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GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS LEGISLAÇÃO PARA PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL NA BAHIA Outubro / 2011

legislação para proteção do patrimônio cultural na bahia

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GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

LEGISLAÇÃO PARA PROTEÇÃODO PATRIMÔNIO CULTURAL

NA BAHIA

Outubro / 2011

GOVERNADOR DO ESTADOJacques Wagner

SECRETÁRIO DE CULTURA DA BAHIAAntonio Albino Canelas Rubim

DIRETOR DO INSTITUTO DO PATRIMÔNIO ARTÍSTICO E CULTURAL DA BAHIA – IPACFrederico A. R. C. Mendonça

GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

FICHA TÉCNICA

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GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

LEGISLAÇÃO PARA PROTEÇÃODO PATRIMÔNIO CULTURAL

NA BAHIA

Outubro / 2011

ASSESSORIA TÉCNICAMargarete Abud

PROCURADORIA JURÍDICASônia Maria da Silva FrançaLucy CaldasHermano Fabrício Oliveira Guanais e Queiroz (redação)

DIRETORIA DE PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURALElisabete Gándara

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃOGeraldo Moniz

PROJETO GRÁFICO e DIAGRAMAÇÃOHelder V. Florentino

APRESENTAÇÃO

O Governo do Estado da Bahia visando o desenvolvimento equilibrado e sustentável entre as regiões passou a reconhecer a existên-cia de 26 Territórios de Identidade. A Secretaria de Cultura - Secult abraçou esta proposta como uma forma eficaz de consolidar sua atuação em todo o Estado, reconhecendo a diversidade de manifestações e a dimensão do território baiano como um desafio a mais na democratização das políticas públicas, buscando o crescimento da economia cultural como uma das áreas de maior possibilidade de alavancar o desenvolvimento das localidades através da sua identidade.

O Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia - IPAC, autarquia vinculada à Secult, criado para atuar de forma integrada na salvaguarda do patrimônio cultural, volta-se para orientar, capacitar e estimular a participação ativa dos municípios no compartilhamento das responsabilidades para preservação, através da

descentralização da gestão dos bens patrimoniais do Estado.

O Guia de Orientação aos Municí-pios, elaborado pela Procuradoria Jurídica do IPAC, contém instruções básicas e utiliza como parâmetro as legislações federal e estadual, visando fornecer orientação e elementos que as-segu-rem aos governos municipais a formulação e implantação de instrumentos de salvaguarda de seu patrimônio cultural material, imaterial e arqueológico.

A Lei Municipal de proteção ao patrimônio cultural configura-se, como um dos instrumentos mais eficazes para garantir a manutenção dos elementos que compõem a identidade de seu povo. Além do que, um bem quando é reconhecido como de valor para a sua população tem maiores oportunidades de rece-ber recursos através de instrumentos de fomento e financiamento para a sua manutenção.

APRESENTAÇÃOGUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

APRESENTAÇÃO

EPÍGRAFE

INTRODUÇÃO

1. COMPETÊNCIA DOS MUNICÍPIOS 1.1 PROCEDIMENTO LEGISLATIVO MUNICIPAL 1.2 APRESENTAÇÃO DE JUSTIFICATIVA À PROTEÇÃO LEGAL 1.3 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

2. INSTITUTOS DE TUTELA APLICADOS AOS MUNICÍPIOS 2.1 TOMBAMENTO 2.2 PROCESSO DE TOMBAMENTO 2.3 OBJETOS DO TOMBAMENTO 2.4 VEDAÇÕES AO TOMBAMENTO DE USO 2.5 CUMULAÇÃO DE TOMBAMENTOS - POSSIBILIDADE 2.6 DA NECESSIDADE DE ESTÍMULO AO PROPRIETÁRIO DE BEM PROTEGIDO 2.7 MUNICÍPIO - ENTE FEDERATIVO QUE PROMOVE A PROTEÇÃO 2.8 CANCELAMENTO DO TOMBAMENTO 2.9 EFEITOS DO TOMBAMENTO

3. INVENTÁRIO

4. REGISTRO ESPECIAL DO PATRIMÔNIO IMATERIAL 4.1 PARTES LEGÍTIMAS PARA PROPOSIÇÃO DO PEDIDO DE TUTELA

5. PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO - COMPETÊNCIA COMUM DOS ENTES FEDERATIVOS

CONSIDERAÇÕES FINAIS

REFERÊNCIAS

CONTATOS

SUMÁRIO

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Arquivo IPAC

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Fazenda Santa Bárbara | Caetité - BA

GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS COMPETÊNCIA DOS MUNICÍPIOS

1. COMPETÊNCIA DOS MUNICÍPIOS A fim de dirimir eventuais dúvidas acerca da competência do Município para legis-lar sobre a temática patrimonial, notadamente a fixação de tutela sobre os bens culturais na seara municipal, cumpre ressaltar que o Supremo Tri-bunal Federal firmou o seu posicionamento, de modo que resta pacífico o entendimento de que há competência material comum de todos os entes federativos para proteger os documentos, as obras e outros bens, seja de natureza material ou imaterial, de valor histórico, artístico e cultural, conforme preceitua o art. 23, III, da Constituição Federal de 1988.

O art. 24 da Carta Magna prevê a com-petência legislativa concorrente da União, Esta-dos, Distrito Federal e Municípios para proteger o patrimônio cultural. A partir disso, resta superada a controvérsia acerca da competência do Municí-pio para legislar sobre a proteção ao patrimônio, como bem preceitua o ilustre administrativista José Afonso da Silva (Ordenação Constitucional da Cultura, 2001, p.43):

[...] os municípios, como se vê no caput do ar-tigo 24, não estão contemplados nas regras de competência concorrente. Mas eles, a rigor, não estão fora inteiramente desse contexto, por que é prevista competência para a proteção da cul-tura. Ora, tendo em vista isso e mais as normas de distribuição de competência a eles no artigo 30, pode-se afirmar que lhes restam área de com-petência concorrente. A eles cabem legislar su-plementarmente à legislação federal e estadual no que couber (art. 30, I), vale dizer, naquilo em que se dá a eles possibilidade de atuar; esse aspecto está consignado no mesmo artigo 30,IX, onde se lhes dá a competência para promover a fiscalização do patrimônio histórico-cultural lo-cal, observadas a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Já que se reconhece a existência de

um patrimônio cultural local (patrimônio cul-tural municipal), pode-se outorgar competência legislativa a tais entes para normatizar sobre tal matéria. Isso porque aos Municípios compete legislar sobre assuntos de interesse local, com fulcro no inciso I, do art. 30, da Carta Política, su-plementando a legislação federal (Dec. Lei 25/37) e a estadual (Lei 8895/2003 e 10.039/2006), no que couber.

