, Andre. Tratado terico e prtico

    da la responsabilidad civil delictual y contratual. Buenos Aires: EJEA, 1961,

    p. 62 e 74).

    A doutrina tradicional negava a possibilidade de reparao por perda de

    uma chance, destacando-se Ren Domogue, que frisava a incerteza definitiva

    de que a obteno do benefcio patrimonial se concretizaria, argumentando,

    como exemplo o caso do cavalo de corrida impedido de participar de uma

    carreira, pois ningum poderia assegurar a vitria do animal (DOMOGUE,

    Ren. Trait des obligations en gnral. Paris: Librairie Arthur Rossaeu e Cie,

    1925, v. 4, p. 28-29; ZANNOINI, 1987, P. 77).

    Henri Lalou contrapunha com o argumento de que, nesses casos, no se

    exige a certeza do dano, pois basta a certeza da probabilidade, pois no h

    qualquer dvida acerca da completa frustrao de possibilidade de o cavalo

    chegar em primeiro lugar, determinada pelo evento danoso, perdendo, com isso

    a chance de uma vitria (LALOU, Henri. Trait pratique de la responsabilit

    civile. Paris: Dalloz, 1949, p.99; ZANNONI, 1987, P. 87.).

    Situa-se nesse ponto a caracterstica essencial da perda de uma chance: a

    certeza da probabilidade.

    A chance a possibilidade de um benefcio futuro provvel,

    consubstanciada em uma esperana para o sujeito, cuja privao caracteriza um

    dano pela frustrao da probabilidade de alcanar esse benefcio possvel.

    Fica claro, assim, que "o perdido, o frustrado, na realidade a chance e no

    o benefcio esperado como tal" (Henri Lalou, Ibid, p. 78).

    Por isso, na perda de uma chance, h tambm prejuzo certo, e no

    apenas hipottico, situando-se a certeza na probabilidade de obteno de um

    benefcio frustrado por fora do evento danoso. Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 8 de 34

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    Repara-se a chance perdida, e no o dano final.

    A teoria da perda de uma chance, em suas variadas nuanas, tem tido uma

    ampla aceitao na jurisprudncia recente desta Corte, como pode ser

    observado dos seguintes precedentes:

    RECURSO ESPECIAL. AO INDENIZATRIA. PROGRAMA TELEVISIVO DE PERGUNTAS E RESPOSTAS - BOA-F OBJETIVA DO PARTICIPANTE - CONTRATO QUE ESTABELECIA OBRA-BASE COMPOSTA DE DUAS PARTES, UMA REAL E OUTRA FICTCIA - CONTRATO QUE NO OBRIGAVA A RESPONDER ERRADO DE ACORDO COM PARTE FICTCIA DA OBRA-BASE - PERDA DE UMA CHANCE - PECULIARIDADES DO CASO - PREQUESTIONAMENTO INEXISTENTE - APLICAO DAS SMULAS 5, 7, 282 e 356 DO STF. 1.- Programa "Vinte e Um", de que participante candidato cujo contrato de participao com a emissora televisiva, como firmado pelo Acrdo, "continha clusula expressa no sentido de que a bibliografia bsica para a formulao da perguntas seria uma determinada obra - 'Corinthians Preto no Branco', a qual continha uma parte verdadeira, de cor preta, e uma parte fictcia, de cor branca, tendo o candidato sido desclassificado por responder o resultado correto de uma partida, que no se encontrava na parte correta, de cor preta, mas que constava, com resultado errado diverso, na parte fictcia de cor branca.2.- Acrdo que reconhece direito a indenizao por perda de uma chance de passagem a etapa seguinte, sob o fundamento de que "o que est implcito na clusula contratual, a ser interpretada segundo o princpio da boa-f objetiva e a causa do negcio jurdico, que os dados reais, contidos na parte preta do livro, que seriam levados em conta para a aferio da correo das respostas", de modo que, no constando, a resposta correta, da parte verdadeira, "eventual dubiedade, impreciso ou contradio da clusula deve ser interpretada contra quem a redigiu, no caso o ru STB", sendo que o julgamento "somente admitiria a improcedncia da ao caso constasse da clusula contratual o seguinte: I) a bibliografia que serviria como base das perguntas e respostas abranger a parte branca e a parte preta do livro; II) o programa de televiso versasse sobre o livro, e no sobre a histria real do Corinthians".3.- Acrdo que, por fim, funda-se tambm em "direito difuso informao exata, desinteressada e transparente", ao passo que, "no caso concreto, o que foi vendido ao pblico telespectador que um candidato responderia questes variadas sobre o Corintians, e no sobre uma obra de fico sobre o Corinthians", de modo que, no

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    constando regncia contratual do caso pela parte ficcional do livro-base, " evidente que se na parte ficcional do livro (parte branca) constasse que o Corinthias venceu por dez vezes a Taa Libertadores da amrica, e por dez vezes foi campeo do mundo" e se se "formulasse questo a respeito, a resposta do autor no poderia ser irreal, sob pena de comprometer o formato do programa e frustrar o prprio interesse do pblico".4.- Inocorrncia de violao do disposto no art. 859 e pargrafos do CC/2002 pela procedncia da ao.5.- Interpretao do contrato dada pelo Tribunal de origem, aps julgamento em Embargos Infringentes, a qual no pode ser alterada por esta Corte, sob pena de infringncia da Smula 5/STJ; fatos ocorridos, que igualmente no podem ser reexaminados, por vedado pela Smula 7/STJ; ausncia, ademais, de prequestionamento, sem interposio de Embargos de Declarao, o que leva incidncia das Smulas 282 e 356/STF.6.- Recurso Especial improvido. (REsp 1383437/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/08/2013, DJe 06/09/2013)

    ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO DA ADMINISTRAO PBLICA QUE EQUIVOCADAMENTE CONCLUIU PELA INACUMULABILIDADE DOS CARGOS J EXERCIDOS. NO APLICAO DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. HIPTESE EM QUE OS CARGOS PBLICOS J ESTAVAM OCUPADOS PELOS RECORRENTES. EVENTO CERTO SOBRE O QUAL NO RESTA DVIDAS. NOVA MENSURAO DO DANO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FTICO E PROBATRIO. RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL A QUO.1. A teoria da perda de uma chance tem sido admitida no ordenamento jurdico brasileiro como sendo uma das modalidades possveis de mensurao do dano em sede de responsabilidade civil. Esta modalidade de reparao do dano tem como fundamento a probabilidade e uma certeza, que a chance seria realizada e que a vantagem perdida resultaria em prejuzo. Precedente do STJ.2. Essencialmente, esta construo terica implica num novo critrio de mensurao do dano causado. Isso porque o objeto da reparao a perda da possibilidade de obter um ganho como provvel, sendo que "h que se fazer a distino entre o resultado perdido e a possibilidade de consegui-lo. A chance de vitria ter sempre valor menor que a vitria futura, o que refletir no montante da

