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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ - UESC DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO DCIE NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD JUVENILIZAÇÃO DAS CLASSES DA EJA NA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE ILHÉUS 1 Lécia Nájla dos Santos Melo Raimunda de Santana Santos RESUMO A juvenilização das classes da EJA tem se constituído nas últimas décadas um desafio para a escola, bem como a constatação do estranhamento, do confronto entre os jovens, os adultos e os profissionais que aí atuam. O objetivo deste trabalho foi investigar e analisar o fenômeno da juvenilização nas classes de EJA, nas escolas da rede pública municipal de Ilhéus no período de 2002 à 2010. Para isto, privilegiamos a pesquisa de abordagem quantitativa e documental a fim de verificar a ocorrência do processo de “juvenilização” nessas classes. Os resultados obtidos certificam a existência de grande número de jovens, que cada vez mais vêm sendo inseridos mais cedo nas turmas da EJA na rede pública de ensino da cidade de Ilhéus. Palavras-chave: Educação de jovens e adultos; jovens; juvenilização; educação. ABSTRACT The classes of juvenilization EJA has been made in recent decades a challenge for the school as well as the finding of estrangement, the confrontation between young people, adults and professionals who work. The objective of this study was to investigate and analyze the phenomenon of adult education classes in juvenilization in public schools in the city of Ilheus period 2002 to 2010. For this, we favor a quantitative approach to research and documentation to verify the occurrence of the process "juvenilization" in these classes. The results certify the existence of large numbers of young people who increasingly have been placed earlier in the adult education classes in public schools in the city of Ilheus. Keywords: Education, youth and adults, young people juvenilization; education. 1INTRODUÇÃO Segundo o Conselho Nacional de Juventude (2006) a juventude é uma condição social, parametrizada por uma faixa etária, a qual no Brasil congrega cidadãos e 1 Trabalho apresentado a UESC para aquisição do título de Especialista em Educação de Jovens e Adultos com Perspectiva em Educação Popular.

JUVENILIZAÇÃO DAS CLASSES DA EJA NA REDE PÚBLICA …nead.uesc.br/jornaped2013/anais_2013/politicas_publicas/... · Brunel (2004) afirma que “o rejuvenescimento da população

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ - UESC DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO – DCIE NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD

JUVENILIZAÇÃO DAS CLASSES DA EJA NA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE ILHÉUS1

Lécia Nájla dos Santos Melo

Raimunda de Santana Santos

RESUMO

A juvenilização das classes da EJA tem se constituído nas últimas décadas um desafio para a

escola, bem como a constatação do estranhamento, do confronto entre os jovens, os adultos e

os profissionais que aí atuam. O objetivo deste trabalho foi investigar e analisar o fenômeno da

juvenilização nas classes de EJA, nas escolas da rede pública municipal de Ilhéus no período de

2002 à 2010. Para isto, privilegiamos a pesquisa de abordagem quantitativa e documental a

fim de verificar a ocorrência do processo de “juvenilização” nessas classes. Os resultados

obtidos certificam a existência de grande número de jovens, que cada vez mais vêm sendo

inseridos mais cedo nas turmas da EJA na rede pública de ensino da cidade de Ilhéus.

Palavras-chave: Educação de jovens e adultos; jovens; juvenilização; educação.

ABSTRACT

The classes of juvenilization EJA has been made in recent decades a challenge for the school as

well as the finding of estrangement, the confrontation between young people, adults and

professionals who work. The objective of this study was to investigate and analyze the

phenomenon of adult education classes in juvenilization in public schools in the city of Ilheus

period 2002 to 2010. For this, we favor a quantitative approach to research and

documentation to verify the occurrence of the process "juvenilization" in these classes. The

results certify the existence of large numbers of young people who increasingly have been

placed earlier in the adult education classes in public schools in the city of Ilheus.

Keywords: Education, youth and adults, young people juvenilization; education.

1INTRODUÇÃO

Segundo o Conselho Nacional de Juventude (2006) a juventude é uma condição

social, parametrizada por uma faixa etária, a qual no Brasil congrega cidadãos e

1 Trabalho apresentado a UESC para aquisição do título de Especialista em Educação de Jovens e Adultos

com Perspectiva em Educação Popular.

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cidadãs com idade compreendida entre os 15 e os 29 anos. Por outro lado, a UNESCO

utiliza a faixa etária de 15 a 24 anos para demarcar o período da juventude, por sua

vez a Organização Mundial de Saúde (OMS) considera as pessoas de 15 a 19 anos

como adolescentes jovens e, pessoas de 20 a 24 anos como adultos jovens.