Não há óbice, pois, a que o Município aprove uma legislação municipal de preservação do patrimônio cultural, complementando a le-gislação federal e estadual já existentes, de modo a integrar os entes federados na persecução do interesse público, qual seja, a preservação do patrimônio cultural.

1.1 PROCEDIMENTO LEGISLATIVO MUNICIPAL

Âmbito da auto-organização e da au-to-administração que estão as questões de com-petências municipais. O Município vai lançar mão de características concedidas pela Constituição Federal Brasileira para exercer suas prerrogativas, que adquirem traços de competências do ente municipal.

Criado o Município, deve-se falar em competências municipais. A primeira delas seria justamente a edição de sua Lei Orgânica, deter-minada pelo art. 29 da Constituição de Outubro. Sob uma ótica municipalista, a Lei Orgânica Mu-nicipal (LOM) é tida como uma espécie de Consti-tuição Municipal, visto sua forma de criação que é equivalente aquela utilizada para confecção de uma Constituição Federal.

Portanto, é na LOM que se concreti-zam as autonomias política, administrativa e financeira, pois é nela que estão as formas de organização dos poderes; a estrutura dos órgãos voltados para a sua administração, regendo seus

INTRODUÇÃO

Estas orientações têm como finalidade fornecer elementos jurídicos aos municípios do Estado da Bahia, com respaldo na experiên-cia desta Autarquia na defesa do patrimônio cultural, acumulada no perpassar de décadas. Deve-se atentar para o fato de que alguns pontos restringem-se à deliberação de cada ente munici-pal, diante da sua realidade/necessidade/possi-bilidade. Toda a fundamentação desta orientação

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Arquivo IPAC

Igreja Matriz de Cachoeira | Cachoeira - BA

Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza mate-rial e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: Os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológi-co, paleontológico, ecológico e científico.

Constituição Federal, art. 216.

está lastreada nos ensinamentos doutrinários e jurisprudenciais constantes na obra “Tutela do Patrimônio Cultural Brasileiro”, do exímio Pro-motor de Justiça de Minas Gerais, Dr. Marcos Paulo Souza Miranda(1), que aqui se transcreveu e se adotou como principal fonte de informação. Destaca-se, ainda, as orientações do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN e demais obras indicadas nas Referências.

GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS COMPETÊNCIA DOS MUNICÍPIOS

proteção pela sua importância para o povo do Município.

Indispensável, ainda, juntar à proposta de proteção os documentos essenciais à com-provação do quanto se solicita, que deverão ser autuados e preservados, formando, assim, um dossiê que servirá ao processo de salvaguarda.

1.3 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA EDUCAÇÃO PAT-RIMONIAL

Os institutos de proteção trazem em si um impacto sobre os municípios que, em sua grande maioria, desconhecem as razões e o con-teúdo da aplicação das intervenções legais. Di-ante disso, possuem certa dificuldade de cumprir as disposições normativas atinentes à matéria. Nasce daí a necessidade de realizar o serviço de educação patrimonial, à luz do art. 225, VI da Constituição Federal, cuja meta é promover a participação da comunidade na preservação do patrimônio.

A educação patrimonial é um proces-so de trabalho centrado no patrimônio cultural como fonte de sabedoria e conhecimento. Há necessidade de que todos tenham consciência da importância da preservação da memória para que possam exercer seus direitos e cumprir seus de-veres em relação ao patrimônio cultural. A edu-cação patrimonial deve envolver a comunidade na gestão do patrimônio, pelo qual ela também é responsável, pois integra a sua memória.

No sentido de dar cumprimento aos mandamentos constitucionais que impõem a educação ambiental, a Lei 9.759/99 dispôs sobre o tema e instituiu a Política Nacional de Educação Ambiental.

Assim, resta ao município, como prin-cipal agente na educação, a responsabilidade e o compromisso de promover, eficazmente, a ativi-dade de educação patrimonial a fim de que esse direito seja exercido em plenitude pelos interes-

servidores e tratando de seus orçamentos e tri-butações; e ,ainda a abordagem dada à política urbana dentro da ordem econômica e social, abrangendo vários aspectos como habitação, sis-tema coletivo de transportes, plano diretor, den-tre outros.

O Município, como ente federativo, é detentor do poder de salvaguardar o meio ambiente no qual seus munícipes interagem, destacando-se o meio ambiente cultural. O sig-nificado da proteção do patrimônio cultural pelo poder local e a sua importância para a implan-tação da democracia constitucional é marcada pela possibilidade maior, por parte do Município, de preservar a identidade cultural do povo e al-cançar o seu sentimento.

O Município, por sua própria condição, por ser nele o lugar em que residem os cidadãos, tem a capacidade de materializar, com maior eficiência, o art. 216, § 1º da Constituição Federal, que atribui ao poder público, com a colaboração da comunidade, o dever de promover, de modo eficaz, a proteção ao Patrimônio Cultural.

A legislação municipal será criada a partir dos procedimentos fixados em cada LOM, tendo as seguintes fases procedimentais, que de-verão ser adequadas à realidade fática e jurídica do ente federativo:

- FASES DO PROCESSO LEGISLATIVO:

1ª Fase - INICIATIVA = É a faculdade que a Cons-tituição/Lei Orgânica atribui a alguém ou a algum órgão para apresentar projeto de lei, inauguran-do o processo legislativo;

2ª Fase - COMISSÕES TÉCNICAS = Divide-se: Temporárias (aquelas que iniciam e terminam o trabalho dentro da mesma legislatura) e Per-manentes (aquelas que passa de uma legislatura para outra);3ª Fase - CASA OU CÂMARA REVISORA = Obriga-toriamente o projeto iniciado por uma das Casas/

Câmaras deve ser revisto pela outra Casa/Câmara;

4ª e 5ª Fases - DISCUSSÃO E VOTAÇÃO = A análise do tema; é o ato de decisão que se toma por maioria dos votos;

6ª e 7ª Fases - SANÇÃO E VETO = Respectiva-mente, são os atos pelos quais o Chefe do Exe-cutivo dá a sua aquiescência ao projeto de texto legal que lhe é submetido, ou seja, o projeto de lei que chega do Poder Legislativo discutido e vo-tado. Vetar significa dizer discordar dos termos de um projeto de lei. O veto pode ser total ou parcial;

8ª Fase - PROMULGAÇÃO = Uma das fases da elaboração da lei. Ela atesta oficialmente a exis-tência de uma lei nova que não foi votada pelo Congresso Nacional (geralmente nas matérias de iniciativa do Presidente da República);

9ª Fase - PUBLICAÇÃO = Última fase da elabo-ração de uma lei. Com ela a lei se torna executável (vigente – eficaz) em todo o Território Nacional/Estadual/Municipal. É o modo oficial estabelecido para possibilitar o conhecimento da lei por todos. A publicação ocorre na imprensa oficial, ou seja: Diário Oficial da União (DOU); Diário Oficial do Estado (DOE); Diário Oficial do Município (DOM).

