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KURT LEWIN E A TEORIA DE CAMPO: UMA INTRODUÇÃO 1 APRESENTAÇÃO Kurt Lewin (1890-1947) trabalhou durante dez anos com Wertheimer, Koffka e Köhler na Universidade de Berlim; dessa colaboração com os pioneiros da Gestaltheorie nasceu sua teoria de campo. Entretanto, não podemos considerar Lewin como um gestaltista, já que ele acaba seguindo outro rumo. Ele parte da gestaltheorie para construir um novo conhecimento. A Gestalt parte do pressuposto de que sempre procuramos uma razão explicativa e perceptiva para entender um fenômeno. A lei da complementaridade ressalta que temos a tendência a complementar aquilo que está incompleto. A da proximidade destaca que atribuímos as características de um objeto ou fenômeno ao que está perto; por exemplo, ao ver duas pessoas próximas podemos entender que se conhecem e que são amigas. A da figura-fundo que ao perceber um fenômeno, destacamos aquilo em que focamos nossa atenção (figura) e deixamos outros fatos em segundo plano (fundo). Lewin abandona a preocupação psicofisiológica da Gestalt para buscar na Física as bases metodológicas de seu trabalho. Pode-se dizer que Kurt Lewin modificou profundamente a trajetória da Psicologia e pode ser apontado como um dos maiores psicólogos contemporâneos. Sua importância não é meramente histórica. Ele trabalha com a dinâmica dos fenômenos grupais a partir de condições concretas da existência, buscando uma orientação mais experimental, funcional e criativa das relações interpessoais no interior dos grupos. Dedicou-se à pesquisa dos 1 Texto do Prof. Altivir João Volpe para fins didáticos, a partir da bibliografia (vide ao final) 2013.

kurt lewin, a teoria de campo e a dinâmica dos grupos fev 2013

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KURT LEWIN E A TEORIA DE CAMPO: UMA INTRODUÇÃO 1

APRESENTAÇÃO

Kurt Lewin (1890-1947) trabalhou durante dez anos com Wertheimer, Koffka e Köhler na Universidade de Berlim; dessa colaboração com os pioneiros da Gestaltheorie nasceu sua teoria de campo. Entretanto, não podemos considerar Lewin como um gestaltista, já que ele acaba seguindo outro rumo. Ele parte da gestaltheorie para construir um novo conhecimento.

A Gestalt parte do pressuposto de que sempre procuramos uma razão explicativa e perceptiva para entender um fenômeno. A lei da complementaridade ressalta que temos a tendência a complementar aquilo que está incompleto. A da proximidade destaca que atribuímos as características de um objeto ou fenômeno ao que está perto; por exemplo, ao ver duas pessoas próximas podemos entender que se conhecem e que são amigas. A da figura-fundo que ao perceber um fenômeno, destacamos aquilo em que focamos nossa atenção (figura) e deixamos outros fatos em segundo plano (fundo).

Lewin abandona a preocupação psicofisiológica da Gestalt para buscar na Física as bases metodológicas de seu trabalho.

Pode-se dizer que Kurt Lewin modificou profundamente a trajetória da Psicologia e pode ser apontado como um dos maiores psicólogos contemporâneos. Sua importância não é meramente histórica.

Ele trabalha com a dinâmica dos fenômenos grupais a partir de condições concretas da existência, buscando uma orientação mais experimental, funcional e criativa das relações interpessoais no interior dos grupos. Dedicou-se à pesquisa dos pequenos grupos (psicogrupos e sociogrupos), utilizando procedimentos científicos aos grupos, sobretudo os das instituições educativas. Fundou o Centro de Pesquisa em Dinâmica de Grupo e os Laboratórios Nacionais de Treinamento (NTLs), onde aplicava os princípios da Teoria de Campo; avaliava os resultados e testava novas hipóteses; reformulava as leis grupais; analisava as questões relacionadas à comunicação interpessoal e intergrupal... em poucas palavras, um cientista de Psicologia Social.