De acordo com Pais (2003) a juventude pode ser caracterizada por duas

tendências: a primeira associa juventude a um conjunto de fatores sociais em uma

determinada fase da vida que é definida pela faixa etária. A outra é constituída por

jovens em condições sociais diferentes entre si que os diferenciam uns dos outros. Isto

nos remete, segundo esse autor, a duas perspectivas distintas: a unidade e a

diversidade. Inicialmente, quando se fixa numa fase da vida, considerando-se a faixa

etária e, em seguida quando o que está em jogo é o conjunto social com toda a

diversidade que o caracteriza, e com todos os elementos que constituem a sociedade,

como os jogos de interesses e as características pessoais diferenciadas. Estas

tendências se tornam mais perceptivas no espaço escolar, onde se passa o

estranhamento, o confronto entre jovens, adultos e profissionais que aí atuam. Desse

modo, a juvenilização das classes da EJA (Educação de Jovens e Adultos) tem se

constituído nas últimas décadas um desafio para a escola posto o distanciamento, o

conflito entre a juventude e o universo escolar, que por muitas vezes não é percebido

ou considerado pelos professores. Além disso, para a comunidade escolar “os jovens

alunos da EJA vieram para perturbar e desestabilizar a ordem ‘supletiva’ escolar

Carrano (2007, p.1)

A complexidade dessa situação nos instigou a proceder à investigação deste

fenômeno, de modo que possamos refletir sobre essa realidade e conhecermos esse

sujeito que está por redesenhar a EJA.

Assim, diante do exposto, levantamos a seguinte questão:

Será que o fenômeno da juvenilização das classes da EJA ocorre nas escolas da

rede de ensino público municipal da cidade de Ilhéus?

Pesquisar o processo de juvenilização das classes da EJA na cidade de Ilhéus

torna-se importante, na medida em que poderá contribuir para revelar-se e desvelar-

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se de que forma esse fenômeno atinge as escolas, bem como qual a reconfiguração

atual da EJA na cidade de Ilhéus. Nessa perspectiva, esse estudo é também importante

por intencionar fornecer subsídios para o desenvolvimento de outras pesquisas, de

modo, a gerar conhecimento acerca desse fenômeno e dos atores sociais inseridos

nessa realidade.

2 REVISÃO DA LITERATURA

Brunel (2004) afirma que “o rejuvenescimento da população que freqüenta a

Educação de Jovens e Adultos (EJA) é um fato que vem progressivamente ocupando

atenção de educadores e pesquisadores na área de educação” (p. 9), e enfatiza que os

estudos sobre esse fenômeno no Brasil, iniciaram-se a partir dos anos de 1990. No

entanto, apesar dos avanços no desvelamento das especificidades, das representações

sociais da juventude, ainda não temos na literatura um consenso sobre o conceito de

juventude.

Nessa direção de ideias, Pais (1990) aponta a existência de duas tendências que

exprimem concepções sobre juventude, a corrente geracional, associada a uma fase da

vida, vivenciada por indivíduos que tem um conjunto de atividades em comum, o que

é definido por uma faixa etária específica. Para a outra tendência, a corrente classista,

a juventude é tomada como um conjunto social diverso que varia de acordo com a

classe social que cada grupo de indivíduos pertence, havendo assim juventudes ou

modos de ser jovem.

De acordo, ainda, com este autor, a juventude se apresenta como uma

categoria construída socialmente e sofre a influência de fatores econômicos, sociais e

políticos da sociedade em que o indivíduo jovem está inserido, e, por isso mesmo esta

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categoria pode se modificar, assim como a sociedade em si se modifica ao longo do

tempo, de acordo com os momentos históricos que está vivenciando.

Dayrell (2003) acredita que os próprios jovens constroem seu modo de ser, os

quais apresentam características específicas de cada um, o que, portanto implica em

dizer que não existe um único modo de ser jovem, daí em concordância com o referido

autor tomarmos aqui a noção de juventudes, no plural, para enfatizar a diversidade de

“modos de ser jovem” existentes.

São estes jovens que vêm sendo inseridos cada vez mais cedo, nas turmas da

EJA. Muitos pesquisadores, tais como Carvalho (2009), Haddad (2007), Spósito (2003),

entre outros, tem se debruçado sobre as causas que tem promovido a juvenilização

das classes da EJA. De acordo com Carrano (2007) a preocupação crescente com o

tema da juventude no campo da Educação de Jovens e Adultos, dá-se em grande

medida pela evidência empírica de que a presença destas pessoas já constitui a

maioria ou quase totalidade da população nesta modalidade de ensino.

Carvalho (2009) reforça esta constatação e aponta as possíveis causas para a

intensificação deste fenômeno quando afirma que

a inserção do jovem nesta modalidade de ensino tem se configurado

como um fator desafiador para uma nova forma de fazer a EJA. A

juvenilização, intensificada na contemporaneidade, decorre das

deficiências do sistema escolar como a evasão e a repetência, que

ocasionam a defasagem entre a idade e série; da busca pela

certificação escolar oriunda da necessidade de trabalhar, da

dificuldade de acesso; da ausência de motivação para o retorno a

escola, entre outras. (p. 01)

Assim, percebe-se que a juvenilização das classes da EJA é o resultado de

problemas seculares que fazem parte da educação brasileira, quais sejam: a evasão e a

repetência, os quais caracterizam o fracasso escolar, e que ainda não foi resolvido.

Na sociedade moderna, observa-se o aumento significativo da violência,

sobretudo no meio urbano. Nesse contexto, a pesquisa Mapa da Violência de 2011,

realizada por Jacobo, aponta que

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É na faixa ‘jovem’, dos 15 aos 24 anos, que os homicídios atingem sua

máxima expressão, principalmente na faixa dos 20 aos 24 anos de

idade, com taxas em torno de 63 homicídios por 100 mil jovens (p.54).