OBSERVAÇÃO: A matéria aplica-se nas três esferas, de maneira idêntica.

1.2 APRESENTAÇÃO DE JUSTIFICATIVA À PROTEÇÃO LEGAL

Imprescindível, inicialmente, a apre-sentação dos motivos que justifiquem o porquê da intervenção legal a ser efetivada sobre o bem. Isso será feito mediante um estudo circunstancia-do, devendo-se explicitar acerca da importância do bem para o Município, evocando-se imagens e toda a base histórica e social que situe o bem no tempo e no espaço, demonstrando-se a relevân-cia e a necessidade da promoção da tutela de 08 09

sados. Diante disso, o IPAC coloca-se à disposição para promover orientação neste sentido.

Arquivo IPAC

Carnaval de Maragogipe | Maragogipe - BA

GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS INSTITUTOS DE TUTELA APLICADOS AOS MUNICÍPIOS

2. INSTITUTOS DE TUTELA APLICADOS AOS MUNICÍPIOS Trata-se de demanda na qual o IPAC deverá subsidiar as administrações munici-pais com legislação e diretrizes de atuação para preservação patrimonial como elementos estru-turantes do desenvolvimento local e regional, destacando-se a elaboração de uma legislação municipal que contempla os institutos do Tom-bamento, do Inventário e do Registro Especial do Patrimônio Imaterial.

Em face do caráter de generalidade da norma, serão fixadas regras gerais, cabendo a cada município, dentro do contexto em que está inserido e da evolução do arcabouço jurídico de proteção ao patrimônio específico, promover as alterações pertinentes, desde que não viole as leis regentes, quais sejam o Decreto Lei 25/37 e a Lei Estadual 8.895/2003 e 10.039/2006, obede-cendo-se ainda, aos princípios constitucionais e ao costume que também são fontes do Direito de grandiosa importância

• Da Parte Geral

A legislação, na sua parte geral, deverá estabe-lecer os institutos de proteção ao patrimônio, fixando as regras que deverão nortear o procedi-mento administrativo de reconhecimento do valor cultural do bem a ser tutelado, destacando-se:

I- Tombamento;II- Inventário para Preservação;III- Registro Especial do Patrimônio Imaterial.

A inserção sugerida busca esclarecer a sociedade local acerca da possibilidade de fazer incidir os institutos de proteção nos bens de pro-priedade de particulares. Compete, neste contex-to, trazer a baila o conceito dos referidos institu-tos, a fim de fornecer elementos à compreensão dos mesmos.

2.1 DO TOMBAMENTO

No ordenamento jurídico brasileiro o instituto do tombamento surgiu com a edição do Decreto-Lei nº 25/37 que é, ainda hoje, a lei na-cional sobre a matéria.

Em linhas gerais, o tombamento é con-cebido como o ato final resultante de procedi-mento administrativo mediante o qual o Poder Público, intervindo na propriedade privada ou pública, integra-se na gestão do bem móvel ou imóvel de caráter histórico, artístico, arque-ológico, documental ou natural, sujeitando-o a regime jurídico especial de tutela pública, tendo em vista a realização de interesse coletivo de preservação de patrimônio. É, portanto, a in-tervenção ordenadora concreta do Estado na propriedade privada, limitativa de exercício de direitos de utilização e disposição, gratuita, per-manente e indelegável.

Na visão de José Eduardo Ramos Ro-drigues, o tombamento é:

“Um ato administrativo pelo qual o Poder Pú-blico declara o valor cultural de coisas móveis ou imóveis, inscrevendo-as no respectivo Livro do Tombo, sujeitando-as a um regime especial que impõe limitações ao exercício de propriedade, com a finalidade de preservá-las. Portanto, trata-se de ato ao mesmo tempo declaratório, já que declara um bem de valor cultural e constitu-tivo, vez que altera o seu regime jurídico.”

Em âmbito federal, o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) é a instituição incumbida de exercer as competên-cias previstas no Decreto-Lei nº 25/37; em nível estadual, ao IPAC incumbe tal desiderato e, no caso específico da Bahia, regem a proteção ao patrimônio cultural a Lei nº 8.895/2003 e o De-creto nº 10.039/2006, que determinam que o tombamento será aplicado ao bem de cultura móvel ou imóvel, tendo por referência o seu

caráter singular.

2.2 PROCESSO DE TOMBAMENTO

Tendo em vista que do ato de tom-bamento decorrem restrições ao direito de pro-priedade do titular do domínio, o procedimento administrativo deverá dar oportunidade ao pro-prietário do bem o devido processo legal, com di-reito à ampla defesa e ao contraditório, na forma da lei, sendo que a desobediência às referidas garantias pode ensejar a nulidade do procedi-mento a ser declarada pelo Poder Judiciário, em ação própria, não olvidando a possibilidade que a Administração Pública tem de rever, a qualquer tempo, os seus atos.

Todos os diplomas que regem a matéria de proteção ao patrimônio devem ser relidos sob as luzes da nova ordem constitucional vi-gente, bem como devem ser conjugados subsidi-ariamente com o disposto na Lei 9.784/98, que regulamenta o processo administrativo junto aos órgãos federais.

As fases do processo administrativo do tombamento podem ser identificadas como as mesmas que são comuns a todo processo admi-nistrativo: instauração, instrução, defesa, relatório e julgamento.