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    indenizao.3. Esta teoria tem sido admitida no s no mbito das relaes privadas stricto sensu, mas tambm em sede de responsabilidade civil do Estado. Isso porque, embora haja delineamentos especficos no que tange interpretao do art. 37, 6, da Constituio Federal, certo que o ente pblico tambm est obrigado reparao quando, por sua conduta ou omisso, provoca a perda de uma chance do cidado de gozar de determinado benefcio.4. No caso em tela, conforme excerto retirado do acrdo, o Tribunal a quo entendeu pela aplicao deste fundamento sob o argumento de que a parte ora recorrente perdeu a chance de continuarem exercendo um cargo pblico tendo em vista a interpretao equivocada por parte da Administrao Pblica quanto impossibilidade de acumulao de ambos.5. Ocorre que o dano sofrido pela parte ora recorrente de ordem material no advm da perda de uma chance. Isso porque, no caso dos autos, os recorrentes j exerciam ambos os cargos de profissionais de sade de forma regular, sendo este um evento certo sobre o qual no resta dvidas. No se trata de perda de uma chance de exerccio de ambos os cargos pblicos porque isso j ocorria, sendo que o ato ilcito imputado ao ente estatal implicou efetivamente em prejuzo de ordem certa e determinada. A questo assim deve continuar sendo analisada sob a perspectiva da responsabilidade objetiva do Estado, devendo portanto ser redimensionado o dano causado, e, por conseguinte, a extenso da sua reparao.6. Assim, afastado o fundamento adotado pelo Tribunal a quo para servir de base concluso alcanada, e, considerando que a mensurao da extenso do dano matria que demanda eminentemente a anlise do conjunto ftico e probatrio constante, devem os autos retornarem ao Tribunal de Justia a quo a fim de que possa ser arbitrado o valor da indenizao nos termos do art. 944 do Cdigo Civil.7. Recurso especial parcialmente conhecido, e, nesta extenso, provido. (REsp 1308719/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 01/07/2013)

    CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAO NO RECURSO ESPECIAL. RECEBIMENTO COM AGRAVO REGIMENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. CONDUTA OMISSIVA E CULPOSA DO ADVOGADO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO. DECISO MANTIDA.

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    1. Responsabilidade civil do advogado, diante de conduta omissiva e culposa, pela impetrao de mandado de segurana fora do prazo e sem instrui-lo com os documentos necessrios, frustrando a possibilidade da cliente, aprovada em concurso pblico, de ser nomeada ao cargo pretendido. Aplicao da teoria da "perda de uma chance".2. Valor da indenizao por danos morais decorrentes da perda de uma chance que atende aos princpios da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em vista os objetivos da reparao civil.Invivel o reexame em recurso especial.3. Embargos de declarao recebidos como agravo regimental, a que se nega provimento. (EDcl no REsp 1321606/MS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 23/04/2013, DJe 08/05/2013)

    RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. VIOLAO DO ART. 535 DO CPC. INEXISTNCIA. SMULA N 7/STJ. NO INCIDNCIA. HOSPITAL PARTICULAR. RECUSA DE ATENDIMENTO. OMISSO. PERDA DE UMA CHANCE.DANOS MORAIS. CABIMENTO.1. No viola o artigo 535 do Cdigo de Processo Civil, nem importa negativa de prestao jurisdicional, o acrdo que adotou, para a resoluo da causa, fundamentao suficiente, porm diversa da pretendida pelo recorrente, para decidir de modo integral a controvrsia posta. 2. No h falar, na espcie, no bice contido na Smula n 7/STJ, porquanto para a resoluo da questo, basta a valorao das consequncias jurdicas dos fatos incontroversos para a correta interpretao do direito. Precedentes.3. A dignidade da pessoa humana, alada a princpio fundamental do nosso ordenamento jurdico, vetor para a consecuo material dos direitos fundamentais e somente estar assegurada quando for possvel ao homem uma existncia compatvel com uma vida digna, na qual esto presentes, no mnimo, sade, educao e segurana.4. Restando evidenciado que nossas leis esto refletindo e representando quais as prerrogativas que devem ser prioritariamente observadas, a recusa de atendimento mdico, que privilegiou trmites burocrticos em detrimento da sade da menor, no tem respaldo legal ou moral.5. A omisso adquire relevncia jurdica e torna o omitente responsvel quando este tem o dever jurdico de agir, de praticar um ato para impedir o resultado, como na hiptese, criando, assim, sua omisso, risco da ocorrncia do resultado.

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    6. A simples chance (de cura ou sobrevivncia) passa a ser considerada como bem juridicamente protegido, pelo que sua privao indevida vem a ser considerada como passvel de ser reparada.7. Na linha dos precedentes deste Tribunal Superior de Justia, restando evidentes os requisitos ensejadores ao ressarcimento por ilcito civil, a indenizao por danos morais medida que se impe.8. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1335622/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/12/2012, DJe 27/02/2013)

    RECURSO ESPECIAL - PROCESSUAL CIVIL - CIVIL - TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE - PARTICIPAO EM PROCESSO LICITATRIO - IMPOSSIBILIDADE - ENVIO DA PROPOSTA PELO CORREIO A ESTADO DIVERSO DA FEDERAO - POSSIBILIDADE CONCRETA DE XITO - PREJUZO REAL - ART. 159 DO CDIGO CIVIL DE 1916 - SMULA N 7/STJ. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENO.1. A teoria da perda de uma chance incide em situaes de responsabilidade contratual e extracontratual, desde que sria e real a possibilidade de xito, o que afasta qualquer reparao no caso de uma simples esperana subjetiva ou mera expectativa aleatria.2. O xito em licitao, possibilidade frustrada em virtude da conduta ilcita da empresa responsvel pela entrega, em tempo hbil, da documentao devidamente enviada, enseja dano concreto, afervel luz do art. 159 do Cdigo Civil de 1916.3. O exame relativo mensurao do valor econmico da efetiva possibilidade da recorrida em obter o resultado til esperado, caso a correspondncia houvesse sido adequadamente enviada ao destino correto, resta insindicvel, nesta instncia processual, pelo bice formal da Smula n 7/STJ.4. A Empresa Brasileira de Correios e Telgrafos isenta do recolhimento das custas processuais em decorrncia do art. 12 do Decreto-Lei n 509/1969.5 - Recurso especial parcialmente provido. (REsp 614.266/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/12/2012, DJe 02/08/2013)

