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Universidade Presbiteriana Mackenzie 1 AS ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS SOB A ÓTICA DO DIREITO Klariene Andrielly Araujo (IC) e Washington Carlos de Almeida (Orientador) Apoio: PIVIC Mackenzie Resumo As organizações religiosas estão baseadas, em primeiro lugar, na autonomia da vontade, e, por conseguinte, na liberdade de organização religiosa. Juntas, elas possibilitam a livre escolha dos indivíduos em seguir ou não uma determinada religião, bem como a livre manifestação de fé e crença por parte daqueles que a seguem, independente de qual seja. Assim, assegurada a liberdade individual de ter ou não uma religião, o ordenamento jurídico brasileiro também garante às entidades religiosas a possibilidade de se organizarem livremente, por meio da liberdade de criação, de auto- ordenação ou auto-regulamentação, de estruturação interna e de funcionamento sem qualquer interferência do poder público. No caso, tem-se que somente através dessas liberdades é que os grupos religiosos verdadeiramente podem exercer suas crenças e rituais sem qualquer impedimento. Desse modo, é possível constatar que a religião, analisada sob a perspectiva das instituições que dela decorrem, possui diversos aspectos que repercutem diretamente no mundo jurídico, os quais são bastante peculiares, se comparados as demais pessoas jurídicas de direito privado. Portanto, o presente trabalho visa apresentar alguns desses aspectos, que não são plenamente desenvolvidos pelos doutrinadores do Direito, analisando os elementos essenciais de uma organização juridicamente estruturada e demonstrando o quão importante são para que a liberdade religiosa seja efetivamente aplicada no Brasil. Palavras-chave: Direito, religião, liberdades Abstract Religious organizations are based, firstly, on the autonomy of the will, and therefore on the freedom of religious organization. Together, they enable the free choice of individuals to follow a given religion or not, and the free expression of faith and belief by those who follow it, no matter what. Thus, guaranteed individual freedom to have or not a religion, the Brazilian legal system also gives religious organizations the ability to organize themselves freely, through the creative freedom, self-ordering or self-regulation, internal structure and operation without any interference from the government. In this case, it follows that only through these freedoms is that religious groups can truly exercise their beliefs and rituals without any hindrance. Thus, it is clear that religion, analyzed from the perspective of the institutions under it, has several aspects that directly affect the legal world, which are quite unique when compared to other legal entities under private law. Therefore, this paper presents some aspects that are not fully developed by scholars of law; analyzing the essential elements of a legally structured organization and demonstrating how important that religious freedom is effectively applied in Brazil. Key-words: Law, religion, freedoms

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AS ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS SOB A ÓTICA DO DIREITO

Klariene Andrielly Araujo (IC) e Washington Carlos de Almeida (Orientador)

Apoio: PIVIC Mackenzie

Resumo

As organizações religiosas estão baseadas, em primeiro lugar, na autonomia da vontade, e, por conseguinte, na liberdade de organização religiosa. Juntas, elas possibilitam a livre escolha dos indivíduos em seguir ou não uma determinada religião, bem como a livre manifestação de fé e crença por parte daqueles que a seguem, independente de qual seja. Assim, assegurada a liberdade individual de ter ou não uma religião, o ordenamento jurídico brasileiro também garante às entidades religiosas a possibilidade de se organizarem livremente, por meio da liberdade de criação, de auto-ordenação ou auto-regulamentação, de estruturação interna e de funcionamento sem qualquer interferência do poder público. No caso, tem-se que somente através dessas liberdades é que os grupos religiosos verdadeiramente podem exercer suas crenças e rituais sem qualquer impedimento. Desse modo, é possível constatar que a religião, analisada sob a perspectiva das instituições que dela decorrem, possui diversos aspectos que repercutem diretamente no mundo jurídico, os quais são bastante peculiares, se comparados as demais pessoas jurídicas de direito privado. Portanto, o presente trabalho visa apresentar alguns desses aspectos, que não são plenamente desenvolvidos pelos doutrinadores do Direito, analisando os elementos essenciais de uma organização juridicamente estruturada e demonstrando o quão importante são para que a liberdade religiosa seja efetivamente aplicada no Brasil.

Palavras-chave: Direito, religião, liberdades

Abstract

Religious organizations are based, firstly, on the autonomy of the will, and therefore on the freedom of religious organization. Together, they enable the free choice of individuals to follow a given religion or not, and the free expression of faith and belief by those who follow it, no matter what. Thus, guaranteed individual freedom to have or not a religion, the Brazilian legal system also gives religious organizations the ability to organize themselves freely, through the creative freedom, self-ordering or self-regulation, internal structure and operation without any interference from the government. In this case, it follows that only through these freedoms is that religious groups can truly exercise their beliefs and rituals without any hindrance. Thus, it is clear that religion, analyzed from the perspective of the institutions under it, has several aspects that directly affect the legal world, which are quite unique when compared to other legal entities under private law. Therefore, this paper presents some aspects that are not fully developed by scholars of law; analyzing the essential elements of a legally structured organization and demonstrating how important that religious freedom is effectively applied in Brazil.

Key-words: Law, religion, freedoms

VII Jornada de Iniciação Científica - 2011

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INTRODUÇÃO

As organizações religiosas se fundamentam na autonomia da vontade quanto à religião,

pois é ela que possibilita aos indivíduos se agruparem para a livre manifestação de fé e

crença, resguardando o direito de cultuar o que bem entenderem, e da mesma forma, a

possibilidade de se organizarem. Assim, ao permitir que as pessoas ajam conforme suas

próprias determinações, a liberdade garante a formação das instituições religiosas, bem

como lhes assegura alguns direitos.

Ao discorrer acerca da liberdade, o filósofo Norberto Bobbio apontou duas perspectivas em

que ela pode ser analisada: a positiva e a negativa (BOBBIO,1997 apud JUNIOR, 2007).

Considerada a relevância da liberdade para a religião, a positiva é a que envolve a

capacidade de autodeterminação, exemplificada na livre escolha da religião pelo indivíduo;

já a negativa, subdividida em ausência de impedimento e de constrangimento, é a que

permite constatar que sem essa liberdade os adeptos poderiam ser impedidos de realizar

seus ritos e cerimoniais, ou mesmo, obrigados a fazer algo contrário a sua crença.

Analisada com mais profundidade, a liberdade religiosa envolve outras três liberdades: de

crença, de culto e de organização religiosa. Abarca, portanto, todo o fenômeno religioso,

uma vez que envolve não só a escolha do indivíduo quanto a sua religião, mas também, a

livre manifestação de sua crença e a possibilidade de se agrupar com pessoas que

professem a mesma fé.