Neste sentido, o autor da pesquisa diz que o jovem é tomado como um

problema social e, para sanar ou amenizar estes problemas decorrentes da ação

juvenil são implementadas políticas e/ou ações com o objetivo de ocupar os principais

causadores de problemas na sociedade. Assim, liga-se ao jovem muitos dos problemas

que a sociedade vem enfrentando.

Jacobo (2011) sublinha ainda que as situações de violência envolvendo jovens

aumentam a cada ano no Brasil, o que faz consequentemente com que a juventude

seja tratada pela mídia como um conceito inseparável da violência, até mesmo como

se fossem sinônimos. Quanto a isso, Dayrell (2010) ressalta que a imagem que a mídia

faz dos jovens dificulta a compreensão da sociedade acerca dessa fase da vida, uma

vez que transmitem noções extremamente negativas, pois apresentam a juventude:

como uma fase de transitoriedade, a qual considera o jovem como

aquele que não é, mas que virá a ser, sendo suas atitudes um problema

para a sociedade posto que se esse indivíduo ainda não é alguma coisa

não teria preocupação alguma com as vivências atuais que se

restringiriam a experiências passageiras e esquecíveis;

como um grupo reduzido indivíduos causadores de problemas na

sociedade, a qual mobiliza estratégias que visam a superação destes

problemas para que a normalidade e a paz imperem;

sob uma visão romântica, como a fase em que o indivíduo tem seu

momento de liberdade, na qual este pode apresentar qualquer tipo de

comportamento posto que é o momento considerado propício para

ensaiar e errar, o que seria inadmissível na fase adulta.

Carrano(2005) afirma que

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o sentimento de fracasso que acompanha o(a) jovem no que diz

respeito a sua trajetória escolar e profissional representa uma porta

aberta para a frustração, o desanimo e também a possibilidade do

ganho por outras vias, como por exemplo, a da violência (p.197).

O autor ressalta, ainda, que a falta de sucesso nos mais variados âmbitos da

vida do (a) jovem pode representar seu ingresso para o mundo da ilegalidade, da

criminalidade, uma vez que é neste meio que este jovem busca por reconhecimento

social.

Porém, está claro e posto a inexistência de políticas públicas eficazes que

venham promover uma mudança significativa na realidade que cerca e vitimiza os

jovens. Jacobo (2011) afirma que

existe um bom número de estudos e um alto nível de consciência

pública sobre a elevada concentração dos homicídios na população

jovem do país, embora, pelos dados atuais, esse nível de consciência

não tenha sido traduzido ainda em políticas de enfrentamento que

consigam reverter o quadro atual. Pelo contrário, a vitimização juvenil

no país continua crescendo, sendo claro indicador da insuficiência

dessas políticas (p.71).

Da mesma forma, Pais (2005) considera que a ausência de políticas públicas

efetivas, que garantam aos jovens sua inserção no mercado de trabalho como um dos

grandes problemas que afetam a juventude atual, sendo os jovens pobres os mais

atingidos. Para o autor, a falta de oportunidade e acesso a bens culturais que

permitam ao jovem envolver-se em atividades que lhes possibilitem preparo para um

futuro profissional digno, torna esses jovens desiludidos e sem perspectivas.

Desse modo, a escola é colocada nesse cenário como a principal solução para

resolução de problemas sociais, tais como: violência, baixo ou nenhum nível de

escolaridade, desemprego, dentre outros, que dizem respeito ao Estado-nação. Assim,

a crescente inserção desses jovens nas classes de EJA, traz ao universo escolar desafios

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que, por conta das suas especificidades e subjetividades, requerem atenção especial.

Alguns estudiosos, como Fernandes (2009), assinalam certas dificuldades dos jovens e

adultos no ambiente escolar. Para esse autor,

quando os ‘jovenzinhos’ chegam à sala de aula das pessoas jovens e

adultos, encontram um universo diferente daquele que freqüentavam.

Ainda que possam encontrar pessoas de suas idades, precisam

aprender a conviver com pessoas de outras idades, inclusive idosas.

Certamente esses ‘jovenzinhos’ se vêem diante de algumas

dificuldades que impactam, inclusive, a constituição dos seus grupos

de relacionamento, grupos de pertença, dentro desse novo contexto.

Essas dificuldades são decorrentes das diferenças etárias e, por

conseguinte, do próprio universo vocabular utilizado cotidianamente

pelos ‘jovenzinhos’(p 3).

Fernandes (2009) revela ainda que

as expressões que fazem parte do vocabulário da juventude

corroboram com a idéia de que esse mundo não é o seu mundo; não é

aquele o espaço no qual estavam acostumados a transitar e a interagir.

Essas mudanças, que não são desprezíveis, geram sofrimento. Por

conta disso, muitas vezes esses “jovenzinhos” voltam a abandonar o

espaço da escola, criando-se, então, um novo ciclo de idas e vindas

(p.3).

