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Legendre - O Amor do Censor

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O Amor do Censor - Relação Direito e Psicanalise

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  • O Amor do Censor ensaio sobre a ordem dogl'!ltica "Trata-se de observar como se

    propaga a submisso, quando a obra-prima do Poder consiste em se fazer amar." Lacan j nos mostrou que o amnr se fundamenta numa palavra va-zia. Se a plena palavra garante a proli-ferao e a expanso dos sentidos, porque seu fundamento o desejo. O desejo, estamos lembrados disto desde Spinoza, a essencialidade do ser falan-te (que se nomeia humano). E Freud nos ensina que, em sua raiz, o desejo deSejo de desejo - com tantos sentidos ruas sem qualquer significalro possvel. J a palavra vazia aquela que se obs-tina na significa'o, subtrocando, as-sim, o desejo por um aparente "desejo de submissa-o".

    As grandes burocracias de mode-lo ocidental encontram facilmente seu paradigma no Direito Cannico e na Teologia Escolstica, cujo feliz casa-mento nos arranjou a bela liturgia de submissa-o a que ainda assistimos: a lei organizada em sistemas - com seus co-

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    Pierre Legend re

    O Amor do Censor ensaio sobre a ordem dogmtica

    Tradufo de: CoWgio Freudiano do Rio de Janeiro: Alusio Menezes Potiguara Mendes da Silveira Jr.

    editora

    Colgio Freudiano do Rio de Janeiro

    FORENSE-UNIVERSITRIA Rio de Janeiro

  • Traduzido de: L'Amour du Censeur- Essai sur L'Ordre Dogmatique

    Copyright Sditions du Seuil, 1974

    Consultor da traduo: M. D. Magno Capa: Luiz Carlos Galv"o Miranda

    CIP-Brasil. Catalogao-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

    Legendre, Pierre. , . . L526a O Amor do censor: ensaio sobre a ordem dogmattca/Pier-

    83.()662

    re Legendre; tradufo e revisto de Alusio Pereira de Mene-zes, M. D. Magno [e) Potiguara Mendes da Silveira Jr. (do] Colgio Freudiano do Rio de Janeiro.- R_io de Janeiro: Fo-rense Universitria : Colgio Freudiano, 1983.

    Anexos

    1. Dogmatismo L Ttulo ll. Ttulo: Ensaio sobre a or-dem dogmtica

    CDD-148 CDU - 165.71

    Reservados direitos de propriedade desta traduo pela EDITORA FORENSE-UNIVERSITRIA LTDA.

    Av. Erasmo Braga, 227- Gr. 309- Te!. : 283-11 52 Rio de Janeiro - RJ

    Impresso no Brasil

    SUMRIO

    Posio do Tema . .... . .. ... ..... ....... . .. . .... 7 I. Desta GloSil a Freud . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

    Onde Freud podia ver a Instituio . . . ,'. . . . . . . . . . . 17 Articular um Seguimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Fundao do Discurso Cannico. Um retorno sua Idade Mdia . . . .. . . . .. . . .. .. .. . .... _.......... 44

    II. Os Primitivos da CensUTll no Ocidente . . . . . . . . . . . . . 53 O Genitor da Palavra . .... . : . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 O Texto como Discurso Assentado . . . . . . . . . . . . . . . . 72 Tratado da Prestana do Doutor . . . . . . . . . . . . . . . . . 88

    III. O Sujeito Possuido pe/4 Instituio . . . . . . . . . . . . . . . 107 A Ordem Sexual e seu Terror _ . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113 Poltica dos C011fessores .. . . : . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129 Onde Passam os Rebeldes? Notaes sobre a Antinomia . 146

    IV. Parntese. A lmtituilib e sua Arte do Trao ...... .. . 155 V. O Discurso Suspenso . . . . ...... . .. . .. ..... . .. . 165

    A Utopia Patriota e sua Lei . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173 Paradigma. A Burocracia como Universo Feliz e Culpado . 190 Tambm, a Questlo Sabatina. Quem est hoje no lugar do Canonista? . .. . .. . .. ... . ........ . .. .... .. . 207

    VI. No Final: A Funo Dogmtica e su Onico Dicionrio . 223 Anexo I. Vitico do Leitor . .. . . .. ...... . ...... 235 Anexo 11. Distines para fundar a boa Cincia.

    Textos Exemplares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 239

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    Posio do Tema

    Este livro trata do Poder e de seus arredores de saber, em um deter-minado lugar da histria.

    Trata-se de observar como se propaga a submissa:o, que se torna dese jo de submisso, quando a grande obra do Poder consiste em fazer-re amar. A realizalo de tal prodgio sempre sups uma cincia particular, que pre-cisamente constitui a anna'o desse amor e camufla com seu texto a pres-tidigitalio de uma pura e snples imposilo de adestramento. Em outras palavras, a Lei em cada sistema institui sua cincia prpria, um saber leg timo e magistral, para assegurar a comunicao das censuras at os sujei tos e fazer prevalecer a opiniio dos mestres. No estreito espao das tradi crS ocidentais, mas graas linhagem ininterrompida dos comentrios jurdicos ou das novas verses do texto, se nos oferece essa matria sur-preendentemente preservada, uma cinCIJ perptua do Poder. Dos telo-gos-legistas da Antigidade aos manipuladores de propagandas publicit-rias, um s e mesmo instrumental dogmtico se aperfeioou a fim de captar os sujeitos pelo meio infalvel que aqui est em questo: a crena de amor.

    Ser, pois, reaberta a velha trincheira dos Jogmatisrnos onde se enrazam ainda as nrabolantes cincias humanas, por demais malinforma . das sobre seu terreno. Seria preciso colocar em evidncia urrui transmisso, e depois o jogo mais moderno das ancestrais tcnicas do fazer-crer . .sem. essas tcnicas no h institui,&o, isto , no h ordem nem subverso. Se o amor do censor d ttulo a este curto trabalho, esta referncia est a para lembrar, segWldo o estilo ingnuo dos tericos medievais da Lei, fundado res no Ocidente de uma medicina da alma, que o fo.der...tQSpor esse prodgio, o oponente pode ser defmido como um culpado, e o erro, como uma falta . .

    , pois, por esse vis particular: o Direito, reconhecido como a mais antiga cincia das leis para reger, isto , dominar e fazer caminhar o gnero

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  • humano, que eu abordo o estudo da instituiyJ'o. No qual veremos os tcni-cos das propagandas ocupar a coloca.!o prestigiosa, outrora reservada s diversas espcies do jurista. O texto dos ancestrais foi transmitido; por vias que se tornaram obscuras antropologia, ele foi recebido nas organizaes nacionalistas dos tempos modernos; com suas belas peas originais, toma-das do Direito Romano e da teologia crista', ele prossegue sua carreira, transfonna sua lngua, melhora e desenvolve sua casustica.

    Evidentemente meu recorte do parcal, porque nao tem a inteno de considerar o todo da instituio, tal como os Ocidentais a const ruram por detrs de uma cortina tradicional, cujos elementos roma-no-cristos foram consideravelmente discernidos pela ftlosofia alemi do sculo XIX, e por Hegel em primeiro lugar. Com este ensaio, penso somen te em demonstrar o sepultamento dos temas que fundavam a crena no Poder na Europa medieval; temas progressivamente submersos pelas mais afve.i's interpretaes, e no obstante sempre presentes no mago do texto.

    com que .. 49 dQgm.a..Jiwo nessa gran-de parada social que chamamos comodamente um sistema &rfdico, e are-velar o ponto de passagem obrigat? rio de toda doutrina que enuncia a sub miSSfo: uma sexologia, para assegurar e justificar o poder dos chefes. Nes-sa passagem inevitvel, onde pode ser percebida, sob sua fonna delirante, porm estritamente ordenada no texto, a ntologia primordial recitada maneira ocidental, o Direito divulga um certo reiJle das crenas e se inau-gura enquanto instrumento poltico. Compreender oomo funciona uma manipulao to radical dos smbolos sexuais, a partir de tal saber arcaico, deveria:' ajudar - pelo menos o que quero esperar - a conceber mais cla-ramente os jogos contemporneos do dogmatismo na instituio que nos tem. Em ambos os casos, a psicanlise reivindicar que isso seja observado com mais atena-o.

    O presente trabalho se inscrexe na moyncia dessa empresa penetrar a camufla,&em Pari observar. o As ques-tes, ao correr das pagmas, serfo suficrentemente enunciadas, o que toma desnecessrio que neste prembulo sejam enunciadas uma a uma. Preferi-ria, antes, dar o tom ao leitor. Este livro n(} libertar nin&um, pois no pretendo mostrar o avesso e o direito das cartas. Assim como a psicanlise nfo se redz chave dos sonhos, muito menos ao suspiro de alvio que vem acompanhar a recusa de sua histria em tantos sujeitos de uma velha monarquia governada pontificalmente (eu falo da Repblica francesa), onde se reconhece, como eu sempre disse, a fatura ocidental de um estado selvagem ainda prescrito sob o regime industrial. Se h de fato aqui matria lgica, nenhuma cincia admitida para responder por ela, salvo a do juris-8

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    ta, que procede por uma liturgia regrada, com todos aqueles de seu cortejo, para selar a verdade. Trata-se, portanto. de observar um ditado teatral, a prestidigitao a fim de arrumar as nicas questes lcitas, e essa cena que nos mostrada : os mestres da Lei sendo presa de sua lgica.

    Assim..opera a instituio por intermedirios e por smbolos, para re-presentar o conflito. Nela se faz necessrio um discurso regrado , pontual-mente recitado, rigoroso em sua gramtica e que preserva a escaJa dos sen-tidos, conseqentemente, discurso ortodoxo e de saber. O indivduo, seja qual for, no figura como institudo sob os tiranos, nem cadver nem dor midor, mas realmente como portador de uma mscara que lhe cabe, sujeito flagrante de seu papel, repetido at o desejo de ser tomado por tal. Nin-gum escapa a semelhante adestxamento, pois a instituio persegue seus rebeldes e infligida at aos loucos, a todos os evadidos. "Todo mundo odeia a per-Seguio", diz um paciente.

    Eis porque esses paralelos, que fundamentam meu estudo, entre dois registros em que a instituio constitui igualmente problema, entre dois modos igualmente dogmticos, duas sobrecargas dtl censura no texto. Nes-se ponto, o Direito Romano vem, antes de mais nada, ajudar, j que ele o inventor da palavra famosa; .f!r'Siiiiio, que se tornou inaudvel a meus alunos, ignaros demais de uma .. cert';ecnica das coisas para perceber seu litgio com o heri legendrio , o imperador-telogo, o prprio Jusii.uWto , orculo a ser ainda conjurado por toda cincia social no Ocidente at Hegel e Marx inclusive. Interpretar a instituio primeiramente refazer a sua

    Se existe um meio atravs do qual se possa conseguir para o psica-nalista wn salvo-conduto nesse domnio em que vige o saber dogmtico do manejo e da oondulo do homem pela instituio, esse meio, o nico, con-siste em retomar ao texto. Bem como na experincia analtica se inaugura uma glosa e se ostenta a lgica, para repor em jogo ou fazer fracassar o conflito conforme o instante em que ele est em causa: a economia do mesmo sistema se reproduz, mas na escala e na medida macroscpica. O acesso .. .ao-.mago da censura , nos dojs cass. o acesso ao tema do text9, a

    de um discurso. Este ensaio escabroso deve, t ambm, neste primeiro momento de

    uma exposio difcil, insistir na importncia e na generalidade do discur-so jurdico. Procuro determinar a natureza exata das conivncias entre a ameaa de que se alimenta a ordem psquica e essa outra ameaa, no me-nos simblica e sempre. m.aq.uiada, que....funda....a...ord.em_de um poder so_ial .!., para um grupo humano historicamente designado e culturalmente identi ficvel. A psiquiatria h oje sabe, comeando a receber a formidvel lio de uma antropologia a princpjo inventada para convencer o negro a renunciar