A presente pesquisa tem como objetivo investigar esse agrupamento de pessoas sob prisma

jurídico, razão pela qual a análise recairá, sobretudo, na terceira modalidade entre as que

foram mencionadas acima. Esta, por sua vez, é a que possibilita a livre criação,

regulamentação, estruturação e funcionamento dos grupos religiosos juridicamente

organizados. Assim, tem-se que o trabalho em questão, visa abordar esses quatro aspectos

das organizações religiosas, bem como identificar os elementos jurídicos essenciais que

possuem, traçando um paralelo com a importância deles para a plena aplicação da

liberdade religiosa.

REFERENCIAL TEÓRICO

Norberto Bobbio conceitua liberdade sob as perspectivas positiva e negativa,

compreendendo, de um lado a ausência de constrangimento e impedimento, e de outro, a

autonomia da vontade. (BOBBIO,1997 apud JUNIOR, 2007). De Plácido e Silva, afirma que a

liberdade exprime a faculdade de fazer ou não fazer, de acordo com a livre determinação

dos indivíduos, mas ressalta o respeito às regras e aos princípios instituídos. (SILVA, 1987

apud SORIANO, 2002).

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Em relação à liberdade religiosa, José Afonso da Silva (2008) a define como um direito

complexo que envolve a liberdade de crença, de culto e de organização religiosa. Aldir

Guedes Soriano (2002), por sua vez, para acrescentar o direito de não ter religião, inclui

nessas três espécies a liberdade de consciência.

Quanto à liberdade de organização religiosa, esta corresponde ao foco central dessa

pesquisa, uma vez que os aspectos jurídicos de tais organizações podem ser plenamente

desenvolvidos a partir dela. Nesse caso, Aloisio Cristovam dos Santos Junior (2007) a

analisa plenamente quando discorre acerca da livre criação, auto-ordenação ou auto-

regulamentação, estruturação e funcionamento das entidades religiosas.

MÉTODO

A investigação cientifica precisa de um conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos

para obter os resultados pretendidos. Assim, método é o que corresponde à linha de

raciocínio adotada durante a pesquisa. No caso, tem-se que a abordagem utilizada foi,

basicamente, a qualitativa, abordando o objeto sem a efetiva preocupação em medir os

dados coletados. O método de abordagem foi o dedutivo, uma vez que a concepção teórica

desenvolvida partiu de conceitos gerais do direito, como a própria liberdade, para depois

analisá-los dentro das organizações religiosas. Em outras palavras, partindo do conceito

geral de liberdade, foi examinada especificamente a liberdade religiosa, e por conseguinte, a

liberdade de organização religiosa, alcançando a livre criação, regulamentação, estruturação

e funcionamento das entidades que dela decorre. Quanto aos métodos de procedimento

empregados, foram utilizados: 1) o histórico, porquanto alguns acontecimentos do passado

foram analisados, para verificar o momento em que o princípio da separação entre Estado e

Igreja foi instituído; 2) o comparativo, para distinguir as diferentes liberdades que garantem o

direito de religião; 3) o monográfico, visto que o tema é examinado profundamente,

principalmente no que tange aos aspectos jurídicos; 4) e o estatístico, ao mencionar o

número de católicos no país, constando a grande influência do catolicismo no Brasil.

Sobretudo, baseada na leitura, análise e interpretação de livros, informações veiculadas

pela imprensa, artigos científicos, legislação e jurisprudência, a modalidade da pesquisa foi

a bibliográfica, uma vez que avalia as diversas contribuições acerca do tema e contribui para

o desenvolvimento de novas perspectivas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As entidades religiosas estão alicerçadas no que se pode chamar de liberdade de

organização religiosa. Esta, por sua vez, é considerada uma espécie da liberdade religiosa

propriamente dita, que, consagrada na Constituição Federal entre os direitos fundamentais,

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garante autonomia da vontade quanto à religião, possibilitando aos indivíduos escolher qual

aderir, ou até mesmo optar por não seguir nenhuma.

Segundo De Plácido e Silva, o vocábulo liberdade indica a condição de livre ou estado de

livre, que permite às pessoas agirem segundo suas próprias determinações, respeitadas as

regras legais instituídas.

A liberdade, pois exprime a faculdade de se fazer ou não fazer o que se quer, de pensar como se entende, de ir e vir a qualquer atividade, tudo conforme a livre determinação da pessoa, quando não haja regra proibitiva para a prática do ato, ou não se institua princípio restritivo ao exercício da atividade. (SILVA, 1987 apud SORIANO, 2002).

Ao definir o conceito de liberdade, Norberto Bobbio o analisa sob duas perspectivas: a

positiva e a negativa. A liberdade negativa compreende a possibilidade de fazer, por meio

da ausência de impedimento, bem como a possibilidade de não fazer, através da ausência

de constrangimento. Por outro lado, a liberdade positiva é a que se identifica com a

autodeterminação ou autonomia da vontade do indivíduo de fazer.

(...) por liberdade negativa, na linguagem política, entende-se a situação na qual um sujeito tem a possibilidade de agir sem ser impedido, ou de agir sem ser obrigado, por outros sujeitos. (...) Por liberdade positiva, entende-se – na linguagem política – a situação na qual um sujeito tem a possibilidade de orientar seu próprio querer no sentido de uma finalidade, de tomar decisões, sem ser determinado pelo querer dos outros. (BOBBIO,1997 apud JUNIOR, 2007).

No que tange à liberdade religiosa, tais perspectivas tomam proporções interessantes, pois

não há como se falar em livre escolha da religião sem a capacidade de auto determinar-se,

tampouco em livre manifestação da crença, quando a pessoa é impedida de realizar os ritos

e cerimoniais religiosos, ou é obrigada a fazer algo contrário a sua fé.

De acordo com o constitucionalista José Afonso da Silva (2008), a liberdade supracitada

representa um direito complexo, envolvendo outras três liberdades: a de crença, de culto e

de organização religiosa. A primeira compreende o direito de escolher e mudar de religião, e

abrange a possibilidade de não aderir a religião alguma. Aldir Guedes Soriano (2002), ao

defini-la, a distingue da liberdade de consciência, justamente para abarcar o direito de não

se ter religião. Nesse sentido Pontes de Miranda fez o seguinte comentário à Constituição

de 1946:

A liberdade de consciência e a de crença são inconfundíveis. O descrente também tem liberdade de consciência e pode pedir que se tutele, juridicamente, tal direito. Bem assim, a liberdade de pensamento, que nem sempre é tangencial com a de consciência. (MIRANDA, 1946 apud SORIANO, 2002).

No caso da liberdade de culto, o modo em que este se apresenta pode ser individual ou

coletivo, uma vez que envolve, não só os atos de devoção praticados em público, mas

também, aqueles que o indivíduo pratica sozinho. Contudo, é importante ressaltar que o

culto coletivo não é sinônimo de público, assim como o individual não é de privado. Quando

alguém age conforme sua fé à vista de outras pessoas, o culto é individual, porém público.