A) instauração - qualquer cidadão, associação, entidade representativa ou autoridade pode vir a provocar o órgão administrativo competente para analisar a sugestão de tombamento de determi-nado bem. Também poderá o órgão competente, ex officio, tomar a iniciativa de iniciar o procedi-mento. O requerimento inicial do interessado, salvo casos em que for admitida solicitação oral, que será reduzida a termo, deve ser formulado por escrito e conter os seguintes dados:

I- órgão ou autoridade administrativa a que se dirige;II - identificação do interessado ou de quem o represente;

III - domicílio do requerente ou local para recebi-mento de comunicações; IV - formulação dos fatos e de seus fundamentos - Justificativa de tombamento; Informações re-levantes sobre o bem cultural, suas características e importância histórica para se preservar; V - data do pedido e assinatura do requerente ou de seu representante.

B) A fase de instrução é absolutamente indis-pensável para embasar o posterior ato de tom-bamento. Com efeito, torna-se imprescindível a prévia existência de estudos técnicos que iden-tifiquem claramente o objeto a ser preservado, tratem de suas características e justifiquem a sua relevância para fins de preservação, de maneira a motivar a subsequente decisão protetiva, que deve se pautar por critérios objetivos, técnicos e visar a proteção do interesse público consubstan-ciado na defesa do patrimônio cultural. Esses es-tudos técnicos são normalmente reunidos em um dossiê, que empresta suporte à decisão admi-nistrativa de tombamento. Nesta fase, deve-se expor as razões histórico-culturais que legitimem a proteção requerida ao município.

C) A fase de defesa do proprietário do bem a ser tombado é imprescindível para a validade do ato de tombamento, já que prestigiam o contra-ditório e a ampla defesa. A legislação de proteção ao patrimônio exige a notificação do propri-etário do bem a ser tombado para fins de que, querendo, possa oferecer impugnação no prazo de 15 (quinze) dias. A partir do recebimento da notificação de tombamento, o bem fica tombado provisoriamente, até homologação final pelo Chefe do Poder Executivo, sendo que os efeitos produzidos pela tutela provisória são os mesmos do tombamento definitivo. Importante ressaltar que no instrumento de notificação deverá conter, expressamente, o direito de impugnar e o prazo estabelecido, consoante entendimento firmado pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.

Deve-se, ainda, por previsão da Lei 9.784/99, garantir ao proprietário do bem os se-10 11

INSTITUTOS DE TUTELA APLICADOS AOS MUNICÍPIOSGUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

guintes direitos consagrados no art. 3º: ter vista dos autos; obter cópias de documentos neles contidos e conhecer as decisões proferidas; for-mular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente; fazer-se assistir, faculta-tivamente, por advogado. O art. 38 da referida lei concede ao proprietário o direito de, na fase instrutória e antes de tomada da decisão sobre o tombamento, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do proces-so, sendo que os documentos e provas deverão ser considerados na motivação do relatório e da decisão. Somente poderão ser recusadas, medi-ante decisão fundamentada, as provas propostas pelo interessado quando sejam ilícitas, imperti-nentes, desnecessárias ou protelatórias.

D) A fase de julgamento compõe-se de dois mo-mentos: o Conselho Municipal de Cultura proferirá sua decisão sobre o tombamento do bem e, após, submete-se o pleito ao Chefe do Executivo, para homologação ou não. Havendo homologação, o bem poder ser, finalmente, inscrito no respectivo Livro de Tombo.

Para produzir efeitos contra terceiros o tombamento deverá ser, por provocação do órgão tombador, averbado à margem da transcrição do domínio do bem imóvel no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca onde se situar o bem, se imóvel; se móvel, no lugar onde for deslocado com sentido de definitividade.

2.3 OBJETO DO TOMBAMENTO

No que tange ao objeto, o tombamen-to pode ser aplicado aos bens móveis e imóveis, públicos ou privados, de interesse cultural ou ambiental, quais sejam: fotografias, livros, mo-biliários, utensílios, obras de arte, edifícios, ruas, praças, cidades, regiões, florestas, cascatas, den-tre outros.

Com o advento da Carta Magna, de

1988, não somente os bens dotados de monu-mentalidade ou excepcionalidade podem ser objeto do ato de tombamento. Basta que sejam portadores de singularidade, referência à identi-dade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade local, para que possam receber a especial proteção estatal.

2.4 VEDAÇÃO AO TOMBAMENTO DE USO

Deve-se enfatizar, outrossim, que o tombamento não se mostra como instrumento apropriado à proteção de bens culturais imate-riais, bem como não se pode tombar o uso es-pecífico de determinado bem (tombamento de uso), uma vez que a destinação não se constitui como coisa móvel ou imóvel. Desta forma, o tom-bamento de uma casa onde funcionou um teatro, por exemplo, não obriga o proprietário do imó-vel a manter infinitamente a mesma destinação cultural. O que pode ocorrer é que, em função da necessidade de conservação, o uso desse bem seja adequado ou inadequado. Pode-se então, impedir o uso danoso do bem tombado não para determinar um uso específico, como, por e-xemplo, que continue a ser museu, mas apenas para impedir o seu uso inadequado. Poderão ser adotadas outras medidas, de cunho judicial, para garantir a continuidade das mesmas atividades, se for esta a hipótese.

2.5 CUMULAÇÃO DE TOMBAMENTOS - POSSIBILI-DADE

Um mesmo bem pode receber a pro-teção de mais de um ente federativo, não sendo incomum a incidência cumulativa de tom-bamentos realizados pelo órgão da União, do Estado e do Município.

Também, não há qualquer impedi-mento no sentido dos entes federativos meno-res tombarem bens de propriedade dos entes maiores, uma vez que a CF/88 impõe o dever de qualquer das entidades políticas proteger os bens culturais de seu interesse, não excluindo

ou restringindo tal dever em razão do titular do domínio ser ou não pessoa de direito público. Deste modo, ao contrário do que ocorre na desapropriação (art. 1º, § 2º, do Decreto-Lei 3.365/41), o Município, por exemplo, pode tombar bens de propriedade dos Estados ou da União.

2.6 NECESSIDADE DE ESTÍMULO AO PROPRIETÁRIO DE BEM PROTEGIDO

Na contemporaneidade, verifica-se uma tendência legislativa no sentido de assegu-rar aos proprietários de bens tombados benefí-cios fiscais como forma de compensar as restrições decorrentes do ato protetivo.

Não há olvidar-se ainda que, como medida de estímulo e incentivo à preservação e conservação do patrimônio, a lei poderá estabe-lecer que os bens patrimoniais inventariados e/ou tombados são isentos ao pagamento do Im-posto Predial e Territorial Urbano (IPTU), desde que o proprietário zele e conserve os bens, efe-tivamente, com suas características motivadoras de preservação, obrigando-se contudo ao paga-mento das taxas de serviços públicos.