1 Texto do Prof. Altivir João Volpe para fins didáticos, a partir da bibliografia (vide ao final) – 2013.

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Por ocasião da morte de Lewin, Tolman escreveu em The Psychological Review (1948, 55, 1-4):

Na futura história da Psicologia do nosso tempo, dois nomes merecerão destaque: Freud e Lewin. Aquele será reverenciado como o primeiro a desvendar a complexidade da história dos indivíduos; Lewin, por sua vez, como aquele que apreendeu as leis dinâmicas segundo as quais os indivíduos se comportam em relação ao meio. Freud, o clínico; Lewin, o experimentalista – dois homens dos quais nos lembraremos sempre, porque suas explorações divergentes mas complementares fizeram da Psicologia uma ciência aplicável tanto a indivíduos como à sociedade real.

BIOGRAFIA

Kurt Lewin nasceu no dia 9 de setembro de 1890 em Mogilno, na antiga Prússia. Pouco sabemos de sua infância e adolescência, de seus pais e de sua constituição familiar. Em sua juventude fez sucessivamente estudos universitários em Friburgo (Alemanha), Munique e Berlim.

Seus interesses pela Psicologia aparecem gradualmente. Inicialmente se dedica à Química e à Física, depois à Filosofia e, finalmente, prepara uma tese em Psicologia. Doutora-se em Filosofia pela Univ. de Berlim (1914), apresentando uma tese sobre “A psicologia do comportamento e das emoções”. Essa tese será retomada e completada por trabalhos posteriores, publicados simultaneamente em Londres e Berlim (1926). O título em inglês de sua primeira obra é “Investigation into the psychology of behavior and emotion”.

Kurt Lewin começa sua carreira na Universidade de Berlim em 1914 mas o início da Primeira Guerra frustra seus planos. É convocado e servirá durante toda a Guerra, dela saindo ileso. Em 1921 torna-se professor-assistente do Instituto de Psicologia da Universidade de Berlim e em 1926, professor titular da mesma Universidade, de onde só sairá com a chegada dos nazistas ao poder em 1933.

Neste ano, por ser judeu, Lewin é obrigado a deixar a Alemanha, após pagamento de resgate para não ir a um campo de concentração. Fica na Inglaterra alguns meses, indo depois aos Estados Unidos, onde é convidado a lecionar na Universidade de Stanford (Califórnia) e, na sequência, Cornell, em Nova York. Depois, passa a titular da disciplina Psicologia da Criança na mesma Universidade, aí permanecendo até 1939.

Durante esse período universitário, publica dois trabalhos teóricos que logo o tornarão célebre: “A dynamic theory of personality” e “Principles

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of topological psychology”. Nesse momento, seu principal interesse é formular uma teoria do conjunto do comportamento individual e, paralelamente, elaborar modelos teóricos que lhe permitam renovar a experimentação e a exploração dos fatos psíquicos. Retorna a Stanford em 1939 e, no ano seguinte, chega à Universidade de Harvard.

Em 1945, continua sua atividade docente fundando a pedido do M.I.T. (Massachussets Institute of Technology), um centro de pesquisas em dinâmica de grupos. É a ocasião para Lewin criar e introduzir o termo Dinâmica de Grupo, no vocabulário da Psicologia.

Kurt Lewin morre prematuramente em 12 de fevereiro de 1947, com 56 anos, numa localidade próxima a Harvard e o M.I.T., onde trabalhava. Após sua morte, Allport e Cartwright publicam vários artigos de Lewin nos volumes “Resolving social conflicts” e “Field theory in social science”.

PRINCIPAIS OBRAS DE LEWIN

Princípios de Psicologia Topológica (1936) – A primeira parte focaliza “a tarefa da Psicologia e os fundamentos da Psicologia Topológica e Vetorial”, detendo-se em temas como conteúdo e extensão do espaço vital psicológico, representação matemática e teoria psicológica... Na segunda parte, dedicada à Psicologia Topológica propriamente dita, são discutidos conceitos topológicos fundamentais para a Psicologia e como aplicá-los para estabelecer a topologia do ambiente psicológico, as fronteiras das regiões psicológicas, a topologia da pessoa, as dimensões do espaço vital, etc.