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Da mesma forma, quando um grupo religioso realiza atos restritos às pessoas que dele

fazem parte, o culto é coletivo, mas privado. De qualquer modo, é essa liberdade que

permite aos adeptos de uma religião exteriorizar sua crença, por meio de ritos, cerimoniais e

quaisquer outras manifestações de cunho religioso.

Por fim, a liberdade de organização religiosa, como o próprio nome já diz, é a que possibilita

às entidades religiosas se organizarem. O bem jurídico tutelado, portanto, consiste no direito

delas estabelecerem o modo de constituição e funcionamento. Diante dessa autonomia, é

interessante destacar que a religião costuma sacralizar o modo que se organiza, razão pela

qual o seu cerceamento pode, também, restringir a liberdade de crença. A Igreja Católica

Romana, por exemplo, baseia-se na crença de que São Pedro foi o primeiro papa para

assegurar a autoridade do Sumo Pontífice, o que envolve fé religiosa e administração

hierárquica. Assim, caso o poder do papa sobre as igrejas católicas seja cerceado, o

ocorrido atinge não só a hierarquia estabelecida, mas da mesma maneira, a fé dos católicos

quanto a essa incumbência, que segundo a interpretação deles, foi determinada pelo próprio

Jesus na passagem de Mateus 16: 13-18 da Bíblia.

Jesus foi para a região que fica perto da cidade de Cesaréia de Filipe. Ali perguntou aos discípulos:

- Quem o povo diz que o Filho do Homem é?

Eles responderam:

- Alguns dizem que o senhor é João Batista; outros, que é Elias; e outros que é Jeremias ou algum outro profeta.

- E vocês? Quem dizem que eu sou? – perguntou Jesus.

Simão Pedro respondeu:

O senhor é o Messias, o Filho do Deus vido.

Jesus afirmou:

Simão, filho de João, você é feliz porque esta verdade não foirevelada a você por nenhum ser humano, mas veio diretamente do meu Pai, que esá no céu. Portanto, eu lhe digo: você é Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha igreja, e nem a morte poderá vencê-la. (BÍBLIA SAGRADA, 2000, grifo nosso).

Outro assunto relevante acerca da liberdade em questão está relacionada à separação entre

Estado e Igreja. O Brasil é considerado um Estado laico, porém permeado pela neutralidade

religiosa e marcado por sua benevolência à religião e às igrejas.

Em geral, as pessoas não têm uma real compreensão da laicidade em todos os seus

contornos. Não basta dizer que Estado laico é aquele que adota o princípio da separação e

não possui uma religião oficial. Aliás, a laicidade também não se confunde com anti-

religiosidade, pois o Estado não está imune às influências que a religião pode exercer na

sociedade. Portanto, é considerado laico aquele que não privilegia qualquer religião em

particular, bem como não se utiliza de critérios religiosos para determinar sua política.

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Pode-se dizer que a laicidade possui variações conforme as peculiaridades de cada

ordenamento jurídico. Segundo Aloisio Cristovam Santos Junior (2007), ressalvados os

direitos nacionais que adotam oficialmente uma ideologia ateísta ou anti-religiosa, isto é, que

são verdadeiros exemplos de totalitarismo político, e não de Estado laico, há dois modelos

básicos de laicidade estatal: o que limita a religião ao foro íntimo das pessoas, afastando-a

do espaço público; e o que a vê como elemento de integração social, inclusive, incentivando

as expressões de religiosidade em público. É o caso, por exemplo, do estabelecimento de

capelanias em corporações estatais.

Diante dessa questão, a secularização, entendida como processo em que a Igreja perdeu

sua influência na sociedade, é o que possibilita gradações desses dois modelos, visto que

ela não se apresenta da mesma forma nos diversos Estados, ou seja, cada um tem suas

particularidades e pode demorar um pouco mais para desenvolvê-la. Todavia, ainda assim

esse processo não deve ser considerado algo ruim, pois ele não implica, necessariamente,

no declínio do fenômeno religioso.

[...] como evento histórico tangível, a secularização significa apenas a separação entre Igreja e Estado, entre religião e política; e isto do ponto de vista religioso, implica em retorno à antiga atitude cristã de dar “a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, e não uma perda de fé e transcendência ou um novo e enfático interesse nas coisas deste mundo. (ARENDT, 2001 apud JUNIOR, 2007).

No entanto, cumpre ressaltar, que o princípio da separação não pode ser atribuído tão

somente a esse processo de secularização. Em alguns países, os movimentos sociais e

políticos e até as religiões que não possuíam plenos direitos, contribuíram sobremaneira

para o estabelecimento do Estado laico, e, por conseguinte, do princípio em comento, o qual

afasta a intervenção estatal da religião e proibi a interferência desta na política, atendendo

os interesses de ambos os lados.

Com efeito, o Brasil tornou-se um país laico a partir do Decreto n.º 119-A, de 7 de janeiro de

1890, que proibiu a intervenção da autoridade federal e dos Estados federados em matéria

religiosa, consagrou a liberdade de cultos, extinguiu o padroado e estabeleceu outras

providências, a fim de instituir o princípio da separação. Redigido por Ruy Barbosa, o

decreto foi recepcionado pela Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de

24 de fevereiro de 1891, e desde então, o princípio restou consagrado no ordenamento

jurídico brasileiro. (BRASIL. Decreto n.º119-A, 1890).

Contudo, é importante destacar a influência católica na história brasileira, a ponto da

Constituição de 1824 instituir a Religião Católica Apostólica Romana como Religião do

Estado. E, apesar das últimas pesquisas apontarem uma significativa queda no número de

católicos no país, segundo a pesquisa Datafolha de março de 2010, mencionada na no texto

“Religiões no Brasil” da enciclopédia livre Wikipédia, o Brasil ainda é predominantemente

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católico, com 61% de seguidores. Verifica-se, portanto, que o modelo da aconfessionalidade

adotado no país é mais receptível às manifestações religiosas. Nesse sentido, basta

examinar o preâmbulo da atual Constituição para notar a benevolência à religião e às

igrejas. (WIKIPÉDIA, 2011).

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (BRASIL. Constituição, 1988, grifo nosso).

Muito se discutiu acerca da natureza jurídica de tal preâmbulo, porquanto alguns

doutrinadores o colocam acima das normas infraconstitucionais. Porém, ao julgar a Ação

Direta de Inconstitucionalidade n.º 2.076, proposta pelo Partido Social Liberal, justamente

para discutir a omissão da expressão “sob a proteção de Deus” no preâmbulo da

Constituição Estadual do Acre, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que o

texto preliminar das constituições não tem relevância jurídica, e sim, política, por refletir a

posição ideológica do legislador. Entendeu-se, desse modo, que o preâmbulo da

Constituição Federal não constitui norma central, e que a expressão omissa não possui

força normativa, razão pela qual não se trata de norma de reprodução obrigatória na

Constituição dos Estados-membros.