    DIREITO CIVIL. CNCER. TRATAMENTO INADEQUADO. REDUO DAS POSSIBILIDADES DE CURA. BITO. IMPUTAO DE CULPA AO MDICO. POSSIBILIDADE DE APLICAO DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL PELA

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    PERDA DE UMA CHANCE. REDUO PROPORCIONAL DA INDENIZAO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.1. O STJ vem enfrentando diversas hipteses de responsabilidade civil pela perda de uma chance em sua verso tradicional, na qual o agente frustra vtima uma oportunidade de ganho. Nessas situaes, h certeza quanto ao causador do dano e incerteza quanto respectiva extenso, o que torna aplicvel o critrio de ponderao caracterstico da referida teoria para a fixao do montante da indenizao a ser fixada. Precedentes.2. Nas hipteses em que se discute erro mdico, a incerteza no est no dano experimentado, notadamente nas situaes em que a vtima vem a bito. A incerteza est na participao do mdico nesse resultado, medida que, em princpio, o dano causado por fora da doena, e no pela falha de tratamento.3. Conquanto seja viva a controvrsia, sobretudo no direito francs, acerca da aplicabilidade da teoria da responsabilidade civil pela perda de uma chance nas situaes de erro mdico, foroso reconhecer sua aplicabilidade. Basta, nesse sentido, notar que a chance, em si, pode ser considerado um bem autnomo, cuja violao pode dar lugar indenizao de seu equivalente econmico, a exemplo do que se defende no direito americano. Prescinde-se, assim, da difcil sustentao da teoria da causalidade proporcional.4. Admitida a indenizao pela chance perdida, o valor do bem deve ser calculado em uma proporo sobre o prejuzo final experimentado pela vtima. A chance, contudo, jamais pode alcanar o valor do bem perdido. necessria uma reduo proporcional.5. Recurso especial conhecido e provido em parte, para o fim de reduzir a indenizao fixada. (REsp 1254141/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 20/02/2013)

    EMBARGOS DE DECLARAO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. OMISSO. E CONTRADIO. EXISTNCIA. SORTEIO. PROMOO PUBLICITRIA. VIOLAO DE DEVER CONTRATUAL. PERDA DE UMA CHANCE.1. A recorrente recebeu bilhete para participar de sorteio em razo de compras efetuadas em hipermercado. Neste constava "voc concorre a 900 vales-compras de R$ 100,00 e a 30 casas." Foi sorteada e, ao comparecer para receber o prmio, obteve apenas um vale-compras, tomando, ento, conhecimento de que, segundo o regulamento, as casas seriam sorteadas queles que tivessem sido premiados com os vale-compras. Este segundo sorteio, todavia, j tinha ocorrido, sem a sua participao. As trinta casas j haviam sido

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    sorteadas entre os demais participantes.2. Violao do dever contratual, previsto no regulamento, de comunicao autora de que fora uma das contempladas no primeiro sorteio e de que receberia um segundo bilhete, com novo nmero, para concorrer s casas em novo sorteio. Fato incontroverso, reconhecido pelo acrdo recorrido, de que a falta de comunicao a cargo dos recorridos a impediu de participar do segundo sorteio e, portanto, de concorrer, efetivamente, a uma das trinta casas.3. A circunstncia de a participao no sorteio no ter sido diretamente remunerada pelos consumidores, sendo contrapartida aquisio de produtos no hipermercado, no exime os promotores do evento do dever de cumprir o regulamento da promoo, ao qual se vincularam.4. Dano material que, na espcie, no corresponde ao valor de uma das trinta casas sorteadas, mas perda da chance, no caso, de 30 chances, em 900, de obter o bem da vida almejado.5. Ausncia de publicidade enganosa ou fraude a justificar indenizao por dano moral. O hipermercado sorteou as trinta casas prometidas entre os participantes, faltando apenas com o dever contratual de informar, a tempo, a autora do segundo sorteio. No conseqncia inerente a qualquer dano material a existncia de dano moral indenizvel. No foram descritas nos autos consequncias extrapatrimoniais passveis de indenizao em decorrncia do aborrecimento de se ver a autora privada de participar do segundo sorteio.6. Embargos de declarao acolhidos com efeitos modificativos. (EDcl no AgRg no Ag 1196957/DF, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/2012, DJe 18/04/2012)

    DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. 1) NEGATIVA DE PRESTAO JURISDICIONAL AFASTADA. 2) PERDA DE CHANCE QUE GERA DEVER DE INDENIZAR. 3) CANDIDATO A VEREADOR, SOBRE QUEM PUBLICADA NOTCIA FALSA, NO ELEITO POR REDUZIDA MARGEM DE VOTOS. 4) FATO DA PERDA DA CHANCE QUE CONSTITUI MATRIA FTICA NO REEXAMINVEL PELO STJ.I.- Os Embargos de Declarao so corretamente rejeitados se no h omisso, contradio ou obscuridade no acrdo embargado, tendo a lide sido dirimida com a devida e suficiente fundamentao.II.- As Turmas que compem a Segunda Seo desta Corte vm reconhecendo a possibilidade de indenizao pelo benefcio cuja chance de obter a parte lesada perdeu, mas que tinha possibilidade de ser obtida III.- Aplica-se a teoria da perda de uma chance ao caso

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    de candidato a Vereador que deixa de ser eleito por reduzida diferena de oito votos aps atingido por notcia falsa publicada por jornal, resultando, por isso, a obrigao de indenizar.IV.- Tendo o Acrdo recorrido concludo, com base no firmado pelas provas dos autos, no sentido de que era objetivamente provvel que o recorrido seria eleito vereador da Comarca de Carangola, e que esse resultado foi frustrado em razo de conduta ilcita das rdios recorrentes, essa concluso no pode ser revista sem o revolvimento do contedo ftico-probatrio dos autos, procedimento vedado em sede de Recurso Especial, nos termos da Smula 7 desta Corte.V.- Recurso Especial improvido. (REsp 821.004/MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2010, DJe 24/09/2010)