A condição para concessão da isenção será para os imóveis que estiverem em bom es-tado de conservação. Estes poderão se beneficiar com a isenção, devendo a vistoria ser feita anu-almente, para averiguar se o mesmo está sendo conservado e continuar recebendo o benefício. Tal iniciativa é de encargo de cada Município, que instituirá tal política de incentivo dentro do critério de conveniência e oportunidade.

2.7 MUNICÍPIO - ENTE FEDERATIVO QUE PROMOVE A PROTEÇÃO

Em que pese a utilização reiterada da expressão “Prefeitura Municipal” nos atos administrativos, é necessário frisar que tal termi-nologia é equivocada, destituída de rigor técnico, pois o ente da Administração Pública direta é o

“Município”, pessoa jurídica de direito público, tratando-se a “Prefeitura” de simples órgão, ou mera nomenclatura que designa o imóvel sede do Poder Executivo municipal, onde o Prefeito, devidamente eleito pelo processo democrático, pratica seu ato de governo. Assim, quem exerce o direito constitucional de promover a tutela dos bens é o Município.

2.8 CANCELAMENTO DO TOMBAMENTO

Segundo Odete Medauar(3), apesar de todos estes efeitos, o tombamento está sujeito:

- à revogação, por inconveniência e inopor-tunidade, ou anulação, por ilegalidade, pois a própria autoridade competente, em vez de homologá-lo, poderá determinar a revisão, al-teração ou desfazimento;

- o Decreto-Lei nº 3.866/41 prevê o cancelamen-to, pelo Presidente da República e, aplicando-se subsidiariamente, pelo Governador e pelo Pre-feito, do tombamento definitivo de bens públi-cos ou privados, de ofício ou em grau de recurso, interposto pelo legitimamente interessado, por motivo de interesse público, mesmo que já tenha sido homologado.

Em qualquer caso, o desfazimento deve trazer as razões de fato e de direito que nortea-ram a decisão. Necessário relembrar que o ato de tombamento acaba por gerar efeitos em favor dos proprietários particulares dos bens que recebem a proteção, o que torna inadmissível o cance-lamento unilateral do ato, sem a instauração de procedimento administrativo, assegurando o contraditório e a ampla defesa aos interessados.

2.9 EFEITOS DO TOMBAMENTO

A) EM RELAÇÃO AO OBJETO:

- os bens tombados mantêm-se como sendo propriedade de seu titular, mas saem da vontade exclusiva deste e ficam submetidos a uma finali-12 13

INSTITUTOS DE TUTELA APLICADOS AOS MUNICÍPIOSGUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

dade coletiva impessoal;

- as coisas tombadas pertencentes às pessoas jurídicas de direito público, inalienáveis por sua natureza, submetem-se à inalienabilidade espe-cial e relativa, só podendo ser transferida de uma pessoa de direito público interno para outra;

- os bens particulares tombados têm sua aliena-bilidade restringida, ficando sujeita a determina-das condições, tais como:

1) prévio oferecimento do bem tombado a ser alienado ao Poder Público, na seguinte ordem: União, Estado e Municípios. Atentar-se para o quanto previsto no Estatuto da Cidade, o qual es-tabeleceu e regulou, dos arts. 25 a 27, o direito de preempção em favor do Poder Público Municipal. Em linhas gerais, o direito de preempção confere ao Poder Público Municipal preferência para a aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares (art. 25). Vale dizer: o Município terá preferência na aquisição de certo bem imóvel urbano, localizado em área delimi-tada por lei municipal lastreada no plano diretor, com observância obrigatória pelo particular em favor do referido ente da Federação.

2) no caso de transferência da propriedade ou deslocação dos bens tombados, deverá haver registro do bem no Cartório do local para onde se transferiu, além de comunicação ao órgão com-petente do patrimônio histórico, dentro do prazo de trinta dias e sob a pena de multa de 10% do valor da coisa.

3) a saída do bem para o exterior só é permitida para o fim de intercâmbio cultural, sem a trans-ferência de domínio e mediante autorização do órgão competente;

4) no caso de extravio ou furto de qualquer ob-jeto tombado, o respectivo proprietário deverá dar conhecimento do fato ao órgão competente;

5) as coisas tombadas ficam sujeitas à vigilância

permanente do órgão competente, que poderá inspecioná-los sempre que for julgado conve-niente, não podendo os respectivos proprietários ou responsáveis criar obstáculos à inspeção, sob pena de multa;

6) em caso de tombamento provisório os efeitos são exatamente os mesmos do tombamento de-finitivo, exceto no que diz respeito às restrições relativas à alienação do bem.

B) EM RELAÇÃO AO PROPRIETÁRIO

Surgem para o proprietário obrigações positivas (de fazer), negativas (não fazer) e de suportar, que são as seguintes:

a) fazer obras de conservação necessárias à preservação do bem ou, se não tiver meios, comunicar sua necessidade ao órgão competente sob pena de multa;

b) assegurar o direito de preferência aos entes federativos em caso de alienação onerosa da coisa tombada, sob pena de multa, nulidade da alienação e de sequestro do bem;

c) não destruir, demolir ou mutilar o bem tom-bado sem prévia autorização do órgão compe-tente, repará-la, pintá-la ou restaurá-la, sob pena de multa.

Trata-se, na verdade, de efeitos que se operam contra todos e não somente contra o proprietário do bem tombado, sendo que deve-se lembrar que a violação a esta norma constitui crime contra o patrimônio cultural brasileiro (art. 62, da Lei 9.605/98);

d) não retirar os bens do país, salvo por curto prazo, para fins de intercâmbio e com autorização do órgão tombador;

e) suportar a fiscalização do bem pelo órgão téc-nico competente, sob pena de multa em caso de opor obstáculos indevidos à vigilância. O ato de

omissão que dificulte ou obste a ação fiscaliza-tória dos órgãos de proteção do meio ambiente cultural encontra, também, adequação típica no art. 69 da Lei 9.605/98.

C) EM RELAÇÃO AO PODER PÚBLICO

Decorrem do respectivo ato protetivo as seguintes obrigações:

a) exercício do poder-dever de impor penali-dades administrativas àqueles que destruírem, inutilizarem, deteriorarem ou alterarem os bens tombados;

b) executar as obras de conservação do bem, quando o proprietário não puder fazê-lo, com-provadamente, adotando, após, as medidas re-gressivas cabíveis no sentido de reaver do pro-prietário os valores gastos com os serviços de conservação;

c) exercer permanente vigilância sobre a coisa tombada, inspecionando sempre que achar con-veniente ou necessário, no exercício do seu poder de polícia;

d) providenciar, em se tratando de bens imóveis particulares, a transcrição do tombamento no Cartório de Registro de Imóveis, para assegurar o direito de preferência.