A Lewin se deve a criação da chamada Psicologia Topológica, disciplina que se propõe a descrever e classificar os fenômenos psicológicos com base em conceitos emprestados da geometria topológica. A Topologia é um ramo não-quantitativo da Matemática que trata das relações espaciais que podem ser estabelecidas em termos de parte e todo. Seu objetivo principal é a análise das propriedades das figuras geométricas que se mantêm, mesmo quando essas figuras são deformadas a ponto de alterarem todas as suas propriedades métricas. Assim, o desenho da figura humana feito por uma criança mantém com a pessoa real relações puramente topológicas. As deformações são de tal ordem que apenas as propriedades fundamentais da figura são mantidas.

Lewin considera que a topologia permite determinar quais os eventos possíveis ou não num dado espaço de vida, enquanto que os conceitos vetoriais possibilitam determinar, dentre esses eventos possíveis, qual o que poderá ocorrer numa situação específica.

Dinâmica e Gênese dos Grupos – Lewin, a partir de 1936 interessa-se em fazer experiências em Psicologia Social, dando a esta novos

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objetivos. Suas pesquisas e trabalhos dessa época buscam esclarecer e elucidar a dinâmica dos fenômenos grupais, muito presos às dimensões concretas e existenciais. A seu ver, os fenômenos grupais devem ser percebidos como funcionais, eficientes e criativos. Lewin considera que cientificamente não possuímos ainda técnicas de exploração e instrumentos para fazer experiências em um nível mais amplo da sociedade como um todo ou com os grandes conjuntos sociais.

Teoria de Campo em Ciência Social (1951). Trata basicamente de como organizar e compreender os fatos ligados à conduta do homem em sociedade. A obra divide-se em 3 partes – a) introdução: aqui examina os problemas básicos da filosofia das ciências sociais; b) segunda parte – apresenta com objetividade a aplicação da teoria de campo à psicologia social, especialmente à dinâmica de grupos, bem como à pesquisa de questões específicas da antropologia cultural, da sociologia e da economia; c) parte final – é um resumo esclarecedor do que as pesquisas de Lewin oferecem à teoria e práxis da psicologia social de inspiração democrática.

Segundo Lewin, “a teoria de campo provavelmente se caracteriza melhor como um método, isto é, um método de analisar relações causais e de criar construções científicas” (Teoria de Campo em Psicologia Social, ver p. 51). A teoria não reduz um acontecimento a elementos, para em seguida considerá-los isoladamente. Ela dá ênfase ao fato de que qualquer acontecimento é a resultante de uma multiplicidade de fatores.

A teoria de campo enfatiza o estudo de um determinado tema e campo é a ferramenta básica desse enfoque.

Trabalhando por etapas, analisando os fenômenos de crescimento dos pequenos grupos e explorando toda a série de questões que seu funcionamento coloca, pouco a pouco vão se destacar e tornar-se evidentes para Lewin certas constantes e leis na formação e evolução dos agrupamentos humanos.

Para ele, o estudo dos pequenos grupos constituiria uma opção estratégica que permitiria, em um futuro distante, esclarecer e tornar inteligível a psicologia dos macrofenômenos grupais.

A TEORIA DE CAMPO DE LEWIN

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A Teoria de Campo procura explicar a natureza e o comportamento

humano, com base nas seguintes premissas:

a). O comportamento de um indivíduo resulta de um conjunto de fatores que coexistem no ambiente em que esses indivíduos desenvolvem a sua atividade; conjunto de fatores que inclui a família, a profissão, o trabalho, a política, a religião, etc.

b). Tais fatores estabelecem uma relação dinâmica e de interdependência, a que Lewin chama campo psicológico (que dessa forma constitui o próprio espaço de vida do indivíduo, definindo como este percebe e interpreta o ambiente externo que o rodeia).

Nesse sentido, CAMPO SOCIAL ou ESPAÇO PSICOLÓGICO é tudo o que existe fenomenologicamente para o indivíduo e para o grupo. Tudo o que estes reconhecem como sua existência. Engloba vetores, valências, forças, regiões, “lugares”, “campi”, ou seja, fantasias, desejos, temores, necessidades – tanto individuais, como grupais e institucionais.

Por exemplo, um grupo pode ter uma “região” caracterizada por necessidades de aprovação. Quando tais necessidades forem satisfeitas ou garantidas, o movimento grupal irá estruturar outras configurações dinâmicas, expressas em novos “lugares” ou “regiões”, as quais alterarão a estrutura do todo – em valências de aproximação ou de afastamento/repulsão.