EMENTA: CONSTITUCIONAL. CONSTITUIÇÃO: PREÂMBULO. NORMAS CENTRAIS. Constituição do Acre.

I - Normas centrais da Constituição Federal: essas normas são de reprodução obrigatória na Constituição do Estado-membro, mesmo porque, reproduzidas, ou não, incidirão sobre a ordem local. Reclamações 370-MT e 383-SP (RTJ 147/404).

II. - Preâmbulo da Constituição: não constitui norma central. Invocação da proteção de Deus: não se trata de norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa.

III. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

(STF, ADI 2076/AC – ACRE, Ação Direta de Constitucionalidade, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, julgada em 15.08.2002, DJ 08.08.2003).

De qualquer modo, segundo Aloisio Cristovam dos Santos (2007), “a invocação da proteção

divina não é destituída de significado”, pois revela que a fé religiosa é respeitada e

valorizada no Brasil, demonstrando certa simpatia pela religião, sem contrariar o princípio da

separação, visto que a Constituição é de todos e não distingue teístas, deístas, agnósticos e

ateus. Nas palavras do Ministro Carlos Velloso, relator da ADI anteriormente mencionada:

Essa invocação, todavia, posta no preâmbulo da Constituição Federal, reflete, simplesmente, um sentimento deísta e religiosa, que não se encontra inscrito na Constituição, mesmo porque o Estado brasileiro é laico, consagrando a Constituição a liberdade de consciência e de crença (C.F., art. 5º), certo que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política (C.F., art. 5º, VIII). (VELLOSO, 2002).

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De igual modo, é o que Manuel Gonçalves Ferreira Filho constata ao fazer um panorama da

Constituição:

Esta Constituição segue em princípio o modelo da separação, mas a neutralidade que configura é uma “neutralidade” benevolente, simpática à religião e às igrejas. é o que decorre das normas adiante assinaladas:

1) A Constituição não é atéia. Invoca no Preâmbulo o nome de Deus (o que já fazia a Constituição de 1934), pedindo-lhe a proteção.

2) Aceita como absoluta a liberdade de crença (art. 5º, VI).

3) Consagra a separação entre Igreja e Estado (art. 19, I).

4) Admite, porém, a colaboração de interesse público” (art. 19, I, in fine).

5) Permite a “escusa de consciência”, aceitando que brasileiro se recuse, por motivos de crença, a cumprir obrigação a todos imposta (art. 5º, VIII), desde que aceite obrigação alternativa. (Caso não o faça, ocorrerá a perda dos direitos políticos – arts.5º, VIII, e 15, IV).

6) Assegura a liberdade de culto (art. 5º, VI) (subentendida a limitação em razão da ordem pública).

7) Garante a “proteção dos locais de culto e liturgia”, mas na forma da lei.

8) Favorece as igrejas, assegurando-lhes a imunidade quanto a impostos incidentes sobre seus “templos” (art. 150, VI, b). entretanto, como aplica o art. 150, §4º, esta imunidade abrange “o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as (suas) finalidades essenciais”. (FILHO, 2002).

A partir dessa análise, tem-se que a liberdade religiosa é amplamente acolhida pelo texto

constitucional, inclusive a liberdade de organização religiosa, melhor compreendida pela

leitura do artigo 5º, inciso VI, combinado com o artigo 19, inciso I, da Constituição Federal.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; (BRASIL. Constituição,1988, grifo nosso).

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; (BRASIL. Constituição,1988, grifo nosso).

Em conjunto, esses artigos asseguram, não apenas a liberdade relativa à expressão de fé

individual e coletiva, mas também, a que garante o funcionamento dos cultos religiosos ou

igrejas. Em outras palavras, fica claro que a Constituição abrange não só as liberdades de

crença e de culto, outrossim, abarca a liberdade de organização religiosa, diante da

possibilidade das entidades se organizarem livremente, sem a interferência do Estado.

É importante fazer algumas ponderações acerca de duas expressões dos textos

supracitados, porquanto podem causar interpretações equivocadas. São elas “cultos

religiosos” e “na forma da lei”.

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No artigo 5º, inciso VI, da Carta Magna, a primeira expressão refere-se às manifestações de

adoração dos fiéis, no entanto, no artigo 19, inciso I, ela adquire o sentido de organização

religiosa que não se identifica como igreja, visto que este termo de origem grega (Εκκλησία,

ekklesia) passou a ter relação direta com a religião cristã. Nesse caso, a expressão foi

utilizada para que todas as entidades religiosas estivessem compreendidas pelo preceito

constitucional. A título de curiosidade, Eclésia, na verdade, era a assembléia popular da

democracia ateniense, aberta a todos os cidadãos homens com mais de dezoito anos, e

somente adquirindo o sentido do que hoje é conhecido como “igreja” a partir do

Cristianismo.

Quanto à segunda expressão, ela não está relacionada com a vedação da interferência

estatal, e sim, com a possível colaboração de interesse público, ou seja, o Estado pode

colaborar com as instituições religiosas, mas para isso necessita de regulamentação legal,

de modo a impedir desvios e impor limites. Nesse sentido, Manuel Gonçalves Ferreira Filho

afirma:

a lei regulamentar deverá editar normas que impeçam desvios na aplicação de auxílios, bem como seus limites, a fim de impedir seja comprometida a separação. (FILHO, 1997 apud JUNIOR, 2007).

Compreendida a dimensão da liberdade, principalmente no que tange à religião e a sua

inserção no ordenamento jurídico brasileiro, é relevante estudar os contornos da liberdade

de organização religiosa em si, para dessa forma, analisar as organizações propriamente

ditas. Nesse caso, tem-se que o §1º do artigo 44 do Código Civil fornece quatro aspectos

que indicam o processo pela qual uma entidade religiosa passa: criação, organização,

estruturação interna e funcionamento.

Art. 44, § 1o São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento. (BRASIL. Código Civil, 2002).

Em relação à livre criação, entende-se que o poder público não pode impedir que um grupo

de pessoas crie uma organização com finalidade religiosa. Quanto à livre organização, tal

expressão, segundo Aloisio Cristovam dos Santos Junior (2007), denota a idéia de ordenar,

remetendo-se ao poder de auto-ordenação ou auto-regulamentação, isto é, da capacidade

que as entidades religiosas têm de estabelecer livremente o próprio ordenamento jurídico.A

estruturação interna, por sua vez, também se relaciona com as normas instituídas pelas

organizações religiosas, contudo esta relação envolve a aplicação e execução delas, e não

a instituição, a qual fica a cargo do poder de auto-ordenação ou auto-regulamentação. Por

último, em relação ao livre funcionamento, este corresponde às próprias atividades

realizadas, uma vez que a organização é criada, organizada e estruturada, justamente, para

desempenhá-las de acordo com a fé pregada.