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  • a seu conflito, que os quadros clfnicos se diversificam de acordo com as inmeras nuanas em relao s fonnas variadas do adesttamento humano. O que empreendo aqui uma suma de questes cujo objeto o de localizar alguma coisa no plano da selvageria ocidental e mesmo, se possvel e mais de perto, no plano de um grupo especificado,.o francs, a que chamo na-cional por falta de saber mais a respeito. Qualquer psicanalista admite tam-bm que na anlise, se o paciente nfo o nico em causa, a instituiio se entrelaa mecanicamente, pela nica razlo de haver esta estranha testemu-nha, o prprio analista, que sabe se calar ex cothedm e nlo ficar desanna-do, a menos que seja um ingnuo; a intervm numa situao que reproduz-e fabrica de novo os poderes magistrais conferidos ao Exco-

    --- mungador, segundo as necessidades de um grande processo. Enfim, se faltasse a certos leitores uma justificafo que tornasse

    - plausvel minha empresa, eis mais uma prova. Este livro representa o ins-- tante de urna conclus'o. Concluo que existe, do

    :.; :.' aljmentados pela tradifo ocideota),um por-baixo proibido, a moa de uma _::j; cincia infernal. Sua mxima, que me foi vrias vezes comentada por um

    deles, est nestas linhas: demajs como tocar piano com um Semelliante graceJO, nws profundo do que diz, visava a dissuadir

    do esforo interpretativo, tido com ilcito, isto , subversivo para alm de uma certa fronteira familiar designada como intransponvel. Por muito tem po este interdito me foi sibllino, inapreensvel em suas razes como em suas defesas algumas vezes expostas, a propsito desse ou daquele trabalho de minha lavra, sem discrio. Mas, pouco a pouco, o n. A fre qenta dos glosadores medievais, uma experincia de tecnocrata passa da no deserto africano, depois a aprendizagem da grande obra psicanaltica deviam contribuir para precisar os termos de um debate regrado, eludido sob a aluso, experimentalmente reconstitudo em Nanterre onde me foi singularmente proposto o velho paradigma do Direito e de seu Terror: ali foi reproduzido o texto dos Padres por novos clrigos adestrados na imemo-rial Universidade e falando comicamente de herdade, sem se dar conta do simulacro; admirveis cenas em que foi repisado o mais antigo repertrio, do qual os estudantes-juristas e seus professores sabiam, por instinto, en-contrar as liturgias. Na querela cannica, recitam-se vrias e so representados papis de Romanos.

    Tratar isso seria portanto reabrir a pesquisa que tem relafo com o jurdico. No ter como abolida a arte da glosa, mas aprontar para nosso uso as tcnicas da referncia. deefrar-lhe os sjlncios. apreender o sentido e o contrasenso, o texto e seu dialtico, a palavra de um doutor. Semelhante tarefa vem apoiar o longo trabalho de Freud, o qual na:o pode 10

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    ser continuado ou retomado sem levar em conta os longos encadeamentos do dogmatismo; tambm deveria sugerir a mais de um analista, preso na rede de seu prprio desejo, teis observaes sobre o modo de emprego da lgica, sobre o alcance do caso em psiquiatria, talvez, enfmt, sobre o enig-ma a respeito dos seguimentos da psicanlise em face da histria continua-da dos procedimentos dogmticos no espao cultural europeu.

    A partir da, o tema deste trabalho introdutrio ganha seu lugar, e seus desenvolvimentos se propOem. na:o como contribui4o terica. mas I como Vrios problemas considerveis j se acham reconhecidos, designando por grandes massas uma matria muito vasta, abusivamente negligenciada. Desbaratar esta trama nJQ coisa de pouca monta, pois se op&m a essa tarefa as censuras em uso e a carncia dos pontfices wstwos no cafamaum universitrio. E por isso que este livro mio foi publicado sob qualquer divisa.

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    I Desta Glosa a Freud

  • Introduzo sob esta rubrica nada mais nada menos que a definillo preliminar, uma exposi.llo dos elementos maneira da antiga retrica, que sabia coagir o aluno a seguir um sentido obri&atrio-. No se entra na casa dos legistas (outro nome para identificar os juristas aos tcnicos da Lei) c:omo se entra na casa da sogra, sem ser apanhado mas, pedindo emprestado o desvio de um acesso matria- o occessw ua materiam, di-ziam os medievais - , por conSeguinte, a via tra ada, admitida de antemo. Pua facilitar a virada e mostiar bem, de sada, que o estudo da tradio y juddjca nio pode atingir o ncleo das coisas sem transjtar por esse lado onde est o psicanalista, necessrio marcar uma primeira interrupo quanto referncia a Freud.

    Antes de mais nada, entendamo-nos sobre um ponto. Este trabalho n!o tem por fun e nfo ter por matria voltar histria das concepes

    tenses no seio do primeiro grupo freudiano em que o tema da foi enunciado repetidas relaes de Tausk com Fieud, por exemplo, mereceriam, do ponto de vista de sua tragdia fmal, novas observaes, colocando diretarpente a questo do conflito em termos de instituio1 A nosso ver, a persistncia e a gra-ridade das dissenses en tre analistas, ligadas ao fenmeno do culto supersticioso dirigido para a pessoa ou para os escritos de Freud, aqui e ali, mesmo na opinio menos:# informada, manifestam seguramente que a psicanlise constitui problemas no QPe diz re.weito cincia e ao poder. Por mais interessante que seja, este grande caso nfO pode ser aprofundado aqui, o propsito visa reconsti-tuil a um s tempo o invlucr"-do doW'atismo ocidental, do qual se ex traiu precisamente o discurso freiimm'

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    sobre a matria institucional, que considero insuficientemente explorada. No proponho, em parte alguma, precipitar-me na direo de uma doutrina da evaso em que os saberes venham perder suas cores e suas propriedades, como qualquer um hoje pode constatar na vala comum das disciplinas universitrias. A instituio ocidental e o dbgmatismo que a solda nilo se deixado em um coquetel de anedotas histricas e de transgres soes analticas. Esta observao justifica tambm uma refleXfo sobre o pro-jeto de meu comentrio a partii de uma releitura de Freud.

    Reler Freud, a ftm de relevar em sua obra os lugares principais da questo, e para fixar as intenes: aspirar. ao sentido das sob sua co bertura jurdica, trabalhar para descobrtr o modo operatono comum qualquer desentemu a relao que liga a psicanlise . tradio do Ocidente ainda presente atrs do advento das grandes burocracws. Trata-se, portanto, de precisar a nserlo do estudo, ao mesmo nos confms da obra freudiana, ali onde cessa a estrita relao das analises, e no centro da teoria que rene entre si os mais diversos casos clnicos. . .

    Enfun, devo acentuar a importncia de meu recurso aos medievaJ.s, vrias vezes louvados em meu livro. Sobre isto, h ainda vris razes que enunciarei mais adiante, no decorrer de um descritivo tcnico sem o qual as formas ocidentais do dogmatismo , por conseguinte, as invenes do

    '-. saber para fazer amar a submisso, permanecem incompreensveis. O leitor est em condies de navegar por ae . mas preciso que aqui, ao abordar mos esta matria rude, no hesitemos quanto Idade Mdia, ainda essen cial. Certamente , todo ataque dirigido contra o obscurantismo impressio nante por aquilo que nos mascara, e a rejeio dos medievais fora da modernidade (do ponto de vista do discurso sobre o Poder) contmua sendo uma extraordinria trapaa. Leiam, ento, Kafka: o glosador reaparece nele com todas as letras e vem ordenar a fuzilaria. Vamos parar de rir da Idade Mdia de suas tcnicas do obscurecimento, sempre eludidas, pre sentes: Seria preciso desfazer esse qiproqu, e eu me empenharei nesse sentido, nos captulos que se seguem, retornando ao discurso me?ieval do mtodo, que trata efetivamente da instiJuio e do processo . :rectSo centar que i!.&Losa3 . corDf' retornadi )iterai do t.exw, est no a.mago da p Sl canlise? Indicarei, a tambm, o estilo convemente para mampular tal pa-ralelo.

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    I ONDE FREUD PODIA VER A INSTITUIO

    Uma preciso quanto a meu ajuntamento de referncias a Freud a fun de introduzir, do modo mais simples, o curto tratado que publico. No tenho a inteno de fazer aqui um sumrio exaustivo, e nada pode dispen-sar o leitor, se ele amante de quadros completos, de recorrer, ele prprio e por sua conta, a esse ndice enigmtico das Gesammelte Werke, onde se intitula a matria sob as mais diversas rubricas4 , mostrando a riqueza das aluses a quem quiser collier bem as palavras, de passagem por esse alfabe-to. No se trata tampouco de empreender uma historiografia que ensine Freud a Freud, e que aborrea sua obra para contabilizar seus bons tre-chos. Bu me interesso pelo que Di obra incisivo, por retraar o procedi menta que. por certas vias, conduziu Freud a lembrar incessantemente a extenslo l&ica de toda anlise e a subverso que nela se anuncia, em relao ao que necessariamente, em cada experincia analtica, ali no est, e que se encadeia com a ordem urversal das censuras.

    O texto freudiano se inscreve, portanto, segundo a apreenso de meu Jf: estudo, como a contrqdogmticll no mago desta maquinaria designada pe-lo termo geral de termo domesticado tardiamente pelo prprio Ocidente, aps a radical defm.io que lhe foi dada outrora pelos medie-vais5 . Em virtude disso, todo o corpus freudiano alcana um estatuto espe-cial na classificaao das espcies do saber sobre o homem, porque ele enun cia a ruptura com os tradicionais. Observamos, por conseguinte, essa passagem em direo a uma nova demarcafo das cincias - passagem evi-dentemente marcada pelo trgico para o prprio Freud - , fazendo surgir a psicanilise (tal como adiant'

  • que se desenvolve a t6cnica moderna de se chegar aos segundo as antecipaoes de um Buffon, quando ele fez resplandescer sua aritmtica moral' ; o sistema do vellio Direjto e seus vestgios galicanos se viram entllo desqualificados por um negador jamais visto, nfo mais o mas o naturalista. Onde estio, em nossos dias, herdeiros do jurista medieval? Na tnnsposia-o das mscaras e no grande qiproqu doravante alimentado pelas famosas cimcills hUI1fllfllls, meu retomo Idade Mdia, da qual tra-taremos mais adiante, aposta identificar alguma coi.sa no debate, que desde

    urna dJrefo nova, sobre um tema fundamental da institui-

    A censura, isto , os bons meios de enterrar o conflito, segundo as exigncias de um duplo jogo e1n que se realiza a funfo vital de mascarr a verdade. Para compreender que os textos jurdicos podem, tambm eles, ser interpretados de acordo com esta proposifo, voltemos a este artigo de mtodo: cqmo dae se lq ullJl ceruura?