    PROCESSUAL CIVIL E DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE DE ADVOGADO PELA PERDA DO PRAZO DE APELAO. TEORIA DA PERDA DA CHANCE. APLICAO. RECURSO ESPECIAL. ADMISSIBILIDADE. DEFICINCIA NA FUNDAMENTAO. NECESSIDADE DE REVISO DO CONTEXTO FTICO-PROBATRIO. SMULA 7, STJ. APLICAO.- A responsabilidade do advogado na conduo da defesa processual de seu cliente de ordem contratual. Embora no responda pelo resultado, o advogado obrigado a aplicar toda a sua diligncia habitual no exerccio do mandato.- Ao perder, de forma negligente, o prazo para a interposio de apelao, recurso cabvel na hiptese e desejado pelo mandante, o advogado frusta as chances de xito de seu cliente. Responde, portanto, pela perda da probabilidade de sucesso no recurso, desde que tal chance seja sria e real. No se trata, portanto, de reparar a perda de uma simples esperana subjetiva, nem tampouco de conferir ao lesado a integralidade do que esperava ter caso obtivesse xito ao usufruir plenamente de sua chance.- A perda da chance se aplica tanto aos danos materiais quanto aos danos morais.- A hiptese revela, no entanto, que os danos materiais ora pleiteados j tinham sido objeto de aes autnomas e que o dano moral no pode ser majorado por deficincia na fundamentao do recurso especial.- A pretenso de simples reexame de prova no enseja recurso especial. Aplicao da Smula 7, STJ.- No se conhece do Especial quando a deciso recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso no abrange todos eles.Smula 283, STF.

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    Recurso Especial no conhecido. (REsp 1079185/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2008, DJe 04/08/2009)

    No caso dos autos, essencialmente sobre o ponto devolvido a esta Corte

    Superior no presente recurso especial, acerca do pedido indenizatrio

    formulado pela criana, o Tribunal de origem manteve a improcedncia de seu

    pleito sob o fundamento de que ela no tem conscincia capaz para

    potencializar a ocorrncia de dano moral, ou seja, de que criana no sofre

    dano moral .

    A jurisprudncia desta Corte Superior, porm, j firmou seu

    entendimento em sentido contrario, afirmando, inclusive, que o nascituro tem

    direito a danos morais, mesmo sem qualquer componente de conscincia, pois

    deve-se tutelar os seus direitos da personalidade, sempre norteado pelo

    princpio da dignidade da pessoa humana, indo por terra o fundamento adotado

    pelo Tribunal a quo.

    Nesse sentido, antigo paradigma desta Corte Superior:

    DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS. MORTE. ATROPELAMENTO. COMPOSIO FRREA. AO AJUIZADA 23 ANOS APS O EVENTO. PRESCRIO INEXISTENTE. INFLUNCIA NA QUANTIFICAO DO QUANTUM. PRECEDENTES DA TURMA. NASCITURO. DIREITO AOS DANOS MORAIS. DOUTRINA. ATENUAO.FIXAO NESTA INSTNCIA. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.I - Nos termos da orientao da Turma, o direito indenizao por dano moral no desaparece com o decurso de tempo (desde que no transcorrido o lapso prescricional), mas fato a ser considerado na fixao do quantum.II - O nascituro tambm tem direito aos danos morais pela morte do pai, mas a circunstncia de no t-lo conhecido em vida tem influncia na fixao do quantum.III - Recomenda-se que o valor do dano moral seja fixado desde logo, inclusive nesta instncia, buscando dar soluo definitiva ao caso e evitando inconvenientes e retardamento da

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    soluo jurisdicional.(REsp 399028/SP, Rel. Ministro SLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26/02/2002, DJ 15/04/2002, p. 232).

    Mais recentemente, esta Terceira Turma, em recurso da relatoria da e.

    Ministra Nancy Andrighi, firmou paradigma importante no cenrio

    jurisprudencial, enfrentando expressamente a questo debatida no aresto

    fustigado no sentido de que as crianas, mesmo da mais tenra idade, fazem jus

    proteo irrestrita dos direitos da personalidade, entre os quais se inclui o

    direito integridade mental, assegurada a indenizao pelo dano moral

    decorrente de sua violao, nos termos dos arts. 5, X, in fine, da CF e 12,

    caput, do CC/02 :

    DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. RECUSA DE CLNICA CONVENIADA A PLANO DE SADE EM REALIZAR EXAMES RADIOLGICOS. DANO MORAL. EXISTNCIA.VTIMA MENOR. IRRELEVNCIA. OFENSA A DIREITO DA PERSONALIDADE.- A recusa indevida cobertura mdica pleiteada pelo segurado causa de danos morais, pois agrava a situao de aflio psicolgica e de angstia no esprito daquele. Precedentes - As crianas, mesmo da mais tenra idade, fazem jus proteo irrestrita dos direitos da personalidade, entre os quais se inclui o direito integridade mental, assegurada a indenizao pelo dano moral decorrente de sua violao, nos termos dos arts. 5, X, in fine, da CF e 12, caput, do CC/02 .- Mesmo quando o prejuzo impingido ao menor decorre de uma relao de consumo, o CDC, em seu art. 6, VI, assegura a efetiva reparao do dano, sem fazer qualquer distino quanto condio do consumidor, notadamente sua idade. Ao contrrio, o art. 7 da Lei n 8.078/90 fixa o chamado dilogo de fontes, segundo o qual sempre que uma lei garantir algum direito para o consumidor, ela poder se somar ao microssistema do CDC, incorporando-se na tutela especial e tendo a mesma preferncia no trato da relao de consumo.- Ainda que tenha uma percepo diferente do mundo e uma

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    maneira peculiar de se expressar, a criana no permanece alheia realidade que a cerca, estando igualmente sujeita a sentimentos como o medo, a aflio e a angstia.- Na hiptese especfica dos autos, no cabe dvida de que a recorrente, ento com apenas trs anos de idade, foi submetida a elevada carga emocional. Mesmo sem noo exata do que se passava, certo que percebeu e compartilhou da agonia de sua me tentando, por diversas vezes, sem xito, conseguir que sua filha fosse atendida por clnica credenciada ao seu plano de sade, que reiteradas vezes se recusou a realizar os exames que ofereceriam um diagnstico preciso da doena que acometia a criana.Recurso especial provido.(REsp 1037759/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 05/03/2010)

    Portanto, no subsiste o fundamento lanado no acrdo recorrido.