D) EM RELAÇÃO À VIZINHANÇA

a) Não se poderá, sem prévia autorização do órgão competente, na vizinhança da coisa tom-bada, fazer construção que impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou car-tazes, sob pena de ser determinada a destruição da obra ou retirada do objeto, impondo-se, neste caso, a multa cabível;

b) considera-se redução de visibilidade a modi-ficação do ambiente circundante, a diferença de estilo arquitetônico, altimetria, volumetria e tudo mais que implique na alteração da harmonia do 14 15

conjunto formado pela coisa tombada e pelos demais elementos situados nas proximidades.

c) deve-se delimitar, objetiva e claramente, o conceito de vizinhança (determinação do entorno do tombamento) bem como a averbação de tal restrição no Registro de Imóveis da área onerada e a notificação dos órgãos municipais responsáveis pela aprovação de projetos de construção e pela autorização de afixação de cartazes e engenhos publicitários;

d) o entorno do tombamento pode ser conceitu-ado como sendo a área de projeção localizada na vizinhança dos imóveis tombados, que é delimi-tado com objetivo de preservar a sua ambiência e impedir que novos elementos obstruam ou reduzam sua visibilidade, tanto do ponto de vista físico (distância, perspectiva, altura) quanto fi-nalístico (harmonia, integração, ambiência).

2.9.1 Sugestões

A Legislação Municipal observará, em sendo pos-sível, as seguintes sugestões, com supedâneo nas motivações já explicitadas:

- Tombamento será aplicado ao bem de cultura móvel ou imóvel, tendo por preferência o seu caráter singular;

- Criação dos Livros de Tombo, que deverão ser utilizados por pessoa capacitada para exercer o mister;

A inscrição nos Livros de Tombamento deverá constar, no mínimo:a) número do processo;b) descrição do bem;c) localização;d) delimitação da vizinhança, para bens imóveis;

- Serão mantidos nos Arquivos do Município, por determinação e orientação do Conselho Mu-nicipal de Cultura, os seguintes livros de inscrição do patrimônio cultural, que poderão ter vários

O INVENTÁRIOGUIA DE ORIENTAÇÃO DOS MUNICÍPIOS

3. O INVENTÁRIO

O segundo instituto destinado à sal-vaguarda de bens culturais é o inventário. Não há, no ordenamento jurídico brasileiro, lei regu-lamentadora acerca do processo de inventário e os efeitos decorrentes de tal ato, enquanto ins-trumento de proteção do patrimônio cultural (MIRANDA, Marcos Paulo de Souza, in Tutela do Patrimônio Cultural Brasileiro, p. 102-103, 2006). Contudo, encontra elogiável conceituação na Lei de Bases do Patrimônio Cultural de Portugal, Lei nº. 10/2001, em seu art. 19, que define a in-ventariação como o levantamento sistemático, atualizado e tendencialmente exaustivo dos bens culturais existentes em nível nacional, com vista à respectiva identificação e registro, adotando-se, para a sua execução, critérios técnicos de natu-reza histórica, artística, arquitetônica, sociológi-ca, antropológica, dentre outras, possibilitando fornecer suporte primário às ações protetivas de competência do Poder Público.

Na visão de Mário de Andrade(4), agre-gado ao tombamento deveria existir um estudo detalhado, tanto no caso da obra erudita, quanto da “obra folclórica”. Assim, o Inventário de refe-rências culturais é um instrumento de política cultural voltado para o conhecimento e identifi-cação de “novos” bens culturais. Sua elaboração e aplicação refletem um momento político par-ticular de disputas sobre as novas narrativas do patrimônio cultural.

O inventário tem como objetivo a iden-tificação e o registro dos bens culturais, adotan-do-se, para sua execução, critérios técnicos de natureza histórica, artística, arquitetônica, soci-ológica, antropológica, fornecendo subsídios às ações de proteção atribuídas ao poder público.

O Inventário para a preservação será processado ao bem cultural, móvel ou imóvel, individualmente ou em conjunto e coleções, tendo por referência o seu caráter reiterativo. Nas

precisas lições de Houaiss(5) (2001) inventário cul-tural é o “levantamento dos bens considerados como representativos de uma cultura com vistas a sua preservação.”

No inventário são elaboradas fichas onde são apostos os resultados dos trabalhos de pesquisa, constando a descrição sumária do bem cultural inventariado, a exemplo de suas carc-terísticas físicas, delimitação e estado de con-servação.

Carlos Amorim(6) ressalta que o in-ventário de bens imóveis servirá de estímulo ao proprietário, a fim de que este conserve o bem de modo adequado, lançando mão das vantagens que o Poder Público deve oferecer; já o inventário de bens móveis está geralmente relacionado a objetos que compõem acervos de igrejas e de ins-tituições públicas.

Quanto ao registro do patrimônio ima-terial, o IPHAN dispõe de metodologia de pesqui-sa através do instrumento do Inventário Nacional de Diferenciais Culturais - INRC, cujo objetivo é documentar os “saberes e fazeres”, seus locais de manifestações, significação histórica e imagem urbana.

Segundo o mesmo autor, ao ente fe-derativo que promove o inventário, União, Es-tado ou Município compete, também, fornecer o selo de autenticidade renovável que se converte em garantia de qualidade.