    A. Primtila notalo: a grrmde amt!lla de !tlber demais.

    Neste lugar da histria, a Frana e outros pases onde se desenvolveu a rellgifo catlk:a do Poder, pases profundamente marcados por uma pol-cia particular dos bons e maus livros, dos bons e maus autores, etc., seria ainda bastante vantajoso refletir sobre a perseguilo - uma espcie de damnatio no estilo antigo - que cercou de incio as descobertas e a temti-ca de Freud. Nesta zona de desenvolvimento humano, onde a ruptura nfo aparvel havia sido hi pouco conseguida pelo trabalho e pelo sofrimento de Galileu, o vasto problema da boa cincia (originariamente oposta mi cincia, divulgada pelo hertico) deve ser considerada sem leviandade. Co-mo a fsica moderna, pela mesma brecha aberta, depois alarpda, a psican lise se investe contra o qiproqu da F, de uma cincia fundada pela teo-logia, contra o modo tradicional de sua propaganda, contra o fechamento do saber sob I;IJll magistrio universal. Como1(;allieu, e por procedimentos jurdicos ou polticos adaptad;, 19

  • confundir entre si as diferentes reaes negativas provocadas pela invenlo analtica e suas conseqncias, do ponto de vista dos ressentimentcs de que a Regra institucional a!!rome a recuperao a fim de captar-lhe a ener gia e de oferecer substitutos plausveis aos indivduos. Muitas nuanas deveriam ser introduzidas. As reaes em causa sem dvida variaram muito de cinqenta anos para c e, mais ainda, depois da ltima guerra no inte rior desses aglomerados nacionais onde se constituem os dogmas nacona listas cuja exata consistncia sempre se ignora, com excea-o dos juristas (pois, eles, pelo menos, no podem se deixar levar por semelhante ignorncia). Os Direitos nacionais, como as lnguas, acarretam as diferenas e fixam as distncias antropolgicas. As aladas das censuras nacionais nlo so intercambiveis, e se deixar lograr a esse respeito diz, precisamente, muito sobre as renovaes do dogmatismo em nossas soce dades dominadas por wna chantagem doutrinria e pela mais cnica manipulal'o publicitria, proclamando a universal abolio da histria. Sea m&ito til reexaminar. pelo vis ills vellios nacjonalisroq_u das grupos humanos a seu adestramegto tradjciona1. Exatamente como o recente fanatismo que nos fabricou um Freu4:pontif}ce, as resistncias psicanlise tambm apresentaram diversas variantes.

    Essas resistncias, de resto, permanecem para ns interessantes de serem lembradas, enquanto recusa primitiva que.vem enunciar, da maneira majs radical, uma negao essencial. A evocao de que as teorias sexuajs estariam em estreitas com a cultura e sua cincia do adeS1Jamento poltico. p[OVQCOU um &fDde pavor. Seja em suas exposies especialmen te consagradas a explicar seu prprio desafio, seja no curso de seus relat-rios clnicos, Frd pde notar esse ponto de gravitao de toda a oposi llo: um suposto constatado como delito de ultraje cin cia. A psicanlise v o sexo por toda parte. Este aforisma tinha acotq.1da na Frana, at bem pouco tempo ainda, em alguns meios universitrios onde o reflexo ancestral do respeito ao texto se rnartifesta de modo mais claro, e em particular, junto a especialistas de certas matrias jurdicas (no todas) ainda ensinadas medieval; o fato merece ser realado, pois ele eloqente e verdadeiramente notvel. Que haja fmgunen to no h dvida, o menos erudito em nosso assunto justificaria isto; pois a maior parte dos contradito res que manejavam com admirvel destreza o argumento do escndalo nfo havia lido Freud. Essas reaes funcionaram mecanicamente. Talvez fosse til remeter a uma das passagens mais claras de um artigo menos conheci do, no qual Freud resuna em algumas pginas concisas seu ensino: "O que a psicanlise chama de sexualidade no de modo aleum idntica impul-so Q.Ue aproxima os sexos e tepde a produzir a volpia nas vnitais, 20

    mas, antes. ao que exprime o termo eeral e compreensjyo de Eros no Ban-quete de Plato"8

    ' . . um pouco o truque do tema do Eros. Este lembrete pos-sw virtude de assinalar este outro ponto de importncia: a longa rneditaao de Freud sobre as tradies da cultura, s quais se relacionam necessariamente nfo s a regra corno a cincia do Ocidente. A psicanlise nelas intervm quandg apjna)a Q1K..D sjm)J!ic;g se coloca.para simular o verdadeiro conflitQ Que nw est l. Seria preciso me-todicamente retornar a esse plano de fundo vital, ao arttigo viveiro das cen suras ocidentais, onde pescamos tanto de nosso instrumental normativo inclusive, com certeza, um velhssimo Cuide des ggars (Guia dos perdi: dos)9 , com o qual infalivelmente se colore a velha medicina alienista, que, de bom grado, busca urna moral e tradiOes; o dogmatismo por toda parte traou seus mapas, designou os lugares da correo ou da recuperaI"o, des-creve o caminho desviado para toda verdade (t7ames veritatis). Alis, obser-

    a de agora, pela fora das coisas, o saber tradkional nlo pde de abnr a questlo fundamental do sujeito, nem de mostrar qw: a

    Le1 recebe da ordem flica sua legitimidade (doutrina do pecado, nanar-rao das origens). A teologia dos Padres fornece, em vrios registros, seus snbolos riqussimos. Quanto a isso, remeto s exposies sublimes de Ambrsio e de Agostinho sobre a cola ou o prego da alma, de que tratare-mos mais adiante, em tempo oportuno.

    . Ao jogo de um fmgimento e s pudiccias complicadas de que fizera especialidade sua a oposio psicanlise h algumas dcadas, e graas s quais se conseguiu aqui e ali fazer pesar sobre Freud o desejo de espetar o

    por toda parte, o leitor se abster de objetar a menor ironia. A psica nlise chegou ao oco das hecatombes e do apodrecimento de que a ins-tituifo cristf no pode se restabelecer. Entre o discurso antigo e medieval SQbre a censura, e o discurso do burgus balzaquiano ou weberiano, um vazio progressivo, a histria de uma perda ao termo da qual emergem duas extremidades, a Jawum asilar e a oolcja qdminjstrqtilla, singular mente pelas instituies leigas da sociedade industrial Quanto censura social, de que d testemunho a organizafo cultural, a psicanlise, surgida da intuitro de que esse vazio nfo vazio, supu ta sob as variveis dos tem-P_OS e dos lugares, a invariante de uma estrutura fundamental. O artigo j Citado de Freud constitui um interessante testemunho sobre a situao a que tinha entlo chegado o universo ocidental dos signos; eu saliento ainda estas linhas: ''A .. .a (de que trata a psicanlise), porque sob m1tru aspedoulua.fo tem a cons-cincia tranqila. Ela comeou por se colocar um ideal de alta moralidade,

    21

  • a moralidade sendo a represdo dos instintos, e exigiu de todos os seus membros que real.i.zassem esse_ ideal, sem se inQuietar com o que esta obe djncia pode custar aos jndiyC4y9s . .Mas ela nlo nem bastante rica, nem bastante organizada para poder lhes oferecer wna indenizafo proporcio-nai sua renncia. O indivduo , pois, levado a encontrar um meio de ar ranjar para si uma compensafo suficiente e que lhe permita conservar seu equilbrio psquico". Mais adiante, isto: "A psicanlise revela as fraquezas r dew sjstoma recomenda seu abandono. Ela sustenta que preciso afrou-.xar a rigidez do recalcamento do instinto e dar, por isso, mais lugar vera-cidade ... Por ter formulado essas crticas a psicanlise, inimiga da civiliZil-

    1 pio, foi banida como perigo pblico"10 - Empreendo, do ponto de vista desse quadro sinistro e sem dvida

    mais realista do que hoje se quer acreditar, apesar das aparncias de Ubera-ao, trazer mportantes precises a esse diagnstico sobre uma histria emi nentemente complc,;xa. As sociedades que fizeram o Ocidente desenvolve-ram - ser preciso lembrar - uma tcnica da sub.mi.so sobre a qual, no sculo XX, fazemos uma vaga idia, em vi{ tude da laicjzacfp da funan . de censura e dos de pensamentos novos em contato com as dbl cias ditas humanas e sociais O empreendimento analtico foi inventado quando o dogmatismo de remota poca e seu sistema penitencirio 1e encaminhavam para uma fase aguda de SQa crise. A instituio antiga, enunciada no texto dos telogos e dos juristas,"pretendia assegurar a niza6o , pretenso bem enfraquecida na sociedade liberal de que Freud nos d a &ombri descrio, nlo sem ter percebido e explorado em outro lugar seus fundamentos es:senciais. Mas bastaria um .. a mais de veracidade" para desfazer a dramaturgia de que se alimenta essa institui"o ininterrompida, ali onde foi banida com tanto clamor a psicanlise? O que isto significa para ns, herdeiros diretos do discurso dogmtico? Vendo como se defen de a mitologia da onipotncia, como se reconstitui a lgica dos desvios do sujeito, coneo do. aprendidos a tirania das leis e o qiliprqu do rebelde, resta pouca margem dvida. A resposta dfto est na expanso dos sistemas burocratizados, portadores do KJMde presente da Beneficncia, aptos a medir a totalidade do conflito como para recuperar a ameaa de saber demais sobre o sujeito e sua religifo do Poder.

    8. AnalgiCtJs - a ordem e sua revelao.

    Um ponto que se deve ftxar bem, a fim de situar a psicanJise em face desta realidade que nomeauaos instituio, conceme diretamen 22

    .,

    !I

    te fonte das observaes freudianas: a relalo dos casos clnicos. Remon-tando este caminho de Freud, perceberemos sem difiCuldade que o estudo que visa a instjtujfo social atn1s da trincheira dQ&Wtjca deve vol-tar a esta narrao

  • portanto ser tomada ao p4! da letra de seus smbolos e segundo sua funo na grande obra institucional que trabalha para escamotear ou reduzir o c.le-J sejo.

    . ei.s para um termo chave, a de convencer o leitor de que, na mshrmw soc,al como na neurose ll40 estamos lonu do

    '4' dor de feitios. *0 trabalho do jurista (depois, o de seus sucessores hoje na

    empresa dogmtica) exatamente a arte de !nventar as palavras ,. > > zadoras, de indicar o objeto de amor hndl! a poltica coloca o prestigin e de manipular as ameaQs primordiais; e ainda a, se efetua um retorno a Freud, reconduzindo a seu nvel verdico o pavor conservador do brocar-do : "O trono e o altar esta:o em perigo"J3 . Quanto cincia que conside-rada tal pela prpria instituio por seus cientistas qualificados, em seu en-cargo de repre:;entar ir.laginariamente o objeto real do dese]u estipulando uma sexnlogia para todos, ela se intitula tradicionalmeute sob as rubricas da F da qual ela procede em linha reta, graas ao jogo mais ou menos sofisticado dos smbolos de (Pai monarca e pontfice); por esta

    constante ao objeto do desejo pode operar a para difundir pouco a pouco a legitimidade, prodigalizar seus seguimentos, arti-cular a Regra e desjgnar o jgiJgiao . No indispensvel retomo ao texto freu-diano, aqui se impe mais particularmente a releitura da sntese consagra-da teorias sexuais infantis, pois essas pginas podem constituir uma uti lssima infioduJo ao processo mais primitivo da subm.issao14

    Um ltimo comentrio a meu tema AnJZlgicas. Eu tenho com isso a inteno de insistir tambm na dificuldade da empresa. O destrinarnento da embrulhada institucional no est terminado para o Ocidente. Por meios incessantemente renovados, o dogroatismo reconstitui seu abrigo, mesmo hoje com acontribw:ro das cincias humanas/sociais. Com a con-di!o de identificar claramente os d:!spojos tradicionais e as tcnicas de sa-ber da propagalo, a pode Cntribuir preciS;lmente para mostr-lo, isolando algumas molas lgicas elementares.

    C. A Igreja e as estrutura.s libidinais. NotaiJes sobre a referncia de Freud instituio latinJZ.

    A atenfo voltada para o fenmeno da organizafo religiosa para ns de um imenso interesse, pois ela mostra que Freud havia descoberto ali

    Traduzimos fetiche por feitio porque a palavra de ori&em portuguesa (N. doT.).

    24

    "'.

    ;j

    um acesso privilegado aos problemas especficos da institui:Jo ocidental. Meu comentrio vir portanto se enxertar a sem dificuldade. Entretanto no seria preciso procurar no descritivo freudiano mais do que seu autor colocou. Os desenvolvimentos sobre a Igreja primeiro, depois sobre o exrcito (sendo este aqui menos importante, salvo se j for o momento de estudar a solidificao dos sistemas burocrticos cuja prtica se inspira igualmente no modelo .mili1Jr), se fundamentam em consideraes gerais, estimuJadas pelas circunstncias, no sobre um estudo verdadeiramente puxado da tradio; as pginas, frequentemente citadas, que tratam da or-

    das massas, constituem sotnente um apontar para as questes

    .J - " ""' .,,

    em que foram adiantados alguns conceitos ainda diretamente utilizveis.