    Faz-se necessrio tambm enfrentamento do fundamento lanado na

    sentena tambm recorrida, no sentido de que, no caso dos autos, o dano seria

    hipottico, sendo somente concretizado quando o autor viesse, futuramente,

    fazer necessidade do material gentico no colhido.

    exatamente neste ponto que tem plena aplicao a teoria da perda da

    chance.

    Como acima j dito, no se exige do consumidor a prova da certeza do

    dano, mas a prova da certeza da chance perdida, ou seja, a certeza da

    probabilidade.

    No caso, a responsabilidade por perda de uma chance por serem "as

    clulas-tronco o grande trunfo da medicina moderna para o tratamento de

    inmeras patologias consideradas incurveis ", cuja retirada do cordo

    umbilical deve ocorrer no momento do parto.

    possvel que o dano final nunca venha a se implementar, bastando que

    a pessoa recm nascida seja plenamente saudvel, nunca desenvolvendo Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 1 9 de 34

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    qualquer doena tratvel com a utilizao das clulas-tronco retiradas do seu

    cordo umbilical.

    O certo, porm, que perdeu definitivamente a chance de prevenir o

    tratamento dessas patologias, sendo essa chance perdida o objeto da

    indenizao.

    No localizei, no acervo jurisprudencial desta Corte Superior, precedente

    que definisse a incidncia da teoria da perda de uma chance nas hipteses de

    defeito na prestao de servio da coleta do material.

    O nico precedente que localizei foi na jurisprudncia do Tribunal de

    Justia do Estado do Paran, na Apelao nmero 401.466-0, da relatoria do

    Des. Ronald Schulman, julgado em 17-5-2007, em que se reconheceu a

    obrigao de indenizar da empresa contratada para a coleta do material gentico

    que chegou atrasada sala de parto, perdendo a oportunidade de faz-lo, se

    assemelhando em muito com o presente caso:

    EMENTA: APELAO CVEL - INDENIZAO POR DANOS MORAIS - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRNCIA - CONTRATO DE PRESTAO DE SERVIOS - COLETA E ARMAZENAGEM DE CLULAS-TRONCO - EMPRESA QUE, NO OBSTANTE TENHA RECEBIDO O PAGAMENTO CORRESPONDENTE, DEIXA DE ENVIAR PREPOSTO QUALIFICADO PARA COLETA DO MATERIAL A SER RETIRADO DO CORDO UMBILICAL - OPORTUNIDADE NICA - MOMENTO DO NASCIMENTO - NEGLIGNCIA DA R VERIFICADA - DANO MORAL CONFIGURADO - INDENIZAO DEVIDA - SENTENA REFORMADA - NUS DE SUCUMBNCIA INVERTIDOS - APELAO PROVIDA E RECURSO ADESIVO PREJUDICADO. 1. Se os pontos que se pretendia demonstrar com a produo de novas provas podiam ser averiguados atravs dos documentos que instruram a inicial, mostra-se desnecessria sua realizao, inocorrendo, portanto, cerceamento de defesa. 2. Considerando que as clulas-tronco so o grande trunfo da

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    medicina moderna no tratamento de inmeras patologias consideradas incurveis, no se pode dizer que a ausncia da r no momento do parto, com a perda da nica chance existente para a coleta desse material, trata-se de um simples inadimplemento contratual . 3. Havendo desperdcio da nica chance existente para a coleta das clulas-tronco por culpa exclusiva da r, que foi negligente ao deixar de encaminhar preposto qualificado para a coleta no momento oportuno, evidente se mostra o dano moral suportado pelos autores diante da frustrao em ampliar os recursos para assegurar a sade de seu primeiro filho.

    Portanto, no h falar em dano hipottico, conforme constou na sentena,

    mas de dano certo consistente na perda definitiva da chance de prevenir o

    tratamento de patologias grave, sendo essa chance perdida o objeto da

    indenizao.

    Destarte, aplicando-se a teoria da perda de uma chance, entendo presente

    a obrigao de indenizar por parte da empresa r que no realizou a coleta das

    clulas-tronco do cordo umbilical do terceiro autor, lhe retirando assim,

    definitivamente, a chance de se prevenir com tratamento de patologias

    graves com o uso delas, sendo essa chance perdida o objeto da indenizao.

    Estabelecida a obrigao de indenizar por parte da empresa r, passa-se

    nesse momento fixao do quantum indenizatrio, com incidncia do

    princpio da reparao integral do dano.

    O princpio da reparao integral tem plena incidncia para um

    ressarcimento amplo da chance perdida pelo lesado, devendo-se apenas ter

    ateno para o fato de que no se indenizar o dano final, mas a chance perdida.

    O dano final seria a vantagem esperada pelo lesado, que foi

    definitivamente perdida, enquanto a chance perdida um prejuzo autnomo,

    como dito, o objeto da indenizao.

    Esta Corte Superior j teve a oportunidade de fazer aplicao de critrio Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 2 1 de 34

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    matemtico, na fixao do quantum indenizatrio para hiptese de perda de

    uma chance, no paradigma do caso do "Show do Milho", em que se

    estabeleceu, atravs de uma probabilidade matemtica o percentual de chances

    de acerto da questo de mltipla escolha com quatro itens (25% do prmio

    total). Foi no REsp. 788.549/BA, relator e. Min. Fernando Gonalves, julgado

    em 8-11-2005:

    RECURSO ESPECIAL. INDENIZAO. IMPROPRIEDADE DE PERGUNTA FORMULADA EM PROGRAMA DE TELEVISO. PERDA DA OPORTUNIDADE.1. O questionamento, em programa de perguntas e respostas, pela televiso, sem viabilidade lgica, uma vez que a Constituio Federal no indica percentual relativo s terras reservadas aos ndios, acarreta, como decidido pelas instncias ordinrias, a impossibilidade da prestao por culpa do devedor, impondo o dever de ressarcir o participante pelo que razoavelmente haja deixado de lucrar, pela perda da oportunidade.2. Recurso conhecido e, em parte, provido.(REsp 788.459/BA, Rel. Ministro FERNANDO GONALVES, QUARTA TURMA, julgado em 08/11/2005, DJ 13/03/2006, p. 334)

    No presente caso, contudo, no h possibilidade de utilizao da

    probabilidade matemtica para auferir as chances em que a parte autora teria de

    contrair uma doena de que viesse a necessitar do uso das clulas-tronco com

    forma de tratamento.