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Ademais, é importante ressalvar que, embora a livre criação, organização, estruturação e

funcionamento das entidades sejam etapas no processo de formação das organizações

religiosas, esses aspectos são, sobretudo, liberdades que possibilitam o reconhecimento de

diversos direitos para as instituições de cunho religioso.

Tais liberdades, como é fácil notar, trazem consigo o reconhecimento de diversos direitos às organizações religiosas, entre os quais podemos citar o direito à fixação dos requisitos exigidos para a inclusão, permanência e desligamento de seus membros, o direito à livre estipulação da sua form ‘a de governo, o direito à livre ordenação de seus ministros e o direito à livre estipulação do modo como serão sustentadas financeiramente. (JUNIOR, 2007, grifo do autor).

Liberdade de criação

A liberdade em questão permite que as organizações religiosas se formem sem qualquer

interferência do Estado, inclusive no modo de criação, ou seja, elas podem ser criadas a

partir da reunião de pessoas que professam a mesma fé em razão do desmembramento de

um grupo, ou até mesmo, da fusão de organizações que já existiam. Porém, uma indagação

difícil de responder diz respeito ao momento que essas organizações adquirem existência

jurídica.

É plenamente possível afirmar que uma organização religiosa existe antes mesmo que

assim seja reconhecida, por meio do registro, visto que ela não necessita de qualquer

permissão para existir. Desse modo, o disposto no §1º do artigo 44 do Código Civil se aplica

às entidades já organizadas, visto que elas apenas buscam o reconhecimento de sua

existência e o registro dos atos constitutivos.

Entretanto, deve-se frisar que os grupos religiosos ainda não organizados também estão

protegidos pelo direito de criação, uma vez que a liberdade ora analisada envolve,

justamente, o direito de criar a organização religiosa. Todavia, se ainda não estão

organizados como tal, não podem obter o reconhecimento, tampouco o registro do artigo 45

do Código Civil.

Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. (BRASIL. Código Civil, 2002).

À luz desse artigo, a partir do momento que são devidamente registradas, tais organizações

adquirem personalidade jurídica e deixam de ser apenas grupos religiosos, que sob uma

perspectiva constitucional, também possuem o direito de serem criados, organizados,

estruturados e funcionarem sem qualquer impedimento, para receber o status de pessoas

jurídicas, consoante o artigo 44 do mesmo diploma legal.

Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:

I - as associações;

II - as sociedades;

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III - as fundações.

IV - as organizações religiosas;

V - os partidos políticos (BRASIL. Código Civil, 2002, grifo nosso).

É importante destacar que a existência jurídica das organizações não se confunde com a

personalidade jurídica. No caso, sem o devido registro no cartório, somente as atividades

religiosas podem ser praticadas livremente, pois, para os atos negociais, como instituição

independente de seus membros, essa personalidade se faz necessária. Em outras palavras,

para que os atos da vida civil não impliquem na responsabilidade solidária e ilimitada de

todos os integrantes, há a necessidade de que a organização seja registrada, mesmo

porque, é através da aquisição da personalidade jurídica que ela pode provar sua existência.

A demonstração documental da constituição da personalidade jurídica faz presumir a existência e o funcionamento da organização religiosa. A organização religiosa despersonalizada, porém, terá de provar a sua existência por outros meio, para o que dificilmente escapará de recorrer ao Judiciário. (JUNIOR, 2007).

Adquirida a personalidade jurídica, tais instituições passam a desfrutar da proteção

mencionada no artigo 52 do Código Civil de 2002. Esse dispositivo legal afirma que a

proteção dos direitos de personalidade aplica-se, no que couber, às pessoas jurídicas, razão

pela qual a reputação, o nome, a marca e os símbolos, como direitos de identidade, podem

gerar reparação civil de danos se forem ofendidos.

Assim, para se obter a personalidade jurídica é preciso elaborar o ato constitutivo, por meio

de uma ata de fundação, pacto ou qualquer outro documento que demonstre a “inequívoca

manifestação escrita de vontade coletiva com ânimo de criar pessoa jurídica”, o qual

também deve apresentar os requisitos do artigo 46 do Código Civil, pois são elementos

fundamentais do registro, que, basicamente, consiste na transposição das informações do

ato constitutivo para o livro do Registro Civil de Pessoas Jurídicas, consoante o artigo 114,

inciso I, da Lei n.º 6.015/73 – Lei dos Registros Públicos. (CENEVIVA, 1991 apud JUNIOR,

2007).

Art. 46. O registro declarará:

I - a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver;

II - o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos diretores;

III - o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente;

IV - se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que modo;

V - se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais;

VI - as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso. (BRASIL. Código Civil, 2002).

Art. 114. No Registro Civil de Pessoas Jurídicas serão inscritos:

I - os contratos, os atos constitutivos, o estatuto ou compromissos das sociedades civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias, bem como o das fundações e das associações de utilidade pública; (BRASIL. Lei n.ª 6.015, 1973).

VII Jornada de Iniciação Científica - 2011

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Outrossim, também não é rara a confusão que se estabelece entre as entidades religiosas e

as associações civis. E, se considerada a redação original do artigo 44 do Código Civil, que

não incluía as organizações religiosas e os partidos políticos no rol das pessoas jurídicas de

direito privado, ambos recebiam o mesmo tratamento jurídico das associações sem fins

lucrativos. Entretanto, alguns dispositivos restaram incompatíveis com a natureza dessas

instituições, violando não só a liberdade religiosa assegurada na Constituição, mas afetando

a estrutura dos partidos políticos, o que justificou a menção deles em separado no

dispositivo legal,

Assim, com o advento da Lei n.º 10.852, de janeiro de 2003, tem-se que além do acréscimo

dessas duas instituições ao artigo 44, foi incluído o parágrafo único no artigo 2.031 do

mesmo diploma legal, as dispensando de se adequarem as disposições do Código. No caso,

entende-se que as organizações religiosas e os partidos políticos possuem a mesma

natureza jurídica das associações, mas como afirma Damião Alves de Azevedo, apenas

foram individualmente destacadas e dispensadas de se adequarem às regras das

associações em geral, devido ao reconhecimento público de suas respectivas formas de

organização. (AZEVEDO, 2006).

Art. 2.031. As associações, sociedades e fundações, constituídas na forma das leis anteriores, bem como os empresários, deverão se adaptar às disposições deste Código até 11 de janeiro de 2007.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às organizações religiosas nem aos partidos políticos. (BRASIL. Código Civil, 2002).