Este distanciamento entre os jovens e a escola, por vezes não é percebido por

muitos professores, outros percebem, entretanto, poucos são aqueles que

reconhecem as suas próprias dificuldades em estabelecer diálogo, em admitir que este

grupo possui particularidades específicas (linguagem, comportamento, vestimentas,

objetivos, dentre outros), em interagir com esses estudantes e, despertar por meio de

estratégias educativas o interesse destes alunos. O conjunto dessas dificuldades pode

gerar conflito entre o docente e os estudantes e, entre os estudantes jovens com seus

colegas estudantes adultos. Nesse contexto, Borghi (2009) destaca que

o crescente processo de pauperização e a massificação do ensino

público, desvinculado de investimentos na qualidade do trabalho

pedagógico, vêm gerando um contingente cada vez maior de Jovens

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com distorção idade/série, ou jovens que, por questões de

sobrevivência; abandonam a escola e mais tarde recorrem à educação

de jovens e adultos, modalidade de ensino historicamente pensada

para o público adulto (p.15).

Desse modo, a escola na sua totalidade é hoje chamada para se adequar às

demandas específicas de outro público: jovens que vêm de processos formativos

diversos, que pensam e aprendem de maneira diferenciada, e precisam se adaptar a

uma nova realidade. Fato este que requer uma compreensão de como jovens e adultos

constroem suas aprendizagens no mesmo contexto escolar e como este processo

educacional interfere na sua formação.

Nesse sentido, Camacho (2004) corrobora ao apontar como possibilidade

resultante desse conjunto de conflitos a falta de identificação dos educandos pela

instituição escolar. Esta se constitui em um desafio a ser superado, considerando que

este pode provocar consequências negativas como, por exemplo, a

desistitucionalização da condição juvenil, e criar obstáculos à construção dos

estudantes da sua identificação com a escola. A autora assinala que

a escola ignora o aluno enquanto um sujeito social e, acima de tudo, o

desconsidera como um jovem que se constitui num sujeito de direitos.

E os jovens alunos demonstram que têm consciência desta realidade

ao expressar um negativismo, uma falta de perspectivas para o futuro

e uma relação burocrática com a escola (p.6).

Assim, acredita que a escola, pela incapacidade de criar uma relação condizente

com os interesses e as expectativas destes alunos, termina por promover rupturas,

muitas vezes irreversíveis, entre a escola e estes jovens. Esta situação pode conduzir à

evasão, ao abandono destes jovens do ambiente escolar.

Esses entraves são criados pela escola e pelos docentes ao não reconhecerem

as especificidades desses sujeitos, ao não permitirem que as culturas juvenis

ultrapassem as portas da escola, o quê consequentemente, dificulta a comunicação

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entre o aluno e a instituição, não colaborando para a construção de identidade dos

educandos. De acordo com Carrano (2007),

as expressões juvenis estão voltadas para a coesão de seus grupos de

referência – aquilo que chamamos por vezes de referências tribais,

códigos, emblemas, valores e representações que dão sentido ao

pertencimento a grupos. A relação dos jovens com seus grupos de

referência provoca choques com os valores das instituições

(especialmente a escola e a família (p.7).

Os jovens procuram transformar os espaços institucionalizados em território

significativos para eles, onde possam ser jovens. Para isso, utilizam-se de marcas

exteriores em seus próprios corpos, tais como tatuagens, bonés, e outros para

demonstrarem quem são. Essas marcas e expressões, não são aceitas pelas escolas nas

suas dependências. Daí decorre conflitos para os quais grande parte das escolas não

está preparada para responder.

Para Pais (2003) essa situação suscita o desinteresse dos jovens pela escola,

uma vez que estes não se reconhecem numa instituição na qual suas culturas não

podem se realizar tampouco podem se fazer presente. A negociação é sempre difícil e

por muitas vezes impossível, se considerarmos que são características das unidades de

ensino a manutenção do controle e da ordem. Da perspectiva deste autor, a escola

apesar de ser um espaço onde o jovem pode gostar de estar presente, ainda não

reconhece as culturas juvenis como possibilidade de inclusão e de transformação.

Diante deste quadro, Dayrell (2007) destaca que para justificar possíveis

fracassos escolares entre os jovens, os professores, os alunos e as suas famílias, vêm se

culpando mutuamente. Para a escola e seus profissionais, o problema está com os

jovens, devido a seu individualismo, irresponsabilidade e falta de interesse nos

estudos. Para os jovens, a escola se mostra distante dos seus interesses, um cotidiano

insignificante, com professores despreparados e desinteressados, que não se

preocupam com suas formações.

Nesse sentido, Dayrell (2007) diz que

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a sala de aula também torna-se um espaço onde é visível a tensão

entre o ser jovem e o ser aluno. Nela ocorre uma complexa trama de

relações de alianças e conflitos entre alunos e entre estes e os

professores, com imposições de normas e estratégias individuais e

coletivas de transgressão. Nesse cotidiano, o jovem aluno vivencia a

ambigüidade entre seguir as regras escolares e cumprir as demandas

exigidas pelos docentes, orientadas pela visão do “bom aluno”, e, ao

mesmo tempo, afirmar a subjetividade juvenil por meio de interações,

posturas e valores que orientam a ação do seu grupo (p. 1121).

Esse autor analisa que para se compreender esta realidade, não se pode

atribuir a culpa aos jovens tampouco aos profissionais da educação. Deve-se sim,

procurar entender o contexto social, cultural e econômico em que este (a) jovem está

inserido, procurando adequar as práticas educacionais a esta nova realidade.