    No caso, a chance perdida, qual seja - a coleta das clulas tronco do

    cordo umbilical da criana, havero outras oportunidades, em uma medicina

    avanada, de se colher tais clulas - via medula-ssea, dentes de leite, no tem

    qualquer contedo patrimonial, mas extrapatrimonial.

    Assim, atento a tais peculiaridades, tenho por razovel o arbitramento da

    indenizao em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), eis que a criana foi a

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    principal prejudicada pelo ato ilcito.

    Destarte, acolho a insurgncia recursal, julgando procedentes os pedidos

    formulados na petio inicial, fixando indenizao ao terceiro autor no

    montante de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), incidindo juros de mora desde a

    data do ato ilcito (Smula 54/STJ) e correo monetria desde o dia do

    presente julgamento (Smula 362/STJ).

    Fica naturalmente mantido o quantum indenizatrio arbitrado em favor

    dos primeiros autores (pais), com os seus respectivos consectrios legais, que

    no foi objeto do recurso especial.

    Quanto a sucumbncia, caracterizado o decaimento total por parte da

    empresa r, ser por ela integralmente suportada, fixando os honorrios de

    sucumbncia em 15% sobre o valor total da condenao.

    Ante todo exposto, voto no sentido de dar provimento ao recurso

    especial.

    o voto.

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    CERTIDO DE JULGAMENTOTERCEIRA TURMA

    Nmero Registro: 2011/0267279-8 PROCESSO ELETRNICO REsp 1.291.247 / RJ

    Nmeros Origem: 1647673820098190001 20090011654220 201113505981

    PAUTA: 07/08/2014 JULGADO: 07/08/2014

    RelatorExmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO

    Presidente da SessoExmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BAS CUEVA

    Subprocurador-Geral da RepblicaExmo. Sr. Dr. JOO PEDRO DE SABOIA BANDEIRA DE MELLO FILHO

    SecretriaBela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

    AUTUAO

    RECORRENTE : CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA E OUTROSADVOGADO : LUIZ EDUARDO DE SOUZA MORAES E OUTRO(S)RECORRIDO : CRYOPRAXIS CRIOBIOLOGIA LTDAADVOGADO : MARCELO GONALVES E OUTRO(S)

    ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil - Indenizao por Dano Moral

    CERTIDO

    Certifico que a egrgia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epgrafe na sesso realizada nesta data, proferiu a seguinte deciso:

    Aps o voto do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, dando provimento ao recurso especial, pediu vista, antecipadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.

    Aguardam os Srs. Ministros Ricardo Villas Bas Cueva (Presidente), Joo Otvio de Noronha e Sidnei Beneti.

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    RECURSO ESPECIAL N 1.291.247 - RJ (2011/0267279-8)RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINORECORRENTE : CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA E

    OUTROSADVOGADO : LUIZ EDUARDO DE SOUZA MORAES E OUTRO(S)RECORRIDO : CRYOPRAXIS CRIOBIOLOGIA LTDA ADVOGADO : MARCELO GONALVES E OUTRO(S)

    VOTO-VISTA

    O EXMO. SR. MINISTRO NANCY ANDRIGHI:

    Conforme relatado, cuida-se de recurso especial interposto por

    CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA e OUTROS, fundamentado

    nas alneas "a" e "c" do permissivo constitucional, contra acrdo do TJ/RJ.

    Ao: de compensao por danos morais, ajuizada pelos recorrentes

    (pais e filho) em face de Cryopraxis Criobiologia Ltda, sustentando que a

    empresa, por negligncia, deixou de coletar as clulas embrionrias do cordo

    umbilical do recm-nascido, no momento do parto, frustrando a expectativa dos

    pais de prover medida preventiva, em favor do filho, que lhe assegura o

    tratamento futuro de vrias doenas, e subtraindo deste tal oportunidade (perda de

    uma chance).

    Sentena: o Juzo de primeiro grau julgou improcedente o pedido de

    Bernardo Longo Cortazio Correa, por entender que no restou configurado o dano

    moral, seja por sua tenra idade, seja pela inocorrncia da perda de uma chance,

    mas existncia de simples dano hipottico. Ademais, julgou parcialmente

    procedentes os pedidos de Carlos Mario da Costa Cortazio Correa e Francis

    Longo Cortazio Correa, para condenar a recorrida a pag-los, solidariamente, a

    quantia de R$ 15.000,00, a ttulo de compensao por danos morais, em virtude

    da tenso e angstia presumivelmente sofridas no momento do parto (fl. 174,

    e-STJ).

    Acrdo: o TJ/RJ deu parcial provimento apelao interposta pelos

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    recorrentes, apenas para majorar o valor da condenao devida aos genitores do

    menor, estabelecendo-o em R$ 15.000,00 em favor de cada um deles.

    Recurso especial: alega-se violao dos arts. 2, 3, 4, 5, 15 e 70 do

    ECA, bem como do art. 14 do CDC.

    Juzo de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo Tribunal de

    origem.

    Voto do Relator: o Min. Paulo de Tarso Sanseverino deu

    provimento ao recurso especial, para condenar a recorrida ao pagamento de R$

    60.000,00 criana, a ttulo de compensao dos danos morais pela perda de uma

    chance, consubstanciada em ter suas clulas embrionrias colhidas e

    armazenadas para, se preciso for, no futuro, fazer uso em tratamento de sade.

    Revisados os fatos, decido.

    Inicialmente, consigno que acompanho o Min. Relator, nos termos do

    voto proferido na sesso de 07/08/2014, no que tange ao reconhecimento da

    legitimidade do menor para pleitear a compensao por danos morais, tendo em

    vista o que decidi no julgamento do REsp 1.037.759/RJ (minha relatoria, 3

    Turma, DJe de 05/03/2010): As crianas, mesmo da mais tenra idade, fazem jus

    proteo irrestrita dos direitos da personalidade, assegurada a indenizao pelo

    dano moral decorrente de sua violao, nos termos dos arts. 5, X, in fine, da CF e

    12, caput, do CC/02.

    Peo vnia, no entanto, para divergir quanto ao reconhecimento dos

    danos morais pela perda de uma chance, com base nos motivos que passo a expor.

    1. Da teoria da perda de uma chance

    01.A teoria da perda de uma chance (perte d'une chance ), inspirada Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 2 6 de 34

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    na doutrina francesa, impe o dever de indenizar quele que subtrai de outrem a

    oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar um prejuzo, ou seja, de

    alcanar uma situao futura melhor.

    02.Trata-se, em verdade, de um novo olhar sobre a responsabilidade

    civil, na medida em que se reconhece o dever de indenizar a oportunidade

    efetivamente perdida, apesar da incerteza quanto concretizao da vantagem que

    dela poderia advir.