Liberdade de auto-ordenação ou auto-regulamentação

Essa liberdade permite a livre criação de regras relativas à estrutura interna e ao

funcionamento das organizações religiosas. Corresponde, portanto, ao poder de estabelecer

o próprio ordenamento jurídico, bem como à possibilidade das instituições, ao invés de criá-

lo, acatarem o ordenamento de convenções, federações, presbitérios, entre outras

associações, que buscam reunir e unificar uma determinada doutrina religiosa. É o caso, por

exemplo, da Convenção Batista Brasileira (CBB), que representa em torno de 7.000 igrejas,

4.000 missões e 1.350.000 de fiéis. (PORTAL BATISTA, 2011).

Quando as entidades não são restritas ao contexto nacional, de modo que assumem

normas estrangeiras para o ordenamento jurídico interno, o poder público em nada pode

interferir nesse acolhimento, pois a liberdade da auto-ordenação possibilita a livre escolha

das normas, sem qualquer restrição quanto ao local em que foram elaboradas. Da mesma

forma, em razão dessa autonomia, quando uma organização religiosa a nível mundial se

desvincula da influência internacional e estabelece novas regras, prevalecem as que foram

produzidas pela própria organização.

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É importante destacar que o ordenamento jurídico de uma instituição religiosa não precisa,

necessariamente, ser escrito. Não há problema algum se ele estiver firmado no costume,

contudo, caso haja algum conflito, fica difícil provar a existência das normas que o integram,

e por isso, a forma escrita é prezada pelas instituições. As igrejas batistas, por exemplo,

além de adotar um estatuto, que devidamente registrado no Cartório, lhes conferem a

personalidade jurídica, normalmente, elas também possuem um regimento interno escrito e

aprovado por seus membros.

Aquele que adere uma determinada organização religiosa submete-se ao regulamento que

esta possui, tanto nos direitos quanto nos deveres, de modo que o Estado jamais deve

impor uma norma dentro das entidades, tampouco o não cumprimento de alguma regra. No

entanto, deve-se ressaltar que o princípio do livre acesso à Justiça não impede que qualquer

lesão ou ameaça ao direito sejam apreciadas pelo Poder Judiciário. Nesse caso, o litígio

deverá ser solucionado com base no ordenamento elaborado pela própria instituição.

Art. 5º, XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; (BRASIL. Constituição, 1988).

O ingresso de membros é outra questão relevante dentro da liberdade ora analisada, uma

vez que é permitido aos grupos religiosos estabelecer regras para que uma pessoa seja

admitida ou não na comunidade religiosa. Assim, no caso de não admissão, não configura

qualquer discriminação, se os requisitos exigidos não afrontarem os direitos fundamentais

assegurados na Constituição. Portanto, é plenamente possível determinar condições para

que alguém seja aceito como membro participante da organização, e o poder público não

pode obrigar a aceitação de qualquer pessoa se esta não cumprir as exigências de filiação.

Diferente das associações civis, tais requisitos não precisam estar em conformidade com as

regras do Código Civil, o que possibilita, inclusive, a inserção de crianças como integrantes.

A Igreja Católica, por exemplo, admite o batismo infantil, que é o ritual de aceitação de

membros quando os pais já são integrantes da comunidade religiosa e desejam que seus

filhos sejam educados com os valores e princípios da Igreja.

Nessa hipótese, não há que se falar em afronta à liberdade religiosa da criança, pois de

acordo com o artigo 5º da Declaração sobre a Eliminação de Todas as Formas de

Intolerância e Discriminação Fundadas na Religião ou nas Convicções, os pais têm o direito

de organizar a vida familiar conforme a religião que seguem ou as convicções que possuem.

Ademais, quando adulta, a pessoa terá a liberdade de escolher qual religião seguir, o que

lhe abre a possibilidade de optar por não fazer mais parte do grupo religioso em que foi

inserida.

Art. 5 - 1. Os pais, ou no caso os tutores legais de uma criança terão o direito de organizar sua vida familiar conforme sua religião ou suas convicções e devem levar em conta a educação moral em que acreditem e queiram educar suas crianças.

VII Jornada de Iniciação Científica - 2011

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(ONU. Declaração sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação Fundadas na Religião ou nas Convicções, 1981).

Toda religião tem seu líder espiritual, contudo em alguns casos, este também recebe a

função administrativa da organização religiosa. É o caso dos padres e pastores, que além

de transmitir o recado de Deus para os fiéis, muitas vezes, estão incumbidos de administrar

a paróquia ou a igreja. Dessa forma, a liberdade em questão também envolve a autoridade

que é conferida aos líderes religiosos, bem como a maneira que o poder é distribuído

internamente.

Segundo Aloisio Cristovam dos Santos Junior (2007), em geral existem três formas de

governo dentro das entidades religiosas: episcopal, quando é exercido por um único

indivíduo; presbiterial, quando um grupo determinado de indivíduos exerce o governo; e

congregacional, quando é exercido pelos próprios integrantes reunidos em assembléias. Em

geral, são as organizações que escolhem como serão dirigidas e o poder público não pode

interferir nessa escolha.

Basicamente, os motivos que justificam a obediência dos membros ao modelo adotado

encontram fundamento nos tipos puros de dominação legítima estudados por Max Weber

(1997 apud JUNIOR, 2007), quais sejam: legal, tradicional e carismática.

Na primeira, o líder recebe essa incumbência em virtude do que dispõe o estatuto, uma vez

que este, quando corretamente elaborado, pode criar e modificar direitos. Na segunda, a

obediência dos liderados está relacionada com a dignidade do líder, ele é santificado pela

tradição e as pessoas obedecem por fidelidade a ele. Por último, na dominação carismática,

a devoção dos fiéis é afetiva, normalmente em razão dos poderes sobrenaturais ou

intelectuais, das faculdades mágicas, das revelações ou do heroísmo que ele possui. Um

bom exemplo desse tipo é Sun Myung Moon, líder da Associação do Espírito Santo para a

Unificação do Cristianismo Mundial, mais conhecida como Igreja de Unificação, fundada em

1954, na cidade de Seul, Coréia.

Independente de qual sistema de governo ou tipo de dominação é vedado ao poder público

intervir na escolha, pois a liberdade conferida às entidades religiosas envolve a capacidade

de autodeterminação. Ademais, não cabe ao Estado se envolver em assuntos religiosos,

muito menos, discutir a autoridade dos líderes ou sistema de governo, visto que recai em

aspectos da doutrina e fé das pessoas adeptas.

No caso do desligamento de membros, este também se orienta pela liberdade de auto-

regulamentação quando se trata de uma sanção disciplinar ao integrante. Assim, é

plenamente possível a criação de um código de disciplina das organizações religiosas,

inclusive, estabelecendo punições, entre as quais a desfiliação é a pena mais grave.