Carvalho (2009) acredita que um dos maiores desafios para a EJA é articular as

relações entre os profissionais envolvidos no trabalho pedagógico e os diferentes

públicos que compõem esta modalidade de ensino, de maneira que haja possibilidades

de educação num mesmo espaço de maneira compartilhada. A autora, ainda, remete-

nos a algumas reflexões que objetivam o sucesso nesta modalidade mesmo em meio

às diversas dificuldades que enfrenta. Tratando-se da juvenilização das classes da EJA,

é interessante repensar como os professores e os alunos envolvidos entendem este

processo, bem como delinear quais práticas pedagógicas tem sido implementadas e, se

estas, de alguma forma atendem às diferenças que ora surgem nesse contexto. Não

obstante, deve-se indagar o que a juventude inserida nas classes de EJA realmente

busca neste tempo e espaço escolar. Há propostas pedagógicas que respondam a estes

anseios? Essa é uma realidade que requer um novo perfil de educador para que as

demandas sejam atendidas? Existem alterações que foram provocadas no cenário da

EJA por conta da convivência de atores tão diferentes dentro de um mesmo espaço?

A autora acredita que ao respondermos essas indagações, dentre outras,

estaremos mais próximos de um fazer pedagógico que atenda, com efeito, a essa nova

demanda do campo educacional.

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3Contexto da pesquisa

A história da institucionalização da EJA no município de Ilhéus tem início no

ano de 2001, quando a então Secretária de Educação Profª Dinalva Melo do

Nascimento forma equipe para início das discussões sobre a matéria, que contava com

representantes da Secretaria de Educação, professores e segmentos da sociedade civil.

A partir dessas discussões foi-se criando instrumentos legais para respaldar a

implantação da EJA no município. O primeiro destes é a Portaria nº 06, de 14 de

novembro de 2001 a qual estabelece as normas e os procedimentos para a

implantação da EJA nas unidades escolares do município de Ilhéus. Porém, é somente

em 2002, por meio da Resolução do CME nº 001, de 11de abril de 2002, publicado no

Diário de Ilhéus em 09 de maio de 2002 que a EJA é efetivamente implantada no

município.

Em seu primeiro ano de vigência a EJA funcionou em oito escolas, apenas com a

1ª Etapa, que compreende os anos iniciais do ensino fundamental, divididas em duas

fases (mais tarde ampliada para três) atendendo um total de 1.816 alunos, distribuídos

em 62 classes. A partir do ano de 2003 a oferta da EJA é estendida para a 2ª Etapa

dividida também em duas fases, correspondentes aos anos finais do ensino

fundamental nas escolas situadas na sede do município e no distrito de Castelo Novo,

sendo esta etapa gradativamente implantada nas escolas do meio rural, conforme a

demanda.

O quadro abaixo possibilita uma melhor visualização de como ficou estruturada

a modalidade da Educação de Jovens e Adultos no município de Ilhéus.

EJA – MUNICÍPIO DE ILHEUS

1ª ETAPA (Séries

FASE I – Alfabetização

FASE II – 1ª e 2ª Séries

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Atualmente a EJA em Ilhéus é ofertada na maioria das escolas do município,

apesar de algumas não oferecerem as duas etapas do ensino (séries iniciais do Ensino

Fundamental e séries finais do ensino Fundamental) no mesmo espaço educativo.

4 Caminho Metodológico

Nosso estudo se inscreve na perspectiva de uma pesquisa de abordagem

quantitativa de caráter exploratório, posto o intuito em empregar “*...+ a linguagem

matemática para descrever, representar ou interpretar *...+” (MINAYO e SANCHES,

1993, p. 241) os resultados da investigação realizada sobre o processo de juvenilização

das classes da EJA na rede de ensino público da cidade de Ilhéus-Bahia.

Nesse caminho investigativo, analisamos os registros documentais (matrícula

inicial) da totalidade das escolas (13) que ofertam a EJA na cidade de Ilhéus, no

período compreendido entre 2002 a 2010. Destas escolas, cinco oferecem a 1ª Etapa

da EJA, seis a 2ª Etapa e duas quais sejam: o CAIC Darcy Ribeiro e a Escola Municipal do

Banco da Vitória, oferecem as duas Etapas. Para a análise dos dados, utilizamos a

iniciais do Ensino

Fundamental)

FASE III – 3ª e 4ª Séries

2ª ETAPA (Séries finais

do Ensino

Fundamental)

FASE I – 5ª e 6ª Séries

FASE II – 7ª e 8ª Séries

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Estatística Descritiva, a qual envolve: a coleta, a apresentação e a caracterização dos

dados por meio de tabelas e gráficos.

5 Apresentando e discutindo os resultados

Encontramos no universo investigado os resultados já apontados por

pesquisadores, como exemplo: Carvalho (2009), Haddad (2007) e Spósito (2003)

dentre outros, no que concerne à existência de grande número de jovens, que cada

vez vêm sendo inseridos mais cedo nas turmas da EJA na rede pública de ensino da

cidade de Ilhéus.

Na Fase I da 1ª Etapa da EJA, que corresponde a alfabetização, no período de

2002 à 2010, temos 3.569 alunos matriculados, dos quais 937 estavam situados na

faixa etária entre 15 a 24 anos, o que corresponde a 26,3% do total dos alunos.