    03. A perda de uma chance, ento, passou a configurar, em si mesma,

    um dano indenizvel, autnomo, desvinculado, portanto, do resultado final

    inicialmente esperado pelo ofendido, mas interrompido pela conduta do ofensor.

    No , porm, toda e qualquer circunstncia de frustrao de uma perspectiva que

    gera o dever de indenizar; exige-se, para tanto, que a chance perdida se mostre

    sria e real.

    04. A propsito, o Min. Ruy Rosado de Aguiar h muito discorreu

    sobre o tema, citando, na ocasio do voto proferido no julgamento do REsp

    57.529/DF (Rel. para o acrdo Min. Fontes de Alencar, 4 Turma, DJ de

    23/06/1997), a esclarecedora lio de Genevive Viney, nesta passagem:

    A oportunidade, a chance de obter uma certa situao futura uma realidade concreta, ainda que no o seja a real concretizao dessa perspectiva; um fato do mundo, um dado da realidade, tanto que o bilhete de loteria tem valor, o prprio seguro repousa na idia da chance. A dificuldade de sua avaliao no maior do que avaliar o dano moral pela morte de um filho, ou o dote devido mulher agravada em sua honra (art. 1548 do CC). preciso, porm, estabelecer linhas limitadoras: a chance deve ser real e sria; o lesado deve estar efetivamente em condies pessoais de concorrer situao futura esperada; deve haver proximidade de tempo entre a ao do agente e o momento em que seria realizado o ato futuro; a reparao deve necessariamente ser menor do que o valor da vantagem perdida (Viney, Genevirve, La responsabilit, in Trait de Droit Civil, Jacques Ghestin, LGDJ, 1982, 341 e seguintes).

    05. Na linha desse entendimento, consolidou-se a atual jurisprudncia

    do STJ: AgRg no Ag 1.401.354/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1 Turma,

    Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 2 7 de 34

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    DJe de 02/08/2012; REsp 1.354.100/TO, Rel. Min. Eliana Calmon, 2 Turma,

    DJe de 24/10/2013; REsp 614.266/MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bas Cueva, 3

    Turma, DJe de 02/08/2013; e REsp 1.190.180/RS, Rel. Min. Luis Felipe

    Salomo, 4 Turma, DJe de 22/11/2010.

    06. Sob tal tica, infere-se que a caracterstica essencial da perda de

    uma chance , com bem descreveu o e. Relator, a certeza da probabilidade:

    certeza da ocorrncia de um fato antijurdico que interrompeu o curso normal de

    um processo aleatrio, o qual poderia culminar em uma situao mais favorvel

    para o lesado; e probabilidade concreta da ocorrncia desse resultado, j que no

    h como afirmar, com absoluta segurana, que se o processo no tivesse sido

    interrompido a situao mais favorvel teria ocorrido.

    07. Jamais se vir saber se a possvel vantagem realmente se

    confirmaria, uma vez que a oportunidade para alcana-la ficou para trs e

    irreversvel, mas o fato certo e provado que se perdeu a chance concreta de

    auferi-la, quando havia uma probabilidade real e sria de isso acontecer.

    08. Logo, a certeza do dano reside na perda da chance efetiva e

    no na perda da vantagem pretendida, mesmo porque esta consequncia no

    efeito direto e imediato da conduta do agente. Ou, segundo o professor italiano

    Maurizio Bocchiola, citado por Srgio Savi: a indenizao da perda de uma

    chance no se afasta da regra de certeza do dano, tendo em vista que a

    possibilidade perdida, em si considerada, era efetivamente existente; perdida a

    chance, o dano , portanto, certo (in Responsabilidade civil por perda de uma

    chance. So Paulo: Atlas, 2006. p. 19).

    09. dizer, embora no seja certa a obteno do proveito, certa a

    probabilidade de consegui-lo, cuja frustrao configura, sem dvidas, um dano

    autnomo para quem deixou de usufru-la. Justamente por isso, porque a certeza

    da probabilidade anulada e no do proveito em si, a indenizao devida ser

    sempre inferior ao ganho que seria alcanado acaso ocorrido o resultado final Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 2 8 de 34

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    almejado, e deve ser calculada segundo um juzo de proporcionalidade.

    10. Convm aqui lembrar o exemplo simblico de aplicao da teoria

    da perda de uma chance, julgado pelo STJ, relativamente ao programa Show do

    Milho (REsp 788.459/BA, Rel. Min. Fernando Gonalves, 4 Turma, DJ de

    13/03/2006). Na ocasio, este Tribunal reconheceu a culpa da emissora de

    televiso e o consequente dever de indenizar, por ter subtrado da participante a

    oportunidade de acertar a ltima pergunta formulada para ganhar o prmio

    mximo, j que no havia assertiva correta, e, com isso, anular a indiscutvel

    probabilidade de 25% de receber R$ 1.000.000,00. O valor da condenao foi, na

    ocasio, reduzido, considerando-se o fato de que, mesmo que ela tivesse

    respondido, no havia como afirmar, com absoluta segurana, que teria acertado a

    resposta.

    11. Noutra toada, insta ressaltar, por oportuno, que perda de uma

    chance contrape-se o mero dano hipottico, baseado em simples expectativa de

    ganho, dependente da concorrncia de circunstncias eventuais e futuras, sem

    suporte na realidade atual, fruto de um juzo conjectural. Nesse caso, no h, a

    priori , certeza do dano, que suposto, condicional, e, por isso, impassvel de

    reparao.

    2. Da hiptese dos autos: dano moral pela perda de uma chance

    12. De incio, importante ressaltar que o dano moral dos pais foi

    reconhecido, no em decorrncia da perda de uma chance, mas sim porque se

    considerou que os transtornos ocasionados superaram os aborrecimentos

    cotidianos prprios de um mero inadimplemento contratual (fl. 174, e-STJ).

    13. Quanto pretenso do menor, sustentam os recorrentes ter ele

    sofrido dano moral decorrente da perda da chance de coleta de clulas-tronco do

    seu cordo umbilical no dia do parto, causada pela negligncia do preposto da Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 2 9 de 34

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    empresa contratada para a realizao de tal servio.

    14. Para o e. Relator, esse fato constitui um ilcito indenizvel, na

    medida em que se trata de dano certo consistente na perda definitiva da chance

    de prevenir o tratamento de patologia grave, sendo essa chance perdida o objeto

    da indenizao.