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Por envolver não só o cumprimento de obrigações pelos membros, mas também, o desvio

de comportamento do padrão ético-religioso, o poder disciplinar alcança todas as esferas da

vida pública e privada dos indivíduos, ou seja, não está adstrito ao que atinge o grupo

religioso, mas abrange a vida particular de seus membros. Nesse sentido, a punição em

questão baseia-se em critérios morais e religiosos, razão pela qual o poder público não deve

interferir, a menos que as regras de procedimento na aplicação da penalidade,

estabelecidas no ordenamento jurídico da organização, forem descumpridas, pois a decisão

que se manifestar quanto à legitimidade da sanção imposta deve ser fundamentada pelas

regras da própria entidade.

Outro ponto relevante e um tanto polêmico diz respeito ao financiamento das organizações

religiosas. É evidente que assim como qualquer outra instituição, a manutenção de suas

atividades requer um custeio, e como é defeso ao Estado subsidiar qualquer religião, resta

aos fiéis buscar uma maneira de arrecadar os recursos necessários, o que geralmente

ocorre por meio de doações dos próprios membros. Na Igreja Cristã tais doações recebem o

nome de dízimos e ofertas, sendo que o dízimo corresponde à décima parte dos

vencimentos, representando uma atitude de agradecimento, obediência e confiança em

Deus.

Obviamente que, em se tratando de dinheiro, existem muitos casos em que a quantia

arrecadada não é utilizada para sustentar a entidade, e sim, para enriquecer os líderes

religiosos, que explorando a fé das pessoas, fazem da religião um verdadeiro comércio.

Porém, não se deve generalizar tal situação, pois a arrecadação se faz necessária, por

exemplo, nos custos com iluminação, água, energia elétrica, limpeza dos templos, e

qualquer outra despesa ministerial. Outrossim, as organizações podem fixar contribuições

aos seus membros, as quais empregadas de acordo com suas finalidades essenciais, não

retiram o caráter religioso que possuem.

Liberdade de estruturação interna

Toda organização religiosa, por mais simples que seja, pressupõe um mínimo de

estruturação interna, através da maneira em que órgãos como diretoria, tesouraria,

assistência social, entre outros, são organizados. Assim, é essa liberdade que define as

atribuições de cada cargo criado, bem como a divisão e coordenação das atividades.

Algumas igrejas, por exemplo, são estruturadas por meio de ministérios com líderes para

cada um deles, outras, por sua vez, possuem departamentos sob a responsabilidade de

coordenadores, e há, também, aquelas que centralizam tudo em uma única pessoa. De

qualquer modo, é a estrutura que subdivide a instituição em unidades menores, as quais

possuem responsabilidades específicas. Nas palavras de Fernando L. Fernandes:

VII Jornada de Iniciação Científica - 2011

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Todas as organizações apresentam uma estrutura, com níveis de mando, execução,

responsabilidade e representatividade, o que caracteriza uma gradação hierárquica

dos diversos grupos componentes do sistema. Esses grupos hierárquicos podem ser

encarados como sistemas menores, parciais (ou subsistemas), os quais – da mesma

forma que o processo circulatório do corpo humano – constituem um sistema maior,

o complexo da organização. (FERNANDES, 2005 apud SANTOS, 2007).

Portanto, considerada a livre estruturação interna, consoante o artigo 44, §1º, do Código

Civil, o poder público não pode fazer qualquer exigência no que tange ao estabelecimento

de órgãos e as respectivas funções dentro das organizações religiosas, razão pela qual,

diferentemente das associações civis, não estão obrigadas a ter uma assembléia geral,

podendo livremente determinar a formação dos órgãos necessários à administração. Da

mesma forma, entende-se que é defeso ao poder público impor e distribuir atribuições, visto

que somente a instituição tem essa capacidade.

Liberdade de funcionamento

O 1º do artigo 44 do Código Civil menciona duas vezes o vocábulo “funcionamento”, contudo

é importante ressaltar que se referem a situações distintas. A primeira menção está

relacionada com a liberdade que permite aos grupos religiosos se reunirem, mesmo sem a

aquisição da personalidade jurídica. A segunda, no entanto, se refere ao próprio processo

de aquisição, visto que é termo utilizado para se referir ao funcionamento das organizações

religiosas como pessoa jurídica.

§ 1o São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento. (BRASIL, Código Civil, 2002, grifo nosso).

Notadamente, esta é liberdade que mais gera conflitos no âmbito judicial. No caso, já

existem decisões que determinaram a paralisação das atividades religiosas, em razão, por

exemplo, da ausência de alvará de funcionamento, da poluição sonora durante as reuniões

do grupo, bem como da perturbação ocasionada pelos carros que impedem o trânsito nas

proximidades do templo, isto é, de situações que violam as regras de segurança e proteção

à ordem pública.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TEMPLO RELIGIOSO. ABSTENÇÃO DE ATO. POLUIÇÃO SONORA. DANO AMBIENTAL. Apelação Cível. Ação Civil Pública. Sentença que condenou a Comunidade Evangélica Projeto Vida a se abster de realizar qualquer culto religioso no estabelecimento situado na rua Newton Prado, n. 80, Vila Suíça, Município de Barra do Pirai. Os direitos protegidos constitucionalmente devem ser interpretados sistematicamente, assim, a sentença não viola o direito de liberdade de culto, apenas protege outros direitos constitucionais também merecedores de amparo, como a ordem pública, o ordenamento urbano e o meio ambiente saudável. Utilização do solo pela apelante configurado uso institucional principal, conforme art. 14, II da Lei Municipal n. 275/95, inadequado para a zona habitacional onde se situa. Reconhecimento de ofensa as normas ambientais em razão do alto nível sonoro produzido, em desconformidade com o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano do Município (Lei n. 273/95). Provimento parcial do recurso apenas para que se condicione o dever de abster-se

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de realizar celebração religiosa à ausência de alvará de funcionamento. (TJRJ, 0000818-95.2001.8.19.0006 ou 2005.001.06574, Apelação, Des. José Carlos Varanda, Décima Câmara Cível, julgada em 13.09.2005).

DIREITO CIVIL. DIREITO DE VIZINHANÇA. USO NOCIVO DA PROPRIEDADE. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO E DA ORDEM. LOTEAMENTO. CASAS RESIDENCIAIS. REALIZAÇÃO DE CULTOS EVANGÉLICOS POR PARTE DOS RÉUS. GRANDE NÚMEROS DE FREQUENTADORES. POLUIÇÃO SONORA. EXCESSO DE BARULHO EM HORÁRIOS DE DESCANSO. GRANDE NÚMERO DE VEÍCULOS QUE COMPROMETEM A SEGURANÇA E A PASSAGEM DOS DEMAIS CONDÔMINOS. Pedido de tutela inibitória. Cabimento. Art. 554 do Código Civil. Compatibilização do direito dos condôminos com a liberdade de culto e direito de propriedade insculpidos na CF art. 5., VI. Provimento parcial do apelo. Possibilidade de realização do culto até às 10:00 horas, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais). Impedimento da entrada de mais de dois veículos, sendo que os restantes devem ficar estacionados em local próprio, fora da área de trânsito do condomínio. (TJRJ, 0177539-82.1999.8.19.0001 ou 2001.001.09675, Apelação, Des. Leila Mariano, Segunda Câmara Cível, julgada em 30.08.2001).