    . '

  • es15 Sempre moderna, sempre tradicional, os dogmatismM e .1Wl$porta ainda...PQJ..Jab...nossos olhos, seu um reservatrio de mjtos fundamentais (sobre bjeJJrquia, sobre .o chefe, sobre a classificao social) que poderamos acreditar perdido para tempre, e com os quais a antropologia deveria se ocupar mais, se por acaso ela te dispusesse verdadeiramente a os aglomerados humanos da Europa latina.

    Aps ter recoohecido o alcance historico da experincia religiosa (e militar) na formalo do inylucro institucional no Ocidente, o conceito freudiano de modelo (Muster16 ) permite esclarecer a compatibilidade da referencao psicanaltica com o enigma da formao de massas (das Riit sei der Massenbildung): formaes estveis e altamente organizadas, a insti tuio em suma, da qual podem existir tantas e tantas espcies. Aprofun dar essa idia permitiria compreender a lgica das relaes entre esses dois universos aparentemente to distantes um do outro: o sujeito, presa de seu

    conflito particular, o texto da Lei no qual se agencia a verdo social de um drama poltico original. Compreender os procedimentos e a na_tureza das correspondncias, eis a utilidade e voltar a essa nolo,"hoje bastante ba nal, apesar da matemtica que ela encerra: o eodelo. Freud se serviu bem desse espelho, cujos efeitos captou, precisamente quando levantou o que naS religies problemtico no que conceme a qualquer analista.

    Notemos que a relidlo coloca brutalmente a quest!o do tuando a pretenso do fazerger de QPC vive a Primeira garan tia de uma conquista dos sujeitos pela Lei social, de uma cincia dos cos-tumes pelo Direito, como dito desde a Antigidade. Testemunho de Quintiliano, retomado por Kant em um famoso tratado onde se aclia de

    ''" nunciado o habitull desafio liberal: "Se existem os deuses ou no algo \ t ;\ = sobre o que eu nada poderia dizer.,17 Na boca do legista, esta mxima _ um fmgimento; vb1o que looos os sistemas institucionais adiantam sua

    . "' . ., ... teologia, ainda que seculai e radicalmente leiga. rf .,:J Fnmd confirma por sua vez tVJC a questo poltica cmineotemeute

    ao abrir. o processo da Verdade. Mas ele precisa a matria do de-bate: o desejo em busa de seu ayalsta. Com isso possvel pegar a psican Use no mago de sua contradifo, a de ser um saber que rompe com o trato. A instituilo tradicional , efetivamente, suportada por um discurso de ex

    pela cincia do (em nossos acobertada tambm : t-1 ditas cincias humanas-sociats), colocando a 1.&1 ofo como um lugar tp1c0

    10. \) de aprUjpoameoto do dCscjo, mas como idia da felicidade. Por ter mostra-do nesse qiproqu a operao de um e aberto dessa maneira a via de um estudo que designa os rituais antigos do Poder no Ocidente, o texto 26

    freudjano na-o teve lUJU na classe da cl&lcia ooltica, tJo estreitamente gada ao mal-entendido da na Europa catlica.

    Voltarei muitas veus a esta realidade essencial: a complexidade e a desmedida aparente dos subsistemas jurdicos, desses Direitos nacionais di-retamente provenienle$, em grande parte, dos desmembramentos. do siste-ma eclesistico (ele mesmo alimentado pelo Direito. recebido do Imprio romano), estio em relafo com a capacidade de recuperao outrora obti da pela Igreja latina. Um modo unlrlo de classi.ficaao para repartir os rebeldes, o milagre permanente da subm.isso, a fora de da .lll desordem jurdica, estes elementos assinalam a perfeio regrada do equ-voco. Onde se inscreve a suprema refe"ncia ao Pai onipotente, segundo f sua fuucio de aferrolhar epe cogWnto do qual ningum, absolutamente , ;. ningum, sai, sen:io por escapatria definida, e sob a rnscara obrigatria \J.' do exromnuaado c dp lpuco dp qjmjnoso e daquele que perdeu os sen-tidos. Em outros termos, diversos paralelos, atravs das observaes sobre

    deviam permitir a j!ientificar. na submisso instituilo, o amor da e suas jogadas, determinados sob o rigor e a coerllo de wna simblica das mais precisas e das mais claras.

    Se a mecnica doo signos da qual a psicanlise tira aigumeotos permi-te assim passar de um universo a outro graas casustica do conflito, per-cebe-se a importncia de uma mjtoloida do Ausente na instaurao da cren a nos poderes de um Onipotente, e na comunicafo da regra social pouco a pouco at ao ltimo sujeito. A sacralizaao da ordem se mantinha junto da cristologia tradicional, isto , a teologja do Chefe (de que se apoderou o discurso poltico), que a figura para despojar os humanos em benefcio do Poder intocvel ao qual oferecido o desejo. Ter entrevisto esta inicial da organi.z.a!o monocrtica no Ocidente continua sendo uma intui!o oonsider"el, pois se deve relacionar ao dogma supremo do Cristo padre e rei (dogma eficazmente traduzido peJos juristas) o estabelecimento da grande diferena entre pradma e pra-baixo. por a que se concebem ao mesmo tempo a ocultao da cincia que tem de tratar do Poder e o limiar do no-transponvel que distingue, como queria dizer muito bem Plato, o pastor do rebanho. Mesmo nos Estados industriais, aps as belas invenes da teocracia pontifcia e das monarquias nacionais, a aluso ao Chefe ado rvel garantiu a selvageria original do Poltico. "O nomem fraco no pode ter a pretensfo de se elevar grandeza de alma e fora do Cristo"18 Lai-cizem o aforisma freudiano e vocs tero, convenham, a mxna de um Es tado napolenico. Eu digo: naplerco, como diria: cristo; nos dois ca-sos, o smbolo a est, o de um Mediador que detm o lugar da Verdade.

    Alis, sob a rubrica do estilo antigo das obedincias que nasce a 27

  • questo de dinheiro, com a qual desde a Antigidade os juristas se espan-tam, hbeis em distinguir o bom e o mau, o limpo e o sujo, em sua classifi-cao das proftsses liberais e das obras servis. A cincia econmica teria neste momento sua palavra a dizer para nos mostrar como foram seculari-zados os smbolos. "Eu aprendi escrevia Ereud_a Eljess, que nosso velho Mundo J'C.idQ pela Autoridade. como o Novo pelo Dlar"19 Acrescenta-rei portanto esta notao: que a lgreja e sua Lei cannica nos presenteiam com um Ocidente anterior ao capitalismo, estipulando que o dinheiro no faz o milagre, pois ele sujo e run. Proposies enigmticas da tradio, eu concordo, e cujo exame, num outro estudo, retornarei sob a divisa do crime arcaico de simonia, a fim de marcar seu alcance primeiro e de seguir a boa via dos casustas da Renascena, em seus esforos de para se desembaraar de um princpio tfo ruim20 .

    Depois olhemos como nessa Igreja, e sob a gide do Chefe divino, se enraza o vnculo social: "e com profunda razo que insistimos na analogia entre a comunidade crist' e uma famlia, e que os fiis se consideram como irmos no amor que Cristo lhes dispensa". Com este o Cristo reinando h indivduos que se achjUD deaes yncylos: so os que no fazem parte da cornynjdade dos crentes gs que nl{o amam o Cris-to e que s4o amados por QJJe urna religio. mesm.Q_quan-do ela se qualifique de rcligllo do amor deye ser severa e tratar . .senumor todos aQueles

  • ,, ! I

    2 ARTICULAR UM SEGUIMENto

    Se a experincia analtica predispe seg_uramente a llentralitii b o de uma ordem a que se compreenda a tea que ra no set ' d pOem

    relaiO entre as duas cenas, aquela que se v e a e 1se seu

    para um sujeito as mscaras, n!o est no rung m au en todo o r o repet;rio como se lhe fosse penmtido responder . .

    P pri se inaugura, com efeito, a instncia comum - a ClVWlfo, gruculpG.- a _qufe ud _onde cada wn um outro sujeito, governado em um f' '"' tura, rl;7 re sura pro-. -- --?;j domesticado sob a &ide das Lets e por uma cen .

    cdar o, d Ordem natural do Direito23 . Se o texto freudJallo, a nuncta segun a . ecem nesta obra despet'to das passagens coraJOsas que volta e meta apar . . . . a d' por que Vlas prea . d el designou correspondncias n o JZ consa erav 'cavam os dois crculos, nem pretendeu liberar, neste ponto, :: seja. entfo, as verdadeiras dificuldades deste estudo e a charlatanice de vanos. .

    Entre essp grandes dificuldades, na empresa de dar a F ud reciso reconhecer em primeiro lugar aquela que estar pnnctpal

    re p estfo aqui a de convencer que a psjcanljse, nesse espao de mente em qu T ue ela n"'!L ...... .. tenninado da histria latina. reinventa e q _ .. ,."" .....-. . - ,.,..m nrumto ao fim dos fins. Entretanto, nfo a encontramos ..._ emanCI&lJf nm.,__ ------ ? Ou t se

    j recuperada na feudadade dos mitos religiosos m?demos.. an es de 'aria fazer do analisando uma espcie de verdadelTO -o

    shakesperiano que futuca gracejador o tmulo - e que mta repetir \ idiotice: prnihid.Q proibir; na feira das sem a ::!:+ . a Micanlise mantm doravante sua banaca, sob o stgno .J menor - ____ .. _ -- . li

    ento rximo das leis, da runa das polCias, do amor vre. do p leYJanameote esses anncios do governo sorridente, No const_remos d il.d d constm!dos para djMjmular a tranja industrialista e propagar a oc 1 a. nas burocracias contemporneas. O texto freudiano se acha de fato mobili:

    I . da manipulaw em urna vasta empresa de desarmam eu zado pe os 30

    I I

    { '

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    . r : ! .

    to dos sujeitos; ele reaparece assim de novo, tratado segundo a ordem de uma tr.ldifo e recapitulado como parte do discurso ancestral A psicanli-se ronyoada para servir grande obra da submjsslo moderna. para for-necer temas tranqilizantes, para facilitar a divulga'o de superpropagan. das elaboradas em nome das irresistveis cincias humanas, etc .. . Esta con-fUdo justif1Ca um breve parntese.

    E voltemos ao constituinte freudiano da cultura, considerando o conceito do Superego;

    A. De como o Superego da cultura (Kultur-berich) no outro coisa senifo um discwso cannico.

    A nofo terica mais importante que Freud adiantara para introdu-zir a compreensfo do mecanismo institycional, anaJogicamente relacionado aos procedimentos internos da psique individual, , sem dvida alguma, a do SuperetQ. Este elemento, contestado to radicalmente por ocasifo das primeiras rplicas dirigidas contra a psicanlise acusada de aprontar a des-moralizaio das massas, por demais conhecido do leitor para ser de novo estudado ponnenorizadamente. Contentar-me-ei em trazer vrias precises indispensveis, lembrando o . peso dew definjlo de uma de jn!. gamento em que "se resumem ncmas rcla,oes com 03 pai "24 ' e que deve contribuir para abrir a via para um reexame do jogo concreto da instituifo encarada na escala de grupos especificados.