A Constituição Federal de 1988 reco-nheceu expressamente (art. 216 §1º) o inventário como instrumento de preservação do patrimônio cultural, de modo que não poderão, tais bens serem destruídos, inutilizados, deteriorados ou alterados sem a prévia autorização do órgão res-ponsável pelo ato protetivo, decorrendo mais dois efeitos jurídicos:

1) a submissão do bem inventariado ao regime jurídico específico dos bens culturais protegidos;16 17

GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

volumes, zelando por sua inviolabilidade e se-gurança:I – Livro do Tombamento dos Bens Imóveis;II – Livro do Tombamento dos Bens Móveis;

Observar as regras gerais de procedimento im-postas pela Lei nº. 8.895/2003, destacando-se o seguinte:

- Dispor expressamente que o bem tombado não poderá sofrer intervenção sem autorização do Órgão competente, sob pena de multa e de obrigação de reparar os danos causados, esta-belecendo, desta forma, porcentagem a ser paga em caso de descumprimento;

- A preservação do bem tombado é de responsa-bilidade do proprietário, que responde objetiva-mente na ocorrência de dano;

- Estabelecer políticas que possibilitem a exe-cução de obras no bem tombado para con-servação do mesmo em caso de incapacidade econômica do proprietário, que deverá ser no-ticiada ao ente público responsável, criando-se prazos para comunicação da incapacidade ao órgão;

- Previsão da impossibilidade de saída do Mu-nicípio de bem móvel, sem prévia e formal au-torização;

- Deverá ser notificado o órgão competente em caso de furto ou desaparecimento de bem tom-bado (estabelecer prazo para ciência do fato), adotando-se, também, as providências criminais pertinentes, qual seja noticiar à Delegacia de Polícia e ao Ministério Público os fatos;- Dever do proprietário de notificar o adquirente sobre a incidência de tombamento no bem, no ato da alienação, sob pena de multa ao propri-etário;

- Dever do ente público de averbar o tombamen-to na matrícula do imóvel no Cartório de Registro de Imóveis;

- Dever do ente público de notificar o proprietário do imóvel acerca do tombamento, concedendo-se ao proprietário o prazo de 15 (quinze) dias para apresentar impugnação, se assim entender, ou então, anuir ao tombamento;

- Criação do Conselho Municipal de Cultura, a quem competirá decidir, em plenário e por maio-ria simples, acerca da aplicação dos institutos de proteção do patrimônio cultural, sem prejuízo das demais obrigações que a lei lhe impuser; - Promover, em parceria com os órgãos de cultura estadual e federal, atividades relativas à edu-cação patrimonial.

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Sobrado Barão de Jeremoabo | Itapicuru - BA

REGISTRO ESPECIAL DO PATRIMÔNIO IMATERIALGUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MUNICÍPIOS

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instauração do processo de registro: o Prefeito do Município, o Secretário da Cultura, ou qualquer membro do Conselho, de vontade própria ou, ainda, atendendo à solicitação de Secretarias Municipais ou entidades civis regulares e devi-damente registradas,na forma da lei e, ainda, a sociedade civil.

As propostas para registro, acompa-nhadas de sua documentação técnica, serão di-rigidas ao Chefe do Poder Executivo pela Secre-taria de Cultura, que as submeterá ao Conselho Municipal de Cultura.

A instrução dos processos de registro será supervisionada pela Secretaria de Cultura e constará da descrição pormenorizada do bem a ser registrado, acompanhada da documentação correspondente, devendo mencionar todos os elementos que lhe sejam culturalmente relevan-tes. É o dossiê do bem registrado que viabiliza o conhecimento da manifestação cultural. Por isso, a noção de “registrar” em documento deve ser ampla para abranger qualquer fixação de infor-mações em suporte físico, como a gravação de CDs, DVDs, e outros meios que permitam o maior e melhor armazenamento de informações.

Após o encerramento da instrução, o Conselho emitirá o parecer acerca da proposta de registro e enviará o processo à Secretaria de Cultura, para deliberação e em caso de decisão favorável, o bem será inscrito no livro correspon-dente.

4. REGISTRO ESPECIAL DO PATRIMÔNIO IMATERIAL No cenário jurídico nacional, o Decreto nº 3.551/2000 instituiu o registro de bens culturais de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, criando o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial, viabilizando a efetiva proteção administrativa dos bens culturais in-tangíveis que se relacionam à identidade e a ação de grupos sociais.

O Registro nada mais é do que a identi-ficação e produção de conhecimento sobre o bem cultural pelos meios técnicos mais adequados e amplamente acessíveis ao público, permitindo a continuidade dessa forma de patrimônio.

Patrimônio cultural imaterial é uma concepção que abrange as expressões culturais e as tradições que um grupo de indivíduos preserva em homenagem à sua ancestralidade, para as gerações futuras. São exemplos de patrimônio imaterial: os saberes, os modos de fazer, as for-mas de expressão, celebrações, as festas e danças populares, lendas, músicas, costumes e outras tradições. O procedimento adotado para o regis-tro de bens culturais em livros se assemelha ao processo de tombamento, nos chamados Livros de Tombo, mas não produz os efeitos restritivos que são próprios daquele.

A proteção que o registro é capaz de o-ferecer se expressa mediante o reconhecimento da existência e valor de determinada mani-festação cultural. Registrar documentalmente a existência da manifestação cultural é ato prote-tivo na medida em que constitui prova capaz de dar suporte a ações que visem a impedir posterior utilização indevida dos conhecimentos e práticas envolvidos na manifestação cultural.

Segundo o art. 1º do Decreto nº 3551/2000, com as alterações sugeridas pelo An-teprojeto de Lei baiano, o registro do patrimônio

imaterial poderá ser efetuado em quatro livros, quais sejam:

I - LIVRO DO REGISTRO ESPECIAL DOS SABERES E MODOS DE FAZER: onde serão inscritos conheci-mentos e modos de fazer enraizados no cotidiano das comunidades. Este registro é de suma im-portância para as populações tradicionais, uma vez que o fenômeno de massificação cultural as-sociado à globalização tem extinguido os modos espontâneos de fazer e conhecimentos popu-lares, principalmente nas cidades brasileiras.

II - LIVRO DO REGISTRO ESPECIAL DOS EVEN-TOS E CELEBRAÇÕES: onde serão inscritos rituais e festas que marcam a vivência coletiva do tra-balho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social. Para as sociedades tradicionais este livro é muito importante, pois, boa parte de suas práticas ainda são coletivas, havendo uma forte interação de quase todos os membros da comunidade nesses eventos.

III - LIVRO DO REGISTRO ESPECIAL DAS EX-PRESSÕES LÚDICAS E ARTÍSTICAS: onde serão inscritas manifestações literárias, musicais, plás-ticas, cênicas e lúdicas. Este livro tem destacado valor, pois, pode promover inclusive, o resgate de muitas “formas de expressão” que comunidades tradicionais vinham deixando de manifestar, muitas vezes por falta de incentivos governa-mentais para divulgação das mesmas, associado à “baixa estima cultural” que essas comunidades têm de si próprias, deixando-se influenciar pela cultura de massa das sociedades no seu entorno.

IV - LIVRO DO REGISTRO ESPECIAL DOS ESPAÇOS DESTINADOS A PRÁTICAS CULTURAIS E COLETIVAS: onde serão inscritos mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas.