    15. A meu sentir, a anlise do contexto ftico, tal e qual descrito no

    acrdo impugnado, embora evidencie o inadimplemento contratual da recorrida

    pelo qual, repita-se, foi condenada a indenizar os pais no revela a certeza da

    probabilidade necessria configurao do dano moral sofrido pelo

    recm-nascido, seno apenas a perda de uma possibilidade de tratamento se e

    somente se ele vier a contrair uma patologia ou correr tal risco e se essa patologia

    puder ser prevenida ou curada pelo uso das clulas-tronco, que deveriam ter sido

    coletadas e no o foram.

    16. A concluso, portanto, de que a recorrida, por negligncia,

    interrompeu, definitivamente, a chance de o recorrente prevenir o tratamento de

    patologia grave, baseia-se, no meu entender, em premissas supostas, as quais, vale

    frisar, no refletem a realidade atual do menor, j que a probabilidade no se fazia

    presente no momento do fato lesivo.

    17. E mais, no campo das suposies, conviria at considerar a

    hiptese no muito remota, alis de a medicina vir a descobrir outros meios

    para a coleta das clulas embrionrias, antes do recorrido vir a delas necessitar, o

    que reavivaria a expectativa de preveno ou tratamento de eventual patologia e,

    por conseguinte, a chance inicialmente perdida, restando apenas o

    descumprimento do contrato.

    18. Volto, ento, s palavras de Genevive Viney, citadas alhures,

    agora adaptadas ao particular: a chance de obter uma certa situao futura no

    uma realidade concreta nos autos; o recm-nascido no est, efetivamente,

    em condies pessoais de concorrer situao futura esperada; no h Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 3 0 de 34

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    proximidade de tempo entre a ao do agente e o momento em que seria

    realizado o ato futuro. E tudo isso porque a perspectiva mais favorvel, querida

    pelos recorrentes, mas interrompida pela recorrida, ainda incerta, na medida em

    que, sendo o menor atualmente saudvel, no se pode, hoje, visualizar, no plano

    concreto, a vantagem que no foi obtida, ou o prejuzo que no foi evitado.

    19. Em verdade, a probabilidade, na espcie, s ser certa quando

    preenchidas as diversas condies j relacionadas; at ento, mera conjectura,

    que no revela, por sua vez, a certeza do dano e, portanto, no implica,

    efetivamente, a perda de uma chance a ser reparada.

    20. A bem dizer, certeza da probabilidade haveria caso a criana

    tivesse recebido o diagnstico de uma doena com chances concretas de

    preveno ou cura por meio das clulas embrionrias no utilizadas, o que,

    afortunadamente, no sucedeu com o recorrente.

    Forte nessas razes, peo vnia ao e. Relator para NEGAR

    PROVIMENTO ao recurso especial, mantendo, na ntegra, o acrdo impugnado.

    Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 3 1 de 34

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    RECURSO ESPECIAL N 1.291.247 - RJ (2011/0267279-8)RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINORECORRENTE : CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA E OUTROSADVOGADO : LUIZ EDUARDO DE SOUZA MORAES E OUTRO(S)RECORRIDO : CRYOPRAXIS CRIOBIOLOGIA LTDA ADVOGADO : MARCELO GONALVES E OUTRO(S)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO JOO OTVIO DE NORONHA:

    Sr. Presidente, inegvel que o estudo de clulas tronco avana dia aps dia.

    No caso, a empresa se responsabilizou, assumiu o contrato, incorreu em

    inadimplemento absoluto e frustrou a expectativa da coleta do material que se guardaria para

    eventual tratamento futuro.

    Causou-se, portanto, dano expectativa da famlia e, por isso, peo vnia Ministra

    Nancy Andrighi para acompanhar o voto do eminente Ministro Relator.

    Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 3 2 de 34

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    RECURSO ESPECIAL N 1.291.247 - RJ (2011/0267279-8)RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINORECORRENTE : CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA E

    OUTROSADVOGADO : LUIZ EDUARDO DE SOUZA MORAES E OUTRO(S)RECORRIDO : CRYOPRAXIS CRIOBIOLOGIA LTDA ADVOGADO : MARCELO GONALVES E OUTRO(S)

    VOTO-VENCIDO

    O EXMO. SR. MINISTRO SIDNEI BENETI:

    Sr. Presidente, eu me impressiono muito com essa questo da perda da

    chance e recuso a caracterizao da perda da chance toda vez que se torna um

    exerccio de futurvel, aquele futuro que poder, eventualmente, vir a ocorrer.

    Aqui, parece-me que isso, porque, realmente, a evoluo pode levar

    desnecessidade desse recurso ao tratamento. Para se caracterizar isso como no

    futurvel, precisaria ser um futuro que, provavelmente, vir a ser ou que tenha uma

    grande chance de vir a ser.

    Peo licena ao Ministro Relator para acompanhar a divergncia.

    Ministro SIDNEI BENETI

    Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 3 3 de 34

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    CERTIDO DE JULGAMENTOTERCEIRA TURMA

    Nmero Registro: 2011/0267279-8 PROCESSO ELETRNICO REsp 1.291.247 / RJ

    Nmeros Origem: 1647673820098190001 20090011654220 201113505981

    PAUTA: 07/08/2014 JULGADO: 19/08/2014

    RelatorExmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO

    Presidente da SessoExmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BAS CUEVA

    Subprocurador-Geral da RepblicaExmo. Sr. Dr. MAURCIO VIEIRA BRACKS

    SecretriaBela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

    AUTUAO

    RECORRENTE : CARLOS MRCIO DA COSTA CORTZIO CORRA E OUTROSADVOGADO : LUIZ EDUARDO DE SOUZA MORAES E OUTRO(S)RECORRIDO : CRYOPRAXIS CRIOBIOLOGIA LTDAADVOGADO : MARCELO GONALVES E OUTRO(S)

    ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil - Indenizao por Dano Moral

    CERTIDO

    Certifico que a egrgia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epgrafe na sesso realizada nesta data, proferiu a seguinte deciso:

    Prosseguindo no julgamento, aps o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi, divergindo do voto do Sr. Ministro Relator, a Turma, por maioria, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Votaram vencidos os Srs. Ministros Nancy Andrighi (voto-vista) e Sidnei Beneti. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bas Cueva (Presidente) e Joo Otvio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Documento: 1336307 - Inteiro Teor do Acrdo - Site certificado - DJe: 01/10/2014 Pgina 3 4 de 34