EM CONCLUSÃO:

a) um campo é uma rede sistemática de relações;

b) um campo contínuo em tempo e espaço;

c) os fenômenos são determinados por todo o campo;

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d) o campo é um todo unitário e interdependente. O todo determina as partes;

e) a realidade percebida se configura mediante a relação entre observador e observado. O observador afeta seu objeto de estudo e, por sua vez, é por ele afetado;

f) como observamos não somente determina o que percebemos, como também muitas vezes um ato de observação-participante modifica realmente o que é observado;

g) um acontecimento é sempre resultado de interações entre dois ou mais fatos;

h) em psicologia, se o passado, a genética, a família, a sociedade têm influência, então todas essas forças devem estar presentes em um campo contemporâneo – o aqui-e-agora grupal. As possibilidades de mudança ou de resistência à mudança estão presentes no aqui-e-agora, mesmo que as forças tenham surgido em algum campo prévio.

A Teoria de Campo apresenta três princípios básicos:

1.- O comportamento é uma função do campo. Ele ocorre à medida que os fenômenos vão se sucedendo.

2.- A análise começa com a situação como um todo, a partir do qual são diferenciadas as partes componentes;

3.- Um indivíduo numa situação real pode ser representado de forma matemática.

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A ESCOLA DE PSICOLOGIA DINÂMICA AMERICANA (KURT LEWIN, SCHUTZ; LABORATÓRIO DE RELAÇÕES SOCIAIS; TÉCNICAS DE AÇÃO; SLAVSON…) TRATA DE CRIAR «CLIMAS» ENTRE OS PARTICIPANTES DE UM GRUPO, CONDUZIDO POR COORDENADORES QUE ENCAMINHAM AS QUESTÕES «EM PÚBLICO». PROPÕE QUE O COORDENADOR SEJA CAPAZ DE CONDUZIR UM GRUPO UTILIZANDO JOGOS DRAMÁTICOS, CONSIGNAS LÚDICAS E INTERPRETAÇÕES DIRIGIDAS «ÀQUELE QUE PROPÕE O TEMA, TRAZ O CONFLITO OU...», ACOMPANHANDO-O E AO GRUPO EM SEUS DIFERENTES MOMENTOS.

A TEORIA DE CAMPO É UM MARCO OU PONTO DE VISTA QUE PERMITE EXAMINAR E ELUCIDAR EVENTOS, EXPERIÊNCIAS, OBJETOS, ORGANISMOS OU SISTEMAS, COMO PARTES SIGNIFICATIVAS DE UMA TOTALIDADE CONHECIDA, DE FORÇAS MUTUAMENTE INFLUENCIÁVEIS QUE JUNTAS FORMAM UMA TOTALIDADE (CAMPO) UNIFICADA, INTERATIVA E CONTÍNUA.

A interpretação subjetiva que cada um faz dos outros indivíduos, das coisas e dos fenômenos que em cada momento constituem o seu ambiente traduz-se em valências, isto é, toma um determinado valor. A valência é positiva quando a forma como alguém interpreta o seu ambiente lhe traz a idéia de satisfação, de bem-estar; é negativa quando se verifica o contrário.

O principal conceito da teoria de campo é o de espaço vital, definido por Lewin como “a totalidade dos fatos que determina o comportamento de um indivíduo num dado momento”.

Mas o que entender por comportamento de grupo? Para Lewin, tal comportamento supõe que vários indivíduos sintam as mesmas emoções e que estas sejam suficientemente intensas para integrá-los e deles fazer um grupo e que, finalmente, o grau de

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coesão atingido por esses indivíduos seja tal que eles se tornem capazes de adotar o mesmo comportamento.

GRUPOS: CAMPO SOCIAL EM INTERAÇÃO DINÂMICA, UM ESPAÇO VITAL PSICOLÓGICO. É UMA TOTALIDADE DINÂMICA, UMA GESTALT (“MAIOR QUE A SOMA DAS PARTES”). A BUSCA DE FORMAS DE EQUILÍBRIO PRESENTES NO GRUPO PODERIA EXPLICAR O SURGIMENTO DE FENÔMENOS COMO LIDERANÇAS E PAPÉIS E SEUS DESDOBRAMENTOS...