4.1 PARTES LEGÍTIMAS PARA PROPOSIÇÃO DO PEDIDO DE TUTELA

São partes legítimas para provocar a

2) a qualificação do bem inventariado como ob-jeto material dos crimes previstos nos arts. 62 e 63 da Lei 9.605/98.

Deste modo, ainda que não exista no ordenamento jurídico pátrio lei regulamenta-dora, entende-se que os órgãos públicos a quem se destinou tal atribuição, poderão realizar a inventariança, recaindo os efeitos legais sobre o proprietário do bem cultural inventariado e o ente federativo que promove o ato protetivo.

Não se pode olvidar, contudo, que a inexistência de lei fragiliza o instituto do in-ventário, deixando margem para discussões ju-rídicas.

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Festa de Santa Bárbara | Salvador - BA

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Afoxé Filhos de Gandhy |Salvador - BA

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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5. PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO. COMPETÊNCIA COMUM DOS ENTES FEDERATIVOS O patrimônio arqueológico com-preende a porção do patrimônio material para o qual os métodos de arqueologia fornecem co-nhecimentos primários. Engloba todos os vestí-gios da existência humana e interessa a todos os lugares onde há indícios de atividades humanas, não importando quais sejam elas, estruturais e vestígios abandonados de todo tipo, na super-fície, no subsolo ou sob as águas, assim como o material a eles associados. (Carta de Lausanne)

Os sítios arqueológicos são definidos e protegidos pela Lei nº 3.924/61 e são considerados bem patrimoniais da união.

O patrimônio arqueológico, segundo Mendonça de Souza e Souza (1983, p. 5) é carac-terizado como o conjunto de locais em que ha-bitaram as populações pré-históricas, bem como toda e qualquer evidência das atividades cultu-rais destes grupos pretéritos e inclusive seus re-stos biológicos. O Patrimônio Arqueológico é as-sim integrado não só por bens matérias (artefatos de pedra, osso, cerâmica, restos de habitação, vestígios de sepultamentos funerários), mas tam-bém e principalmente pelas informações deles dedutíveis a partir, por exemplo, da sua própria disposição locacional das formas adotadas para ocupação do espaço e dos contextos ecológicos selecionados para tal.

O patrimônio arqueológico possui uma base de dados finita e diferentemente de outros sistemas não comporta restauração, sua capaci-dade de suporte de alterações é assaz limitada. Por isso, reflexões que apontam para a identi-ficação e minimização dos impactos cumulativos se constitui uma preocupação constante em obras e empreendimentos de potencial dano à matriz arqueológica. (BASTOS, 2001 SAB).

Cabe ao município, detentor de

patrimônio arqueológico, dentre outras obrigações:

• Promover a salvaguarda dos sítios arqueológi-cos;

• Contribuir para a formulação da política de preservação do patrimônio cultural;

• Propor normas e procedimentos e desenvolver metodologias, refletindo a pluralidade e diversi-dade cultural brasileira, divulgando a existência do seu patrimônio cultural;

• Estabelecer um constante diálogo com os entes da administração federal e estadual, uma vez que se trata de responsabilidade de todos estes, de natureza irrenunciável e cumulável.

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Detalhe pintura rupestre | Palmeiras - BA

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CONSIDERAÇÕES FINAIS À vista do exposto, cumpre aos mu-nicípios a análise e execução da presente orien-tação, que tem como objetivo essencial fornecer subsídios acerca dos principais institutos de sal-vaguarda de bens de valor cultural, ressaltando que o IPAC, na qualidade de autarquia estadual legal e regimentalmente investida da função ins-titucional de promover a tutela do Patrimônio Cultural do Estado da Bahia, pela especialização/habilidade técnica que detém, se coloca a dis-posição dos entes municipais deste Estado, no

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Procissão da festa de Boa Morte | Cachoeira - BA

sentido de orientá-los sobre questões de mérito de tombamento, educação patrimonial, auxílio jurídico na elaboração de legislação complemen-tar, bem como no desenvolvimento de atividades outras voltadas à defesa do Patrimônio Cultural.

Para fins de aprofundamento da temática, já que é impossível esgotar nes-ta orientação os institutos de proteção do Patrimônio Cultural apresentam-se obras re-ferenciais a seguir.

AMORIM, Carlos A. O inventário para preservação. Salvador. s.dCASTRO, Sônia Rabello de. O Estado na preservação de bens culturais. Rio de Janeiro: Renovar, 1991;CASTRIOTA, Leonardo Barci. Patrimônio Cultural: conceitos, políticas, instrumentos. São Paulo: Annablume: Belo Horizonte, IEDS, 2009.COUCEIRO, Sylvia; BARBOSA, Cibele. Patrimônio imaterial: debates contemporâneos. Cadernos de Estudos Sociais, Recife, v.24, n. 2, p. 151-159, jul./dez. 2008. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella – Direito Administrativo - 10ª edição - Editora Atlas, 1999; GASPARINI, Diogenes- Direito Administrativo - 6ª edição - Editora Saraiva, 2001; MEDAUAR, Odete - Direito Administrativo - 3ª edição - Revista dos Tribunais, 1999.MEIRELLES, Hely Lopes - Direito Administrativo Brasileiro - 26ª edição - Editora Malheiros, 2001; MIRANDA, Marcos Paulo de Souza. Tutela do patrimônio cultural brasileiro: doutrina, jurisprudência, legislação. Belo Horizonte: Del Rey, 2006._________. O inventário como instrumento constitucional de proteção ao patrimônio cultural brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1754, 20 abr. 2008. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/11164>. Acesso em: 27 jan. 2011. SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. Bens Culturais e Proteção Jurídica. 2. ed. rev. ampl. Porto Alegre: Unidade Editorial, 1999.

REFERÊNCIAS

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CONTATOS

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ASSESSORIA TÉCNICATel.: (71) 3117-6464 / 3117-6492E-mail.: [email protected]

DIRETORIA DE PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURALTel.: (71) 3117-7496 / 3117-7498E-mail.: [email protected]

COORDENAÇÃO DE ARTICULAÇÃO E DIFUSÃOTel.: (71) 3116-6945E-mail.: [email protected]

OUVIDORIATel.: (71) 3117-6461E-mail.: [email protected]

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃOTel.: (71) 3117-6490 / 3116-6673E-mail.: [email protected] 22 23Cabocla - Cortejo 2 de julho | Salvador - BA

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