No mesmo período, a Fase II (1ª e 2ª séries do ensino fundamental) desta

etapa, apresenta a mesma realidade, só que em escala maior, já que dos 4.807 alunos

matriculados, observou-se que 1.829 são jovens entre 15 a 24 anos, o que perfaz 38%

do total.

No entanto, na Fase III (3ª e 4ª séries do ensino fundamental), o percentual

identificado, em relação às fases precedentes, apesar de expressivo, diminui para

32,9% dos alunos matriculados compreendidos entre 15 a 24 anos, o que representa

533 dos 1618 alunos matriculados nessa fase. Vale ressaltar que essa fase só passou a

ser oferecida a partir do ano 2007, porém, chama-nos atenção a presença significativa

de alunos jovens nas classes da EJA nestas Fases iniciais.

Podemos notar que durante o período pesquisado (2002 a 2010), na Fase I da

1ª Etapa, os percentuais do quantitativo de jovens na faixa etária entre 15 a 24 anos

matriculados nas classes da EJA, variaram bastante no decorrer dos anos.

Os maiores índices no número de alunos jovens matriculados foram

encontrados na Escola Municipal Herval Soledade e na Escola Municipal do Salobrinho,

com os percentuais de 56,7% em 2002 e 53,5% do mesmo ano, respectivamente.

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Em contrapartida, a escola que apresentou menor presença de alunos jovens

foi o CAIC Darcy Ribeiro, que em 2007 contava com 6,3% de alunos na faixa etária

pesquisada, em relação ao total de matriculados, qual seja 48 alunos e, no ano de 2010

com 3,3% de jovens dos 30 alunos matriculados.

No decorrer de alguns anos letivos, a Fase I da 1ª Etapa não foi oferecida em

algumas escolas, esses anos foram: Escola Heitor Dias nos anos 2008 e 2010; Centro

Comunitário do Iguape no ano 2003; Escola Municipal Herval Soledade no ano de 2010

e Escola Municipal do Salobrinho nos anos 2007, 2009 e 2010.

A Escola Municipal do Banco da Vitória apenas formou turma de EJA na referida

Etapa e Fase em 2010, assim, numa classe com o total de 16 alunos matriculados, tão

somente 3 estudantes estavam na faixa etária compreendida entre 15 a 24 anos, o que

totalizava 18,8% do total de alunos.

Fato interessante a se destacar é que no ano de 2004, na Escola Municipal

Herval Soledade, dos 44 alunos matriculados nas turmas de EJA, a Fase I da 1ª Etapa

não contava com nenhum jovem na faixa etária alvo da pesquisa, assim como na Fase

II da 1ª Etapa dos 56 alunos matriculados nessa Fase, não havia nenhum jovem com

idade entre 15 e 24 anos.

Constatamos certa intermitência na oferta da EJA em algumas escolas, por

exemplo, em 2003 na Fase II da 1ª Etapa, não foram formadas turmas nessa fase no

Centro Comunitário do Iguape, tampouco em 2012 na Escola Heitor Dias e na Escola

Herval Soledade.

A escola que apresentou um maior percentual de jovens na Fase II da 1ª Etapa

foi a Escola Municipal Herval Soledade, com 69,7% de alunos num universo de 89

alunos matriculados, nesta escola no ano de 2002. A que apresentou o menor

percentual na mesma fase foi a Escola Municipal Vovô Isaac em 2008 com 9,1% de

alunos jovens. Isto em comparação com a totalidade das escolas investigadas.

Essa diferença dos valores percentuais é apenas aparente, pois ao analisar os

dados coletados em todas as escolas participantes da pesquisa, percebemos que não

houve grande variação, pois o número de jovens matriculados nesta Fase foi elevado,

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sendo a realidade da Escola Municipal Vovô Isaac no ano 2008, com 9,1%, uma

exceção.

A Fase III da 1ª Etapa foi iniciada no ano 2007 em cinco das escolas que

ofereciam a modalidade, com exceção da Escola Municipal do Salobrinho que iniciou

em 2008 e a Escola Municipal Banco da Vitória em 2010.

No ano de 2010 esta Fase não foi oferecida nas Escolas Municipais Heitor Dias e

Herval Soledade. O maior percentual de alunos jovens matriculados nesta Fase foi de

51,7% no ano de 2008, na escola CAIC Darcy Ribeiro e, o menor foi de 13% no ano de

2009 no Centro Comunitário Dr. Nelson d’Oliveira.

Entretanto, apesar da presença de um grande número de jovens nas classes da

EJA na cidade de Ilhéus, fato que nos parece comum na maioria das escolas do país,

nota-se a partir da análise dos percentuais, em particular nas três Fases da 1ª Etapa,

que existe uma tendência decrescente de matrícula de jovens no decorrer de 2002 a

2010 na maioria das escolas investigadas.

Na 2ª Etapa da EJA nas treze escolas publicas municipais da cidade de Ilhéus no

período de 2002 a 2010, foram matriculados 4.627 alunos na Fase I e 3.733 na Fase II,

destes, o contingente de jovens entre 15 a 24 ultrapassou 50% da matricula total

(Tabela 1).

TABELA 1 Dados referentes às I e II fases da 2ª Etapa, entre o período de 2002 a 2010.