A IDENTIDADE E A QUALIDADE DE TAIS EVENTOS, OBJETOS OU ORGANISMOS ESTÃO SEMPRE EM UM AQUI-E-AGORA MARCADO POR VALÊNCIAS E VETORES, POR FORÇAS QUE SE MOSTRAM NUMA INTERAÇÃO MUTUAMENTE INFLUENCIÁVEL ENTRE OBSERVADOR E OBSERVADO; ENTRE EU E O OUTRO; ENTRE INDIVIDUO E GRUPO; ENTRE UM SUBSISTEMA E OUTRO; ENTRE...

EM RESUMO:

1. FORÇAS IMPULSORAS E FORÇAS RESTRITIVAS

Para Lewin, existe uma dinâmica específica nos grupos, uma “social engineering” – necessitando de uma ciência e de uma arte para manejar os pequenos grupos.

Sobre a força que movimenta um grupo, há em Lewin pelo menos dois modelos de elaboração teórica: o primeiro refere-se à questão da fonte de energia ou à condição de formação do estado tensional que movimento um grupo; o segundo abrange o problema da direção assumida pelo comportamento manifestado nesse movimento. Ambos os esquemas se assemelham às perspectivas desenvolvidas por Freud, em que há também dois pontos de vista – o econômico e o dinâmico.

A lógica dos modelos de elaboração teórica permitiram a Lewin desenvolver pesquisas em torno da dinâmica dos grupos humanos. Tais estudos envolveram sobretudo a análise dos papéis e das lideranças – campo de forças de alta intensidade presentes nos grupos. O campo grupal é atravessado por forças impulsoras e por forças restritivas. Assim, Lewin fez pesquisas com liderança autocrática; democrática e laisser-faire. Para

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que ocorram MUDANÇAS é necessário aumentar as forças impulsoras e diminuir as restritivas.

Outros estudos de Lewin dizem respeito ao clima e à cultura de um grupo – os estados de homeostase ou de equilíbrio grupal. A seu ver, o grupo busca uma “boa forma” em seu equilíbrio de FORÇAS PSICOLÓGICAS.

2. PERPECTIVA DINÂMICA E FENOMENOLÓGICA:

a) A TEORIA DE CAMPO APRESENTA-SE COMO UM PROCESSO NO QUAL AS PARTES SÃO ORGANIZADAS E COMPREENDIDAS EM INTERAÇÃO UMAS COM AS OUTRAS, FORMANDO TOTALIDADES.

b) INTERDEPENDÊNCIA FIGURA-FUNDO;

c) OS GRUPOS E SEU AMBIENTE SÃO ENTENDIDOS COMO PARTES DE UM TODO DINÂMICO – VETORES E VALÊNCIAS EM CONTÍNUA INTERAÇÃO.

3. UMA PSICOLOGIA NÃO-DESCRITIVA, NÃO CLASSIFICATÓRIA, SEM DICOTOMIAS: UM CONTINUUM ENTRE PARTE E TODO, ENTRE ESTE E AS PARTES.

-- O HOMEM SE INSCREVE NO CONTEXTO E, AO MESMO TEMPO, O CONTEXTO SE INSCREVE NELE, EM PROCESSOS IMPOSSÍVEIS DE SEREM VISTOS/ANALISADOS ISOLADAMENTE.

4. LEWIN É CONHECIDO POR SER O INICIADOR DA PESQUISA-AÇÃO (ACTION RESEARCH), DA PESQUISA-PARTICIPANTE, NA QUAL O INDIVÍDUO É, AO MESMO TEMPO, SUJEITO E OBJETO DA AÇÃO EM ESTUDO.

LEWIN UNE AÇÃO E TEORIA, SEGUINDO QUATRO PASSOS:

a). PLANEJAMENTO para a coleta de dados/ um levantamento das etapas a serem seguidas;

b).AÇÃO: o que é? O que poderia ser?

c). REFLEXÃO: táticas; estratégias; procedimentos técnicos; E

d). CONSTRUÇÃO DE NOVAS AÇÕES: a partir dos resultados alcançados, novo planejamento E ASSIM POR DIANTE.