No que tange ao alvará de funcionamento propriamente dito, é interessante destacar que

este interfere no livre funcionamento estabelecido pelo Código Civil, mas assim como

decidido na ação direta de inconstitucionalidade do Tribunal de Justiça do Distrito Federal,

que analisou a Lei Orgânica n.º 1.350/96, trata-se de um documento necessário e

socialmente útil. Segundo o desembargador relator Getúlio Pinheiro:

(...) Se com a concessão de alvará de funcionamento já há desastres com grande número de vítimas fatais, imagine sem tal exigência, especialmente porque é dever do estado preservar a segurança da população (...). (TJ/DF, Ação Direta de Inconstitucionalidade 2002 00 2 001479-9 ADI - 0001479-91.2002.807.0000 (Res.65 - CNJ), Conselho Especial, Rel. Getúlio Pinheiro, julgada em 29.04.2003, DJU 20.10.2003).

Entende-se, portanto, que se há abusos por parte das organizações religiosas, de modo a

atingir o bem público, elas se sujeitam à responsabilidade civil e criminal, e nessa hipótese,

o Estado pode intervir, uma vez que as entidades não têm permissão para violar o interesse

público. É nesse sentido que Aloisio Cristovam dos Santos Junior (2007) distingue a

organização em si, do espaço físico onde ela realiza suas atividades.

Assim, segundo ele, não há qualquer inconstitucionalidade nas determinações do poder

público quanto ao local utilizado pelas entidades religiosas. Contudo, devido às

especificidades dessas instituições, é preciso que as normas a esse respeito expressem

claramente quais os motivos que as legitimam e como serão aplicadas às organizações

religiosas, justamente, para que não configure a restrição da liberdade constitucionalmente

assegurada. Ademais, tem-se que a limitação determinada pela autoridade judicial somente

é válida, quando obedecer o princípio do devido processo legal, garantindo que a questão

seja analisada em todas as suas interfaces.

Por outro lado, como é vedado ao Estado impedir o exercício da liberdade religiosa, em

decorrência do princípio da separação, ele também não está autorizado a impor a prática de

qualquer ato relacionado às atividades essenciais das organizações religiosas. Um bom

exemplo nesse sentido ocorreu na Primeira Igreja Batista de Goiânia, que diante da decisão

VII Jornada de Iniciação Científica - 2011

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do pastor titular em não permitir a realização do casamento de uma jovem, pelo fato dela

estar grávida, o que feriria os princípios de fé da igreja, a entidade foi processada pela

família, e por determinação do juiz, o templo foi arrombado e a cerimônia realizada.

Analisando esse caso específico, ocorre que as entidades religiosas podem estabelecer

regras para as cerimônias realizadas em suas dependências. De acordo com §2º do artigo

226 da Constituição Federal de 1988, o casamento religioso pode ter efeito civil, mas não é

por isso que ele perde seu caráter religioso. Tal efeito demonstra que se trata de um ato

religioso, o qual recebe o efeito civil. Nessa perspectiva, verifica-se que a decisão do

magistrado de fato violou a liberdade de autodeterminação da igreja, e em conseqüência, a

sua liberdade de funcionamento.

Outra questão importante de ressaltar, é que a recusa do pastor tampouco se tratou de um

ato discriminatório. Pelo contrário, a determinação judicial que obrigou a realização do

casamento é que conferiu um tratamento desigual em relação aos outros membros da

instituição, uma vez que apenas essa jovem casou dentro da igreja sem cumprir todos os

requisitos exigidos. Ademais, é garantido aos nubentes o casamento civil, razão pela qual

não há motivos para impor às instituições religiosas a realização de qualquer ato nesse

sentido.

CONCLUSÃO

Diante de tudo o que foi explanado, tem-se que a religião não está adstrita a um plano

espiritual, pois, enquanto instituição organizada pelos indivíduos que dela fazem parte, o

fenômeno religioso repercute em diversos setores da sociedade, apresentando, inclusive,

aspectos jurídicos que são de suma importância para a plena aplicação da liberdade

religiosa.

Contudo, é importante destacar que essa repercussão é limitada pelo modelo de laicidade

adotado pelo Estado, o qual não permite que o poder público privilegie qualquer religião em

particular, bem como se utilize de critérios religiosos para determinar sua política. Caso

contrário, resta violado o princípio da separação.

A liberdade religiosa, entendida como parcela da autonomia da vontade que se relaciona à

religião, corresponde a um direito complexo, o qual dependendo da classificação escolhida,

envolve outras três liberdades, quais sejam: de crença, de culto e de organização religiosa.

Nesse sentido, somente com essas modalidades plenamente asseguradas é que de fato as

pessoas são livres para decidir se vão seguir ou não uma religião, e a partir dessa decisão,

manifestar livremente a fé e crença que tiverem sem qualquer impedimento.

Relativo à liberdade de organização religiosa, é ela que garante a livre criação,

regulamentação, estruturação e funcionamento dos grupos religiosos. Estes, por sua vez, se

Universidade Presbiteriana Mackenzie

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comparados as demais pessoas jurídicas de direito privado, apresentam diversas

peculiaridades, justamente porque sua existência decorre da própria Constituição. Entre

tantos exemplos, a aquisição da personalidade jurídica dessas entidades constitui um

direito, e não uma obrigação.

Ademais, é por meio das liberdades conferidas as instituições religiosas, que elas podem se

organizar e estabelecer um ordenamento jurídico próprio, sem qualquer interferência estatal.

Assim, são livres para admitir e excluir membros, distribuir o poder internamente, e

estruturar-se conforme suas necessidades, criando órgãos, departamentos ou ministérios.

Da mesma forma, é através de tais liberdades que não há qualquer obstáculo quanto ao

livre funcionamento, ressalvados os casos em que a ordem pública é atingida.

Portanto, tem-se que a aplicação da liberdade religiosa em si, não se atém apenas à livre

escolha por parte dos seguidores, pois dela decorrem outras liberdades e direitos que

garantem a livre manifestação de fé e crença, não só de modo individual, mas também, de

modo coletivo. Em outras palavras, analisadas sob a ótica do Direito, as organizações

religiosas também são tuteladas juridicamente e a elas é garantida autonomia suficiente

para que a fé e a religião não sofram qualquer restrição.

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