ETAPA

I fase

15 a 24

anos

Total por

turma % II fase

15 a 24

anos

Total por

turma %

2002 0* 0* 0,0 2002 0* 0* 0,0

2003 219 378 57,9 2003 50 132 37,9

2004 295 405 72,8 2004 143 210 68,1

2005 302 552 54,7 2005 207 384 53,9

2006 309 615 50,2 2006 202 419 48,2

2007 311 563 55,2 2007 368 837 44,0

2008 412 678 60,8 2008 292 524 55,7

2009 387 630 61,4 2009 380 624 60,9

2010 466 806 57,8 2010 386 603 64,0

Total 2701 4627 58,4 Total 2028 3733 54,3

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Fonte: Escolas da rede municipal da cidade de Ilhéus.

* Dados não localizados.

Encontramos índices elevados da presença de jovens na EJA na Escola Nucleada

de Castelo Novo, a qual está localizada no meio rural do município de Ilhéus. Nessa

escola, na Fase I da 2ª Etapa no ano de 2004, 87% dos alunos matriculados se

constituiu de jovens com idade entre 15 a 24 anos. A mesma situação foi encontrada

Escola Municipal Temístocles Andrade (meio urbano) que dos 168 alunos matriculados

nessa fase no ano de 2010, 137 são alunos jovens, o que representa 81,5% do total.

Cinco das escolas investigadas iniciaram tão somente em 2003 a oferta da Fase

I da 2ª Etapa. Duas delas, Escola Municipal Themístocles Andrade e a Escola Municipal

Banco da Vitória, também iniciaram neste período a Fase II desta etapa. As outras três:

Escola Municipal Princesa Isabel, Escola Nucleada de Castelo Novo e Escola Municipal

do Salobrinho, iniciaram a oferta desta fase em 2004. No Instituto de Ensino Eusínio

Lavigne teve inicio em 2005; na Escola Municipal do Pontal ofertou somente a Fase I

em 2006 e a Fase II no ano seguinte; na Escola Municipal Paulo Freire em 2006 com a

Fase I e a Fase II em 2008. A Escola CAIC Darcy Ribeiro apenas começou a atender essa

população em 2010 nas duas fases dessa Etapa.

Identificamos que na Fase II da 2ª Etapa, os percentuais são expressivos quanto

à presença dos jovens nas classes da EJA, o que nos leva a inferir que aqueles e aquelas

estudantes que realizaram a Fase I e II da 1ª Etapa, prosseguiram seus estudos ao

ingressarem nesta fase.

Observamos que nas escolas localizadas nos bairros mais afastados do centro,

principalmente na 1ª Etapa da EJA, há redução do número de jovens matriculados

entre os anos de 2002 à 2010 (Gráfico 1). Nesse contexto, na Escola Municipal Herval

Soledade, localizada no Banco da Vitória, bairro que dista 8,7 quilômetros da área

urbana da cidade de Ilhéus, a qual atende expressiva população oriunda do meio rural,

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em 2002, 69,7% dos 89 alunos matriculados na Fase II da 1ª Etapa era de jovens na

faixa etária compreendida entre 15 a 24 anos, no entanto em 2009, este percentual

diminuiu para 37,5% de alunos jovens matriculados nessa mesma fase.

Gráfico 1 – Número absoluto de alunos entre 15 à 24 anos em relação ao total de

matriculados

Fonte: Secretaria da própria escola.

Verificamos também que enquanto essa queda ocorre, de forma significativa,

na 1ª Etapa da EJA em quase todas as escolas da rede, na 2ª Etapa o decréscimo é

inexpressivo, como podemos identificar (Tabela 2), por exemplo, na Escola Municipal

Themístocles Andrade, situada no bairro Teotônio Vilela, periferia da cidade de Ilhéus.

TABELA 2 Dados referentes as I e II fases da 2ª Etapa, entre o período de 2002 a 2010.

ESCOLA MUNICIPAL THEMÍSTOCLES ANDRADE

2ª ETAPA

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I fase 15 a 24 anos Total por turma %

2002 0* 0* 0,0

2003 46 100 46,0

2004 0* 0* 0,0

2005 49 153 32,0

2006 64 136 47,1

2007 60 157 38,2

2008 125 181 69,1

2009 165 208 79,3

2010 137 168 81,5

Total 646 1103 58,6

II fase 15 a 16 anos Total por turma %

2002 0* 0* 0,0

2003 31 82 37,8

2004 0* 0* 0,0

2005 16 47 34,0

2006 21 94 22,3

2007 26 84 31,0

2008 27 90 30,0

2009 129 195 66,2

2010 109 160 68,1

Total 359 752 47,7

Fonte: Dados coletados na Secretaria da escola

*Os dados não foram localizados na Escola.

Nesta escola o número de jovens matriculados nas duas fases da 2ª Etapa

apresenta uma tendência crescente. No ano de 2003 quando foi iniciada a oferta da

EJA nessa escola, na Fase I desta etapa, o percentual de jovens era de 46% dos 100

alunos matriculados, já em 2010 este percentual cresceu para 81,5% dos 168 alunos

matriculados. Nos mesmos períodos a Fase II apresenta percentuais de 37,8% e 68,1%,

respectivamente, de jovens matriculados em relação ao total dos alunos de idades

diversas, o que demonstra um aumento significativo no número de jovens na faixa

etária de 15 a 24 anos nesta modalidade de ensino.