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CONTRIBUIÇÕES DE KURT LEWIN PARA A DINÂMICA DE GRUPO – GEORGES LAPASSADE

1. A CHAMADA EXPERIÊNCIA DOS

TRÊS CLIMAS"

Kurt Lewin empenhou-se em elaborar uma representação das situações psicológicas e de seu meio ambiente, assim como em conceber uma dinâmica dessas representações. Foram destacadas da experiência fundamental, chamada de "climas sociais", algumas noções gerais e essenciais.

Seis grupos de crianças trabalham com massinha sob a direção de monitores. Os dois primeiros são conduzidos de acordo com encaminhamentos autocráticos. Só o monitor conhece a finalidade das operações. Decide sobre as tarefas a realizar, reparte-as e faz os elogios ou censuras aos membros do grupo de maneira pessoal.

Os dois grupos seguintes são dirigidos de modo democrático. Toda decisão a curto e longo prazo é assunto a ser discutido entre o grupo e seu monitor. Este último aprecia o grupo em seu conjunto.

Os dois últimos trabalham num clima de deixar correr (laisser-faire). O monitor contenta-se em fornecer, a pedido das crianças, a massa para modelagem e as instruções técnicas, mas nada sugere ou decide.

Procura-se, em seguida, eliminar todas as variáveis (características dos monitores, por exemplo, procedendo-se a um rodízio) para conservar apenas uma: os climas sociais artificialmente criados nos três tipos de grupo.

Um outra possibilidade é, então desencadear algumas situações ou experimentais nesses grupos. Por exemplo, a introdução de um ingrediente perturbador (um falso faxineiro que levante poeira), ou a saída, em dado momento, do monitor. As reações das crianças do mesmo modo que toda a vida do grupo são observadas e filmadas.

Daí pode-se concluir que o fato de viver em clima autocrático, democrático ou laisser-faire influi no grau de agressividade dos grupos; ou ainda explorar o mesmo material para estudo da motivação ou coesão desses grupos em função dos climas; os modos de comunicação nesses grupos, como são tomadas as decisões, etc. Em resumo, estudar a dinâmica de tais grupos.

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2. A COESÃO

A própria noção de dinâmica de grupo pressupõe que se possa definir no grupo um sistema de forças. Distinguir, por exemplo, forças de progressão/impulsoras e forças de coesão: as primeiras são as que "puxam" um grupo no sentido de objetivos aos quais se destina; as segundas são as que incitam os membros do grupo a permanecer no grupo. Seriam forças de contenção, de manutenção do status quo.

Entre os fatores de coesão do grupo pode-se distinguir, em função dos fins do grupo:

- a pertinência dos fins: serão acaso bem escolhidos?- a clareza dos fins: isto implica concordância na percepção dos fins

pelos diferentes membros do grupo;- - aceitação dos fins pelos membros.

Esses acordos dos membros definem forças de atração ou cooperação; as divergências constituem, pelo contrário, as forças de repulsão ou afastamento/evitação. Se as segundas dominam, podem-se observar processos de desagregação do grupo.

3. A COMUNICAÇÃO NOS GRUPOS

O estudo das redes de comunicação tem por objetivo determinar os efeitos das estruturas dos canais de comunicação sobre a circulação da informação.

Essas estruturas de comunicação têm conseqüências sobre a vida do grupo, sobre seu "clima": a comunicação em estrela, em rede, favorece o rendimento mas pode desenvolver frustrações e, em conseqüência, manifestações agressivas, ao passo que a comunicação em círculo é mais satisfatória no nível da circulação dos sentimentos entre os membros do grupo, mas pode acarretar perdas de tempo.

Foram estudadas igualmente as barreiras que se opõem às comunicações. Pode-se distinguir numa perspectiva de inspiração sociométrica:

- comunicações ligadas às relações formais (oficiais, como as circulares e comunicados numa administração ou empresa, os relatórios ou notas de serviço, etc.);

- comunicações de natureza informal (por exemplo, os rumores e o cochichar nas antesalas de um congresso, os boatos, as fofocas, etc.).

Podem-se distinguir ainda os processos de comunicação: (quem fala e a quem? Fala-se muito ou pouco?, etc.); atitudes e comportamentos de cada

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um dos membros do grupo na esfera das comunicações (que atitudes dos animadores de uma reunião facilitam a comunicação dos membros? etc.).