    Reconheamos a via de acesso. Poderiam me contrapor como obst-culo a extenslo do desvio de que me sirvo aqui, jil que comeo o estudo evocando, de safda, o estilo medieval das coisas, aquilo de que a maior parte dos praticantes da psicanli'se ou dos pesquisadores em sua movncia acrcditarlo potler se abster !em dificuldade. Certamente. Sados de seu ga-binete, psiquiatras ou nfo, demonstram muitas vezes a esse respeito uma ignorncia suspeita, estando eles prprios em causa. Faltam-nos, sem a menor dvida, excetuando-se insignificantes estudos sobre o estatuto SO cial dos analistas, verdadeiros relatrios que restil!Jam estes a seu crculo, evidentemente que nfo ao bom povo dos pacientes, com certeza incapazes de contradizer u narraes mais ou menos sinceras que inspira seu caso ex poat facto; eu suspeito que alguns de nossos testemunhos, imitadores de Freud, menos pontuais que ele e, sobretudo, menos informados sobre tradies da social, .. foram" um pouco, arranjam o casus 4 manei-ra dos antigos autores de questiona, tfo hbeis em lograr o estudante. Quanto estrutura dos arranjos da profJSSfo, sua Querela do Lutrin, ao

    31

  • sacerdotalismo com que volta e meia se envenena uma leitura do texto freudiano acolhido freqentemente como escritura de revelao, isto seria o suficiente , com certeza, para abrir uma crtica. Na verdade, que sabemos exatamente da psicanlise na prpria Frana de hoje, sobre suas curas de servio, sobre o sentido apregoado e o outro sentido? O que 6 que ela vem enfatizar na ordem da ameaa? O que que ela vem, por fim, fabricar nesta velha Nao galicana?

    Seria preciso pua ns primeiro reconhecer que a psicanlise est no n das grandes manobras institucionais, e que nem possvel ser de outro modo no momento atual. Ela se enuncia, por conseguinte, como segmento tradicional. Aprender a identificar seu lugar automaticmnente designado numa tstrica particulu um empreendimento bastante espi-nhoso, cuja importncia ser percebida pouco a pouco, a fim de compreen-der por um certo vis o prprio discurso analtico, o do paciente, o de seu Chefe, e tentar antecipar quanto ao futuro provvel da famosa cincia dos sonhos na sua relao com a instituio. Em outros termos, devemos oom-

  • deixar de nos dizer que o .. Isso" fala atravs d.o diseurso cannico e ape-sar da censura, etc. Ns s perceberemos melhor o lado alegrico {ou ma-termtco) da aludo freudiana e ao mesmo tempo o extenso trajeto a ser percorrido em direlo a uma teoria desnudada de obscuridades ou de la-cunas. O que nlo para amanh. Embora, no momento, abstendo-me de consideraes tericas, demasiado onerosas para este breve ensaio de incio dedicado a descobrir as grandes questes de um debate novo sobre o dis-curso dogmtico, f com que se note a importincia de usar em nossa matria o termo censura (6til do mesmo modo em um sentido bem prxi mo ao analtico, co onne a ocasifo). Famoso vocbulo, recuperado dos Romanos pelo Direito cannico a partir da Idade Mdia para o bricabraque das excomunhes, interditos e suspensesl7 , do qual os co-mentadores retiveram principalmente isto: que a censura uma pena, mas

    pena medicinal O censurado o em falta, segundo as formas definidas, e metodicamente classificadas como tal. Veremos, por outro lado, que a Lei. recitada num texto e pelos doutores, enuncia SU3$ I&J. todas as sms) reans referindo-se i OTdcm tambm.da

    . ftXada, dos smbolos; deste ltimo ponto de vista, o texto jurdico {outro ra apoiado na fantasmagoria declarada pelos telogos, hoje nas representa-es manipuladas pelas propagandas publicitrias) procede, ao mais alto :]P.'\ grau, de uma maquilagem, de arranjos que venham tomar plausveis e ine-vitveis as multo doutas dmotas do deoejo. O sistoma juddico funci_ono par" peneirar. descolorir e reco!orir. desttur e reconstruir mta a grande obra: adstrar para o amr .do }>Qdu. Em outros tennos, sob as pro posies algumas vezes delirantes de sua simblica e pelos procedimentos classificatrios da justificao repressiva, a Lei estipula, para sujeitos indis tintos e desconhecidos, um universo idealizado da falta (manque, n. do t.) e destina ao pobre-pecador-doente de sua falta (jaute, n. do t.) (mais tarde o cidado intercambivel da sociedade dita liberal) o benefcio de uma pg1a. de uma leitirna (fundada como tal pelo discurso) de que se espera a reconcilialo, acrscimo do ilusrio. A idia da._Sa]y.Jo est .. entre os juristas.de tal modo associada pena e ao bend.Wo .. moral, que fteq.entemcnte aproveitei. em bem-

  • ... i?: ..... ....

    ..J. t_

    este universo cultural que aqui est sendo problematizado comporta um estatuto fixado de anteno, essencialmente predeterminado, de todos os intervenientes da onipotncia, que receberam poder - um poder sgrado -de obter as respostas da censura. Indcio segundo e considervel da lgica, por toda parte presente na instituio.

    Enfim, o sistema textual pelo tema do SnperegQ.da .cultu ra orpniza o /uw comum rias penas, que vem precisar as condies nas quais o tratamento do rebelde pode ser conseguido e de que maneira a..p.u-niJO se acba eri&ida como palavra traoqilizadQra. Com efeito, o exco-mungador nlo se dirige ao delinqente, mas aos outros, e seu discurso re-grado, regulamentado na parte do Direito concernente ao processo, plei-teia a inocncia de todos pela instituifo que prodigaliza o perdo. Este o axioma de induJLncia, bem conhecido dos juristas29 , que coloca como mxima geral que o Poder impecvel e que a falta (faute) se organiza co-mo nolo abstrata, idealidade pura que defme algum objeto dramatizado e que passaria de mfo em m!lo at voltar mio da justia, ou seja, ao Mestre da Lei. A grande questlo real ou fictcia, e da cla$$ific.a!n dos

    assinala a utopia da dvida quanto ao fundamento ltimo da censura; o lugar de uma boa instituifo que no faa a partilha dos hwna-nos sob a protefo de um terror qualquer, o lugar da sociedade fraterna que tenha frustrado a ameaa, um lugar travestimento libid.inal, nega instituifo sua realidade trgica; esse lugat n'o existe, todos os juristas dirlo a vocs; os quais pelo menos conhecem sua Patrstica, sua cincia dos Padres. Semelhante tese oferece a mais frtil das confrontaes para a con-jectura freudiana sobre esta matria.

    Estas distines que introduzo, a fim de cercar os elementos comple-mentares que compem o sistema da censura encarada na escala da cultura ocidental, parecero, neste momento, bastante difceis, talvez mesmo in-certas ao leitor nfo previnido de um outro fato a ser tambm relevado: a distncia colocada entre o desenvolvimento visvel ou concreto das coisas institucionais (exemplo de nossos dias: o estilo dos conflitos no seio de uma burocracia nacional) e a rede lgica de conceitos de que fazem uso os juristas. Nada roemos evidente, com efeito cp1e a ligao entre a .ardem ma: nifestada aparentemente e a ordena:rg do por-dehajxo da censura, presen-te no texto, mas ilegvel sem o suplemento trazido precisamente..Q)a inter-pretafo que aqui est em questllo. Os manipuladores da Lei, especialistas nesta casustica graas qual a instituio pode viver e se perpetuar. exercem uma cincia se retomo, em minha proposifo, uma das frmulas mais felizes de I . Lacan, ao p da letra, pois os juristas, antigos ou moder-nos, e aqueles que hoje partilham de sua tarefa dos tempos clssicos, geral-36

    ,,

    mente Dlo sabem para que serve eaa arte consumada para tratar do (e o) conflito; alm do mais, o saber nfo o exerccio deles. Mas, uma das difi-CUldades fundamentais, ao abordar -o tenito onde reina como mestre o jw:i..a, provm da ignorncia crassa dos observado-res exteriores, por sua vez enfumados em sua prpria fortaleza e ameaados de nlo ver nada da transafo institucional, caso eles eludam ter na maior conta essa cincia sacerdotal e sagrada que lhes cuidadosamente oculta pela operao lgica da cultura. Por isso; preciSo logo evitar julgar apressadamente demais as proposies tcnicas provenientes dos legistas, proposiOes que podem pa-

    mpies, mai que so realmente enjiffiticas, quando vm se inscrever na gama dos prQblemas de interpretao que a psi-canlise considera, de seu ponto de vista e de suas posiOC$.

    A fim de provar que o olhar analtico nfo exclui a possibilidade de se obliquar em direfo a esse texto, ser til trazer novas precises que ve-nham ajudar os cticos:

    C. Onde pode engajar-se esta pesquisa: na identificao de um dogmtico, de seus portadores e dos meios de SUil defesa.

    Aqui est, portanto, ftxada para a exploraio psicanaltica, fora do testemunho cJnico, uma espkie de programa, utilizvel como guia, a fim de condUZir o estudo da instituia'o at ao ponto onde se possa ver qe efetivamente a Mi desnor;Wa o desejo, llissjmuia uma preside a esta troca de que procede todo discurso poltico. Sabemos doravante que a :[!, .. ,, interptetafo analtica quer investir um texto (o paciente) a ser l decodificadO seaundo a hjptc:SC mesma de uma reaJjdadC ohsc!lreCida por ' \:J trs de qualquer Unha de censura. Recuperar aquela realidade exatamente"f o emoreendJmento. Mas esse resultado final no pode ser obtido, na ordem da cultura, sem alguns desvios qtle dio sua importncia e valor insubstitu-vel aos fatos adquiridos previamente pela histria e pela sociologia. Chegou ento o momento de mostrar que, sem o domnio desses resultados inter-medirios, a pesquisa induzid_a na zona das culturas a partir de Freud pelos especialistas formados na psicanlise corre o maior risco de fazer fracassar suas tentativas de aprofundamento, particularmente em face da sociedade ocidental por muitssimo tempo preservada de um certo olhar cientfico.

    Algumas observaes sumrias vo ter como objeto os principais elementos referenciados como instituindo a censyra.

    Comecemos, 'portanto; novamente examinando o COIJ!O da cinia, na. forma particular do dogmatismo de que os Ocidentais fizeram uso. A

    37

  • histria erudita demonstrou o imenso alcance social e a diversidade das sapientes desde a Escolhtica; o Direito e a Teologia

    participaram ento do conjunto do sistema das jnjas. Hoje, esse fen meno tio bem constatado pelos historiadores (sobretudo graas a traba lhos que Slo quase desconhecidos na Frana) e continua sendo tio impor-tante para compreender a gnese da instituilo ocidental, que o crisol me-dieval ser mais adiante objeto de uma expllcaio especial. Observo aqui apenas a inquietao da maioria dos pesquisadores em psicologia dita so-cial, em antropologia ou em qualquer outro ramo que trate os fatos ditos de cultura, quando se evoca perante eles o empreendimento do velho dog matiSmo, em sua mecnica tradicional, aqum da Reforma e do Aufldiinmg, para o governo desses humanos qualificados oomo na&s, segundo um neologismo inventado pelos universitrios medievais preocupa-dos. em nlo se confundirem. Recusando de olhar face a face o jeito do es-p.rito do&mtico, inevitavelmente de encarar corretamente o tra o especfico da instituifo, ou seja, fmalmente a relalo que a se desen-volve em permanncia com a idia infantil da O e:ito dog-

    t o seu mais puro produto. Sem wn retomo, metodicamente preparado, A ordem origi-nma do texto, tio amplamente repertoriado pelos historiadores das Gran-des Glosas da instituio latina, fiem muito incerto se imiscuir na inter- pretalo do sistema normativo das sociedades nacionais da Europa onde devia emergir o Estado burocrtico.