Tecendo algumas considerações

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A partir dos resultados da pesquisa realizada na rede pública de ensino

municipal em Ilhéus-Bahia, constatamos que as escolas pertencentes a essa rede

vivenciaram o processo de juvenilização nas classes de EJA. Embora tenhamos notado

que em algumas unidades escolares e em determinados períodos, tenha ocorrido um

decréscimo na matricula de jovens na Fase I da 1ª Etapa. Por exemplo, o Centro

Comunitário Dr. Nelson D’Oliveira, que no ano de 2003 matriculou nesta fase 51,5% de

jovens do total de 31 alunos, verificou-se a redução desse percentual em 2010, quando

tão somente 6,5% dos 31 alunos matriculados eram jovens na faixa etária de 15 a 24

anos.

Na análise empreendida diante do processo de juvenilização das classes de EJA,

observamos uma tendência decrescente no decorrer dos anos, da matricula de alunos

jovens na 1ª Etapa da EJA. Tal constatação nos conduz a inquirir: Onde estão os jovens

que ora se encontram fora da escola? Será que continuaram seus estudos? Estas

questões são pertinentes ao verificarmos que mais de 12% do total de analfabetos do

Brasil (14,1 milhões) segundo o PNAD/IBGE (2010), está na Bahia: 1,8 milhão de

baianos com 15 anos ou mais não sabem ler e escrever, o que corresponde a 16,7% da

população do Estado nesta faixa etária.

Em Ilhéus, constata-se que 12,5% da população ilheense com 15 anos ou mais

não sabe ler e escrever como aponta o último censo, sendo 3% da população total

jovens entre 15 e 24 anos. Isto significa que devido o baixo grau de escolaridade, esses

jovens terão dificuldades relevantes de inserção no mercado formal de trabalho.

Nesse cenário nacional e regional (Ilhéus), nota-se a ausência de políticas

públicas eficazes que atendam de forma qualitativa a essa população. Dessa forma é

preciso sublinhar que a oferta de programas, por seu caráter fragmentado e

descontínuo, não conduzem à emancipação do sujeito, tampouco ao desenvolvimento

da sua consciência crítica de modo que este possa adquirir as ferramentas necessárias

para exercer plenamente a sua cidadania a fim de provocar rupturas com certos ciclos

de pobreza.

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A escola nesse contexto, palco privilegiado de promoção de transformações,

precisa, a partir dos seus “novos atores” jovens, reformular o currículo, as estratégias

metodológicas, a gestão, e principalmente refletir sobre o exercício da docência. A

escola que ainda temos não está e não foi preparada para atuar com a população

adulta e tampouco agora com os jovens, que estão a construir outro perfil da EJA,

jovens que passam a exigir novas demandas da escola. Esses elementos que não

podem ser analisados de forma isolada convergem e se encontram para reforçar o

discurso de que a escola pública não serve, que é ineficaz.

Nesse contexto complexo, a escola é alvo novamente da tentativa do Estado

em se desresponsabilizar das suas funções, quais sejam aquelas de prover os recursos

necessários para o desenvolvimento de uma educação de qualidade e, em consonância

com o que está estabelecido na Constituição Federal da República do Brasil de 1988,

no seu Art 208 o qual preconiza que a “oferta de ensino noturno regular, adequado às

condições do educando” (Inciso VI). Nesse sentido, consideramos que a Constituição

avança quando oportuniza as pessoas que não realizaram, não concluíram o processo

de escolarização em idade “adequada” em dar continuidade aos seus estudos, porém,

por outro lado esse mesmo Estado que oportuniza não proporciona as condições

objetivas e efetivas para que isso se realize.

Outrossim, para além do caráter compensatório dado em forma da lei, as

escolas ofertam somente em classes noturnas a educação para pessoas jovens e,

vincula o processo de escolarização ao trabalho, quando ofertam a essas pessoas

programas profissionalizantes. Reitera, assim, que a educação para as camadas

populares é aquela que tem como objetivo fulcral responder as demandas

provenientes do mercado. O processo de humanização, de transformação por meio do

desenvolvimento da consciência crítica, da reflexão sobre seu estar e viver no mundo

passa ao largo dessas propostas. A escola pública, a educação para os jovens é aquela

que profissionaliza, eixo central desse paradigma reprodutivista.

Os resultados da nossa pesquisa apontam para a necessidade da escola se abrir

ao atendimento das reais necessidades dos jovens na atualidade e, para o bem das

futuras gerações, esta deve ser ressignificada, deve ultrapassar a perspectiva de

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inclusão, compreendida como assistencialismo, reposição, resgate, improvisação.

Nesse sentido, a estrutura e o funcionamento da educação dos jovens nas classes da

EJA, na cidade de Ilhéus não estão distante do que acontece no cenário nacional.

Portanto, é preciso refletir sobre as especificidades exigidas por esses jovens, para que

se possa garantir efetivamente uma educação de qualidade, que os permitam ampliar

a capacidade de desenvolver competências requeridas para atuarem no mundo de

forma crítica, autônoma e responsável.

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