4. A VARIAÇÃO, DIVERSIDADE E HETEROGENEIDADE

Pode-se verificar, nos grupos, uma pressão no sentido da uniformidade que implica sobretudo a rejeição dos desviantes, isto é, dos membros que não adotam os valores, normas e objetivos do grupo. Um membro desviante suscita um problema para o grupo: ao mesmo tempo em que este se coloca para ouvi-lo, tende a rejeitá-lo. Pode-se admitir a hipótese de que ele poderia trazer elementos novos e soluções aos problemas que se coloquem ao grupo. Assim, isso levaria a esforços no sentido de reintegrá-lo ao grupo.

A relação para com o desviante constituiu objeto de experiências numerosas. Numa delas, a rejeição dos desviantes foi estudada em função da motivação do grupo: quanto mais forte é a motivação, mais intensa é a tendência a rejeitar o desviante. Reuniu-se um grupo experimental de 10 pessoas das quais 3 (psicólogos) tinham funções rigorosas a desempenhar, desconhecidas dos 7 demais membros. O primeiro psicólogo assume o papel do "indivíduo modal", que se reúne à maioria; o segundo é o "indivíduo móvel" que se opõe, depois se reintegra; o terceiro é sistematicamente "desviante" (oposto ao grupo). Propõe-se organizar o grupo: o membro modal e o membro móvel obtêm a presidência, mas propõe-se ao desviante o lugar de secretário para que seja controlado, obrigando-o a escrever para que se cale.

No nível das comunicações do grupo, observa-se uma baixa significativa de mensagens no sentido da pessoa móvel após sua reintegração. O desviante polariza então as comunicações. Observa-se em seguida uma baixa que tende a isolá-lo, quando se verifica que ele não se reintegra. Isso corresponde a uma baixa na pressão do grupo sobre o desviante em vista da "uniformização" do grupo.

5. RESISTÊNCIAS À MUDANÇA E ÀS DECISÕES GRUPAIS

Uma experiência, freqüentemente citada, foi realizada numa empresa de confecções. Essa empresa defrontava-se com resistências do pessoal por ocasião de mudanças nos postos de trabalho ditadas pela evolução das técnicas ¾ resistências essas que se manifestavam pela baixa de

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rendimento, demissões, hostilidade para com a direção, etc. A experiência efetuou-se com quatro grupos de operários.

No primeiro grupo (18 operários), explicou-se simplesmente a necessidade das mudanças; no segundo grupo, representantes do pessoal participavam das decisões. Nos outros dois grupos (7 e 8 operários), todos os trabalhadores participavam nas decisões. As mudanças foram mais bem-aceitas nesses últimos dois grupos, ao passo que a resistência foi mais forte no primeiro. Tal exigência tendiam a delinear a autogestão operária, mesmo que os organizadores tivessem em mente outros propósitos, ou os formulassem de outra maneira.

6. A CRIATIVIDADE GRUPAL

Os problemas da inteligência, do conhecimento e da invenção têm sido até aqui estudados muito mais no nível do indivíduo que no nível do grupo. Para estudar experimentalmente a criatividade dos grupos, comparando-a com a dos indivíduos, Faucheux e Moscovici dedicaram-se a certas experiências.

As conclusões tiradas dessas experiências são as seguintes:

1) a superioridade do grupo depende do tipo de tarefa. A interação social não é garantia de rendimento mais econômico;

2) há um efeito positivo de grupo quando a organização da tarefa permite colaboração dos membros, colaboração suscetível de tornar mais flexível a percepção de cada um e de controlar sua produção, graças às regras existentes;

3) numa prova em que um efeito de grupo é possível, os grupos são mais originais que os indivíduos.

O leitor perceberá sem dificuldade a conseqüência importante dessas pesquisas, num processo de ensino-aprendizagem, sem que seja necessário insistir muito na questão. Tais pesquisas permitiram, de fato, resolver cientificamente os problemas suscitados pela distinção de "trabalho individual" e "trabalho em equipe".

7. ORIENTAÇÕES ATUAIS NA DINÂMICA DE GRUPO

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Kurt Lewin enfatiza que é preciso procurar as relações entre o campo grupal e o campo social. Enfatiza a relação dos grupos entre si e destes com as comunidades e com os sistemas institucionais.