    1' Quanto conduio da censura, podemos ainda acentuar que a orga-,.. nizafo ocidental desenvolveu em altssimo grau os recortes sociais da cin

    cia, classificando aqueles que sabem e os demajs. Apesar da atonia dos tra balhos de que dispomos a esse respeito, as indicaes documentais existem em grande nmero para justificar e sustentar esse tema essencial. O cresci mento e os arrendamentos da cultura foram assegurados desde a Idade M-dia, atravs das crises de todos os tipos e os desferrolhamentos revolucio nrios, com a cobertura de castas letradas, tipifkadas segundo os pases considerados, bastante comparveis no conjunto (principalmente na Fran-a e na Alemanha, apesar de evidentes contrastes) s do manda-rinato chins, alis freqentemente meditado (pnmeiro pelos tericos je-sutas do Poder, depois pelos reformadores da Burocracia Francesa). Deste ponto de vista faltam trabalhos, sobretudo na Frana, para apontar as posi-Oes mantidas pelos juristas, para seguir a c.rolulo das UaaOes .entre a cos-moaooia rc1igiosa (at]ica ou refonnada) e a jdcologia leplista,.para refe-renciar, enfim, por quais via:! ocultas o poder doiJurisW c doi tclogt, mantenedores do maneira dos uJems no lsll, pode hoje passar _ 38

    ,

    't

    I

    por outru Ddos, ainda que seja c

  • D. A instituio modenuz e o sepultamento das tradies.

    Com toda certeza, no levando a srio as tradies notoriamente reli giosas que foram, por muito tempo, o principal modo de expresso tcnico da censura social, estaramos ameaados de evacuar um fato hlstrico es-sencial ao universo ocidental e doravante tratado por preterio, a saber, o que chamaremos aqui a laicizpg SGJlETJ'ipda do djscug.g da l.ei. A esp-cie de abalo telrico com que foi sacudida a Igreja catlica ( cujo3 reflexos so tio importantes para se compreender o caso francs), acometida de au toperseguifo na descoberta de seus mitos, a eficaz propaganda do sorriso sob todas as suas fonnas, o estado de confuso das crenas a um blefe comercial, poltico e autenticamente cultural, em favor do i-i, da Nova Sociedade, do Terceiro Mundo, de Jesus.Superstar ou da Revolu!o do que tomou a Palavra, etc., so alguns sinais visveis, en tre tantos outros, de que a manpulaio do homem pela instituio prope doravante renegar as antigas reprimendas. Onde ganha relevo a bela mxi ma: "Todo o mundo gentil", ironizada por um cinema que deveria medi-tar a sociologia antiburocrtica, quando ela anWlcia o poder persontJlizado pelas relaDes humtJnas, etc. Pode-se, contudo, notar a extraordinria faa-nha de uma suposta ruptura, que consegue ao mesmo tempo manter em seu lugar o velho repertrio. Aqui est uma exemplar anedota disto, con-tada em Nanterre, alto lugar da transgressfo proclamada, onde se pde ver as juvenssimas Damas de Caridade desempenharem admiravelmente o papel de dar, sempre para se assegurarem de estar no primeiro escalo social, sem negligenciar conseqentemente a utilizao de um marxismo-leninismo (sic) de contrabando; era ainda, modernizada e atualizada, a antiga versfo como nos bons tempos do sculo XIX: "socorrer os in

  • .t . . ,.-' om todo adcmamcnto. Mas preciso ressaltar que a recuperal'o dos

    , Jndivduos humanos pela confonnalo institucional implica em exproprii-.\/ .. ;,;:,os o possvel de seu sentimento de culpa no conffito, em ofe

    recer-lhe, pro.fusamente, palavras tnnqillzadoraa. medida em que se '- descnvolxe c se apctfci0>a a mapipnln\l ,rridete. que eljmiu gQI(CS

    siyamcntc u t6cnica& terroristas d! Penitficla quo vismm frap.camente a fulminar o desejo, toma elementar e fundamental aasimilar a rep:esslo ttadilo. Esse qiproqu est integrado no texto da cultun por combina-eS extremamente lgicas, e todo o aparelho organizacional se encontra mobiliz.ado para propagar isto: uma crena pura e simples. pnciso oon-

    '-\ vencer de modo absoluto que o l'odcx se tomou bom e q,ue as t6cnicu no-'vas principalmente as publjcjtrlas. propOem evacuar a frustra.Qio, da

    ordem. Ontem, as pesaoas eram obscurantistas, subdesenvolvidas, etc., ago-' ra elas ompreendem e querem se amar; ontcm. .. a.AdJDinjstr""g CP napo-'J )enica, iodjferente, clv:ja de papclada.t ej., ap>n o Goveroo inteli&eute

    e &eotil. n1o fu;r.jla majs e ClJIC' que partijpcmus. Asaim, sob divcnas ma-quiagens, se acrescem as belas mxilnas, tidas como inditas. Ser?, pensar' o jurista, especialista das vuiaOes da Lei e das viradas de Jurisprudncia;

    - ancestral guardilo do zo, ele conhece suas etiquetagens e seu de exposil'o. Que a cMneia clssica da sen mais adiante) esteja desqualificada, n1o imPede as brilhantes renovaes de uma cincia numinosa que trata do Eltado sagrado e do grande medo que ele inSpira.

    _ Meu projeto nlo pode evidentemente desprezar tal escamotealo da bis----. tria. A cenSUill do passado, mesmo que estivel3e aparentemente desman

    chada DQ disQaan dogmtico Ode a iostitudo .CDcon1ra seu principal abrigo eU qo n liest.a pcsqW$8.

    Enfim, pode ser acrescentada uma 61tima observalo, tendo em vista acentuar a natureza do desvio quo minha glosa toma a Freud. O que distin-gue a cultura ocidental de algunw outras, conaideradas de preferncia pe los antroplogos como sendo apropriadas para pr i prova as teorias mais ou menos habilmente inspiradas pela psicanlise numinosa, cin cia do pavor), o fenmeno da Escritura. A instituilo se revela facilmente atravs disso, ininterrupta, identilk'4vel. submetida a certas part.kularida-des. A existncia dessas linhagem do texto, o imemo fundo de reserva de que dispOem nossas disciplinas de apoio (principalmente a histria jurdi-ca), pennitem uma aproximao metdica das superposies tradicionais, das quais me empenharei em tirar proveito com as precaues em uso (sen-do dado, sobretudo, a atitude refraria dos pesquisadores a respeito desse fundo). O sinal menos recusvel do sepultamento das tradies nlo seria a epistemologia oficial, a qual faz uma escolha estranha, sabendo banir a 42

    I

    I ;

    sobre a zona perigosa, mostrar, dedo em riste, tal quem se ap&a ainda a velha etiqueta dos Legistas burgueses que cataloga os .. mal-intencionados"?33 No primeiro escallo da documentafo mal repu-tada: o dtSQJoo do Direito annro mc:dicyal, que todos eles querem es-quecer, e ao qual deve ser reservado por conseguinte aqui mesmo seu lugar dehorua. .

    43

  • 3 FUNDAO DO DISCURSO CANONJCO.

    UM RETORNO SUA IDADE MtDIA

    Este livro lembrar freqentemente os estratos medievais do..4Qslna ' . tismo ocident.aJ; ele crise a Idade Mdia clssica como n da a

    partir do sculo XII marcada pela efervescncia da dialtica abelardiana, pelo renascimento do Direito Romano, pela composifo moderna doPo-der sob as figuras da teocracia pontifcia. Ent"o, nlo preciso procurar muito longe para encontrar o ponto focal para onde convergem a tradio e a lgica, tanto uma quanto a outra reunidas em uma gramtica, como ex-plicava Raimundo Llio em suas exposies vertiginosas em meados do sculo Xlll. Se quisennos realmente ver alguma coisa em nossa questo, so. bre a constituio e a transmisso do objeto institucional, preciso esro-lher este comeo: uma espcie de primeiro instante que tem seu alcance lgico at nossos dias. Cada vez que deve ser reconhecida, a ocidental enuncia isso perfeitamente, atravs de uma narrao da Gnese, que designa a era imaginria de onde foi arrancada, sem retomo, acredita se a cultura europia, que entrou numa via moderna a partir da Reforma,

    -.. capitalismo e das teocracias seculares. Mas essa referncia mdia (da qual o historiador se apregoa portador, encarregado de destgnar os sen tidos), essa remisso infncia da cincia, indicam precisamente aonde se atm o discurso original, censurado e desviado na juno dos tempos mo-demos.

    Em outros termos, para abordar agnerincia diffitica com a gual 0 CfJ.lPUS freudiano mantm uma certa (orma de relalo de oposilo todos devem se desarmar e se gesJrutgarar: tomar o partido dessa transgresso cultural que nos inventou uma Idade Mdia, ou ento fazer a reaprendiza-gem de um saber hoje degradado e consentir em olhar o jurista tal ele , o jurista originrio que, tomo a dizer, se acha sob o estatuto dos lnt migos do desejo e dos recuperadores do conflito. O jurista exatamente isto: o tsl'Ccilista. no seu e no que lhe compete. de uma manjpula-ao uniyersa) para a or

  • .

    utilizada correntemente no que diz respeito a esta geometria e aos atribu-tos fnosfJCOS que lhe llo conferidos. tanto a rvore do Saber

    medieval para colher dela uma filosoflll-doDireito, pau para toda obra e verdadeiramente boa menina (a dita filosofia floresceu nas ex-faculdades de Direito, a ttulo de uma que nada tenho a dizer quanto a cue lado p111 onde as coisaJ se inclinam.

    O importante, na visada deste estudo, RmUJ.$MI.Ili.d:lde do aq:uo cJnamtioo ao saber entre os medievais. Estamos, portanto, a na preaena de um n primitivo. Esquecemos que ele sustentava tudo, rigoro-wnente tudo, e sempre da mesma maneira, n1o s a teologia e o Direito, mas tamb6m a .... a cincia dos animais_,_!,P.Qpria mate-mtica. A extrema tecni.ci.dade do manejamento da distinl!o - esse dutin . guo com que tanto& espritos fortes foram ofuscadas- permitiu entllo na-da ficar fora da instituila, e fazer o andaime das leis sob \na riica nolo da Lei. Definir as quatro partes de qualquer doutrina, mostrar nas opera-&l lgic:u um Ogg( da palavra, descobrir a ordem de um tratado para comparar I fera. O louco e O donninbOCO. essas J)IOet.aS fMine1Bm 8

    . salid!!1e de wn discy,no do mtodo. O discuno cutnico 6 finalmente, em face da aparelhagem medieval;

    apeou um cuo particular, uma solidria de um conjUnto. QUero deixar to bem claro desde ji. Voltar consideralo eStrita (liberada dos julpmentos morais com que se envenena tio freqentemente uma episte-mologia comprada emliquida!"o) da matriz uma neessidade absoluta, para quiser tentar compreender o essencial na esp6cie de sobre-dUiafiO de que se beneficiou a censura, que invocamos para dar tes-temunho da instituilo, sem ter d6vida de que ainda hoje ele 6 tratado exa-tamente i maeira canon.istas. O que a psicanlise enfrenta, na escala dos Jlllpos histori

  • pai de sua geralo. Ser preciso, a fun de compreender o rigor das ramifi-caOes, reintroduzir o enigma dos desenvolvimentos histricos que supOe .a transmisso do que, com alguma dificuldade, designo com palavra tio vaga: a imtituiiio, quer dizer, fmalmente, urna estrutura; eu intento poder colocar o descritivo com a sagacidade de Raimundo Llio que descreve de cima a baixo, e at as razes, a Arbor Scientiae33 ; mas falta ainda minha pwa apreender com precislo suficiente as combinaes complexas, ela-boradas doravante nJo mais pelos g)ospdores de um Direita sapiente mas pelos tcnjros das cincias humanas que. na turbulncia dos,gahlnms de publicidade ou de organizaio, estfo em via de se revezar com os escols-ticos, aps um longo desvio, mais adiante lembrado em poucas palavras. Pela virtude da celebraes cientficas, do culo XX. o dogmaUSWL4em-bu seu trayestimcntp diyersificou seus modos de reconheceu d noyo Slll

    Enfun, sob o sisno do deye= nomear as burocracias, cuja gentica depende estreitamente dainstauraiO do discursQ __ cannico no Ocidente. Esse reSime oontemoorneo da suhmj$$o, ao qual se adjudi caro cientificamente os grupos humanos clssicos e seu conflito tradicional, no nada extraordinrio, embora os TrliUIIlgeTS reneguem. Se j ftz refern-cia em algumas circunstncias a Bossuet, a A fo/tjcq _fPtfm.iR.44.tPrgprias pqlgvrqs da fucritura Santa para revelar aos especialistasem.otganizaa:o as verdades inferiores de seu saber, acrescentarei aqui o essencial, o discurso do canonista medieval. Sobretudo na zona de atrao francesa, onde o es pto patriota mostra fiebnente as mais estreitas dependncias do modelo eclesistico. Podemos tambm nos assegurar disso pela clnica, onde a ins-tituio mantm com rigor sua loucura.

