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Lapso de consciência por Eduardo Souza, disponível em https://animusmundus.wordpress.com/2014/11/12/lapso-de-consciencia/ — Você quer ver como será-foi sua vida? Foi assim que tive consciência pela primeira vez. Pesaroso que fui-sou-serei, quei sem resposta; só olhando, boquiaberto. O silêncio era um abismo sibilando seu nome, calmo. Não uma simples ausência de som. Aquilo parecia respirar pacientemente. Ao nosso redor, o nada. Não era a escuridão mais intensa, era a inexistência de luz. Mas eu podia ver aquele universo brilhando e se movimentando vagarosamente dentro dos olhos desapressados d’Aquilo. — Você poderá escolher, então, vir à existência. Se lhe convir. Innitas vozes falavam ao mesmo tempo, sem que nenhum lábio se movesse. Vozes doces, vozes pesadas, vozes de júbilo e de melancolia. Aquilo parecia já saber o que eu z-farei, e eu ainda não sabia dar uma resposta, não sei se sabia murmurar qualquer coisa que fosse. Pensei que gostaria de ver. Os seus olhos brilharam a luz mais clara que já existiu, a fusão de mil sóis invadiram minha consciência. Não saberia dizer quanto tempo durou; se a duração da minha vida ou se um breve instante de sonho. Ali, eu vi a minha vida que acontecerá-aconteceu. Cada sorriso, cada lágrima, cada sonho abandonado, despedaçado, esmagado. Cada realização, cada segundo de trabalho, cada fruto do acaso, cada deslize. Cada momento innito de amor. Cada profunda certeza e cada angústia trespassar os ancos da alma. Cada decisão que z-farei e cada decisão que zeram-farão por mim. Olhei de novo para Aquilo. Parecia-lhe que nada tinha acontecido e tudo o que vi foi uma fração breve de um movimento do canto daqueles olhos-universo. — Deseja viver?

Lapso de Consciencia

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Breve narrativa de Eduardo Souza, no Animus Mundus.

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Page 1: Lapso de Consciencia

Lapso de consciência

por Eduardo Souza, disponível em https://animusmundus.wordpress.com/2014/11/12/lapso-de-consciencia/

— Você quer ver como será-foi sua vida?

Foi assim que tive consciência pela primeira vez. Pesaroso que fui-sou-serei, quei sem resposta; só olhando, boquiaberto. O silêncio

era um abismo sibilando seu nome, calmo. Não uma simples ausência de som. Aquilo parecia respirar pacientemente.

Ao nosso redor, o nada. Não era a escuridão mais intensa, era a inexistência de luz. Mas eu podia ver aquele universo brilhando e se

movimentando vagarosamente dentro dos olhos desapressados d’Aquilo.

— Você poderá escolher, então, vir à existência. Se lhe convir.

Innitas vozes falavam ao mesmo tempo, sem que nenhum lábio se movesse. Vozes doces, vozes pesadas, vozes de júbilo e de

melancolia. Aquilo parecia já saber o que eu z-farei, e eu ainda não sabia dar uma resposta, não sei se sabia murmurar qualquer

coisa que fosse.

Pensei que gostaria de ver. Os seus olhos brilharam a luz mais clara que já existiu, a fusão de mil sóis invadiram minha consciência.

Não saberia dizer quanto tempo durou; se a duração da minha vida ou se um breve instante de sonho.

Ali, eu vi a minha vida que acontecerá-aconteceu. Cada sorriso, cada lágrima, cada sonho abandonado, despedaçado, esmagado.

Cada realização, cada segundo de trabalho, cada fruto do acaso, cada deslize. Cada momento innito de amor. Cada profunda

certeza e cada angústia trespassar os ancos da alma. Cada decisão que z-farei e cada decisão que zeram-farão por mim.

Olhei de novo para Aquilo. Parecia-lhe que nada tinha acontecido e tudo o que vi foi uma fração breve de um movimento do canto

daqueles olhos-universo.

— Deseja viver?