A análise sistemática das leis e constantes gerais presentes nos grupos foi denominada por Kurt Lewin de dinâmica dos grupos. Em sua fase inicial (1938-1940), o termo designou uma ciência experimental, praticada em laboratório em grupos artificiais constituídos para fins de experimentação. Essas experiências obedeciam às regras fundamentais de toda pesquisa experimental: controle das variáveis, aparelhamento experimental, quantificação das observações. A proposta era a de estudar o funcionamento, a coesão, as interações comunicacionais, os processos decisórios (a questão do poder e da autoridade, os estilos de liderança e dos papéis, por exemplo), inovação e criatividade dos grupos, entre outros aspectos.

Numa segunda fase, o mesmo termo dinâmica de grupo designou o trabalho do dinamizador do grupo que, saído de seu laboratório, ocupou-se da "resolução dos conflitos sociais". O psicanalista "conhece" o indivíduo a partir de sua intervenção terapêutica, que tem em mira obter a cura ¾ isto é, uma modificação da personalidade. O psicossociólogo prático que utiliza os pressupostos da Teoria de Campo "conhece o grupo ao organizá-lo", e a sociedade ao modificá-la. Seu conhecimento científico se estabelece a partir de uma prática social, e seu laboratório é constituído por grupos reais, organizações sociais.

Uma das características marcantes de Kurt Lewin foi o fato de exigir que tudo fosse discutido, explorado e decidido em grupo: hipóteses, objetivos, metodologia, etc. Suas descobertas só constituiriam para ele uma ciência depois de submetidas a experimentações sistemáticas e a diferentes verificações na vida concreta dos grupos humanos.

É possível afirmar que Lewin não procurou a explicação dos fenômenos de grupos na natureza de cada um de seus elementos mas nas múltiplas interações que se produzem entre os elementos da situação social onde se situam, no próprio momento em que são observados e interpretados. Atualmente, a dinâmica de grupos desenvolve pesquisas, experiências e estudos sobre a psicologia dos grupos de tarefa e sobre a psicologia dos grupos de formação (futuros coordenadores de grupos; formação de professores; formação de profissionais de dinâmica de grupo...).

Pode-se perceber que o termo "dinâmica de grupo" adquiriu uma significação cada vez mais ampla. Esta "ampliação" existia já no projeto de Kurt Lewin de intervenção refletida e rigorosa nos processos sociais. Mas, muito depressa, a corrente lewiniana misturou-se a outras orientações da pesquisa e de ação.

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Em suas aplicações práticas, a dinâmica de grupo implica variadas técnicas de formação, de intervenção e de psicoterapia. É assim que numerosos centros de psicossociologia ou de educação de adultos se constituem com períodos de estágio ou formação mais longos ou curtos, contínuos ou "temporários", de cuidadores de cuidadores, de formação de equipes profissionais, de professores, gerentes, supervisores, etc.

ENFIM... Jacob Levy Moreno (Psicodrama) e Enrique José Pichon-Rivière (Grupos operativos) partem da Teoria de Campo de Kurt Lewin.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADALAPASSADE, G. e LOURAU, R. Grupos, organizações e instituições. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988.

LEWIN, K. Princípios de psicologia topológica. São Paulo: Cultrix, 1973.

_____. Problemas de dinâmica de grupo. São Paulo: Cultrix, s/d.

_____. Teoria de campo em psicologia social. São Paulo: Pioneira, 1965.

MAILHIOT, G. Dinâmica e gênese dos grupos: atualidade das descobertas de Kurt Lewin. 7ª. ed. São Paulo: Duas Cidades, 1991.

MINICUCCI, A. Dinâmica de grupo: teorias e sistemas. 3ª. ed São Paulo: Atlas, 1991.

MOSCOVICI, F. Desenvolvimento interpessoal. Treinamento de grupo. Rio de Janeiro: José Olympio, 2008.

SCHOSSLER, A.B. Somos um grupo ou não? Uma investigação do processo grupal. Dissertação (Mestrado) em Psicologia Social e Institucional. Porto Alegre: Psicologia/UFRGS, 2005.

dgrh-ajv./fev.2013

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