    A Idade Mdia. sob a enigmtica tranHJarncia 4Q discurso cJDnico, estjpula uma constituilo da censura. Eis porque estar atento a esse fato nos abre a via primeira dos acessos.

    NOTAS 1 Vejam P. Rouen, Animal mon frire toi. L 'hilltwe de Freud et Tausk, Ed.

    Payot, 1971 . 2 Para seu incentivo, o leitor dispe de um pequeno guia pedaggico, Anexo I. 3 O sentido originrio desta tcnica de explicao, denominada g/osD pelos

    prprios mediewis (comentrio literal do texto), objeto de desenvolvimentos cir-cunstanciados, mais adiante, no captulo 2.

    4 Volume XVIII, squndo a nova edilo.

    48

    l 5 Esse texto est repr-oduzido no Anuo O. 6 Esrai d'llrithmtique mol'rlle, in Histoin Mturelle. 8il'rlle et

    nova edio, XXI (ano VIU), p. 97-234. 7 Rico de aluses entre os mediev-..is, esse crime designa tambm a palam ne-

    fanda, anttese saalep. Fina anlise do esforo escolstico sobre esta questo funda mental por V. Pie.rgiovanni, La LestJ mtlje:rt nelltr OmonistiCil foto ad Ugucci

  • !I I

    i .

    3ente no incio do desainamcnto racionalista, sobretudo na Frana, cuja ascendncia catlica marcou tio profundamente o jo&e instit ucional. Pua compreender o esforo em direo a uma teoria poltica construda como doutrina da libertao, preciso interropr os clssicos neste pa.Cs, principalmente Condattet, d'un trzbltau hlftorique dt1 prorrb dt l 'e!plrit ltumllin, e A. Coumot, Yitrz/Jsme, Ra-tiOflalimJe, 18 7 S.

    l3 Tolice dos que desprezam a jurdica. Que eles leiam as profecias de um orculo clssico, Jean Domat (1625-1696), Les Lois ci'lll1n dJms ltllr Ordre rur tJUotl, pilar do Dirett.o francs.

    14 Moi et le otr, in &ulJs.. , Ed. Payot, 1967, p. 205; GW XIII, 264: Tra-duo a su aiticada; prefu:am a traduo literal do estilo freudiano (die Repriisentllllz lllfRnT

    25 jpr, efetivamente, com os dois ftfbos : (lez) e tli8ere (esco lha). A mais importante alusio, que assimila a Lei a uma variedade de escritura, foi vulgarizada na Idade N.6dia pelas celebres Etymologies de Isidaro de Sevilha (morto em 636):a lu entra na cateoria do id quod lt!litur (o que 1t li).

    26 Este ponto evidentemente fundamental, e eu remeto observao de La fonna do superego , portanto, inferhel do indivduo numa dada so-

    ciedade", Ecri ti, p. 13 7. 27 Clebre def'uulo do Papa Inocncio 111 (um dos maiores doutrinadores da

    toocraa ocidental); texto recolhido. pelas Decretrlis de Gregrio IX, livro 5, ttulo 40 ("Da significao uas palavras"), captulo 20.

    2111 Um grande enxugo d as tradies anunciado pela informtica, pois a matemtica moderna agride o saber do jurista. Indiferena dos h istoriadores franceses sobre esse tcJila capital. Para abordar a questo, pode-se ler a explicao de conjunto de Simit1s, lnfomuJtion.skriJe de1 Rechn und Daknverarbei tunf, Karlsruhe, Mller, l 970.

    29 A indu/gentia uma noo-torrente entre os canonistas desde a sua Idade Mdia; vejam, no sculo XVII, os desenwlvimentos prolixos de Fagnan, grande con sumidot de autor idades medievais em seus Commentaria sobre as !Hcntois de Greg-rio IX (vasto index sistemtico reunido no tomo UI da edio Venets, 1696). Para relaCIOnar com as noes complementares: por exemplo, a ignorncia, a simplicidade de esprito (gnOI'anr/Q, simplicitM), pontos de aplicao onde o Direito cannico ma-nifesta sua mestria para classificar os modos diversos do desconhecimento e do no-saber pelo SUJeito.

    30 Vrias meninas de boas famtiias se apaixonaram em Nanteue por uma Re-vohao-total-paca (assim me explicou uma delas}, e foi aberta uma creche sob o signo exclusivista das aianaspobres da favela que ficava ao lado. Belas herdeiras disfara-das, leiam, pois, a Ordenana do dia 31 de outubro de 1821, sobre os Escritrios de Benefioncia, e principalmente o artigo 4, que eu cito, do qual seus ancestrais tiraram proveito para possuir o operrio. Ou melhor ainda: olhem esse belo panorama , que lhes oferece A. de Wattevil\e, Ugidation charitoble, edio, 1847; vocs podero encontrar a vrios mo delos pa11 suas rplicas.

    31 Remeto a A De!iCrlo 'dico;

    apos tua morte, at o sculo XVI e ainda depois, criou-se mesmo as de Bar-tolo" (ctithedrtz &rto/11 cujos titulares ensinavam a interpretao ba.ltolial'a do Direi to romano, no lugar do texto! As FacWdades de Direito se sobressaram em tais pa.r-dia.s sapientes; hoje, por aluso aos nomes famosos, a sociologia amencana faz uma entrada solene a, entfUllnlo o ,...ntenciriu C)'trutunlista cmbelece o d iscurso.

    33 Vejam a lei de 19 de julho de 1791, que defme esta bela Crmula. 34 Sob proteo do bom Luis-Felipe, os juristas J'()diam apregoar isto em esti

    lo bem ingnuo; "Ns, professores da cincia da ordem retemos, ::lO menos como um de.er, o encargo de ensinar o respeito pela ordem e pela Lei". C. Giraud, "Naologie: Alban d'Hauthuille", Revue de fglation et dt furisprudence, 1846, p. 116.

    35 Sob a gide do Direito Romano, essencial para a Europa. constituiu-se uma do utrina do assustador e do esoondido, onde se escamoteia o Poder que cha-mamos absolutista. Leiam o composto por P. de Francisci, ArcQ11a impcr, Mi-lano, Giuffr, 1948, principalmente o tomo lU.

    36 Eplogo: 1968; de rep-:nte tomados de horror perante o texto escolst!co, os especialistas de histria institucional riscaram, de seus programas cannicos, a glosa e os glosadores. Esses universitrios bem asuerridos deram. uma vez rn.1.is, na solene ocasio de um salve-se-quem-pude.-, a dimenso do que significa para eles a Lei.

    37 Percebe-se berr, isso nos .:mbaraos do Coorr pour l'insrructwn du prince de Panne, livro VIII, captulo VII: "Da escol.stica c, eventualmente, da ma-neira de ensinai as arteH as cincias", in Otllvret, PUF, 11, 1948, p. 147-lSS.

    33 O utilo merueval se acha articulado de modo particularmente notvel nessa obra fa.SCWlte, aqui utilizada veu $ (!qundo a ediio Lyon, lSlS). Vocs en contrario a at uma da doutrina.

    51

  • 'l

    n Os Primitivos da Censura

    no Ocidente

  • t I \

    Entramos num espao potico. Vamos nos entender: numa composi-o acabada, um universo fechado de signos, onde as palavras mantm a boa distncia, e que se. oferecem em bloco fora de alcance da decifrao. Porque as pessoas se contentam com o empacotamento de nomenclaturas desqualificadas, separadas das nossas para sempre, porque se omitem de reaprender a utilizar seu instrumental lingstico, a Escolstica, sua teatra-lidade, suas figuraes e seu ritual mascarado sob uma lgica, esto na panela das culturas! Eu extraio aqui todo o esplio, o objeto trouv, para meu exerccio.

    A questo no sennos logrados. Estamos longe de obter dos medie-vais a totalidade do que eles quiseram dizer. No est em jogo portanto toda a Escolstica, mas somente o que se aproxima da matria de meu deli-to, a saber, o quadro vazio, i.lma teoria simblica para circundar o texto, cercar a dialtica e fundar a $Ubmisso aos doutores. Afirmo que a cincia )l dos juristas medievais, provinda de uma universal. . no fundo, a selvageria na ordem de uma censura: a ocidental. O Direito cannico oferece essa ordem em estado bruto. Antes de analisar as provas, todas elas na dependncia de uma serniologia das representaes ocidentais sobre a

    eu adianto duas essenciais: - A Escolstica se apresenta sob um formulrio do processo. Eis

    um ponto considervel, e que coloca as coisas no lugar. Vamos nos referir aos grandes mestres, telogos e ftlsofos no sistema_, para nos assegurar bem disso : Toms de Aquino que trata, por exemplo, da bondade e da malcia dos. atos hwnanos em geral', e Roger Bacon que se interroga sobre a perfeiao do discursol ; veremos o mesmo andamento, comwn a todos os autores e em todos os ramos. regrada em seus detalhes, pontuada por ... imaginrio, desen-rolado estritamente, com questes e respostas, rplicas e dplicas (termos tcnicos que designam a liturgi!ql;o palavreado no decorrer de um proces-so), para chegar finalmente a proferir a sentena. Esta engrenagem da for

    55

  • malizao apresenta naturalmente suas variantes e deVe freqentemente ser adaptada segundo os gneros literrios; mas ela comanda realmente o acesso lgica do conjunto. E preciso logo dimensionar tal fenmeno, o qual no teria porque ser assimilado a algum maneirismo - wna simples figura!Io em um estilo. Esta notallo importante, pois ela reala wn fato capital, contrrio opinio arraigada - salvo o respeito que guardo aqui pelo imenso saber de Leibniz3 O fato que a Escolstica nfo operava de um modo puramente dedutivo, porm mais sutilmente, seguindo a arte do juiz, os desvios do procedimento judicirio, como se pode ver alis na ex press:Io geralmente ultraprobabilista das concluses do raciocnio.

    Nlo ignorem esta observafo preliminiar ao longo deste meu curto tratado.

    - Para garantir a gravidade da revelallo cannica em relao ao con junto escolstico, mais uma observalo: referenciar o lugar do Direito cannico segundo a prpria topologia medieval.

    Na mais monumental, na mais complexa e na mais compreensiva diviso das cincias, o Direito cannico pode ocupar indiferentemente uma das dezesseis partes onde se acham contidas todas as cincias, absolu tamente todas4 Mas essa classificao horizontal e nlo hierrquica, se ela faz do Direito pnntificio uma cincia tio natural Quanto o inventrio dos vegetais, aqu.ilo e que aJo conta: que existe um saber sagrado, e separado dos outros, em relao com o Pra-cima onde reside a Potncia; s nesse lugar af que se domina afinal e se justifica a Natureza.

    Se volto a lembrar isso, para levar em considerao, uma vez mais e de wn outro ponto de vista, a cosmogonia ocidental, essa marca irrecu-svel e radicalmente elementar de um sistema em que a instituilo, tanto quanto alhures em outras culturas, est associada realidade sacerdotal, geomtrica definilo das I.eis, designaao de um cculn sagrmto onde tutio est dito.

    Da se pode identificar a posa:o central de tal saber e o papel de atravessador que o canorsta se outorga. Da podem ser percebidos os lmi" tes mgicos, que delimitam o traado obrigatrio por onde transita o diB curso. Ponderemos sobre isso, considerando o simples jogo das trs es fundadoras:

    a) Nomear o campo referencial. Eis o objeto da distino inicial, pela qual o Direito cannico descobre seu oriente. Temos aS&Un o par:

    leis di vi nas e naturais /leis humanas

    56

    A grande coleo redigida por Graciano, sob o signo dos primeiros dialticos e sob a designao prometedora de Concrdia do:s clirwne:r dis-cordantes, comea por a. Assim se articulam as duas zonas desniveladas de um mesmo percurso, onde se diferenciam dois tipos de saber sobre a censura: o teolgico e o jurdico, segundo a relao: superior/inferior. Com isso, o Direito cannico faz eleio de suas origens, define uma orto-nomia e sua relao com a Palavra. Em outros termos, encontram-se classi-ficados ali, como o prprio Graciano desenvolve$, dois corpos de textos, duas Escrituras cuja regra para sua leitura est ela prpria sob a gide da Ordem wiver:sal.

    Por isso opera a segunda relaa'o: b) A instdncia do discurso cantmiro: quem profere a ltzlavra legti-

    ma? A questo tem conexo com a seguinte matriz:

    I pontfice romano I imperador romano A est, ento, demonstrado o jogo lgico do Direito romano; colo-

    cado pela Escolstica e em sua verdadeira escala, o enigma de um ltimo avalista para aferrolhar a instituilo segundo a tradio ocidental. Esse vasto problema do clculo da legitimidade tende a isto: descobrir para a censtna um vnculo, que exclua a possibilidade de se saber demais sobre ela, de se chegar a um ponto supremo do Poder. Ser preciso, mais adiante, voltar a essa pesquisa sobre uma articulao julgada racional entre o Di reito romano e todos os sub-sistemas jurdicos nacionais provenientes dos desmembramentos sucessivos do sistema medieval: pois, a Europa dos tem pos modernos em busca de suas chefias leigas no pde eludir a quesUio dos medievais, tratada por estes com a contundncia necessria. Quanto a isso, necessrio aqui uma chamada histria dogmatizada.

    A soberba narraao legendria do Imprio dada Igreja pelo pio Constantino, o milagre da Inven'o das Pandectas, a bela imagem do papa do que protege as Leis dos Romanos6 , essas ferramentas simblicas colo-caram a demarcalo do lugar ideal onde reside a Palavra que deve gover-nar nlo esse ou aquele aglomerado, mas realmente todo o gnero humano. Pois o papa , afinal, o nico verdadeiro Romano, segundo esse cenrio. Trata-6e, portanto, deste jogo: recuperar os sujeitos na instituiO universal, exercer juridicamente o imprio, isto , por meio de uma lgica. Se o Direi to cannico e o Direito imperial se enunciam claramente na distino, a relao entre os dois termos declara dois poderes escalonados: no alto, a

    57

  • autoridade sagrada dos pontfices (auctortas Sllcra pontificum), a real (regalis potestas 7 ) .

    O Direito cannico est assim, estritamente, posto como Direito pontifcio, no cruzamento de todos os Direitos humanos e do Direito divi no. Funcionalmente intermedirio, mecanicamente levado autonomia, ele implica, sm nenhuma d\Mda, uma monarquia sacerdotal.

    Da essa chamada ao terceiro fundamento: c) A a&S/Iultwrz sacerdotal. No h porque se enganar quanto a isso.

    Graciano, guia sempre excelente, fornece-nos a ltima distino, numa passagem famosa, estipulando que existem dois gneros de cristJos (duo sunt genera christiancrum 8 ) :

    [ os f os leigos

    Ainda a se ostenta a lgica, e no mesmo tom, para ftxar os graus, marcar o afastamento, pronunciar que se dois estatutos, duas funes sepa ram dois estados, a instituo latina engloba o gnero humano sob suas divises. O Direito cannico sobrepuja assim qualquer outro corpo de tex-tos, e de sua hegemonia para a vida das normas sociais resultam imensas conseqncias, cujo ato ser lavrado nesta e na parte seguinte.

    58

    \'

    1 O GENITOR DA PALAVRA

    O que quer que faamos para enfeitar e esconder a dificuldade,. a quest{O (eligjosa est no mago da instituio ocidental e de seu texto tra dicional de uma maneira to real quanto na .Melansia ou entre os Bam-baras. Continuamos a protestar contra isso neste nosso sistema cultural que ainda sabe fazer to bem dois pesos e duas medidas na cincia doPo der, e que recusa observar a organizao nacionalista como objeto antro-polgico entre todos os outros. Assim se acha frustrada a ameaa de um ataque radical s censuras. S aqui, portanto, que pode se inserir a ferra menta psicanaltica, que vem precisamente restituir histria sua fatura e acentuar a universal selvageria das instituies, encarregadas de aferrolhar a sujeia:o por um certo discurso de amor. No que diz respeito Europa latina, preciso voltar ordem cannica das coisas, pois ela tem direta mente a ver com 05 temas fundamentais do desejo e da iluso, aos quais todo analista sabe confiar seus silncios ou sua glosa particular na grande obra anaitica.

    S um porm, no plano de minhas observaes, encontra-se um pro-blema terico que barra o acesso continuao, e que ficou mais ou menos na sombra at o presente momento. Trata-se de empreender o aprofunda-mento do tema freudiano que faz referncia ao Chefe da Igreja 9 e de recu perar o conjunto do texto tradicional ocidental - um texto macio e com pJexo -, pata separar seus elementos, pelos quais se tentar responder analiticamente. As observaes de Freud, com toda a certeza inseparveis da sua prpria ilustra'o e defesa 10 , podem nos levar longe, com a condi o de nunca esquecermos que os estudos desse gnero s podem ganhar realmente sua importncia com a referncia e o apoio de um vai-evem

    caso contrrio, multiplicarse-o as mais supu qlefabricam uma psicanlise bonachona e pouco convmcente.

    Ora, evidentemente, ainda que neste ensaio eu pretenda fazer apenas o inventrio de um novo domnio (os enunciados dogmticos de toda insti

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  • tuio para seu prprio desenvolvimento e sua salvaguarda), afunde esta-belecer a hiptese plausvel de um sentido a ser dado ao desvio institucio-nal, n1o disponho do recurso ao assunto (a no ser por brevssimas alu-ses). Este recurso ser intercalado, no tempo oportuno e no seu devido lugar; pois a pedagogia poltica e social das tradies produziu suas discipli-nas estritas, das quais nossos analisandos, instrudos demais a esse respeito, dlo testemunho. Mas aqui, neste ponto de partida em que estamos, admiti-remos que se trata de observar a questo sagrada do Poder num ideal e absoluto onde sfo inventadas as proposies dogmticas, um espao como que matemtico e que na:o conhea a histria, radicalmente antecen-dente e pr-constitudo, onde estamos separados de qualquer sujeito falan-. te. este espao que se prende a instituilo (como disseram no Ocidente os telogos e os legistas) antes que wn sujeito venha participar dela, um sujeito para sofr-la realmente; a este espao que Freud se refere ao colo-car seu tema da Religilo e da alma das massas (Milssenseele ). Evocar as coi-sas desse modo nos coloca em presena de um lugar segundo, uma espcie de duplo do espao psquico, onde a Religio e a cultura ditaram seu texto, que para o Ocidente se fixou em wna Seria um duplo realmente? Pelo menos assjm o supomos, uma vez que dela recebe-mos wn texto. congelado. inerte. escrito. A instituico se rela,iQna antes de majs nad,a com o qm;co da letra morta.

    Deste ponto vista o interesse de olhar um segmento essencial des-sa tradio escrita (a versa-o medieval em sua integralidade dogmtica), na medida em que for possvel, abstrao feita de seu meio histrico e de qualquer outra especifica!o particular, o de introduzir a pesquisa para tentar ver alguma coisa da in.stituic4o prqa. Tomo de bom grado a Ferdi nand de Saussure11 ltimo termo, aplicado por ele linguagem quan-do estava em tomo de suas primeiras definies, a fim de ter acesso a um lado completamente novo do signo, sua marca precisamente, que escapa a qualquer ser reerad_g_para ser transmitido.

    Mais tarde, perceberemos perfeitamente que, sob outros expressio-nismos que no os da aparelhagem escolstica, a instituio ocidental con-tinua sua vida, a de ser a linauaaem de uma censura.

    Entramos portanto na ordem de uma simblica preestabelecida, onde transparece o objeto ertico, e que realiza imaginariamente o desejo, segundo wna combinao muito complexa, caracterstica do que nomea mos cultura ocidental. Mas de que trataremos em primeiro lugar? Do pontfice e da ameaa, da qual ele a S, e que ganha consistncia ao ser conjurada por sua Boca. tem....iuporte. 60

    O discurso cannico , desse modo, no-separvel de um portador primordial, e o texto enuncia perfeitamente o mito que amarra a institui- j:i lo sua verdade. Indico, mais adiante, algumas distines essenciais para esclarecer, segundo meu projeto, as vias de um acesso, identificar o modus operandi das relaes que do censura seu poder de repetio, a exigncia de uma rigorosa lgica, afunde obter sua estrutura no proces so solene que pe o dogmatismo em cena.

    A. Geraii do texto: de como o pontfice primeiro afif111lldo como sm-bolo, pam jwtificar ou verifictJT qualquer enunciado.

    O conjunto do Direito cannico, erigido na Idade Mdia como Direi-to pontifcio, nlo pode ser isolado desta abertura necessria: o reconheci-mento do pontfice. Comearemos, pois, por a, com os comentadores clssicos, considerando o enunciado bruto de uma representao simblica tida por todos como fundamental, pois ela envolve todo o sistema; depois ser preciso lembrar-se de wn aspecto incisivo da mscara, e tentar recu-perar, em pelo menos uma parte, uma realidade colocada sob proteo . ":P

    . desse modo. . -;. O cannico expe. em primeiro lu&ar. o pontfice nico e ' "E'

    de perto a gramtica de Graciano, grande coletor da , ,,. < < tradio (ver Anexo 1), e observemos a posilo fixada. O papa se acha ler calizado de modo muito preciso, por meio de uma teoria sobre a origem e a classificao normativa dos textos; essas questes muito tcnicas sobre a hierarquia das fontes do Direito (como guiar o canonista por entre esses milhares de fragmentos, de provenincia variada ao extremo: conct1ios gerais e locais, obras dos santos autores, legislafo secular, etc.?) esto em uma das primeiras viradas da dialtica, j que se trata de superar os contr-rios designando para todos os casos o derradeiro avalista.

    Se ele efetivamente este avalista, o papa, en'tretanto, no aparece no discurso de uma maneira qualquer. Ele se mostra a no lugar de um ou-tro; af afl.ffila!Jo Para wresentll o Ausente. O que di-zem sobre isso? A referncia teologia da Escritura, ao gesto de Moiss que consagra o grande sacerdote, ao ritual salomnico que institw o poder e a funo do exorcista para liberar de seus demnios os corpos possu-dos12 , lembra que o pontflce romano :ecebeu o encargo desumano de comandar o pra-cima e o pra-baixo. Fle possui as chaves msticas. Sua sen-tena, segundo esta doutrina do transmissor, declara a Lei e mantm a Igreja sacrossanta13 Os glosadores nomearam prfeitamente esta situa-

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  • fo, com a ajuda do termo, evocador para o jurista, de vic:arius Christi, por alusfio ao escravo vicrio, o escravo que segundo a tipologja do Direito

    ..... romano antigo recebeu a misso geral de representai seu mestre e de gerir seus negcios sejam quais forem, em sua ausncia.

    Esta designalo de um papel vem a